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SÍNDROME DOLOROSA MIOFASCIAL A dor miofascial ou musculoesquelética regional, é frequente na prática clínica. Além disso, acomete músculos, tecido conectivo e fáscias, principalmente na região cervical, cintura escapular e lombar. Definição: distúrbio doloroso crônico acompanhado de pontos-gatilho em 1 ou mais músculos ou grupos musculares. Sendo uma causa frequente de dor no pescoço e no ombro, cefaleia do tipo de tensão e lombalgia. Epidemiologia: a prevalência na população é difícil de ser avaliada e dimensionada, pois é um diagnóstico exclusivamente, clínico e nem sempre pensado e realizado. Os estudos até então realizados, sugerem que indivíduos em faixas etárias mais ativas, são mais acometidos pela SDM. Em um estudo, Sola e colaboradores (1955) identificou em uma população de 200 adultos jovens selecionados, sem queixas de dor, onde 54% das mulheres e 45% dos homens, apresentava pontos-gatilhos na musculatura da cintura escapular. A SDM apresentou uma prevalência na região cervical, quadril, cintura escapular e região lombar. Mais observada em mulheres, associada com uma limitação dos movimentos, fraqueza e disfunção autonômica, tendo os pontos-gatilho e a dor referida. Pontos-gatilho: eles representam áreas de hiperalgesia mecânica localizada, Os pontos- gatilho geralmente estão associados a uma “resposta de contração” muscular, que pode ser provocada facilmente pela introdução de uma agulha ou pela palpação do ponto- gatilho. Apresentação Clínica: sendo o diagnóstico realizado, único e exclusivo, por história clínica (anamnese) e exame físico. De forma que se apresenta como uma condição dolorosa muscular regional caracterizada pela ocorrência de bandas musculares tensas palpáveis, identificando pontos gatilhos extremamente dolorosos. Os pontos gatilhos podem ser palpados, e ainda, pode estar associados à presença de banda tensa ou de nódulo muscular. E ainda, esses PGs são gerados por uma sobrecarga dinâmica (traumatismo, excesso de uso) ou estáticas (sobrecargas posturais), que ocorrem durante as atividades de vida diárias e ocupacionais. A ocorrência de contração muscular visível e palpável localizada, ou seja, o reflexo contrátil localizado (RCL) ou twitch response, sendo induzido pela palpação ou punção da banda muscular ou dos PGs, é uma característica da SDM. Esses PGs podem ser ativos ou latentes. O ativo é um foco de hiperirritabilidade sintomático e muscular situado em bandas musculares tensas em áreas onde há queixa de dor, e quando pressionado, gera dor referida em áreas padronizadas, reprodutíveis em cada músculo. A dor ela pode ser espontânea e até mesmo ao movimento, limitando o movimento do paciente, e com isso gera a sensação de fraqueza muscular. Já os latentes são pontos dolorosos com características similares aos ativos, mas estão presentes em áreas assintomáticas, e não se associam à dor durante as atividades físicas normais. De forma que se tornam pontos ativos quando se tem estressores físicos exógenos, endógenos ou emocionais. Características da SDM: • dor difusa em um músculo ou grupo de músculos; • dor regional em peso, queimor ou latejamento, surtos de dor e referência de dor à distância; às vezes há queixas de parestesias (sem padrão neuropático); • banda muscular tensa palpável contendo PGs; • ausência de padrão de dor radicular ou neuropática; • reprodução das queixas ou alterações das sensações durante a compressão do ponto miálgico; • ocorrência de reação de contração local (RCL) durante a inserção da agulha ou palpação no sentido transversal do ponto hipersensível da banda muscular; • alívio da dor após o estiramento do músculo ou após a infiltração no ponto sensível; • possível limitação da amplitude de movimento; • encurtamento muscular ao estiramento passivo; • possível redução da força muscular ao teste manual. Apesar de diversas características com suas dificuldades em serem identificadas, tem- se os quatro critérios mínimos para o diagnóstico: (1) – pontos dolorosos em banda tensa muscular; (2) – reconhecimento de dor muscular; (3) – padrão de dor referida prevista; (4) – resposta de contração local (local twitch response). A dor ainda pode se apresentar sendo contínua ou episódica, e geralmente, persistente. Ainda, a dor não segue o padrão dermatomérico ou radicular. Alguns fatores são fundamentais para o diagnóstico das SDM: história clínica detalhada sobre a condição clínica, ocorrência ou não de sobrecarga musculoesqueléticas, posturas inadequadas durante a execução de tarefas, histórico de antecedentes pessoais e familiares, com afecções traumáticas, inflamatórias, metabólicas, oncológicas, viscerais, neuropáticas ou musculoesqueléticas pregressas. Devendo se atentar também o exame físico detalhada, neurológico, atitudes posturais, padrão de movimento das estruturas musculoesqueléticas, assimetria de membros, e palpação dos PGs. O histórico do paciente deve revisar os eventos de saúde cronologicamente, o uso de medicamentos e os fatores que interferem na dor. As queixas subjetivas da ocorrência de lesão ou de disfunção muscular são representadas pela dor, pelo enrijecimento e pela tensão muscular, principalmente um a dois dias após a execução de atividades físicas. Os doentes com PGs ativos geralmente queixam-se de dor mal localizada em queimor ou em peso e, muitas vezes, em pontada em um segmento corpóreo e referida à distância. Alguns doentes queixam-se de parestesias ou de adormecimentos regionais. A dor pode ocorrer quando há estimulação dos PGs durante a execução de atividades de contração voluntária e pode associar-se a alterações do sono, à sensação de fraqueza, à fadiga e à intolerância aos exercícios. A localização da dor e suas peculiaridades quanto ao padrão, à intensidade(escala numérica 0 a 10, e/ou fáscias de dor), aos fatores desencadeantes, aos fatores de melhora ou de piora são elementos importantes para caracterizar a SDM. A utilização de desenhos ou de gráficos do corpo humano é útil para documentar a distribuição dos padrões e a localização da dor. Os históricos sobre condições clínicas presentes e passadas, atividades no lar e no trabalho, condições mentais e hábitos alimentares (uso de álcool e adoção de dietas) são também fundamentais para o diagnóstico. O hábito de ingerir bebidas alcoólicas pode precipitar miopatia alcoólica aguda e mioglobinúria; a deficiência de vitamina B é associada à osteomalácia, fator causador de dor óssea ou muscular; a fraqueza decorrente de deficiência de palmitiltransferase ou de carnitina pode ocorrer particularmente durante a execução de exercícios prolongados após jejum e após dieta rica em gordura e pobre em carboidratos. Assim, a história de atividade física deve ser detalhadamente revisada. O sedentarismo, a frequência com que são realizadas as atividades esportivas (como os atletas de finais de semana), o tipo de atividades praticadas que podem sobrecarregar estruturas musculoesqueléticas (aeróbica, musculação) e a assimetria de sobrecarga musculoesquelética (tênis e outros esportes) são importantes na história clínica. Etiologias As causas mais comuns, são traumatismos, sobrecargas agudas ou microtraumatismos repetitivos de estruturas musculoesqueléticas. FISIOPATOLOGIA Os PGs apresentam cerca de 3 a 6 mm, e são formados pela presença de sangue ou de material extracelular, que de forma a não serem reabsorvidos após a ocorrência de lesão muscular, resultam em uma limitação do movimento e aderência tecidual, que afeta por sua vez, os mecanismos de deslizamento das fibras musculares. E assim, ocasionam a dor, conforme se realiza os movimentos, tensão e até espasmos musculares. E a principal teoria para a formação desses PGs ocorre a partir de microtraumatismos ou sobrecargas. As fibras musculares, quando sofrem lesão, sobrecarga e estressede repetição, desenvolvem PGs, resultando em contração muscular exagerada durante um período de tempo prolongado. Juntamente, ocorre a fadiga muscular. A isquemia focalizada e as anormalidades subsequentes do ambiente extracelular das miofibrilas, além da liberação de substâncias algogênicas (endógenas), geram um círculo vicioso caracterizado por atividade de elevação motora e do sistema nervoso neurovegetativo, aumentando a sensibilidade à dor. Os eventos dolorosos podem ser autossustentados por fenômenos de sensibilização centrais e periféricos. De forma que nos locais que se formam os PGs, geram uma tensão nas fibras musculares, e essa tensão pode produzir uma sobrecarga mecânica localizada nos tecidos conectivo, e até em estruturas vizinhas à banda de tensão, e assim, essa sobrecarga gera falência dos elementos contráteis no nódulo, e assim, ocorre a liberação de substâncias sensibilizadoras dos nociceptores. De forma que a o desenvolvimento desses PGs e das bandas de tensões, são resultantes de macro e microtraumatismos localizados, e assim, causam ruptura do retículo sarcoplasmático e liberação e acúmulo de cálcio no sarcoplasma. O cálcio liberado no sarcoplasma reage com os ATP’s e causa um deslizamento e interação da actina com a miosina, e encurtamento do sarcômero, resultando no espasmo ou hipertonia muscular localizada. E por fim, essas atividades contráteis não controladas, causam um aumento do consumo energético e provoca um colapso da microcirculação local (compressão mecânica dos capilares). Os estímulos nociceptivos acionam os nociceptores musculares relacionados às fibras nervosas III (equivalente as fibras A-delta), e as fibras IV (que são equivalentes das fibras C). Que por sua vez, se projetam no corno posterior da substância cinzenta da medula espinal, transferindo os estímulos pelos tratos de projeção rostral. Ocorre, então, aumento da excitabilidade dos neurônios na medula espinal, que passam a apresentar atividade espontânea, aumento da reação aos estímulos mecânicos, ampliação dos campos receptivos e reforço de sinapses inefetivas. A deformação plástica da membrana neuronal causa a cronicidade da dor e é referida em outras estruturas profundas (músculos, tendões, articulações, ligamentos), enquanto a visceral causa referência cutânea. FISIOPATOGENIA: • Traumatismos: Macro ou microtraumatismos mecânicos excitam os nociceptores das fibras musculares, resultando em aumento na concentração tecidual de substâncias algogênicas e em ocorrência da inflamação e da sensibilização de nociceptores e de neurônios no SNC. • Sobrecarga funcional: Os músculos sobrecarregados funcionalmente quanto à intensidade e à duração das atividades podem sofrer lesões estruturais, incluindo necrose, e inflamação neurogênica, ou seja, rotura e edema de fibras musculares e infiltração inflamatória intersticial. Esses fenômenos, somados ao acúmulo de ácido láctico tecidual, estão envolvidos na dor persistente após a execução de exercícios extenuantes. As fibras dos músculos e do tecido conectivo rompem-se durante as atividades físicas e sofrem reparação, fenômeno que é acompanhado de edema e de sensibilização dos nociceptores. Segundo a teoria do espasmo muscular, há aumento da atividade elétrica muscular no músculo dolorido, mas esse fenômeno não pode ser evidenciado por meio de eletroneuromigrafia de agulha ou de superfície. • Isquemia: A isquemia associada à atividade muscular reduz a pO2 K+ , libera prostaglandinas, bradicinina e íons e libera radicais ácidos (ácido láctico) e outros produtos do metabolismo oxidativo que podem excitar os nociceptores. Estes são ativados pelos estímulos mecânicos gerados durante a contração muscular e tornam-se sensíveis à noradrenalina. O acúmulo de bradicinina produzida a partir da calicreína parece ser o mecanismo mais importante da ocorrência da dor isquêmica. • Inflamação: O processo miosítico resultante da injeção de agentes irritantes musculares acarreta em liberação de substâncias vasoativas (serotonina, histamina, bradicinina, PGs), resultando no aumento da atividade dos nociceptores e de outros receptores. A inflamação neurogênica agrava a condição inflamatória original. • Modificação do tônus muscular: O aumento do tônus • muscular ocorre quando há estresse psíquico, atividade física, anormalidades neurogênicas ou miogênicas. As cãibras constituem contração muscular involuntária prolongada e dolorosa, e os espasmos são contrações musculares involuntárias, dolorosas ou não. No mecanismo da dor em casos de cãibra, há possivelmente ativação de nociceptores mecânicos e, na dor do espasmo muscular, participam mecanismos de isquemia consequentes à compressão vascular pelos músculos tensos. • Condições autolimitantes: Os PGs podem ser ativados diretamente por sobrecarga agudas, fadigas, traumatismos ou neuropatias ou ser ativados indiretamente por outros PGs preexistentes, por afecções viscerais, por artropatias e por estresse emocional. Os mesmos fatores responsáveis pela geração dos PGs ativos podem, em menor grau, causar os PGs latentes ou induzir os PGs-satélite ativos em outros músculos. A inativação dos PGs principais pode também inativar os PGs-satélite sem necessidade do tratamento desses últimos. A ativação dos PGs pode ser associada à sobrecarga mecânica, que ocasiona encurtamento de um músculo e que pode ter PGs latentes ou ativos. Os PGs- satélite desenvolvem-se em músculos situados na área de dor referida dos PGs principais ou na área de dor referida de uma afecção visceral, como infarto do miocárdio, úlcera péptica, colecistolitíase ou cólica renal, entre outras. Os fatores perpetuantes aumentam os estressores, convertendo o PGs latentes em ativos. A intensidade e a extensão da área de dor referida depende do grau de atividade dos PGs, e não da dimensão dos músculos. O repouso adequado e a ausência de fatores perpetuantes transformam os PGs ativos em latentes e os sintomas dolorosos desaparecem. A reativação ocasional dos PGs, quando excede o limite de tolerância dos músculos, pode ocasionar dor recorrente ao longo dos anos. EXAMES COMPLEMENTARES Os exames clássicos solicitados para doenças inflamatórias, infecciosas e metabólicas, são normais em pacientes com SDM. Os estudos eletromiográficos de superfície demonstram que as fibras musculares com PGs ativos são mais facilmente fadigáveis e apresentam menor capacidade de gerar contração muscular do que as fibras musculares normais. A fraqueza pode ser decorrente da inibição reflexa dos músculos pela presença de PGs. Foram identificadas modificações funcionais nos músculos com PGs caracterizadas pelo aumento da reação aos estímulos elétricos, pelo alentecimento no relaxamento e pelo aumento da fadigabilidade. Essas anormalidades, em conjunto, sugerem que haja diminuição da capacidade funcional diante da execução de tarefas. Os PGs podem causar espasmos musculares e inibir a atividade de outros músculos e aumentam a reação de contração muscular. TRATAMENTO Os medicamentos analgésicos e anti-inflamatórios são importantes no controle da dor, e por isso, devem ser a primeira escolha terapêutica. E o uso dessas medicações se mostrou eficaz na utilização para dor aguda, sendo utilizado apenas para o controle para a realização de cinesioterapia, ou até mesmo dos procedimentos de agulhamento e/ou infiltração. O relaxante muscular mais utilizado, é a ciclobenzaprina (20 a 30 mg VO/dia), que tem ação central. Ainda, pode-se associar os analgésicos, miorrelaxantes com os psicotrópicos. Os antidepressivos tricíclicos (amitriptilina, clorimioramina, nortriptilina) na dose de 25 a 100 mg ao dia, e alguns inibidores específicos de recaptação de serotonina e noradrenalina (venlafaxina, mirtazapina), também são indicados. De forma que essa associação medicamente, ajudam a normalizar opadrão de sono e relaxam os músculos. Além dessas medicações, há os benzodiazepínicos, que são depressores do SNC e miorrelaxantes. São drogas que aumentam a inibição pré-sináptica das fibras aferentes na medula espinal, mediadas pelo GABA. Atuando por sua vez, como tranquilizantes, e ainda, apresentam sua capacidade miorrelaxantes. O programa de medicina física baseia-se na inativação dos PGs, na reabilitação muscular, na cinesioterapia com relaxamento muscular e em orientações posturais, além da remoção de outros fatores desencadeantes e perpetuantes. Para tanto, é fundamental a identificação correta dos músculos envolvidos. A adoção de hábitos saudáveis de vida constituem a base do tratamento da dor musculoesquelética. A dieta saudável e o sono repousante, além dos exercícios e da atividade física programada, são medidas complementares de extrema importância para qualquer programa de reabilitação de doentes com dor neuromuscular crônica.
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