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Recurso Especial Eleitoral em São Paulo

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TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 626-24.2016.6.26.0261 - CLASSE 32
- PIRAPOZINHO - SÃO PAULO
Relator: Ministro Admar Gonzaga
Recorrentes: Orlando Padovan e outro
Advogados: Hélio Freitas de Carvalho da Silveira - OAB: 154003/SP e outros
Recorrida: Coligação Juntos Somos Mais Fortes
Advogados: Rogério Leandro Ferreira - OAB: 142624/SP e outro
Recorrido: Ministério Público Eleitoral
DECISÃO
Orlando Padovan e António Carlos Colnago, candidatos eleitos
aos cargos de prefeito e vice-prefeito do Município de Pirapozinho/SP nas
Eleições de 2016, interpuseram recurso especial eleitoral (fls. 1.816-1.877) em
face de acórdão do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (fls. 1.553-1.602)
que, por unanimidade, recebeu os apelos com efeito suspensivo e declarou a
inconstitucionalidade parcial do § 3° do art. 224 do Código Eleitoral, rejeitando
as demais questões preliminares, e, por maioria de votos, deu parcial
provimento ao recurso dos ora recorrentes, a fim de reformar, em parte, a
sentença do Juízo da 261a Zona Eleitoral daquele Estado para afastar o
reconhecimento da captação ilícita de sufrágio e a multa imposta com base no
art. 41-A da Lei 9.504/97, confirmando, porém, o juízo de procedência da ação
de investigação judicial eleitoral ajuizada pela Coligação Juntos Somos Mais
Fortes quanto à prática de abuso do poder económico, mantendo, assim, as
sanções de cassação de diplomas e de declaração de inelegibilidade pelo
período de oito anos, aplicadas nos termos do art. 22, XIV, da Lei
Complementar 64/90.
Ademais, a Corte de origem negou provimento aos apelos
apresentados pelo Ministério Público Eleitoral e pela Coligação Juntos Somos
Mais Fortes e deu provimento ao recurso eleitoral de Cícero Alves Maia,
candidato não eleito ao cargo de vereador no mesmo pleito, a fim de julg
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP
totalmente improcedente a ação de investigação judicial eleitoral com relação a
ele.
Eis a ementa do acórdão regional (fls. 1.553-1554):
RECURSOS ELEITORAIS. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL
ELEITORAL (AIJE). ABUSO DE PODER ECONÓMICO. CAPTAÇÃO
ILÍCITA DE SUFRÁGIO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA COM
RELAÇÃO A ORLANDO PADOVAN, ANTÓNIO CARLOS
COLNAGO, RESPECTIVAMENTE, PREFEITO E VICE-PREFEITO
ELEITOS, E CÍCERO ALVES M Al A, CANDIDATO A VEREADOR
NAS ELEIÇÕES 2016, E DE IMPROCEDÊNCIA QUANTO A
CLAUDECIR MARAFON, VEREADOR ELEITO. RECEBIDOS OS
RECURSOS COM EFEITO SUSPENSIVO. AFASTADAS AS
PRELIMINARES ARGUIDAS POR ORLANDO PADOVAN, ANTÓNIO
CARLOS COLNAGO, CÍCERO ALVES MAIA E CLAUDECIR
MARAFON. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO ART. 224,
§ 3°, DO CÓDIGO ELEITORAL. DISTRIBUIÇÃO DE CAMISETAS
VERMELHAS JUNTAMENTE COM R$ 50,00, BEM COMO
PAGAMENTO DE CONTAS E COMPRA DE MEDICAMENTOS EM
TROCA DE VOTOS. REALIZAÇÃO DE EVENTO COM
FORNECIMENTO GRATUITO DE BEBIDAS. DEPOIMENTOS
COLHIDOS EM SEDE POLICIAL E NÃO CONFIRMADOS EM
JUÍZO, SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO.
DESCARACTERIZADA A CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO POR
FALTA DE PROVAS. CONFIGURADO O ABUSO DE PODER
ECONÓMICO NAS ELEIÇÕES MAJORITÁRIAS. NÃO RESTOU
COMPROVADO O ABUSO DE PODER ECONÓMICO NO PLEITO
PROPORCIONAL. A REFORMA DE R. SENTENÇA É MEDIDA QUE
SE IMPÕE. DESPROVIMENTO DOS RECURSOS INTERPOSTOS
PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL E PELA COLIGAÇÃO
"JUNTOS SOMOS MAIS FORTES". PROVIMENTO PARCIAL DO
RECURSO INTERPOSTO POR ORLANDO PADOVAN E ANTÓNIO
CARLOS COLNAGO, A FIM DE AFASTAR O RECONHECIMENTO
DA CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E,
CONSEQUENTEMENTE, ELIDIR A MULTA APLICADA.
PROVIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO POR CÍCERO ALVES
MAIA, PARA, COM RELAÇÃO A ELE, JULGAR A PRESENTE
AÇÃO IMPROCEDENTE.
Opostos embargos de declaração (fls. 1.607-1.627), foram eles
rejeitados em decisão assim ementada (fl. 1.780):
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INOVAÇÃO RECURSAL
ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO
PASSIVO NECESSÁRIO. AFASTAMENTO. CONDUTAS CINDÍVEIS
E AUTÓNOMAS. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.
EMBARGOS REJEITADOS.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP
Os recorrentes sustentam, em suma, que:
a) o recurso especial não demanda o reexame do acervo
fático-probatório dos autos, mas apenas a requalificação
jurídica dos fatos consignados no acórdão recorrido,
considerando os votos vencedores e os votos vencidos;
b) o acórdão recorrido ofendeu os arts. 275, l e II, do Código
Eleitoral, 1.022, II e III, parágrafo único, II, do Código de
Processo Civil, e 93, IX, da Constituição da República, diante
da existência de omissões e erros materiais no julgado, razão
pela qual deve ser aplicado o disposto no art. 1.025 do Código
de Processo Civil, ou, caso assim não se entenda, deve ser
provido o recurso especial para determinar o retorno dos autos
ao TRE/SP, a fim de que a Corte de origem corrija as falhas
apontadas nos embargos;
c) houve contrariedade ao art. 941, § 3°, do Código de
Processo Civil, uma vez que o voto vencido, que reconhecia a
improcedência da demanda, não compôs o acórdão regional
originário e tal falha não foi corrigida, a despeito da oposição
de embargos de declaração, ensejando a nulidade do acórdão
recorrido;
d) a decisão regional ofendeu os arts. 29, X, e 5°, LI 11 e LVI,
da Constituição da República, 157, caput e §§ 1°, 2° e 3°, do
Código de Processo Penal e 369 do Código de Processo Civil,
assim como afrontou o verbete sumular 702 do Supremo
Tribunal Federal, pois considerou válidos os elementos
probatórios colhidos em inquérito policial instaurado em
desfavor de prefeito e que não foi supervisionado pelo tribunal
competente, ensejando a nulidade das provas obtidas;
e) o aresto recorrido contrariou os arts. 5°, LV, da Constituição
da República, 22, caput, da Lei Complementar 64/90 e 434,
435 e 437, § 1°, do Código de Processo Civil, por violação ao
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP
contraditório e à ampla defesa, porquanto, intempestivamente e
em audiência de instrução, foram juntados documentos novos
pela parte autora sem a concessão de prazo razoável para
análise e manifestação dos representados;
f) houve violação aos arts. 22, caput, V a X, da Lei
Complementar 64/90, 5°, II, LV e LVI, da Constituição da
República, e 157, caput e §§ 1°, 2° e 3°, do Código de
Processo Penal, em virtude da produção de prova ilícita
consistente no depoimento pessoal dos réus, contrariando a
jurisprudência desta Corte Superior e do Tribunal Regional
Eleitoral paulista;
g) o acórdão regional divergiu do entendimento do Tribunal
Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul quanto à possibilidade
de exame, em embargos declaratórios, da matéria alusiva à
nulidade de depoimento pessoal do réu, por tratar-se de
matéria de ordem pública, passível de arguição a qualquer
momento;
h) a oitiva de testemunha não arrolada na petição inicial
afronta o disposto nos arts. 22, caput, da LC 64/90, e 27, § 1°,
da Res.-TSE 23.462;
i) a ausência de formação de litisconsórcio passivo
necessário entre todos os envolvidos na suposta prática de
abuso do poder económico infringiu o disposto nos arts. 22,
XIV, da Lei Complementar 64/90, e 114 e 115 do Código de
Processo Civil, tendo o acórdão regional divergido da
jurisprudência desta Corte Superior (REspe 843-56) e do
Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba (Acórdão 410/2017)
quanto ao ponto;
j) houve contrariedade aos arts. 14, § 9°, da Constituição da
República, 237 do Código Eleitoral, 19, parágrafo único, e 22,
caput, XIV e XVI, da Lei Complementar 64/90, e 371 do Código
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP
de Processo Civil, tendo em vista: i) que há ausência de prova
robusta e incontestável do abuso do poder económico; ii) que
os fatos não configuram ilicitude; iii) que a condenação ocorreu
com base em meras presunções; iv) que inexiste gravidade
apta a impactar a lisura das eleições; e v) que os recorrentes
são apenas beneficiários de atos de terceiros;
k) houve dissídio jurisprudência! quanto à impossibilidade de
se presumir a responsabilidade do candidato em virtude de
proximidade política ou familiar, bem como à indevida
declaração de inelegibilidadecom base no art. 22, XIV, da Lei
Complementar 64/90, em razão de ato de responsabilidade de
terceiros;
l) o aresto regional violou o art. 224, § 3°, do Código Eleitoral
e a Constituição Federal ao reconhecer a inconstitucionalidade
da expressão "após o trânsito em julgado", contida no citado
dispositivo legal, com base no acórdão desta Corte proferido
nos ED-REspe 139-25, pois tal norma é compatível com o texto
constitucional vigente.
Requerem o recebimento do recurso especial com efeito
suspensivo e pleiteiam o conhecimento e o provimento do apelo, a fim de que
sejam tornados insubsistentes os acórdãos regionais e julgada extinta ou
improcedente a ação de investigação judicial eleitoral.
Caso assim não se entenda, pugnam por que seja afastada a
inelegibilidade imposta ou, ainda, reconhecida a nulidade do acórdão e da
sentença, determinando-se a realização de novo julgamento da demanda pelas
instâncias ordinárias.
Por decisão às fls. 1.997-1.999, o Presidente do Tribunal de
origem admitiu o recurso especial e concedeu-lhe efeito suspensivo.
A Coligação Juntos Somos Mais Fortes apresentou
contrarrazões às fls. 2.008-2.018, nas quais pugnou pela revogação do efeito
suspensivo conferido ao recurso especial, com determinação de cumprimento
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP
imediato do acórdão regional, e pleiteou o não conhecimento e o não
provimento do apelo.
Pela decisão de fls. 2.023-2.024, o Presidente do TRE/SP
manteve a decisão que conferiu efeito suspensivo ao recurso especial.
A douta Procuradoria-Geral Eleitoral, no parecer de
fls. 2.039-2.047v, opinou pelo não provimento do recurso especial.
É o relatório.
Decido.
O recurso especial é tempestivo. O acórdão atinente ao
julgamento dos embargos de declaração foi publicado no Diário da Justiça
Eletrônico de 21.2.2018, quarta-feira, conforme certidão à f l. 1.809, e o apelo
foi interposto na mesma data (fl. 1.816) em petição subscrita por advogados
habilitados nos autos (procurações às fls. 500 e 862 e substabelecimentos às
fls. 1.261-1.2626 1.628).
No caso, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo manteve a
condenação dos recorrentes às sanções de cassação de diplomas e de
declaração de inelegibilidade pelo período de oito anos, aplicadas nos termos
do art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90, em virtude da prática de abuso do
poder económico, consistente na distribuição de camisetas e de cerveja a
eleitores.
Nas razões recursais, sustenta-se que o acórdão regional
afrontou disposições legais e constitucionais, assim como incorreu em
divergência jurisprudencial.
l - ofensa aos arts. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90 e 114 e 115 do
Código de Processo Civil - ausência de formação de litisconsórcio
passivo necessário
Os recorrentes alegam que a ausência de formação de
litisconsórcio passivo necessário com todos os envolvidos nos fatos tidos como
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP
abusivos, conforme indicado na narrativa da petição inicial, afrontou o disposto
nos arts. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90 e 114 e 115 do Código de
Processo Civil, acarretando a decadência para a propositura da ação de
investigação judicial eleitoral.
Defendem que "não se pode falar em longa manus se não há
uma indicação sequer da atuação direta ou ordem proferida pelos recorrentes"
(fls. 1.842-1.843).
Acerca da questão, observo que não assiste razão ao parecer
da Procuradoria-Geral Eleitoral no ponto em que afirma que "a jurisprudência
do Tribunal Superior Eleitoral não exige a formação de litisconsórcio passivo
necessário nas hipóteses de abuso de poder económico" (fl. 2.044), mas
apenas nos casos de conduta vedada e de abuso do poder político.
É certo que este Tribunal firmou o "entendimento, a ser
aplicado a partir das Eleições de 2016, no sentido da obrigatoriedade do
litisconsórcio passivo nas ações de investigação judicial eleitoral que apontem
a prática de abuso do poder político, as quais devem ser propostas contra os
candidatos beneficiados e também contra os agentes públicos envolvidos nos
fatos ou nas omissões a serem apurados" (REspe 843-56, red. para o acórdão
Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 2.9.2016, grifo nosso).
Todavia, conquanto o precedente citado tratasse de hipótese
de abuso do poder político, esta Corte Superior já decidiu que a orientação
jurisprudencial nele fixada se aplica também às ações de investigação judicial
eleitoral que versem sobre a prática de abuso do poder económico, conforme
aresto proferido no REspe 624-54, rei. Min. Jorge Mussi, DJE de 11.5.2018,
assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. VICE-
PREFEITO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL
(AIJE). ABUSO DE PODER ECONÓMICO ART. 22 DA LC 64/90.
DISTRIBUIÇÃO. BEBIDA. OMISSÃO. VÍCIO INEXISTENTE.
EMBARGOS REJEITADOS.
PRELIMINAR. LITISCONSÓRCIO PASSIVO
AUTORES. DISTRIBUIÇÃO. BEBIDA.
NECESSÁRIO
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 8
4. Em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), impõe-se
litisconsórcio passivo necessário entre o autor do ilícito e o
beneficiário (precedente). Entendimento que incide nos casos
de abuso de poder económico, político e de uso indevido dos
meios de comunicação social, pois, a teor do art. 22, XIV, da LC
64/90, aplica-se a inelegibilidade também a quem praticou o ato
CONCLUSÃO. PROVIMENTO. IMPROCEDÊNCIA.
16. Recursos especiais providos para julgar improcedentes os
pedidos, confirmando-se a liminar anteriormente deferida.
Por oportuno, destaco o seguinte trecho do voto condutor do
citado precedente:
Alega-se nulidade por ausência de formação de litisconsórcio passivo
necessário entre os candidatos recorrentes e três responsáveis pela
distribuição de 150 latas de cerveja após comício, em desacordo com
o entendimento deste Tribunal firmado no REspe 843-56/MG.
O TRE/SP, apesar de consignar que não conheceria da alegação,
avançou no tema e a examinou, de modo que a matéria encontra-se
prequestionada. É o que se infere dos seguintes trechos (fl. 478):
Ato contínuo, afirmou que não seria o caso de aplicar à hipótese em
análise o entendimento firmado no REspe 843-56/MG, pois nele se
discutiu abuso de poder político, enquanto aqui se apura abuso de
poder económico. Confira-se (f Is. 478-479):
Todavia, a tese fixada pelo TSE no leading case estende-se a todas
as condutas apuradas em AIJE (art. 22 da LC 64/90), o que inclui
também abuso de poder económico (caso dos autos) e uso indevido
dos meios de comunicação social, visto que, naquele julgado, se
consignou que:
[...] o inciso XIV do art. 22 da LC 64/90 dispõe expressamente
que "julgada procedente a representação, [...] o Tribunal
declarará a inelegibilidade do representado e de quantos
hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes
sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos
8 (oito) anos subsequentes [...]". Em outras palavras, assim
como nos §§ 4° e 8° do art. 73 é fixada sanção ao autor do
ilícito que não o candidato (vindo este a ser o mero
beneficiário), no inciso XIV do art. 22 essa distinção também
ocorre, estabelecendo-se sanção a quem comete o ilícito
em benefício do postulante a cargo eletivo.
Em outras palavras, sendo expressa a previsão de inelegibilidade em
desfavor de quem comete o ilícito que não o candidato, não há
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP
sentido lógico ou justificativa em não citar os autores da conduta para
compor o polo passivo.
Desse modo, merece reparo a conclusão da Corte Regional de que
não haveria litisconsórcio passivo apenas porque a espécie cuida de
abuso de poder económico (e não político).
Portanto, de acordo com a atual jurisprudência desta Corte,
aplicável aos feitos atinentes às Eleições de 2016, como é o presente caso, é
obrigatória a formação de litisconsórcio passivo nas ações de investigação
judicial eleitoral que versem sobre abuso do poder económico, político e uso
indevido dos meios de comunicação social, as quais devem ser propostas em
desfavor dos candidatos beneficiários e dos autores da conduta ilícita,tendo
em vista que a sanção de inelegibilidade se aplica também a quem praticou o
ato.
Fixado esse ponto, observo que os recorrentes alegam que
apontaram, em embargos de declaração, outras pessoas que, no seu entender,
seriam responsáveis pelas condutas tidas como abusivas, as quais não teriam
sido incluídas no polo passivo da demanda, embora a participação delas nos
fatos estivesse indicada na narrativa da petição inicial e, segundo alegam,
tivesse sido registrada no acórdão regional.
Destaco o seguinte trecho do voto vencido do Juiz Marcus
Elidius, relator originário, o qual acolhia os embargos de declaração a fim de
reconhecer a decadência e extinguir a ação de investigação judicial eleitoral
com resolução de mérito (f Is. 1 .799-1 .803):
Por fim, verifica-se que a jurisprudência consolidou o entendimento
de que há litisconsórcio passivo necessário entre os candidatos
beneficiados e os responsáveis pela prática do abuso do poder, visto
que a eventual procedência da ação acarretaria efeitos na esfera
jurídica de ambos, pois o art. 22, inciso XIV, da Lei das
Inelegibilidades, também estabelece sanção a quem comete o ilícito
em beneficio do postulante a cargo eletivo (Precedentes: TSE,
Respe 8547/PI, Rei. Min. António Herman de Vasconcellos e
Benjamin, DJE 19.12.16; TSE, Respe 133-48/PI, Rei. Min. António
Herman de Vasconcellos e Benjamin, DJE 17.10.16; TSE, Respe
843-56/MG, Relator Designado Min. Henrique Neves, DJE 02.09.16).
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 10
Esse entendimento também privilegia a verdade material, pois
apenas com a participação dos responsáveis pela prática abusiva,
concedendo-lhes o direito ao contraditório e à ampla defesa, é
possível elucidar todas as circunstâncias em que ocorreram os fatos
narrados na inicial.
Nos embargos de declaração foram elencadas 11 (onze) pessoas
supostamente envolvidas nas condutas impugnadas, as quais não
fazem parte do polo passivo desta ação.
De início, já é possível excluir a necessidade de participação das
pessoas abaixo discriminadas, pelas razões a seguir expostas:
1. Estevam Rapchan Manari, João Carlos Assef, Josiane dos
Santos e lida Jaques: são citados por possível participação na
captação ilícita de sufrágio (arregimentação de eleitores e
compra de votos), a qual não foi reconhecida no Acórdão
embargado;
2. Proprietário da Chácara "Auto Nil": não foi comprovada a
realização de nenhum evento na chácara "Auto Nil";
3. Carlos Eduardo Martinez Colnago: não foi demonstrada a
sua participação na distribuição de bebidas no "Bar do Pedrão";
4. Dercília Aparecida Vieira: não foi evidenciado o seu
envolvimento na distribuição de camisetas;
5. José Andrade dos Santos e Josinaldo Alves da Silva: nos
autos não há indícios de participação deles em qualquer das
condutas.
O proprietário do "Bar do Pedrão", onde foi realizada festa com
distribuição gratuita de bebida, não teve a sua conduta
individualizada na inicial, a qual sequer faz menção ao seu nome,
narrando apenas a realização do evento no local.
Somente no curso da instrução processual, foi demonstrado que
JOÃO MARINHO SILVA NETO, qualificado como um dos donos do
"Bardo Pedrão", realizou a compra das latinhas de cerveja.
Por conta disso, não havia como o chamar para compor a [sic] polo
passivo quando da propositura da demanda.
Conclui-se, então, que a presença de Estevam Rapchan Manari,
João Carlos Assef, Josiane dos Santos, lida Jaques, Carlos Eduardo
Martinez Colnago, Dercília Aparecida Vieira, José Andrade dos
Santos, Josinaldo Alves da Silvar, do Proprietário da Chácara "Auto
N/l" e do proprietário do "Bar do Pedrão" no polo passivo não
acarreta qualquer nulidade ao processo.
Contudo, com relação a Walter Bezamat Remelli, representante da
Coligação "Para Nossa Cidade Crescer Ainda Mais", a qual lançou as
candidaturas de ORLANDO PADOVAN e ANTÓNIO CARLOS
COLNAGO para o pleito majoritário, vê-se que a sua atuação foi
fundamental para a distribuição de camisetas.
Na própria inicial (fls. 21/23) é relatado que Walter Bezamat Remelli,
representante da Coligação "Para Nossa Cidade Crescer Ainda
Mais", a qual lançou as candidaturas de ORLANDO PADOVAN e
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 11
ANTÓNIO CARLOS COLNAGO para o pleito majoritário, participou
da confecção das blusas vermelhas, pois: 1) em sua casa foi
apreendido recibo da "Meeting Uniformes" em nome de ORLANDO
PADOVAN, datado de 28/09/2016, no valor de R$ 11.700,00 (onze
mil e setecentos reais); 2) Carlos Alexandre Fabrin Boulhosa,
proprietário da "Meeting Uniformes", ouvido no bojo do Inquérito
Policial, afirmou ler confeccionado 3 (três) lotes, cada um contendo
300 (trezentas) camisetas vermelhas, a pedido de Walter Bezamat
Remelli,
Assim, está claro que ele deveria ter integrado o polo passivo desta
demanda como um dos responsáveis pela prática abusiva, o que não
aconteceu.
Dessa foram [sic], há de ser reconhecida a nulidade de todos os aios
processuais a partir da petição inicial e determinado o retorno dos
autos à origem para que a coligação representante providencie o
aditamento a inicial para incluir e requerer a citação de Walter
Bezamat Remelli. Todavia, deixo de determinar o acima mencionado,
tendo em vista que a decadência restou consumada. Explico.
O rito previsto no a/t 22, da Lei Complementar n° 64/90, não
estabelece prazo decadência! para o ajuizamento da ação de
investigação judicial eleitoral. Por Construção jurísprudencial, no,
âmbito do c. Tribunal Superior Eleitoral, entende-se que as ações de
investigação judicial eleitoral que tratam de abuso de poder
económico e político podem ser propostas até a data da diplomação
porque, após esta data, restaria, ainda, o ajuizamento da Ação de
Impugnação de Mandato Eletivo (Al M E) e do Recurso Contra
Expedição do Diploma (RCED) (Precedentes: TSE, AgR-RMS
5390/RJ, Rei. Min. João Otávio de Noronha, DJE 09.05.2014; TSE,
REspe n° 12.531/SP, Rei. Min. limar Galvão, D J 10.9.1995; TSE
RO n° 401/ES Rei. Min. Fernando Neves, DJ 10.9.2000; TSE, RP
n° 628/DF, Rei. Min. Sálvio de Figueiredo, DJ 17.12:2002).
Os responsáveis pelo abuso de poder devem ser chamados a
integrar a lide dentro do prazo para propositura da ação, o que não
ocorreu no presente caso, pois a diplomação dos eleitos aconteceu
no dia 16.12.2016. Portanto, de rigor, o reconhecimento da
decadência do direito de propor a presente ação.
Diante do exposto, acolho os presentes embargos de declaração,
com atribuição de efeito modificativo ao julgado, para, ante a
ausência de litisconsórcio passivo necessário, reconhecer a
ocorrência [da] decadência do direito de propor a ação e julgar
extinto o processo com resolução de mérito, nos termos do artigo
487, inciso II, do Código de Processo Civil.
Todavia, prevaleceu o voto divergente do Juiz Marcelo
Coutinho Gordo, que rejeitou os embargos de declaração, nos seguintes
termos (fIs. 1.781-1.782):
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 12
Inclusão ou não de Walter Bezamat Remelli no polo passivo da ação
é questão desconhecida até então. Ou seja, não fora veiculada a
qualquer tempo e não haveria de sê-lo agora máxime ao argumento
de se tratar "de matéria de ordem pública".
Note-se, ademais, que para chegar a tal conclusão o d. Relator,
renovadas as vénias, revolve o exame de provas já efetivado
anteriormente, algo também descabido nos limites destes embargos.
E ainda que assim não fosse, já seria imprópria a conclusão de
fundo. A menção acerca do nome de Walter Bezamat Remelli na
inicial, mormente concebida a imputação de abuso de poder
económico não importa, necessariamente, na sua inclusão no polo
da ação. As condutas são cindíveis e autónomas de sorte que o
prosseguimento sem ele é, como foi, perfeitamente possível.
A questão é distinta dos casos de abuso de poder político onde o ato
é conjunto, não cindível portanto. Tem-se, outrossim, a co-
participação do agente na mesma conduta.
A divergência foi acompanhada pela Juíza Cláudia Lúcia
Fonseca Fanucchi, a qual consignou em seu voto que "Walter Bezamet
Remelli, sendo representante da Coligação'Para Nossa Cidade Crescer Ainda
Mais', à qual pertencem os representados e ainda por possuir cargo em
comissão naquele município, é descrito na inicial simplesmente como o
cumpridor das ordens, provenientes do então Prefeito de Pirapozinho Orlando
Padovan. Também deve-se observar que a representante não imputa a Walter
a conduta de distribuição de camisetas" (fl. 1.785).
E, mais adiante, asseverou: "O próprio fato do autor da ação
alegar que Walter teria pedido as aludidas camisetas vermelhas em confronto
com a afirmação inicial de que o recibo correspondente à compra desses
materiais estava no nome do representado Orlando Padovan (fl. 22), confirma
que Walter somente foi mencionado na exordial como um verdadeiro longa
manus do referido representado" (fl. 1.785).
Ainda no voto convergente proferido pela Juiz Juíza Cláudia
Lúcia Fanucchi, consignou-se que "os embargantes nem mesmo se
incumbiram do ónus de descrever qual seria a conduta supostamente ilícita
imputada a Walter Bezamet Remelli ao ponto de ensejar sua inclusão como
parte nesta ação" (fl. 1.786).
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 13
Como se vê, embora tenha entendido que a alegação referente
ao litisconsórcio não fora suscitada em momento anterior e, assim, não poderia
ter sido veiculada em sede de embargos de declaração, a Corte de origem
analisou as condutas das pessoas elencadas nos aclaratórios e concluiu pela
inexistência de litisconsórcio passivo necessário com relação a elas, inclusive
quanto a Walter Bezamet Remelli, o qual, de acordo com a corrente vencedora,
seria autor de conduta cindível e autónoma, e fora descrito na petição inicial
como mero cumpridor das ordens emanadas do recorrente Orlando Padovan,
não tendo participado da distribuição de camisetas vermelhas a eleitores.
Ressalto que a jurisprudência deste Tribunal é no sentido de
que "as condições da ação (legitimidade passiva, no caso), segundo a Teoria
da Asserção, devem ser aferidas em abstraio, sem exame de provas, em
consonância com as (simples) alegações postas na inicial" (AgR-AI 587-88, rei.
Min. RosaWeber, DJE de 9.2.2018).
No presente caso, a Corte de origem assentou que Walter
Bezamat Remelli seria mero executor das ordens do candidato Orlando
Padovan, conforme a narrativa da petição inicial, de modo que a sua integração
à lide como litisconsorte passivo necessário não era necessária.
Quanto ao tema, este Tribunal Superior já decidiu, mutatis
mutandis, que é "desnecessária a formação de litisconsórcio entre candidato
beneficiário e agente executor da conduta vedada quando atua na qualidade de
simples mandatário" (AgR-REspe 634-49, rei. Min. Rosa Weber, DJE de
30.9.2016). No mesmo sentido: AgR-REspe 311-08, rei. Min. João Otávio de
Noronha, DJE de 16.9.2014.
De outra parte, colhe-se do acórdão regional referente aos
embargos que a conduta do proprietário do bar onde ocorreu a distribuição
gratuita de bebidas não foi individualizada na petição inicial, a qual não
mencionou o seu nome e apenas narrou a realização do evento no local, tendo
sido demonstrado, somente no curso da instrução processual, que João
Marinho Silva Neto, um dos donos do citado estabelecimento comercial,
realizou a compra das latas de cerveja, de forma que não havia como chamá-lo
para compor o polo passivo da demanda.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 14
Quanto a tais pontos, os recorrentes alegam que não se pode
presumir que Walter Bezamat Remelli tenha agido sob sua ordem e sustentam
que a petição inicial indicara que João Marinho Silva Neto participou da
distribuição gratuita de bebidas, sendo impossível que os autores da demanda
não soubessem quem era o dono do estabelecimento comercial, por se tratar
de cidade pequena.
Todavia, para acolher tais alegações recursais e modificar a
conclusão à qual chegou o Tribunal de origem, no sentido de ser dispensável a
formação de litisconsórcio passivo na espécie, seria necessário o reexame do
conjunto fático-probatório dos autos, providência que não se admite em recurso
especial eleitoral (verbete sumular 24 do TSE).
No que diz respeito ao alegado dissenso jurisprudencial com o
acórdão do TSE no REspe 843-56 e o Acórdão 410/2017 do TRE/PB, anoto,
conforme tem reiteradamente decido esta Corte, que "fica prejudicada a análise
da pretensa ocorrência de dissídio jurisprudencial quando se cuida da mesma
tese que respaldou o recurso pela alínea a do inciso l do a/f 276 do CE, a qual
foi rejeitada por tratar de reexame de provas" (AgR-REspe 1-88, rei. Min.
Napoleão Nunes Maia Filho, DJE de 22.2.2018).
De qualquer forma, anoto que os precedentes indicados como
paradigmas não guardam semelhança fática com a hipótese dos autos, pois
nestes o Tribunal de origem entendeu que os candidatos recorrentes foram
responsáveis pelos atos abusivos, o que não foi reconhecido nos julgados tidos
como paradigmas.
Com efeito, no Acórdão 410/2017, do TRE/PB, tratava-se de
AIJE proposta em face de prefeito e vice-prefeito pela prática de conduta
vedada e abuso do poder político, na condição de eventuais beneficiários de
suposto excesso de gastos com publicidade institucional no primeiro semestre
do ano eleitoral, tendo a Corte Regional Eleitoral paraibana concluído pela
imprescindibilidade da citação dos secretários municipais, os quais eram
ordenadores de despesa por força de lei complementar local e seriam os
responsáveis pelos contratos firmados pela prefeitura com agências de
publicidade.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 15
Já no REspe 843-56, este Tribunal analisou AIJE por abuso do
poder político e económico, consistente na atuação de secretário municipal de
fazenda, que teria concedido gratificações a servidores públicos em troca de
votos, sem a participação do candidato beneficiado.
Assim, não há falar em obrigatoriedade de formação de
litisconsórcio passivo na espécie e, por conseguinte, não houve
decadência da ação de investigação judicial eleitoral, razão pela qual se
rejeitam as alegações de ofensa a dispositivos de lei e de dissídio
jurisprudência).
Passo ao exame das demais alegações recursais.
II - ofensa aos arts. 275, l e II, do Código Eleitoral, 489, § 1°, II, III e IV, e
1.022, II e III, parágrafo único, II, do Código de Processo Civil, e 93, IX, da
Constituição da República - omissão, contradição e erro material no
acórdão regional
Os recorrentes apontam ofensa aos arts. 275, l e II, do Código
Eleitoral, 489, § 1°, II, III e IV, e 1.022, II e III, parágrafo único, II, do Código de
Processo Civil, e 93, IX, da Constituição da República, sob o argumento de que
o Tribunal de origem deixou de sanar as omissões do julgado suscitadas em
embargos, acerca das alegações de ilicitude do depoimento pessoal dos réus e
da oitiva de testemunhas não arroladas na petição inicial, as quais seriam
questões de ordem pública e poderiam ser analisadas de ofício.
Todavia, não há falar em omissão do acórdão regional quanto
a tais pontos, pois o Tribunal de origem, ainda que em sentido contrário à
pretensão dos recorrentes, analisou as questões deduzidas e assentou a
impossibilidade de se pronunciar sobre as alegações de nulidade do
depoimento pessoal dos réus e da oitiva de testemunhas supostamente não
arroladas na petição inicial, por configurarem indevida inovação recursal em
sede de embargos declaratórios.
Ademais, não merece acolhimento a alegação de que o
Tribunal de origem deveria se manifestar de ofício sobre as indigitadas
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 16
questões, pois, em casos recentes e alusivos à instância ordinária, esta Corte
assentou que "é vedada a inovação de tese recursal em sede de embargos de
declaração, ainda que se trate de matéria de ordem pública. Precedente: AgR-
RCED 8015-38, rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 13.5.2016"
(REspe 709-48, rei. Min. Admar Gonzaga, DJE de 16.10.2018).
Anoto que a aplicação do disposto no art. 1.025 do Código de
Processo Civil, alusivo ao prequestionamento ficto, pressupõe quea matéria
tenha sido arguida perante o Tribunal a quo e que a instância superior
reconheça a existência de vício na falta de exame do tema, situação que não
ocorre no presente caso, conforme dito acima.
Ill - ofensa ao art. 941, § 3°, do Código de Processo Civil - ausência de
transcrição de voto vencido
Os recorrentes alegam ofensa ao art. 941, § 3°, do Código de
Processo Civil, sob o argumento de que o voto vencido da Desembargadora
Marli Ferreira, que teria reconhecido a improcedência da demanda, não
compôs o acórdão regional originário, mesmo após a oposição de embargos de
declaração, caracterizando-se omissão que ensejaria a nulidade do aresto e
determinação para complementação do julgado, ou a realização de novo
julgamento na hipótese de ser impossível o saneamento da falha.
Defendem que o voto vencido é importante para o
delineamento da moldura fática e para fins de prequestionamento e aduzem
que o encerramento do biénio de investidura da magistrada prolatora do voto
divergente seria irrelevante, porquanto o que se requer é apenas a
documentação da prestação jurisdicional entregue durante o exercício da
jurisdição eleitoral.
Quanto ao ponto, destaco o seguinte trecho do voto proferido
pelo relator originário, Juiz Marcus Elidius, por ocasião do julgamento dos
embargos de declaração, no que foi acompanhado pelos demais juizes da
Corte de origem (fl. 1.798):
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 17
Também não há qualquer omissão em razão do voto vencido da
Desembargadora Marli Ferreira não integrar o Acórdão. Segundo o
a/t 947, § 3°, do Código de Processo Civil, apenas o voto vencido do
relator deve necessariamente ser declarado e considerado parte
integrante do acórdão.
Frise-se que a Desembargadora Marli Ferreira, na ocasião do
julgamento deste recurso, não declarou o seu voto e, atualmente.
não compõe mais a Corte deste Tribunal.
Acerca da questão, destaco que o Superior Tribunal de Justiça
já decidiu que "a inobservância da regra do § 3° do art. 941 do CPC/15 constitui
vício de atividade ou erro de procedimento (error in procedendo), porquanto
não diz respeito ao teor do julgamento em si, mas à condução do procedimento
de lavratura e publicação do acórdão, já que este representa a materialização
do respectivo julgamento. Hipótese em que há nulidade do acórdão, por não
conter a totalidade dos votos declarados, mas não do julgamento, pois o
resultado proclamado reflete, com exatidão, a conjunção dos votos
proferidos pelos membros do colegiado" (STJ, REsp 1.729.143, rei. Min.
Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJE de 15.2.2019, grifo nosso).
Todavia, no caso em exame, não há falar em nulidade do
acórdão recorrido, pois ele contém todos os votos declarados no julgamento
dos recursos eleitorais, cabendo assinalar, de acordo com o aresto atinente
aos embargos de declaração, que a Desembargadora Marli Ferreira não
declarou o seu voto vencido e já não integrava a Corte Regional Eleitoral
quando da análise do citado recurso integrativo, o que torna inviável a eventual
juntada do teor pronunciamento divergente.
Ainda quanto ao ponto, observo que argumento similar ao
deduzido pelos recorrentes foi analisado no julgamento dos ED-HC 0603989-
63, da relatoria do Ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 24.8.2018,
ocasião em que este Tribunal rejeitou a tese de omisssão no acórdão
embargado por ausência de voto escrito divergente do eminente Ministro
Herman Benjamin, tendo em conta que o biénio de atuação do referido julgador
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 18
no TSE já se encerrara, "não havendo, portanto, como se exigira prática de ato
retroativo de magistrado que não mais integra este Colegiado".
Eis a ementa do referido julgado:
ELEIÇÕES 2016. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HABEAS
CORPUS. AÇÃO PENAL. ELEIÇÕES 2016. CORRUPÇÃO
ELEITORAL COAÇÃO A TESTEMUNHAS. FRAUDE.
ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. SENTENÇA CONDENATÓRIA.
ORDEM CONCEDIDA. PRISÃO PREVENTIVA E DEMAIS
CAUTELAS REVOGADAS. VÍCIOS. INEXISTÊNCIA. VOTO
ESCRITO. ENCERRAMENTO DO BIÉNIO DE MEMBRO DO TSE.
COMPOSIÇÃO REGULAR DO ACÓRDÃO. RES.-/TSE N°
23.172/2009. REJEIÇÃO.
2. In casu, o Ministério Público Eleitoral aponta omissão no acórdão
proferido, por maioria, por esta Corte, referente à ausência do voto
escrito do e. Ministro Herman Benjamin, que, ao discordar da
fundamentação adotada pelo relator no voto condutor do HC n°
0603989-63/RJ, declarou que acompanharia a divergência e
acrescentaria, em momento posterior ao julgamento, as anotações
que fundamentariam o seu dissenso.
3. Não compete ao relator substituir ministro que não mais integra
esta Corte Superior para adotar providência que somente a este
caberia, qual seja, a juntada de voto divergente, cujo conteúdo é
dissonante de seu próprio posicionamento.
4. Com efeito, o biénio de atuação do e. Ministro Herman Benjamin
perante esta Corte Superior, a teor do que prevê o § 2° do art. 121 da
Constituição Federal, se encerrou no dia 27.10.2017, não havendo,
portanto, como se exigir a prática de ato retroativo de magistrado que
não mais integra este Colegiado.
6. Embargos de declaração rejeitados.
(ED-HC 0603989-63, rei, Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, DJE
de 24.8.2018.)
Conforme dito acima, no presente caso, não houve declaração
do voto vencido e, tal como no precedente citado, já se encerrou o biénio de
atuação eleitoral da magistrada que o proferiu, razão pela qual merecem ser
rejeitadas as alegações de ofensa ao art. 941, § 3°, do Código de Processo
Civil e de nulidade do acórdão regional.
IV - alegação de ilicitude das provas oriundas do inquérito policial por
desrespeito às normas procedimentais
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 19
Os recorrentes apontam nulidade das provas oriundas do
inquérito policial e utilizadas na ação de investigação judicial eleitoral, sob o
argumento de que "houve efetivamente descumprímento de normas e formas
de tramitação usual de uma investigação policial, a contaminar a validade das
provas ali reunidas" (fl. 1.831) e, por consequência, das provas produzidas na
instrução processual, aduzindo que seria caso de aplicação da teoria dos frutos
da árvore envenenada.
Examino separadamente as alegações recursais deduzidas
neste tópico.
IV.1 - violação aos arts. 5°, Llll e LVI, e 29, X, da Constituição da
República, 157, capute §§ 1°, 2° e 3°, do Código de Processo Penal, e 369
do Código de Processo Civil, e ofensa ao verbete sumular 702 do
Supremo Tribunal Federal - nulidade de provas oriundas de inquérito
policial não supervisionado pelo tribunal competente por prerrogativa de
função
Os recorrentes alegam que a decisão regional ofendeu os
arts. 5°, Llll e LVI, e 29, X, da Constituição da República, o verbete sumular
702 do Supremo Tribunal Federal, e os arts. 157, caput e §§ 1°, 2° e 3°, do
Código de Processo Penal, e 369 do Código de Processo Civil ao considerar
válidos, para embasar a condenação, os elementos probatórios colhidos em
inquérito policial instaurado para apurar a prática do crime tipificado no art. 299
do Código Eleitoral, pois a investigação criminal deveria ter sido supervisionada
pelo Tribunal Regional Eleitoral por se tratar de investigado no exercício do
cargo de prefeito, de forma que o vício ensejaria o julgamento de
improcedência da demanda ou a declaração de nulidade das provas obtidas e
o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau para proferir nova sentença.
Sobre o ponto, assim consignou o acórdão regional proferido
no julgamento dos embargos declaratórios (fls. 1 .798-1 .799):
As alegações alusivas ao foro por prerrogativa de função do Prefeito
ORLANDO PADOVAN e ao litisconsórcio passivo necessário, a
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 20
despeito de se tratarem teses defensivas novas, por serem matérias
de ordem pública, devem ser enfrentadas.
Ora, é claro que a instauração de inquérito policial para apurar
suposto crime eleitoral praticado por prefeito depende de supervisão
do Tribunal Regional.
Contudo, neste caso, o inquérito policialfoi instaurado em outubro de
2016 (fl. 44), para investigar crime eleitoral supostamente praticado
por ANTÓNIO CARLOS COLNAGO, vice-prefeito eleito em 2016,
CÍCERO DA RODOVIÁRIA, candidato a vereador não eleito em
2016, e CL AU DEC l R MARRAFON, candidato a vereador eleito em
2016, os quais não possuíam foro por prerrogativa de função, e não,
por ORLANDO PADOVAN, prefeito reeleito em 2016.
Acrescente-se que vice-prefeito não possui foro por prerrogativa de
função, como se vê no art. 74, inciso l, da Constituição do Estado de
São Paulo.
Além do mais, não é possível decretar, em sede de Ação de
Investigação Judicial Eleitoral, a nulidade de aios praticados na
esfera criminal.
É certo que, na linha da jurisprudência do Tribunal Superior
Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal, o "inquérito instaurado diante de
suposto crime eleitoral cometido por prefeito exige supervisão do órgão a quem
compete processar e julgar a respectiva ação penal, sob pena de nulidade de
todos os aios" (AgR-REspe 6-10, rei. Min. Herman Benjamin, DJE de
29.9.2016).
Todavia, esta Corte já decidiu que "a instauração do inquérito
policial sem a supervisão do Tribunal Regional, em razão da prerrogativa de
foro do investigado, não acarreta, por si só, nulidade" (REspe 129-35, rei. Min.
Luís Roberto Barroso, DJE de 26.1 1 .201 8).
Destaco o seguinte trecho do voto condutor do citado aresto:
5. O Supremo Tribunal Federal tem afirmado em diversos
precedentes ser nula a investigação instaurada para apurar fatos
atribuídos a autoridade com prerrogativa de foro, sem a supervisão
do Tribunal competente para processar e julgar a correspondente
ação penal (Inq n° 2411-QO, Tribunal Pleno, Rei. Min. Gilmar
Mendes; AP n° 933-QO, 2a Turma, Rei. Min. Dias Toffoli; AP n° 912-
QO, 1a Turma, Rei. Min. Luiz Fux). No mesmo sentido se orientam
julgados do Tribunal Superior Eleitoral (HC n° 645/RN, Rei. Min.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 21
Gilson Dipp; HC n° 429-07/MT, Rei. Min. Gilmar Mendes; HC n°
106888/SP, Rei. Min. Gilmar Mendes).
6. O rigor dessa orientação predominante, contudo, tem sido
atenuado em casos nos quais, embora instaurado o inquérito sem a
autorização e supervisão do Tribunal competente, não se verifica
prejuízo decorrente dessa irregularidade. É o que se dá, por
exemplo, quando os atos instrutórios e o recebimento da denúncia
são ratificados pela autoridade competente (AgR-RE n° 730.579, Rei.
Min. Ricardo Lewandowski).
7. O mesmo rigor foi afastado pelo STF em caso no qual a
instauração do inquérito policial e sua tramitação não se deram com
a supervisão do Tribunal competente, em razão de equívoco da
autoridade policial, sem o propósito de prejudicar o detentor da
prerrogativa de foro (STF, Inq. 2952-ED/RR, Rei. Min. Gilmar
Mendes). Nesse precedente, teve influência a circunstância de que a
supervisão do inquérito, durante o período de tramitação irregular, foi
limitada a prorrogações do prazo para investigações. Entendeu-se
que "a falta da adequada supervisão do inquérito pela Corte
competente não desconstitui atos de investigação que não
dependem de intervenção judicial, como a tomada de depoimentos".
Ainda quanto ao ponto, anoto que este Tribunal já decidiu que
se admite "a convalidação de atos decisórios em matéria criminal, relativa ao
eventual desrespeito a foro por prerrogativa de função se, no momento do
deferimento da medida de busca e apreensão, não era ainda conhecido o
envolvimento de autoridade com foro privilegiado, a atrair a competência
do Tribunal Regional para a supervisão do inquérito e deferimento da
cautelar" (AgR-REspe 50-98, rei. Min. Luciana Lóssio, DJE de 8.11.2016, grifo
nosso).
No presente caso, conquanto o recorrente Orlando Padovan,
por exercer o cargo de prefeito, seja detentor de foro especial por prerrogativa
de função e o indigitado inquérito policial visasse a apurar a suposta prática de
corrupção eleitoral em favor da chapa majoritária por ele encabeçada, deve-se
ter em conta que, de acordo com o Tribunal de origem, o citado prefeito não
era investigado.
Ademais, não há no acórdão recorrido nenhum elemento que
permita inferir em que momento da investigação criminal teriam surgido indícios
de eventual envolvimento do prefeito nas condutas supostamente ilícitas, ou
mesmo se, após esse momento, teria porventura sido praticado ato de caráter
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 22
decisório ou adotada providência que estivesse protegida pela cláusula da
reserva de jurisdição, a fim de que se pudesse cogitar a existência de eventual
prejuízo, na linha dos precedentes acima citados.
Assim, para analisar a alegação de nulidade das provas
oriundas do inquérito policial por suposta falta de supervisão do Tribunal
Regional Eleitoral competente por prerrogativa de função, seria necessário o
reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que não se admite em
recurso especial eleitoral, nos termos do verbete sumular 24 do TSE.
Portanto, não merecem acolhimento as alegações de
ofensa aos dispositivos legais e constitucionais citados acima, tampouco
se vislumbra nulidade processual quanto ao ponto.
IV. 2 - indeferimento de perícia em fotografias, mídias e conversas do
WhatsApp
Os recorrentes alegam que o Tribunal de origem incorreu em
erro de julgamento, pois conversas supostamente realizadas por meio do
aplicativo WhatsApp teriam sido utilizadas como razões de decidir para a
aplicação das sanções previstas no art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90,
configurando-se o uso de prova ilícita para a condenação, na medida em que
tais diálogos somente poderiam ter sido analisados após autorização judicial e
deveriam ter sido periciados, o que não ocorreu.
Defendem que também as fotografias e as mídias dos autos
deixaram de ser submetidas a perícia, a fim de demonstrar a sua veracidade e
integridade.
Acerca da questão, o Tribunal de origem assim se pronunciou
no julgamento dos recursos eleitorais (fls. 1 .567-1 .568):
Em sede recursal, também é colocado que houve cerceamento do
direito de defesa, em razão de o Juízo a quo haver negado a
realização de perícia nas fotos, filmagens e documentos escritos
oriundos do Inquérito Policial: bem como de acareação entre as
testemunhas ILDA JAQUES e SANTA JAQUES, e entre a
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 23
testemunha WALTER BEZAMAT REMELLI e o recorrente CÍCERO
ALVES M Al A.
Acerca desses pedidos, o Magistrado pronunciou-se em audiência (fl.
1. 129) e na sentença (fl. 1.207):
Fl. 1.129 - "(...) Indefiro o pedido de acareação, haja vista que
as controvérsias e divergências serão aferidas por ocasião da
sentença e, por certo, a mencionada acareação seria inócua.
(...)"
Fl. 1.207 (...)
A prova pericial, na hipótese, além de incompatível com a
celeridade do rito eleitoral, ao final se demonstrou
desnecessária, já que os fatos restaram comprovados por
outros elementos probatórios que supriram a necessidade
daquela.
Não há razões, então, para se falar em cerceamento do direito de
defesa, vez que o Juízo de Primeira Instância motivou o
indeferimento das diligências, e decidiu a causa com base nos
elementos já constantes dos autos, seguindo os ditames do princípio
do livre convencimento motivado.
Como se vê, o indeferimento da realização de perícia nas
fotografias, nas filmagens e nos documentos escritos oriundos do inquérito
policial ocorreu em virtude da sua desnecessidade, tendo em vista que os fatos
que seriam objeto de análise pericial teriam sido demonstrados por outros
elementos de convicção.
Na linha da jurisprudência desta Corte Superior, "cabe ao
magistrado a direção do processo, devendo apreciar as necessidades reais da
produção de provas para o deslinde da questão, podendo inclusive indeferir as
provas que entender desnecessárias ou procrastinatórias, conforme preceitua o
art. 130 do Código de Processo Civil" (REspe 1310-64, rei. Min. Maria Thereza
de Assis Moura, DJE de 1 4.1 2.201 5).
No caso, conforme consignado pelo Tribunal de origem, o juiz
eleitoral examinou o conjunto fático-probatóriodos autos e concluiu que a
perícia requerida era desnecessária para a solução da controvérsia.
Assim, o acórdão regional não merece reparos quanto ao
tópico, pois está de acordo com o entendimento desta Corte Superior de que
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 24
"inexiste afronta às garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa
em razão do indeferimento das diligências pleiteadas, porquanto
desnecessárias ao deslinde da causa" (AgR-RO 0600870-81, rei. Min. Tarcísio
Vieira de Carvalho Neto, PSESS em 13.11.2018).
No mesmo sentido: "Suposto cerceamento de defesa. O
Regional, analisando o conjunto probatório dos autos, concluiu pela
desnecessidade de realização de prova pericial nas gravações, considerando a
sua irrelevância no caso concreto. Como se sabe, compete ao magistrado,
enquanto destinatário da prova, indeferir, 'em decisão fundamentada, as
diligências inúteis ou meramente protelatórias' (art. 370, parágrafo único, do
CPC). Precedentes" (AgR-REspe 244-24, rei. Min. Gilmar Mendes, DJE de
2.2.2017).
No que diz respeito, em específico, ao argumento de que
teriam sido utilizadas, para a condenação, conversas realizadas por meio do
aplicativo WhatsApp, cuja análise não teria, segundo alegam os recorrentes,
sido precedida de autorização judicial, e que não teriam sido periciadas,
verifica-se que tal questão não foi objeto de análise e decisão pelo Tribunal de
origem, faltando-lhe o indispensável prequestionamento, a teor do verbete
sumular 72 do TSE.
Ademais, verifica-se que não consta do acórdão recorrido
nenhuma informação que possa indicar que a obtenção das conversas via
aplicativo de mensagens tenha ocorrido em desacordo com o devido processo
legal.
Assim, é de ser rejeitada a alegação de ilicitude da prova
quanto ao ponto.
IV.3 - ausência do delegado de polícia em oitivas realizadas no inquérito
policial
Os recorrentes alegam que houve inquirição de pessoas no
inquérito policial sem a presença do delegado de polícia, o que configuraria
indevida transferência para terceiros de atividade privativa da autoridade
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 25
policial, ensejando nulidade que não é afastada pela supervisão e pela
circunstância de o delegado ter preparado as perguntas anteriormente aos
atos, já que poderia haver a necessidade de se formular novas perguntas a
partir das respostas apresentadas.
Quanto ao ponto, o Tribunal de origem consignou o seguinte
(fls. 1.564-1.565):
Ressalte-se, também, que o fato de o delegado não estar presente
no momento da gravação dos depoimentos colhidos em sede policial
não ocasiona a nulidade do ato.
Conforme explicado pelo Delegado de Polícia, o Sr. MARCELO
SILVA CONSTANTINI, na audiência de instrução (mídia de fl. 1.153),
apesar de a gravação ter sido realizada apenas na presença do
escrivão, ele supervisionou todo o trabalho, inclusive, determinando
as perguntas que seriam formuladas e, ao final, conferindo os termos
digitados. Ou seja, os atos foram totalmente acompanhados e
monitorados pela Autoridade Policial.
Quanto ao ponto, anoto que as conclusões da Corte de origem
de que o delegado de polícia supervisionou a tomada dos depoimentos e
determinou as perguntas que seriam formuladas, conferindo os termos
digitados, não podem ser revistas sem o indevido reexame fático-probatório.
Além disso, verifica-se que os recorrentes apontam a nulidade
de forma genérica, pois nem sequer indicam quais pessoas teriam sido
inquiridas sem a presença do delegado, assim como não demonstram a
existência de eventual prejuízo, limitando-se a afirmar, em tese, a possibilidade
de que novas perguntas surgissem a partir das respostas apresentadas pelos
depoentes.
Todavia, "no processo eleitoral, a decretação de nulidade fica
condicionada, por força do art. 219 do CE, à efetiva demonstração de prejuízo"
(AgR-AI 708-23, rei. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 19.3.2019).
Portanto, não há falar em nulidade quanto ao ponto.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 26
IV.4 - da busca e apreensão na residência de Walter Bezamat Remelli
Os recorrentes sustentam que a testemunha Walter Bezamat
Remelli se sentiu vítima de abuso de poder em virtude do suposto emprego de
força excessiva em diligência policial realizada na sua casa, a qual teria
ocorrido sem mandado de busca e apreensão e com policiais fortemente
armados, com realização de revista íntima de sua esposa.
Acerca de tais alegações, o Tribunal de origem assim se
pronunciou no acórdão atinente ao julgamento dos recursos eleitorais
(fls. 1.565-1.566):
No que diz respeito à busca e apreensão efetuada na casa de
WALTER BEZAMAT REMELLI, ele próprio, no seu depoimento em
Juízo, afirmou ter autorizado a entrada dos policiais em sua casa,
mesmo depois de ser informado que não havia mandado.
O Boletim de Ocorrência, mais especificamente à fl. 232, também
registra que só foi realizada a busca após a autorização do
proprietário.
Ainda em audiência, a testemunha ressaltou que a operação foi
constrangedora, vez que os policiais adentraram a casa fortemente
armados, vistoriando todos os cantos da residência, e chegando,
inclusive, a realizar uma revista íntima em sua esposa. Colocou,
também, que esse fato foi representado junto à Corregedor/a da
Polícia Civil.
No entanto, como não há provas de eventual abuso de autoridade
nessa busca e apreensão, ao tempo em que WALTER BEZAMAT
REMELLI é enfático ao dizer que anuiu com a entrada dos policiais
em sua residência, os objetos apreendidos devem permanecer nos
autos.
Vê-se, portanto, que a Corte de origem entendeu que, no
depoimento prestado em juízo, Walter Bezamat Remelli "afirmou ter autorizado
a entrada dos policiais em sua casa, mesmo depois de ser informado que não
havia mandado" (fl. 1.565), consignando, ademais, que tal circunstância ficou
registrada no boletim de ocorrência e que "não há provas de eventual abuso de
autoridade nessa busca e apreensão" (fl. 1.565).
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 27
A pretensão recursal de que sejam revistas tais conclusões, a
fim de declarar a suposta ilicitude da diligência de busca e apreensão e dos
elementos probatórios nela colhidos, esbarra no óbice ao revolvimento do
acervo fático-probatório dos autos (verbete sumular 24 do TSE).
Diante de tais considerações, é de ser rejeitada a alegação
de ilicitude das provas colhidas no inquérito policial e dos elementos
probatórios dela derivados, e, por conseguinte, não há falar em nulidade
das decisões das instâncias ordinárias.
V - ofensa aos arts. 5°, LV, da Constituição da República, 22, caput, da Lei
Complementar 64/90 e 398, 434, 435 e 437, § 1°, do Código de Processo
Civil -juntada de documentos na audiência de instrução
Os recorrentes alegam que o decisum atacado contrariou os
arts. 5°, LV, da Constituição da República, 22, caput, da Lei Complementar
64/90, e 398, 434, 435 e 437, § 1°, do Código de Processo Civil, por violação
ao contraditório e à ampla defesa, já que, em audiência, foram juntados
documentos de forma extemporânea pela parte autora do feito, sem a prévia
concessão de prazo para análise e manifestação dos réus.
Acerca de tais alegações, destaco o seguinte trecho do aresto
atinente ao julgamento dos recursos eleitorais (fls. 1.566-1.567):
Foram juntados diversos documentos provenientes do Inquérito
Policial n. 620-17.2016.6.26.0261 no momento da Audiência de
Instrução (Termo de Audiência às fls. 1.127/1.130).
Sendo que, na própria audiência, a defesa levantou questão relativa
a eventual prejuízo, tendo o Juízo de Primeiro Grau posicionado-se
da seguinte maneira (77. 1.129):
"(..-) inicialmente é necessário consignar que as defesas
tiveram ciência verbal sobre a juntada de novos documentos e,
inclusive, manusearam alguns deles durante a instrução, de
sorte que em razão da própria lealdade processual não se
pode alegar ausência de acesso aos referidos documentos
durante a instrução. (...)"
Como se pode ver, além de as partes terem tido a oportunidade de
manusear os documentosdurante a audiência, em sede de
alegações finais, foi dada oportunidade para ORLANDO PADOVAN,
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP
ANTÓNIO CARLOS COLNAGO, CÍCERO ALVES M Al A e
CLAUDECIR MARAFON se manifestarem acerca dos novos
elementos, tudo em conformidade com os princípios do contraditório
e da ampla defesa.
Como se vê, o Tribunal Regional Eleitoral assentou que os
recorrentes tiveram oportunidade de manusear os documentos oriundos do
inquérito policial que foram juntados aos autos por ocasião da audiência de
instrução, assim como puderam se manifestar sobre eles nas alegações finais.
Assim, agiu com acerto a Corte de origem ao rejeitar a
alegação de afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa, pois, na
linha da jurisprudência deste Tribunal Superior, "o cerceamento de defesa resta
afastado sempre que oportunizado à parte manifestar-se acerca das provas
carreadas aos autos em alegações finais" (REspe 458-67, rei. Min. Luiz Fux,
DJE de 30.8.2016).
Ademais, para analisar a alegação recursal de que os
indigitados documentos teriam sido usados pela parte autora para inquirir
testemunhas na audiência de instrução, seria necessário o revolvimento fático-
probatório, vedado pelo verbete sumular 24 do TSE.
Ainda quanto ao ponto, anoto que este Tribunal já decidiu, na
linha de julgados do Superior Tribunal de Justiça, que "somente os documentos
tidos como indispensáveis, porque 'substanciais' ou 'fundamentais', devem
acompanhar a inicial e a defesa. A juntada dos demais pode ocorrer em outras
fases e até mesmo na via recursal, desde que ouvida a parte contrária e
inexistentes o espírito de ocultação premeditada e de surpresa do juízo"
(REspe 822-03, rei. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 4.2.2015).
Na espécie, os recorrentes alegam ser intempestiva a juntada
dos citados documentos, mas não demonstram que eles devessem
acompanhar a petição inicial por eventualmente serem essenciais à propositura
da demanda. Além disso, e conforme assinalado no acórdão regional, os
recorrentes puderam não apenas manusear tais documentos na audiência,
mas também se manifestar sobre eles nas alegações finais.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 29
Assim, não há falar em violação aos princípios do
contraditório e da ampla defesa na espécie, tampouco em violação aos
dispositivos tidos como afrontados, de modo que é forçoso rejeitar as
alegações de nulidade das provas e do acórdão regional quanto ao ponto.
VI - ofensa aos arts. 22, caput, V a X, da Lei Complementar 64/90, 5°, II, L.V
e LVI, da Constituição da República e 157, caput e §§ 1°, 2° e 3°, do Código
de Processo Penal - colheita de depoimentos pessoais dos réus e oitiva
de testemunhas não arroladas na petição inicial
Os recorrentes apontam ofensa aos arts. 22, caput, V a X, da
Lei Complementar 64/90, 5°, II, LV e LVI, da Constituição da República e 157,
caput e §§ 1°, 2° e 3°, do Código de Processo Penal, sob o argumento de
ilicitude da prova consistente na colheita dos depoimentos pessoais dos
representados, aduzindo que tal procedimento não tem previsão legal e
contrariaria a jurisprudência desta Corte Superior e do TRE/SP.
Defendem que o depoimento pessoal do representado Cícero
Alves Maia foi determinante para afastar a versão dos fatos apresentada pela
testemunha Walter Bezamat Remelli.
Sustentam, ademais, que ocorreu oitiva de testemunhas não
arroladas na petição inicial da ação de investigação judicial eleitoral, em afronta
ao disposto nos arts. 22, caput, da Lei Complementar 64/90 e 27, § 1°, da Res.-
TSE 23.462 e em ofensa ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla
defesa.
Quanto a tais argumentos, a Corte de origem, por ocasião do
julgamento dos embargos de declaração, assentou que "a[s] alegações de
ilicitude do depoimento pessoal dos réus e de oitiva de testemunha não
arrolada na inicial são novas teses defensivas trazidas em sede de embargos,
o que não é admitido" (fl. 1.792).
Os recorrentes alegam que as supostas nulidades processuais
decorrentes da colheita de depoimento pessoal dos investigados e da oitiva de
testemunhas não arroladas na petição inicial seriam matérias de ordem pública,
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 30
cognoscíveis pelo órgão julgador de ofício ou em razão dos embargos
apresentados.
Quanto ao tema, observo que este Tribunal Superior já decidiu
que "as matérias de ordem pública, nas instâncias ordinárias, podem ser
suscitadas a qualquer tempo, ainda que apenas em âmbito de embargos de
declaração" (ED-REspe 10-62, rei. Min. Laurita Vaz, DJE de 19.2.2014).
Todavia, em decisão mais recente, proferida na análise de
recurso especial em que se alegava omissão de acórdão regional acerca de
matéria dita de ordem pública, a qual fora suscitada apenas em embargos
opostos perante Tribunal Regional Eleitoral, esta Corte assinalou que "a
pretensão de ver apreciada matéria em sede de embargos de declaração
opostos em segundo grau de jurisdição quando ela não foi ventilada em
nenhum momento processual anterior, nem mesmo em sede de defesa ou
no recurso eleitoral, revela quebra do dever processual de cooperação e da
boa-fé Caris. 5° e 6° do Código de Processo Civil)" (REspe 709-48, rei. Min.
Admar Gonzaga, DJE de 16.10.2018, grifo nosso).
Portanto, agiu bem a Corte de origem ao entender pela
inadmissibilidade da inovação de teses recursais em sede de embargos de
declaração.
Além disso, por não ter havido pronunciamento do Tribunal de
origem acerca de tais temas, incide o óbice do verbete sumular 72 do TSE,
pois até "mesmo as matérias de ordem pública necessitam do
prequestionamento para serem analisadas em sede de recurso especial
eleitoral, o que não ocorreu no caso" (AgR-REspe 227-92, rei. Min. Laurita Vaz,
DJE de 24.6.2014).
De qualquer sorte, ressalto que a eventual colheita de
depoimento pessoal do réu em ação de investigação judicial eleitoral não
ensejaria, por si só, a nulidade processual cogitada pelos recorrentes, pois é
necessária a demonstração de efetivo prejuízo decorrente da prática do
referido ato processual.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 31
Acerca do tema, este Tribunal já decidiu que "a ocorrência do
constrangimento ilegal consubstanciado na obrigação do representado de
prestar depoimento pessoal, por si só, não implica nulidade do processo, 'pois
não se pode presumir eventual prejuízo à defesa, mormente se a lei assegura
ao interrogado o direito de permanecer perante o juízo em silêncio - princípio
do nemo tenetur se detegere'" (AgR-REspe 359-32, rei. Min. Aldir Passarinho
Júnior, DJE de 4.8.2010).
Ademais, também já se decidiu que "não há óbice [...] a que o
depoimento pessoal seja prestado, se o investigado consentir com a realização
do ato, o que pode ser de seu interesse" (AgR-RMS 26-41, rei. Min. Luís
Roberto Barroso, DJE de 27.9.2018).
No presente caso, não consta no acórdão regional nenhuma
referência aos depoimentos pessoais que os recorrentes alegam ter prestado
em juízo, havendo menção apenas ao do investigado Cícero Alves Maia, em
relação ao qual nem sequer se alega, nas razões recursais, eventual ausência
de consentimento do referido depoente ou violação ao seu direito de
permanecer em silêncio.
De outra parte, da leitura das razões recursais, verifica-se que,
para chegar à conclusão de que teria ocorrido oitiva de pessoas não indicadas
na petição inicial, os recorrentes fazem "comparação entre o rol de
testemunhas de f/s. 39 e o rol adaptado após despacho judicial" (fl. 1.838) nos
presentes autos, "para se limitar as testemunhas do autor ao máximo legal
(seis testemunhas)" (fl. 1.838).
Todavia, ao embasar a alegação apenas no rol de testemunhas
juntado com a petição inicial destes autos, os recorrentes olvidam que, de
acordo com o acórdão regional, foram apensadas ao presente feito, em virtude
de conexão, a AIJE 713-77.2016.6.26.0261, proposta pela Coligação Juntos
Somos Mais Fortes em desfavor de Cícero Alves Maia, e a AIJE 712-
92.2016.6.26.0261, ajuizada pelamesma coligação em face de Claudecir
Marafon (fl. 1.573).
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 32
Nesse contexto, merece destaque o quanto consignado no
parecer ministerial, segundo o qual "a testemunha Santa Jacques foi arrolada
na petição inicial do processo n° 713-77.2016.6.26.0261 ff/s. 22 do apenso I)"
(fl. 2.044).
Assim, a análise da alegação recursal de que a parte autora da
demanda, ao cumprir determinação judicial para adequar o rol de testemunhas
ao número máximo previsto em lei, teria feito constar da relação dois nomes
que não figuraram na nominata inicial (Maria Lima Melo e Santa Jaques)
demandaria o revolvimento fático-probatório, em contrariedade ao verbete
sumular 24 doTSE.
No que tange ao argumento de dissídio jurisprudência! quanto
ao entendimento de que a nulidade de depoimento pessoal seria matéria de
ordem pública, verifica-se que os recorrentes se cingiram a transcrever trechos
de acórdãos, sem demonstrar a existência de semelhança fática entre os
julgados, de modo que foram desatendidos os requisitos do verbete sumular 28
doTSE.
De qualquer modo, anoto que o aresto indicado como
paradigma (acórdão do TRE/RS nos ED-RC 25-66) não guarda semelhança
fática com o presente caso, pois nele se discutiu a nulidade de interrogatório
em ação penal, por ter sido realizado antes da audiência de instrução,
configurando-se inversão do rito previsto na lei processual penal, ao passo que,
no presente caso, alega-se a nulidade do próprio depoimento pessoal da parte
em ação cível-eleitoral.
Desse modo, não vislumbro as apontadas violações de
dispositivos legais e constitucionais, tampouco dissídio jurisprudencial
quanto ao ponto.
VII - violação ao art. 224, § 3°, do Código Eleitoral - renovação de eleição
e trânsito em julgado da decisão
Os recorrentes alegam que o aresto regional violou o art. 224,
§ 3°, do Código Eleitoral e a Constituição da República ao reconhecer a
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 33
inconstitucionalidade parcial do citado dispositivo legal com base no acórdão
desta Corte proferido nos ED-REspe 139-25, rei. Min. Henrique Neves da Silva,
PSESSem28.11.2016.
Defendem que a norma em questão, segundo a qual eventual
nova eleição ocorrerá após o trânsito em julgado de decisão que cassar o
diploma, é adequada ao texto constitucional vigente, compatibilizando-se com
os valores da soberania popular, da prestação jurisdicional célere e da
independência dos poderes.
Sobre o tema, destaco o teor do acórdão regional
(fls. 1.569-1.572):
[...]
O art. 224, § 3°, do Código Eleitoral, dispõe o seguinte:
Art. 224, § 3°, do Código Eleitoral. "A decisão da Justiça
Eleitoral que importe o indeferimento do registro, a cassação
do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em
pleito majoritário acarreta, após o trânsito em julgado, a
realização de novas eleições, independentemente do número
devotos anulados."
O Tribunal Superior Eleitoral, quando do julgamento dos Embargos
de Declaração no Recurso Especial Eleitoral n° 13925 - Salto de
Jacuí/RS, de relatoria de Ministro Henrique Neves da Silva, publicado
na sessão do dia 28/11/2016, decidiu que "é inconstitucional a
expressão 'após o trânsito em julgado' prevista no § 3° do art. 224 do
Código Eleitoral, conforme redação dada pela Lei 13.165/2015, por
violar a soberania popular, a garantia fundamental da prestação
jurisdicional célere, a independência dos poderes e a legitimidade
exigida para o exercício da representação popular", ou seja, foram
acolhidos, em parte, os embargos de declaração "para declarar,
incidentalmente, a inconstitucionalidade da expressão 'após o
trânsito em julgado' prevista no § 3° do art. 224 do Código Eleitoral".
Apesar de a decisão supra não possuir efeito vinculante, adota-se no
presente caso o entendimento firmado pela Corte Superior Eleitoral,
possibilitando a realização de novas eleições assim que esgotadas
as instâncias ordinárias, sem a necessidade de aguardar o trânsito
em julgado.
É importante colocar, também, que o art. 224, § 3°, do Código
Eleitoral, é perfeitamente aplicável a este caso concreto, uma vez
que há a possibilidade de perda dos mandatos dos candidatos eleitos
no pleito majoritário.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 34
No ponto, anoto que o Supremo Tribunal Federai concluiu em
8.3.2018 a análise da ADI 5.525, da relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso,
julgando-a parcialmente procedente para declarar inconstitucional a locução
"após o trânsito em julgado" contida no 3° do art. 224 do Código Eleitoral, de
modo que a questão foi dirimida em sentido contrário à tese defendida pelos
recorrentes e com efeito vinculante.
Antes disso e conforme consignado no aresto regional, esta
Corte também já decidira pela inconstitucionalidade parcial do § 3° do art. 224
do Código Eleitoral, em específico da expressão "após o trânsito em julgado"
nele contida. Nesse sentido: ED-REspe 139-25, rei. Min. Henrique Neves da
Silva, PSESS em 28.11.2016; AgR-REspe 431-53, rei. Min. Luciana Lóssio,
DJE de 31.3.2017; e AgR-REspe 245-09, rei. Min. Luciana Lóssio, DJE de
9.5.2017.
Assim, o entendimento do Tribunal a quo quanto à matéria está
em consonância com a jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal
Federal, acima citada, razão pela qual incide o verbete sumular 30 do TSE, o
qual "pode ser fundamento utilizado para afastar ambas as hipóteses de
cabimento do recurso especial - por afronta à lei e dissídio jurisprudencial"
(AgR-AI 152-60, rei. Min. Luciana Lóssio, DJE de 27.4.2017).
VIII - mérito
Ultrapassadas as questões preliminares suscitadas, passo à
análise do mérito.
No caso, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo entendeu
que não ficou comprovada a captação ilícita de sufrágio, mas reconheceu a
prática de abuso do poder económico, consistente na distribuição de camisetas
e de cerveja a eleitores, razão pela qual confirmou a cassação dos diplomas de
prefeito e vice-prefeito dos recorrentes e a declaração da sua inelegibilidade
pelo período de oito anos, nos termos do art. 22, XIV, da LC 64/90.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 35
Destaco o teor do acórdão regional (fIs. 1.573-1.602):
O cerne da presente questão está em saber se foram realizadas, de
modo a caracterizar abuso de poder económico e captação ilícita de
sufrágio, as seguintes condutas: I. entrega de camisetas vermelhas,
juntamente com o valor de R$ 50, 00 (cinquenta reais) e da promessa
de pagamento de mais R$ 50,00 (cinquenta reais) no caso de vitória
da chapa ORLANDO PADOVAN/CARLÃO; II. quitação de contas de
água e de luz, bem como compra de medicamentos em troca de
votos; e III. realização, no dia 01/10/2016 (véspera da eleições), de
evento no "Bar do Pedrão" com a distribuição de bebida gratuita à
população.
A) Entrega de camisetas vermelhas, juntamente com o valor de
R$ 50,00 (cinquenta reais) e da promessa de pagamento de mais
R$ 50,00 (cinquenta reais) no caso de vitória da chapa
ORLANDO PADOVAN/CARLÃO.
Analisando os registros fotográficos juntados aos autos, a exemplo
das f Is. 411/455 e 635/653, observa-se que no dia da eleição
(02/10/2016) diversos eleitores de Pirapozinho/SP foram votar
trajando vermelho (cor da chapa ORLANDO PADOVAN/CARLÃO)
ou amarelo (cor da chapa MARCOS BRAMBILA/MARCOS
CAVALLI).
Inclusive na mídia de fl. 654, há vídeo em que o então candidato
MARCOS BRAMBILA pede para seus eleitores irem votar vestidos
de amarelo.
Na busca e apreensão realizada na casa de WALTER BEZAMAT
REMELLI ff/s. 230/235) foi encontrado um recibo da "MEETING
UNIFORMES" Cf/s. 237/238) em nome de ORLANDO PADOVAN,
datado de 28/09/2016, no valor de R$ 11.700,00 (onze mil e
setecentos reais).
No Relatório de Investigação de f Is. 242/250, conste [m] as seguintes
informações:
Após analisar a impressão no recibo e a impressão colhida na
fábrica, chegamos a conclusão que foram feitas pelo mesmo
carimbo, contudo, a impressão do recibo apresenta-se menos
nítida aparentando que foi feita às pressas.
Neste relatório é colocado, também, que CARLOS ALEXANDREFABRIN BOULHOSA, proprietário da "MEETING UNIFORMES",
afirmou ter confeccionado 3 (três) lotes, cada um contendo 300
(trezentas) camisetas vermelhas, a pedido de WALTER BEZAMAT
REMELLI.
Por sua vez, WALTER BEZAMAT REMELLI, em seu depoimento em
juízo (mídia de fl. 1.154), confirmou ter comprado essas camisetas,
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 36
no entanto não reconheceu o recibo de fls. 237/238. Ele afirmou que
adquiriu as blusas atendendo a uma solicitação de CÍCERO ALVES
MAIA, sem o conhecimento de ORLANDO PADOVAN; que, com
relação a essa negociação, não foi emitido recibo; e que o valor total
da transação foi R$ 10.800,00 (dez mil e oitocentos reais), pois cada
peça custou R$ 12,00 (doze reais).
No Relatório de Investigação de fls. 88/97, constam fotos de diversas
camisetas vermelhas, todas no mesmo padrão. Algumas dessas
camisetas foram apresentadas na Delegacia por MARCILIO MELO
DOS SANTOS (2 camisetas), ROSAL/NA ALBINO DE BARROS
(1 camiseta), ELIEGE CRISTINA DE BARROS (1 camiseta), MARIA
LÚCIA BARROS (1 camiseta) e pelo advogado ROGÉRIO
LEANDRO FERREIRA (3 camisetas), e outras, foram apreendidas
nas residências de JOSIANE DOS SANTOS (6 camisetas) e de
DERCILIA APARECIDA VIEIRA (3 camisetas), no carro de CARLOS
EDUARDO MARTINS COLNAGO (2 camisetas) e na propriedade de
CÍCERO ALVES MAIA (25 camisetas).
Nesse relatório também está a foto da camiseta que DERCILIA
APARECIDA VIEIRA usou no dia da eleição e que foi apreendida
nessa ocasião.
CÍCERO ALVES MAIA, em seu depoimento pessoal (mídia de
fl. 1.154), negou a versão de WALTER BEZAMAT REMELLI, e disse
que as 25 (vinte e cinco) camisetas encontradas na sua propriedade
foram compradas por ele, sem nota fiscal.
No Relatório de Investigação de fls. 1.011/1.021, pode-se ver que
houve conversas, via aplicativo WhatsApp, nas quais CLAUDECIR
MARRAFON e ELEONA DE CAMPOS NEVES pedem a
ROSÂNGELA FRANCISCA MARTINÊS, esposa de ANTÓNIO
CARLOS COLNAGO, camisetas.
Na residência de JOSIANE DOS SANTOS (relatório de investigação
de fls. 307/318), foi encontrada uma lista com nomes de diversas
pessoas, e os respectivos números de RG, CPF e título de eleitor.
Na casa e no comércio de CÍCERO ALVES MAIA (relatório de
fls. 345/388), foram encontradas diversas listas, algumas com nomes
de pessoas associados a valores, outras com nomes de eleitores e
os respectivos números de RG, CPF e título de eleitor.
Já na residência de CLAUDECIR MARAFON (relatório de
fls. 389/398), foram apreendidas lista com nomes de eleitores,
acompanhados dos números dos títulos, e relação de cabos
eleitorais.
Na casa de ILDA JAQUES (relatório de fls. 399/408), foi encontrada
relação com nomes associados a valores, essas pessoas,
supostamente, teriam sido arregimentadas para trabalhar na
campanha de CÍCERO ALVES MAIA e de ORLANDO PADOVAN/
CARLÃO.
Em sede policial, MIKAELE ANDREIA DA SILVA LOIOLA (fl. 47),
MARIA LÚCIA BARROS (fls. 48/49), ELIEGE CRISTINA DE
BARROS (fls. 50/51) e ROSALINA ALBINO DE BARROS (fl. 52)
afirmaram que receberam camisetas vermelhas para serem usadas
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 37
no dia da eleição, juntamente com o valor de R$ 50,00 (cinquenta
reais), em troca do voto na chapa ORLANDO PADOVAN/CARLÃO,
e que lhes foram prometidos mais R$ 50,00 (cinquenta reais) no caso
de vitória.
ISABELE CRISTINA LUCAS ff/s. 319/320) narrou que foi procurada
por "NALDO", candidato a vereador, para trabalhar nas eleições, no
entanto não recebeu nenhuma camiseta, tampouco lhe foi oferecido
qualquer valor; que ela forneceu os dados do seu título de eleitor; e
que, apesar de não ter havido pedido expresso, para ela, ficou claro
que a intenção era pagar pelo seu voto. Nesse mesmo sentido foi o
depoimento de CRISLEINE CRISTINA MAGALHÃES SOUZA (fls.
322/323).
M ARA MICHELE DA SILVA CARVALHO (fl. 321) disse que foi ao
comité no intuito fornecer o seu nome e o de seu marido (ALEX DA
SILVA) para trabalhar nas eleições, mas, ao invés disso, a cada um
deles foi oferecido o valor de R$ 50,00 (cinquenta reais) para votar
em ORLANDO PADOVAN/CARLÃO e no "CÍCERO DA
RODOVIÁRIA" (CÍCERO ALVES MAIA).
Com relação aos depoimentos de VANETE DE OLIVEIRA MARTINS,
SELVA DE OLIVEIRA MARTINS, EDNA DE OLIVEIRA SOARES e
ELIANA OLIVEIRA DA SILVA ANADÃO (fls. 986/993), é interessante
transcrever trecho da sentença ora recorrida:
"- VANETE DE OLIVEIRA MARTINS: Disse que forneceu seus
dados para sua tia, ELIANA, que a contratou para trabalhar
como cabo eleitoral do requerido Claudecir, pela quantia de
R$ 50,00, e que, além do dinheiro, recebeu uma camiseta
vermelha para trabalhar no dia das eleições, circulando com
ela.
- SELAVA /s/c/ DE OLIVEIRA MARTINS: Contou que sua irmã,
ELIANA, pediu os seus dados para que seu genro, Renato,
trabalhasse nas eleições em prol do candidato Claudecir, e
que recebeu uma camiseta vermelha para trabalhar no dia das
eleições.
- EDNA DE OLIVEIRA SOARES: Discorreu que trabalhou nas
eleições para o requerido Claudecir, e entregou os números
de títulos eleitorais de familiares (Selva, Vanete, Francisco,
Tatiana, Edna e Marcos) para Claudecir. Negou que ele
tivesse distribuído camisetas, mas afirmou que, após as
eleições, Claudecir foi até o bairro para pagar as pessoas que
tinham trabalhado para ele, entregando R$ 50,00 para
VANETE e para o marido da depoente.
- ELIANA OLIVEIRA DA SILVA ANADÃO: Expôs que trabalhou
nas eleições pedindo votos para os requeridos Claudecir e
Orlando, e entregou os números de títulos eleitorais de
familiares (SELVA, VANETE, Francisco, Tatiana) para EDNA,
que os repassou para, Claudecir Disse que ficou sabendo que
SELVA e VANETE receberiam R$ 50,00."
Contudo, é importante salientar que esses depoimentos colhidos em
sede policial não foram ratificados em juízo, sob o crivo do
contraditório.
REspe n° 626-24.2016.6.26.0261/SP 38
Ouvida em juízo como testemunha, MARIA ILMA MELO, mãe de
MARCÍLIO MELO DOS SANTOS (mídia de fl. 1.154), em depoimento
confuso, relatou que foi até a rodoviária procurar "C/D/A TUBALDINI",
já que tinha interesse em trabalhar na eleição; que, como não
encontrou "CIDA TUBALDINI", informou o seu nome e o de seu filho,
bem como os números dos seus títulos de eleitor a "Joni", filho de
CÍCERO ALVES MAIA; que foi acordado que ela receberia R$ 50,00
(cinquenta reais) logo após a votação e, como contrapartida, teria
que trabalhar pedindo votos para CÍCERO ALVES MAIA no dia da
eleição; que nessa ocasião lhe foi dito que com o número do título
era possível aferir se o eleitor votou em CÍCERO ALVES MAIA, já
que dava para saber o número de votos recebidos em cada seção
eleitoral; que o valor de R$ 50,00 (cinquenta reais) não foi pago
espontaneamente após as eleições, tendo ela, inclusive, entrado em
contato telefónico com CÍCERO ALVES MAIA; que o filho dela, o
qual é especial e toma remédio controlado, foi até a rodoviária
nervoso cobrar o dinheiro, e, por conta disso, foram entregues a ele
R$ 50,00 (cinquenta reais); e que não trabalhou para ninguém no dia
da eleição, apenas vendeu suco em frente a um dos locais de
votação.
MARIA ILMA MELO também informou que na véspera da eleição
ANTÓNIO CARLOS COLNAGO ("CARLÃO") e CÍCERO ALVES
MAIA foram até a sua casa e entregaram a ela 2 (duas) camisetas
vermelhas, uma para ela e outra para o seu filho, e disseram que ela
receberia R$ 100,00 (cem reais) logo após a eleição caso votasse na
chapa ORLANDO PADOVAN/CARLÃO, mas que essa quantia
jamais foi paga.
Em audiência, foi confirmado que o número do celular da testemunha
MARIA ILMA MELO é o mesmo que consta ao lado do seu nome na
lista de "CIDA TUBALDINI" (fl. 365), apreendida nas buscas
realizadas na casa e no comércio de CÍCERO ALVES MAIA.
SANTA JAQUES, irmã de ILDA JAQUES, foi ouvida como
testemunha (mídia de fl. 1.154), apesar de ter declarado não falar
com ANTÓNIO CARLOS COLNAGO há aproximadamente 10 (dez)
anos, em razão de um desentendimento entre eles, e de ter apoiado
a chapa MARCOS BRAMBILA/MARCOS CAVALLI. Segundo ela,
sua irmã ILDA JAQUES colaborou com a campanha de ORLANDO
PADOVAN e ANTÓNIO CARLOS COLNAGO, arregimentando

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