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Anna Carolina Miarelli Colombo RECUPERAÇÃO JUDICIAL EM TEMPOS DE COVID 19 EM SOCIEDADES NÃO EMPRESÁRIAS: O CASO DA UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES NOVA LIMA FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS 2020 RECUPERAÇÃO JUDICIAL EM TEMPOS DE COVID 19 EM SOCIEDADES NÃO EMPRESÁRIAS: O CASO UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES Resumo: O tema envolvendo a recuperação judicial é objeto de estudos e pesquisas que remontam há muito tempo, porém, com uma nova perspectiva envolvendo o período em que o país se encontra, em meio à pandemia do novo coronavírus, e a atual calamidade pública, as questões envolvendo o tema pedem maior atenção e estudo. Tem-se como objetivos para esta pesquisa conhecer a Lei 11.101/05 e suas conjunturas junto à sociedade não empresária, identificar os impactos causados pela pandemia do novo coronavírus, visto o estado de calamidade vigente e a recuperação judicial e o caso envolvendo pessoa jurídica não empresária julgado durante período de pandemia pelo coronavírus. A metodologia adotada foi o levantamento bibliográfico. Concluiu-se o juiz que proferiu a sentença do processo da Universidade Cândido Mendes, sociedade sem fins lucrativos, ou seja, não se trata de sociedade empresária, se ateu ao momento em que estamos vivenciando, mas não seguiu as disposições legais exigidas pela Lei 11.101/05. Palavras-chave: Recuperação Judicial. Cândido Mendes. Covid-19. Data de submissão: 00/00/0000 – Data de aprovação: 00/00/0000 – Data de publicação: 00/00/0000 1 INTRODUÇÃO O tema envolvendo a recuperação judicial é objeto de estudos e pesquisas que remontam há muito tempo, porém, com uma nova perspectiva envolvendo o período em que o país se encontra, em meio à pandemia do novo coronavírus, e o atual momento em que se encontra o país em meio á restrições e evitando aglomerações, as questões envolvendo o tema pedem maior atenção e estudo. A recuperação judicial de pessoas jurídicas não empresárias é um tema bastante abrangente e remete a questões jurídicas de ampla discussão, porém, em meio ao período de restrições causadas pela pandemia do novo coronavírus, foi necessária a adaptação à situação em que as pessoas jurídicas se encontram, com a adoção de iniciativas que substituem durante o período, por exemplo, os encontros presenciais das Assembleias Gerais de Credores, por encontros virtuais ou até mesmo pelo adiamento da mesma. Desta forma, tem-se como objetivos para esta pesquisa conhecer a Lei 11.101/05 e suas conjunturas junto à pessoa jurídica não empresária, identificar os impactos causados pela pandemia do novo coronavírus, visto o estado de calamidade vigente e a recuperação judicial e o caso envolvendo pessoa jurídica não empresária julgado durante período de pandemia pelo coronavírus. Ao abordar a temática será possível conhecer as situações envolvendo as discussões da recuperação judicial de sociedade não empresária e a partir daí contribuir para que o tema possa ser difundido, instigando mais pesquisas e trabalhos que aprofundem a temática envolvida envolvendo o meio jurídico á uma temática nova que está em construção e em ação no país. 2 LEI 11.101/05 E A RECUPERAÇÃO JUDICIAL No ano de 2005, após anos de espera e tramitações, entrou em vigor em 08 de junho a Lei 11.101 que passou a dispor sobre a recuperação extrajudicial e judicial de empresas, assim como a falência, tal lei implica em meios de recuperação das empresas que se encontram em períodos delicados financeiramente. (SALOMÃO E SANTOS, 2012). A partir desta data ficou revogado o então Decreto-Lei 7.661/1945, “reforçou bastante o aspecto judicial da falência e da concordata, proibindo a moratória amigável; Eliminou a natureza contratual da concordata; diminuiu a influência dos credores, concentrando poderes nas mãos do juiz.” O Decreto- Lei 7.661/1945, passou a vigorar no Brasil durante o Estado Novo, assim como exposto por Cardoso (2005, p.06): Com o advento do Estado Novo, consequentemente, houve a reforma deste pelo Decreto-lei n° 7.661 de 21 de junho de 1945cujo objetivo era o de ajustar a legislação nacional à politica de fortalecimento dos poderes do Estado. Uma das principais mudanças no ordenamento jurídico, introduzido por esta reforma, foi a concessão das concordatas preventivas e suspensivas pelo Estado, por intermédio do juiz, aos devedores infelizes e honestos, independentemente da concordância dos credores. Um ponto a ser considerado pelo Decreto-Lei 7.661/1945, configura-se no emprego da concordata que era vista como uma das condições para a recuperação das sociedades empresárias, a respeito das concordatas Cardoso (2005, p.41) explica: São, portanto, as condições gerais para obter a concessão da concordata: regularidade no exercicio do comércio, ou seja, sociedade empresária, para ter direito à concordata, deve ter os seus atos constitutivos registrados no registro de empresas (Junta Comercial) e os seus livros devidamente autenticados, nos termos do art. 140, inciso l, da LF de 1945; não ter titulo vencido há mais de 30 dias, em decorrência dos mandamentos do pedido de autofalência, ou ter a sua falência requerida neste prazo, conforme art. 140, ll; não ter impetrado concordata nos 5 anos anteriores, art. 140, IV; estar quite com o fisco e a Seguridade Social, segundo rezam os arts. 191 do CTN e art. 95, §2°, alínea e, da Lei n.° 8.212/91, respectivamente. m No direito falimentar normalizado pelo Decreto-lei n.° 7.661/45 há duas espécies de concordata: a que suspende a falência - concordata suspensiva - e a que previne o estado falimentar - concordata preventiva Esse mecanismo viria a muda somente a partir de 2005, quando a Lei n.º 11.101/2005, que revogou o antigo Decreto-Lei 7.661/1945. Diante das necessidades de adequação ao novo modelo econômico industrial, o então Decreto-Lei de 1945, passou a não estar dentro dos novos paradigmas judiciais e nos novos formatos de organização industrial e econômica. Pimenta (2006, p.152), afirma que: Dentre várias significativas alterações, esta nova legislação concursal introduz em nosso ordenamento os institutos da recuperação judicial e extrajudicial de empresas, elaborados sob a premissa da preservação da unidade econômica em dificuldades momentâneas. É importante notar que como condição para que a sociedade empresária possa estar em conformidade com a mesma o período de problema financeiro há de ser momentâneo, ou seja, quando há como o empresário reverter o quadro em que sua instituição se encontre, através do plano de recuperação da empresa. Outro ponto importante no meio jurídico foi a alteração em termos jurídicos e até mesmo a extinção de alguns pontos como aconteceu com a concordata e a continuação dos negócios pelo falido, pontos que eram permitidos com o antigo Decreto-Lei de 1945. (SALOMÃO E SANTOS, 2012). De acordo com os autores acima citados, a Lei 11.101/05: Alterou conceitos e termos jurídicos, extinguindo a concordata e a continuação dos negócios pelo falido, como previsto no revogado Decreto-Lei 7.661/1945. Introduziu a recuperação extrajudicial e judicial de empresas, modificando radicalmente o sistema falimentar então vigente. Porém, foi mantida a dualidade para os procedimentos, em sendo o devedor insolvente um empresário e outro não empresário. Em relação a este, de natureza civil, o sistema é o da insolvência (Código de Processo Civil, art. 748 e seguintes). No tocante àquele que exerce atividade empresária, aplica-se a lei em comento.(SALOMÃO E SANTOS, 2012, p.07). Desta forma, as novas conotações trouxeram em ascensão um novo modelo de intervenção jurídica dentro das empresas, porém, não deixando de lado a responsabilidades do empresário em prol da solução para com os problemas financeiros e a recuperação de sua empresa.Vale lembrar que : O instituto da recuperação de empresas, tanto sob a forma judicial quanto extrajudicial, representa a solução legalmente estipulada para tentar manter em funcionamento as empresas em dificuldades econômicas temporárias e, por meio desta medida, assegurar os empregos existentes e os interesses de terceiros como credores, consumidores e o próprio Fisco. (PIMENTA, 2006,p.153). Assim, o instituto de recuperação de empresas é uma medida provisória, onde vale ressaltar que “não cabe ao Poder Judiciário a tarefa de reelaborar a atividade do empresário individual ou sociedade empresária em crise”, ao judiciário cabe acompanhar e aplicar ao empresário os mecanismos legais para que este consiga recuperar a estabilidade financeira de sua empresa e mantê-la produtiva em seu meio. (PIMENTA, 2006, p.153). Desta forma, a Lei 11.101/2005, consegue manter em funcionamento através de mecanismos legais autorizados pelo judiciário, a empresa e os empregos de funcionários e a função social da mesma. 3 OS IMPACTOS DA PANDEMIA COVID-19 FRENTE A RECUPERAÇÃO JUDICIAL O ano de 2020 trouxe grandes impactos e mudanças para a sociedade como um todo. No tocante ao setor jurídico, os impactos não foram diferentes; mudanças em visões e alterações em situações jurídicas acabaram por ocasionar debates e mudanças no contexto. Borges (2020,p.02), afirma que “Nesse contexto, é necessário que a “caixa de ferramentas” jurídicas disponíveis para o empresariado esteja clara e disponível, motivo pelo qual passamos a expor algumas delas como alternativas plenamente viáveis, caso sejam bem orientadas.” Essa “caixa de ferramentas” jurídicas acaba por estar em desenvolvimento e necessitando se adaptar e encontrar soluções juridicamente corretas que deem suporte aos mais variados setores da sociedade. A pandemia devido ao covid-19 obrigou o Brasil, assim como praticamente todos os países do globo terrestre, a restringir atividades e ações e assim, acabou por abalar a economia em todas as instituições de ensino. Essa defasagem da economia fez com que algumas ferramentas jurídicas acabassem por se tornar essenciais para a manutenção de certas atividades, porém, trouxe consigo vários impasses e tomadas de decisões que foram revistas e executadas no meio jurídico. (ANDRADE e PAULA, 2020). A atual crise desencadeada pela pandemia gerou “Lojas fechadas compulsoriamente, setor de serviços esvaziado e um desestímulo flagrante do consumo fazem com que o cenário em que alguns contratos foram anteriormente firmados mudasse drasticamente.” (BORGES, 2020,p. 02). Desta forma, o incentivo a solução de problemas envolvendo as rupturas contratuais é incentivado através de métodos alternativos de solução de conflitos, porém há se ter cautela no uso de ferramentas que visem juridicamente a solução para estes casos, assim, como explicado por Borges ( 2020,p. 02): Mas se por um lado há amplo incentivo a essa primeira ferramenta, por outro falta uma gestão estratégica para renegociação de contratos. É preciso não se perder de vista que uma repactuação em tempos de pandemia já abordará inequivocamente a premissa da crise, ou seja, cria-se a expectativa de que os contratantes já calcularam impactos e possíveis cenários desfavoráveis para estabelecer as novas relações contratuais. Sem dúvidas, referido argumento será utilizado em disputas judiciais. Assim, é necessário que alguns cuidados sejam tomados, com o intuito de garantir a legalidade das ações a serem tomadas. Com o intuito de assegurar a segurança e legalidade dos processos, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), estabeleceu algumas orientações que tem como objetivo maior garantir “aos juízos com competência para julgamento de ações de recuperação judicial em decorrência dos impactos dos econômicos do covid-19” maior cuidado e legalidade (ANDRADE e PAULA, 2020), tais orientações foram dispostas em uma Resolução, que dispõe sobre essas orientações e recomendações de caráter judicial especial diante da pandemia de covid-19. 3.1 O que diz a RESOLUÇÃO Nº 63/2020 – CNJ As orientações dispostas pelo CNJ foram divulgadas pelo órgão sob uma Resolução editada em 31 de março de 2020, onde o mesmo expõe de forma bastante clara e objetiva sobre os caminhos, a serem tomados juridicamente em relação ao tratamento da recuperação judicial diante a situação de emergência desencadeada pela pandemia causada pelo covid- 19.(ASSIS, BRADÃO e PIMENTA 2020). A primeira orientação diz respeito diretamente a “prioridade na análise e decisão sobre questões relativas ao levantamento de valores em favor de credores ou empresas recuperandas”, ou seja, essa premissa tem por objetivo maior ajudar a manter o funcionamento das empresas que estão em processo de recuperação judicial: “O plano aprovado, em um momento preliminar, se posta agora ante um cenário diverso e imprevisível, sendo indiscutivelmente necessário rediscutir em juízo eventuais repactuações, ressalvados os direitos e o tratamento igualitário aos credores.” .(ASSIS, BRADÃO e PIMENTA 2020). A segunda premissa do CNJ diz respeito a suspensão da realização das Assembleias Gerais de credores por meio presencial, ou seja, não é necessário um encontro presencial durante as assembleias sendo permitido a realização da mesma através de meios virtuais. (ANDRADE e PAULA, 2020). A terceira orientação, segundo Assis, Bradão e Pimenta (2020, p.454): Está dentro das sugestões do CNJ, adicionalmente, a prorrogação do prazo de duração da suspensão (stay period) até a realização da AGC, quando necessário seu adiamento. A suspensão se dará até o momento que seja possível deliberar acerca da homologação do resultado desta AGC. Tal orientação traz embasamento para que a realização das AGC (Assembleias Gerais de Credores) por meio virtual, adiamento das AGCs, bem como a suspensão da realização das mesmas, dando prioridade para homologação do resultado da referida AGC. A quarta orientação do CNJ estabelece “Autorizar que todas as empresas que já estejam em fase de cumprimento do plano de recuperação, aprovado pelos credores, em prazo razoável, apresentem planos modificativos,”, porém, vale lembrar que tal empresa tem de estar “adimplentes com suas obrigações” estando em condições aptas para que possam realizar as mudanças necessárias em seus planos. (ANDRADE e PAULA, 2020). A orientação de número 5 estabelecida pelo CNJ, de acordo com Assis, Bradão e Pimenta (2020, p.454): (...) que os juízos determinem a continuidade das atividades de fiscalização por parte dos administradores judiciais, mas de forma virtual ou remota. A divulgação dos relatórios mensais de atividades deverá ser feita nas respectivas páginas da internet (CNJ, 2020). Não seria prudente medida diversa, uma vez que este é o momento em que a fiscalização e atuação do administrador judicial se fará mais necessária. Vive- se um contexto de crise a ser agravada pela pandemia, sendo possível inferir que as empresas em recuperação sofrerão mais do que as demais, tendo em vista já estarem em crise. Por fim, o órgão recomenda que ao realizarem análises acerca de “medidas de urgência, despejo por falta de pagamento e atos executivos de natureza patrimonial em ações judiciais que demandem obrigações inadimplidas durante o estado de calamidade pública” os juízes sejam cautelosos, não esquecendo-se do Decreto Legislativo de nº 6 de 20 de março de 2020, onde fica estabelecido o estado de calamidade me saúde pública vigente no país. ASSIS, BRADÃO e PIMENTA (2020). A este respeito, Colombo e Marques (2020, p. 40), explicam: (...) o CNJ recomendou que os magistrados adotem medidas como (i) priorizar decisões sobre levantamento de valores; (ii) suspender assembleias gerais de credores presenciais e, quando necessário, autorizar a realização de reuniões virtuais; (iii) prorrogar prazo de suspensão de açõese execuções (stay period) quando houver a necessidade de adiamento da assembleia geral de credores; (iv) analisar se é o caso de autorizar a apresentação de plano de recuperação modificativo dadas algumas circunstâncias; (v) considerar a ocorrência de força maior ou de caso fortuito para relativizar a convolação da recuperação judicial em falência em decorrência do descumprimento de plano de recuperação judicial; e (vi) avaliar com cautela o deferimento de medidas de urgência, despejo por falta de pagamento e atos executivos de natureza patrimonial em ações judiciais relativas inadimplementos durante o estado de calamidade pública. A partir das mudanças necessárias durante o período da pandemia causada pelo covid- 19, o meio jurídico passa por alterações que acabam por deixar lacunas entre o que diz a lei de recuperação judicial e as novas possibilidades de julgamento e trâmites do processo de recuperação. É possível observar que o CNJ se preocupou em estabelecer tais diretrizes de modo a orientar e fazer possível a compreensão jurídica diante da necessidade extraordinária e urgente nos casos envolvendo a recuperação jurídica durante o período envolvendo a pandemia causada pelo covid-19. 4. O CASO CÂNDIDO MENDES A Associação Sociedade Brasileira de Instrução - ASBI e Instituto Cândido Mendes refere-se a uma universidade de cunho privado fundada no país no ano de 1902. Seu histórico sempre se referiu em uma instituição de ensino. Ao longo dos anos, a instituição acabou por contrair dívidas, se vendo diante de um inevitável fechamento. Com o intuito de se reerguer, a instituição colocou em processo junto ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), assim como explanado pelo próprio processo montado pela Instituição junto ao Tribunal de Justiça: Em decorrência de dificuldades oriundas das conjunturas de mudanças políticas na área de educação, além da recente e notória retração na economia nacional, que redundou na sua instabilidade econômico-financeira, tudo, agora, foi agravado pela pandemia do Covid-19, um evento inédito, imprevisto e imprevisível para a nossa geração, de magnitude avassaladora, cujos efeitos, nefastos e imensuráveis, não são por ninguém ignorados e impactaram especialmente o setor de ensino. Por tais razões, as requerentes se viram mergulhadas numa crise financeira de grande vulto, devedoras de cerca de 400 milhões de reais, pelo que, vêm ao Judiciário pleitear a chance de apresentarem um plano de reorganização visando o seu soerguimento. ( Mauro, MM. Juiz, 2020, p.111). Observa-se que, a instituição afirma que a crise financeira na qual se encontra instaurada agravou-se diante da pandemia de Covid-19, segundo a qual, o fechamento de atividades não essenciais, bem como a suspensão de aulas e atividades presenciais deixaram a instituição diante do agravamento da crise econômica na qual a mesma já se encontrava inserida. Ao requerer a Recuperação Judicial da Instituição, a mesma o fez com pedido de base na Lei nº 11.101/2005, onde encontra-se disposto: Art. 1º Esta Lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor. Art. 2º Esta Lei não se aplica a: I – empresa pública e sociedade de economia mista; II – instituição financeira pública ou privada, cooperativa de crédito, consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano de assistência à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas às anteriores. (Grifo nosso) Vale ressaltar que a referida Lei Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, a mesma não faz quaisquer menções á instituições públicas ou ainda sociedades não empresarias. Diante do exposto pela instituição junto ao TJ/RJ, o juiz deferiu em favor da instituição, a colocando em processo de Recuperação Judicial, onde o mesmo assimila: É certo que o art. 1° da Lei n° 11.101/2005, se refere à recuperação judicial, à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária, e que o art. 2°, nos seus incisos I e II, expressamente exclui da abrangência da lei as entidades que elenca, entre as quais não consta associação de ensino. ( Mauro, MM. Juiz, 2020, p.111). Mesmo com a ciência do não enquadramento da Instituição Cândido Mendes enquanto sociedade empresária pela Lei no 11.101/2005, o Tribunal de Justiça RJ decide por aceitar o pedido de Recuperação, explanando: Assim, a menos que se estenda à associação civil de ensino a proibição genérica oriunda da sua não inclusão no art. 1°, é forçoso concluir não existir na lei vedação ao deferimento de recuperação judicial às instituições ora requerentes. Na ponderação da Análise Econômica do Direito, o juiz, ao aplicar o ordenamento jurídico, deve atentar para os fins sociais e para as exigências do bem comum, "resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a razoabilidade e a eficiência", tal como preconiza o art. 8º do CPC. Com efeito, a associação de ensino não é objetivamente excluída por nenhum dos artigos da LRF; apenas por dedução e interpretação contrariu sensu, é que se poderia extrair tal ilação do art. 1º. Porém, quando o legislador pretendeu excluir diretamente, elencou as pessoas jurídicas nos dois incisos do art. 2º. Não há, portanto, como estender à associação civil a proibição expressa contida no art. 2º e seus incisos, vedada a possibilidade de ampliação da interpretação das normais legais restritivas. É fundamental, ademais, cotejar a interpretação de tais normas (arts. 1º e 2º) com o princípio insculpido no art. 47 da LRF, o da preservação da empresa, que considera não a natureza formal da pessoa jurídica, mas a sua função econômica e social enquanto fonte produtora de riquezas. ( Mauro, MM. Juiz, 2020, p.111). Com esta prerrogativa, a instituição dá início ao processo de Recuperação Judicial, com respaldo na decisão tomada pelo TJ-RJ, mesmo não sendo enquadrada na Lei como sociedade empresária, mas sim como entidade sem fins lucrativos em que em nenhum momento é citado na Lei 11.101/2005. O argumento utilizado pelo advogado da Universidade é de que a finalidade da Lei de Recuperação Judicial é a de preservar a empresa, qualquer que seja a sua natureza, pelo seu caráter de produzir riqueza e gerar empregos, estimulando a atividade econômica. (LUNA, 2020). Ainda podemos destacar que a justificativa da juíza ao proferir a decisão foi em desacordo com a Lei e utilizando argumentos de teor emocional. Veja-se: Uma associação histórica, tendo em vista o lapso temporal em que atua no mercado, não teria o direito de tentar uma recuperação antes de decretar sua falência? Como se sabe, a recuperação é o caminho, como o próprio nome já diz, que busca de todas as formas, recuperar por meio de um plano, suas economias, com o escopo de superar uma crise. O fato de visar uma recuperação por todos os meios, embora o caso concreto incida sobre uma associação, o que se observa-se no contento, é a aplicação do princípio da preservação da empresa, o qual foca em preservar a empresa por qualquer meio, seja mudando o sócio, por meio de planejamentos, ou visando melhorias, frisando-se que o essencial é a preservação. No caso em questão, é notório o intuito de preservar a associação, a qual contribui até mesmo economicamente para a coletividade. Logo, busca preservar a atividade, causando o mínimo de impacto social, sendo assim, o princípio da preservação da empresa, seria incidente até mesmo para o caso da associação, trocando apenas a última denominação, mas fixando o enfoque do princípio, sendo portanto, o princípio da preservação da associação, a qual tem relevância para o mercado, e seria submetidaao processo de falência para que fosse preservada a qualquer custo, e mantida para que o todo não seja prejudicado e ela permaneça no mercado. (MORAES, 2020, p.03). Não existem dúvidas nem discussões dispondo de inconstitucionalidade da Lei Falimentar, diante disso, ao proferir a decisão o juízo competente não utilizou dos critérios obrigatórios dispostos no interim da disposição legal, em que deixa claro e evidente que associação sem fins lucrativos nem instituições podem ser objeto de Recuperação Judicial. Ademais, visando a situação narrada em todo teor deste artigo, entende-se que o atual cenário foi um fator importante para a decisão, porém não deve ser utilizado como respaldo pois contraria a legislação aplicável, o que pode acarretar em uma descompensação do judiciário brasileiro, por não haver segurança jurídica nas decisões acerca de uma lei vigente. O processo foi remetido ao Tribunal Justiça para ser analisado pelos Desembargadores, sendo repassado ao duplo grau de jurisdição, por ter havido Recurso pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, que respaldou seu Recurso propriamente na Lei, arguindo que seja negado provimento ao pedido da Universidade e, além disso, que fosse nomeado Administrador Judicial pelo Juízo para acompanhar a Recuperação caso fosse confirmada. O Recurso apresentado foi provido em parte apenas para acatar a nomeação de Administrador, no que pese o argumento de não ser acatada a Recuperação foi denegado. Sendo assim, o entendimento do MM. Juíza, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro foi endossado pelos Desembargadores da 6ª Câmera Cível dispondo no teor do Acórdão, de acordo com matéria divulgada pela Revista Consultor Jurídico (2020, p. 01): (...) a finalidade maior da Lei de Recuperação Judicial é a de preservar a empresa, qualquer que seja a sua natureza, como fonte produtora de riquezas, o emprego dos trabalhadores, o interesse dos credores, sua função social e o estímulo da atividade econômica. (...) Assim, sob o fundamento do princípio da preservação da empresa, por se tratar de atividade preponderante, que, embora não distribua lucro entre seus associados, gera imensa riqueza para o meio social, comprovando assim seu caráter econômico, deve- se permitir o deferimento do processamento da recuperação judicial desde que comprovado mais de dois anos de efetivo exercício da atividade educacional, o que para o requerente é público e notório. Por fim, merece reparo a decisão impugnada, quanto à nomeação do Administrador Judicial, que, segundo o provimento, é jurista renomado, de notório saber jurídico e especialista na matéria empresarial, com marcante atuação em processos de recuperação judicial perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, onde está cadastrado. A decisão acima elencada, proferida pelo acórdão da 6ª Câmara Cível do TJRJ no dia 02/09/2020. Após a decisão, foram opostos Embargos de Declaração Infringentes pelo MPRJ, sustentando que houve contradição no Acórdão proferido ao tratar da parte autora do processo como Associações, e ao mesmo tempo a caracteriza como empresa, ao determinar a sua Recuperação Judicial. Alega ainda que, não há possibilidade de uma entidade ser considerada ao mesmo tempo Empresa e Associação, tornando a decisão contrariam em seu teor. Ainda alegou a existência de omissões, e utilizando o referido recurso como Pré-questionamento Explícito. ( Revista Consultor Jurídico, 2020). Ainda, apenas para fins informativos, não sendo de interesse ao artigo elaborado, houve o ingresso do Banco do Brasil S.A. e de Ricardo Hasson Sayeg, como terceiros interessados, apresentando também embargos à decisão proferida pela 6ª Câmara. A agravada apresentou Contrarrazões aos Embargos apresentados, e dando prosseguimento o processo foi incluído em pauta de julgamento presencial por vídeo conferência. Diante disso, o processo se encontra em andamento até o presente momento, para julgamento dos ED’s interpostos. 4.1. IMPACTOS DA DECISÃO A decisão deferindo a Recuperação Judicial da Universidade Cândido Mendes, é uma alteração expressiva na legislação atual. Mesmo que de forma implícita, a Juíza e os Desembargadores que deferiram o pedido de Recuperação, acabaram ultrapassando o limite do seu poder. De acordo com o princípio de Montesquieu a Separação dos Poderes, Executivo, Legislativo, e Judiciário, não devem ultrapassar seus limites. Sendo assim, os executores do poder judiciário, não devem extrapolar o poder que lhe é conferido, então devem apenas cumprir o seu objetivo de julgar, não devendo legislar sobre matéria já consolidada, a única possibilidade é de modular a legislação, e não modifica-la, como ocorreu no caso em questão. Ainda assim, é inquestionável que a atuação do Poder Legislativo muitas vezes deixa a desejar e propicia para a atuação do Judiciário em casos que não é de sua competência. No entanto, de tanto o Judiciário questionar e legislar as normas, o que era para ser de competência atípica, hoje estar se tornando cada vez mais típicas, mais rotineiras que o próprio exercício do Poder Legislativo. É preciso que os limites impostos pela Constituição sejam respeitados, pois mesmo sendo uma forma de desenvolvimento do Poder Judiciário visando atender as necessidades da sociedade, o mesmo se não limitado poderá atentar contra o princípio da Separação dos Poderes que tanto visa proteger. (ARAÚJO, 2016). 4.2. ALTERAÇÃO DA LEI 11.101/04 A Lei 11.101/04 que versa sobre a Recuperação Judicial, foi modificada instantaneamente, com a decisão proferida pelo TJRJ e confirmada pela 6ª Câmara Cível TJRJ. Mesmo a decisão sendo passível de modificações, cria-se uma lacuna para que a Lei já consolidada, que passou por todas as suas etapas de aprovação, seja contestada. Uma lei promulgada torna-se absoluta até o momento de suas possíveis modulações, que são as jurisprudências aplicando melhor a Lei no caso concreto. Ocorre que no caso em questão, não houve adequação ao caso, e sim modificação da lei. 5. CONCLUSÃO Diante do exposto, torna-se indiscutível que o juiz que proferiu a sentença do processo da Cândido Mendes, sociedade sem fins lucrativos, ou seja, utilizou de respaldo a atual situação que o mundo vivencia, porém não se ateve a Legislação vigente, no caso pela Lei 11.101/05. Ocorre que, a Recuperação Judicial é emanada de requisitos, pois trata-se de um processo que “escolhe” os credores que terão preferência para receber o que lhe é devido, sendo assim, a Lei de Falência exige que os falidos em recuperação sejam sociedades empresárias, não devendo ser deferido o pedido de Recuperação Judicial, pois não se enquadra nos requisitos obrigatórios para a concessão da Recuperação. A decisão em questão abre um lapso para que seja deferido pedidos de sociedades não empresárias, o que pode acarretar em uma mudança brusca da legislação e a insegurança jurídica irá pairar sobre uma Lei em conformidade com a Legislação. Sendo assim, a Cândido Mendes não cumpriu os requisitos necessários, mas ainda assim conseguiu autorização para iniciar sua Recuperação Judicial. Pelo cenário que estamos vivendo, mesmo sendo uma necessidade a realização do instituto da Recuperação por qualquer sociedade, isso acarretaria em prejuízos enormes por anos de legislação vigente, modificando uma lei por métodos contrários a Constituição. Desta forma, se a decisão em questão prosperar e transitar em julgado, deve-se ater que a mesma infringe as leis consolidadas, bem como os entendimentos jurisprudenciais, sendo assim, não deve ser utilizada como embasamento para outros processos, pois acarretaria em uma necessidade de criar uma nova lei em que englobe as sociedades não empresárias como as possíveis para realizar a Recuperação Judicial. REFERENCIAS ARAÚJO, Ueveny Valina de. Julgarou Legislar: qual o papel do Judiciário frente ao Princípio da Separação dos Poderes? 2016. Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47041/julgar-ou-legislar-qual-o-papel- do-judiciario-frente-ao-principio-da-separacao-dos-poderes, acesso em 17/11/2020. 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