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07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 1/3 ■ Capítulo 4 Coleta, Transporte e Conservação de Amostras Edna Maria Alvarez Leite Introdução As análises toxicológicas englobam uma grande variedade de determinações envolvendo incontáveis xenobióticos e inúmeras amostras, biológicas ou não. Em geral, essas análises são realizadas em alíquotas de amostras coletadas; no entanto, em alguns casos (p. ex., em certas análises com finalidade forense), a amostra total obtida pode ser utilizada. Sabese que a concentração de um analito em uma amostra pode ser alterada durante a coleta, transporte e conservação (armazenamento) da mesma, caso essas etapas préanalíticas não sejam realizadas de maneira adequada. Condições como o anticoagulante usado em amostras de sangue, o material dos recipientes utilizados para coleta e armazenamento e o uso de conservantes ou de diluentes durante as etapas devem ser cuidadosamente selecionados de modo a não contribuir para a variabilidade analítica. É certo que uma amostragem, incluindo as etapas de coleta, transporte e armazenamento, quando adequadamente realizada, tem papel essencial para a confiabilidade do resultado analítico e contribui, de maneira efetiva, para que a incerteza associada à medida seja minimizada. Em outras palavras, a confiança em um resultado analítico final depende de uma correta e adequada amostragem; essa dependência se tornou maior à medida que o desempenho dos métodos foi aumentando, diminuindo a exigência de uso de grandes quantidades de amostra para uma análise.1–3 Embora existam alguns setores ou organismos nacionais e internacionais que padronizam e divulgam protocolos referentes às medidas apropriadas para se obterem, armazenarem e transportarem amostras analíticas, a experiência prática de cada analista é essencial, frente à grande variedade de analitos e tipos de amostras existentes. A coleta e o manuseio adequado das amostras, para cada análise ou para um grupo de análises, exigem, portanto, a presença e a coordenação de alguém experiente ou especialmente treinado para esse tipo de realização. A maior parte das análises toxicológicas tem sua amostragem realizada fora do laboratório de toxicologia. Assim, quando o responsável pela amostragem não apresentar as condições necessárias para essa atividade, o laboratório deverá fornecer assistência prática, no sentido de tornar essas condições préanalíticas as mais adequadas possíveis. No presente capítulo, serão apresentadas algumas medidas práticas que possibilitarão uma amostragem apropriada à realização de alguns tipos de análises toxicológicas. Serão enfocadas condições gerais para coleta, transporte e conservação de amostras biológicas (p. ex., urina, sangue, ar expirado, cabelo) utilizadas nas análises toxicológicas com finalidade forense, de diagnóstico de intoxicações alimentares e de avaliação da exposição ocupacional. Além disso, informações referentes à amostragem e ao manuseio de amostras de água serão apresentadas neste capítulo. Amostras biológicas Toxicologia ocupacional A amostragem biológica para fins de monitoramento ocupacional representa um momento crítico para a exatidão e a confiabilidade dos resultados analíticos. Sabese que algumas das maiores fontes de erro nas análises 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 2/3 toxicológicas ocupacionais decorrem de contaminações/decomposições das amostras coletadas e dos equívocos ocorridos na escolha da matriz a ser analisada, no horário da coleta, no transporte e na conservação das amostras. Para a realização de um monitoramento biológico de exposição ocupacional, além dos cuidados inerentes a todas as análises toxicológicas, é recomendado o estabelecimento de uma estratégia prévia de amostragem, com a determinação de quantos trabalhadores devem ser monitorados, levandose em consideração, basicamente, o tamanho do setor ocupacional, o tipo de exposição dos trabalhadores, os agentes presentes no meio e o biomarcador a ser analisado. Como medida de segurança para o laboratório e instrumento de auxílio na interpretação clínica dos resultados analíticos, recomendase também que, antes da etapa de amostragem, os trabalhadores selecionados preencham um protocolo toxicológico contendo seus históricos ocupacionais e algumas características e hábitos individuais (p. ex., dieta, tabagismo, consumo de bebidas alcoólicas e refrigerantes, uso de medicamentos, existência de alterações clínicas, entre outras). Além disso, nesse protocolo, devem constar dados referentes à coleta da amostra (data, horário, volume coletado etc.).4 Na maioria das vezes, as etapas préanalíticas para as análises toxicológicas ocupacionais são direcionadas em função das características físicoquímicas e cinéticas dos biomarcadores a serem analisados (tipo e quantidade de amostra, horário da coleta, utilização de conservantes e anticoagulantes). Existem, no entanto, medidas gerais que devem ser implantadas para a coleta, armazenamento e transporte das amostras biológicas ocupacionais, e serão mencionadas a seguir.1–6 Urina Amostras spot de urina, ou seja, aquelas coletadas em um dado período do dia (representam, em média, a urina excretada na bexiga nas 2 a 4 h anteriores) são as mais indicadas para a análise dos biomarcadores. Apenas em casos excepcionais, por exemplo, quando o resultado analítico é questionado ou o valor do indicador biológico encontrado está muito próximo (patamar superior ou inferior) do índice biológico máximo permitido (IBMP), pode ser empregado o exame de urina de 24 horas. Nesse caso é necessária a conscientização do trabalhador sobre a importância de se coletar toda a urina produzida no dia. É necessário que os frascos utilizados para a coleta das amostras de urina sejam de tamanho adequado para o volume de amostra exigido pela análise, estejam devidamente limpos e contenham o conservante apropriado, quando for o caso. A escolha do frasco apropriado para a coleta da amostra, se de plástico ou vidro, por exemplo, exige o conhecimento das características físicoquímicas dos analitos a serem determinados. De maneira geral, podem ser utilizados os frascos de plástico apropriados adquiridos no comércio; no entanto, em alguns casos, esses frascos são inadequados como, por exemplo, na determinação do tolueno inalterado, que exige recipientes de vidro âmbar. Os frascos que forem adquiridos no comércio não devem permanecer sem uso por mais de 6 meses. A contaminação das amostras de urina pode ocorrer em diferentes períodos da amostragem, como coleta, armazenamento, transporte e durante a análise laboratorial; cuidados especiais devem ser tomados para evitar essa contaminação. As amostras devem ser coletadas fora do local de trabalho, sob a supervisão de pessoal técnico habilitado. Antes da coleta de suas amostras urinárias, os trabalhadores não deverão estar vestindo suas roupas de trabalho; recomendase que os mesmos lavem as mãos e o orifício uretral antes da coleta (o banho completo é a medida preferencial, quando possível) e desprezem o primeiro jato de urina antes de recolher a amostra. Após a coleta, os frascos com as amostras devem ser transportados em bolsas/caixas térmicas hermeticamente fechadas à temperatura interna de 4°C, no máximo. O horário da coleta é determinado pela cinética do xenobiótico a ser analisado; em muitos casos, recomendase coletar a amostra ao final da jornada de trabalho ou nas 3 h finaisda mencionada jornada. O volume coletado deve ser suficiente para a realização das análises desejadas; um volume aproximado de 50 mℓ costuma ser suficiente. É importante destacar que, nos casos de análise de substâncias voláteis, o volume coletado deverá preencher todo o espaço interno dos frascos, evitando a possível perda por volatilização do analito decorrente da existência de espaço morto (vazio) na parte superior do frasco. Nesses casos, recomendase coletar volumes menores de urina (15 a 20 mℓ). Esses frascos não deverão ser abertos até o momento da análise. Sangue Alguns cuidados especiais devem ser tomados, quando a amostra biológica a ser coletada é o sangue. 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 3/3 A coleta de sangue deve ser realizada por um profissional capacitado para isso: flebotomista, enfermeiro do trabalho, paramédico e médico do trabalho são os mais recomendados. A pele, no local da coleta, deverá ser limpa (o ideal seria que o trabalhador tomasse um banho completo antes da amostragem). Eventualmente em alguns casos, como por exemplo, na coleta de sangue para a determinação de baixas concentrações de chumbo, pode ser indicada limpeza mais específica da pele com solução diluída de HCl puríssimo (0,1 mol/ℓ), seguida de limpeza com etanol e água desionizada. O trabalhador deverá permanecer sentado antes da punção venosa por aproximadamente 15 min, de modo a evitar a hemoconcentração que ocorre quando os indivíduos se encontram de pé, ou a hemodiluição que se instala como resultado de atividade física, mesmo que pequena. O uso de torniquete ou outro mecanismo capaz de provocar estase sanguínea no local deve ser evitado, ou utilizado o mais breve possível, uma vez que esses mecanismos resultam em hemoconcentração. Um ponto crítico da amostragem sanguínea é o uso de anticoagulante, quando necessário. O tipo e a quantidade de anticoagulante utilizado devem ser escolhidos em função do biomarcador a ser analisado, sua possível concentração e o tempo de conservação da amostra. Assim, por exemplo, a heparina, que tem poder anticoagulante de apenas alguns dias, não deve ser utilizada se as amostras forem analisadas mais tardiamente. Apesar disso, em termos de risco de contaminação das amostras sanguíneas, especialmente aquelas utilizadas na determinação de metais como chumbo e cádmio, por exemplo, o uso da heparina apresentase mais adequado do que o de outros anticoagulantes como oxalato e fluoreto de sódio. O citrato de sódio e o EDTA (ácido etilenodiaminotetracético), por apresentarem ação quelante, podem interferir com uma série de determinações químicas. Além disso, o EDTA pode produzir diminuição no volume de eritrócitos e, consequentemente, modificar a concentração de alguns analitos. O uso de tubos de coleta a vácuo é, atualmente, a maneira mais comum para se coletarem amostras de sangue, mas são essenciais alguns cuidados na seleção do tipo de tubo a ser utilizado, não apenas pela questão do anticoagulante presente, mas também porque o material liberado pelas tampas de alguns desses tubos pode interferir na análise. É necessário tomar todo o cuidado possível, para não ocorrer hemólise da amostra coletada. Quando as amostras desejadas forem o soro ou o plasma, as separações dos componentes celulares do sangue devem ocorrer o mais rapidamente possível. Nas situações em que a coleta de sangue é realizada pelo método tradicional, com agulha e seringa, é necessário avaliar o tipo de agulha usada, uma vez que as de aço, por exemplo, podem conter traços de metais como níquel, cromo, manganês e cobalto. Ar expirado O interesse na utilização do ar expirado como amostra biológica, no monitoramento ocupacional de compostos voláteis, vem crescendo gradativamente, basicamente por ser um método não invasivo e refletir adequadamente a concentração sanguínea do composto de interesse. A utilização dessa amostra, no entanto, apresenta algumas dificuldades, tais como: pequena concentração dos xenobióticos na amostra, exigindo 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 1/3 técnicas analíticas de maior sensibilidade; meiavida curta de alguns compostos no ar expirado, obrigando a realização da coleta em tempo bem estabelecido após a exposição; grande quantidade de vapor de água que funcionará como interferente na coleta e a técnica utilizada para a coleta do ar expirado. Diferentes opções para diminuir a interferência da presença dos vapores de água no ar expirado são encontradas na literatura e, assim, o laboratório ou o organismo responsável pela obtenção da amostra, antes de coletar o ar expirado, deverá selecionar o tipo de equipamento a ser utilizado na amostragem.7 Além disso, é necessário determinar o momento para se obter a amostra, considerando a cinética do analito, a duração e a técnica de coleta do ar expirado em função da fisiologia respiratória.8 Um dispositivo bastante simples, denominado BSC (Breath Single Canister),9 para a coleta do ar expirado, foi validado nos anos 1990 pela USEPA – U.S. Environmental Protection Agency, sendo ainda bastante utilizado em laboratórios norteamericanos. O frasco coletor (canister) apresentase com o formato de um pequeno botijão de aço inoxidável, geralmente com capacidade de 1 ℓ , contendo uma válvula regulável na parte lateral superior e uma pequena peça descartável de Teflon® (tubo), em sua parte superior, por onde será coletado o ar expirado. A superfície interna do frasco deve estar neutralizada, empregandose normalmente para isso uma técnica de polimento eletrolítico. O indivíduo deve coletar sua amostra fechando seus lábios sobre o tubo de Teflon® e, em seguida, vedando o nariz com a mão. Ao final de uma expiração, ou seja, quando o volume corrente de ar (aproximadamente 500 mℓ) tiver sido eliminado, o indivíduo deve abrir a válvula do frasco e continuar a expirar, coletando, assim, o ar alveolar. Um diagrama desse sistema de coleta pode ser encontrado no trabalho de Pleil e Lindstrom (1997).9 Esse equipamento está disponível no comércio e possibilita a coleta de ar expirado por meio de um processo simples e fácil. Sua grande limitação, para a maioria dos laboratórios toxicológicos em termos nacionais, é a necessidade de acoplamento de dispositivos especiais, normalmente aos cromatógrafos a gás em que serão realizadas as análises, para a retirada, em condições criogênicas, da alíquota da amostra coletada que será injetada dentro da coluna cromatográfica. Várias outras técnicas de coleta do ar expirado são encontradas na literatura, algumas utilizando captação dos analitos em sorventes específicos, outras empregando a técnica de extração em fase sólida (SPE) ou a microextração em fase sólida (SPME). Pawliszyn (1997)10 propôs o uso de dois métodos de amostragem utilizandose SPME, um passivo e outro ativo. Na técnica denominada passiva, o ar exalado é coletado inicialmente em um tipo de amostrador (p. ex., bolsas plásticas) e somente depois dessa coleta o analito será extraído pela SPME. Na amostragem ativa, a coleta é feita na própria fibra de microextração, empregandose para isso uma adaptação no dispositivo SPME. Para tanto, um tubo de Teflon®, pelo qual será expirado o ar alveolar, passa a recobrir a fibra do dispositivo que, quando exposta, extrairá o analito de interesse. Para cada composto específico, é necessário padronizar o tipo de fibra mais adequado e o tempo de expiração dentro do tubo. Recomendase que o indivíduo aspire o ar pelo nariz e prenda a respiração porcerca de 5 a 10 s. Em seguida, deve expirar todo o volume corrente, fora do tubo de Teflon® e, só então, expirar o restante do ar (ar alveolar) dentro do dispositivo, em uma velocidade lenta.11 Técnica de amostragem semelhante foi empregada por Ghittori et al. (2004),12 para proceder à análise de tolueno no ar expirado de indivíduos expostos ao solvente. A duração da expiração dentro do tubo de Teflon® depende do composto a ser analisado e do tipo de fibra utilizada (p. ex., material e espessura da fibra). Após a coleta, o dispositivo é levado ao laboratório e a amostra é diretamente dessorvida no injetor de um cromatógrafo a gás. Saliva A utilização da saliva como amostra biológica ocupacional tem sido estudada mais recentemente. Essa amostra pode representar uma opção vantajosa no monitoramento de alguns xenobióticos como metais (Pb e Cd), tabaco (cotinina) e outros biomarcadores indicativos, por exemplo, de estresse ocupacional (cortisol, imunoglobulina A).13 15 Estudos da composição proteômica da saliva têm sido desenvolvidos objetivando novos biomarcadores ocupacionais ou de doenças em geral.16 Por ser uma coleta não invasiva, a amostragem é mais bem aceita pelos trabalhadores, além do fato de ser simples e de fácil administração, podendo ser realizada pelo próprio trabalhador, desde que devidamente orientado, dispensando a necessidade de recurso humano especializado.13 Os resultados analíticos encontrados nas amostras de 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 2/3 ■ saliva refletem a concentração dos biomarcadores em tempo real – ou seja, no momento em que a coleta foi realizada; ao contrário, por exemplo, da urina, que fica armazenada na bexiga antes de ser excretada. O emprego da saliva como amostra no monitoramento biológico de chumbo e cádmio tem crescido nos últimos anos, embora existam várias limitações apresentadas por alguns pesquisadores. O uso dessa amostra no monitoramento do chumbo, por exemplo, não é indicado nos casos de exposições a elevadas concentrações do metal, uma vez que a correlação existente entre os níveis sanguíneos e salivares tornase praticamente insignificante.13 O momento e a duração da amostragem dependem da cinética de eliminação do composto; se a concentração do biomarcador na saliva for afetada pelo fluxo salivar, será necessário medir a taxa de secreção do bioindicador. A lavagem da cavidade bucal e a coleta fora do local de trabalho são medidas que podem diminuir a eventual contaminação externa da amostra. O armazenamento da amostra coletada varia de acordo com o biomarcador que se deseja analisar. Na determinação de biomarcadores de estresse ocupacional, como a imunoglobulina A (IgA), a amostra deve ser armazenada a −30ºC por até 3 meses.13 Transporte e armazenamento das amostras Os frascos contendo as amostras, cuidadosa e hermeticamente fechados, devem ser rotulados (nome, data etc.) e, caso não sejam enviados imediatamente ao laboratório, devem ser devidamente armazenados a 4°C ou, quando especificado, em outras temperaturas, geralmente a −20°C. Podem ser utilizadas caixas de isopor vedadas, contendo gelo reciclável em seu interior, tomandose cuidado na fixação adequada dos frascos, de modo a evitar que os mesmos quebrem ou tombem durante o transporte. Quando amostras de sangue forem coletadas pelo método tradicional, deverão ser transportadas, preferencialmente, dentro da própria seringa. No laboratório, caso a análise não seja realizada imediatamente, devese armazenar as amostras e, para isso, é necessário o conhecimento das propriedades físicoquímicas do analito, como temperatura, pH e tempo de armazenamento compatível com sua estabilidade química. Como medidas gerais para o armazenamento no laboratório, é recomendado manter os frascos ao abrigo da luz, em refrigerador (4°C) ou congelador (−20°C) quando especificado; minimizar o risco de alteração no teor do analito em decorrência de concentração da amostra (p. ex., quando ocorre evaporação de água presente na matriz biológica, através das paredes dos recipientes de armazenamento); evitar o uso de frascos de policarbonato e de polimetilpentano, uma vez que estudos demonstram ser a evaporação de água pelas paredes desses frascos de aproximadamente 2 e 1% ao ano, respectivamente (nos frascos de polietileno, polipropileno, Teflon® e vidro, a perda é cerca de 0,5% ao ano). As amostras que necessitam ser reanalisadas meses depois da primeira análise (contraprovas, pesquisas etc.) devem ser mantidas em congeladores especiais (−80°C) ou sob nitrogênio líquido (−130°C, em média). Em qualquer situação de armazenamento, é necessário vistoriar os frascos antes de armazenálos para se certificar de que todos estão completamente fechados e com os rótulos intactos e legíveis. Toxicologia de alimentos Intoxicações alimentares As intoxicações alimentares são, em geral, avaliadas por meio de análises qualitativa e quantitativa do agente químico etiológico no próprio alimento e não em amostras biológicas do indivíduo intoxicado. Nas situações em que a análise de amostra biológica é requerida para o diagnóstico da intoxicação, esta amostra deverá ser coletada, o mais rápido possível, assim que os sintomas tóxicos se iniciam (de preferência nos primeiros 2 dias após a exposição). As amostras biológicas usuais são sangue e urina; esta última, nos casos em que o agente etiológico é biotransformado no organismo. O vômito, ocorrendo em um período máximo de 12 h após a exposição, também pode ser analisado. Os cuidados gerais na amostragem do sangue e da urina devem ser, basicamente, os mesmos mencionados neste capítulo; algumas particularidades, no entanto, poderão estar associadas às características dos agentes químicos causadores da intoxicação como, por exemplo, no material do recipiente de coleta e armazenamento, no caso das bifenilas policloradas (PCB, polychlorinated biphenyls).17 Algumas vezes, é necessário separar o soro sanguíneo, embora vários agentes tóxicos presentes nos alimentos e causadores de intoxicação como cianetos, chumbo, mercúrio, compostos orgânicos voláteis, entre outros, sejam determinados no sangue total. As amostras devem ser coletadas em frascos limpos e isentos de contaminantes químicos. Imediatamente após a coleta, dependendo da matriz biológica e da estabilidade química do composto de interesse, as amostras devem ser refrigeradas a 4°C ou congeladas a −15°C se a matriz biológica for vômito, urina ou 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 3/3 ■ soro. Os recipientes contendo as amostras biológicas devem se transportados em sacos plásticos duplos, selados, em temperatura nunca superior a 4°C. Nos casos em que as amostras devem ser congeladas, evitar colocar os frascos com as mesmas diretamente em contato com o gelo.18 Um protocolo toxicológico contendo informações diversas deverá ser encaminhado ao laboratório. A sintomatologia apresentada pelo paciente, o período de latência entre a ingestão do alimento e o aparecimento desses sintomas, o local de residência do intoxicado e os alimentos ingeridos nas últimas 24 h são algumas das informações essenciais nesse protocolo. Toxicologia forense Análise post-mortem A confiança e a relevância de qualquer resultado analítico toxicológico são determinadas, inicialmente, pela integridade da amostra submetida à análise. Considerando que após a morte os processos metabólicos orgânicoscomeçam a ser reduzidos drasticamente, em diferentes velocidades, pela autólise, talvez mais do que em qualquer outra área da toxicologia, a amostragem postmortem deve ser cuidadosa e rapidamente elaborada. Embora existam vários tipos de amostras que podem ser coletadas nesse tipo de análise forense, assim como várias técnicas distintas para essa amostragem, algumas delas serão enfocadas a seguir.19–21 Sangue As concentrações de xenobióticos encontradas em amostras de sangue periférico têm se mostrado mais confiáveis para as análises toxicológicas do que aquelas determinadas em amostras de sangue cardíaco, por exemplo. Assim, nos casos em que a morte foi causada por intoxicação ou quando a causa do óbito é desconhecida, recomendase a coleta do sangue femoral para a pesquisa. A amostra (5 a 40 mℓ, dependendo das análises a serem realizadas) deve ser coletada das veias femorais, antes de a necropsia ser iniciada, por meio de punção percutânea com cuidado para não coletar sangue de outras veias/artérias mais centrais. A coleta deve ser realizada com tubo a vácuo, de preferência âmbar (para evitar a fotodegradação); o uso de tampa de borracha ou de cortiça não é indicado.20 Após a coleta, a amostra deve ser transferida para tubos de vidro âmbar, novos e limpos, vedados com tampas de rosca recobertas com alumínio. O total ou mais de 3/4 do volume do tubo deve ser preenchido com a amostra, sendo indicado o uso de conservantes como o fluoreto de sódio (10 mg/mℓ de sangue) ou oxalato de potássio (30 mg/mℓ). O uso de fluoreto de sódio, por exemplo, protege a amostra contra alterações postmortem como a produção bacteriana, a produção de etanol e outros álcoois. Auxilia, também, no retardamento da destruição de substâncias quimicamente lábeis como cocaína, nitrazepam, cianetos etc. Sempre que possível, a coleta deverá ser realizada em duplicata, para a eventual necessidade de ser repetida ou realizada uma segunda análise toxicológica. As amostras de sangue não devem ser coletadas por pressão de cortes feitos nos membros do cadáver, uma vez que esta técnica poderá provocar alterações dinâmicas nas concentrações das substâncias a serem pesquisadas no sangue.19,21 Urina As amostras de urina, coletadas antes da necropsia, apresentam grande importância para as análises forenses post mortem, principalmente quando se torna necessária a realização de triagens toxicológicas (além do produto inalterado, vários metabólitos urinários poderão estar presentes na urina, facilitando a identificação de possíveis agentes químicos causadores do óbito). Para a coleta dessa amostra, quando disponível, devese perfurar a bexiga, com auxílio de agulha e seringa, após a abertura do abdome, ou então 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 1/3 realizar a coleta com o auxílio de um cateter uretral antes do início da necropsia. É importante certificar se o indivíduo esteve usando cateter antes de falecer; uma vez que, nesse caso, a urina poderá estar contaminada com anestésicos (p. ex., lidocaína) presentes no gel utilizado para a introdução do cateter. A urina deve ser conservada em frasco de vidro com tampa de rosca, contendo solução de fluoreto de sódio (30 mg/mℓ de urina) como conservante. Um volume aproximado de 20 mℓ de amostra é suficiente para a realização das análises toxicológicas. Nos casos em que a amostra tiver que ser congelada, apenas 80 a 90% da capacidade do frasco deverá ser preenchido com a urina.19–21 Humor vítreo Amostras de humor vítreo são úteis quando se pesquisa morte por álcool, casos de óbito relacionados com diabetes ou insulina e em alguns testes bioquímicos que se fizerem necessários (ureia, glicose etc.). São particularmente importantes nos casos em que já ocorreu putrefação do corpo, uma vez que, protegido dentro dos olhos, o humor vítreo permanece estéril e mais resistente à decomposição.20 As amostras devem ser coletadas de ambos os olhos, mas de maneira separada. A perfuração do globo ocular deverá ser realizada com uma agulha fina, apropriada para coletas intraoculares, acoplada a uma seringa com volume igual a 5 mℓ. A técnica de coleta proposta por Forrest (1993)19 e Millo et al. (2008)20 recomenda a perfuração da esclerótica em um ângulo de aproximadamente 60°, tomando a pupila como referência. A agulha deve penetrar diretamente no sentido do centro do globo ocular; a aspiração deve ser delicada e, devido à sua viscosidade, o humor vítreo flui lentamente para o interior da seringa. Em geral, coletamse 2 a 3 mℓ do humor vítreo, que deverá ser conservado com fluoreto de sódio (10 mg/mℓ de amostra).20 Bile Algumas substâncias como o paracetamol e os opiáceos, que são concentradas no fígado e excretadas na vesícula biliar, podem ser determinadas na bile, coletada antes do início da necropsia. Embora alguns autores indiquem a coleta da bile com o auxílio de agulha, seringa ou cateter,19 a viscosidade da amostra dificulta muito a utilização dessa técnica. A maneira mais fácil e simples de se coletar a bile será por meio de incisão direta da vesícula biliar dentro de um frasco de vidro de 30 mℓ de capacidade, com tampa de rosca; em geral, uma alíquota de 20 mℓ da amostra é suficiente para a realização das análises toxicológicas.19 Tecidos Muitas vezes, quando a causa da morte é totalmente desconhecida, recomendase obter amostras de tecidos cerebral, adiposo, hepático, renal e pulmonar, entre outros. O fígado pode representar uma amostra importante, considerando ser esse órgão um local de concentração e biotransformação de xenobióticos e substâncias endógenas. Recomendase coletar cerca de 100 mg do lóbulo direito desse órgão, antes de o mesmo ser fixado, preferencialmente o mais distante possível do estômago e vesícula biliar.20 O estômago, o intestino delgado e os rins são outras vísceras representativas na pesquisa de uma causa mortis, especialmente no caso de ingestão do xenobiótico, uma vez que, neste caso, a concentração da substância será muito maior no estômago, por exemplo, que em outros órgãos. De acordo com Millo et al. (2008),20 o estômago deve ser fechado em suas duas extremidades (esôfago e piloro), dessecado e, em seguida, aberto dentro de um jarro de boca larga. Cerca de 30 cm do intestino delgado com seu conteúdo devem ser coletados e armazenados no mesmo recipiente que contém o estômago; a metade de cada rim deve ser obtida também. As amostras de tecido não devem ser armazenadas em recipientes de vidro e tampouco adicionadas de agentes fixantes. Cuidado especial deve ser tomado durante a coleta, manuseio e armazenamento das amostras, para evitar a contaminação cruzada entre elas, especialmente quando compostos voláteis podem estar presentes. Os vários tipos de amostras coletadas devem ser identificadas e encaminhadas ao laboratório, juntamente com um protocolo toxicológico que deverá conter informações referentes à natureza da amostra, o local de onde ela foi coletada, a data e a hora da coleta, a idade do indivíduo, a estimativa da hora em que o óbito ocorreu, o período de tempo decorrido entre o falecimento e a realização da necropsia, a existência e a identificação de eventual doença presente préóbito, os medicamentos que o indivíduo vinha ingerindo antes do falecimento, entre outras. 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 2/3 Compostos voláteis como drogas de abuso Vários compostos voláteis podem ser utilizados como drogas de abuso, e a tomada de amostras biológicas para identificação exige cuidados especiais.22 Além do sangue, a coleta deoutros tecidos, como do cérebro, tecido adiposo e pulmão, é importante nos casos em que se torna necessária a pesquisa de compostos voláteis e gases.20 As amostras dos tecidos devem ser coletadas antes da respectiva fixação e armazenadas em recipientes de vidro separados. No caso específico do pulmão, recomendase a coleta na altura do ápice pulmonar, com o cuidado de amarrar firmemente o brônquio principal após a abertura do tórax. Após a divisão do hilo, o pulmão deve ser colocado imediatamente em um saco plástico (para evitar a perda das substâncias voláteis) e enviado o mais rápido possível para a análise.20 A análise do tecido adiposo, especialmente do cerebral, pode ser recomendada também nesses casos. Após a coleta do tecido, este deve ser submetido às mesmas medidas de armazenamento indicadas para as amostras sanguíneas. Na eventualidade de os compostos voláteis não terem levado o indivíduo à morte, a análise deve ser realizada no sangue como amostra de escolha (a urina somente poderá ser útil se uma significativa porção do composto volátil for biotransformada no organismo e eliminada por essa via). Nesse caso, o sangue deve ser coletado e armazenado em frascos de vidro com tampa revestida de alumínio. A heparina de lítio é o anticoagulante de escolha e o volume de sangue coletado deverá ser suficiente para preencher todo o frasco (tubo de vidro). Caso o volume coletado seja insuficiente para esse preenchimento, o tubo deve ser trocado por um de volume menor. Os tubos contendo as amostras devem ser mantidos a 4°C e não podem ser abertos até o momento da análise. As amostras coletadas para a pesquisa dos compostos voláteis devem ser enviadas e analisadas imediatamente após suas obtenções; caso isso não seja possível, deverão ser armazenadas em refrigeração. Quando os compostos voláteis presentes na amostra são o acetato de metila ou de etila, recomendase a adição de fluoreto de sódio a 1%, objetivando inibir a atividade de enzimas esterases presentes no sangue. Cabelo como amostra biológica O cabelo é uma amostra biológica mais fácil de coletar, transportar e armazenar do que o sangue e a urina, por exemplo. Quando adequadamente coletada, a amostra de cabelo torna possível realizar avaliações retrospectivas do consumo crônico de substâncias psicoativas, de intoxicações intencionais ou criminais, de exposição a drogas de abuso durante a gestação e de exposição a alguns contaminantes ambientais ou adulterantes alimentares.23 A análise dessa matriz biológica, empregandose métodos ultrassensíveis, demonstra, inclusive, exposição única a uma pequena concentração de um dado xenobiótico excretado pelo cabelo. Além disso, considerando que o cabelo cresce de maneira uniforme e estável, a análise de um dado segmento do fio capilar poderá fornecer informações sobre o período de uso ou exposição à substância. Assim, enquanto sangue e urina expressam exposições recentes (ou em curso), a análise do cabelo pode revelar exposições antigas (de muitos anos passados). A dificuldade do uso dessa matriz biológica decorre da possibilidade de contaminação externa do cabelo, o que pode resultar em um dado analítico incorreto. Essa dificuldade pode estar aumentada quando se trata de cabelo feminino, uma vez que produtos para tinturas, alisamentos e outros tratamentos artificiais podem conter metais em sua composição, interferindo na análise desejada. Bass et al. (2001)24, em trabalhos encontrados na literatura médica, propõem diferentes medidas de limpeza prévia do cabelo para não contaminálo. Várias dessas medidas apresentaramse inadequadas, uma vez que podem eliminar, também, o xenobiótico presente no interior do cabelo e não apenas a contaminação externa. Os autores relatam ainda que dados obtidos de outros estudos demonstraram que a lavagem dos cabelos com xampu não prejudicaria a análise, salvo quando forem usados produtos especiais que contenham algum tipo de composto adicional como, por exemplo, sulfito de selênio. Muitos protocolos que estabelecem as exigências para a coleta desse tipo de amostra biológica são praticamente inviáveis de serem seguidos, uma vez que recomendam que apenas os cabelos recém nascidos e não tingidos, alisados ou cacheados artificialmente no mínimo 3 meses antes da coleta deveriam ser coletados. Além disso, estudos demonstram que, mesmo seguindo esse tipo de protocolo, a contaminação externa não é evitada em função da existência de contaminantes no ar ambiental e na água. Em um amplo estudo realizado sobre o cabelo como amostra biológica, Balíková (2005)23 propõe que, antes da coleta da amostra de cabelo, estes sejam lavados com solventes para remover óleos e/ou potenciais agentes contaminantes externos e, quando possível, que seja realizada a determinação desses interferentes externos para posterior comparação com o resultado encontrado na análise da matriz interna do cabelo. 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 3/3 ■ De maneira geral, recomendase que a coleta da amostra de cabelo seja realizada na parte posterior da cabeça, de preferência coletando os fios menos superficiais. Uma mecha interna do cabelo deve ser selecionada e cortada com uma tesoura o mais próximo possível do couro cabeludo (cerca de 0,3 cm de distância da pele). O ideal é que essa mecha seja arrancada em vez de ser cortada, obtendose assim os fios com a raiz; no entanto, por motivos éticos e humanitários, esta medida não é realizada. A quantidade de cabelo coletada varia de acordo com a finalidade da análise; contudo, de maneira geral, recomendase coletar 200 mg da amostra, quantidade que se apresenta como suficiente para os casos necessários de contraprova ou repetição da análise. Durante a coleta, a orientação dos fios de cabelos deve ser marcada do sentido da raiz (ou parte mais inferior do fio) para as pontas. Essa estratégia poderá possibilitar, se necessário, a avaliação do período de uso ou a exposição à substância. As amostras de cabelo devem ser enviadas ao laboratório em recipientes apropriados, como sacos plásticos com vedação, devidamente identificadas com informações gerais prévias como tamanho, cor, eventual tratamento químico do cabelo e, se forem pelos, a parte anatômica do corpo da qual a amostra foi coletada. Quando a análise é postmortem, é preciso encaminhar ao laboratório outras informações, como data e hora da coleta, idade do indivíduo, estimativa da hora em que o óbito ocorreu, período de tempo decorrido entre o falecimento e a realização da necropsia, existência e identificação de eventual doença presente préóbito e os medicamentos que o indivíduo vinha ingerindo antes do falecimento. No laboratório, a amostra deve ser lavada e o procedimento adequado para isso varia de acordo com o tipo de xenobiótico que se quer analisar (metais, substâncias psicoativas etc.). Especificamente, quando se deseja analisar metais,24 a lavagem do cabelo coletado deverá ser feita, em média, por quatro vezes, utilizandose solução diluída 1:200 de Triton X100. A amostra deverá ser enxaguada com acetona e deixada para secar em local limpo. Em seguida, nova lavagem com água MiliQ e acetona, por duas vezes, deverá ser efetivada. A amostra deve ser levada para secagem em forno descontaminado, em temperatura de 70 a 80°C. Quando se busca determinar substâncias psicoativas ou medicamentos, a lavagem com água MiliQ, seguida de um solvente apropriado (dependendo da solubilidade dos eventuais contaminantes externos) e acetona pode ser suficiente. Depois de lavado e seco, o cabelo coletado deve ser dividido em pequenos fragmentos, cortados no sentido transversal, ou transformadomecanicamente em pó, de modo a expor a parte interna dos fios e seu conteúdo. Em seguida, dependendo da estabilidade do analito que se deseja pesquisar, diferentes métodos para digestão (ou incubação) da amostra de cabelo deverão ser empregados, seguidos das etapas analíticas específicas do método de análise selecionado. Amostras de água A amostragem para a realização de análises de água é bastante variável em função não apenas dos diferentes ecossistemas aquáticos existentes (ecossistema de água salgada: mares/oceanos e ecossistema de água doce: lênticos – lagos, lagoas/lóticos – rios, córregos), mas também do tipo de análise que se pretende realizar (análises física, microbiológica ou química). A amostragem que será enfocada no presente capítulo será, basicamente, aquela referente à análise de contaminantes químicos das águas doces. No Quadro 4.1 listamos alguns parâmetros indicados para a amostragem de água do ecossistema lótico, objetivando a análise de contaminantes químicos presentes. Coleta em campo (rios, lagos, córregos) A coleta, o armazenamento e o transporte desse tipo de amostra devem ser realizados de maneira cuidadosa, a fim de evitar alterações na composição dos constituintes químicos 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 1/4 existentes na água a ser analisada. Esses cuidados devem ser redobrados quando o xenobiótico a ser analisado encontrase em quantidadestraço, o que não representa situação rara nesse tipo de análise. Quadro 4.1 Parâmetros de amostragem para análise de alguns contaminantes presentes em água.27 Substância Recipiente/volume Conservante Tempo de armazenamento Arsênio Polietileno/200 mℓ HNO3, pH 2. Manter a 4°C 6 meses BTEX* Vidro âmbar, tampa Te�on®/40 mℓ HNO3, pH 2. Manter a 4°C 14 dias Cádmio Polietileno/200 mℓ HNO3, pH 2. Manter a 4°C 6 meses Cianeto Polietileno/500 mℓ NaOH, pH 12. Manter a 4°C 24 h Chumbo Polietileno/200 mℓ HNO3, pH 2. Manter a 4°C 6 meses Fenol Vidro âmbar/1.000 mℓ HNO3, pH 2. Manter a 4°C 24 h Hidrocarbonetos derivados do petróleo Vidro/1.000 mℓ HNO3, pH 2 28 dias Manganês Polietileno/200 mℓ HNO3, pH 2. Manter a 4°C 6 meses Nitratos e nitritos como N2 Polietileno/250 mℓ HNO3, pH 2. Manter a 4°C 28 dias Zinco Polietileno/200 mℓ HNO3, pH 2. Manter a 4°C 6 meses *BTEX: benzeno, tolueno, etilbenzeno, xilenos. Adaptado de Wyoming Department of Environmental Quality/Water Quality Division, 2011.27 O tipo de frasco utilizado na coleta, assim como a maneira de coletar a amostra, depende, basicamente, do tipo de composto a ser analisado e da matriz a ser amostrada. O tipo de composto a ser analisado e a matriz a ser amostrada (águas superficiais, profundas, subterrâneas, sedimentos etc.) determinam o tipo de frasco, o modo e o número de coletas. Agências internacionais como OEPA (Ohio Environmental Protection Agency),25 WDA (Wyoming Department of Agriculture)26 e WDEQ (Wyoming Department of Environmental Quality),27assim como organismos nacionais como COGERH (Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará),28 IAL (Instituto Adolfo Lutz)29 e Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária)30 dispõem de manuais completos que detalham e especificam os recipientes, os locais, o número e a quantidade de amostras a serem coletadas. Muitas vezes, é necessário impedir a ação de microrganismos presentes na água, que podem promover a hidrólise dos analitos de interesse e, outras vezes, é essencial impedir que compostos voláteis solubilizados se percam durante a amostragem. Verificase, portanto, que o emprego correto de técnicas de preservação das amostras coletadas é um parâmetro importante para a correta determinação dos analitos e, dentre elas, destacamse a conservação química e a diminuição da temperatura da amostra. A adição de conservantes químicos pode ser útil quando se deseja analisar constituintes pouco estáveis presentes na amostra ou, então, quando é preciso manter a estabilidade da amostra por um período de tempo maior. É necessário cuidado, no entanto, para evitar adicionar conservantes que possam se transformar em interferentes como, por exemplo, a conservação por meio de acidificação com ácido nítrico, quando se deseja determinar a concentração de nitratos presentes na água. As técnicas de conservação com base na diminuição da temperatura da amostra são, basicamente, o congelamento e a refrigeração. A manutenção da amostra em uma temperatura nunca superior a 4°C (refrigeração) é a técnica mais utilizada na análise química de amostras de água. O congelamento seguido de posterior descongelamento em laboratório pode não ser adequado quando se deseja analisar alguns componentes dos resíduos sólidos do manancial de água. 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 2/4 • • • • • • • • • ■ ■ ■ Independentemente do tipo de matriz a ser analisada ou do xenobiótico a ser determinado, alguns cuidados gerais devem ser tomados no momento da coleta de campo de amostras de água:28 Evitar coletar amostras com folhas, detritos ou outro material estranho, salvo se a análise precisar ser realizada no sedimento O volume de amostra a ser coletado varia de acordo com as análises a serem realizadas, devendo ser suficiente para as necessidades analíticas Quando for necessária a conservação química da amostra, apenas agente de grau analítico deverá ser empregado O frasco de coleta deve ser deixado à temperatura ambiente, aclimatado antes da coleta da amostra Procurar não contaminar os frascos de coleta e armazenamento, evitando tocar a parte interna dos mesmos, mantendoos sem exposição a impurezas (poeiras, óleos, fumaça, cinzas de cigarro, gasolina etc.) Recomendase que a pessoa que realiza a amostragem use luvas plásticas do tipo cirúrgico (desde que não contenham talco) e não fume durante toda a etapa de coleta e armazenamento das amostras Após a coleta, as amostras devem ser acondicionadas imediatamente nos frascos de armazenamento, tendo o cuidado de observar a condição física dos mesmos Os frascos contendo amostras que exijam refrigeração, para a manutenção de suas integridades física e química, devem ser transferidos e acondicionados em recipientes com isolamento térmico (p. ex., caixas de isopor com gelo reciclável em seu interior) Todas as amostras devem ser identificadas e as informações de campo devem ser registradas (o ponto de amostragem e sua profundidade; a data e a hora da coleta; a procedência da água – se de córrego, rio ou lago; a temperatura da água; as condições meteorológicas, nas últimas 24 h, que possam interferir na qualidade da água – por exemplo, chuvas etc.). Coleta de água potável Os mesmos cuidados com a limpeza e descontaminação dos recipientes utilizados para a coleta de campo, mencionados no item anterior, devem ser mantidos nesse tipo de amostragem.28,29 Os frascos devem ser, preferencialmente, fornecidos pelo laboratório, estarem limpos e conter conservante químico adequado, quando necessário. De maneira geral, pequenas quantidades de ácido nítrico são utilizadas como conservante. É necessário controlar o fluxo da água a ser coletada, uma vez que é recomendável deixar a água escorrer por 3 a 5 min, em um fluxo estável, antes do início da coleta. Alguns cuidados são específicos para certas análises a serem realizadas na água como, por exemplo, nas determinações de metais, praguicidas e compostos voláteis. Análise de metais Caso seja necessário coletar mais de um frasco de amostra, a coleta deverá ser feita individualmente;ou seja, somente quando um frasco tiver sido preenchido e vedado é que se deverá abrir e preencher um segundo frasco de coleta. Todos os frascos utilizados, depois de vedados, deverão ser identificados e enviados imediatamente ao laboratório em condições de temperatura nunca superior a 4°C. Quando se deseja analisar alguns metais pesados na água potável, especialmente o chumbo (ou o cobre), aconselhase fazer a coleta de duas amostras distintas. A primeira amostra, que refletirá a quantidade de metal presente no encanamento, deverá ser coletada imediatamente após a abertura da torneira. Recomendase que essa água tenha permanecido no encanamento por pelo menos 6 h antes do momento da coleta. A segunda amostra, que representará a concentração do metal na água efetivamente ingerida, deverá ser coletada 5 a 15 min após a abertura da torneira. A água escorrida durante esse intervalo de tempo deverá ser desprezada. Para analisar o teor de mercúrio presente na água, deverão ser obtidas amostras individuais, coletadas separadas, também em duplicatas. É necessário ter muita atenção para evitar que os frascos e suas tampas sejam contaminados por meio do contato com superfície ou materiais externos. Os frascos, depois de preenchidos, deverão ser agitados cuidadosamente no caso de haver conservante adicionado ao mesmo. Análise de praguicidas Na análise de praguicidas, as amostras devem ser coletadas no mínimo em triplicata, utilizandose frascos de vidro do tipo Mason, lavados previamente 3 a 4 vezes com detergente neutro para laboratório e enxaguados, 07/01/2019 Minha Biblioteca: Ciências Farmacêuticas - Toxicologia Analítica, 2ª edição https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2860-7/cfi/6/34!/4@0:0.00 3/4 ■ 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. abundantemente, 4 a 5 vezes com água purificada e aquecida; a temperatura é essencial para que todo o resíduo de detergente seja efetivamente retirado. No momento da coleta, o frasco e sua tampa devem ser tratados com a água a ser analisada por, no mínimo, 5 vezes. A coleta de cada alíquota deve ser feita separadamente, fechando o frasco imediatamente após a coleta. Antes de selar o frasco com o seu anel de vedação, é necessário colocar no bocal do frasco uma folha dupla de alumínio. Deve haver cuidado para que os frascos e suas tampas não sejam contaminados pelo contato da água com a superfície externa. Esses frascos, devidamente rotulados, devem ser enviados ao laboratório o mais rápido possível, em recipientes vedados contendo gelo reciclável, de modo a manter a temperatura igual ou abaixo de 4°C. O envio de amostras coletadas ao laboratório deve ocorrer em um prazo nunca superior a 24 h após a coleta. Análise de compostos voláteis Para a determinação de compostos voláteis na água, todo o cuidado deve ser tomado no sentido de evitar a perda dos mesmos por evaporação. Um dos mecanismos promotores dessa evaporação é a formação de bolhas de ar no interior do frasco contendo a amostra; portanto, medidas devem ser tomadas para evitar o aparecimento dessas bolhas no recipiente. É necessário que a água a ser coletada escoe da torneira por 4 a 15 min e a coleta se inicie quando a temperatura da água estiver estabilizada. Se possível, o fluxo da torneira deve ser regulado (não mais que 0,5 ℓ/min). A amostra deve ser coletada com o auxílio de um frasco medidor de vidro (p. ex., copo graduado), devidamente limpo e em um fluxo lento, até aproximadamente 3/4 do volume do copo medidor. Em seguida, as amostras devem ser transferidas lenta e cuidadosamente para frascos de vidro (tipo vial), geralmente de 40 a 50 mℓ, com tampa contendo septo de borracha/silicone. Esses recipientes deverão ser totalmente cheios com a amostra de água e vedados imediatamente (a face da tampa recoberta com silicone deve ser colocada voltada para dentro do vial; ou seja, do lado em que houver contato com a amostra), cuidando para não ocorrer formação de bolhas de ar para dentro do frasco. Algumas vezes, recomendase, antes da vedação do vial, a adição de agentes redutores como o tiossulfato de sódio ou ácido ascórbico (0,1 g/ℓ e 0,5 g/ℓ, respectivamente), quando a água a ser amostrada tiver sido tratada ou contiver cloro. É preciso ter cautela para que não ocorra contaminação da amostra, não se permitindo, por exemplo, o contato da parte interna do vial, ou de sua tampa, com superfícies ou materiais externos. É recomendável a coleta de duas alíquotas de amostra, para cada ponto de amostragem. Os frascos contendo as amostras devem ser devidamente rotulados e enviados imediatamente ao laboratório, em recipientes termoisolantes capazes de manter condições de congelamento da amostra ou, no máximo, temperaturas de 4°C, em um prazo máximo de 24 h. Referências bibliográ�cas CITAC. The cooperation on international traceability in analytical chemistry. CITAC/EURACHEM Guide: quality in analytical chemistry an aid to accreditation, UK, 2002. 57 p. Disponível em:<http://www.eurachem.org/>. Acesso: 10 dez. 2013. EURACHEM. A focus for analytical chemistry in europe. EURACHEM guide: the fitness for purpose of analytical methods a laboratory guide to method validation and related topics, UK, 1998, 75p. 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