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Farmacologia da doença de Parkinson

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Cássia Mendes Ataide - UFMS 
Farmacologia da doença de Parkinson 
DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS 
Maior fator de risco é o envelhecimento e há um 
crescimento da expectativa de vida 
No Brasil, a expectativa média de vida é de 75 anos 
Incidência aos 50 anos: 5% Alzheimer e 2% Parkinson 
Já acima dos 50 anos, aumenta a incidência 
Parcela crescente da população acometida e/ou 
susceptível 
-Causas primárias desconhecidas ou multifatoriais 
-Aumento da exposição a agentes externos e  do 
reparo genético 
-Facilitada por TCEs (síncope), AVEs e encefalites (vírus; 
príon) 
-Intervenções (farmacológicas ou não) pouco eficazes 
(novidade) 
- da qualidade de vida e  do custo socioeconômico 
MECANISMOS DE MORTE CELULAR 
1. Excitotoxicidade do glutamato (via NMDA) 
Glutamato é o principal neurotransmissor excitatório – 
distribuído por todo SNC (quase não existe lugar no 
encéfalo sem glutamato) 
Estresse oxidativo, neuroinflamação e apoptose ou 
necrose 
Aumento exagerado da [glutamato] leva a uma 
hiperativação de receptores (principalmente o NMDA). 
O NMDA, em situações normais, fica inativo. 
Prolongação do contato com glutamato leva a uma 
série de consequências  aumento da [cálcio] 
intracelular - pode levar à alteração do metabolismo 
mitocondrial (altera o fornecimento de energia para os 
neurônios); ativação de cascatas de apoptose (ex. 
cascata da caspase); estímulo da síntese de NO 
(neurotransmissor, porém agente oxidante em grandes 
quantidades); facilitação da desestabilização de 
membranas; recrutamento da cascata de ácido 
araquidônico e formação de mediadores inflamatórios 
(prostaglandinas, TX...)  aumenta chance de morte 
celular e doenças neurodegenerativas com esse fim 
2. Agregação proteica (“misfolding”) 
Alterações conformacionais, agregação e toxicidade 
 Mecanismos de “depuração” (chaperonas e 
degradação) 
Dobramentos incorretos de proteínas – conformações 
alteradas tendem a se agregar (normalmente, temos 
mecanismos de eliminação) e formam agregados 
insolúveis que podem se depositar no meio intra e/ou 
extracelular, levando à neurotoxicidade 
A DOENÇA DE PARKINSON 
Distúrbio progressivo da postura e movimentos 
2ª doença neurodegenerativas mais frequente 
2/10 mil pessoas/ano (200 mil no Brasil) 
Incidência dobra dos 60 aos 70 anos 
Tremor de repouso, bradicinesia, rigidez muscular... 
Antes: depressão, ansiedade, agressividade, anosmia 
(perda do olfato) 
Progressão lenta (10-20 anos) 
Etiologias e hipóteses causais (genética x ambiental) 
 Idiopática ou familiar 
- -sinucleína (exocitose de neurotransmissores) e 
parkina 
 Teoria do vetor ambiental (toxinas por via 
olfatória) 
-Efeito cumulativo de agrotóxicos (rotenona, 
organofosforados, MPTP) 
 Parkinsonismo secundário a fármacos 
(antipsicóticos típicos) 
Hipótese ambiental como etiologia da “DP 
esporádica” 
Toxinas ambientais com “tropismo dopaminérgico” 
Disfunção mitocondrial é central 
Exemplo do MPTP na heroína, que é convertido em 
MPP+ (forma ativa da toxina) no organismo pela 
monoaminoxidase (enzima responsável pela 
degradação de dopamina, noradrenalina e serotonina) 
MPTP atravessa barreira hematoencefálica e entra em 
neurônios ou células da glia pelo transportador de 
dopamina  só entra em neurônios com transportador 
de dopamina ou células da glia 
Cássia Mendes Ataide - UFMS 
Dentro do neurônio, a MPP+ consegue interferir no 
metabolismo mitocondrial, levando à morte neuronal 
 morte neuronal é seletiva em neurônios que 
produzem dopamina 
Componente genético e mutações 
10% dos casos são unicamente genéticos 
-sinucleína (cromossomo 4 / muito presente em 
terminais pré-sinápticos) e genes relacionados à 
parkina (exocitose; seletivos para neurônios 
dopaminérgicos; cromossomos 1 e 6) 
CARACTERÍSTICAS 
Degeneração dopaminérgica nigroestriatal seletiva (+ 
gliose) 
Lesões no tronco (impacto autonômico / 
comportamental) 
Via que liga a substância negra com estriado 
Surgimento de tecido de cicatrização – gliose 
Atenuação da coloração da substância negra 
(mesencéfalo) em pessoas com Parkinson  neurônios 
catecolaminérgicos produzem catecolaminas (depósito 
de melanina) – no Parkinson, há uma redução dos 
neurônios dopaminérgicos 
Degeneração progressiva e seletiva da substância 
negra 
Dopamina é a catecolamina mais reativa (sentido 
oxidativo) 
Facilita misfolding de -sinucleína (corpos de Lewy  
aglomerados anormais proteicos de -sinucleína) 
Doença exclusivamente dopaminérgica  neurônios 
catecolaminérgicos também podem ser afetados 
Perda de função da via nigroestriatal 
Controle motor voluntário 
Causa fisiológica: deficiência de neurônios e dopamina 
na via nigroestriatal 
 [DA] em núcleos da base 
 Fluxo tálamo-cortical motor 
Parte compacta da substância negra: principal 
fornecedora de dopamina para os núcleos da base 
Há 2 vias para levar dopamina ao corpo estriado: 
 Receptores D1 – via direta 
 Receptores D2 (inibitório) – via indireta 
(autocontrole da direta) 
Doença  via direta inibida e indireta ativada, levando 
à redução do movimento 
-Via direta: atividade reduzida decorrente da perda da 
estimulação de D1  inibição do movimento 
-Via indireta: aumento da atividade devido à liberação 
da inibição de D2  inibição do movimento 
SITUAÇÃO NORMAL: 
Via direta: dopa estimula o estriado – estimula via 
direta – libera GABA (inibitório sobre globo pálido) – 
inibe a liberação de GABA – tálamo hiperativado – ativa 
o córtex 
Via indireta: dopamina inibe o estriado – reduz a 
liberação de GABA – aumenta a estimulação do globo 
pálido – aumenta GABA – inibe a liberação de 
glutamato 
Obs- a dopamina atua em receptores com caráter 
diferentes (D1 excitatório e D2 inibitório) 
NO PARKINSON 
Não há substância negra – menos dopamina é liberada 
Reduz dopamina atuando em D1 – perde excitação – 
reduz liberação de GABA – hiperexcitação no globo 
pálido – aumento de GABA – redução da informação 
talâmica até o córtex 
Reduz dopamina em D2 – inibe menos o corpo estriado 
– libera mais GABA – inibe mais o globo pálido – libera 
menos GABA – inibe menos o subtalâmico – libera mais 
glutamato – inibe mais o tálamo – reduz a ativação 
cortical 
**Faltando dopamina, há um prejuízo global do 
controle estriatal dos movimentos (via direta e indireta) 
 raiz do problema 
Receptores dopaminérgicos 
Receptores acoplados à proteína G 
Família D1 é excitatória  acoplada à Gs, aumenta 
AMPc 
-Corpo estriado e neocórtex 
Família D2 é inibitória  acoplada à Gi, reduz a AMPc 
-Corpo estriado, substância negra e hipófise 
 
Cássia Mendes Ataide - UFMS 
VIAS DOPAMINÉRGICAS CENTRAIS 
1. Nigroestriatal (mais importante para o Parkinson) 
Controle motor (estriado) 
Parkinson ( DA)  perda do controle 
Dopamina da subs. negra  corpo estriado 
2. Mesocortical 
Controle cognitivo, impulsivo e de atenção (córtex) 
Transtorno de déficit de atenção ( DA) 
Dopamina da área ventral tegumentar  córtex 
3. Mesolímbica 
Controle emocional e recompensa 
Esquizofrenia ( DA) e dependência 
Dopamina da área ventral tegumentar  regiões 
límbicas 
4. Tuberoinfundibular (hipofisária) 
Controle endócrino (prolactina)  D2 inibe 
constantemente, exceto durante a lactação 
Dopamina do núcleo arqueado do hipotálamo  
hipófise 
SINTOMAS ESPERADOS 
Motores 
Surgem após perda de 60% de neurônios ( 80% da DA 
estriatal) 
Postura inclinada; mascaramento facial; rigidez 
muscular; postura inclinada; cotovelos e pulsos 
flexionados;  balanço de braços; joelhos e quadril 
flexionados; micrografia (tentar esconder sintomas); 
tremor de extremidades; joelhos e quadril flexionados; 
marcha “em falso” 
Degeneração dopaminérgica nigroestriatal seletiva (+ 
gliose) 
Sintomas motores são tardios (70-80% degeneração da 
DA) 
Sintomas não-motores precoces  ansiedade, 
depressão, agressividade, anosmia (surgecom perda 
mínima de neurônios dopaminérgicos) 
Teste de olfato 
TERAPIA FARMACOLÓGICA DA DP 
Limitações: paliativo e sintomático; não cura ou evita 
progressão; eficácia variável e flutuante (fases); efeitos 
indesejados vastos (idosos); polifarmácia (idosos) 
OBS – como falta dopamina, é esperado um fármaco 
que aumente a dopamina ou mimetize seu efeito – 
porém existem efeitos indesejados 
Racional terapêutico 
Aumento da função da via ou atividade dopaminérgica 
1. Precursores da DA 
2. Inibidores de enzimas de degradação DA 
3. Agonistas de receptores DA (ação direta) 
4. Adjuvantes (outros mecanismos / 
transmissores) 
OBS- 1 e 2 são agentes dopaminérgicos indiretos 
OBS- 1, 2 e 3 são antiparkinsonianos 
1. Precursores da síntese de dopamina 
Análogo sintético da DOPA (Levodopa, L-DOPA)  
aumenta o substrato e, consequentemente, a síntese 
Rota sintética da dopamina: tirosina – DOPA – 
dopamina 
Melhor eficácia atual (pode perder o efeito 
cronicamente)  com a morte dos neurônios 
dopaminérgicos, não haverá mais enzimas necessárias 
para fazer a produção do neurotransmissor 
Problemas: só trata sintomas motores; delírio e 
alucinações (pró-psicótico); náusea, vômito (excesso 
de dopamina ativa gatilho do vômito  maioria dos 
antieméticos são antagonistas dopaminérgicos); 
alterações CV ( noradrenalina); discinesia tardia; 
“perda” metabólica exige doses maiores ( 
biodisponibilidade); oscilações plasmáticas (liga-
desliga  tem dia que o efeito do fármaco funciona, 
tem dia que não) 
Associação com inibidores da DOPA-descarboxilase 
periférica (aumenta a [levodopa] que atinge o SN) 
Associados à L-DOPA:  efeitos periféricos indesejados 
- Ex. Carbidopa, Benserazida 
2. Inibidores seletivos de enzimas de degradação 
 [DA] sináptica 
Inibidores seletivos da MAO-B (Selegilina, Rasagilina) 
Inibidores da COMT (Entacapona, Tolcapona) 
OBS – inibir a MAO-B é mais eficiente que inibir a COMT 
Utilizado em Parkinson inicial (efeito sutil) 
Associação à L-DOPA (sinergismo) 
Neuroproteção ( ativação de toxinas via MAO-B)  
reduz a progressão da doença 
Cássia Mendes Ataide - UFMS 
Problemas: insônia (principalmente associado a L-
DOPA); toxicidade hepática (isoformas de MAO no 
intestino, fígado e outros locais) 
3. Agonistas de receptores dopaminérgicos (mimetiza 
efeitos da DA) 
Agonistas D1/D2 pouco seletivos (Bromocriptina, 
Pergolida) 
Agonistas D2/D3 mais seletivos (Pramipexol, Ropirinol) 
Boa alternativa à L-DOPA (em especial quando há 
poucos neurônios DA) 
Problemas: meia-vida curta - várias administrações 
(diminui a adesão); efeitos pró-psicóticos (delírio e 
alucinação); aumento de impulsividade; náusea e 
vômito; discinesia tardia 
 Prolactina e lactação  exemplo cessar a produção 
de leite em casos de mastite (agonista D2 reduz 
produção de prolactina) 
4. Adjuvantes 
Auxiliam a via DA por outros mecanismos (não são 
fármacos dopaminérgicos) 
*Amantadina (antiviral para influenza A)  
antagonista NMDA 
- liberação de DA e  recaptação 
-Uso em fases iniciais  tentar neuroproteção 
-Associado à L-DOPA (em especial, quando há pouca 
tolerância aos efeitos indesejados da L-DOPA) 
-Problemas: insônia, fadiga,  libido, manchas na pele 
e edema em extremidades 
*Antagonistas colinérgicos de receptores muscarínicos 
(Biperideno, Triexifenedil, Benzatropina, Orfenadrina) 
-Ações antagônicas DA/ACh no estriado ( inibição 
tônica) 
-Controle de efeitos motores de antipsicóticos 
Um esquizofrênico possui excesso de dopamina – usa 
antipsicótico (antagonista dopaminérgico) – tem 
sintoma motor  não pode usar um antiparkinsoniano 
(aumentaria a dopamina e pioraria a psicose)  só 
pode usar antagonista muscarínicos 
-Associado à L-DOPA (principalmente quando a mesma 
tem uma perda de efeito – progressão da doença) 
-Problemas: boca seca e visão borrada (midríase); 
constipação e retenção urinária; problemas de 
memória (progressão da demência); sedação 
(sonolência) 
ALTERNATIVAS RECENTES DA DP 
 Novas estratégias e fármacos em potencial 
Fatores neuroprotetores (antioxidantes, cafeína e 
nicotina) 
Exercícios físicos regulares (neuroproteção) 
Fatores neurotróficos ( neurogênese/  morte) 
Terapia gênica (pouco seletiva)* 
Implante de células tronco na substância negra 
(invasiva)* 
Anti-inflamatórios (morte neuronal e neuroinflamação) 
e antagonistas de glutamato 
Antagonistas de adenosina (A2A) – cafeína é 
 “Deep brain stimulation”: modulação direta SNC 
(invasivo); efeito a curto prazo 
Como se fosse um marca-passo – eletrodo é ligado no 
núcleo da base ou em regiões talâmicas

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