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CICLO DO SANGUE A triagem do paciente inclui uma série de perguntas, envolvendo peso, parceiros sexuais, doenças prévias, nível de exposição a algumas doenças, entre outros, a fim de garantir uma coleta e transfusão segura para o receptor. São investigadas algumas doenças antes de ser realizada a transfusão, para garantir que não haja contaminação do paciente, tendo em vista que alguns doadores podem estar em fase de latência de certas doenças, não saberem da infecção, estarem em período de janela imunológica ou até omitirem essa informação. As doenças que devem receber atenção na investigação são: • HIV Devem ser realizados dois testes para garantir a não infecção, sendo um deles o imunoenzimático e o segundo por quimioluminescência ou por outra técnica, de forma que seja distinta da usada inicialmente. Possui uma janela imunológica de 22 dias, com NAT (exame de pesquisa de RNA viral) com 68% de eficácia. • Hepatite B Os marcadores de hepatite B que devem ser pesquisados são HBsAg e anti-HBc, que podem ser realizados por métodos imunoenzimáticos ou por quimioluminescência. Janela imunológica de 70 dias, com NAT (exame de pesquisa de RNA viral) com 84% de eficácia. • Hepatite C Deve ser realizado teste imunoenzimáticos ou por quimioluminescência. Possui uma janela imunológica de 70 dias, com NAT (exame de pesquisa de RNA viral) com 84% de eficácia. • HTLV I e II Deve ser realizado teste imunoenzimáticos ou por quimioluminescência • Doença de Chagas Teste imunoenzimático de alta sensibilidade. • Sífilis Deve ser realizado teste treponêmico e não treponêmico. 1. Critérios para doação de hemocomponentes • Documento de identificação com foto • Ter dormido, no mínimo, 5 horas na noite anterior • Não ter ingerido bebida alcoólica nas 24h que antecedem a doação • Pesar mais de 50kg ou que tenham perdido mais que 10% do peso nos últimos 3 meses de maneira explicável • Ter entre 16 e 65 anos, mas antes dos 18 anos precisa de autorização dos pais • Não estar de jejum • Homens podem fazer 4 doações anuais, com intervalo mínimo de 2 meses. Mulheres podem fazer 3 doações anuais, com intervalo mínimo de 3 meses • O uso de alguns medicamentos, como ácido acetilsalicílico nos 5 dias que antecede não implica na rejeição do candidato, mas exclui a preparação de plaquetas • Concentração de hemoglobina não deve ser inferior a 12,5g/dL para as mulheres e hematócrito não pode ser menor que 38%. Para os homens, esses limites são de 13g/dL e 38%, respectivamente • A pressão arterial sistólica não deve ser maior que 180mmHg nem inferior a 90mmHg, e a pressão diastólica não deve ser superior a 100mmHg nem menor que 60mmHg • O pulso deve estar entre 60-100bpm • Contraindicado em casos de gravidez e até 12 semanas após o parto, assim como candidatas após 12 semanas de aborto, lactantes com parto há menos de 12 meses 2. Volume a ser coletado • Não pode exceder 8mL/kg de peso corporal para mulheres • Não pode exceder 9mL/kg de peso corporal para homens • Volume admitido para a doação de 450 ± 50mL, aos quais podem ser acrescidos de até 30mL para a realização de exames laboratoriais exigidos pelas leis e normas técnicas 3. Impedimento temporário • Resfriado devem ser aguardados 7 dias após desaparecimento dos sintomas • 90 dias após parto normal • Tatuagem nos últimos 12 meses Hemoterapia – indicações transfusionais Clínica Integrada de Hematologia – aula 6 Nicole Sarmento Queiroga Figura 1. Esquema de ciclo do sangue na doação. • 12 meses em situações que há maior risco de adquirir doenças sexualmente transmissíveis • Candidatos que estiveram no Acre, Amapá, Amazonas, Rondônia, Roraima, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Tocantins devem aguardar 12 meses 4. Impedimento definitivo • Hepatite aos 11 anos de idade • Evidência clínica ou laboratorial de infecções como hepatites B e C, doenças associadas ao vírus HTLV I e II e doença de Chagas • Uso de drogas ilícitas injetáveis 5. Separação dos hemocomponentes Após a doação, o passo é o fracionamento, em que a bolsa inicial tem, pelo menos 2 outras ligadas a ela. Em caso de separação por processamento industrial, a denominação dada é hemoderivação, como albumina, globulinas e concentrado de fatores de coagulação. Geralmente, os resultados da separação são o concentrado de hemácia, plasma fresco congelado e plaqueta randômica. O processamento industrial é importante porque vai inativar vírus ou microrgansimos, garantindo ainda mais segurança ao receptor. • Componentes eritrocitários ✓ Concentrado de hemácias Devem ter hematócrito entre 65 e 80%, nas bolsas cuja solução preservativa seja CPDA-1. Armazenamento em temperatura de 4 ± 2ºC, à exceção das hemácias congeladas. Validade de 42 dias se conservado em solução aditiva e 35 dias, se conservado em CPDA. • Componentes plasmáticos ✓ Plasma fresco congelado (PFC) Plasma separado de sangue por centrifugação e totalmente congelado até 8 horas depois da coleta. Válido por 24 meses se armazenado à temperatura de -30ºC ou inferior e por 12 meses, se entre -30 e -20ºC. ✓ Crioprecipitado Fração de plasma insolúvel em frio, obtido a partir do plasma fresco congelado. Contém, no mínimo, 70 unidades internacionais de Fator VIII e 140mg/dL de fibrinogênio. Sua conservação deve ser feita a -30ºC ou temperaturas inferiores para possuir validade de 24 meses ou a temperaturas entre -20 e -30ºC, para ser válido por 12 meses. • Concentrados plaquetários Pode ser obtido a partir do sangue total ou aférese. Se partir do sangue total, deve ter, no mínimo, 5,5x1010 plaquetas por bolsa, e se partir da aférese, ela deve possuir pelo menos 3x1011 plaquetas. Devem ser conservadas entre 20 e 24ºC, sob agitação constante. Possuem validade de 3 a 5 dias, a depender do plastificante da bolsa de conservação. A confirmação da boa condição do concentrado de plaqueta é feita pela formação de ondas através da incidência de luz. O procedimento de aférese não é feito apenas para plaquetas, mas também pode ser feito a plasmaférese na terapêutica de doenças autoimunes, púrpura trombocitopênica trombótica e também pode ser usado a leucaférese para indivíduos que vão doar medula óssea, fazendo a coleta periférica do local que estão presentes mais células progenitoras, por meio do uso da medicação de colônia de granulócitos – estimula a ida das células da medula para regiões periféricas. TRANFUSÃO SANGUÍNEA 1. Requisição • Nome e sobrenome • Sexo, peso, idade • Número do prontuário ou registro do paciente • Número do leito, se internado • Diagnóstico, antecedentes transfusionais, hemocomponente solicitado com volume e quantidade • Tipo de transfusão • Resultados laboratoriais que justifiquem • Data, assinatura e CRM do médico solicitante A transfusão pode ser classificada de acordo com tipo de atendimento: extrema urgência – imediata, urgência – dentro de 3 horas, não urgente – dentro de 24 horas ou programada – realização em dia e horário marcado. 2. Provas pré-transfusionais mínimas • Repitificação ABO e Rh da bolsa de sangue Figura 2. Esquema de separação de hemocomponentes. Figura 3. Solicitação de hemocomponentes para transfusão. • Determinação do grupo ABO, fator Rh(D) e a pesquisa de anticorpos irregulares no sangue do receptor – contra hemácias desconhecidas 3. Transfusão de hemácias • Pré-operatório Em pacientes hígidos, ou seja, sem comorbidades, não ocorre indicação de elevar o hematócrito a 30%, sendo os valores entre 20 e 24% aceitáveis e seguros e hemoglobina entre 7 e 8g/dL. Em caso de complicações, deve-se fazer a transfusão, ou em casos perda maior de 500mL ou em sinais de hipóxia decorrente da perda aguda de sangue. Emcaso de cirurgias ortopédicas ou cardíacas, deve manter a hemoglobina cima de 8g/dL, já que apresenta grandes chances de hemorragia. Em caso de necessidade transfusão prévia pela condição do paciente, sempre que possível, evitar a transfusão nas 24 horas que antecedem a cirurgia, para evitar possível hiperviscosidade sanguínea durante o procedimento. • Clínica médica Raramente indicada em casos de hemoglobina superior a 9g/dL e está quase sempre indicada quando está menor que 7g/dL. Entre os valores de 6 e 7g/dL a decisão de transfusão deve ser tomada com base na análise individual de cada caso. Em pacientes com leucemia, coronariopatas, idosos a hemoglobina deve ser mantida igual ou superior a 8g/dL. • Hemorragia aguda Recomendada quando a perda volêmica é superior a 25 a 30% da volemia total, identificada por sinais de choque, como FC maior que 100-120bpm, hipotensão arterial, diminuição do débito urinário, enchimento capilar retardado (>2seg), aumento da FR, alteração do nível de consciência (ansiedade, obnubilação, síncope). Hematócrito não é um bom parâmetro após hemorragia. • Anemia hemolítica autoimune (AHAI) As provas pré-transfusionais são incompatíveis pela presença do auto-anticorpo (próprias células e outras) não inviabiliza a indicação, mas deve ser a avaliação do risco benefício. Para realização do procedimento deve ser assinado o Termo de Responsabilidade Médica para Transfusão com Prova Cruzada Incompatível. Caso o paciente esteja com Hb entre 5 e 6/dL, em bom estado, aguardando por evolução do quadro, não faz a transfusão, mas em caso de paciente com hemoglobina em índices mais baixos, com risco de morte, procura-se a bolsa mais adequada, como decisão compartilhada entre paciente, profissionais e paciente. • Dosagem Quantidade suficiente para corrigir os sinais, sintomas de hipoxia ou para que a dosagem de hemoglobina atinja níveis aceitáveis, geralmente 7/dL. Não é necessário elevar a hemoglobina aos níveis “normais” porque pode provocar hiperviscosidade. Uma bolsa de concentrado de hemácias, normalmente, eleva a hemoglobina em 1g, considerando um adulto médio, sendo o teor de hemoglobina de 55 a 60g. Não pode ser transfundido com nenhum outro tipo de medicamento, com exceção de soro fisiológico. A febre não é um fator que contraindica absolutamente à transfusão, mas deve ter um monitoramento maior. A hemácia pode ser transfundida de algumas formas e isso é demandado pela situação do paciente. ✓ Concentrado de hemácias fenotipadas Hemácias testadas para outros antígenos eritrocitários além do ABO e RhD, como o antígeno Kell, Duffy, Lutheran, Duffy, Cromer. Em caso de receber hemácias com esses antígenos, considerando um paciente que não os possui, não apresentará reações na primeira transfusão, mas já irá desenvolver anticorpos específicos, chamada aloimunização. Exemplos de casos de alta necessidade transfusional, paciente com leucemia, com anemia falciforme, talassemia major, síndromes mielodisplásicas, insuficiência renal são indicados a transfusão com concentrado de hemácias fenotipadas, em casos assim, é visto a importância de congelar as bolsas selecionadas. De modo geral, ocorre indicação para todos aqueles que possuem Pesquisa de Anticorpo Irregular (PAI) positiva e para doenças hematológicas que evoluem com anemia em programa transfusional ou com necessidade frequente. ✓ Concentrado de hemácias lavadas Obtido com solução isotônica compatível para eliminar a maior quantidade de plasma. É indicado em casos de reações transfusionais alérgicas graves e para paciente com deficiência de IgA (primeiro anticorpo a surgir em infecções de mucosas). Para a lavagem da bolsa, o sistema deve ser aberto e deve ser inserida a solução diversas vezes, podendo até reduzir a quantidade de hemoglobina presente nas hemácias. Em caso de reações alérgicas leves não deve ser utilizada. ✓ Hemocomponentes filtrados Retirada da maior quantidade possível de leucócitos, restando, geralmente valores menores que < 5x106 leucócitos por unidade de bolsa. O objetivo dessa realização é reduzir a liberação de citocinas, aloimunização, espécies patogênicas associadas, incidência de reações febris transfusionais, melhoria das condições de armazenamento de sangue. Ideal que já seja armazenada filtrada, porque se for filtrada antes da transfusão pode já ter acontecido a liberação das citocinas. A indicação ocorre em reação transfusional febril não hemolítica (RFNH), profilaxia de aloimunização HLA – reconhecimento de antígenos, transplante de medula óssea, prevenção de infecção por CMV, RN com peso <1,2Kg, pacientes candidatos ao transplante, pacientes transplantados, pacientes politransfundidos, doenças onco-hematológicas, insuficiência renal crônica. ✓ Hemocomponentes irradiados Exterminação dos linfócitos para evitar Prevenção da Doença Enxerto Contra Hospedeiro Relacionada a Transfusão Sanguínea, doença associada a proliferação de linfócitos T do doador no receptor, cuja mortalidade é de 90 a 100%. Indicada para RN prematuros ou de baixo peso (1,2Kg), transfusões entre familiares, exsanguíneo transfusão, transfusões HLA compatíveis, transplantes de medula óssea autólogos e alogênicos, doença de Hodgkin, portadores de imunodeficiência congênita, pós transplante de células do cordão. • Transfusão de plaquetas Profilaxia ou tratamento das manifestações hemorrágicas secundárias às plaquetopenias ou plaquetopatias. Indicado em situações que: ✓ <10.000/mm3 (ou <5.000/mm3) na ausência de sangramentos e de fatores de risco para sangramentos ✓ <20.000/mm3 na presença de fatores associados a eventos hemorrágicos como febre, acima de 38ºC, manifestações hemorrágicas menores (gengivorragia por escovação, equimoses), doença de enxerto versus hospedeiros ✓ <50.000/mm3 na presença de sangramentos A Púrpura Trombocitopênica Trombótica é contraindicada à transfusão de plaquetas. ✓ Procedimentos A dose depende da forma, se for randômica o indicado é uma unidade para cada 10kg de peso do paciente adulto, em pacientes pediátricos menores de 15Kg, a dose é de 5-10 mL/Kg. A infusão demora, em média, 30 minutos, não excedendo a velocidade de infusão de 23-30mL/Kg/hora. • Plasma fresco congelado Indicado para pacientes que possui deficiência combinada de fatores de coagulação, seu uso pode causar desregulação hemostática porque há infusão de grande quantidade de volume e promove muitas reações. Indicado em casos de hepatopatia, CIVD, sangramento por uso de warfarina caso complexo protombínico não disponível, transfusão maciça com sangramento por coagulopatia, Púrpura Trombocitopênica Trombótica. A dose é feita de 10-20mL/Kg de peso e aumenta em 20 a 30% os níveis de fatores de coagulação do paciente. Antes de ser utilizado deve ser completamente descongelado em banho- maria a 37ºC ou em equipamentos apropriados. • Crioprecipitado Indicado em deficiências de fibrinogênio quantitativa ou qualitativa ou deficiência de fator XIII quando o concentrado purificado não estiver disponível. Dose de 1 a 1,5 unidades para cada 10Kg. Dose pode ser diminuída quando houver administração concomitante de CH ou CP, pela presença de 2 a 4mg de fibrinogênio/mL, correspondendo a 2 unidades do produto. • Transfusão de granulócitos Suspensão de granulócitos obtida por aférese, com validade de 24 horas e sua conservação deve ser feito em temperaturas entre 20 e 24ºC, deve ser irradiado, não deve ser filtrado. Indicado para pacientes com neutropenia grave (<500/mm3) com infecção documentada e não responsiva a terapia por pelo menos 24 a 48 horas. Não tão utilizada. Figura 4. Procedimentos que precisam de transfusão de hemácias. Figura 4. Componentes presentes do plasma congelado.