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ALFABETIZAÇÃO E
LETRAMENTO
2 
 
SUMÁRIO 
LETRAMENTO ............................................................................................................ 3 
A História da Escrita .................................................................................................... 3 
Alfabetos Fenício e Hebraico ...................................................................................... 7 
A História da Alfabetização ......................................................................................... 9 
As Diferentes Concepções de Aprendizagem ........................................................... 12 
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) ...................................................................... 12 
A Teoria Construtivista de Piaget .............................................................................. 16 
A Concepção Histórico-cultural ................................................................................. 18 
O Conceito de Alfabetização ao Longo da História ................................................... 20 
Os Métodos de Alfabetização .................................................................................... 27 
As Contribuições de Emília Ferreiro: a Psicogênese da Língua Escrita .................... 35 
Os Diferentes Níveis do Processo de Construção da Escrita.................................... 41 
Nível Pré-silábico ...................................................................................................... 42 
Nível Silábico ............................................................................................................. 43 
Nível Alfabético ......................................................................................................... 46 
ALFABETIZAR LETRANDO: A CONSTRUÇÃO DE UMA PRÁTICA ........................ 48 
Saberes Necessários para Ler e Escrever ................................................................ 50 
Palavras, Consoantes e Vogais ................................................................................ 60 
Os Diferentes Tipos de Textos .................................................................................. 69 
O Ambiente Alfabetizador ......................................................................................... 79 
A Alfabetização com Textos ...................................................................................... 87 
Os “Erros” mais Comuns e Possíveis Estratégias de Intervenção ............................ 99 
Referências ............................................................................................................. 118 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3 
 
LETRAMENTO 
 
A História da Escrita 
O surgimento da escrita marca a história da humanidade. Podemos acreditar 
que, desde os primeiros tempos, o homem procurou registrar suas impressões sobre 
o mundo e comunicá-la a outros homens, utilizando para isso pedra, materiais 
inorgânicos e orgânicos à base de tintas vegetais e minerais. 
Na Pré-história, o homem já se comunicava através de desenhos feitos nas 
paredes das cavernas. Com esse tipo de representação (pintura rupestre), trocava 
mensagens, passava ideias e transmitiam desejos e necessidades. Porém, ainda não 
era um tipo de escrita, pois não havia organização, nem mesmo padronização das 
representações gráficas. 
Temos conhecimento de que a escrita foi inventada por volta de 3.300 antes de 
Cristo, pelos sumérios, na Mesopotâmia (atual Iraque). Acredita-se que uma das 
razões para a sua invenção foi a necessidade de registrar as atividades comerciais 
(compra e venda). A primeira forma de escrita foi a pictográfica, onde cada “desenho” 
representava um objeto ou um ser específico. 
Na fig.1 encontramos desenhos simplificados representando, de forma 
estilizada, uma cabeça de boi, a fim de designar boi. Já a fig. 2, que representa a 
mulher, é o desenho de um triângulo pubiano com a fenda da vulva. 
Os vários pictogramas empregados poderiam expressar uma ideia, surgindo, 
assim, o termo de escrita ideográfica, com sinais para palavras individuais ou 
conceitos. A fig. 3 representa mulher estrangeira, pois ao lado do triângulo pubiano 
(mulher) foi acrescentado o símbolo de montanha (vindas de outro lado da montanha, 
estrangeira). 
Por volta de 2.900 a.C. os pictogramas primitivos desapareceram, deixando de 
representar o objeto por ele designado para retirar o seu significado do contexto. 
Surge, então, a escrita cuneiforme, que possui esse nome por ser traçada em barro, 
formando uma suposta cunha. Essa escrita também utilizava pictogramas, porém não 
era uma criação livre do “escritor”. Foram encontrados verdadeiros “catálogos”, 
dicionários primitivos que apresentavam diferentes significados para o mesmo 
símbolo. Um desenho de pé podia dizer “andar”, “pôr-se de pé”, “transportar” etc. Os 
pictogramas podiam representar tanto ideias quanto objetos. Veja os exemplos 
abaixo: 
4 
 
Os pictogramas representam tanto ideias quanto objetos. 
Um pássaro e um ovo, lado a lado, significam 
“fecundidade”. 
Vários traços descendo do céu, “a noite”. 
Dois traços cruzados simbolizam “inimizade”. 
Dois traços paralelos, a “amizade”. 
Fonte: JEAN, G. A Escrita - memória dos homens. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002. 
 
Enquanto os símbolos cuneiformes riscam toda Mesopotâmia, outros sistemas 
de escrita nascem e se desenvolvem no vizinho Egito e, também, na longínqua China. 
De uma ponta a outra do mundo, os homens dedicam-se a transcrever sua história 
sobre a pedra, o barro e o papiro, vendo nisso um presente divino (JEAN, 2002: 25). 
Os caracteres da escrita egípcia são chamados de hieróglifos, palavra que 
significa “escrita dos deuses” (do grego hieros, “sagrado”, e gluphein, “gravar”). Eles 
também eram pictogramas, porém os desenhos eram muito rebuscados e estilizados 
constituindo uma verdadeira obra de arte. “Logo que a ‘escrita dos deuses’ começa a 
ser decifrada, ao prazer da compreensão une-se o prazer da contemplação.” 
No Egito, como na Mesopotâmia, saber ler e escrever era, ao mesmo tempo, 
privilégio e poder. Será que no mundo de hoje, principalmente no Brasil, isso é 
diferente? 
 
Fonte: JEAN, G. A Escrita - memória dos homens. Rio de Janeiro: 
Objetiva, 2002. 
Este conjunto de signos hieroglíficos é lido, excepcionalmente, da esquerda 
para a direita. O primeiro signo, à esquerda, lê-se “hb”. O segundo é determinativo: a 
perna demonstra tratar-se de uma palavra relativa a algo que passa com o pé. O 
terceiro é um pictograma figurativo: um homem que dança, significando o todo 
“dançar”. 
 
5 
 
No ano de 2000 a.C., a China inventa a escrita que 
perdura até hoje. É uma escrita marcada por pictogramas. 
A escrita chinesa é um caso único: “codificada em 1500 
antes da nossa era e constituída em sistema coerente 
entre 200 a.C. e 200 d.C., é perceptivelmente a mesma 
que os chineses leem e escrevem hoje”. Veja os exemplos 
abaixo: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fonte: JEAN, G. A Escrita - memória dos homens. Rio de Janeiro: 
Objetiva, 2002. 
 
Apesar de a escrita ideográfica ser datada dos primórdios da história, até hoje 
a utilizamos em diferentes culturas. Por exemplo: nas placas de trânsito, nas 
indicações de porta etc. 
Os símbolos foram sendo usados e aprimorados até que surgiu o fonetismo. 
Os sumérios e os egípcios passaram a usar os pictogramas não designando mais o 
objeto representado e sim um outro cujo nome lhe era foneticamente semelhante. É 
a aproximação da escrita com a fala. Nesta perspectiva, o desenho de um gato (chat) 
e um desenho de um pote (pot) passa a significar “chapeau” (chapéu). Esta 
“tecnologia da escrita” teve a sua origem em uma brincadeira infantil denominada 
rebus (do latim: res “coisa”, rebus “pelas coisas”). Era As guerras, motivadas pelo 
domínio territorial, fizeram com que algumas línguas fossem abafadas, enquanto 
outras difundidas. 
Com o passar do tempo, todasas civilizações sentiram necessidade de 
registrar suas ações do cotidiano, como as conquistas, festas, rituais etc. Para um 
grande número de povos, a escrita, cada vez mais, foi se tornando uma necessidade. 
Então, passaram a criar símbolos para poder representar as coisas e, cada vez mais, 
 
Alguns pictogramas, datados das 
origens da escrita chinesa, 
chegaram até nós. Há entre as 
formas antigas, à esquerda, e as 
formas modernas, à direita, 30 
séculos... 
Do alto para baixo: o sol, a 
montanha, a árvore, o meio, o 
campo, a fronteira, a porta. 
6 
 
esses símbolos foram sofrendo modificações e ganhando sons, tornando assim um 
alfabeto. 
A verdadeira revolução da escrita ocorreu em 1000 a.C., com a invenção do 
alfabeto, que tem origem com os fenícios, que emigraram para a margem oeste do 
Mediterrâneo, para o norte da África, o sul da Espanha, a Sicília, a Sardenha, Chipre, 
Grécia e Itália. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Na escrita chinesa, as “chaves”, um jogo muito parecido com o que 
conhecemos hoje em números de 214, colocadas ao lado de um outro caractere 
especificam lhes o sentido. O elemento “poder” (c), precedido da chave “água”(a), 
significa “rio”(d). Porém, o mesmo elemento associado à chave “palavra” (b) dá 
“criticar”(e). 
A escrita cuneiforme, os hieróglifos ou os caracteres chineses têm em comum 
transcrever palavras e sílabas. Saber ler e escrever, nesses sistemas, consiste em 
conhecer um grande número de signos ou de caracteres. 
Completamente diferente é o funcionamento do alfabeto, permitindo, a 
princípio, com cerca de 30 signos, tudo escrever. Todavia, não é tão simples assim, 
pois as 23 letras de nosso alfabeto não reproduzem todos os sons... Daí o os 
problemas cruciais encontrados pelos escolares no aprendizado da ortografia! Mesmo 
assim, 23 letras são muito menos do que mil caracteres do chinês popular, as algumas 
centenas de hieróglifos do povo egípcio e muitíssimo menos do que os 600 signos 
cuneiformes do aluno-escriba da Mesopotâmia. Por essa razão, muitos pensam que 
o aparecimento do alfabeto marca verdadeiramente o início da democratização do 
saber (JEAN, op. cit.: 52). 
7 
 
Primeiro surgiram os silabários, conjunto de sinais específicos para 
representar as sílabas, isto é, os sinais representavam sílabas inteiras em vez de 
letras individuais. 
Os fenícios inventaram um sistema reduzido de caracteres que representavam 
o som consonantal: é a chamada escrita fonética. Escolheram um conjunto de 
palavras cujo o primeiro som fosse diferente dos demais e para representá-lo 
graficamente escolheram higrógrafos egípcios cujo aspecto figurativo lembrava o 
significado das palavras da lista (21 sons). Não havia vogais. Por exemplo: a primeira 
palavra da lista era a palavra “alef”, que significava “boi”, e o hieróglifo escolhido foi o 
que representava a cabeça do boi. Sendo assim, a figura da cabeça do boi passou a 
representar o som inicial da palavra “alef”. Essa relação foi realizada com as 21 
palavras. Veja ao lado o alfabeto. 
Alfabetos Fenício e Hebraico 
 
Fonte: MAN, J. A. História do Alfabeto – como 26 letras transformaram o mundo 
ocidental. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002. 
Em seguida, os gregos adaptaram o sistema de escrita fenícia agregando as 
vogais e criando assim a escrita alfabética (alfabeto, palavra derivada de alfa e beta, 
as duas primeiras letras do alfabeto grego). Os gregos mantiveram o princípio 
acrofônico, ou seja, o som inicial do nome da letra é o som que a letra representa. 
 
 
Alfabeto Grego 
 
 
8 
 
 
A escrita grega foi adaptada pelos romanos, constituindo-se o sistema 
alfabético greco-romano, que deu origem ao nosso alfabeto. Os romanos 
dispensaram os “nomes especiais” das letras. Para eles bastava ter como nome da 
letra apenas o próprio som dela. “Foi assim que alfa, beta, gama, delta, épsilon etc. 
transformaram-se em a, bê, ce, dê, e etc.” (CAGLIARI, 1998: 17). Esse sistema 
representa o menor inventário de símbolos que permite a maior possibilidade 
combinatória de caracteres, isto é, com o alfabeto podemos escrever qualquer palavra 
de uma língua. É a possibilidade de registrar o pensamento. O homem agora pode 
escrever qualquer ideia ou sentimento. 
 
9 
 
As escritas árabe e latina são a origem de numerosos 
alfabetos. 
Ao lado temos uma inscrição romana do século III, que é lida 
da esquerda para direita. 
Fonte: JEAN, G. A Escrita - memória dos homens. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002. 
 
Com certeza, a invenção do alfabeto possibilitou ao homem ampliar a sua 
capacidade de expressão e de perpetuar a história da humanidade. Mas isso não quer 
dizer que tenha tornado simples a aquisição da língua escrita. 
(...) o alfabeto parece a própria essência da simplicidade, ‘tão fácil quanto o 
ABC’. Mas o sentido de simplicidade é traiçoeiro, pois o alfabeto é a aparência externa 
de profundezas linguísticas ocultas. Os seus poucos símbolos não são nada se 
comparados à complexidade de sons que representam, enquanto aqueles sons 
apenas sugerem a complexidade da própria língua (...). As nossas 26 letras formam 
uma grade que nos dá a nítida impressão de controle e compreensão. Olhe com mais 
cuidado e verá que está penetrando em um pântano que talvez tenha feito com que 
nosso escriba asiático desistisse na hora (...) (MAN, 2002: 85). 
 
A História da Alfabetização 
Qualquer sistema de escrita só é capaz de atravessar o tempo se as novas 
gerações se apropriarem dele. Para que isso aconteça, é essencial que aqueles que 
dominam o seu funcionamento ensinem aos outros como decifrá-lo. 
Podemos acreditar que na época primitiva da escrita, ser alfabetizado implicava 
apenas saber “ler” o que os símbolos significavam e ser capaz de “escrevê-los”, já 
que, provavelmente, se escrevia apenas um tipo de documento ou texto (anotações 
de compra e venda). Com o desenvolvimento do sistema escrito, houve um aumento 
significativo da quantidade de informações necessárias para saber ler e escrever, 
usando cada vez mais símbolos para representarem o som da fala. 
Acredita-se que: o longo processo de invenção da escrita também incluiu a 
invenção de regras de alfabetização, ou seja, as regras que permitem ao leitor decifrar 
o que está escrito e saber como o sistema de escrita funciona para usá-lo 
apropriadamente (CAGLIARI, 1998: 15). 
Temos informação que na Antiguidade as pessoas alfabetizavam-se 
aprendendo a ler algo já escrito e depois copiando. Iniciavam com palavras e 
10 
 
posteriormente, passavam para textos famosos, que eram “estudados” 
exaustivamente; para então chegar a escrever seus próprios textos. Muitos aprendiam 
sem ir à escola, já que não pretendiam tornar-se escribas. Com certeza, a curiosidade 
levou muita gente a aprendera ler para lidar com os negócios, comércio, ler obras 
religiosas ou obter informações sobre a cultura da época. 
A alfabetização, nesses casos, dava-se com a transmissão de conhecimentos 
relativos à escrita de quem possuía para quem queria aprender. Aprender a decifrar 
a escrita, ou seja, a ler relacionando os caracteres às palavras da linguagem oral, 
devia ser o procedimento comum. Aqui não era preciso fazer cópias nem escrever: 
bastava saber ler. 
Para se alfabetizar em um sistema de escrita que têm como base o princípio 
acrofônico, bastava decorar a lista dos nomes das letras, observar a ocorrência de 
consoantes nas palavras e transcrever esses sons. Por exemplo, “para escrever 
David, bastava identificar as consoantes DVD, procurar na lista de letras, aquelas que 
começavam com sons de D e V e escrevê-las”. Procure escrever a palavra David 
utilizando o alfabeto fenício apresentado anteriormente. 
Quando os gregos passaram a utilizar o alfabeto, aprender a ler e escrever 
tornou-se um uma tarefa de grande alcance popular. Surgem as “escolas de alfabeto”. 
A ortografia passa a fixar a forma de escrita das palavras, para evitar que falantes de 
dialetos diferentesescrevessem as mesmas palavras de maneiras diferentes, 
seguindo apenas a transcrição da própria fala e o valor sonoro do alfabeto. 
Os semitas, os gregos e os romanos nos deixaram alguns ‘alfabetos’: tabuinhas 
ou pequenas pedras ou chapas de metal onde se encontravam todas as letras, na 
ordem tradicional dos alfabetos. Na verdade, serviam de guia para as pessoas 
aprenderem a ler e a escrever, ou mesmo quando fossem escrever. Tais documentos 
foram, por assim dizer, as mais antigas “cartilhas” da humanidade: uma cartilha que 
continha apenas o inventário das letras do alfabeto (IBIDEM: 18). 
Na Idade Média, a alfabetização ocorreu menos nas escolas e passou a ser 
uma tarefa da vida privada. Quem sabia ler ensinava a quem não sabia, mostrando o 
valor fonético das letras em determinada língua, a forma ortográfica das palavras e a 
interpretação da forma gráfica das letras e suas variações. O fato de os aprendizes 
serem falantes da língua que estavam aprendendo/decifrando, se constituía em um 
facilitador da aprendizagem da escrita, pois ajudava nas tentativas de descobrir, entre 
as várias possibilidades a leitura correta. É o que acontece com as crianças de hoje 
11 
 
(e de sempre) que ao depararem, por exemplo, com a palavra RODA em um texto, 
não lerão [rôda], pois [róda] terá significado por fazer parte do seu acervo linguístico. 
No século XV, na Europa, começaram a aparecer as primeiras cartilhas 
(diminutivo de “carta”, no sentido de esquema, mapa de orientação) e gramáticas com 
o objetivo de estabelecer uma ortografia e ensinar o povo a escrever nas línguas 
vernáculas, abandonando o latim. Os textos destes livros são basicamente religiosos. 
Não temos muitos registros de quando e como começa a história da 
alfabetização no Brasil, mas com certeza a origem está nas cartilhas portuguesas. 
Podemos inferir que a história da alfabetização brasileira começa com a chegada dos 
jesuítas, em 1549. Foram eles que, de certa forma, apresentaram um sistema de 
escrita para os índios, sendo responsáveis pela escolarização catequização das 
crianças. 
Há notícias de que Portugal realizava remessas de livros escolares para as 
colônias, para que nelas se ensinassem a ler e escrever. Os jesuítas inauguraram na 
Bahia a primeira escola de leitura, escrita e religião. 
Acredita-se que Cartinha de Aprender a Ler, uma das mais antigas para ensinar 
o idioma português, tenha sido utilizada no Brasil. 
As cartilhas portuguesas marcam o início da literatura didática em nosso 
idioma. Além da cartilha de João de Barros, há notícias de uma cartilha elaborada por 
Frei João Soares, impressa em 1539 e reeditada várias vezes. Uma outra obra, o 
Método Castilho para o Ensino Rápido e Aprazível do Ler Impresso, Manuscrito e 
Numeração do Escrever, produzida por Antônio Feliciano de Castilho (1850), em 
Lisboa, também foi utilizada no Brasil. Esta obra incluía abecedário, silabário e textos 
de leitura, sendo marcada por preocupações fonéticas (BARBOSA, 1990: 57). 
Em 1876 surgiu a Cartilha Maternal, do poeta João de Deus Ramos. No 
prefácio o autor diz que o aluno que aprende por letras ou pelas sílabas “conduzido 
através de elementos inertes do pensamento, reduz-se à posição de repetidor de uma 
cambulhada de miudezas trivialíssimas, que não o divertem, nem o instruem, atrofiam-
lhe o espírito e deixam nele impresso o hábito da leitura mecânica, senão, muitas 
vezes, o selo do idiotismo” (BARBOSA, 1990: 57). O autor opunha-se aos métodos 
de soletração e silabação como pontos de partida para a aprendizagem da leitura. 
Esta cartilha marca a transição do abecedário do bê-a-bá para os métodos analíticos, 
que foram difundidos no Brasil durante a República. 
12 
 
Em nosso dia-a-dia também nos perguntamos: Por que alguns alunos 
aprendem e outros não? Por que uma determinada atividade atinge os seus objetivos 
para alguns alunos e para outros não? 
A concepção de como o desenvolvimento e aprendizagem humana acontecem 
dependerá da visão que se tem de mundo em um determinado momento histórico e 
persistirá enquanto for capaz de explicar a realidade, pelo menos para algumas 
pessoas. 
 
As Diferentes Concepções de Aprendizagem 
Mulheres e homens, somos os únicos seres que, social e historicamente, nos 
tornamos capazes de aprender. Por isso somos os únicos em quem aprender é uma 
aventura criadora, algo, por isso mesmo, muito mais rico do que meramente repetir a 
lição dada. Aprender para nós é construir, reconstruir, constatar para mudar, o que 
não se faz sem abertura ao risco e à aventura do espírito. 
Conhecendo um pouco da história da escrita e como esse conhecimento foi 
disseminado pelo mundo, algumas questões afloram: Como ocorre o conhecimento? 
O que nos difere dos animais? Essas são reflexões que geram muita inquietude e 
muitas pesquisas. 
Buscando apoio nas contribuições da psicologia para explicar como ocorre o 
conhecimento, encontramos a concepção inatista que defende os fatores internos 
(biológicos) como determinantes no processo de aprendizagem. Nesta perspectiva, 
os eventos que ocorrem após o nascimento não são essenciais e/ou importantes para 
o desenvolvimento do pensamento intelectual, visto que, nesta visão, o ser humano 
já nasce com suas qualidades e capacidades básicas prontas. 
 
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) 
13 
 
 
A natureza, dizem-nos, é apenas o hábito. Que significa isso? Não há hábitos 
que só se adquirem pela força e não sufocam nunca a natureza? É o caso, por 
exemplo, do hábito das plantas, cuja direção vertical se perturba. Em se lhe 
devolvendo a liberdade, a planta conserva a inclinação que a obrigaram a tomar; mas 
a seiva não muda, com isto, sua direção primitiva; e se a planta continuar a vegetar, 
seu prolongamento voltará a ser vertical. O mesmo acontece com os homens. 
(ROUSSEAU, J-J. Emilio. In: DAVIS, 1994, 27). 
Nesta concepção, a função da educação é interferir o mínimo possível no 
processo de desenvolvimento espontâneo do homem, já que, como preconiza o dito 
popular, “pau que nasce torto, morre torto”. Não tem jeito! 
Os inatistas buscaram seus fundamentos na Teologia, no Evolucionismo de 
Darwin, na Embriologia e na Genética. 
Na Teologia, a fundamentação se dá na máxima de que “Deus, de um só ato, 
criou cada homem em sua forma definitiva”. O que um bebê virá a ser já está 
determinado pela ‘Graça Divina’. 
Da Teoria Evolucionista de Darwin, os inatistas basearam-se numa leitura 
equivocada de que a evolução da espécie depende de mudanças graduais e 
cumulativas, que decorrem de variações hereditárias. Cabe ao ambiente selecionar 
os mais aptos. “Só os mais aptos de uma determinada espécie – aqueles capazes de 
se adaptar ao meio – sobreviveriam”. 
Já na Embriologia, buscaram subsídios em seus primeiros estudos que 
apontavam o desenvolvimento quase que invariável, sendo regulado por fatores 
endógenos (fatores internos). 
Para quem acredita nessa concepção, não vale a pena investir na educação, 
já que o professor pouco poderá contribuir para o desenvolvimento do aluno. O 
sucesso ou o fracasso escolar é visto como responsabilidade única e exclusiva do 
aluno, na medida em que a aprendizagem depende apenas de fatores internos. 
Ainda hoje encontramos muitos educadores que acreditam que os fatores 
internos são determinantes para a aprendizagem. É muito comum presenciarmos o 
diálogo a seguir: 
Professora A: - Eu não sei o que fazer para o Ricardo aprender a ler! Ele não 
acompanha a turma. 
Professora B: - Qual Ricardo? O irmão de Leandro dos Santos? 
14 
 
Professora A: - É! 
Professora C: - A família toda é assim. Os irmãos já passaram pela escola e 
não conseguiram. 
Professora B: - Puxaram aos pais. Eles são analfabetos. 
Professora C: - “Filho de peixe, peixinho é!” 
Em contraposição ao inatismo, a concepção ambientalista 
(comportamentalista ou behaviorista) considera que os fatores externos são 
determinantes no processode aprendizagem. Defende que o homem é um ser 
extremamente plástico, reativo à ação do ambiente. A experiência sensorial é a fonte 
do conhecimento, sendo assim a aprendizagem é entendida como um “processo pelo 
qual o comportamento é modificado como resultado da experiência” (IBIDEM: 33). 
Essa concepção teve em Skinner seu maior expoente. Para ele, manipulando-
se os elementos presentes no ambiente (estímulos) é possível controlar o 
comportamento, que é adquirido ao se estabelecer associações entre um estímulo e 
uma resposta, e entre uma resposta e um reforçador. Para os ambientalistas, o ser 
humano busca maximizar o prazer e minimizar a dor. 
Assim, o reforço é um instrumento utilizado para fazer com que os 
comportamentos considerados corretos permaneçam no indivíduo. Já a punição é 
utilizada para minimizar ou eliminar os comportamentos considerados inadequados. 
Nesta perspectiva, o planejamento das condições ambientais é determinante 
para a aprendizagem de novos comportamentos. Na escola, o professor passa a ter 
papel fundamental. O sucesso da aprendizagem depende dele, visto que é ele o único 
responsável pelo planejamento, organização e execução das atividades pedagógicas. 
A educação foi sendo entendida como tecnologia, ficando de lado a reflexão fi 
losófica sobre a sua prática. 
A organização das condições para que a aprendizagem ocorra exige clareza e 
respeito aos objetivos que se quer alcançar (objetivos instrucionais ou operacionais), 
a estipulação da sequência de atividades que levarão ao objetivo proposto e a 
especificação dos reforçadores que serão utilizados. 
Baseado nesta concepção, encontramos a repetição como um ‘método’ de 
aprendizagem. 
É comum ainda encontrarmos em algumas práticas pedagógicas, exercícios 
nos quais as crianças precisam escrever cinco vezes a mesma palavra, ‘resolver’ vinte 
15 
 
‘continhas’ de adição, responder a um questionário da mesma forma que o texto lido 
etc. Afinal, “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”. 
Podemos observar também que o erro é visto como um comportamento 
inadequado, e como tal, precisa ser extinto através da ‘dor’ (punição). Sendo assim, 
não é muito difícil encontrarmos crianças tendo que copiar três vezes a palavra errada, 
ficando de castigo (sendo privada da merenda, recreio ou das atividades que mais 
gostam) fazendo cópias etc., pois ‘Quando a cabeça não pensa, o corpo é que paga’. 
Você já parou para pensar por que falamos português? Por que somos fi lhos 
de brasileiros? Ou por que vivemos em um país que se fala português? Ou por que 
desde que nascemos estamos em contato com pessoas que falam português e que 
nos mostram o nome das coisas? 
Enquanto os inatistas priorizam os fatores internos e os ambientalistas, os 
fatores externos, a concepção interacionista nos faz pensar que “nem tanto ao mar 
nem tanto à terra”. 
Esta corrente teórica nos mostra que a aprendizagem e o desenvolvimento 
dependem da interação de fatores internos e externos. 
Nas concepções anteriores, o homem é visto como um ser passivo, não tendo 
participação no seu processo de aprendizagem, já que, ou ele nasce com suas 
potencialidades prontas ou o ambiente é que irá moldá-lo. Para os interacionistas, o 
homem é visto como um ser ativo ou interativo, participante do seu processo de 
aprendizagem, que é resultado da sua interação com o meio, sendo o meio entendido 
não apenas como ambiente físico, mas sim como um ambiente marcado pela cultura, 
num determinado momento histórico e em todas as relações interpessoais que são 
estabelecidas. 
É através da interação com outras pessoas, adultos e crianças, que desde o 
nascimento, o bebê vai construindo suas características (seu modo de agir, de pensar, 
de sentir) e sua visão de mundo (seu conhecimento). 
Desde que nascemos estamos interagindo com o mundo físico e social. É a 
partir dessas interações que vamos conhecendo as características e peculiaridades 
do mundo. 
A construção do conhecimento exige elaboração, ou seja, uma ação sobre o 
mundo. 
A aquisição de conhecimento é vista como um processo individual, construído 
durante toda a vida, no meio cultural. O conhecimento pode ser comparado a uma 
16 
 
espiral, onde as experiências anteriores servirão de base para novos conhecimentos, 
mediados pela relação que o indivíduo estabelece com o meio. O erro é encarado 
como parte do processo de aprendizagem, sendo importante para a prática 
pedagógica, pois a partir do “erro” o professor poderá compreender o processo de 
pensamento do aluno e planejar atividades que possibilitem avançar no seu 
conhecimento. A sabedoria popular há muito nos diz que: ‘quem tem boca vai a 
Roma’. 
Piaget e Vygotsky foram os maiores defensores da concepção interacionista. 
Apesar de enfatizarem que o conhecimento ocorre a partir da interação de fatores 
internos e externos, esses dois autores apresentam uma visão diferente de como 
ocorre a interação entre os mesmos. 
A Teoria Construtivista de Piaget 
 
Jean Piaget (1896-1980) 
Segundo Piaget, a busca do equilíbrio (ou adaptação com seu meio) é uma 
característica essencial do ser humano. Para ele, o “desenvolvimento cognitivo ocorre 
através de constantes desequilíbrios e equilibrações. O aparecimento de uma nova 
possibilidade orgânica no individuo ou a mudança de alguma característica do meio 
ambiente, por mínima que seja, provoca a ruptura do estado de repouso, da harmonia 
entre organismo e meta – causando um desequilíbrio”. 
Para voltar a uma nova situação de equilíbrio, dois mecanismos são 
acionados. É o que Piaget denominou de assimilação (o organismo não altera a sua 
estrutura) e acomodação (o organismo é obrigado a alterar a sua estrutura para se 
17 
 
ajustar às novas demandas impostas pelo meio). Assimilação e acomodação são 
processos distintos e opostos, que ocorrem simultaneamente. 
Quando estamos diante de um novo conhecimento (desafio) nos sentimos 
desequilibrados intelectualmente. Buscamos a partir das nossas experiências 
anteriores, desenvolvermos ações destinadas a atribuir significações aos elementos 
do ambiente com os quais interagimos (assimilação). Quando esses conhecimentos 
não são sufi cientes para dar conta do desafio (estado de equilíbrio), precisamos 
ampliar ou modificar nossas ações (físicas ou mentais) para atingirmos o novo 
conhecimento (acomodação). 
Quando jogamos uma bola de soprar para uma criança (desafio), ela fará uso 
do esquema pegar (postura de braço, mão e dedos) que já é conhecido por ela, 
atribuindo ao balão o significado de ‘objeto que se pega’ – assimilação. Porém, o 
esquema ‘pegar’ precisará ser modificado para se ajustar às características do objeto: 
a abertura dos braços, dos dedos e a força utilizada para segurá-lo é diferente da que 
se utiliza para pegar uma bola de plástico, de papel ou de couro – acomodação. 
Posteriormente, ao ser desafiada a pegar uma bola de gude, mais uma vez os seus 
esquemas terão que se modificar (acomodação) ao novo objeto. 
Pense em um aluno que já consegue fazer uma adição e que na escola 
estamos apresentando para ele a multiplicação (desafio/desequilíbrio). Com certeza 
saber somar parcelas iguais (assimilação) é um esquema mental necessário para a 
multiplicação. Porém, não é sufi ciente. Ele precisará modificar esse esquema para 
compreender o conceito de multiplicação (acomodação) e consequentemente 
distinguir o momento de utilizá-la. 
Para Piaget, o desenvolvimento é um processo contínuo, caracterizado por 
quatro fases diversas (etapas ou períodos). Em cada etapa, a criança constrói certas 
estruturas cognitivas, que se constituem em uma forma específica de pensar e atuar 
no mundo. Ele as denominou de sensório-motora (do nascimento aos 2 anos de 
idade, aproximadamente), pré-operatória (2 anos até aproximadamente aos 7 anos), 
operatório-concreta (7 anos até aos 12 anos, aproximadamente) e 
operatórioformal (a partir dos 13 anos). 
ParaCláudia Davis (1994), o modelo Piagetiano, que pretende ser universal, é 
fortemente marcado pela maturação, pois é ela a responsável pelo fato de as crianças 
sempre apresentarem determinadas características psicológicas em uma mesma 
faixa etária. 
18 
 
Desenvolvimento cognitivo e aprendizagem não se confundem: o primeiro é um 
processo espontâneo que se apoia no biológico. Aprendizagem, por outro lado, é 
encarada como um processo mais restrito, causado por situações específicas (como 
frequência à escola) e subordinado tanto a equilibração quanto à maturação (DAVIS, 
1994: 46). 
Um outro conceito muito importante na teoria piagetiana é o conceito de 
autonomia, que é a capacidade de agir por si mesmo, levando em consideração os 
fatos relevantes para decidir e agir da melhor forma para todos. Esse conceito se opõe 
ao de heteronomia que significa dependência da forma de agir e pensar. Sendo assim, 
a grande finalidade da escola seria contribuir para a formação de sujeitos autônomos. 
A Concepção Histórico-cultural 
Já para Vygotsky, desenvolvimento e aprendizagem são processos que estão 
inter-relacionados. Na medida em que o sujeito aprende, ele se desenvolve, e esse 
desenvolvimento leva a novas aprendizagens. 
 
Lev Semionovitch Vygotsky (1896-1934) 
Os processos de desenvolvimento não coincidem com os processos de 
aprendizado. Ou melhor, o processo de desenvolvimento progride de forma mais lenta 
e atrás do processo de aprendizado; desta sequenciação resultam, então, as zonas 
de desenvolvimento proximal (VYGOTSKY, 1991:102). 
Na teoria histórico-cultural, a educação escolar assume papel relevante, pois 
apesar de afirmar que o aprendizado do sujeito começa muito antes de se frequentar 
a escola, diz que o “aprendizado não é desenvolvimento; entretanto, o aprendizado 
adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento 
vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de 
19 
 
acontecer”; logo, “o aprendizado escolar produz algo fundamentalmente novo no 
desenvolvimento da criança”. 
O conceito de zona de desenvolvimento proximal é uma das grandes 
contribuições de Vygotsky para a prática educativa. 
Para ele há, pelo menos, dois níveis de desenvolvimento: o real e o potencial 
(ou proximal). 
No primeiro nível, as funções mentais da criança já se estabeleceram como 
resultado de certos ciclos completados, ou seja, são conhecimentos que já estão 
consolidados. Ela não precisa de ajuda para resolver uma determinada situação. O 
nível potencial refere-se àquilo que a criança consegue fazer, porém, ainda com a 
ajuda de pessoas mais experientes (adultos ou crianças). 
Assim sendo, para Vygotsky (1991), zona de desenvolvimento proximal é “a 
distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através 
da solução independente de problemas e o nível de desenvolvimento potencial, 
determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em 
colaboração com companheiros mais capazes” . 
Aquilo que hoje é desenvolvimento potencial será amanhã desenvolvimento 
real. O desenvolvimento é um processo dinâmico e contínuo. 
A partir desses conceitos, podemos inferir que o papel do professor não é 
apenas constatar aquilo que o aluno já sabe (nível real), mas sim atuar na zona de 
desenvolvimento proximal, possibilitando a ele vivenciar situações que lhe desafi em, 
fazendo-o avançar nos seus conhecimentos (nível potencial). 
Vygotsky ressalta a importância do outro no processo de aprendizagem. Somos 
capazes de aprender porque estamos o tempo todo sendo mediados pelo outro 
(através da pessoa física, do livro, do fi lme, da TV etc.) que nos ‘apresenta o 
mundo’, ou seja, somos inseridos na cultura, levados à apropriação dos 
conhecimentos que estão disponíveis na sociedade. 
A linguagem tem papel fundamental nesse processo, pois é através dela que 
vamos interagir com as outras pessoas, internalizando os novos conceitos. 
Você deve estar se perguntando o que essas teorias têm a ver com 
alfabetização e letramento? 
Podemos responder: TUDO, pois é através da concepção que temos de como 
se dá a aprendizagem que iremos construir a nossa prática pedagógica. 
20 
 
Como já falamos anteriormente, não pretendemos aqui aprofundar nenhuma 
das teorias apresentadas, pois além de não ser o objetivo deste material, seria 
impossível visto a complexidade das mesmas. Quisemos apenas ressaltar alguns 
aspectos que podem nos ajudar a refletir sobre a prática escolar e o processo de 
alfabetização das crianças. 
 
ALFABETIZAÇÃO X LETRAMENTO? 
O Conceito de Alfabetização ao Longo da História 
 
Todos os problemas da alfabetização começaram quando se decidiu que 
escrever não era uma profissão, mas uma obrigação, e que ler não era marca de 
sabedoria, mas de cidadania. 
Emília Ferreiro 
Ao conhecermos um pouco da história da alfabetização no Brasil, podemos 
perceber que este conceito vem sendo modificado ao longo dos anos e que, 
consequentemente, isso tem repercussões diretas na prática pedagógica. 
Mas por que esse conceito vem sendo modificado? Ser alfabetizado não é 
saber “decifrar os códigos” da escrita? 
Provavelmente, durante algum tempo, saber decifrar o código escrito era 
garantia de alfabetização e era sufi ciente para se apropriar dos conhecimentos de 
uma determinada sociedade, em um determinado momento histórico. Mas, 
certamente, nos últimos séculos e, principalmente, nas últimas décadas, isso não é 
mais satisfatório. 
As transformações ocorridas na história da Humanidade impõem, cada vez 
mais, novas necessidades e aprimoramento das ações de ler e escrever. Ler hoje não 
21 
 
exige as mesmas habilidades que há 50 anos. A velocidade com que os 
conhecimentos são produzidos e as informações são divulgadas, atualmente, exige 
um leitor com muito mais estratégias de leitura, sendo capaz de organizar e articular 
as informações para dar sentido ao texto. 
Como nos lembra Emília Ferreiro (2002: 13), “os verbos “ler” e “escrever” 
deixaram de ter uma definição imutável: não designavam mais (e tampouco designam 
hoje) atividades homogêneas. Ler e escrever são construções sociais. Cada época e 
cada circunstância histórica dão novos sentidos a esses verbos”. 
Em 1958, a UNESCO definiu como alfabetizado o sujeito capaz de ler 
compreensivamente ou escrever um enunciado curto e simples relacionado à sua vida 
diária. Aqui já fica claro que não basta mais decifrar o código. É necessário saber 
utilizar a escrita, mesmo que de forma simples, no dia-a-dia. Porém, muitos que 
passavam pela escola, concluíam o período de alfabetização e aprendiam a “decifrar 
o código”, não eram capazes de compreender o que liam e de se comunicarem através 
da escrita. Será que já superamos isso? 
Dentro desta perspectiva, analfabeto é aquele que não consegue ler e nem 
escrever textos simples, como um bilhete, por exemplo. 
Em 1978, a própria UNESCO propôs a adoção do conceito de alfabetização 
funcional, considerando a pessoa capaz de utilizar a leitura e a escrita para fazer 
frente às demandas de seu contexto social e de usar essas habilidades para continuar 
aprendendo e se desenvolvendo ao longo da vida, como alfabetizada funcional. 
No Brasil, durante muitas décadas, foi considerado alfabetizado aquele que era 
capaz de assinar o seu nome. Essa era, inclusive, a forma de garantia de cidadania. 
Antes da constituição de 1988, só os “alfabetizados” possuíam direito ao voto e para 
tirar o título de eleitor, bastava saber “desenhar o nome” (assinar). 
O IBGE, responsável por recensear a população brasileira e divulgar o 
quantitativo de analfabetos no país, utilizava como metodologia para contar os 
analfabetos apenas as respostas dadas, pelos entrevistados, se sabiam ou não 
assinar o nome. 
Atualmente, o IBGE considera alfabetizada a pessoa de 5 anos ou mais de 
idade, capaz de ler e escrever pelo menos um bilhetesimples no idioma que 
conhecesse e analfabeta a que aprendeu a ler, mas esqueceu, e aquela que apenas 
assina o próprio nome (IBGE, 2005). Porém, a forma de coletar essa informação é a 
resposta dada à pergunta: “Você sabe ler e escrever?”, pelos entrevistados. Não 
22 
 
podemos ter certeza se aqueles que respondem sim são capazes, realmente, de ler 
e escrever um bilhete simples. 
Nos anos 90, o IBGE passou a divulgar também índices de analfabetismo 
funcional, seguindo as recomendações da Unesco, tomando como base não a 
autoavaliação dos respondentes, mas o número de séries escolares concluídas. Por 
este critério, são analfabetas funcionais as pessoas com menos de quatro séries 
escolares concluídas. 
Estes índices têm sido objeto de muitas pesquisas no meio acadêmico. 
Em 2001, foi criado o INAF (Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional), uma 
parceria do Instituto Paulo Montenegro (IBOPE) e Ação Comunitária, medindo 
diretamente as habilidades da população por meio de testes. O objetivo desse 
indicador, é gerar informações que ajudem a dimensionar e compreender o fenômeno 
do alfabetismo funcional e fomentam o debate público sobre ele e orientam a 
formulação de políticas educacionais e propostas pedagógicas. 
Em todo o mundo, a modernização das sociedades, o desenvolvimento 
tecnológico, a ampliação da participação social e política colocam demandas cada vez 
maiores com relação às habilidades de leitura e escrita. A questão não é mais apenas 
saber se as pessoas conseguem ou não ler e escrever, mas também o que elas são 
capazes de fazer com essas habilidades. Isso quer dizer que, além da preocupação 
com o analfabetismo, problema que ainda persiste nos países mais pobres e também 
no Brasil, emerge a preocupação com o alfabetismo, ou seja, com as capacidades e 
usos efetivos da leitura e escrita nas diferentes esferas da vida social (RIBEIRO, 2006: 
1). 
O INAF procura responder, dentre outras, as seguintes questões: quais são as 
habilidades de leitura e escrita dos brasileiros? Quantos anos de escolaridade e que 
tipo de ação educacional garantem níveis satisfatórios de alfabetismo? Que outras 
condições favorecem o desenvolvimento de tais habilidades ao longo da vida? 
Além do conceito de analfabetismo, o INAF distingue três níveis de habilidades 
na população alfabetizada: o nível rudimentar, o básico e o pleno. Ainda que os três 
níveis tenham algum grau de funcionalidade, ou seja, correspondam a habilidades 
que as pessoas podem aplicar em determinados contextos, somente o nível pleno 
pode ser considerado como satisfatório, aquele que permite que a pessoa possa 
utilizar com autonomia a leitura e a matemática como meios de informação e 
aprendizagem. 
23 
 
Acesso em 20/06/2007. 
Nestes cinco anos de pesquisas, alguns resultados do INAF nos fazem refletir 
sobre o conceito de alfabetização: 
• A grande maioria da população brasileira (68%) na faixa etária de 15 a 
64 anos, que estudou até a 4ª série do Ensino Fundamental, atinge, no máximo, o 
nível rudimentar. 
• Mais grave ainda: 13% deste grupo podem ser considerados analfabetos 
em termos de habilidades de leitura e escrita e 4% sequer conseguem identificar 
números em situações cotidianas. 
• Dentre os que cursaram da 5ª a 8ª série, apenas ¼ pode ser considerado 
plenamente alfabetizado, enquanto a maioria se enquadra no nível básico de 
Veja a seguir a descrição de cada nível. Que nível de Alfabetismo você 
possui? 
 Leitura Habilidades Matemáticas 
Analfabetismo 
Não domina as habilidades 
medidas. 
Não domina as habilidades medidas. 
Alfabetismo 
Nível 
Rudimentar 
Localiza uma informação simples 
em enunciados de uma só frase, um 
anúncio ou chamada de capa de 
revista, por exemplo. 
Lê e escreve números de uso frequente: 
preços, horários, números de telefone. 
Mede um comprimento com fi ta 
métrica, consulta um calendário. 
Alfabetismo 
Nível Básico 
Localiza uma informação em textos 
curtos ou médios (uma carta ou 
notícia, por exemplo), mesmo que 
seja necessário realizar inferências 
simples. 
Lê números maiores, compara preços, 
conta dinheiro e faz troco. Resolve 
problemas envolvendo uma operação. 
Alfabetismo 
Nível Pleno 
Localiza mais de um item de 
informação em textos mais longos, 
compara informação contida em 
diferentes textos, estabelece 
relações entre as informações 
(causa/efeito, regra geral/caso, 
opinião/ fato). Reconhece a 
informação textual mesmo que 
contradiga o senso comum. 
Consegue resolver problemas que 
envolvem sequências de operações, 
por exemplo, cálculo de proporção ou 
percentual de desconto. Interpreta 
informação oferecida em gráficos, 
tabelas e mapas. 
Fonte: RIBEIRO, Vera Masagão. Analfabetismo e Alfabetismo funcional no Brasil. Disponível em: 
www.reescrevendoaeducação.com.br/2006. 
24 
 
alfabetismo, tanto na leitura quanto nas habilidades matemáticas. Permanecem no 
nível rudimentar, tanto na leitura quanto na matemática, 24% deste grupo. 
• Dos que completaram o Ensino Médio, 56% dos brasileiros apresentam 
pleno domínio das habilidades de leitura e escrita e 49% atingem um nível pleno de 
alfabetismo em termos de habilidades matemáticas. 
Hoje a concepção de alfabetização da Unesco inclui o desenvolvimento de 
conhecimentos e competências necessários para o indivíduo inserir-se e movimentar-
se com desenvoltura no meio social, entre os quais o domínio de novas linguagens e 
tecnologias. 
Você já deve ter percebido o quão complexo é o conceito de alfabetização e 
que ele é muito mais do que decodificar a escrita. Porém, desde os primórdios, a 
palavra alfabetização sempre esteve associada ao ensino da leitura e da escrita como 
aquisição de uma técnica. 
(...)técnica dos traçados das letras, por um lado, e técnica da correta oralização 
do texto, por outro. Só depois que dominada a técnica é que surgiam, como num 
passe de mágica, a leitura expressiva (resultado da compreensão) e a escrita eficaz 
(resultado de uma técnica posta a serviço das intenção do produtor). Acontece que 
essa passagem mágica da técnica para a arte só foi transposta, naqueles lugares 
onde a escola mais faz falta, por pouquíssimos escolarizados precisamente pela 
ausência de uma tradição histórica de ‘cultura letrada’ (FERREIRO, 2002: 13). 
Para explicitar que se espera da alfabetização mais do que “decifrar letras”, 
foram sendo utilizadas as expressões “alfabetização plena”, “alfabetização integral”, 
“alfabetização total” que apontam para uma prática de alfabetização que perpassa 
pela aquisição e uso da leitura e escrita nos contextos sociais. Dentro dessa nova 
concepção, surge o termo letramento13 para designar “um estado, uma condição: o 
estado ou condição de quem interage com diferentes portadores de leitura e de 
escrita, com diferentes gêneros e tipos de leitura e de escrita, com as diferentes 
funções que a leitura e a escrita desempenham na nossa vida. Enfim: letramento é o 
estado ou condição de quem se envolve nas numerosas e variadas práticas sociais 
de leitura e de escrita” (SOARES, 2001: 44). 
O termo letramento aparece em oposição ao termo alfabetização. Letrado é 
compreendido como aquele que aprende a ler e escrever, usa a leitura e a escrita, 
envolve-se em suas práticas, tornando-se, uma pessoa diferente. Já o alfabetizado é 
25 
 
aquele que adquire a tecnologia da escrita, aprende a codificar em língua escrita e a 
decodificar a língua escrita, podendo tornar-se letrado ou não. 
Alguns autores, como Emília Ferreiro, dizem ser desnecessário a criação do 
termo letramento, pois compreendem que “a alfabetização não é mais entendida como 
mera transmissão de uma técnica instrumental, realizada numa instituição específica 
(a escola)” (FERREIRO, 2002: 40). Outros autores, porém, defendem a utilização do 
termo letramento, como Soares (01) argumentando que: 
(...) Entretanto, contraditoriamente, este novo conceito de aprendizagemda 
leitura, estreitamente relacionado com práticas de leitura, com a formação de um 
verdadeiro leitor, vem convivendo com a persistência do conceito restrito e tradicional 
de aprendizagem da leitura como a mera aquisição da tecnologia da escrita, como 
apenas formação de um decodificador da escrita (...) (Soares, 2005: 1). 
Observando a prática pedagógica que ocorre em nossas escolas, podemos 
distinguir nitidamente aquelas que ainda concebem a alfabetização como apenas uma 
tecnologia daquelas que a compreendem como apropriação (tornar “própria”) da 
língua escrita. 
Assim, teríamos de alfabetizar e letrar como duas ações distintas, mas não 
inseparáveis, ao contrário: o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e 
escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o 
indivíduo se tornasse, ao mesmo tempo, alfabetizado e letrado. 
Letramento pressupõe uma mudança de lugar social, do modo de viver na 
sociedade, de inserção na cultura. Implica também em tornar-se cognitivamente 
diferente. “A pessoa passa a ter uma forma de pensar diferente da forma de pensar 
de um analfabeto ou iletrado”. Traz também consequências linguísticas, pois o 
convívio com a língua escrita acarreta mudança no “uso da língua oral, nas estruturas 
linguísticas e no vocabulário”. 
Será que ser analfabeto, em uma sociedade grafocêntrica, condena o sujeito 
a não ser letrado? Um analfabeto pode ser letrado? A Mafalda é ou não letrada? 
Querendo ou não, vivemos em uma sociedade onde a escrita se faz presente. 
Se letrado é aquele que vivencia as práticas de leitura e escrita que estão presentes 
em uma sociedade, podemos dizer que aquele que não domina a tecnologia 
(alfabetizado) pode ser letrado. A Mafalda não sabe ler nem escrever, não domina a 
tecnologia da escrita, mas conhece muito bem a função da escrita. 
26 
 
 
Assim, um adulto pode ser analfabeto, porque marginalizado social e 
economicamente, mas vive em um meio em que a leitura e a escrita têm presença 
forte, se interessa-se em ouvir a leitura de jornais feita por um alfabetizado, se recebe 
cartas que outros leem para ele, se dita cartas para que um alfabetizado as escreva 
(e é significativo que, em geral, dita usando vocabulário e estruturas próprios da língua 
escrita), se pede a alguém que lhe leia avisos ou indicações afixados em algum lugar, 
esse analfabeto é, de certa forma, letrado, porque faz uso da escrita, envolve-se em 
práticas sociais de leitura e escrita. Da mesma forma, a criança que ainda não se 
alfabetizou, mas já folheia livros, finge lê-los, brinca de escrever, ouve histórias que 
lhe são lidas, está rodeada de material escrito e percebe seu uso e sua função, essa 
criança é ainda “analfabeta”, porque não aprendeu a ler e escrever, mas já penetrou 
no 
 
Existem vários níveis de letramento, que vai desde identificar um rótulo de uma 
embalagem até à leitura de um texto científico, como uma tese de doutorado. Acredita-
se que o nível de letramento de grupos sociais relaciona-se fundamentalmente com 
as suas condições sociais, culturais e econômicas. 
Soares (2001) destaca a necessidade de condições para o letramento. Mas 
que condições seriam essas? 
1- Escolarização real e efetiva da população – A necessidade de 
letramento surge quando se amplia o acesso à escolarização. Com mais pessoas 
sabendo ler e escrever, “passando a aspirar a um pouco mais do que simplesmente 
saber ler e escrever”. 
2- Disponibilidade de Material de Leitura – Criar condições para aqueles 
que aprenderam a ler e escrever fi quem imersos em um ambiente de letramento, com 
acesso aos livros, revistas e jornais, às livrarias e bibliotecas. 
 
Fonte: QUINO. Toda Mafalda - da primeira à última tira. São Paulo: Martins Fontes, 2000. 
27 
 
Os Métodos de Alfabetização 
 
Fonte: QUINO. Toda Mafalda - da primeira à última tira. São Paulo: Martins Fontes, 2000. 
No Brasil, agregado à discussão sobre o que é ser alfabetizado, sempre 
tivemos o olhar do professor centrado na eficácia de processos e métodos de 
alfabetização. Como alfabetizar? Qual o melhor método? Que cartilha usar? Essas 
são perguntas que acompanham a prática docente e que refletem a concepção de 
aprendizagem que o educador possui. 
Até meados dos anos 80 do século passado, havia uma polarização entre 
processos sintéticos e analíticos, direcionados ao ensino do sistema alfabético e 
ortográfico da escrita. 
Os processos sintéticos são os mais antigos, tendo mais de 2000 anos. 
Consideram a língua escrita objeto de conhecimento externo ao aprendiz. Têm como 
ponto de partida o estudo dos elementos da língua (letra, fonema, sílaba). 
Pressupõem o estabelecimento da correspondência entre o som e a grafia. 
Nesta concepção, encontramos os métodos de soletração, o fônico e o 
silábico, tendências ainda fortemente presentes nas atuais propostas didáticas. Tais 
métodos privilegiam os processos de decodificação, as relações entre fonemas (sons 
ou unidades sonoras) e grafemas (letras ou grupos de letras) e uma progressão de 
unidades menores (letra, fonema, sílaba) a unidades mais complexas (palavra, frase, 
texto). 
O ensino parte do simples para o complexo, na visão do professor. Só se 
avança no processo se todas as Dificuldades da fase anterior estiverem consolidadas. 
A leitura é considerada como um esquema somatório: pela soma dos 
elementos mínimos (fonema ou sílaba) o aluno aprende a palavra. Pela soma das 
palavras, a frase. Pela soma das frases, o texto. 
Quando se analisa o sistema alfabético, enquanto sons convertidos em códigos 
gráficos, fica claro que existem certas semelhanças perceptivas gráficas (a letra d e a 
28 
 
letra b, por exemplo) e certas semelhanças sonoras (a letra v e a letra b, por exemplo). 
Logo um dos critérios de simplicidade – sempre vista pela lógica do adulto – 
recomendava, na apresentação sequencial dos elementos da língua, evitar 
proximidade entre sons e grafias semelhantes. 
Por outro lado, como a questão era evidenciar através do ensino certo 
paralelismo entre sons e grafias do alfabeto, parece claro que aqueles elementos que 
apresentam uma relação biunívoca entre som e grafia (o som fonema f com a letra f, 
por exemplo) seriam considerados mais simples do que aqueles que apresentam 
correspondências múltiplas entre letras e sons (os sons da letra s, por exemplo). Daí 
outro critério estabelecido: na apresentação sequencial dos elementos da língua 
escrita, o processo começa pelas correspondências mais simples, ou seja, aquelas 
que sejam biunívocas, pois algumas relações são mais simples e outras, mais 
complexas (BARBOSA, 1990:48). 
Os processos sintéticos enfatizam a consciência fonológica e a aprendizagem 
do sistema convencional da escrita (importantes ao processo de alfabetização), mas 
deixam de explorar as complexas relações entre fala e escrita, suas semelhanças e 
diferenças. A linguagem oral e a linguagem escrita são dois conhecimentos distintos. 
Com certeza, tudo que pensamos e sentimos pode ser representado pela oralidade e 
pela escrita, porém com recursos diferentes. 
Dão tanta ênfase à decodificação que, muitas vezes, resulta em propostas que 
descontextualizam a escrita, seus usos e funções sociais, enfatizando situações 
artificiais de treinamento de letras, fonemas ou sílabas. É muito comum encontrarmos 
nas cartilhas desses métodos frases completamente desconexas como: “O boi baba 
na babá”, “A foca afia a faca” etc. Com certeza essas frases não são encontradas nos 
textos que circulam na sociedade e “retratam” situações um tanto quanto inusitadas. 
Você já viu alguma foca usando faca? E afiando a faca? 
Em contraposição aos processos sintéticos, temos os processos analíticos, que 
valorizam a análise e a compreensão de sentidos, propondo uma progressão 
diferenciada: de unidades mais amplas (palavra, frase, texto) a unidades menores 
(sílabas ou sua decomposição em grafemas e fonemas).São exemplos dessa 
abordagem os métodos de palavração (palavra decomposta em sílabas), de 
sentenciação (sentenças decompostas em palavras) e o global de contos (textos 
considerados como pontos de partida, até o trabalho em torno de unidades menores). 
29 
 
Foi Nicolas Adam, que, em 1787, propôs que a aprendizagem da língua escrita 
deveria partir de palavras com significado para as crianças. Ele compara o 
aprendizado da escrita com o aprendizado da fala, alegando que não falamos primeiro 
os sons das letras, para depois aprendermos as sílabas, as palavras, as frases, para 
finalmente mantermos um diálogo. 
Segundo esta abordagem, o prévio é o reconhecimento global de palavras ou 
orações; a análise dos componentes é uma tarefa posterior. 
Não importa a dificuldade auditiva daquilo que se aprende, já que a leitura é 
uma tarefa predominantemente visual. 
(...) Já encontramos aí os fundamentos da formulação ideovisual: ler é mais 
importante que decifrar; o sentido do texto tem mais importância que o som do texto; 
a aprendizagem parte de palavras com significado afetivo e efetivo para as crianças. 
Segundo Adam, a análise da palavra deveria ocorrer numa etapa bem posterior ao 
domínio do capital de palavras aprendidas globalmente. Pouco tempo depois, Jacotot, 
outro precursor do método global, recomenda que esta análise das palavras se inicie 
precocemente, o mais rápido possível (BARBOSA, op. cit.: 50). 
Essa concepção ainda persiste nas práticas docentes atuais. Os métodos 
analíticos contemplam algumas das capacidades essenciais ao processo de 
alfabetização – sobretudo o estímulo à leitura de unidades com sentido, pelo 
reconhecimento global das mesmas. Entretanto, quando incorporados de forma 
parcial e absoluta, acabam enfatizando construções artificiais e repetitivas de 
palavras, frases e textos, muitas vezes apenas a serviço da repetição e da 
memorização, com objetivo de manter controle mais rígido da sequência do processo 
e das formas de interação gradual da criança com a escrita. Neste aspecto, podemos 
afirmar que os métodos sintéticos e os analíticos se aproximam por entenderem que 
o processo de aprendizagem está baseado na memorização. 
Nas últimas décadas a discussão sobre a eficácia de processos e métodos de 
alfabetização, que passaram a ser identificados como propostas “tradicionais”, ficou 
secundária. O foco central passou a ser a discussão sobre a psicogênese da aquisição 
da escrita, uma abordagem de grande mudança conceitual no campo da 
alfabetização, que foi sistematizada por Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1985) e por 
vários outros teóricos e pesquisadores. A ênfase deixa de ser o método de ensino e 
passa a ser a o processo de aprendizagem da criança que se alfabetiza e suas 
30 
 
concepções progressivas sobre a escrita, que é entendida como um sistema de 
representação e não como um código. 
Essa nova abordagem entende também que a aprendizagem é de natureza 
conceitual e não mecânica, e que a escrita é um objeto sociocultural do conhecimento. 
Barbosa (1990) apresenta um quadro-resumo fazendo um contraponto das 
principais características dos dois grandes eixos de abordagem da leitura e da 
alfabetização: 
 
 ABORDAGEM TRADICIONAL NOVA ABORDAGEM 
ORIGEM 
- Ensino coletivo e simultâneo 
(década de 1880, na Europa). 
- Nos anos 70, a partir das 
pesquisas desenvolvidas pela 
Psicolinguística sobre o 
comportamento do leitor no ato 
da leitura. 
MÉTODOS 
- Sintéticos: alfabético 
silábico fônico 
- Analíticos: palavração 
 sentenciação conto 
- Analítico-sintético. 
- Pedagogia de Projeto 
(situações funcionais de 
leitura). 
CONCEPÇÃO 
DE ESCRITA 
- A língua como: 
1º) objeto de análise 
2º) objeto de uso 
- Sistema simbólico de 
segunda ordem, subordinado à 
fala. 
- Sem autonomia quanto ao 
significado. 
- Saber escolar. 
- A língua como: 1º) 
objeto de uso 
2º) objeto de análise 
- Sistema de linguagem, 
paralelo e equivalente à 
linguagem oral 
- Portadora direta do 
sentido (autonomia em relação 
à fala). 
- Saber social. 
31 
 
CONCEPÇÃO DE 
APRENDIZAGEM 
- Objetivo: alfabetizar (dizer 
o sistema alfabético). 
- Baseada no processo de 
ensino (o método). 
- Uso escolar da escrita. 
- Desprezo pelas aquisições 
extraescolares. 
- Uniforme, cumulativa, 
pontual (progressão hierarquizada 
passo a passo, do simples para o 
complexo). 
- Utiliza a fala como 
referencial (estigmatizando as 
variantes de registro). 
- Privilegio absoluto do 
mecanismo de transcodificação. 
- O professor ensina: o aluno 
aprende (repete): E/R. 
- Para ler é preciso analisar a 
escrita. 
- Aprender para fazer. 
- Sentido privilegiado: a 
audição (leitura auditiva). 
- Pressupõe a 
homogeneidade do saber das 
crianças. 
- Crença na possibilidade de 
ensino de estratégias ao leitor. 
- Conquista individual e 
competitiva do saber. 
- Simulação de situações de 
leitura. 
- Objetivo: inscrição da 
criança no circuito da 
comunicação escrita. 
- Baseada no processo 
de aprendizagem (a 
construção de um saber ou 
prática). 
- Promove situações 
reais de leitura/escrita. 
- Intervenção numa 
etapa de um processo já 
iniciado fora da escola. 
- Intervenções 
diversificadas e heterogêneas. 
- Utiliza o processo de 
aprendizagem da fala como 
referencial. 
- Informação geral / 
informação específica. 
- Mudança na escola: o 
lugar privilegiado para a 
criação de situações de 
leitura/escrita. 
- Mergulho na escrita 
social: é lendo que se aprende 
a ler. 
- Fazer para aprender. 
- Sentido privilegiado: a 
visão (leitura visual). 
- Confronto de 
estratégias e Dificuldades do 
grupo 
- Baseada em 
estratégias desenvolvidas pelo 
leitor, sustentada por 
intervenções precisas. 
- Troca de informações 
no grupo; socialização do 
saber. 
32 
 
- Familiaridade com a 
multiplicidade de situações 
sociais de leitura. 
 
CONCEPÇÃO DE 
ESCOLA 
- Detentora do 
monopólio da escrita. 
- Único lugar onde 
ocorre a aprendizagem da 
leitura (baseada numa 
concepção escolar dessa 
aprendizagem). 
- Promotora da “escrita 
escolar”. 
- Não detentora do 
monopólio da escrita. 
- Espaço 
privilegiado(entre outros) onde 
a criança, através de um 
conjunto de intervenções, 
desenvolve sua condição de 
leitor. 
- Promotora do uso social 
da escrita. 
PRÉ-REQUISITOS - Maturidade para 
leitura/escrita. 
- Experiências prévias do leitor 
no mundo social da escrita. 
33 
 
ETAPAS DE ENSINO - Pré-alfabetização (pré-
escola). 
- Alfabetização. 
- Pós Alfabetização. 
- Construção individual 
(equilíbrio, contradição, novo 
equilíbrio) da compreensão 
escrita como comunicação 
social, interpessoal, no coletivo 
e no social. 
MATERIAL DE LEITURA - Cartilha. 
- Quadro de giz. 
- Silabário/jogos 
carimbos. 
- Literatura infantil. 
- Utilização da 
diversidade e abundância da 
escrita no mundo. 
- Biblioteca/Centro de 
documentação. 
PAPEL DO 
PROFESSOR 
- É aquele que ensina e 
transmite seu saber. 
- Ensina uma técnica 
pré-programada. 
- Informa, demonstra, 
corrige. 
- É aquele que intervém 
numa determinada etapa do 
processo. 
- Cria situações 
favoráveis ao desenvolvimento 
de estratégias pelo leitor 
aprendiz. 
- Propõe, organiza, 
promove, informa, seleciona, 
questiona, participa, sistematiza 
técnicas de acesso e 
apreciação da escrita. 
ESTRATÉGIAS DE 
LEITURA 
- Correspondência som/grafia: 
transformação de uma cadeia 
de sinais sonoros que permite 
(ou não!) extrair um significado 
do texto. 
- Familiaridade visual 
com palavras e frases. 
- Exploração direta da 
escrita, portadora de sentido 
sem mediação oral. 
- Mobilização do saber e 
experiência do leitor, anterior e 
exterior à escrita. 
- Intencionalidade do 
leitor: o questionamento do 
texto. 
34 
 
- Estratégias adaptadas 
a escritos específicos: fl 
exibilidade. 
- Hipótese,antecipação, 
verificação, identificação. 
- Dicionário. 
- Contexto. 
- Perguntar a terceiros. 
- Saltar palavras. 
FUNÇÃO DA 
DECIFRAÇÃO 
- Causa da aprendizagem da 
leitura (da decifração à leitura). 
- Consequência da 
aprendizagem da leitura. 
- Aquisição subjacente à 
leitura. 
- É o “plus” da leitura (cf. 
Smith). 
CARACTERÍSTICAS DA 
LEITURA 
- Baseada na decifração. 
- Leitura silabada, lenta, 
hesitante. 
- Estacionada no tempo. 
- Sentido extraído do 
texto oralizado. 
- Dificuldade quanto ao 
significado. 
- Tendência à 
vocalização e subvocalização. 
- Tendência à regressão 
no texto. 
- Monovalente e integral. 
- Baseada no sentido. 
- Leitura fluente, flexível, 
segura. 
- Adaptada às 
necessidades das sociedades 
modernas. 
- Sentido atribuído ao 
texto escrito. 
- Fonte de informação, 
orientação, prazer. 
- Leitura silenciosa. 
- Uso de múltiplas 
estratégias. 
- Polivalente/seletiva. 
CARACTERÍSTICA DO 
LEITOR 
- Aquele que adquire o hábito 
de sonorizar a escrita: um leitor 
de letras. 
- Aquele que, diante das 
questões que o mundo lhe 
propõe, sabe que pode 
encontrar respostas relevantes 
na escrita e domina estratégias 
diversificadas de exploração do 
texto. 
35 
 
ATIVIDADE DE 
ESCRITA 
- Escrita de um modelo: 
cópia, ditado, redação, leitura 
oral. 
- Escrita de sons 
(problemas ortográficos: a 
palavra é escrita como se 
pronuncia). 
- Simulação de 
situações de escrita (redação 
escolar). 
- Escrita do sentido, no 
contexto. 
- Ortografia: reprodução 
de formas visuais (escrita, 
língua para os olhos). 
- Apoiada nas 
necessidades de expressão 
pessoal. 
AVALIAÇÃO - Do produto: mede a 
capacidade do aprendiz de 
reproduzir o que foi ensinado 
- Leitura oral: controle da 
combinatória 
- Do processo: ponto de 
referência para reorganizar a 
intervenção do ensino (a leitura 
em voz alta corresponde a uma 
situação particular de leitura) 
Fonte: BARBOSA, J. J. Alfabetização e Leitura. [s.l.]: Cortez, 1990. 
 
As Contribuições de Emília Ferreiro: a Psicogênese da Língua Escrita 
(...) Tudo o que foi colocado muda radicalmente se tomarmos como objetivo 
escolar a aquisição da língua escrita, se reconhecermos que não há proeminência da 
leitura sobre a escrita – enquanto atividades que permitem conhecer esse modo 
particular de representação da linguagem – e reconhecermos também (como mostram 
abundantemente os dados de investigações recentes em diversos países da América 
Latina) que as crianças não chegam ignorantes à escola, que têm conhecimentos 
específicos sobre a língua escrita, ainda que não compreendam a natureza do código 
alfabético e que são esses conhecimentos (e não as decisões escolares) que 
determinam o ponto de partida da aprendizagem escolar. 
 
Emília Ferreiro 
Não poderíamos falar de alfabetização sem abordar as contribuições de Emília 
Ferreiro. Nas últimas três décadas, as suas pesquisas têm norteado a discussão sobre 
o tema. Não pretendemos aqui discorrer sobre todo o seu trabalho, mas destacar 
alguns aspectos dos seus estudos e pesquisas, que contribuem para se pensar a 
alfabetização. 
36 
 
Emília Ferreiro não criou um método de alfabetização. Ela buscou explicar 
como se dá a psicogênese da língua escrita, ou seja, procurou observar como a 
criança constrói, se apodera, da linguagem escrita. 
O seu trabalho demonstra, de forma categórica, que a escrita não é um código, 
mas sim um sistema de representação que é apropriado pelo sujeito por meio do 
contato que ele tem com a língua escrita, mediado por outros sujeitos. Daí a sua 
afirmação de que só se aprende escrever escrevendo. 
“Ler não é decifrar, escrever não é copiar”. 
Emília Ferreiro 
Ela tentou conhecer a maneira como as crianças concebem o processo de 
escrita, o que pensam e quais hipóteses organizam sobre a leitura e a escrita. 
Percebeu que as crianças pequenas, por exemplo, acreditam que tanto se pode ler 
um desenho como uma palavra, porque ainda não conseguem distinguir os tipos de 
representação (desenho e palavra) do objeto. 
Identificou também que em outra fase as crianças já “distinguem” o que pode 
ser palavra, logo pode ser lido, daquilo que não é palavra. Ao pedir que tentassem ler 
“palavras” como as abaixo, as crianças afirmavam que não podiam ler a primeira e a 
segunda, pois só tinham letras iguais. Já a terceira podia ser lida pois tinha letras 
diferentes, mesmo sem ter algum significado na língua materna. Isso demonstra que 
elas possuíam a hipótese de que para ser lido (palavra) há necessidade de se ter 
letras diferentes. 
 
Emília afirmou que existe “um processo de aquisição da linguagem escrita que 
precede e excede os limites escolares”. A escola é apenas um dos espaços de 
aprendizagem da linguagem escrita e não o único. Todos os contatos/experiências 
vividos pela criança fazem parte da elaboração da sua construção. Daí a importância 
das experiências vivenciadas pelas crianças dentro e fora da escola. 
Esses conhecimentos, apresentados por Emília Ferreiro, possibilitaram deixar 
de pensar, apenas, em como se ensina (professor), para focar o processo de 
aprendizagem (aluno). 
Jean Piaget obrigou-nos a abandonar a ideia de que nosso modo de pensar é 
o único legítimo e obrigou-nos a adotar o ponto de vista do sujeito em 
37 
 
desenvolvimento. Isto é fácil de dizer, mas muito difícil de aplicar coerente e 
sistematicamente (FERREIRO, 1987: 68). 
Ao olhar o processo de aprendizagem, do ponto de vista do sujeito que aprende 
(aluno), o que era considerado erro passa a ser visto como sinalizador de como o 
sujeito está pensando, construindo o seu conhecimento. 
O erro passa a ser construtivo, pois ele reflete a construção de conhecimento 
do aprendiz e aponta para o professor a necessidade de intervenções pedagógicas 
adequadas. 
Vejamos a escrita abaixo, que é de uma menina com 5 anos de idade. 
 
Se olhássemos apenas a sua escrita (PSIO) diríamos que ela não sabe 
escrever, que essas quatro letras não formam a palavra passarinho e que “comeu 
letras”. Porém, se analisarmos o seu texto, veremos que ela possui uma hipótese 
sobre a linguagem escrita. Pensa que apenas uma letra é capaz de representar o som 
da sílaba. Observe que ela não escreve letras aleatórias, ela escreve uma letra para 
cada sílaba da palavra, estabelecendo uma relação sonora. Veja: 
 
Segundo Ferreiro (1987), é necessário estabelecer a diferença entre a 
construção de um objeto de conhecimento (linguagem escrita) e a maneira pela qual 
fragmentos de informação fornecidos ao sujeito são incorporados ou não como 
conhecimento, pois apesar de estarem relacionados, são processos distintos e essa 
compreensão implicará em uma prática pedagógica diferenciada. 
Para ela, as crianças que vivem em ambientes urbanos, desde o seu 
nascimento, estão expostas a materiais escritos e a ações sociais de escrita, obtendo 
diversas informações acerca de alguns tipos de relações entre ações e objetos. Pode 
saber, por exemplo, que usamos letras para escrever, o que é e para que serve uma 
carta, sem saber “escrever” e, muito menos, que tipo de texto é uma carta. 
38 
 
Com certeza, os conhecimentos prévios adquiridos no ambiente social 
ajudarão muito no processo de construção da linguagem escrita, mas não serão sufi 
cientes para a construção do objeto (linguagem escrita). 
A construção do objeto de conhecimento implica muito mais que mera coleção 
de informações. Implica a construção de um esquema conceitual que permita 
interpretar dados prévios e novos dados (isto é, que possa receber informações e 
transformá-la em conhecimento); um esquema conceitual que permita processos de 
inferência acerca de propriedades não-observadas de um determinado objeto e a 
construção de novos observáveis, na base do que se antecipou e do que foi verificado. 
Como já dissemos anteriormente, a pesquisa de Emília Ferreiro foi influenciada 
por Piaget, seuorientador, que afirmava que as respostas do sujeito são apenas a 
manifestação externa de mecanismos internos de organização e que as respostas só 
podem ser classificadas de “corretas” ou “incorretas”, quando tomamos o ponto de 
vista do observador (na maioria das vezes, o professor) como sendo o único legítimo. 
(...) Até há poucos anos as primeiras tentativas de escrever feitas pelas 
crianças eram consideradas meras garatujas, como se a escrita devesse começar 
diretamente com letras convencionais bem traçadas. Tudo o que ocorria antes era 
simplesmente considerado como tentativas de escrever e não como escrita (...). Não 
se supunha que a execução de tais garatujas ocorresse simultaneamente com algum 
tipo de atividade cognitiva (...). Mais ainda: quando as crianças começavam a traçar 
letras convencionais, porém numa ordem não-convencional, o resultado era 
considerado uma “má” reprodução de alguma escrita que por certo, teriam observado 
nalgum outro lugar. 
Veja o texto abaixo, escrito por uma menina de 6 (seis) anos, em junho. O que 
você acha deste texto? O que essa menina já sabe sobre a língua escrita? 
Podemos afirmar que aqui no Brasil, antes do trabalho de Emília Ferreiro, a 
escola “não autorizava” a escrita espontânea. As crianças só escreviam aquilo que 
havia sido “ensinado” pelo professor. Só era aceita a escrita que estava próxima à 
convencional (ortográfica). Aqueles que “escreviam diferente” eram considerados 
problemáticos e encaminhados aos especialistas (fonoaudiólogos, psicólogos ou 
psicopedagogos). 
 
39 
 
Com certeza esse texto é bem diferente dos que encontramos nas cartilhas. 
Ele está bem próximo dos textos que estão presentes na sociedade (texto 
narrativo), nos livros de literatura. 
Vejamos o que esta menina já sabe e pensa sobre a língua escrita: 
• Sabe que para escrever usamos letras e não rabiscos, números etc. 
• Sabe que a palavra é um conjunto de letras que representa uma ideia 
e que por isso, não basta colocar qualquer letra. 
• Sabe que há uma relação sonora na escrita. 
• Sabe que há padrões na escrita, ou seja, palavras iguais serão 
sempre grafadas iguais. 
• Pensa que a escrita é uma transcrição da fala. Por isso, escreve 
algumas palavras do mesmo jeito que oraliza, inclusive juntando-as e/ou 
segmentando-as. 
• Sabe contar uma história (início, meio e fim). 
• Sabe as características específicas de um texto narrativo, como conto 
de fadas (final feliz) e as utiliza de forma adequada (“viveram felizes para sempre”). 
Você percebeu que um olhar cuidadoso, investigativo pode revelar o que o 
aluno já sabe e como pensa? Percebeu que como “saber olhar” muda a qualificação 
do “erro”? 
Esta menina ainda precisa construir alguns conceitos ortográficos, mas com 
certeza já compreendeu que a escrita é um sistema de representações. 
O texto acima demonstra que as crianças pensam sobre a escrita e que esta 
não é aprendida por meio de cópias ou exercícios mecânicos. É um trabalho de 
reflexão, o aprendiz precisa compreender seu processo de construção e suas 
normas de produção. 
40 
 
Para Emília Ferreiro, as crianças reinventam a escrita e seu aprendizado é 
um processo de construção pessoal, que de certa forma, recria o processo de 
construção da escrita vivenciado pela humanidade: “a ontogênese repete a 
filogênese”. 
Os resultados das pesquisas de Emília Ferreiro permitem que, conhecendo 
a maneira como a criança concebe o processo de escrita, as teorias pedagógicas 
e metodológicas apontem caminhos a fim de que os erros mais frequentes no 
processo de alfabetização possam ser evitados, desmistificando certos mitos 
vigentes em nossas escolas. Por isso, afirmamos que construtivismo é uma 
fundamentação metodológica e não um método em si, pois não pretende apontar 
o passo a passo para a alfabetização, mas sim princípios que devem nortear a 
prática pedagógica. 
Para Emília Ferreiro e Ana Teberosky, a grande maioria das crianças, na 
faixa dos seis anos, já faz corretamente a distinção entre texto e desenho, sabendo 
que o que se pode ler é aquilo que contém letras. Algumas crianças ainda persistem 
na hipótese de que tanto se podem ler as letras quanto os desenhos. As 
pesquisadoras acreditam que isso é consequência do pouco contato que a criança 
possui com o material escrito. Sendo assim, uma boa prática pedagógica deve 
garantir o acesso das crianças aos textos escritos que estão presentes na 
sociedade. 
Ao observar o processo de construção da escrita de inúmeras crianças, 
Emília Ferreiro constatou que este processo atravessa alguns níveis, que 
representam as hipóteses que as crianças elaboram sobre a escrita. 
Isso não significa que a criança que pensa que uma letra é sufi ciente para 
grafar uma sílaba, por exemplo, escreverá todas as palavras desta forma até criar 
uma nova hipótese. O que observamos nos seus textos é o predomínio de alguma 
hipótese, porém, poderemos ter até palavras grafadas ortograficamente corretas, 
pois a familiaridade com elas a fez decorá-las e não “questioná-las”. 
Podemos perceber também que as crianças, em um determinado momento, 
possuem diferentes hipóteses sobre a escrita e vão testando-as. É muito comum 
encontrarmos em um mesmo texto, a mesma palavra grafada de formas diferentes. 
Outra situação muito comum é uma criança escrever uma palavra 
ortograficamente correta em um texto e dias depois escrever a mesma palavra de 
forma diferente. Às vezes, ela muda a grafia do seu próprio nome 
41 
 
(Márcia/Marssia/Marsia), pois começa a refletir sobre as informações recebidas 
sobre as possíveis formas de grafar o mesmo som. 
Por mais que pareça que há uma “regressão” na aprendizagem da escrita, 
esses “erros” demonstram que a criança está pensando, raciocinando sobre a 
língua e ainda não estabilizou a sua hipótese, ou seja, ela ainda não construiu o 
conceito necessário para dominar determinada característica do sistema de 
representação que é a escrita. 
Veja o texto abaixo, produzido por um menino de 6 anos, para a reescritura 
da fábula de Esopo. Observe como ele escreve os verbos no passado e como ele 
utiliza o “L” e o “U” no final das palavras. 
 
Percebemos que ele sabe fazer a flexão dos verbos para o passado e que 
percebe também o som das letras “L” e “U” no final das palavras, que é muito 
parecido, porém, ele ainda não tem certeza em que situação deve usá-las (questão 
meramente ortográfica), por isso grafa sel (seu), largol (largou) e penssou 
(pensou). Toda a sua grafia não é aleatória, representa os seus conhecimentos e 
reflexões sobre a linguagem escrita. 
 
Os Diferentes Níveis do Processo de Construção da Escrita 
Passaremos a descrever, de forma sucinta, os níveis identificados por Emília 
Ferreiro no processo de construção da escrita. Lembramos que estas fases são 
divisões meramente didáticas, para que possamos compreender melhor este 
 
42 
 
processo. Segundo a autora, não há um tempo específico para as crianças 
passarem por determinado nível e nem para permanecerem nele. Sendo a escrita 
uma construção individual, cada sujeito vivenciará este processo de forma 
particular, dependendo das experiências vivenciadas e das 
mediações/intervenções ocorridas (por adultos ou crianças). 
 
Nível Pré-silábico 
Neste nível, a criança começa a diferenciar desenho e escrita. Suas 
tentativas dão-se no sentido da reprodução dos traços básicos da escrita com que 
elas se deparam no cotidiano. O que vale é a intenção, pois, embora o traçado seja 
semelhante, cada um “lê” em seus rabiscos aquilo que quis escrever. Desta 
maneira, cada um só pode interpretar a sua própria escrita, e não a dos outros. 
A criança elabora a hipótese de que a escrita dos nomes é proporcional ao 
tamanho do objeto ou a que está se referindo. Nesta lógica, a palavra “elefante” 
deve ser muito maior (ter mais letras) que a “formiga”. Não há uma relação sonora. 
A hipótese central é de que para ler coisas

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