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/
DEFINIÇÃO
Identificação dos principais conceitos de Marshall McLuhan (1911-1980) sobre os meios de
comunicação de massa e as críticas ao teórico. Apresentação do hibridismo nos meios de
comunicação e as sensorialidades acionadas pelas diversas mídias, bem como as mudanças nos
papéis de produtor e de consumidor de conteúdo na era digital.
PROPÓSITO
Discutir a passagem da cultura impressa para a digital a fim de identificar diferentes práticas de
produção e consumo da informação de acordo com os meios e compreender o cenário atual de
mídia e suas potencialidades.
/
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Reconhecer os conceitos de meios quentes e meios frios de McLuhan e as principais críticas ao
teórico
MÓDULO 2
Definir hibridismo, comparando sensorialidades despertadas pelas mídias impressa, digital,
audiovisual e móvel
MÓDULO 3
Comparar os conceitos de mídias de massa e de nicho e os papéis de produtor e de consumidor
de conteúdo no cenário atual
MÓDULO 4
Comparar os efeitos do texto linear e do hipertexto em contextos cross-media, transmídia e
multimídia
/
INTRODUÇÃO
Você sabia que tocamos nossos smartphones, em média, 2.617 vezes por dia? Isso significa
consultá-los 109 vezes por hora, de acordo com Tozzi e Gómez (2018). Em breve, preveem os
especialistas, consumiremos cada vez mais informações em dispositivos vestíveis, que dispensam
o uso das mãos, como óculos e relógios inteligentes, conectados à internet. Será que esses
aparelhos podem ser considerados extensões do corpo humano?
MÓDULO 1
 Reconhecer os conceitos de meios quentes e meios frios de McLuhan e as principais críticas
ao teórico
Autor do livro Os meios de comunicação como extensões do homem (1974), o canadense
Marshall McLuhan, um dos teóricos mais controversos da Comunicação no século XX, foi tão
reverenciado quanto criticado. Em 1977, ele chegou a fazer uma ponta no filme Noivo Neurótico,
Noiva Nervosa, de Woody Allen, em que contesta um professor de mídia que discorria sobre seu
pensamento em uma fila de cinema. Com o surgimento da internet e o desenvolvimento do campo
/
dos estudos de cibercultura, McLuhan voltou a ficar em evidência, como veremos no fim deste
módulo.
McLuhan cunhou a expressão “o meio é a mensagem”, partindo da premissa de que os meios de
comunicação não são tecnologias neutras. Até então, os estudos no campo da Comunicação
davam mais ênfase ao conteúdo das mensagens do que à forma como elas se apresentavam e
eram veiculadas. McLuhan se deteve nas características materiais dos suportes em que as
mensagens eram transmitidas para verificar a influência que exerciam sobre nós.
 
Fonte:Shutterstock
 Marschall McLuhan em 1945.
UM EXEMPLO: A MESMA INFORMAÇÃO VEICULADA EM UM
JORNAL, OUVIDA EM UMA RÁDIO OU ASSISTIDA NA
TELEVISÃO ACIONARIA DIFERENTES PERCEPÇÕES NOS
LEITORES, OUVINTES E TELESPECTADORES. OS MEIOS
INFLUENCIAM O MODO COMO SENTIMOS E PENSAMOS.
Mouillaud (1997, p. 29) também analisa a questão:
/
À PRIMEIRA VISTA, A EMBALAGEM E O OBJETO
PODEM SER SEPARADOS SEM QUE O OBJETO PERCA
SUA IDENTIDADE; ENTRETANTO, UM PERFUME
CONTINUA A SER UM PERFUME SEM SEU FRASCO? O
LIMITE MATERIAL ESTÁ EVIDENTE, E O LIMITE
SIMBÓLICO?
Ou seja, o mesmo perfume despertará diferentes percepções dependendo da embalagem em que
ele se apresentar. No caso do jornal, o mesmo texto impresso pode ser veiculado em um website.
Mas ele provocará no leitor e no usuário a mesma experiência e os mesmos significados nos dois
suportes? Mesmo depois de 30 anos do lançamento do primeiro website, o senso comum tende a
classificar o suporte impresso ainda como mais crível que os suportes digitais.
 
Fonte:Shutterstock
Mas nem sempre o meio impresso esteve entre os mais prestigiados. O filósofo francês Régis
Debray (1993), em seu livro Curso de Midiologia Geral, ressalta que, no início de sua utilização, o
papel não desfrutava de credibilidade. Prova disso foi o fato de as universidades terem mantido
durante muito tempo os canudos de formatura confeccionados com pele para a colação dos
/
alunos. Posteriormente, foi a vez de os livros de bolso provocarem indignação nos meios literários
por serem vistos como uma profanação do livro convencional. Portanto, assim como Mouillaud,
Debray acredita que não há como se menosprezar o valor simbólico da materialidade dos
suportes.
VALOR SIMBÓLICO DA MATERIALIDADE DOS
SUPORTES
Não é à toa que ouvimos com frequência as expressões “Deu no jornal” ou “Vi na televisão”
como sinônimos de credibilidade. Uma pesquisa do Datafolha (MARQUES, 2020), realizada
em meio à pandemia de coronavírus, revelou que programas jornalísticos da TV (61%) e
jornais impressos (56%) lideraram no índice de confiança do público, seguidos de programas
jornalísticos de rádio (50%) e sites de notícias (38%). Podemos partir da premissa de que as
principais notícias, como decisões e pronunciamentos de autoridades e organismos
internacionais, foram informadas por todos os veículos. Entretanto, o jornal e a TV
despontam como mais merecedores de crédito por parte da população do que os sites.
Um dos maiores historiadores da leitura, o francês Roger Chartier também acentua a importância
da forma na comunicação, ressaltando a influência dos suportes materiais na compreensão dos
significados das mensagens. Chartier (1998) observa, por exemplo, que um romance de Balzac
pode ser recebido de maneira diferente, mesmo sem que uma linha do texto tenha sido mudada,
caso ele seja publicado em um folhetim, em um livro ou em uma coletânea.
Voltando a McLuhan, ele sustenta que a forma como experimentamos a realidade é mediada
pelos sentidos. Desse modo, cada meio de comunicação acionaria predominantemente um ou
vários sentidos humanos. Cada novo meio introduzido alteraria a relação entre os nossos
sentidos, modificando nossa forma de experimentar o mundo. Embora seus estudos tenham sido
motivados pelo advento da televisão, McLuhan volta à época da tradição oral, antes da invenção
da escrita, para fazer valer seu raciocínio.
javascript:void(0)
/
DA CULTURA ORAL PARA A IMPRESSA E A
ELETRÔNICA
Em Galáxia de Gutenberg, publicado em 1962, os capítulos indicam a divisão proposta por
McLuhan entre a oralidade, a escrita e a era eletrônica. Antes da invenção do alfabeto fonético,
éramos marcados pela cultura da oralidade. McLuhan lembra que, em uma conversa presencial
entre as pessoas, todos os sentidos estavam presentes: gestos, cheiros, ambiente, audição e
visão se articulavam simultaneamente. A invenção da escrita teria reduzido o espaço para a
oralidade e nos guiado em direção a uma cultura visual, separando os sentidos que se
entrecruzavam antes. Na leitura, o sentido que prevalece é a visão.
ALFABETO FONÉTICO
Antes dele, havia a escrita pictográfica ou hieroglífica, quando os sistemas, baseados em
figuras e símbolos, ainda não representavam sons.
O ALFABETO FONÉTICO É CAPAZ DE TRADUZIR O
AUDÍVEL E O TÁTIL NO VISÍVEL E NO ABSTRATO.
BARBOSA, 2017.
Segundo Barbosa (2017), McLuhan sustenta que a consequência da adoção da escrita
reconfigurou nossa cultura para um mundo visual, baseado na abstração, na linearidade e no
javascript:void(0)
/
individualismo. Todos os sentidos continuaram a ser acionados ainda para a obtenção de
conhecimento, mas a confirmação passou a ser pela visão: é preciso ver escrito para crer.
A prensa de Gutenberg, para McLuhan, acelerou ainda mais a característica visual de nossa
cultura devido à uniformidade no formato das letras. Ele demarca uma diferença crucial entre a
cultura manuscrita e a impressa. Na primeira, a leitura era ainda mais social, feita em voz alta, não
havia índice nem numeração das páginas, como nos livros. Com a prensa de Gutenberg, tem
origem um processo de mecanização, que inaugura o modo linear de produção. A leitura passa a
ser predominantemente silenciosa, nossos olhos passam a acompanhar as páginas da esquerda
para a direita e as frases e orações dependem de uma relação de causalidade entre elas.
 
Fonte:Shutterstock Prensa de tipos móveis de 1811, em exposição em Munique, Alemanha.
A IMPRENSA EXIGE A FACULDADE VISUAL NUA E
ISOLADA, NÃO A SENSORIALIDADE UNIFICADA.
/
MCLUHAN, 1969.
Se, por um lado, a cultura escrita permitiu a expansão do conhecimento, por outro reduziu a
comunicação ao aspecto visual. A era eletrônica estaria recriando um mundo à imagem de uma
“aldeia global”, a partir do advento da TV. Até o surgimento da televisão, vivíamos na "Galáxia de
Gutenberg". Para McLuhan, a evolução dos meios de comunicação de massa estaria
reorganizando nossas percepções e nos levando de um mundo linear e tipográfico para um
mundo audiotátil, tribalizado e cósmico da era eletrônica.
ALDEIA GLOBAL
Quando Marshall McLuhan cunhou o termo “aldeia global”, a internet estava restrita aos
circuitos militar e acadêmico norte-americanos e ainda estávamos distantes do uso de
computadores pessoais.
Mas se alguém tinha dúvidas sobre esse conceito inicialmente pensado em relação à
televisão, ele foi concretizado na web: estamos conectados 24 horas por dia ao redor do
mundo e sem obstáculos geográficos.
MEIOS QUENTES E MEIOS FRIOS
McLuhan acreditava que a mudança na comunicação da forma tátil-acústica, característica das
práticas orais, para a visual poderia ser sistematizada pelos conceitos de meios quentes e meios
frios. Essa divisão foi apresentada no livro Os meios de comunicação como extensões do homem
(1974). O que determina se os meios são quentes ou frios é o grau de participação dos indivíduos
e os sentidos que são acionados no ato da comunicação.
Veja alguns exemplos desses meios e tente identificar as razões pelas quais eles foram definidos
como quentes ou frios.
javascript:void(0)
/
Meios quentes Meios frios
Alfabeto Caricatura
Filme Desenho
Fotografia Fala
Jornal Hieróglifos
Palestra Telefone
Rádio Televisão
 Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal
Quantas vezes você já não assistiu a uma palestra e ficou bocejando? E quantas conversas ao
telefone não te deixaram entusiasmado? Então a palestra não deveria ser considerada “fria” e o
papo ao telefone “quente”?
O pensamento de McLuhan vai contra o senso comum em relação ao que nos acostumamos a
perceber como “quente” e “frio”. Os meios quentes, para ele, seriam os que prolongam um dos
nossos sentidos e em “alta definição”, ou seja, nos suprem com uma elevada clareza de
informação. Se o meio nos proporciona uma mensagem de fácil compreensão ou “mastigada”,
como diríamos na gíria, os nossos sentidos são pouco requisitados para a recepção da
mensagem. O rádio, por exemplo, pela definição de McLuhan, estenderia a audição. Já o telefone,
embora dependa da audição, seria “frio” porque tanto o emissor como o receptor precisam
participar da conversa para completar a mensagem.
/
OS MEIOS FRIOS, PORTANTO, SÃO AQUELES QUE DEMANDAM
QUE ACIONEMOS MAIS DE UM SENTIDO SIMULTANEAMENTE
OU AINDA UMA MAIOR PARTICIPAÇÃO PARA
INTERPRETARMOS AS MENSAGENS. ELES NOS DEIXAM
MARGEM PARA PREENCHERMOS OS SIGNIFICADOS DELAS.
 
Fonte:Shutterstock
 A primeira imagem transmitida por ondas de televisão pela NBC foi de um boneco do Gato
Félix
Quando recebemos uma informação por um meio frio, precisamos acionar mais de um sentido
para compreendê-la. É o que acontece com a televisão, em que visão e audição se articulam.
Além disso, as observações de McLuhan se referem aos primórdios da televisão, quando a baixa
definição da imagem exigia do telespectador um esforço maior para decodificar a mensagem. A
título de exemplo, veja como era a definição da imagem do Gato Félix em 1928.
Diferentemente da fotografia, um desenho ou uma caricatura também ampliam a nossa
capacidade perceptual. Para compreender melhor, veja a classificação dos meios segundo suas
características:
Meios quentes Meios frios
Baixa participação Alta participação
/
Linear Não linear
Fragmentário (individual) Tribal
Aciona um sentido em alta definição Aciona mais de um sentido em baixa definição
 Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal
 
Fonte:Shutterstock
Você se lembra de que, na introdução a este tema, foi questionado se o smartphone seria uma
extensão do corpo humano? McLuhan entende que os meios – ou as tecnologias – expandem a
existência, as capacidades e o corpo humano. O telefone seria a extensão do ouvido. O livro, por
exemplo, a da visão. Ao estender nossos sentidos, os meios seriam prolongamentos de nosso
corpo, como uma projeção de nosso sistema nervoso central para restabelecer o equilíbrio
sensorial que foi modificado pela introdução de um novo meio. Para o teórico, os meios seriam
tanto extensões quanto “amputações”, entorpecendo-nos com seus efeitos.
/
A extensão exigiria um processo de “autoamputação” realizado pelo nosso corpo para aliviar a
perturbação dos meios sobre o nosso sistema nervoso central. A adoção dessas extensões
acionaria em nós essa autoproteção com o entorpecimento da área prolongada. Esse estado de
êxtase revelaria a incorporação de um novo aparato tecnológico por nós.
CRÍTICAS AO PENSAMENTO DE MCLUHAN
De intelectual pop, McLuhan caiu no ostracismo a partir da década de 1980. Com a internet,
porém, seus estudos voltaram a ficar em evidência. O teórico sofreu várias críticas, entre as quais
a de adotar um pensamento evolucionista e de ser determinista tecnológico.
DETERMINISMO
Determinismo é a doutrina filosófica que defende que os fenômenos têm relação causal e
necessária. Mas é usado em um sentido mais geral para dizer que o meio em que as
pessoas estão inseridas as determinaria de maneira inescapável, uma leitura reducionista da
causalidade.
Estudos que investigam as relações entre a oralidade e a escrita muitas vezes estabelecem uma
oposição ou subordinação entre os dois universos ou ainda uma linha evolutiva, como foi o caso
de McLuhan, que demarcou a passagem da oralidade para a escrita a partir da invenção do
alfabeto fonético. Mas será que deixamos de ser uma sociedade oral com a invenção da
escrita e da tipografia?
Paul Zumthor está entre os críticos de McLuhan, embora reconheça a importância de suas
contribuições. Para ele, existem três tipos de oralidade:
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/
PAUL ZUMTHOR
Paul Zumthor (1915-1995) foi um importante linguista, crítico literário e historiador da
literatura suíço.
ORALIDADE PRIMÁRIA
Característica das sociedades que não têm contato algum com a escrita.
ORALIDADE MISTA
Ocorre quando as linguagens oral e escrita estão presentes, mas a influência da escrita é apenas
parcial.
ORALIDADE SECUNDÁRIA
Caracterizaria as culturas letradas, em que a voz e o imaginário perderam força.
A diferença é que, para Zumthor, as existências desses tipos de oralidade não estariam
condicionadas a uma linha evolutiva. Elas dependeriam do contexto cultural de cada sociedade.
ORALIDADE E ESCRITA COEXISTIRAM SEMPRE, EM
ÉPOCAS HISTÓRICAS, E SUAS DIFERENÇAS AFETAM A
MENSAGEM DE MODO MENOS DEMARCADO DO QUE
FEZ ACREDITAR MCLUHAN.
ZUMTHOR, 2014.
/
Um exemplo evidente seria pensar nas aldeias indígenas, marcadas pela oralidade ainda no
século XXI. Entretanto, mesmo nas grandes capitais, não podemos supor que o sucesso da troca
de mensagens em áudio por aplicativos de conversas, como o WhatsApp, revela o aspecto oral de
uma cultura? Pesquisa realizada pela empresa Panorama Mobile Time/Opinion Box revelou que
76% dos brasileiros enviam mensagens por áudio na plataforma. Não à toa o fundador do
WhatsApp, Brian Acton, afirmou, em entrevista à Revista Exame, que os brasileiros amam ligar e
mandar áudios. (AGRELA, 2017)
Outra crítica comumente dirigida a McLuhan gira em torno de seu aforismo “o meio é a
mensagem”. De acordo com o teórico, são os meios que determinam as mudanças culturais em
nossos comportamentos. Essa visão, para muitos críticos, privilegia o aspecto tecnológico e
menospreza o cultural, ou seja, a ação humana. Sem referir-se ao canadense, o filósofo Pierre
Lévy (2000)indiretamente questionou suas afirmações ao voltar-se contra o determinismo
tecnológico. Ele prefere utilizar o termo “condicionamento tecnológico”. Assim, as invenções
tecnológicas apenas seriam parte do ambiente de transformação cultural de nossas sociedades. O
homem tipográfico, por exemplo, não teria sido determinado pela prensa de Gutenberg, mas
condicionado por ela. As tecnologias ajudariam a compor os cenários de transformação, mas as
mudanças não dependeriam exclusivamente delas.
 
Fonte:Shutterstock
 Pierre Lévy
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/
AFORISMO
Aforismo: Máxima ou sentença que em poucas palavras contém uma regra ou um princípio
de alcance moral.
Outro crítico de McLuhan é Umberto Eco, autor do livro Apocalípticos e Integrados (1979), em
que critica tanto os defensores quanto os detratores da indústria cultural. Um dos grandes
problemas do pensamento de McLuhan, para Eco, seria a falta de conceituação sobre meios,
mídias e mensagens. McLuhan se referia indistintamente a eles. Além disso, Eco aponta que o
conteúdo importa sim. O modo como os meios são percebidos por cada indivíduo e os contextos
político, histórico e sociocultural em que as mensagens se inserem têm de ser levados em
conta para uma análise estrutural dos meios de massa.
UMBERTO ECO
Umberto Eco (1932-2016) foi um escritor, filósofo e linguista, titular da cadeira de Semiótica e
diretor da Escola Superior de Ciências Humanas na Universidade de Bolonha. Além de
acadêmico e articulista de jornal, escreveu romances de grande notoriedade, entre os quais
O Nome da Rosa e O pêndulo de Foucault.
OS CONTEXTOS POLÍTICO, HISTÓRICO E
SOCIOCULTURAL EM QUE AS MENSAGENS SE
INSEREM
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/
Para exemplificar, a primeira transmissão de TV ocorreu no Reino Unido, em 1926. No ano
seguinte, a CBS (Columbia Broadcasting System), uma das maiores emissoras de TV e
rádio, foi inaugurada nos EUA. No Brasil, somente em 1950 ocorreria a primeira transmissão,
pela TV Tupi, que alcançou 200 brasileiros. Portanto, contextos inteiramente diversos
precisam ser considerados ao se observar os efeitos dos meios.
 
Fonte:Shutterstock
As críticas mais contundentes se referiram ao conceito de meios quentes e meios frios. Para
James Carey, eles são o ponto fraco da obra do canadense, aponta Barbosa (2017). O grande
problema é que a classificação proposta por McLuhan não leva em conta as mudanças das
características dos meios com o passar do tempo. Atualmente, classificar a televisão como um
meio frio soa problemático, com TVs apresentando as imagens em alta definição. Em 1948,
poderia fazer sentido, já que a TV tinha menos linhas de definição e, portanto, uma qualidade de
imagem que era inferior em relação aos filmes, considerados como meios quentes. Como observa
Carey:
JAMES CAREY
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/
James William Carey (1934-2006) foi um teórico de comunicação americano, crítico de mídia
e instrutor de jornalismo na Universidade de Illinois e, mais tarde, na Universidade Colúmbia.
OS MEIOS QUE SÃO QUENTES EM UM MINUTO PODEM
SER FRIOS. É IMPOSSÍVEL AFIRMAR QUE A
TEMPERATURA É UMA PROPRIEDADE ABSOLUTA DE
UM MEIO OU SE UM MEIO É QUENTE OU FRIO
RELATIVAMENTE A OUTRO. E A CLASSIFICAÇÃO DAS
MÍDIAS SEGUNDO ESSAS CATEGORIAS SÃO SEMPRE
ARBITRÁRIAS.
CAREY apud BARBOSA, 2017.
A televisão seria um meio mais frio em relação ao rádio. E, mesmo assim, em determinado
período. Seguindo os argumentos de Carey, seria mais produtivo enxergar essa classificação
entre meios quentes e meios frios como relativa, dependendo das mudanças que os meios
sofressem em sua estrutura e seu conteúdo. Em tempos de convergência, por exemplo, seria
ainda possível afirmar que o rádio é um meio quente diante do cenário de interatividade que se
verifica atualmente, em que o ouvinte participa até da programação, entrando ao vivo no ar?
/
Para recapitular a diferença e alguns questionamentos a respeito de meios quentes e meios frios,
assista ao vídeo abaixo.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. UM DOS TEÓRICOS MAIS POLÊMICOS DO SÉCULO XX, MCLUHAN
PROPÔS O CONCEITO DE MEIOS QUENTES E MEIOS FRIOS PARA
CLASSIFICAR OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO DE NOSSA
/
SOCIEDADE A PARTIR DO SURGIMENTO E DISSEMINAÇÃO DA TV COMO
MÍDIA DE MASSA. ABAIXO, APRESENTAMOS ALGUNS MEIOS E AS
RAZÕES PELAS QUAIS FORAM LISTADOS COMO FRIOS OU QUENTES.
ASSINALE A ALTERNATIVA QUE ESTÁ EM DESACORDO COM O
PENSAMENTO DE MCLUHAN:
A) A televisão foi considerada um meio frio por acionar vários sentidos no telespectador e por
demandar dele uma capacidade de imaginação para a recepção da imagem.
B) O rádio seria um meio frio por aguçar a audição e permitir pouca participação dos ouvintes.
C) O jornal foi classificado como um meio frio por ser linear e teria reduzido nossa percepção ao
aspecto visual.
D) A palestra e a fala são ambas meios frios por demandarem muita interatividade dos envolvidos.
2. O PENSAMENTO DE MCLUHAN FOI BASTANTE CRITICADO POR
TEÓRICOS DA COMUNICAÇÃO, PRINCIPALMENTE SEUS ARGUMENTOS
SOBRE OS MEIOS QUENTES E FRIOS, EMBORA O CANADENSE TENHA
VOLTADO A FICAR EM VOGA COM O ADVENTO DA INTERNET. AS
ALTERNATIVAS ABAIXO APONTAM FALHAS ACERCA DO PENSAMENTO
DO TEÓRICO CANADENSE, EXCETO:
A) A divisão entre meios quentes e frios é estática e não leva em conta que os meios sofrem
transformações em suas características ao longo do tempo.
B) Mais produtivo seria pensar sobre as propriedades dos meios de forma relativa entre eles, ou
seja, um meio seria mais quente ou mais frio em comparação com outro.
C) O único problema do aforismo “o meio é a mensagem” seria a perspectiva cultural.
D) A classificação da televisão como um meio quente só fazia sentido à época do início das
transmissões, em que os aparelhos tinham baixa definição de imagem.
GABARITO
/
1. Um dos teóricos mais polêmicos do século XX, McLuhan propôs o conceito de meios
quentes e meios frios para classificar os meios de comunicação e expressão de nossa
sociedade a partir do surgimento e disseminação da TV como mídia de massa. Abaixo,
apresentamos alguns meios e as razões pelas quais foram listados como frios ou quentes.
Assinale a alternativa que está em desacordo com o pensamento de McLuhan:
A alternativa "D " está correta.
 
A palestra e a fala, embora pareçam ser da mesma natureza, não o são, segundo a classificação
de McLuhan. A palestra é um meio quente porque os ouvintes têm uma posição passiva diante do
orador. Já na fala, um meio frio, só há o desenrolar da comunicação se ambos os envolvidos
preencherem a conversa.
2. O pensamento de McLuhan foi bastante criticado por teóricos da comunicação,
principalmente seus argumentos sobre os meios quentes e frios, embora o canadense
tenha voltado a ficar em voga com o advento da internet. As alternativas abaixo apontam
falhas acerca do pensamento do teórico canadense, exceto:
A alternativa "C " está correta.
 
Ao afirmar que “o meio é a mensagem”, McLuhan tende a um determinismo tecnológico. Para
Umberto Eco, a análise dos meios de comunicação não pode se ater às suas formas. É preciso
contemplar as propriedades dos meios, mas também os conteúdos das mensagens, as
percepções individuais dos receptores e os contextos em que eles estão inseridos.
MÓDULO 2
 Definir hibridismo, comparando sensorialidades despertadas pelas mídias impressa, digital,
audiovisual e móvel
Imagine um esloveno ou um egípcio que chegue ao Brasil e acesse websites de notícias de
diversos veículos, sem traduzi-los para o português. O importante para esse exercício de
imaginação é que sejam cidadãos de países que não conheçam o português. De curiosidade, eles
/
entram no site do jornal Folha de S. Paulo, no da rádio CBN e no do Jornal Nacional. Supondo
que não entendam português, você acha que eles saberão identificar qual é o site originariamente
de um jornal, de uma rádio e de uma TV? A resposta, por enquanto, ainda é sim e torçamos para
que tal cenário mude em breve. Embora a internet tenha proporcionado a possibilidadeda
utilização de uma linguagem híbrida ou multimídia, ainda notamos a prevalência do texto no site
da Folha de S. Paulo, do áudio no da CBN e do audiovisual no do Jornal Nacional.
HIBRIDISMO E REMEDIAÇÃO
Vimos que a classificação de McLuhan sobre os meios quentes e frios ficou datada. Entretanto,
seu pensamento voltou a ser valorizado com a internet pelo fato de o meio permitir um hibridismo
entre as linguagens impressa, sonora, audiovisual e tátil se as consumirmos nos smartphones.
McLuhan percebia que, num primeiro momento, todo meio novo busca incorporar os meios que o
precederam e referenciá-los. Assim, cada meio tornava-se o conteúdo do que substituía:
O manuscrito tornou-se o conteúdo do impresso

A fotografia e o romance tornaram-se o conteúdo do filme

O filme tornou-se o conteúdo da TV
Ou seja, uma mídia era sempre assimilada ou representada na mídia mais nova.
O termo hibridização foi usado por McLuhan na década de 1960 para caracterizar as mudanças
provocadas pela introdução e disseminação da televisão. No século XXI, voltou a ficar atual com a
convergência entre as mídias possibilitada pela rede mundial de computadores.
/
 SAIBA MAIS
Parte das críticas a Marshall McLuhan se deram também pela incompreensão à sua forma de se
expressar, adaptando frases de outros autores e empregando metáforas, exemplos e aforismos.
De acordo com Barbosa (2017), a forma de escrever do autor lembrava um mosaico, em vez de
seguir uma linearidade sequencial da escrita. Ao tentar romper com a ideia de causalidade e
sequência, McLuhan se expressava em livros de maneira não convencional, usando o meio como
forma de crítica a uma de suas principais características: a linearidade. Seu livro O meio é a
massagem: um inventário de efeitos, de 1967, é um exemplo disso.
O MEIO É A MASSAGEM
O título do livro teria sido resultado de um erro tipográfico, segundo um sobrinho de
McLuhan, que ao voltar do tipógrafo atentou que no lugar da palavra message (mensagem)
havia a palavra massage (massagem). McLuhan, na ocasião, preferiu o título com o erro,
alegando que estava na proposta certa, e levava a refletir sobre os demais sentidos
sensórios. As edições brasileiras têm o nome tanto de O meio é a mensagem, quanto O
meio é a massagem.
O HÍBRIDO, OU ENCONTRO DE DOIS MEIOS, CONSTITUI
UM MOMENTO DE VERDADE E REVELAÇÃO, DO QUAL
CRESCE A FORMA NOVA. ISTO PORQUE O PARALELO
DE DOIS MEIOS NOS MANTÉM NAS FRONTEIRAS
ENTRE FORMAS (...). O MOMENTO DE ENCONTRO DOS
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/
MEIOS É UM MOMENTO DE LIBERDADE E LIBERTAÇÃO
DO ENTORPECIMENTO E DO TRANSE QUE ELES
IMPÕEM AOS NOSSOS SENTIDOS.
MCLUHAN apud DEL BIANCO, 2005.
 
Fonte:Shutterstock
 Forte em Saint Tropez ao por do sol
Lembra-se do conceito de extensão e autoamputação que os meios provocam sobre os nossos
sentidos ao acentuar determinada forma de recepção da mensagem em detrimento de outras?
Pois o que McLuhan está tentando transmitir com a citação anterior é que, ao assimilarmos um
novo meio, ficamos em um estágio de transição entre formas que nos permitem ter consciência
sobre os efeitos de determinado meio sobre os nossos sentidos, libertando-nos da sensação
anestésica que eles despertavam em nós. Ou seja, sairíamos do “modo automático”. Ao
suscitarem novas sensações, um meio nos faria refletir sobre elas.
Na contemporaneidade, entretanto, não é mais possível enxergar esse cenário evolutivo de uma
mídia para a outra. Aliás, será que algum dia os meios foram excludentes? Quem via televisão não
poderia ler jornal na manhã do dia seguinte? Ou ouvir um programa de rádio? Na época do
surgimento da TV, dizia-se que ela acabaria com o rádio. Entretanto, a previsão não se
/
concretizou. Com a era digital, a profecia ficou ainda mais distante porque meios e práticas
convergem. Quando navegamos por um website, estamos experimentando o encontro de todas as
mídias anteriores. Para Del Bianco, a hibridização entre os meios realinha o sistema de
comunicação:
É POSSÍVEL ENTENDER HOJE QUE AS MUTAÇÕES
EMERGENTES POR HIBRIDIZAÇÃO DESENCADEIAM UM
REALINHAMENTO DO SISTEMA DE COMUNICAÇÃO,
ABRINDO CAMINHO PARA A CONVERGÊNCIA DE
PROCESSOS E PRÁTICAS. E NESSE AMBIENTE DE
MODIFICAÇÕES E RECICLAGENS, ONDE UMA FORMA
NÃO SUBSISTE SEM A OUTRA, É QUE ESTÃO SENDO
MOLDADAS NA CONTEMPORANEIDADE AS BASES DO
PROCESSO DE CONVERGÊNCIA OU INTEGRAÇÃO
ENTRE NOVOS E VELHOS MEIOS. REVOLUCIONÁRIO E
VISIONÁRIO, O PENSAMENTO DE MCLUHAN SAIU DO
OSTRACISMO PARA INSPIRAR PESQUISADORES EM
TODO MUNDO.
DEL BIANCO, 2005.
Esse processo de incorporação de um meio pelo outro foi chamado de “remediação” por Bolter e
Grusin (2000). Os autores analisaram os diferentes graus em que as mídias digitais “remediam”
as anteriores, surgidas na era analógica dos meios de comunicação de massa.
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/
BOLTER E GRUSIN
Em seu livro Remediation: Understanding New Media (2000), Bolter e Grusin fazem uma
releitura do clássico de McLuhan Understanding media: the extensions of man.
Como o jornal, o cinema, o rádio e a televisão estão representados na internet? Para Bolter e
Grusin, os níveis de incorporação variam da absorção total à parcial de uma mídia pela outra:
Absorção total
As rupturas em relação ao meio anteriormente prevalente são pouco percebidas.

Absorção parcial
As diferenças entre os antigos e novos meios se sobressaem, sem que isso resulte, no entanto, no
apagamento da mídia anterior.
Entre os extremos, estariam diferentes formas de remediação.
Voltando ao exemplo dos sites da Folha de S. Paulo, da CBN e do Jornal Nacional, em que grau
desse fenômeno você acha que eles se encontram? Certamente não é o de absorção total, já que
ainda notamos neles, claramente, traços da mídia anterior que remediaram: o rádio, o jornal e a
TV.
/
 
Fonte:Shutterstock
Importante notar que, para os autores, o processo de remediação, entretanto, age nos dois
sentidos: tanto da mídia anterior para a nova quanto da nova para a que a antecedeu. Como
exemplo, eles citam os filmes que incorporaram características das mídias digitais, como a
computação gráfica, num movimento que parte da mídia mais nova para uma anterior: o cinema.
Quantas vezes você já deve ter visto diálogos de aplicativos de mensagens projetados na tela de
cinema, simulando o diálogo entre os personagens que estão usando seus smartphones em
cena? Ou tweets reproduzidos em páginas impressas? Na visão de Bolter e Grusin, o processo de
remediação é inevitável: todo meio estaria absorvendo o outro.
Manovich (2003), ao analisar as chamadas novas mídias – ou mídias digitais – observou que elas
se nutrem das características das velhas, tornando-se, assim, metamídia. O grande divisor de
águas entre elas seria a migração das mídias para o software, que permite novas formas de
distribuição e interatividade. Entretanto, as novas mídias se valem das convenções culturais já
existentes e construídas pela chamada velha mídia.
Mas será que as “velhas mídias” são tão antigas assim?
O MEIO IMPRESSO E A LINEARIDADE
/
Vilém Flusser (2010) observou que o motivo por trás da invenção do alfabeto foi superar a
consciência mágico-mítica (pré-histórica) e garantir espaço para uma nova (histórica)
consciência. Discípulo de McLuhan, Walter Ong (1912-2003) defendeu no livro Oralidade e
escrita: a tecnologização da palavra que a escrita separa o conhecido do conhecedor por meio do
texto. Para ele, a cultura oral reduziria o espaço para a experimentação intelectual, pois a mente
está ocupada com o que classifica como tarefas conservadoras: como o conhecimento é
transmitido sem cessar entre os indivíduos e as gerações, é preciso que a mente se encarregue
disso. Por que Ong as chama de conservadoras? Porque é por meio delas que uma cultura é
preservada. Exemplos são as diversas culturas indígenas e afro-brasileiras, e num outro âmbito, a
cultura surda mundial, que não têm tradição escrita, mas nem por isso deixam de ter história.
 
Fonte:Shutterstock
 Capa da edição do trigésimo aniversáriode Oralidade e Escrita, De Walter J. Ongl
VILÉM FLUSSER
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/
Grande pensador da comunicação sob um viés filosófico, Vilém Flusser (1920-1991),
nascido em Praga, refugiou-se do nazismo mudando-se para o Brasil e se naturalizando
brasileiro.
WALTER ONG (1982) AFIRMA QUE O TEXTO, POR SER
LITERALMENTE CONSERVADOR (ELE SE CONSERVA),
LIBERARIA A MENTE DE TAREFAS CONSERVADORAS. ELE
ACREDITA QUE ESCREVER FORTALECE A CONSCIÊNCIA. PARA
O TEÓRICO, O USO DE UMA TECNOLOGIA PODE ENRIQUECER
A PSIQUE, ALARGAR O ESPÍRITO HUMANO E INTENSIFICAR
SUA VIDA INTERIOR, E A ESCRITA É UMA TECNOLOGIA AINDA
MAIS PROFUNDAMENTE INTERIORIZADA.
Walter Ong demarcou a existência entre a oralidade primária e a secundária. A primeira diz
respeito à oralidade das culturas sem conhecimento da escrita. Já a secundária seria a das
culturas em que o rádio, a televisão e outros meios eletrônicos transmitem uma nova oralidade
que, entretanto, depende da escrita. Faz sentido. Afinal, os noticiários de rádio, TV, as
radionovelas e as novelas pressupõem a existência de um texto jornalístico ou roteiro.
O RÁDIO E A TV: VOLTA À TRIBALIDADE?
Já o rádio e a TV, para McLuhan, trariam um retorno às possibilidades sensórias mágico-míticas
das culturas orais. O teórico atribuiu à imprensa a construção do pensamento tipográfico ou linear
e viu nos meios eletrônicos perspectivas mais ricas de interação com os nossos sentidos.
Comecemos pelo rádio. Embora tenha classificado o rádio como um meio quente pela baixa
participação do público, McLuhan, por outro lado, escreveu o texto Rádio, o tambor tribal, o
trigésimo capítulo do clássico Understanding Media: The Extensions of Man, em que discorre
sobre como o rádio restabeleceu uma conexão íntima com a cultura oral.
/
O meio, com seu poder de envolver, teria alargado a audição, como notam Del Bianco e Meditsch
(2005). McLuhan, apontam os autores, recorreu à metáfora do tambor tribal para definir o rádio
como uma tecnologia que fortalece a conexão do homem com o grupo, com a comunidade, que
foi capaz de reverter rapidamente o individualismo do homem tipográfico para o
coletivismo. O rádio, para Del Bianco, trouxe à tona ecos de antigos tambores tribais.
ESSA FORÇA ARCAICA DO RÁDIO, SEGUNDO
MCLUHAN, ESTÁ NA PRÓPRIA NATUREZA
TECNOLÓGICA DO MEIO. AO PRODUZIR IMAGENS
AUDITIVAS, O RÁDIO CRIA UM AMBIENTE TOTALMENTE
INCLUSIVO E ABSORVENTE QUE PROPICIA ÀS
PESSOAS UM MUNDO PARTICULAR EM MEIO ÀS
MULTIDÕES. ALARGA O SENTIDO DA AUDIÇÃO E AS
FACULDADES HUMANAS, TORNANDO-SE UMA
EXTENSÃO DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL. POR
ESSA CARACTERÍSTICA, ALTERA OS ÍNDICES DE
/
SENSIBILIDADE OU MODOS DE PERCEPÇÃO DE QUEM
TRANSITA EM AMBIENTES MOLDADOS POR ELE.
DEL BIANCO, 2005.
O rádio elenca a linguagem oral, a penetração, a mobilidade, o baixo custo, o imediatismo, a
autonomia (a pessoa pode receber a mensagem em qualquer lugar que esteja) e a sensorialidade.
Segundo Ortriwano (1985), ele envolve o ouvinte, fazendo-o participar por meio da criação de um
“diálogo mental” com o emissor e faz a imaginação ser ativada mediante a emocionalidade das
palavras e dos recursos da sonoplastia, permitindo que as mensagens tenham nuances
individuais, de acordo com as expectativas de cada um.
Em relação à televisão, à mídia digital e à mídia impressa, alguns autores defendem que nelas a
imaginação seja limitada pela presença de imagens. O argumento vai na contramão de McLuhan.
Como já vimos, desde então, a configuração da TV se modificou.
Pode soar estranho atualmente imaginar que uma TV nos anos 1960 pudesse acionar um mundo
audiotátil, e não audiovisual, como defendia McLuhan. Com alta definição e som surround, agora a
televisão se aproxima mais da experiência audiovisual do cinema. Estivesse exagerando ou não, o
autor canadense foi um visionário. E não se pode esquecer das smart TVs, que podem inclusive
ser acionadas por gestos. Já poderíamos afirmar que a TV é audiovisual e tátil. E podemos ir além
se considerarmos o uso crescente de dispositivos acionados por comando de voz interconectados
com os smartphones.
/
 
Fonte:Shutterstock
OS DISPOSITIVOS MÓVEIS E A TACTILIDADE
É possível notar a influência da materialidade como impulsionadora de uma nova linguagem no
conteúdo produzido para telas sensíveis ao toque, como os smartphones e os tablets. Palácios e
Cunha (2012), ao analisarem os impactos desses novos dispositivos sobre o jornalismo,
enumeraram a tactilidade como mais um atributo do ciberjornalismo contemporâneo, além da
multimidialidade, hipertextualidade, interatividade, customização, memória e da instantaneidade.
Embora tenham analisado os efeitos sobre o jornalismo, cabe ressaltar que as conclusões a que
chegaram se aplicam a quaisquer produtos desenvolvidos para esses meios.
/
 
Fonte:Shutterstock
DIFERENTEMENTE DE RECURSOS COMO A
“MULTIMIDIALIDADE” E A “MEMÓRIA”, QUE NOS
PRIMÓRDIOS DA INTERNET ERAM APENAS
POTENCIALIDADES, A TACTILIDADE JÁ NASCE
PLENAMENTE APROPRIÁVEL PARA UTILIZAÇÕES EM
APLICATIVOS CRIADOS PARA PLATAFORMAS MÓVEIS.
SEU USO NÃO ESTÁ LIMITADO POR BARREIRAS
TÉCNICAS, MAS APENAS CIRCUNSCRITO PELA
CAPACIDADE CRIATIVA PARA UM MELHOR
APROVEITAMENTO.
/
PALÁCIOS e CUNHA, 2012.
No artigo Duas telas, dois caminhos: a produção de notícias para celular e tablet no panorama dos
jornais brasileiros, Barsotti e Aguiar (2014) sustentam que a produção de produtos jornalísticos
para tablets possibilitou o surgimento de uma nova linguagem nesses dispositivos. Eles
observaram que, nos produtos jornalísticos para smartphones, a tactilidade se revelava apenas no
ato do consumo, já que as redações, à época, só reproduziam automaticamente para as telas de
celulares os seus sites, fazendo uma operação de transposição.
Já nos tablets, a tactilidade tornava-se um componente necessário para experimentar os produtos,
tendo em vista que a produção jornalística era pensada especificamente para essas telas.
BARSOTTI E AGUIAR (2014) AFIRMAM QUE O JORNALISMO
FEITO SOB MEDIDA PARA ESSES DISPOSITIVOS TEM
APOSTADO NA LÓGICA DAS SENSAÇÕES, AO APOIAR-SE NA
RECEPÇÃO POR MEIO DOS TRÊS SENTIDOS:
A VISÃO, A AUDIÇÃO E O TATO.
Os produtos analisados à época valiam-se de textos, áudios e vídeos, mas também de infográficos
interativos e testes que demandavam a tactilidade para o usuário interagir com o conteúdo.
A LINGUAGEM HIPERMÍDIA E A
INTERATIVIDADE
Interação é a palavra-chave para a compreensão da mudança radical de um consumo mais
passivo de informação que caracterizou a era dos meios de comunicação de massa para um mais
ativo na era digital. Bardoel e Deuze (2001) identificaram quatro características do jornalismo
online que se aplicam de modo geral aos produtos veiculados na rede mundial de computadores:
a hipertextualidade, a interatividade, a mutimidialidade e a customização de conteúdo.
A multimidialidade se refere à convergência de diversas mídias tradicionais para a internet, com a
possibilidade de utilização de som, imagem e texto, transpondo características originariamente do
jornal, do rádio e da TV.
/
A interatividade na web pode acontecer de várias formas. Para alguns autores, ela é múltipla, de
modo que não é possível falar de interatividade no singular. Segundo Mielniczuk (2001), ela
estaria presente em uma série de processos.
 
Fonte:Shutterstock
Diante de uma tela de computador conectado à internet, o usuário estabelece relações:
com a máquina

com o conteúdo

com outras pessoas – seja o autor ou outros leitores
No trecho a seguir, Mielniczuk faz referência à ocorrência de tais processos em um site
jornalístico:
/
NAVEGANDO PELO WEBJORNAL E ELEGENDO O
PRÓPRIO PERCURSO DE LEITURA, OS USUÁRIOS
TERIAM ACESSO ÀS INFORMAÇÕES DE UM JEITO
MUITO DIFERENCIADO ENTRE SI. É POSSÍVEL DIZER
QUE DIANTE DE UM JORNAL IMPRESSO CADA LEITOR
FAZ O SEU PERCURSO DE LEITURA OU QUE DIANTE DA
TELEVISÃO CONVENCIONAL CADA PESSOA TROCA OS
CANAIS – DURANTE O TELEJORNAL – DE ACORDO
COM SUA VONTADE, PORÉM EM AMBOS OS CASOS
EXISTE UMA UNIDADE PROPOSTA.NO WEBJORNAL,
ESSA DITA UNIDADE PROPOSTA É TÃO COMPLEXA –
SOBRETUDO PELA CONSTANTE ATUALIZAÇÃO, PELO
GRANDE VOLUME DE INFORMAÇÕES E PELO
FORMATO HIPERTEXTUAL – QUE O PRODUTO DEIXA
DE SER PERCEBIDO PELOS LEITORES COMO SENDO
ÚNICO.
MIELNICZUK, 2001.
No trecho destacado, a autora indiretamente está abordando outra característica gerada pela
navegação na web: a customização. No exemplo, ela menciona a customização gerada pelo
percurso de leitura escolhido pelo usuário por meio dos hiperlinks. Nenhum produto será único, já
que existem escolhas o tempo inteiro a serem feitas pelo usuário, como em um jogo. Dependendo
das opções que façam, os usuários serão apresentados a diferentes alternativas de leitura.
A customização tem duas outras faces: em muitos sites e aplicativos, o usuário configura os
produtos de acordo com suas preferências. Entretanto, existe ainda uma customização algorítmica
nas redes sociais e nos mecanismos de busca. Por meio do nosso comportamento ao
/
navegarmos na web, os algoritmos presentes nessas plataformas filtram o que nos será mostrado
e ocultado.
NO CASO DO JORNALISMO, TAL FILTRAGEM PODE TRAZER
CONSEQUÊNCIAS IMPREVISÍVEIS, TENDO EM VISTA QUE
APENAS ALGUMAS NOTÍCIAS SERÃO MOSTRADAS AOS
USUÁRIOS NAS REDES SOCIAIS (BARSOTTI, 2018). UM DOS
PRINCÍPIOS DO JORNALISMO É JUSTAMENTE LEVAR
DIVERSIDADE DE PONTOS DE VISTA AOS USUÁRIOS. A
CULTURA ALGORÍTMICA TAMBÉM ENVOLVE QUESTÕES DE
PRIVACIDADE E ALGUNS AUTORES DEFENDEM QUE PODE
INDUZIR ESCOLHAS E COMPORTAMENTOS.
No vídeo a seguir, Anderson Lopes, doutor em Ciências da Comunicação pela USP, explica os
dilemas da customização e da cultura algorítmica.
/
Por fim, resta descrever os efeitos da hipertextualidade. A conexão entre os textos por meio de
links rompe com a linearidade da leitura tal como no texto impresso. Essa característica da
linguagem digital também contribui para a personalização do conteúdo, já que cada leitor
escolherá seu caminho de leitura. É claro que, no jornal impresso, você também poderia ler
apenas o primeiro parágrafo de uma notícia, abandoná-la e decidir pular da Política para o
Caderno de Esportes, por exemplo. Ainda assim, o “cardápio” de notícias ofertado a você seria
composto apenas pelas notícias que aconteceram no dia anterior.
Na televisão e no rádio, o telespectador poderia trocar de canal ou estação quantas vezes
quisesse. Portanto, já havia interatividade, mas as escolhas do leitor, ouvinte e telespectador eram
limitadas pela grade de programação ou pelo tamanho do jornal. Na web, a liberdade de escolhas
é infinita.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. EMBORA A PALAVRA HIBRIDISMO OU HIBRIDIZAÇÃO TENHA SURGIDO
NOS ANOS 1960, ELA GANHOU FORÇA E UM SIGNIFICADO MAIS
PALPÁVEL COM O ADVENTO DA INTERNET. AS AFIRMATIVAS ABAIXO
REPRESENTAM CARACTERÍSTICAS DO HIBRIDISMO, EXCETO:
A) A convergência entre os meios de comunicação possibilitada pela rede mundial de
computadores.
/
B) A dependência de um meio em relação ao outro: eles tornam-se complementares e
dependentes na web.
C) O abandono das convenções culturais preexistentes quando um novo meio surge no sistema
de comunicação.
D) Processo que leva à incorporação de um meio pelo outro nos dois sentidos: da mídia mais
velha para a mais nova e vice-versa.
2. DE ACORDO COM O PENSAMENTO DE MCLUHAN, A RECEPÇÃO DE
CADA MEIO DESPERTA NO PÚBLICO DIFERENTES SENTIDOS OU
SENSORIALIDADES, INDEPENDENTEMENTE DAS MENSAGENS QUE
VEICULAM. ABAIXO, ESTÃO LISTADAS ALGUMAS SENSAÇÕES
PROVOCADAS PELOS MEIOS. ASSINALE A ALTERNATIVA INCORRETA:
A) Pela profusão de imagens, a televisão desperta nos telespectadores a visão.
B) Os dispositivos móveis, com telas sensíveis ao toque, acionam a visão, a audição e o tato.
C) A leitura dos jornais impressos aguça a visão, direcionando a uma leitura linear.
D) O rádio ecoa um tambor tribal, estendendo a audição.
GABARITO
1. Embora a palavra hibridismo ou hibridização tenha surgido nos anos 1960, ela ganhou
força e um significado mais palpável com o advento da internet. As afirmativas abaixo
representam características do hibridismo, exceto:
A alternativa "C " está correta.
 
Os novos meios se valem das convenções culturais compartilhadas amplamente pela sociedade e
que tiveram origem no contexto de consumo dos velhos meios. Com isso, conseguem facilitar a
compreensão de suas mensagens pelo usuário sem provocar uma grande ruptura com a
experiência previamente adquirida por eles.
/
2. De acordo com o pensamento de McLuhan, a recepção de cada meio desperta no público
diferentes sentidos ou sensorialidades, independentemente das mensagens que veiculam.
Abaixo, estão listadas algumas sensações provocadas pelos meios. Assinale a alternativa
incorreta:
A alternativa "A " está correta.
 
A televisão, pela definição de McLuhan, teria nos levado de um mundo tipográfico para um mundo
audiotátil. O conceito de McLuhan foi cunhado em uma época em que a TV apresentava imagens
de baixa qualidade e que, portanto, demandava do telespectador diversos sentidos para
interpretar os pontos na tela a que estava assistindo. Com a evolução dos aparelhos, a TV se
aproximou do cinema, com imagens de alta definição. Mesmo assim, ela é, no mínimo, um meio
audiovisual: aciona a visão e a audição. Já há alguns aparelhos comandados por gestos no
mercado. Nesse caso, a televisão seria audiovisual e tátil.
MÓDULO 3
 Comparar os conceitos de mídias de massa e de nicho e os papéis de produtor e de
consumidor de conteúdo no cenário atual
Você já assistiu a Black Mirror: Bandersnatch? No filme, os usuários podem decidir cinco finais
possíveis para o personagem Stefan, um jovem programador que desenvolve um game nos anos
1980 que começa a misturar a realidade com o mundo virtual. O destino do personagem principal
é fruto das escolhas dos usuários. Foi a primeira experiência interativa do serviço de streaming
Netflix.
Outro exemplo são os QR codes que têm aparecido em intervalos comerciais de TV, para que se
saiba mais sobre alguma oferta. Ou, em uma emissão de rádio, o âncora anunciar que
determinado ouvinte está enviando informações por WhatsApp. Ou, ainda, a escolha de assentos
nas compras online para ir fisicamente assistir a um filme. Ainda será possível distinguir tão
marcadamente as mídias online e offline?
/
BROADCAST E INTERCAST
No livro We media: How audiences are shaping the future of News and information, Bowman e
Willis (2003) fizeram a distinção entre a mídia broadcast e a que denominaram como intercast. A
mídia broadcast seria representada pelos meios analógicos de comunicação de massa: jornais,
cinema, rádio e televisão. A intercast seria composta pelos meios na internet. Para os autores, a
rede mundial de computadores facilita a comunicação horizontal, diferentemente dos veículos
tradicionais, que seriam de comunicação vertical.
No sistema broadcast, que consideram mais hierarquizado, as decisões são centralizadas e
comunicadas para o público de cima para baixo. Os meios analógicos teriam consolidado um
modelo de relacionamento com suas audiências dentro do conceito clássico de emissor-receptor.
Como se fosse “eu falo e vocês escutam”. Tal modelo se baseava numa amostragem do público
que era possível de ser obtida com pesquisas quantitativas e qualitativas de mercado. No caso
dos jornais, a aferição era feita pelo Índice de Verificação de Circulação (IVC), que recentemente
foi renomeado e agora se chama Instituto Verificador de Comunicação, passando a medir também
os assinantes digitais.
Na TV e no rádio, são comuns as pesquisas de audiência. Entretanto, quaisquer decisões
baseadas no comportamento do público só poderiam ter tomadas a posteriori. Embora existissem
canais de comunicação abertos para a audiência – como a seção de cartas nos jornais e telefones
para atender à audiência no rádio e na TV –, eles eram mais escassos do que são atualmente.
No modelo nomeado por eles de intercast, o feedback do público é instantâneo. É possível saber
em tempo real quais sãoas notícias mais lidas em determinado site ou as mais compartilhadas em
/
redes sociais, acompanhar o termômetro de votações de reality shows na TV ou ainda saber quais
são os filmes mais assistidos numa plataforma de streaming.
BROADCAST
Meios analógicos de comunicação de massa
Decisões centralizadas
Comunicação vertical

INTERCAST
Dispositivos digitais, conectados à internet
Feedback instantâneo
Comunicação horizontal
Cabe ressaltar que a internet permite reunir, simultaneamente e no mesmo ciberespaço
informativo, os produtores de conteúdo, a audiência, as fontes de informação, os sites do governo,
de empresas e do terceiro setor. Nesse ambiente, em que qualquer um dos usuários pode
participar, as regras são mais flexíveis e a hierarquia é mais frouxa. Antes da internet, por
exemplo, um livro precisava de uma boa crítica literária para entrar na lista de mais lidos.
Atualmente, os leitores podem também ajudar a construir a reputação de uma obra, enviando suas
próprias avaliações. Existe, inclusive, o fenômeno dos booktubers, que são “críticos” literários do
YouTube, além de blogs, já há mais tempo, também tratando de literatura. Ou podem descobrir
leituras afins sem precisar da ajuda de uma resenha, pois os sistemas de recomendação se
encarregam disso.
/
MÍDIAS DE MASSA E MÍDIAS DE NICHO
No vídeo a seguir, entenda a diferença entre mídias de massa e mídias de nicho:
“Mídias-sol” e “mídias-poeira” são outras classificações propostas para definir a separação entre
as mídias offline e online. Ela é de autoria de Ignacio Ramonet (2012). As mídias-sol seriam as de
comunicação de massa, e as mídias-poeira, as de nicho.
Imagine o desenho de um dinossauro. A parte principal do seu corpo é bem mais alta do que a
cauda, que é longa, mas tem pouca altura. O mercado de nicho seria como a cauda de um
/
dinossauro. Há pouco ou nenhum impacto no mercado quando esses produtos são lançados, mas
a demanda por eles, embora baixa em termos de volume, é contínua. Anderson observou que
existia uma “cauda longa” na busca por tais produtos e notou três características principais desta
teoria: “(1) a cauda das variedades disponíveis é muito mais longa do que supomos; (2) ela agora
é economicamente viável; (3) todos esses nichos, quando agregados, podem formar um mercado
significativo.” (ANDERSON, 2011, p.10)
Vamos recorrer a um exemplo prático: em 2018, a youtuber Jout Jout leu o livro infantil A parte que
falta em um vídeo em seu canal. Houve um aumento de mais de cem vezes nos pedidos de
livrarias, e a editora Companhia das Letrinhas anunciou uma reimpressão para dar conta da
Amazon. O livro, que não era um lançamento, ficou no topo dos mais vendidos no site de
compras.
A FALSA OPOSIÇÃO ENTRE MÍDIA ONLINE E
OFFLINE
Como visto no vídeo, não há mais como separar os mundos físico e virtual, que se entrelaçam
cada vez mais na sociedade em rede. Isso também vale para as mídias. Elas não se excluem,
mas se complementam. Quantas vezes você se sentou no sofá diante da TV com o celular na mão
e ficou navegando no Twitter e comentando o programa a que assistia?
Uma pesquisa do IBOPE Conecta, sobre o comportamento do usuário brasileiro, mostrou que 95%
deles assistem à TV e navegam pela internet ao mesmo tempo. Dentre eles, 9% assistem à TV e
navegam na internet simultaneamente para interagir com a programação a que estão assistindo e
outros 9% discutem com amigos sobre o programa que estão vendo. Não é à toa que, durante as
transmissões de programas populares, como o Master Chef e o Big Brother, e de partidas de
futebol, hashtags referentes a eles entrem no topo dos Trending Topics do Twitter. No caso do Big
Brother, por exemplo, os telespectadores podem votar pela internet para escolher quem será o
eliminado da vez.
Paremos para pensar nas outras mídias de massa da era analógica. O rádio foi estendido para as
redes sociais, aplicativos de trocas de mensagens e até mesmo para a televisão. Os repórteres da
Band News, por exemplo, depois de gravarem suas reportagens em áudio, precisam fazer um
/
vídeo para ser publicado nas redes sociais da emissora. Eles também podem ser solicitados a
gravar a mesma reportagem para ser exibida na televisão aberta. Os principais programas de
estúdio têm transmissão ao vivo pelo Facebook. Além disso, diversas pautas surgem porque os
ouvintes são convidados a enviarem denúncias e sugestões pelo número de WhatsApp divulgado
no ar. Se um ouvinte perder a programação ao vivo, ela também estará disponível no aplicativo da
rádio. Aliás, isso também vale para a TV. A TV Globo, por exemplo, envia a programação da TV
aberta para o aplicativo Globoplay para smartphones e smart TVs.
 
Fonte:Shutterstock
SE VIVEMOS EM UMA SOCIEDADE EM REDE, O JORNALISMO
NÃO PODERIA ESTAR EXCLUÍDO DELA. O CONCEITO DE
JORNALISMO EM REDE, PROPOSTO POR ANSGARD HEINRICH
(2011), IMPLICA ENXERGAR AS ORGANIZAÇÕES
JORNALÍSTICAS COMO NÓS DE UMA COMPLEXA REDE DA
QUAL PARTICIPAM TAMBÉM OS CIDADÃOS COMUNS, AS
FONTES, OS JORNALISTAS INDEPENDENTES E BLOGUEIROS,
ENTRE OUTROS.
Ansgard Heinrich enxerga o jornalismo em rede extrapolando a esfera da internet. Como todos
estão em rede – fontes noticiosas, jornalistas e público – todos influenciam e são influenciados
/
pelos demais agentes envolvidos no processo, independentemente do grau de influência de cada
um e do suporte em que a comunicação se dá.
PORTANTO, O CONCEITO DE JORNALISMO EM REDE
ACABA COM A OPOSIÇÃO ENTRE MEIOS DIGITAIS E
ANALÓGICOS.
BARSOTTI, 2017.
QUANTO MAIS INFORMAÇÃO, MAIS
NECESSIDADE DE MEDIAÇÃO
E como lidar com tanta informação? A internet registra o maior crescimento entre as mídias na
história. No clássico A Sociedade em rede – A Era da Informação: economia, sociedade e cultura,
Manuel Castells afirma que, em 1973, quando a internet estava em seus primórdios, havia 25
computadores conectados à rede. Durante os anos 1970, o número aumentou para 256 e, na
década seguinte, para alguns milhares de usuários. Em 1999, nove anos após o surgimento da
World Wide Web (www), a interface gráfica que permitiu a criação de sites, a internet já conectava
63 milhões de computadores, 950 milhões de telefones (a internet era discada) e cinco milhões de
sites e era usada por 179 milhões de pessoas em todo o mundo.
MANUEL CASTELLS
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/
Manuel Castells é um sociólogo espanhol e referência nos estudos da sociedade em rede e
no pensamento sobre as transformações sociais no século XX.
E qual o volume de informação que circulava na rede? Em 2002, um estudo da Universidade de
Berkeley mediu a extensão dele. Intitulado How Much Information?, ele somou as informações
lidas, vistas e ouvidas, ao longo de 2002, em meios impressos, rádio, TV, internet e telefone.
Foram 70 milhões de horas transmitidas pelo rádio e 31 milhões pela TV, cinco bilhões de
mensagens instantâneas enviadas por telefone e 31 bilhões de e-mails trocados. Somente a
internet gerou 170 terabytes de informação, o equivalente a 17 bibliotecas do Congresso dos EUA,
o triplo do registrado no estudo anterior, realizado em 2000. (BARSOTTI, 2012)
Em 2019, éramos 3,9 bilhões de pessoas conectadas à rede ao redor do globo, ou 51% da
população mundial, segundo estudo da UIT, agência das Nações Unidas. A empresa Visual
Capitalist mensurou o que isso quer dizer em um minuto na internet:
1 milhão de logins no Facebook
41,6 milhões de mensagens enviadas no Facebook Messenger e no WhatsApp
3,8 milhões de buscas no Google
4,5 milhões de vídeos assistidos no YouTube
 Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal
Nessa avalanche de informações, seria ainda necessário o papel de seleção e curadoria exercido
por jornalistas, produtores culturais e editores de livros? Você acha que o fato de haver espaço
/
ilimitado para uma infinidade de produtos e serviços na web significa que ela dispense a
necessidade de mediação? Como fica a relação entre os emissores e os receptores à medida quetodos têm acesso aos meios de publicação?
 
Fonte:Shutterstock
Pierre Lévy está entre os autores que apostam nos efeitos democratizantes da rede. Em
Wikinomics: como a colaboração em massa pode mudar o seu negócio, Tapscott e Williams veem
com bons olhos o desaparecimento das fronteiras claras entre público e autor na internet. Eles se
referem aos prosumers, termo criado por Toffler (1980) para designar o produtor-consumidor
(producer + consumer, em inglês) de conteúdo. Para os autores, a democratização da tecnologia
estaria permitindo a inclusão de todos.
EM UM MUNDO ONDE TUDO O QUE VOCÊ PRECISA É
DE UM CELULAR COM CÂMERA PARA MOSTRAR O QUE
/
ESTÁ ACONTECENDO À SUA VOLTA, NÃO É MAIS TÃO
SIMPLES LIMITAR O PAPEL DE UMA PESSOA.
TAPSCOTT e WILLIAMS, 2006.
 ATENÇÃO
Cabe aqui uma ressalva: como vimos, apenas 51% dos habitantes do planeta têm acesso à
internet. No Brasil, a exclusão digital atinge um a cada quatro brasileiros, de acordo com dados do
IBGE.
Rosenbaum (2011) utiliza o termo curador de conteúdo que, para ele, é exercido tanto por
amadores quanto por profissionais, sem hierarquia entre eles. Ele enfatiza, no entanto, o valor da
curadoria humana sobre a dos algoritmos, que também atuam na seleção de conteúdos na
web: eles estão presentes nos sistemas de recomendação, nas redes sociais e nos buscadores.
Eles filtram nossas buscas e escolhas, mas são os humanos que adicionam valor à informação,
ressalta o autor.
Por outro lado, há autores que enxergam como preocupante o excesso de informações publicadas
por amadores na web, sem curadoria. Andrew Keen (2009), em O culto do amador, é bastante
crítico. Ele sustenta que a nação web 2.0 é tão digitalmente fragmentada que não é mais
capaz de debate informado. Para ele, na web, “as palavras do sábio não contam mais que os
balbucios de um tolo.” Vale lembrar que Keen escreveu o livro muito antes do cenário a que
estamos assistindo, de propagação de desinformação, com as chamadas fake news.
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Fonte:Shutterstock
ESSE APAGAMENTO DAS LINHAS ENTRE PÚBLICO E
AUTOR, FATO E FICÇÃO, INVENÇÃO E REALIDADE
OBSCURECE AINDA MAIS A OBJETIVIDADE. O CULTO
DO AMADOR TORNOU CADA VEZ MAIS DIFÍCIL
DETERMINAR A DIFERENÇA ENTRE LEITOR E
ESCRITOR, ARTISTA E RELAÇÕES-PÚBLICAS, ARTE E
PUBLICIDADE, AMADOR E ESPECIALISTA. O
RESULTADO? O DECLÍNIO DA QUALIDADE E DA
CONFIABILIDADE DA INFORMAÇÃO QUE RECEBEMOS,
DISTORCENDO ASSIM, SE NÃO CORROMPENDO POR
COMPLETO, NOSSO DEBATE CÍVICO NACIONAL.
/
KEEN, 2009.
No caso do jornalismo, diversos autores já apontaram para o risco da falta de curadoria da
informação que trafega na internet e sustentam que a era digital fortalece o papel do profissional.
Neveu (2006) acredita numa revalorização da função do jornalista, diante da abundância de
informação na web. Ele afirma que o caos da oferta de informação na internet pode devolver
sentido à necessidade de uma forma de certificado de garantia para o profissionalismo dos
jornalistas.
Wolton (2010) vai na mesma linha de pensamento. Para ele, a informação se tornou abundante,
mas a comunicação é uma raridade no cenário contemporâneo. Daí a necessidade do
intermediário, que seria o jornalista.
NÃO É O SUPORTE QUE DÁ SENTIDO À INFORMAÇÃO,
NEM O RECEPTOR, MAS O JORNALISTA. NESSA
LEGITIMIDADE DO JORNALISTA RESIDE O PAPEL
ESSENCIAL DA PROFISSÃO DE INTERMEDIÁRIO, QUE
MUITOS QUEREM REDUZIR, OU SUPRIMIR, EM FAVOR
DE UMA SUPOSTA ‘DEMOCRACIA DIRETA’.
WOLTON, 2010.
Um dos maiores youtubers do país, Felipe Neto disse, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo
(MEIRELES, 2020) que, sem os jornalistas, “não há chance de batalha” contra “os obscurantistas,
negacionistas e revisionistas”, referindo-se ao cenário das fake news em meio à pandemia de
coronavírus. “É preciso destruir o terraplanismo científico e histórico e trazer à luz (e à
popularidade) os verdadeiros cientistas, historiadores e comunicadores comprometidos com a
verdade”, afirmou.
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VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. O CENÁRIO CONTEMPORÂNEO DE MÍDIA DEMONSTRA QUE HÁ UMA
CONVIVÊNCIA DO SISTEMA BROADCAST COM O INTERCAST OU DAS
MÍDIAS DE MASSA COM AS MÍDIAS DE NICHO. HÁ AINDA OUTRA
CLASSIFICAÇÃO PARA DEFINI-LAS: “MÍDIAS-SOL” E “MÍDIAS-POEIRA”. A
RESPEITO DELAS, ASSINALE A ÚNICA OPÇÃO QUE NÃO É VERDADEIRA:
A) No sistema broadcast, a comunicação é vertical e centralizada. Já no intercast, ela é horizontal
e descentralizada.
B) Os meios de massa preveem um modelo de comunicação de emissão de mensagem de todos
para todos.
C) Não é mais possível fazer a distinção entre mídias offline e online porque todos os meios
atualmente convergem para a internet e são dependentes de interações digitais.
D) A metáfora das “mídias-sol” foi utilizada por Ramonet para caracterizar os meios de
comunicação de massa no cenário contemporâneo da comunicação.
2. NA INTERNET, O PÚBLICO PODE TANTO COMPRAR UM BEST-SELLER
QUANTO UM LIVRO DE UM ESCRITOR DESCONHECIDO. OU ASSISTIR A
UM FILME INDEPENDENTE QUE NÃO CHEGOU A NENHUMA COMPETIÇÃO
CONCORRIDA DO CINEMA MUNDIAL. ESSA POSSIBILIDADE ESTÁ
RELACIONADA AO SURGIMENTO DE NICHOS DE MERCADO PARA
PRODUTOS QUE NÃO VIRARIAM HITS E FOI CLASSIFICADA COMO
“CAUDA LONGA”. ASSINALE A ÚNICA OPÇÃO QUE NÃO CARACTERIZA O
CONCEITO:
A) Produtos de nicho, antes da internet, não tinham visibilidade porque não entravam em cartaz
nos cinemas, não chegavam às livrarias nem tocavam nas rádios.
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B) No varejo online, existe uma busca infinita por produtos de nicho que, somados, representam
um mercado significativo para bens culturais.
C) A “cauda” de variedades de produtos disponíveis é longa porque há demanda para eles,
independentemente de suas datas de lançamento.
D) A economia da era do broadcast era a economia da abundância: programas, filmes, discos e
livros eram campeões de venda e audiência.
GABARITO
1. O cenário contemporâneo de mídia demonstra que há uma convivência do sistema
broadcast com o intercast ou das mídias de massa com as mídias de nicho. Há ainda outra
classificação para defini-las: “mídias-sol” e “mídias-poeira”. A respeito delas, assinale a
única opção que não é verdadeira:
A alternativa "B " está correta.
 
Os meios de comunicação de massa, da era analógica, operam na lógica da oferta, onde a
comunicação seria estabelecida de um para todos: um emissor transmitindo a mensagem
para todo o público. Os meios de comunicação da era digital trabalham com a lógica da
demanda, onde a comunicação acontece de todos para todos.
2. Na internet, o público pode tanto comprar um best-seller quanto um livro de um escritor
desconhecido. Ou assistir a um filme independente que não chegou a nenhuma competição
concorrida do cinema mundial. Essa possibilidade está relacionada ao surgimento de
nichos de mercado para produtos que não virariam hits e foi classificada como “cauda
longa”. Assinale a única opção que não caracteriza o conceito:
A alternativa "D " está correta.
 
A economia da era do broadcast era a economia da escassez: poucos programas, filmes, discos e
livros tinham espaço nas salas de cinema, na grade da televisão, nas estantes das lojas. Mas as
apostas tinham que ser certeiras e eles precisavam gerar audiências de massa. Na internet, temos
o inverso: a economia da abundância, pois os custos da era analógica foram reduzidos no mundo
virtual.
/
MÓDULO 4
 Comparar os efeitos do texto linear e do hipertexto em contextos cross-media, transmídia e
multimídia
Será que é 100% verdadeira a afirmação de que a leitura de um livro ou de um jornal é sempre
linear? Quantas vezes você já ficou curioso em saber logo o final de um romance e foi xeretar o
fim do livro? Ou ainda pulou da página 5 de um jornal e foi direto para o Caderno de Cultura,
evitando a leitura do noticiário local e internacional, que vinham nas páginas imediatamente
seguintes àquelas em que você estava? Agora pensemos no mesmo livro e no mesmo jornal
sendo lidos em um dispositivo móvel. É claro que você também pode “pular” páginas tanto no e-
book quanto no jornal que estãodisponíveis em sua tela. A diferença é que poderá optar também
por outros caminhos a partir dos hiperlinks que encontrar em ambos. De um livro, poderá até
mesmo ir para outro. De uma edição do dia do jornal, poderá ir para a da semana anterior.
 
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O HIPERTEXTO: CAMINHOS MÚLTIPLOS
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De acordo com Fachinetto (2005), o termo hipertexto foi criado nos anos 1960, por Theodor H.
Nelson, com seu projeto Xanadu. Ele foi concebido para ser um processador de textos capaz de
lidar com várias versões de um texto e mostrar as diferenças entre elas.
O objetivo de Nelson, que era estudante em Harvard, era facilitar a escrita não linear. Por meio de
um documento eletrônico, o usuário poderia escolher seu próprio caminho de leitura. No livro O
labirinto da hipermídia: arquitetura e navegação no ciberespaço, Lúcia Leão (1999) expõe o
pensamento de Nelson: para ele, o hipertexto se constitui de escritas associadas não
sequenciais, conexões possíveis de se seguir, oportunidades de leitura em diferentes
direções.
 
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Refletindo sobre as diferenças entre hipertexto e hipermídia, George Paul Landow afirma que o
hipertexto é composto de fragmentos de texto e dos links que os conectam entre si. Para ele, o
termo hipermídia estende a noção de hipertexto, ao adicionar informação visual, sonora, animação
e outras formas de informação, além do texto (apud FACHINETTO, 2005).
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/
GEORGE PAUL LANDOW
George Paul Landow é professor emérito de História da Arte na Brown University. Ele é um
especialista em literatura, arte e cultura vitoriana, é ainda pioneiro em crítica e teoria da
literatura eletrônica, hipertexto e hipermídia.
Vale lembrar que, assim como no hipertexto, o usuário também escolhe seu caminho na
hipermídia: posso decidir entrar em outro vídeo “linkado” ao que estou assistindo, posso interagir
com infográficos (de modo que eles me apresentem os dados específicos que estou buscando),
posso seguir alternativas distintas em games e assim por diante.
DIFERENTEMENTE DA NARRATIVA LINEAR, O LEITOR TEM MAIS
LIBERDADE DE ABANDONAR A ORDEM PREVISTA PELO AUTOR
E ESCOLHER SEU PRÓPRIO CAMINHO DE LEITURA NO
HIPERTEXTO. NOS MEIOS DIGITAIS, O TEXTO PODE SER
FRAGMENTADO E RETIRADO DE UMA SEQUÊNCIA QUE
OBEDECE À LÓGICA DA ESCRITA, DE CAUSALIDADE ENTRE AS
ORAÇÕES. A LINEARIDADE, COMO JÁ VISTO, CARACTERIZOU
O HOMEM TIPOGRÁFICO, SEGUNDO MCLUHAN.
Mas será que foi somente com o hipertexto que aconteceu essa quebra da linearidade? Foi essa
pergunta que Aguiar e Barsotti (2010) fizeram no artigo As novas tecnologias digitais e as
perspectivas para o jornalismo e a literatura eletrônicos. Os autores notam que a linearidade já
vinha sendo problematizada mesmo antes da era digital. Uma hipótese é que seu surgimento
possa estar relacionado à forma fragmentada de lidar com a noção de espaço e tempo na
contemporaneidade.
Como já vimos, desde a invenção do telégrafo, os jornais passaram a noticiar eventos que, antes,
só poderiam ser incluídos nas edições muito tempo depois de terem acontecido. Teria começado
ali uma nova noção geográfica e temporal, que se aceleraria no século XX, com o rádio e a TV. As
transmissões ao vivo (o “aqui” e o “agora”) nos teriam levado à aldeia global prevista por McLuhan.
/
Eventos distantes geograficamente passaram a ficar próximos de nós e com cada vez mais
instantaneidade.
Na literatura, a tendência de quebra da linearidade nas narrativas já era observada em livros
publicados no século XX, citam Aguiar e Barsotti (2010). Dois exemplos são as obras O jardim dos
caminhos que se bifurcam (1941), de Jorge Luis Borges, e Se um viajante numa noite de inverno
(1979), de Italo Calvino, uma história que termina e reinicia continuamente. No cinema, a quebra
da sequência temporal pode ser observada no clássico Pulp Fiction, de Quentin Tarantino,
assinalam Aguiar e Barsotti (2010). A Ética, de Spinoza, é um livro de filosofia do século XVII
organizado em axiomas, proposições, definições, que se remetem uns aos outros. É possível
começar a leitura desse tratado em qualquer parte do livro e seguir as remissões conforme se
desejar.
 
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 Representação do ator John Travolta no cenário de Pulp Fiction, no Museu Madame Tussauds
em São Francisco.
PULP FICTION
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O filme começa e termina em assalto a um restaurante, e outras histórias se entrecruzam,
sem qualquer ordem cronológica. A estrutura, circular, estaria mais próxima do pensamento
mágico-mítico que teria voltado a nos encantar. Vale lembrar que o filme é de 1994, ainda no
início da popularização da internet.
O hipertexto é, portanto, uma inovação narrativa anterior à era digital. Mas o cenário digital
acelerou o processo. As histórias impressas, os filmes, os áudios e os vídeos estão transformando
os formatos lineares do passado. Aguiar e Barsotti (2010) sustentam que seria ingênuo acreditar
no purismo do texto impresso atualmente porque ele se interpenetra profundamente com o
eletrônico, a começar pelo meio em que são escritos.
MESMO QUE NÃO SE UTILIZE NENHUM RECURSO
DIGITAL COMO TÉCNICA DE LEITURA, É PRECISO
LEMBRAR QUE TODOS OS LIVROS E OS JORNAIS QUE
SE DESTINAM AO SUPORTE IMPRESSO SÃO ESCRITOS
ATUALMENTE NO COMPUTADOR. OU SEJA, ELES
TAMBÉM SOFREM INFLUÊNCIA DO NOVO MEIO E SÃO
POR ELE MODIFICADOS.
AGUIAR e BARSOTTI, 2010.
Umberto Eco, assim como fez em Apocalípticos e Integrados, em que expôs os argumentos dos
críticos e dos defensores dos meios de comunicação de massa, buscou o equilíbrio ao analisar os
efeitos do hipertexto no livro Sobre a literatura. Para ele, os contos “imodificáveis”, ou seja, os já
consagrados pelos livros impressos, ao contarem uma história, também contam a de cada
indivíduo. Por isso, sustentou, são amados. Por outro lado, Umberto Eco viu valor no hipertexto,
que pode educar para a liberdade e para a criatividade.
/
NARRATIVAS SEM FRONTEIRAS
Narrativas migram de um meio para o outro e adaptam-se às linguagens de cada um. Se houver a
crença de que o futuro das boas histórias dependerá da exploração dos recursos dos novos
meios, assistiremos a um descentramento cada vez maior das produções culturais e sua
interseção com outros campos. Assim como o hipertexto, essa falta de centralidade é anterior ao
computador. Instalações de artes plásticas que utilizam poesia multimídia não são novas. O
mesmo ocorre quando textos de jornais são lidos em rádio, lembram os autores. Mas é inevitável
sua aceleração na era digital, com a convergência das mídias. A especificidade de cada meio vem
se diluindo.
 
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 ZKM, Centro de Arte e Mídia de Karlsruhe, Alemanha.
Imaginando os diversos campos da cultura, como a fotografia, o cinema e a música, como círculos
que se interpenetram, Arlindo Machado (2007) constatou:
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CHEGA UM MOMENTO EM QUE A AMPLIAÇÃO DOS
CÍRCULOS ATINGE TAL MAGNITUDE QUE HÁ
INTERSEÇÃO NÃO APENAS NAS BORDAS, MAS
TAMBÉM NOS SEUS NÚCLEOS DUROS. ORA, ESSE É
JUSTAMENTE O PONTO DE RUPTURA: NO MOMENTO
EM QUE O CENTRO MAIS DENSO DO CÍRCULO,
IDENTIFICADOR DE SUA ESPECIFICIDADE, COMEÇA A
SE CONFUNDIR COM OS OUTROS, CHEGAMOS A UM
NOVO PATAMAR DA HISTÓRIA DOS MEIOS: O
MOMENTO DA CONVERGÊNCIA DOS MEIOS, QUE SE
SOBREPÕE À ANTIGA DIVERGÊNCIA.
A narrativa multimídia pode abrigar vários campos artísticos, entre eles as artes plásticas, o
design, o vídeo e a música, os games e a programação. Flusser (2010) observou que a fronteira
entre a categoria “arte” e a categoria “ciência e técnica” é eliminada pela produção multimídia: a
Ciência evidencia-se como forma artística e a Arte, como fonte de conhecimento científico.
Mesmo um romance pode combinar meios anteriormente usados em outras narrativas. Um
exemplo é Alice inanimada, de Kate Pullinger e Chris Joseph, que usa uma combinação de várias
mídias para contar a história de uma menina que sai de uma região da China para se tornar
designer de jogos. Como classificá-lo? Literatura, game, animação?
No jornalismo,um marco inaugural desse uso de diferentes mídias foi o especial Snow Fall, do
New York Times, publicado em 2012. No ano seguinte, a reportagem, sobre uma avalanche
ocorrida no estado de Washington com vítimas fatais, ganhou o Prêmio Pulitzer. Dividida em seis
capítulos, a história foi contada utilizando recursos multimídia: infográficos animados, vídeos
aéreos, animações, fotografias e hiperlinks.
Durante seis meses, uma equipe de reportagem e de especialistas em programação e design
planejou o projeto. A iniciativa foi considerada um divisor de águas no jornalismo online e foi
replicada no mundo todo. O Brasil também começou iniciativas do gênero, como o especial Belo
Monte, sobre a usina hidrelétrica, na Folha de S. Paulo. Na edição impressa, mereceu duas
/
páginas. Ou seja, nos meios analógicos, permanece a especificidade de cada um. Nos meios
digitais, as fronteiras ficam cada vez mais esmaecidas.
É BOM RESSALTAR QUE OS SITES JORNALÍSTICOS ESTÃO
PRESENTES NA INTERNET DESDE A SEGUNDA METADE DOS
ANOS 1990. ENTRETANTO, NOS PRIMÓRDIOS, ERA COMUM
QUE AS PÁGINAS IMPRESSAS FOSSEM APENAS
TRANSPOSTAS PARA O MEIO ONLINE. AS ATUALIZAÇÕES
ERAM RARAS NAQUELE MOMENTO. TAMPOUCO RECURSOS
MULTIMÍDIA ERAM USADOS. OS SITES LANÇAVAM MÃO
APENAS DO HIPERTEXTO. PORTANTO, O SNOW FALL FOI
CONSIDERADO UM MARCO POR TER UTILIZADO AS DIVERSAS
LINGUAGENS QUE A CONVERGÊNCIA TORNOU POSSÍVEL DE
FORMA FLUENTE E INTERATIVA.
MULTIMÍDIA, CROSS-MEDIA E TRANSMÍDIA
No artigo Interfaces e linguagens para o documentário transmídia, Renó (2013) procura
demonstrar a confusão que há entre os conceitos multimídia, cross-media e transmídia, embora
muitas vezes eles sejam aplicados sem distinção. Ele lembra que cross-media é um termo que
significa a transmissão de um mesmo conteúdo por plataformas diferentes, segundo demarcou
Henry Jenkins (apud RENÓ, 2013). Ou seja, você pode assistir a um filme na televisão aberta, na
tela do seu smartphone ou na sala de cinema. O conteúdo será exatamente o mesmo, embora as
experiências sejam bem diferentes.
Para Vicente Gosciola (apud RENÓ, 2013), os termos também devem ser usados de forma
distinta. Ele nota que o cross-media é uma linguagem geralmente adotada pelo marketing e que
teria ambições voltadas para o mercado. Já a narrativa transmídia, contaria uma história
expandida e dividida em várias partes que são distribuídas entre diversas mídias,
exatamente aquelas que melhor possam expressar a sua parte da história. Ou seja, os
produtos transmídia seriam complementares.
/
 RESUMINDO
Enquanto a estratégia cross-media distribui a mesma mensagem em multiplataforma, a
narrativa transmídia oferta mensagens distintas, ainda que relacionadas e complementares, em
ambiente multiplataforma.
Nos primórdios da internet, era comum veículos jornalísticos lançarem mão de uma estratégia
cross-media, distribuindo o mesmo conteúdo para várias plataformas. Mas aos poucos as
redações começaram a produzir conteúdos específicos para os meios.
Veja também a explicação do professor Anderson Lopes sobre multimídia, cross-media e
transmídia.
/
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. O “NÚCLEO DURO” DE CADA MEIO VEM SE DILUINDO NA ERA DIGITAL.
QUANTO MAIOR FOR A INTERSEÇÃO ENTRE ELES, NOTAREMOS O
FENÔMENO DA CONVERGÊNCIA, QUE SE SOBREPÕE À ANTIGA
DIVERGÊNCIA DA ERA ANALÓGICA. SOBRE A CONVERGÊNCIA, TODAS
AS AFIRMAÇÕES ABAIXO ESTÃO CORRETAS, EXCETO:
A) Reúne diferentes linguagens e meios.
B) Favoreceu a narrativa transmidiática.
C) Enfatiza a oposição entre as mídias analógicas e digitais.
D) Permite que os usuários participem e construam narrativas.
2. A HIPERMÍDIA ESTENDE O CONCEITO DE HIPERTEXTO PARA OUTRAS
LINGUAGENS, COMO A SONORA, A INFOGRÁFICA, A AUDIOVISUAL E A
DOS GAMES. NO HIPERTEXTO, O USUÁRIO DECIDE QUAL CAMINHO DE
CONSUMO VAI PERCORRER. MARQUE O ÚNICO EXEMPLO ABAIXO QUE
ESTÁ EM DESACORDO COM ESSA AFIRMAÇÃO:
A) Assim como no cinema, os usuários de um webdocumentário assistem ao filme obedecendo à
sequência linear, do contrário não entenderiam o desfecho da história.
B) Em um infográfico interativo, o usuário pode filtrar as informações que deseja consumir a partir
de alternativas apresentadas pelo produtor de conteúdo.
C) Em um podcast, assim como quando se ouve música online, o usuário retorna para ouvir
alguns trechos que não compreendeu ou vai diretamente para o episódio ou a canção seguintes
caso não esteja satisfeito com o que está ouvindo.
D) Em um game, o comando de ação do usuário vai determinar as etapas seguintes que
enfrentará.
/
GABARITO
1. O “núcleo duro” de cada meio vem se diluindo na era digital. Quanto maior for a
interseção entre eles, notaremos o fenômeno da convergência, que se sobrepõe à antiga
divergência da era analógica. Sobre a convergência, todas as afirmações abaixo estão
corretas, exceto:
A alternativa "C " está correta.
 
A convergência permite a reunião das mídias analógicas com as digitais. Um exemplo: Uma rádio
continua com suas transmissões pelas ondas eletromagnéticas ao mesmo tempo em que está
presente na web, com seu site, e nos smartphones, seja em aplicativos ou em plataformas de
distribuição de podcasts, como o Spotify.
2. A hipermídia estende o conceito de hipertexto para outras linguagens, como a sonora, a
infográfica, a audiovisual e a dos games. No hipertexto, o usuário decide qual caminho de
consumo vai percorrer. Marque o único exemplo abaixo que está em desacordo com essa
afirmação:
A alternativa "A " está correta.
 
Embora o diretor de um webdocumentário tenha previamente traçado um roteiro para o consumo
daquela narrativa audiovisual, com princípio, meio e fim, o usuário pode subvertê-lo, adiantando
cenas, retrocedendo para o começo da história quantas vezes quiser ou mesmo começando pelo
fim.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
/
Na passagem da cultura impressa para a digital, estamos assistindo a um longo caminho de
adaptações e mudanças que envolvem tanto o modo como produzimos quanto como consumimos
informação, o que engloba transformações tecnológicas, mas também culturais. Se atribuirmos
toda a revolução a que estamos assistindo no mundo contemporâneo à evolução das máquinas,
reduziremos o protagonismo dos humanos nesse cenário.
A grande mudança de paradigma da cultura impressa para a digital reside na migração da escrita
linear para o hipertexto. Em vez de seguir uma ordem de leitura sequencial, inaugurada pelo
alfabeto fonético, o usuário agora decide seu próprio caminho de consumo da informação. Na
contemporaneidade, o conceito de hipertexto foi estendido para hipermídia.
Para analisar esse cenário, estudamos os conceitos de meios quentes e meios frios, hibridismo,
mídia de massa e mídia de nicho, transmídia e cross-media. Assim, buscamos entender os efeitos
das novas mídias sobre nós, mas também as possibilidades que trazem para os produtores de
conteúdo do século XXI, que podem se valer das potencialidades de todas elas.
REFERÊNCIAS
AGRELA, L. Brasileiros amam ligar e mandar áudios, diz fundados do WhatsApp. In: Exame.
Publicado em: 12 fev. 2017.
AGUIAR, L.; BARSOTTI, A. As novas tecnologias digitais e as perspectivas para o jornalismo
e a literatura eletrônicos. In: Comunicação e Inovação, v.11, n.21, 2010.
ANDERSON, C. A cauda longa. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.
/
BARBOSA, R. Compreendendo McLuhan: O que são meios quentes e meios frios. In:
CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO NA REGIÃO NORDESTE
(Intercom Nordeste), 19.; DT 1 – JORNALISMO, 2017, Fortaleza. Anais, Fortaleza: Intercom
Nordeste, 2017.
BARDOEL, J.; DEUZE, M. Network Journalism: Converging Competencies of Old and New
Media Professionals. In: Australian Journalism Review, v.23, n.3, 2001.
BARSOTTI, A; AGUIAR, L. Duas telas, dois caminhos: a produção de notícias para celular e
tablet no panorama dos jornais brasileiros. In: Sur le journalisme, v.3, n.2, 2014.
BARSOTTI, A. Da manchete ao post: a formação de múltiplas agendas nas redes sociais. In:
Revista Contracampo, v.37, n.1,

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