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Vitória Farias – 2º semestre de Medicina { Vírus - Influenza } CARACTERÍSTICAS DOS VÍRUS ▬ Não são considerados organismos vivos; ▬ São parasitos intracelulares obrigatórios, porque dependem da maquinaria biossintética de células vivas para se multiplicar. ▬ Induzem a síntese de estruturas especializadas que podem transferir o ácido nucleico viral para outras células. ▬ Eles têm poucas ou mesmo nenhuma enzima própria para seu metabolismo. Por exemplo, não têm enzimas para a síntese proteica e a geração de ATP, por isso depende da célula hospedeira. ▬ Contêm um único tipo de ácido nucleico, DNA ou RNA. ▬ Contêm um revestimento proteico (às vezes recoberto por um envelope de lipídeos, proteínas e carboidratos) que envolve o ácido nucleico. ESTRUTURA VIRAL Um vírion é uma partícula viral infecciosa completa, totalmente desenvolvida, composta por um ácido nucleico e envolta por um revestimento proteico que a protege do meio ambiente. Os vírus são classificados de acordo com o ácido nucleico que possuem e por diferenças nas estruturas de seus envoltórios. → Ácido nucleico: Os vírus podem possuir tanto DNA como RNA, mas nunca ambos. O ácido nucleico dos vírus pode ser de fita simples ou dupla. Assim, existem vírus que apresentam o familiar DNA de dupla-fita, DNA de fita simples, RNA de dupla-fita e RNA de fita simples. Dependendo do vírus, o ácido nucleico pode ser linear ou circular. Em alguns vírus (como o vírus da gripe), o ácido nucleico é segmentado. → Proteína viral: As proteínas estruturais dos vírus desempenham várias funções importantes. O principal objetivo é facilitar a transferência do ácido nucleico viral de uma célula hospedeira para outra. Servem para proteger o genoma viral contra a inativação por nucleases; além disso, participam na fixação da partícula viral a uma célula suscetível e são responsáveis pela simetria estrutural da partícula viral. As proteínas determinam as características antigênicas do vírus. A resposta imunológica protetora do hospedeiro é dirigida contra determinantes antigênicos das proteínas ou glicoproteínas expostas na superfície da partícula viral. Algumas proteínas de superfície também podem exibir atividades específicas, como, por exemplo, a hemaglutinina do vírus influenza, que aglutina eritrócitos. → Capsídeo: O ácido nucleico de um vírus é protegido por um revestimento proteico chamado de capsídeo. A estrutura do capsídeo é determinada basicamente pelo ácido nucleico do vírus e constitui a maior parte da massa viral, sobretudo dos vírus menores. Cada capsídeo é composto de subunidades proteicas, denominadas capsômeros. Em alguns vírus, as proteínas que compõem os capsômeros são de um único tipo; em outros, vários tipos de proteínas podem estar presentes. → Envelope: Em alguns vírus, o capsídeo é envolto por um envelope, que geralmente Vitória Farias – 2º semestre de Medicina consiste em uma combinação de lipídeos, proteínas e carboidratos. Alguns vírus animais são liberados da célula hospedeira por um processo de extrusão, no qual a partícula é envolta por uma camada de membrana plasmática celular que passa a constituir o envelope viral. Em muitos casos, o envelope contém proteínas codificadas pelo genoma viral juntamente com materiais derivados de componentes normais da célula hospedeira. Os vírus cujos capsídeos não são envoltos por um envelope são conhecidos como vírus não envelopados. Nesse caso, o capsídeo protege o ácido nucleico viral do ataque das nucleases presentes nos fluidos biológicos e promove a ligação da partícula às células suscetíveis. → Espículas: Dependendo do vírus, os envelopes podem ou não apresentar espículas, constituídas por complexos carboidrato-proteína que se projetam da superfície do envelope. Alguns vírus se ligam à superfície da célula hospedeira através das espículas, que são características tão marcantes de alguns vírus que podem ser utilizadas para a identificação. A capacidade de determinados vírus, como o influenza, de agregar hemácias está associada à presença das espículas. Esses vírus se ligam aos hemácias, formando pontes entre eles. A agregação resultante, chamada de hemaglutinação, é a base de diversos testes laboratoriais úteis. Os vírus Orthomyxoviridae (vírus influenza) constituem um importante determinante de morbidade e mortalidade causadas por doenças respiratórias, e algumas vezes ocorrem surtos de infecção em forma de epidemia mundial. A influenza já foi responsável por milhões de mortes no mundo inteiro. A mutabilidade e a elevada frequência do rearranjo genético, bem como as consequentes alterações antigênicas nas glicoproteínas da superfície viral, tornam os vírus influenza um verdadeiro desafio em termos de controle. PROPRIEDADES DOS ORTOMIXOVÍRUS São conhecidos três tipos imunológicos de vírus influenza, designados pelas letras A, B e C. Verifica-se a contínua ocorrência de alterações antigênicas no grupo A dos vírus influenza e, em menor grau, no grupo B, enquanto o tipo C parece ser antigenicamente estável. 1. Estrutura e composição A partícula viral é circundada por um envelope lipídico derivado da célula. Duas glicoproteínas codificadas pelo vírus, a hemaglutinina (HA) e a neuraminidase (NA), são inseridas no envelope e expostas, em forma de espículas de cerca de 10 nm de comprimento, sobre a superfície da partícula. Essas duas glicoproteínas de superfície constituem os antígenos importantes que determinam a variação antigênica dos vírus influenza e a imunidade do hospedeiro. A HA representa cerca de 25% da proteína viral, e a NA, cerca de 5%. A proteína do canal iônico M2 ORTOMIXOVÍRUS Vitória Farias – 2º semestre de Medicina e a proteína NS2 também são encontradas no envelope, porém existem apenas algumas cópias por partícula. Devido à natureza segmentada do genoma, quando uma célula é coinfectada por dois vírus diferentes de determinado tipo, as misturas de segmentos dos genes parentais podem ser reunidas na progênie de vírions. Esse fenômeno, denominado reagrupamento genético, pode resultar em alterações súbitas nos antígenos da superfície viral - uma propriedade que explica as características epidemiológicas da influenza e que constitui um problema significativo para o desenvolvimento de vacinas. 2. Hemaglutinina: A proteína HA do vírus influenza liga as partículas virais a células suscetíveis e constitui o principal agente contra o qual são dirigidos os anticorpos neutralizantes (protetores). A variabilidade da HA é primariamente responsável pela contínua evolução de novas cepas e epidemias subsequentes de influenza. A hemaglutinina deve seu nome à sua capacidade de aglutinar eritrócitos em determinadas condições. 3. Neuraminidase: A antigenicidade da NA, a outra glicoproteína encontrada na superfície das partículas virais do influenza, também é importante na determinação do subtipo do vírus influenza isolado. A espícula sobre a partícula viral é um tetrâmero, composto de quatro monômeros idênticos. Existe um pedículo delgado que termina por uma cabeça em forma de caixa. A NA possui um sítio catalítico no ápice de cada cabeça, de modo que cada espícula de NA contém quatro locais ativos. A NA atua no final do ciclo de replicação viral. Trata-se de uma enzima sialidase que remove o ácido siálico dos glicoconjugados. Facilita a liberação das partículas virais das superfícies das células infectadas durante o processo de brotamento e ajuda a evitar a autoagregação dos vírions ao remover os resíduos do ácido siálico das glicoproteínas virais. É possível que a NA ajude o vírus a transpor a camada de mucina nas vias respiratórias para alcançar as células-alvo epiteliais. 3. Drift: O impulso antigênico é devido ao acúmulo de mutações puntiformes no gene, resultando em alterações dos aminoácidos na proteína. As alteraçõesna sequência podem afetar os locais antigênicos na molécula, de modo que o vírion consegue escapar ao reconhecimento pelo sistema imunológico do hospedeiro. O sistema imunológico não causa variação antigênica, mas outras funções, como a força de seleção que permite a expansão de novas variantes antigênicas. Uma variante deve sofrer duas ou mais mutações para que surja uma nova cepa epidemiologicamente significativa. 4. Shift: A mudança antigênica reflete alterações drásticas na sequência de uma proteína da superfície viral, alterações essas demasiado extremas para serem explicadas pela ocorrência de mutação. Os genomas segmentados dos vírus influenza sofrem rápido reagrupamento em células duplamente infectadas. O mecanismo para o deslocamento consiste no reagrupamento genético entre os vírus influenza humanos e os aviários. Os vírus influenza B e C não exibem mudança antigênica, visto que existem poucos vírus relacionados em animais. REPLICAÇÃO DO VÍRUS INFLUENZA 1. Fixação, penetração e desnudamento do vírus: Antes de tudo, o vírus precisa se fixar na célula. Para isso, ele se liga ao ácido siálico da superfície celular através do sítio receptor localizado no ápice do grande glóbulo da HA. Em seguida, acontece a endocitose mediada por receptor, em que as partículas virais são internalizadas em endossomos. A etapa seguinte envolve a fusão entre o envelope viral e a membrana celular, desencadeando o processo de desnudamento. O pH baixo, existente no interior do endossomo, é necessário à fusão da membrana mediada pelo vírus, que libera RNP virais no citosol. O pH ácido provoca uma alteração estrutural da HA, colocando o "peptídeo de fusão" HA2 em contato correto com a membrana. A proteína do canal iônico M2 presente no vírion permite a entrada de íons do endossomo na partícula viral, desencadeando a alteração estrutural da Vitória Farias – 2º semestre de Medicina HA. Em seguida, os nucleocapsídeos virais são liberados no citoplasma celular. A clivagem que separa HAl e HA2 é necessária para que a partícula viral seja infecciosa, sendo mediada por proteases celulares. Os vírus influenza normalmente permanecem confinados às vias respiratórias, visto que as enzimas proteases que clivam a HA são abundantes apenas nesses locais. Foram observados exemplos de vírus mais virulentos que se adaptaram para utilizar uma enzima mais onipresente, como a plasmina, para clivar a HA e promover infecção disseminada das células. A extremidade aminoterminal de HA2, gerada por clivagem, é necessária à fusão do envelope viral com a membrana celular - etapa essencial no processo da infecção viral. A presença de pH baixo deflagra uma alteração estrutural que ativa a atividade de fusão. 2. Transcrição e tradução: Os mecanismos de transcrição utilizados pelos ortomixovírus diferem acentuadamente daqueles observados em outros vírus do RNA devido à maior participação das funções celulares. A transcrição viral ocorre no núcleo. Os RNAm são produzidos a partir dos nucleocapsídeos virais. A polimerase codificada pelo vírus, constituída por um complexo das três proteínas P, é primariamente responsável pela transcrição. Sua ação deve ser orientada pelas terminações 5' metiladas e revestidas provenientes de transcrições celulares recém- sintetizadas pela RNA-polimerase II celular, o que explica o porquê a replicação do vírus influenza é inibida pela dactinomicina e pela α- amanitina, que bloqueiam a transcrição celular, enquanto outros vírus do RNA não são afetados, uma vez que não utilizam transcrições celulares na síntese do RNA viral. Seis dos segmentos do genoma produzem RNAm monocistrônicos, traduzidos no citoplasma em seis proteínas virais. As duas outras transcrições sofrem junção, produzindo cada qual dois RNAm traduzidos em diferentes quadros de leitura. Nas fases iniciais, após a infecção, ocorre a síntese preferencial das proteínas NS1 e NP. Em um estágio mais tardio, as proteínas estruturais são sintetizadas em alta velocidade. As duas glicoproteínas, HA e NA, são modificadas por meio da via secretora. A proteína não estrutural NS1 do vírus influenza desempenha um papel pós-transcricional na regulação da expressão gênica viral e da celular. A proteína NS1 liga-se a sequências poli(A), inibe a fixação pré-RNAm e a exportação nuclear de RNAm que sofreram junção, assegurando um reservatório de moléculas celulares doadoras para fornecer os primers necessários à síntese do RNAm viral. A proteína NS2 interage com a proteína M1 e está envolvida na exportação nuclear dos RNP virais. 3. Replicação: A replicação do genoma viral é efetuada pelas mesmas proteínas polimerases codificadas pelos vírus envolvidas na transcrição. Os mecanismos que regulam as funções alternativas de transcrição e replicação das mesmas proteínas estão relacionados com a abundância de uma ou mais das proteínas do nucleocapsídeo viral. A exemplo dos outros vírus de fita negativa, os modelos para a síntese do RNA viral permanecem recobertos com nucleoproteínas. Os únicos RNA totalmente livres são os RNAm. A primeira etapa na replicação do genoma consiste na produção de cópias de fitas positivas de cada segmento. Essas cópias antigenômicas diferem dos RNAm em ambas as terminações; as extremidades 5' não são revestidas, enquanto as extremidades 3' não estão truncadas nem poliadeniladas. Essas cópias servem de modelo para a síntese de cópias fiéis do RNA do genoma. Como existem sequências comuns em ambas as extremidades de todos os segmentos de RNA virais, elas podem ser reconhecidas de maneira eficiente pelo mecanismo de síntese do RNA. O entrelaçamento de segmentos do genoma provenientes de diferentes vírus parentais em células coinfectadas é provavelmente responsável pela alta frequência de reagrupamento genético típico dos vírus influenza dentro de um mesmo gênero. Foram observadas frequências de reagrupamento de até 40%. 4. Maturação: O vírus amadurece por brotamento a partir da superfície da célula. Os componentes virais chegam ao local de brotamento por diferentes vias. Os Vitória Farias – 2º semestre de Medicina nucleocapsídeos são organizados no núcleo e migram para fora da superfície celular. As glicoproteínas HA e NA são sintetizadas no retículo endoplasmático, modificadas e organizadas em trímeros e tetrâmeros, respectivamente, sendo inseridas na membrana plasmática. A proteína M1 atua como ponte, ligando o nucleocapsídeo às extremidades citoplasmáticas das glicoproteínas. A progênie de virions brota para fora da célula. Durante essa sequência de eventos, a HA é clivada em HA1 e HA2 quando a célula hospedeira tem a enzima proteolítica apropriada. A NA remove os ácidos siálicos terminais das glicoproteínas da superfície celular e viral, facilitando a liberação das partículas virais da célula e impedindo sua agregação. Muitas das partículas não são infecciosas. Algumas vezes, as partículas não formam capsídeos em torno de todo o complemento dos segmentos genômicos; com frequência, um dos grandes segmentos de RNA está ausente. Essas partículas não infecciosas são capazes de provocar hemaglutinação, podendo interferir na replicação do vírus intacto. Na atualidade, dispõe-se de sistemas de genética reversos que permitem a geração de vírus influenza infecciosos a partir de cDNA clonados de segmentos de RNA virais, permitindo os estudos funcionais e de mutagênese.
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