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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE DIREITO I DISCIPLINA: ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA PROFESSORA: CIBELE CARNEIRO ALUNA: NATHÁLIA PERES ANUNCIAÇÃO DA SILVA 2020.2 Análise do filme “Uma Lição de Amor” em observância do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/15). O filme conta a história de Sam Dawson, que é um homem com deficiência mental que abrigou uma mulher sem-teto e a engravidou. Após o nascimento do bebê, a mulher deixou a criança com o pai e foi embora. Lucy foi o nome dado em homenagem ao Beatles, “Lucy in the sky with diamonds…”, de quem Sam é grande fã. Com meu bebê recém nascido, Sam tem que se virar como pai solteiro para conciliar o trabalho com a filha, entretanto, ele conta com ajuda de vários amigos, a maioria deficientes. Com muita dedicação de Sam e muito amor, Lucy cresceu em um lar cheio de afeto, tornando-se uma menina linda e educada. Porém, perto do aniversário de sete anos, que é a idade mental de Sam estimada pelos médicos, a menina começa a ultrapassar intelectualmente o pai. A situação é percebida por ela em ocasiões como a leitura de um livro para dormir, onde o pai não conseguia pronunciar certas palavras que ela falava rapidamente, além do raciocínio mais lento. Com receio de magoar Sam, Lucy passou a fingir que não entendia certas palavras e coisas, como se quisesse retardar seu próprio desenvolvimento, atitude que chamou a atenção da professora, que contactou uma assistente social. Sam, apesar dos esforços da filha em tentar se auto-sabotar, percebeu o que a menina estava fazendo e a corrigiu imediatamente, pedindo para ela pronunciar corretamente as palavras que ela sabia ler, que não queria que ela fizesse isso, que ver o desenvolvimento dela era a maior felicidade dele. A menina relutou, porém atendeu ao pedido do pai, então leu corretamente o texto do livro. Entretanto, a correção do pai não foi o suficiente para o Conselho Tutelar, que imediatamente retirou a menina dos cuidados do pai, sem qualquer indício de maus tratos e/ou negligência, tomando uma medida drástica prejudicial tanto para Sam, quanto para Lucy. Com a filha em um abrigo, Sam buscou com a ajuda dos seus amigos uma advogada influente, que nunca realizava ações pro-bono, porém pela insistência de Sam em seu escritório, ela pegou a causa para tentar promover sua boa imagem com as pessoas do seu círculo social. Travando então uma dramática e cansativa disputa judicial para reaver a guarda da filha. Com o decorrer do processo, as testemunhas de Sam - seus amigos deficientes - tiveram seus depoimentos minorados, não sendo o bastante nem para a própria advogada acreditar que Sam ganharia a causa. Rita Harrison, a advogada, passou a conviver mais com Sam com o objetivo de tratar estratégias judiciais, o que fez com que o pai de Lucy notasse a relação da mesma com seu filho. Apesar de não ser deficiente, Rita não dava atenção e demonstrava o amor da forma que Sam fazia com Lucy, o que levantou o questionamento do que realmente é necessário para cuidar de uma criança. Com um fim dramático, após praticamente ir para adoção, Sam consegue a guarda de Lucy, principalmente por redenção da tutora provisória, que percebeu o amor e dedicação de Sam para criar a filha, o que era reconhecido pela menina. Dando uma verdadeira lição de amor para todos, principalmente para a advogada Rita. Analisando o filme conforme o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146), é importante ressaltar a importância dessa Lei no que tange a capacidade civil das pessoas deficientes, destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania. No Código Civil (Lei nº 10.406/02), a presunção era de incapacidade das pessoas deficientes, trazendo exemplo dos incisos II e III, do art. 3º: São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; II - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. Nos incisos II e II do art. 4º, dizia: São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; É notório que se a situação do filme se passasse no Brasil, antes da vigência da LBI, Sam perderia a tutela da Lucy por se enquadrar nas hipóteses acima, seria “classificado” como relativamente ou totalmente incapaz. Com as alterações trazidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, foram revogados os incisos supracitados e outros tiveram alterações significativas para garantir a capacidade da pessoa deficiente. A Lei Brasileira de Inclusão possui um capítulo inteiro que trata “Da Igualdade e Não Discriminação” (Capítulo II), que em seu art. 4º diz que toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação, e no § 1º classifica a discriminação em razão da deficiência toda forma de distinção, restrição ou exclusão, por ação ou omissão, que tenha o propósito ou o efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento ou o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais de pessoa com deficiência, incluindo a recusa de adaptações razoáveis e de fornecimento de tecnologias assistivas. Em comparação com o filme, percebe-se que Sam sofreu discriminação no pior sentido, tendo seus direitos fundamentais negados, sua capacidade retirada. O art. 5º diz que a pessoa com deficiência será protegida de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, tortura, crueldade, opressão e tratamento desumano ou degradante. Além do art. 6º reafirmar que: A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para: I - casar-se e constituir união estável; II - exercer direitos sexuais e reprodutivos; III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar; IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória; V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. No que tange o resguardo desses direitos, tem-se elencado o art. 7º, que diz que é dever de todos comunicar à autoridade competente qualquer forma de ameaça ou de violação aos direitos da pessoa com deficiência. E em seu parágrafo único: Se, no exercício de suas funções, os juízes e os tribunais tiverem conhecimento de fatos que caracterizem as violações previstas nesta Lei, devem remeter peças ao Ministério Público para as providências cabíveis; e no art. 8º reafirma o dever do Estado, da sociedade e da família assegurar à pessoa com deficiência, com prioridade, a efetivação dos seus direitos. Diante do exposto, percebe-se que Sam teria seus direitos fundamentais assegurados com mais facilidade se a situação do filme passasse em um lugar onde a Lei nº 13.146/15 estivesse em vigor.