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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA Psicologia Aplicada à Saúde - Atividade Avaliativa 1 Nomes da dupla e turmas: Júlia Cerutti C. de Freitas(turma 1) e Paula C. Sarti Brunelli (turma 2). Resenha Crítica sobre o filme “Estamira” (2004) O documentário “Estamira”, dirigido por Marcos Prado e lançado em 2004, retrata o cotidiano de uma senhora mentalmente perturbada de 62 anos, que vive como catadora em um lixão, no Rio de Janeiro. Taxada como louca por sua família, Estamira mostra a sua realidade e a de muitos brasileiros, destacando a pobreza e a saúde precária, assim, revela uma sociedade totalmente desumana e alheia às questões sociais. Com isso, é possível a realização da análise do filme com a obra de Carlos Batistella, “Abordagens Contemporâneas do Conceito de Saúde”. O texto de Batistella “Abordagens Contemporâneas do Conceito de Saúde” traz o retrato de uma pergunta, “O que é saúde?”, e levanta as diversas abordagens e o histórico desses conceitos ao longo do tempo. Desde ausência de doença, sinônimo de bem estar, norma ou direito, o significado de saúde foi sendo ampliado e restringido. Nesse contexto, muitas dessas ideias podem ser ilustradas através do filme “Estamira”. Primeiramente, tendo o conceito de saúde como ausência de doença, tem-se a explicação do filósofo americano Cristophe Boorse. De acordo com Boorse (citado por Almeida Filho & Jucá, 2002: p. 881, citado por BATISTELLA, 2007, p.54)., “a saúde de um organismo consiste no desempenho da função natural de cada parte”. Ao defender que a classificação de estados humanos como saudáveis ou doentes deve ser realizada somente com base em dados objetivos, Boorse (citado por BATISTELLA, 2007, p.54) exclui as questões social, econômica, cultural e psicológica. - O que se contrapõe ao documentário, visto que durante todo o filme mostra-se que todos esses aspectos influenciam sim no conceito de saudável ou não - principalmente quando a protagonista revela os abusos sexuais sofridos na infância, que refletem no seu psicológico atordoado. Por isso anular as vivências do indivíduo, prejudica o cuidado e o atendimento ao paciente, respeitar sua história o dignifica. Segundamente, faz-se possível relacionar o conceito de saúde como bem-estar social. Contrapondo-se ao conceito de saúde da OMS (1948, citado por BATISTELLA, 2007, pg. 57), “um completo estado de bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença ou enfermidade”, Caponi (1997, citado por BATISTELLA, 2007, p. 58) afirma que a maior contestação ao conceito da OMS refere-se ao fato de que sua adoção pode servir para justificar práticas arbitrárias de controle e exclusão de tudo aquilo que for considerado indesejável ou perigoso. E, em suma, tudo aquilo que é considerado ameaçador/arriscado, torna-se objeto de intervenção, realizada por meio de medicamentos. Em relação a esse conceito, fica bem explícito no filme essa intervenção através da medicação – Estamira, como todo ser humano, não possui um completo estado de bem-estar físico, mental e social (bem claro em todos os aspectos, por conta do lugar onde vive, por na maioria das vezes apresentar confusões mentais, alucinações) e, por conta disso, é taxada como louca por sua família, ou em outras palavras, como perigosa. Sendo considerada isso, tem-se a intervenção do seu médico psiquiatra: diversas caixas de remédios dadas a ela como forma de “controlar” a sua perigosidade. Em complemento, essa questão do controle causado pela medicação, permeia outro conceito, o de dimensão normativa de saúde. Esse é muito bem descrito por Foucault (1982c: p. 150 citado por BATISTELLA, 2007, p. 60) como “um dispositivo de seleção entre os normais e os anormais”, além de muito bem ilustrado no documentário. Estamira foi do início ao fim colocada fora da norma, julgada por não se encaixar nos padrões sociais de saúde e sanidade. Numa tentativa de melhorar essa questão, o filho tenta buscar ajuda profissional, mas Estamira só é obrigada a tomar uma série de remédios, que ela mesmo julgava controladores. Nessa ideia de saúde, onde se cria um padrão a ser seguido, a arma de controle social é visível, e a população se vê obrigada a seguir as diretrizes estabelecidas. Conclui- se através de uma reflexão conjunta do filme com o texto, que Estamira não se encaixava no padrão de saúde de nenhum tipo, possuía doenças mentais, fugia da norma, estava à margem da sociedade. Por isso, ao longo do tempo, sempre tentavam encaixar ela nos padrões, até chegar ao ponto de fazerem uma interferência medicamentosa, que foi recusada por ela. Portanto, fica nítido que na nossa sociedade, a tendência é sempre padronizar as pessoas, até se tratando de saúde, e o que o indivíduo julga certo para si mesmo, é por muitas vezes não levado em consideração. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ALMEIDA FILHO, N. de. & JUCÁ, V. Saúde como ausência de doença: crítica à teoria funcionalista de Christopher Boorse. Ciência e Saúde Coletiva, 7(4): 879-889, 2002. In: BATISTELLA, Carlos. Abordagens Contemporâneas do conceito de saúde. Rio de Janeiro, 2007, p.54. 2. BATISTELLA, Carlos. Abordagens Contemporâneas do conceito de saúde. Rio de Janeiro, 2007. 3. CAPONI, S. Georges Canguilhem y el estatuto epistemológico del concepto de salud. História, Ciências e Saúde – Manguinhos, IV (2): 287-307, jul-out., 1997. CARVALHO, S. R. Saúde Coletiva e Promoção da Saúde: sujeito e mudança. São Paulo: Hucitec, 2005. In: BATISTELLA, Carlos. Abordagens Contemporâneas do conceito de saúde. Rio de Janeiro, 2007, p. 58. 4. ESTAMIRA. Direção de Marcos Prado. Rio de Janeiro: Zazen Produções Audiovisuais Ltda, 2006. 5. FOUCAULT, M. Poder-corpo. In: FOUCAULT, M. Microfísica do Poder. 3.ed. Rio de Janeiro: Graal, 1982c. In: BATISTELLA, Carlos. Abordagens Contemporâneas do conceito de saúde. Rio de Janeiro, 2007. p.60.
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