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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS – UNIMONTES CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS - CCH DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO E LETRAS – DCL CURSO DE GRADUAÇÃO EM LETRAS PORTUGUÊS ALEXANDRE FIGUEIREDO CAVALCANTE O DISCURSO ARMAMENTISTA NA CAMPANHA PRESIDENCIAL DE 2018 Montes Claros – MG Agosto/2020 ALEXANDRE FIGUEIREDO CAVALCANTE O DISCURSO ARMAMENTISTA NA CAMPANHA PRESIDENCIAL DE 2018 Monografia apresentada ao curso de Letras Português, da Universidade Estadual de Montes Claros/Unimontes, como exigência para obtenção do grau de licenciado em Letras Português. Orientador(a): Profa. Dra. Ana Márcia Ruas de Aquino. Montes Claros – MG Agosto/2020 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO E LETRAS - CCH TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO - MONOGRAFIA Curso: Letras Português DEFESA PÚBLICA DO TRABALHO DE MONOGRAFIA FOLHA DE APROVAÇÃO Autor (a): Alexandre Figueiredo Cavalcante Título: O discurso armamentista na campanha presidencial de 2018 Monografia defendida e aprovada em _____/_____/______, com NOTA ____ ( ), pela comissão julgadora: Profª. Ana Márcia Ruas de Aquino – Orientadora Profª. Daniela Imaculada Pereira Costa – Examinadora Profª. Sandra Ramos de Oliveira Duarte Gonçalves – Examinadora Profª. Andrea Cristina Martins Pereira Chefe do Departamento de Comunicação e Letras Unimontes Profª. Maria Cristina Ruas de Abreu Maia Coordenadora Didática do Curso de Letras Português Unimontes Prof. Dorival Souza Barreto Júnior Coordenador de Monografia do Curso de Letras Português Unimontes Dedico este trabalho a minha amada mamãe, Nilma Figueiredo Santos, que sempre me apoiou, em todos os momentos da minha vida. Se cheguei aonde cheguei, muito disso se deve a ela, que se sacrificou pelos seus filhos para que eles pudessem alcançar o sucesso, além de lhes possibilitar o maior milagre que um ser vivo pode receber: a vida! AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus pela minha saúde, pela iluminação e por permitir a conclusão deste trabalho. À minha querida família, a meus irmãos, Abimael (Maninho) e Robson; a minha mãe, Nilma, e a meu pai, Abimael (Binha), a meus filhos, Eduardo, Erick, Magno, Marina e Otávio. A meus avós maternos, Seu Tião e Dona Melicia, a meus avós paternos, Seu Gregório e Dona Magnólia. A minha prima Vanilde, pelo incentivo a cursar Letras Português. Aos meus amigos da Polícia Penal. Aos meus demais amigos e professores, aos quais, de alguma forma, ajudaram-me e apoiaram-me em prol das minhas conquistas e do meu sucesso. Agradeço, especialmente, à minha orientadora, Ana Márcia, pelas primorosas aulas e inesquecíveis lições, ao longo da minha trajetória acadêmica, e pelas importantes orientações rumo à conclusão desta importante etapa da minha jornada universitária. Um agradecimento muitíssimo especial a minha mãe, Nilma Figueiredo Santos, que muito me apoiou para chegar aonde cheguei – e chegarei – e alcançar o sucesso que alcancei – e alcançarei... Por fim, agradeço a todos aqueles que, mesmo de longe, apoiaram minhas escolhas e acreditaram nesta conquista. O discurso político é, por excelência, o lugar de um jogo de máscaras. Toda palavra pronunciada no campo político deve ser tomada ao mesmo tempo pelo que ela diz e não diz. Jamais deve ser tomada ao pé da letra, numa transparência ingênua, mas como resultado de uma estratégia cujo enunciador nem sempre é soberano. (Patrick Charaudeau) Em sua defesa, as mídias declaram-se instância de denúncia do poder e destacam sua atuação no direito democrático que todo cidadão tem de se informar. (Patrick Charaudeau) RESUMO O presente estudo tem como temática o discurso armamentista na campanha presidencial de 2018, que teve como principais oponentes Fernando Haddad e Jair Bolsonaro. Objetiva-se, de modo geral, com este trabalho, analisar os discursos utilizados pelos candidatos, numa visão armamentista. De modo específico, os objetivos são: explicitar a trajetória eleitoral de cada candidato e o jogo discursivo da dissimulação; apresentar a proibição de armas no Brasil, tendo como base o Estatuto do Desarmamento – Lei 10.826/2003; averiguar as influências sociais do discurso político e do discurso midiático na decisão do eleitorado brasileiro. O procedimento metodológico foi uma pesquisa bibliográfica e documental, com abordagem qualitativa. Como resultados, nota-se que o discurso político e o discurso midiático estão relacionados ao discurso armamentista, cumprindo funções determinadas pelas relações histórico-institucionais que estruturam o direito democrático brasileiro. Como conclusão, observa-se que a produção de sentido se dá a partir do lugar que o ator político institui como sujeito enunciador, por meio da sua imagem (ethos), que passa pelo afeto (pathos), sendo estruturada por aquilo que o discurso demonstra ou encobre (logos). Palavras-chave: Eleições de 2018; Discurso armamentista; Discurso político; Discurso midiático. ABSTRACT This study has as its theme the arms speech in the 2018 presidential campaign, which had Fernando Haddad and Jair Bolsonaro as its main opponents. The objective of this work is, in general, to analyze the speeches used by the candidates, in an armamentist vision. Specifically, the objectives are: to explain the electoral trajectory of each candidate and the discursive game of dissimulation; to present the prohibition of weapons in Brazil, based on the Statute of Disarmament - Law 10.826/2003; to investigate the social influences of political discourse and media discourse in the decision of the Brazilian electorate. The methodological procedure was a bibliographic and documental research, with a qualitative approach. As a result, it is noted that political discourse and media discourse are related to arms discourse, fulfilling functions determined by the historical-institutional relations that structure Brazilian democratic law. In conclusion, it can be seen that the production of meaning takes place from the place that the political actor establishes as the enunciating subject, through his image (ethos), which passes through affection (pathos), being structured by what the discourse demonstrates or conceals (logos). Keywords: 2018 elections; Armamentist speech; Political speech; Media speech. SUMÁRIO INTRODUÇÃO................................................................................................................ 10 CAPÍTULO I – ASPECTOS CONCERNENTES A DISCURSO(S) E RETÓRICA 10 1.1- O Discurso religioso.................................................................................................. 10 1.2- O Ethos discursivo.................................................................................................... 13 CAPÍTULO II - INFORMAÇÕES ACERCA DO CENÁRIO DE INTERLOCUÇÃO.......................................................................................................... 17 2.1- O programa de televisão “De frente com Gabi”.................................................... 17 2.2 -O pastor Silas Malafaia............................................................................................ 18CAPÍTULO III – ANÁLISE DOS DADOS .................................................................. 21 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................... 27 REFERÊNCIAS............................................................................................................... .................................. 28 ANEXOS........................................................................................................................... ............. 29 INTRODUÇÃO................................................................................................................ 09 CAPÍTULO I – OS DOIS PRINCIPAIS CANDIDATOS À CAMPANHA PRESIDENCIAL DE 2018 – BOLSONARO E HADDAD ........................................ 12 1.1- A trajetória política de Jair Messias Bolsonaro ................................................... 12 1.2- A trajetória política de Fernando Haddad ........................................................... .......................................................................................... 14 1.3 O discurso político: o jogo de dissimulação ........................................................... 15 CAPÍTULO II - A PROIBIÇÃO DO USO DE ARMAS NO BRASIL ................... 17 2.1- O referendo sobre as armas................................................................................... 17 2.2 - A população e a insegurança social ..................................................................... ............................................................................................ 18 2.3 O discurso político e a manipulação estratégica para conquistar o eleitorado .. 21 CAPÍTULO III – DISCURSO POLÍTICO E DISCURSO MIDIÁTICO: PROCESSOS DE INFLUÊNCIA SOCIAL NAS ELEIÇÕES DE 2018 ................... 3.1 Análise das estratégias discursivas dos candidatos para a adesão do eleitor ...... 3.1.1 Análise dos princípios de alteridade, pertinência, influência e regulação para candidatos e eleitores ...................................................................................................... 3.1.2 Análise do ethos, pathos e logos na imagem do ator político ............................. 3.1.3 Instância midiática, instância política e instância cidadã nas malhas do discurso de campanha presidencial ............................................................................... 26 26 26 28 29 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................... 36 REFERÊNCIAS............................................................................................................... .................................. 28 9 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como temática, sob o ponto de vista armamentista, os discursos de campanha política de dois presidenciáveis que concorreram às eleições de 2018, Fernando Hadadd e Jair Bolsonaro. As propostas dos candidatos confundiam a opinião pública, ou seja, um candidato era a favor e outro contra a posse de armas pela população, o que acabou representando uma mudança na agenda de valores, nesse processo eleitoral. Diante desses aspectos, os quais foram observados no decorrer da campanha, foi definido o objeto de estudo desta pesquisa. Para embasar o estudo, foram realizadas leituras preliminares, a fim de se buscar o referencial teórico pertinente no arcabouço da Análise do Discurso, ciência que consiste em analisar a estrutura de um texto para, a partir daí, compreender as construções ideológicas nele presentes, tendo-se solidificado, por meio das leituras, o fato de que seria necessário estabelecer um vínculo entre os discursos político e midiático, pois essa área dialoga com outras áreas do conhecimento e há, no estudo em questão, uma inter-relação do discurso político com o discurso das mídias. Nesse sentido, a internet influenciou na campanha, por facilitar a difusão de informações pela rede mundial dos computadores, no entanto foi à mídia televisiva que contribuiu de forma decisiva, com os debates entre os políticos e, também, com as propagandas políticas. Ou seja, grande parte da população votante tem pelo menos um aparelho de televisão em sua residência, facilitando, assim, as opiniões, durante a campanha política, sobre as vantagens e desvantagens do armamento. A Análise do Discurso Francesa e a Ciência da Informação, no Brasil, sobretudo no que se refere à Organização da Informação e do Conhecimento, com as diferentes perspectivas dos estudos discursivos, presentes nas pesquisas sobre informação e conhecimento, podem revelar que as filiações teóricas interferem, produzindo distintos sentidos sobre o posicionamento político dos agentes, bem como das instituições de pesquisas. Dessa forma, as ideologias presentes em um discurso estão diretamente construídas, bem como influenciadas, pelo ambiente político-social em que o seu autor está inserido. Logo, é mais do que uma análise textual, voltando-se, também, para a análise contextual da estrutura discursiva do objeto examinado. O discurso político é um jogo de máscaras, tendo como intuito a persuasão do outro. Está inserido na instância social, como forma de comunicação, que representa os valores sociais, políticos e religiosos. Em períodos eleitorais, o discurso dos candidatos permite que a 10 satisfação individual aconteça como resolução dos problemas do coletivo. Nesse sentido, o discurso político necessita diretamente do discurso midiático, a fim de que as informações e divulgações das propostas cheguem até o eleitorado. Tanto o campo político quanto a mídia implicam um espaço que mobiliza o cidadão, valendo-se, ambos, da persuasão e da eloquência, para influenciar as ideias e as tomadas de decisões da população. A mídia comporta-se como uma máquina de informação que apresenta o noticiário deformado; valorizando uns em detrimento dos outros, descreve e analisa as restrições e desenvolve estratégias de encenação no discurso da informação, mostrando, assim, a realidade social por meio da manipulação. Os candidatos a presidente do Brasil, nas eleições de 2018, utilizaram-se tanto do discurso político quanto do discurso midiático, para informar o eleitorado brasileiro acerca das suas principais propostas governamentais, sendo supostamente o papel da população brasileira votante a análise das propostas que melhor solucionassem os problemas que a afligem. A pesquisa passou por revisão da literatura, método documental e teve uma abordagem qualitativa, com a finalidade de, em um primeiro momento, coletar as estratégias do discurso político, com um levantamento do discurso político e dos procedimentos midiáticos aos dados necessários. Num segundo momento, passou-se a analisar esses dados a partir dos pressupostos teóricos da Análise do Discurso, em sua linha francesa, de modo que esta pesquisa apresenta uma discussão sobre parte da crítica já produzida acerca do discurso político e do discurso midiático, sobretudo a que contemple o discurso armamentista nas campanhas eleitorais de 2018. Objetiva-se, portanto, de modo geral, com este trabalho, analisar os discursos utilizados pelos candidatos, numa visão armamentista, política e midiática. De modo específico, os objetivos são: explicitar a trajetória eleitoral de cada candidato e o jogo da dissimulação; apresentar a proibição de armas no Brasil, tendo como base o Estatuto do Desarmamento – Lei 10.826/2003; averiguar as influências sociais do discurso político e do discurso midiático na decisão do eleitorado brasileiro, uma vez que as ideologias construídas pelos sujeitos são influenciadas pelo ambiente político-social. Para alcançar tais objetivos, este trabalho foi dividido em capítulos, conformese apresenta a seguir: No primeiro capítulo, intitulado “Os dois principais candidatos à campanha presidencial de 2018 – Bolsonaro e Haddad”, apresentamos um panorama sobre esses 11 candidatos, as suas trajetórias políticas, bem como uma breve exposição acerca do jogo de dissimulação do discurso político. No segundo capítulo, cujo título é “A proibição do uso de armas no Brasil”, apresentamos o referendo sobre o armamento, com aspectos voltados para a proibição ou não do uso de armas, recorrendo ao Estatuto do Desarmamento – Lei 10.826/2003 – e à insegurança social, além do discurso manipulatório e estratégico na conquista do eleitorado. No terceiro capítulo, denominado “Discurso político e discurso midiático: processos de influência social nas eleições de 2018” discutimos o discurso político, o discurso midiático e os processos de influência social desses discursos nas eleições de 2018, dando enfoque à análise de estratégias empregadas na difusão dos atos de linguagem na campanha. Por fim, apresentamos as “Considerações Finais”, seguidas das “Referências”. 12 CAPÍTULO I OS DOIS PRINCIPAIS CANDIDATOS À CAMPANHA PRESIDENCIAL DE 2018 – BOLSONARO E HADDAD Neste capítulo, serão abordadas considerações acerca da trajetória dos candidatos Jair Messias Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), que disputaram as eleições presidenciais de 2018, trazendo para o enfoque das discussões, por meio da Análise do Discurso de corrente francesa, o discurso político. 1.1- A trajetória política de Jair Messias Bolsonaro O candidato Jair Messias Bolsonaro nasceu em Campinas, São Paulo, no dia 21 de março de 1955, descendente de famílias italianas (FRAZÃO, 2019). Bolsonaro foi aluno da Escola Preparatória de Cadetes do Exército, de Campinas, e, em 1977, formou-se na Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende, no Rio de Janeiro. O candidato cursou a Brigada de Paraquedismo do Rio de Janeiro, no Exército Brasileiro, formando-se no curso de Educação Física em 1983. Chegou à patente de capitão em 1986. Nesse mesmo ano, em seu exercício nessa função, chegou a liderar um protesto contra os baixos salários dos militares, destacando-se ao escrever um artigo polêmico para uma revista de grande circulação no País. Outro fato de sua carreira militar data de 1987, quando ele teria elaborado um plano que previa a explosão de bombas em quartéis e outros locais estratégicos no Rio de Janeiro. O capitão foi eleito vereador e, depois, deputado federal, com um discurso de defensor dos militares e pronunciamentos de pedidos de aumento salarial e mais investimentos para as Forças Armadas. Jair Messias Bolsonaro, na sua trajetória política, demonstrava-se como representante das forças armadas e também da segurança pública. A revista eletrônica Exame publicou uma matéria sobre o presidenciável, revelando que Bolsonaro sempre se insurgiu [...] contra a proteção que os direitos humanos conferem aos que estão sob custódia do Estado. Já disse ser a favor da pena de morte e contra o Estatuto do Desarmamento. Condena a descriminalização das drogas e quer que o cidadão comum possa se armar, em legítima defesa, contra ação de bandidos (VEJA..., 2018). 13 Nesse entendimento, Bolsonaro discursava pelo “novo” na política nacional, embora com um comportamento já “velho” e bem comum na trajetória de vários políticos brasileiros: ele passou por inúmeros partidos (PPB, PDC, PPR, PFL, PTB, PP e PSC), até desembarcar no Partido Social Liberal (PSL), no começo de 2018 (ELEIÇÕES..., 2018). Ao filiar-se, naquele ano, ao PSL, lançou-se candidato a presidente da República. Numa campanha eleitoral amparada pelas redes sociais, ele apostou num discurso conservador dos costumes, de recuperação da economia e de combate à corrupção e à violência urbana e, assim, mobilizou uma legião de seguidores. Vale ressaltar que o PSL (Partido Social Liberal) fora o partido do presidenciável Jair Bolsonaro à época das eleições presidenciais, entretanto, um tempo depois de ter vencido as eleições, o presidente desfiliou-se do PSL e teria criado uma nova legenda: Aliança pelo Brasil (D'AGOSTINO, 2019), fato esse que não gera qualquer tipo de interferência nas análises aqui pretendidas. Bolsonaro, nas eleições de 2018, defendeu um discurso armamentista para buscar a adesão do seu eleitorado. Com o argumento de facilitar o porte e a posse de armas para dar maior segurança aos cidadãos, já que o Estado teria falhado com seu dever de garantir segurança à população, caberia a cada brasileiro o papel de defender a si próprio, sua família e sua propriedade. O presidenciável Bolsonaro dizia, nos discursos de campanha, que iria suavizar regras a quem matasse em legítima defesa, ou seja, quando A atirasse em B, dentro da sua casa [de A] ou defendendo sua vida ou patrimônio, no campo ou na cidade, esse indivíduo que atirou responderia a processo, mas não teria punição. O discurso armamentista encontra ressonância numa sociedade que vivencia dois momentos importantes de sua história: (1) a ascensão da força repressiva, aliada ao (2) discurso defensor das armas de Jair Bolsonaro. Nesse sentido, os adversários evocavam que Bolsonaro propagava um discurso do ódio latente. Nessa linha discursiva, Bolsonaro retomou o resultado do referendo de 2005, quando o povo expressou, através do voto, o direito de comprar armas para se defender. Isso, todavia, levaria apenas a uma falsa sensação de segurança entre os indivíduos e, presumidamente, a um caos social. Portanto, o presidenciável Bolsonaro usava as redes sociais a seu favor, enquanto, cercado de múltiplas vozes, buscava interação com os seus seguidores, no intuito de persuadir o público com mensagens favoráveis ao armamentismo. Nesse viés de interações, a informação circulava como alvo positivo, ao mesmo tempo em que a sua campanha tornou-se 14 uma via de mão dupla, uma vez que usuários comentavam e opinavam, também, negativamente, acerca de suas ideias. 1.2- A trajetória política de Fernando Haddad O candidato Fernando Haddad (FRAZÃO, 2018) nasceu em São Paulo (SP), no dia 25 de janeiro de 1963. Formado em direito, tem mestrado em economia e doutorado em filosofia, sendo professor do Departamento de Ciência Política da USP (Universidade de São Paulo). Brasileiro, filho de imigrantes libaneses, disputou as eleições de 2018 como candidato à presidência pelo Partido dos Trabalhadores (PT), fato que se deu em decorrência de, no dia 7 de abril de 2018, o então candidato à presidência, pelo PT, Luiz Inácio Lula da Silva, ter sido preso. Com uma candidatura impugnada, com base na Lei da Ficha Limpa, a qual considera inelegíveis os candidatos condenados em segunda instância, Lula não pôde prosseguir como presidenciável, tendo o seu lugar sido ocupado por Haddad. No dia 14 de setembro de 2018, o PT anunciou, oficialmente, que Fernando Haddad seria o candidato do PT para as eleições presidenciais de 2018, embora houvesse contra ele acusações de improbidade administrativa e de fazer uso de “caixa dois”, na campanha para prefeito, em 2012. Para o cargo a vice-presidente, fora escolhida a deputada do Rio Grande do Sul, Manuela d‟Ávila. Haddad, no seu discurso, abordava que a maioria dos homicídios é cometido por armas de fogo e, diferentemente de seu adversário, posicionava-se contra o armamento da população. O candidato Haddad, com um discurso de marco legal, em diálogo com a comunidade educacional, organizações estudantis e toda a sociedade, deixava claro que as armas não seriam a sua linha prioritária. Esse candidato chegou a afirmar que haveria risco de confronto bélico no continente, se Jair Bolsonaro (PSL) se elegesse, diante de declarações por este feitas sobre a situação na Venezuela1 . Respondendo a uma pergunta de um jornalista argentino, Haddad afirmara ser preocupante a possibilidade de o Brasil ceder aos Estados Unidos à base de Alcântara, da Força Aérea Brasileira, no Maranhão, estando, futuramente, no governo o PSL (À IMPRENSA..., 2018). Nas eleições presidenciáveis de 2018, Haddad mantinha uma linha discursiva de que violência não se combate com violência, posicionando-se, como sempre, contrário à 1 Esse assunto será retomado no capítulo II, no segundo parágrafo do subitem 2.3. 15 liberação do porte de armas, dizendo que as pessoas não estariam preparadas para se defender e que cabia ao Estado fazer a sua parte; se não estivesse fazendo bem, que fosse construído o sistema único de segurança pública. 1.3-O discurso político: o jogo de dissimulação Segundo a BBC/Brasil (TOMBESI, 2018), em outubro de 2018, o Brasil foi às urnas para escolher um novo presidente. Treze candidatos estavam disputando as eleições. Para ajudar o eleitor, a BBC News Brasil preparou um especial interativo, com as propostas de todos os candidatos, divididas em seis temas: 1) educação e saúde; 2) segurança; 3) políticas sociais e direitos humanos; 4) economia e emprego; 5) política e corrupção; 6) política externa. A presença de um discurso atravessada por outro(s) discurso(s) é uma característica bastante marcante no discurso político. No caso em questão, está presente o fato de se trazerem experiências e impressões resultantes dos temas discutidos pelos presidenciáveis, com enforque no discurso midiático, para dentro do discurso político. Segundo Charaudeau (2008), para que o ator político consiga estabelecer o ethos de competência, numa cena política, ele deve ter o profundo conhecimento do domínio particular que exerce a sua atividade como política e provar que tem a experiência, bem como os meios necessários, para alcançar os objetivos prometidos durante a campanha eleitoral. Em suas promessas, dois candidatos se destacaram, numa perspectiva armamentista, explorando visões opostas, dada a relevância dos acontecimentos e fatos durante o processo eleitoral e as reações dos políticos em atos de manipulação discursiva, por meio das mídias, para vencer as eleições. O discurso político é, por excelência, dotado de persuasão. Além da argumentação, a persuasão é um dos aspectos mais importantes desse discurso. Podemos encontrar, nos atores que dele participam, a utilização de recursos retóricos e procedimentos linguísticos como meios de persuasão, na tentativa de se eleger, num cargo público, por votação popular. Conforme os estudos de Charaudeau (2015), as mídias manipulam tanto os outros quanto manipulam a si mesmas. Para manipular, é preciso um agente da manipulação que tenha um projeto e uma tática, mas é preciso também um manipulado. No discurso político, o tipo de argumentação mais usado é a construção do raciocínio por meio de dados, ou seja, o enunciador utiliza-se de dados como provas concretas para 16 fundamentar o seu ponto de vista e conseguir persuadir um auditório, conquistando, assim, novos adeptos para a sua candidatura. Segundo Charaudeau (2008), essas imagens são extremamente frágeis e, dependendo do momento histórico e da cultura do país, podem ser adoradas ou rejeitadas, demonstrando algumas fortes características do discurso político como a dinamicidade, a fragilidade e a sua condição provisória: “Qualquer que seja a construção dessas imagens e de seus efeitos sobre os povos, um fato se revelou para a história: elas são frágeis. Adoradas um dia, podem ser queimadas no dia seguinte.” (CHARAUDEAU, 2008, p. 89). Nesse sentido, diante do discurso antagônico de ambos os candidatos, o jogo constante das informações é tanto explícito quanto implícito, com o qual a circulação da informação ditava o dissimulado jogo dos presidenciáveis em defender ou atacar, por meio do ato de linguagem. 17 CAPÍTULO II A PROIBIÇÃO DO USO DE ARMAS NO BRASIL O Estatuto do Desarmamento é uma política de controle de armas que está em vigor no País desde 22 de dezembro de 2003. Ele foi sancionado com o objetivo de reduzir a circulação de armas e estabelecer penas rigorosas para crimes que envolvam tanto seu porte ilegal quanto o contrabando. A flexibilização da posse de armas, que acompanha a descrença na segurança pública, deixa uma temática favorável por uma parte da sociedade, ao passo que há uma opinião contrária por outra parcela da população. A ligação com a imagem dos presidenciáveis, ao longo dos debates, em 2018, demonstra ataques quanto a questões armamentistas. No decorrer do processo eleitoral, vimos, de diversas maneiras, explícita ou implicitamente, ser instituído o jogo de máscaras, tão presente no discurso tanto de Bolsonaro quanto de Haddad. O candidato Bolsonaro, na defesa do armamento do cidadão, sempre demonstrou sua ideologia, contrária à do concorrente, por este afirmar que armar o cidadão não geraria sensação de segurança. Neste capítulo, serão abordados esses aspectos que norteiam a campanha eleitoral de 2018. 2.1 O referendo sobre as armas O Referendo sobre a proibição ou não da comercialização de armas de fogo e munições, ocorrido no Brasil, a 23 de outubro de 2005, não aprovou o artigo 35 do Estatuto do Desarmamento (BRASIL, 2003). A proibição do comércio de armas de fogo e munição no Brasil foi rejeitada por quase dois terços dos eleitores, em referendo realizado, de acordo com resultados divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (BRASIL, 2005). O Estatuto do Desarmamento, conforme o dispositivo da lei 10.826/2003, já previa a possibilidade de proibição da venda de armas e munições no País, exceto para profissões especificadas, caso a população aprovasse a medida em referendo. Na consulta popular, realizada em 2005, a maioria dos eleitores disseram não à proibição. Com o resultado, continuam em vigor todas as demais disposições do Estatuto do Desarmamento, promulgado em 23 de dezembro de 2003, que já restringe a posse e uso de 18 armas de fogo às corporações militares e policiais, empresas de segurança, desportistas, caçadores e pessoas autorizadas apenas pela Polícia Federal. Então, a instância midiática escolhe fornecer uma informação de hipótese de defesa do patrimônio, num quantitativo reduzido, e, portanto, aponta um problema de ordem social, sustentando-se num número reduzido de receptores, que são os produtores rurais: O deputado federal e pré-candidato à Presidência da República, Jair Bolsonaro, disse, na quarta-feira (16/05) que, no que depender dele, o produtor rural terá um fuzil na propriedade. Ele fez a declaração durante passagem pela Agrobrasília, feira de tecnologia agrícola realizada em Brasília (DF). “No que depender de mim, o homem do campo vai ter fuzil em sua propriedade. Isso não é ser radical”, disse Bolsonaro, acrescentando que deixar o agricultor desarmado é ser “inconsequente e irresponsável” e deixá-lo “à mercê do MST e outros tipos de bandidagem”. Bolsonaro defendeu o endurecimento de penas para crimes como o roubo de insumos nas lavouras. “Ninguém vai pra cadeia por causa disso”. Disse ainda que ações de movimentos como o dos Trabalhadores Rurais Sem Terra devem ser tratadas como criminosas [...]”. (SALOMÃO, 2018). E essa instância [midiática] reproduz comentário do presidenciável Bolsonaro, durante a campanha eleitoral, quando este afirma que daria fuzis aos produtores rurais para lutarem contra os invasores de terra. A mídia reproduz um texto que fere a própria Constituição Federal (BRASIL, 1988): “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.”A derrota da proibição do comércio de armas e munições confirma a reviravolta na opinião pública, apontada pelos institutos de pesquisa, ao longo da campanha, a qual durou vinte dias, com horário obrigatório na televisão e no rádio. 2.2 A população e a insegurança social A população brasileira tem reivindicado aos poderes políticos a possibilidade de se armar para que, assim, consiga se defender. Essa busca por segurança induz o cidadão a pensar que uma arma possa lhe trazer segurança, no entanto o discurso em prol de se realizar mudanças consistentes no Estatuto do Desarmamento brasileiro facilitará o acesso de civis às armas. No ano de 2003, no governo do ex-presidente Lula, a lei 10.826, ou Estatuto do Desarmamento, entrou em vigor para reduzir ainda mais a circulação de armas e evitar o porte ilegal e contrabando. Além de dar mais atribuições ao Sistema Nacional de Armas (Sinarm), o 19 Estatuto passou a permitir a posse de armas apenas para formação profissional e por comprovada necessidade do cumprimento das atividades profissionais. Antes do Estatuto do Desarmamento (BRASIL, 2003), a venda de armas de fogo era permitida – para maiores de 21 anos de idade – em lojas ou em shoppings, nas seções de artigos esportivos, e a munição era encontrada em lojas de ferragem, nas prateleiras de caça e pesca. Entretanto, embora a proibição da venda facilitada dessas armas tenha acontecido com o referido Estatuto, desde então, parlamentares tentam mudar a lei de restrição da venda e posse de armas (ALESSI, 2017). A mídia não é apenas portadora de informação, isto é, possui o seu papel central na sociedade como formadora de opinião pública, o que a torna também central na construção da imagem que as pessoas fazem da política. Segundo Charaudeau (2015), as mídias apresentam os fatos e acontecimentos do mundo, fazendo circular explicações sobre o que se deve pensar acerca dos acontecimentos, propiciando, assim, o debate e o espaço crítico e reflexivo da cidadania. Com isso, o artigo 35 do Estatuto do Desarmamento, que dizia: “art. 35 - É proibida a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional, salvo para as entidades previstas no art. 6º desta Lei” (BRASIL, 2003) não entrou em vigor. Como estratégia argumentativa que enfatiza as diferenças entre os candidatos, ou seja, cria uma espécie de divisão entre pessoas e grupos, temos, ainda, a “diferenciação”. O objetivo é desunir e impedir os grupos de se polarizarem, de maneira que constituam barreiras para as relações existentes no exercício de poder. Desse modo: “O poder político é também parte interessada na construção da agenda midiática e, de maneira geral, no jogo de manipulação.” (CHARAUDEAU, 2015, p. 257). Dessa maneira, o poder político e as instâncias midiáticas impõem aos cidadãos os reflexos da atualidade social, fazendo com que a manipulação aconteça, influenciando a opinião e conscientização de cada indivíduo. Os dois presidenciáveis demonstraram, nas eleições de 2018, propostas para a segurança pública em situações divergentes, principalmente sobre o Estatuto do Desarmamento, estando um deles favorável, enquanto o outro era contrário. Percebemos, no decorrer do processo eleitoral, a manipulação política na prática social e de interação, e essa manipulação distinguiu outras formas de gerenciamento da mente dos oradores. O conhecimento do orador sobre seu público-alvo é um denotador de poder, isto é, num discurso, é nítida a argumentação para que o orador obtenha vantagem mediante as suas colocações, manipulando o discurso, a fim de que seja aceito em diversos aspectos. 20 Nota-se que os meios de comunicação deixaram de ser entendidos como canais e passaram a ser vistos como potenciais construtores de conhecimento, responsáveis pelo agendamento de temas públicos e formadores de compreensão sobre o mundo e a política, nas eleições de 2018. Com isso, “[...] o discurso das mídias procura pôr em cena responsáveis e mesmo eventuais culpados. Assim estaria assegurada uma possível captação, estaria assegurada, em todo caso, a repercussão.” (CHARAUDEAU, 2015, p. 187). O candidato Bolsonaro buscava, a todo o momento, exercer um controle social sobre o público que se fazia presente, bem como a manipulação e influência no processamento da informação sobre o armamento no País. No entanto, na fala do presidenciável, é notória a face manipuladora aos receptores, ao defender o porte de arma para o cidadão de bem. Ao mesmo tempo, direcionava ataques aos adversários contrários, ao afirmar que daria fuzis aos produtores rurais para lutarem contra os invasores de terra. O presidenciável Fernando Haddad, por outro lado, protestava contra o projeto armamentista do seu adversário, não concordando com a flexibilização do porte de armas, e manifestava, no seu discurso, que a liberação de armas ocasionaria mais violência. Assim, o presidenciável Haddad buscava atingir o cidadão que repudiava a facilitação de armas. A legislação brasileira, consoante a Lei de Segurança Nacional nº 7.170/1983 (BRASIL, 1983), considera crime fazer propaganda em público que incite à subversão da ordem política ou social, e fazer apologia ao crime e à luta, com violência, entre classes sociais. O discurso do candidato Bolsonaro tenta convencer, influenciar e compartilhar, em toda a mídia, para que chegue até o cidadão a mensagem de que ele tem que estar armado para se defender, quando for atacado ou violado pelo mal. No seu discurso, Bolsonaro busca atingir a confiança da população, com argumentos que possam validar a autenticidade e a veracidade de sua proposta como altamente importante para a sociedade brasileira e, assim, desconstruir o discurso do adversário Haddad. Segundo Charaudeau (2008), uma campanha de persuasão volta-se às categorias afetadas, para convencê-las dos fundamentos da situação em curso (palavra). O governo da palavra não é tudo na política, mas a política não pode agir sem palavra. Cabe então, analisar a possibilidade concreta de controle da informação por determinados grupos. Nesse sentido, observam-se a divisão e a manipulação feitas pela mídia, ou seja, a manipulação das informações operada por outras forças sociais, em contato com veículos informativos e jornalistas. 21 No discurso, as paixões/emoções aparecem com uma racionalidade subjetiva, pois se refere à busca de um sujeito por algo que, por sua vez, insere-se na ordem do desejo (CHARAUDEAU, 2010). Essa racionalidade subjetiva, impressa nos debates de temas polêmicos, tendo como versão mais radical essa percepção de Bolsonaro, acaba por corroborar um discurso pouco comum, para o período em vigência, que se justifica por ações extremistas e tem como características fazer apologia explícita às armas, conseguindo atingir um legado nas redes sociais. 2.3 O discurso político e a manipulação estratégica para conquistar o eleitorado As mídias sociais cresceram fortemente nos últimos anos e se tornaram uma relevante opção de comunicação entre os políticos e seu público-alvo, com seus interesses ideológicos, pela soma de benefícios como eficácia, alcance, interatividade, os quais proporcionam uma comunicação “em duas mãos” e em tempo real. Em matéria jornalística, cita-se a fala do candidato Haddad sobre possível conflito armado entre Brasil e Venezuela, além da cessão de uma base brasileira aos Estados Unidos, por parte de Bolsonaro: Eu não sei se esse vídeo, ele teria sido em um discurso na Avenida Paulista em que ele teria dito isso. Pela hostilidade que ele manifesta, com relação a esse vizinho em particular, quero crer que possa ter algum fundamento, lembrando que o Brasil está há 140 anos sem conflito com seus vizinhos, acrescentou o petista. Agora, a ideia também de colocar uma base militar americana no Brasil também é fonte de preocupação porque nósnão temos essa tradição. O Bolsonaro, e isso eu ouvi, declarou que a Base de Alcântara seria cedida para os americanos. Então há preocupações, pode haver uma escalada armamentista na região. (PESTRE, 2018). Haddad teme que o adversário coloque uma base militar americana no Brasil, o que seria preocupante, devido ao fato de o Brasil ser um país pacífico. E diz, ainda, Haddad, que o concorrente Bolsonaro estaria aliado aos Estados Unidos para influenciar na cessão da Base de Alcântara. Essa visão discursiva deflagra o perigo do armamentismo no País. O discurso político possui uma dinâmica, que é uma manifestação por meio da qual há uma repetida tentativa de fixar sentidos às propostas em um cenário de disputa política, devendo conter, em suas propostas, elementos comuns aos interesses do público. O discurso na política é para se conquistar o poder e chegar à vitória do seu exercício. Assim: “Todos os grandes políticos disseram, ou deram a entender, que a arte política reside 22 em uma boa gestão das paixões coletivas, isto é, em um „sentir com os outros‟ que [...] os tornam cegos quanto às suas próprias opiniões e motivações pessoais.” (CHARAUDEAU, 2008, p. 19). Durante o processo eleitoral, os candidatos, a todo o momento, tentam convencer os cidadãos de que os seus projetos são os melhores e, por meio de suas ações, constroem os sentidos dos enunciados para estarem à frente do outro, na corrida eleitoral. No tocante às mídias, estas são utilizadas no cenário político e, segundo Charaudeau (2015), são poderosas, e o cidadão torna-se delas refém. Para esse autor, as mídias: [...] são utilizadas pelos políticos como um meio de manipulação da opinião pública – ainda que o sejam para o bem-estar do cidadão; as mídias são criticadas por constituírem um quarto poder; entretanto, o cidadão aparece com frequência como refém delas, tanto pela maneira como é representado, quanto pelos efeitos passionais provocados, efeitos que se acham muito distantes de qualquer pretensão à informação. (CHARAUDEAU, 2015, p. 17) Contudo, as políticas de ação manipuladas são o resultado desse redirecionamento, o qual direciona o cidadão. A mídia falada, escrita e televisada são segmentos de discussões, debates e até entreveros que estão diante da realidade, porém faz parte da democracia e da cidadania. No Brasil, percebe-se que as eleições apontam vários discursos, nos quais há uma exposição de valores para persuadir o eleitor a votar em tal candidato. Quanto a essa ação, a qual a instância política quer sempre que o cidadão adira, devemos lembrar que à instância política não importa se os cidadãos singularmente vão aderir ou não. Ressalta-se o objeto armas, em duas expectativas de se conquistar o voto. Assim, um discurso de armas entre ambos é marcado profundamente pela presença de enunciadores midiáticos referentes tanto ao armamento quanto ao não armamento. A utilização dessas tecnologias por seus usuários demanda custos relativamente baixos a outras comunicações, se comparadas aos das mídias tradicionais. Os limites do poder político na mídia contemporânea se percebem no processo de estabelecer a manipulação para conquistar a opinião pública, ou seja, visa influenciar o eleitor no processo eleitoral. Como qualquer transmissor de informações, a mídia tem o poder de escolher aquilo que vai transmitir, e a maneira como vai transmitir. Para Charaudeau, “As mídias não transmitem o que ocorre na realidade social, elas impõem o que constroem do espaço público” (CHARAUDEAU, 2015, p. 19, grifos no original). Isso significa dizer que há uma distorção naquilo que é transmitido: 23 A ideologia do “mostrar a qualquer preço”, do “tornar visível o invisível” e do “selecionar o que é mais surpreendente” (as notícias ruins) faz com que se construa uma imagem fragmentada do espaço público, uma visão adequada aos objetivos das mídias, mas bem afastada de um reflexo fiel. Se são um espelho, as mídias não são mais do que um espelho deformante, ou mais ainda, são vários espelhos deformantes ao mesmo tempo, daqueles que se encontram nos parques de diversões e que, mesmo deformando, mostram, cada um à sua maneira, um fragmento amplificado, simplificado, estereotipado do mundo (CHARAUDEAU, 2015, p. 20). O objeto que transmite uma opinião enfoca distorção, e a mídia pode causar uma distorção suscetível a qualquer sujeito que enuncia. No discurso político, o tipo de argumentação mais usado é a construção do raciocínio por meio dos dados, ou seja, o enunciador utiliza-se de dados como provas concretas para fundamentar o seu ponto de vista e conseguir persuadir um auditório, conquistando, desse modo, novos adeptos para a sua candidatura. A internet passa a ser vista e utilizada como um meio para a propagação de conteúdos e de discursos, sem, no entanto, haver a necessária proteção aos direitos fundamentais e humanos, em seu ambiente, para se evitarem as distorções. Com ideologias distintas, um candidato defendia pauta conservadora, em se tratando dos costumes, sendo o outro mais liberal. As redes sociais de comunicação implicaram regras, ainda que a comunicação contextual atribuída e explicitada siga regras gerais do discurso, na interação, ou seja, alguns grupos condenam o discurso do Bolsonaro, outros aprovam. Assim também acontece com Haddad. Isso nos leva a observar que os políticos exercem o poder do discurso, reproduzindo suas convicções ideológicas e tentando influenciar, por meio da persuasão, os receptores. Na visão de Foucault (2014), o poder do discurso é considerado como um complexo de ordens que nos são impostas, sem que possamos delas nos defender, na medida em que, quando vamos contra ele [o discurso], somos tachados de loucos ou algo análogo. Isso remonta às paixões, aos efeitos patêmicos, que nos fazem trilhar o caminho da racionalidade subjetiva, ou seja, daquilo que é passional, em lugar da razão, e essas paixões envolvem a instância cidadã, votante, por meio das escolhas feitas pelas mídias, em relação aos candidatos, na maneira como isso chega até a população. Numa democracia, a participação popular no processo governamental é relevante para o processo político, visto que, na eleição 2018, os debates entre os candidatos, nos principais canais de comunicação, repercutiam em tempo real, por isso o papel da mídia social foi 24 relevante para que milhões de eleitores escolhessem as propostas presidenciáveis manipuladas pelas redes e mídias sociais. Charaudeau (2015, p. 277) expõe que a sociedade é formada e constituída por três entidades ou, melhor dizendo, três instâncias, sendo elas: [...] a instância política, a instância cidadã e, espremida entre as duas, se é que se pode falar assim, a instância midiática, propriamente dita. É dessa realidade que é preciso tomar consciência: não há relação dual entre o midiático e o político, como não há relação dual entre o midiático e o cidadão. Cada entidade se define por intermédio das outras e, portanto, uma depende das outras; sem isso não se produziriam os efeitos esperados nem haveria o interesse que desperta a informação. Tanto Bolsonaro como Haddad utilizaram do discurso político, do discurso midiático e de estratégias para conquistar o eleitorado brasileiro, usando do poder da palavra para convencê-lo [o eleitorado] de que um seria melhor do que o outro para a ocupação do cargo de presidente do Brasil. Ou seja: “Encontramo-nos, assim, em um jogo em que todos mudam sob a influência dos outros: a opinião sob a influência das mídias, as mídias sob influência da política e da opinião, o político sob influência das mídias e da opinião.” (CHARAUDEAU, 2008, p. 25). Desse modo, ocorreu, nas eleições de 2018, um jogo de manipulação e persuasão dos candidatos, como forma de convencer as pessoas de que a sociedade brasileira necessitava de presidentescomo eles. Evidentemente, cada um defendia pontos de vista diferentes, parecendo que, de fato, caberia à população o direito de escolha. Logo, o discurso político influenciou e influencia diretamente a opinião das pessoas, uma vez que a comunicação dos políticos é marcada por ideias e decisões que demonstram a “verdade” da informação, que é construída a partir do poder e da dominação. Após a vitória de Bolsonaro (PSL) à Presidência da República, o oponente derrotado, Haddad (PT), fez discurso em São Paulo, exaltando o papel do candidato do PSL ao representar os 45 milhões de brasileiros que o escolheram nessas eleições. Então, diante do resultado da eleição, o presidenciável Haddad, por meio de sua fala, torna o seu discurso uma fala para anônimos, pois a “verdade” da informação está expressa na escolha pelo discurso de poder e dominação do candidato adversário Bolsonaro. 25 CAPÍTULO III DISCURSO POLÍTICO E DISCURSO MIDIÁTICO: PROCESSOS DE INFLUÊNCIA SOCIAL NAS ELEIÇÕES DE 2018 Como já expresso anteriormente, esta pesquisa foi realizada à luz dos postulados da Análise do Discurso francesa. Partindo dessa noção do discurso, a seguir, apresentaremos aspectos do contrato midiático que possibilitam ao sujeito angariar para si estratégias para a situação de comunicação. Além disso, seguindo essa mesma noção, apontaremos o ethos, o pathos e o logos nessa campanha presidencial, e a sua relação com o candidato vencedor. 3.1 Análises das estratégias discursivas dos candidatos para a adesão do eleitor Segundo Charaudeau (2005), quando se refere ao contrato midiático, este trata de informação e de opinião, e há lógicas como finalidade para a legitimação do discurso, do sujeito, entre elas as lógicas de legitimidade, de credibilidade e de captação, ou seja, os espaços em que circulam as estratégias para essa situação de comunicação, no caso, a disputa presidencial de 2018. 3.1.1 Análise dos princípios de alteridade, pertinência, influência e regulação para candidatos e eleitores Os sujeitos desse discurso de campanha presidencial fizeram escolhas que nos permitiram identificar a sua finalidade, a sua identidade e o seu propósito, responsáveis pela sua legitimidade, credibilidade e captação. É constituído o lugar do sujeito falante como um sujeito enunciador, que vai corresponder: 1) ao princípio da alteridade – com as condições de legitimidade; 2) ao princípio da pertinência – com as condições de credibilidade; 3) ao princípio da influência e 4) ao princípio da regulação – com as condições de captação (CHARAUDEAU, 2005). Mediante tais princípios, analisaremos a forma como ocorreu essa correspondência na constituição do lugar do sujeito enunciador, a qual tornou exitosa a sua intencionalidade: Princípio da alteridade e suas condições de legitimidade: 26 Percebe-se que Bolsonaro, ao se engajar no ato de linguagem, legitimou a sua fala, assim como o seu espaço de fala, e, num jogo interdiscursivo ou de alteridade – na sua relação com o(s) outro(s) do discurso –, conseguiu justificar-se ao tomar para si a palavra, ou seja, a sua fala foi legitimada pelos interlocutores. Durante a campanha, as suas estratégias em relação aos interlocutores foram correspondidas e, mesmo havendo diferenças, embora houvesse semelhanças entre o presidenciável e os eleitores, havia entre eles saberes compartilhados e motivações comuns, capazes de estabelecer um processo mútuo de reconhecimento do outro, propício à legitimação do candidato como tal, por validar a troca linguageira entre esses parceiros: instância política e instância cidadã. Princípio da pertinência e suas condições de credibilidade: Sobre o princípio da pertinência, pode-se afirmar que Bolsonaro se utilizou do contexto que o cercava para que as suas estratégias de linguagem se adequassem a esse contexto, com atos de linguagem pertinentes ao ambiente que estava em construção na época da campanha: um período de crise econômica, de incertezas e de propensão a mudanças na composição partidária e política do Brasil, e as intencionalidades articuladas do candidato possibilitaram o compartilhamento de saberes sobre o mundo, valores psicológicos e sociais e de saberes sobre comportamentos. Princípios da influência e da regulação e suas condições de captação: Esses dois princípios, embora sejam diferentes, serão analisados em conjunto, por serem interdependentes, pois, para haver influência, deve haver uma regulação. Isto é, uma regulação do jogo de influências. Em se tratando do princípio da influência, todo ato de linguagem pressupõe que haja um “contrato” de influência entre locutor e interlocutor(es). O sujeito que produz o ato de linguagem espera afetar emocional ou afetivamente o interlocutor e orientar ou influenciar seu pensamento. Como se sabe, havia uma insatisfação concernente à política àquela época, no Brasil, e isso deixava propensa a população a ter o seu pensamento influenciado, captado pelo enunciador. Sobre o princípio da regulação, que é uma contrainfluência, há, aqui, um dispositivo de luta que é apaziguado por essa regulação, que impede o conflito e possibilita uma 27 intercompreensão entre enunciador e interlocutor(es), provocando, nesse caso, a troca entre candidato e eleitor, com a captação desse eleitor. Como os candidatos (Bolsonaro e Haddad) foram para o segundo turno, em 2018, não se nega que as estratégias de Haddad também foram parcialmente exitosas. Esses sujeitos puderam realizar o ato discursivo, cada um se utilizando de categorias de língua possíveis naquela enunciação, acatando as restrições também da enunciação e se adaptando ao “como dizer” para a instância cidadã (os eleitores), para a instância política (o candidato e o seu adversário), além da instância midiática (a imprensa falada, escrita, televisionada, on-line, por meio das várias mídias como Twitter, WhatsApp, Youtube, Facebook e outras mídias de internet, inclusive com o compartilhamento de fake news). 3.1.2 Análise do ethos, pathos e logos na imagem do ator político Consideramos essencial tratar da argumentação e da persuasão, na maneira como é produzida pelos candidatos, de acordo com as suas plataformas de governo, com a apresentação de propostas eleitorais, cujo propósito final buscado é, supostamente, trazer melhorias para a população. A persuasão passa pelo afeto, no sentido de armar ou não a nação, na busca de uma aproximação com o eleitor (pathos), e vemos que são extremamente importantes as imagens que o ator político institui de si mesmo, numa cena discursiva, pois, por meio dessas imagens (ethos), o candidato busca a identificação e a credibilidade para conseguir a adesão de novos eleitores, com o intuito de vencer as eleições e se constituir no cargo público que deseja, na campanha presidencial de 2018, naquilo que o discurso demonstra ou parece demonstrar/encobrir (logos). Em todo discurso existem essas imagens, desde as trocas verbais mais comuns, como um diálogo entre amigos, até uma manifestação proferida por candidatos a seus possíveis eleitores, como foi o caso deste trabalho. Essas imagens dependem muito do caráter moral e dos valores éticos e comportamentais que o enunciador apresenta perante o auditório para o qual ele está discursando. O enunciador deve ter um conhecimento prévio dos costumes e valores da sociedade, ou seja, dos seus interlocutores. O ethos mostra-se, ao longo desse jogo, com imagens extremamente vulnerabilizadas, com o candidato podendo obter êxito ou não, em determinado contexto, dependendo de diversos aspectos como, por exemplo, o momento histórico, as circunstâncias e os valores sociais que os eleitores esperam de seus governantes em determinada época. 28 Ao longo da trajetória aqui analisada, em se tratando da campanha, em 2018, dos candidatos à presidênciado Brasil, pôde-se perceber que essas imagens estão em conflito e expostas ao perigo de serem maculadas ou anuladas, ao sofrerem desqualificações pelos adversários políticos. Essa busca por sobressair, com a desconstrução da imagem do outro, institui uma dissimulação, que seria um jogo de significações, com a preservação e a desqualificação dos atores políticos. Para isso, os candidatos utilizam-se do recurso das máscaras, ou seja, do parecer ser verdadeiro. Esses recursos foram muito utilizados pelos candidatos, com diversas imagens sendo instituídas e confrontadas ao longo da campanha, como as imagens de armas, cenas demonstrativas do bom caráter do candidato, exposição dos candidatos e de suas famílias, apresentação de cada candidato como experiente para o cargo, entre outros. Além desses recursos, os candidatos utilizaram-se dos procedimentos expressivos que são ligados à oralidade, para manipular e persuadir o eleitor, amparados pela maneira de discursar, caracterizando a enunciação do ator político numa cena discursiva, a partir do pressuposto de que, ao falar de armas, convenceria o outro, com o bem falar. Esses recursos são fundamentais na busca por se eleger em um pleito bastante concorrido, em que qualquer falha pode prejudicar a imagem do candidato, acarretando em perdas de votos. No discurso armamentista da campanha presidencial de 2018, o candidato Bolsonaro (PSL) defendia a ideia de que o armamento seria uma maneira de proteção à população brasileira, enquanto Haddad (PT), em seu discurso, relatava que os homicídios são cometidos por armas de fogo e se posicionava contra o armamento da população, afirmando ser a favor da educação e contra a violência e as armas. Os candidatos utilizaram-se do discurso político, da persuasão, da manipulação e do discurso midiático para convencer e mostrar à população brasileira as suas ideias para o progresso do Brasil. A política, conforme Charaudeau (2008), é uma área de batalha em que se trava uma guerra simbólica para estabelecer relações de dominação ou pactos de convenção entre um determinado grupo. 3.1.3 Instância midiática, instância política e instância cidadã nas malhas do discurso de campanha presidencial As últimas campanhas eleitorais brasileiras se caracterizaram pelo uso e pela incorporação maciça da internet e das mídias sociais como ferramentas de propaganda pelos 29 candidatos. Em relação às eleições de 2014 e 2016, consolidaram essa tendência todos os candidatos aos cargos majoritários e aos cargos proporcionais, ao fazerem uso de algum tipo de mídia digital – como ferramenta de comunicação e interação com os cidadãos –, de maneira geral, e não apenas com o potencial eleitor (BRAGA; CARLOMAGNO, 2018). Nesse sentido, o acesso às mídias digitais dá voz e visibilidade à política e aos próprios candidatos que estão concorrendo aos respectivos cargos. Os políticos, por meio das mídias, desempenham e ampliam, no contexto público, suas ideias e opiniões, fazendo com que os cidadãos tomem conhecimento de seus discursos. O debate político, por exemplo, nas rádios, nas televisões e nos canais on-line, traz manifestações políticas que aumentam, cada vez mais, a inclusão dos candidatos na sociedade, tendo efeitos negativos ou positivos na comunicação social. Desse modo, O comentário midiático corre o risco constante de produzir efeitos perversos de dramatização abusiva, de amálgama, de reação paranoica. Assim, a instância midiática procura, para compensar tais efeitos, multiplicar os pontos de vista e colocar num plano de igualdade os argumentos contrários. Talvez esteja aí a especificidade do comentário jornalístico: uma argumentação que, certamente, bloqueia a análise crítica, mas que, pela sua própria fragmentação, sua própria multiplicidade de pontos de vista, fornece elementos para que se construa uma verdade mediana. É uma atitude discursiva que aposta na responsabilidade do sujeito interpretante. (CHARAUDEAU, 2015, p. 187). Tendo como base a assertiva acima, percebe-se que o discurso das mídias desempenha estratégias de informações que manipulam diretamente a sociedade e funcionam como máquina que instaura e dramatiza o espaço público. Em 2018, o candidato Bolsonaro defendia a importância do armamento à população e, segundo o Instituto Datafolha (MAIORIA..., 2018), depois de ser tema da campanha eleitoral em vários momentos, o direito a se armar continua sendo rejeitado pela maioria dos eleitores brasileiros. Para 55% deles, a posse de armas deve ser proibida, pois representa uma ameaça à vida das pessoas, e 41% pensam o contrário, que possuir uma arma legalizada deveria ser um direito do cidadão para se defender. Os demais 4% preferiram não opinar sobre a questão. Percebe-se que a maioria da população brasileira é contra o armamento social, no entanto, essa maioria foi contraditória, ao eleger o candidato que defendia o direito ao armamento. O discurso político do candidato Bolsonaro teve repercussão positiva no primeiro turno, levando-o ao segundo turno, em parte pelas mídias sociais (WhatsApp, Twiter, You- tube). Nessas mídias, foram veiculadas fake news com um papel ativo, apelativo para os bons costumes e o conservadorismo, que causaram grande impacto na instância cidadã, o que 30 ocorreu, também, em outras eleições como a de Hillary Clinton e Donald Trump, nos Estados Unidos. Em se tratando de Jair Bolsonaro, a sua campanha, para o uso dessas mídias, “[...] contou com assessoramento profissional, nacional e internacional, assim como com recursos de setores patronais apoiadores de sua candidatura (VARGAS et al., 2018, p. 98). A comunicação midiática desse candidato ao cargo de presidente do Brasil foi de suma importância, pois, desse modo, a população passou a conhecê-lo, bem como as suas ideias políticas. “O discurso político do candidato líder da contenda [Bolsonaro] e a própria eleição assumiram assim um caráter novo e atípico que esvaziou a esfera pública como era entendida tradicionalmente.” (VARGAS et al., 2018, p. 101). O discurso político de Haddad foi determinado por dois eixos: “um primeiro não antagonista”, apegado à identidade de Lula e do que ele representou política e administrativamente; “um segundo antagonista, pautado por uma campanha estruturada em torno de fake news, disseminadas nas redes sociais.” (BALTHAZAR et al., 2018, p. 79). Haddad critica e é contrário ao armamentismo da população, e evoca, no seu discurso político, uma agenda de valores relativos a uma pauta eleitoral já “normalizada”: educação, defesa da democrática, das políticas públicas, da inclusão, da valorização da economia e da sociedade. A identidade política de Haddad ganha dimensão nacional a partir da gestão como Ministro da Educação, no segundo governo de Lula. Haddad seguia o modo de campanha consolidado nas democracias liberais desde o final dos anos 1960, centrado no debate público fundado mais na razão que na paixão, mediado e formatado para mídias eletrônicas, principalmente para a televisão. O campo conservador efetivamente secundarizou ou inviabilizou debates sobre projetos políticos, sobre inclusão, qualidade de vida e distribuição de renda que tradicionalmente marcam esse momento do jogo democrático (BALTHAZAR et al., 2018). Tanto Bolsonaro quanto Haddad utilizaram-se das instâncias midiáticas para proferirem seus discursos políticos, de maneira que a persuasão, a enganação, o jogo e a manipulação se fizeram presentes na comunicação de ambos os candidatos. Charaudeau (2015) entende que toda manipulação acontece por meio de uma enganação, cuja vítima é o manipulado. Observa-se a população como vítima (manipulado), e os políticos como atores (manipuladores) de opiniões e detentores de poder. Os discursos políticos dos dois candidatos ao cargo de presidente nos mostram um jogo de cenas eum baile de máscaras, em que cada um defende seu ponto de vista, baseado em ideias que, para eles, são primordiais à sociedade brasileira. 31 Bolsonaro defendeu como propostas reduzir gradativamente os impostos e reduzir os ministérios, sendo totalmente contra a volta do imposto sindical obrigatório, radicalmente contra as drogas e a favor da vida. Já o candidato Haddad falou em criar novas taxas; fazer a reforma agrária para beneficiar grupos organizados; querer desmilitarização das polícias; esvaziar presídios, soltando presos que cometeram crimes menos graves; expandir o programa de governo; aumentar o poder dos sindicatos; defender a legalização do aborto e da maconha (VARGAS et al., 2018). Bolsonaro e Haddad defenderam, na campanha eleitoral de 2018, pontos de vistas diferentes, porém ambos defendiam com veemência os seus discursos, tentando, de maneira persuasiva, convencer o eleitorado brasileiro. Para Charaudeau (2008), o pensamento tem influência em relação à opinião do outro, e ocorre que ele pode igualmente ser mascarado por procedimentos de comunicação empática, tais que, ao final dessas manipulações comunicativas mais ou menos voluntárias, constroem- se novas formas do pensamento político. Desse modo, o uso das mídias sociais encontrou relevância, também, nessa disputa presidencial, já que estas se tornaram um ingrediente indispensável durante as campanhas eleitorais, funcionando como um processo de construção de imagens e de redes de apoio aos políticos, não obstante possam ser apontados os fenômenos negativos, nas campanhas, associados a essas mídias digitais. Como alguns desses fenômenos negativos estão: o uso de bots (robôs), as notícias falsas deliberadamente produzidas, os falsos perfis dos candidatos e de seus adversários ou a propagação remunerada de mensagens de ódio (ROMANO et al., 2018a). As mídias, juntamente com a instância política, são duas ferramentas que constroem e influenciam as opiniões sociais, desempenhando pontos positivos e pontos negativos no ambiente social. Sendo assim, as mídias contribuem significativamente para as campanhas eleitorais, fazendo do discurso político um jogo de manipulação, em que cada candidato apresenta a sua realidade disfarçada, visando ao próprio bem individual (na tentativa de garantir a vitória nas eleições), não o bem da população. A instância midiática controla e reforça esse discurso político, retroalimentando-o, mas não oferece aos cidadãos os acontecimentos “brutos”, informa deformando, persuadindo e mostrando pontos que a favoreçam, como se pode observar a seguir (Figura 1): 32 Figura 1: Discurso de campanha eleitoral INSTÂNCIA POLÍTICA INSTÂNCIA MIDIÁTICA INSTÂNCIA CIDADÃ Fonte: Adaptado da noção dos três lugares de fabricação do discurso político (CHARAUDEAU, 2008, p. 55-64). Dos candidatos (instância política) para as mídias (instância midiática), é um processo de fluxo sem “reservas”, ou seja, as mídias “recebem” o discurso manipulatório-persuasivo dos candidatos e, por sua vez, informam/opinam, manipulando-o, de acordo com seus interesses, que não deixam de ser, também, interesses políticos e sociais. Quando é das mídias para a população (instância cidadã), esta instância deixa para trás questões importantes relativas às decisões que irão determinar suas escolhas e, restringindo a sua leitura ao discurso tanto dos candidatos quanto das mídias, parece usar uma espécie de funil, em que o jogo discursivo amplo, largo – vindo dos candidatos e das mídias –, vai se diminuindo até chegar ao auditório (a população), já “processado” pelos oradores e pela linguagem, e a população não alcança os disfarces usados nesses discursos. Ressaltamos que, ao fazer esse tipo de menção ao discurso que chega à instância cidadã, não estamos censurando essa instância. Sob o ponto de vista do discurso, sabemos da importância equivalente de todas elas para a constituição da retórica, bem como afirma Meyer (2007, p. 25): “[...] o ethos, o pathos e o logos devem ser postos em pé de igualdade, se não quisermos cair em uma concepção que exclua as dimensões constitutivas da relação retórica. O orador, o auditório e a linguagem são igualmente essenciais.” As três instâncias mencionadas são essenciais para a construção da retórica, mas não se nega o domínio dos candidatos e das mídias. Por meio dos discursos político e midiático, Bolsonaro e Haddad apresentaram suas propostas, participaram de debates e expuseram seus principais pontos de vista para, aquele que vencesse as eleições, assumisse a presidência e, 33 supostamente, garantisse a melhoria do Brasil, utilizando-se do jogo manipulatório (que inclui as mídias) para a conquista da confiança do eleitorado brasileiro. Em relação ao posicionamento dos candidatos quanto ao armamento dos cidadãos brasileiros, Bolsonaro afirmou que pretendia “jogar pesado” contra o crime e lutar contra a redução da maioridade penal; prender e manter os criminosos na cadeia; acabar com a redução de penas e a saidinha da prisão, defendendo, ainda, que o cidadão deve ter direito à legítima defesa (VARGAS et al., 2018). Haddad pretendia desmilitarizar as polícias; esvaziar presídios, soltar presos que cometeram crimes menos graves e desarmar a população (VARGAS et al., 2018). Os discursos dos candidatos à presidência se contradizem, pois um é a favor do discurso armamentista e o outro não, cabendo à população o direito de escolha. Fica evidente, conforme dados do Datafolha (MAIORIA..., 2018), que a própria população brasileira afirmou ser contra o armamento, mas, no final, essa mesma população contrapõe seus discursos, votando no candidato que defende o porte de arma. É importante ressaltar que nosso objetivo, nesta pesquisa, não é defender questões partidárias, mas sim expor os discursos dos candidatos à presidência em 2018. É nesse sentido que se faz necessário mencionar, neste trabalho, tanto o posicionamento dos políticos quanto o dos cidadãos acerca do porte de arma. Os jogos de espelhos, de imagens e de manipulação estão presentes em todas as instâncias, sendo elas: as instâncias midiáticas, as instâncias políticas e a instância cidadã. “Trata-se de uma relação triádica entre o político, o midiático e o cidadão, sendo que cada uma dessas entidades se define através das outras, o que traz várias consequências [...]” (CHARAUDEAU, 2015, p. 277), e é preciso tomar consciência dessa realidade. Nessa perspectiva, nas eleições de 2018, a influência das instâncias políticas e midiáticas é utilizada como ferramenta de comunicação e interação entre os cidadãos, e não apenas com o potencial do eleitor. Portanto, as últimas campanhas eleitorais brasileiras se caracterizaram pelo uso e incorporação maciça da internet e das mídias sociais como ferramenta de propaganda pelos candidatos. O discurso político dos dois candidatos, acerca do armamento brasileiro, vem traçar a fronteira entre: a) perda da liberdade, violência, ditadura, perda da soberania nacional e da soberania popular etc., na visão de Haddad, e b) bandidagem, imoralidade, corrupção, protetores de traficantes e estupradores etc., na visão de Bolsonaro (ROMANO et al., 2018b). 34 Embora houvesse essa delimitação pró-armamentista e contra-armamentista, a eleição de 2018 entre Bolsonaro e Haddad mostrou que a população brasileira é a favor do armamento no Brasil, uma vez que o resultado do segundo turno favoreceu o candidato Bolsonaro, defensor do armamento. Percebe-se, no entanto, que a manipulação e a persuasão utilizadas por ambos os candidatos fazem parte do discurso midiático, sendo o discurso político mascarado pela subjetividade e pelo poder da palavra, a fim de desenvolver estratégias ideológicas e simbólicas da realidade social.35 CONSIDERAÇÕES FINAIS Entre os fatores afetados pelas disputas de poder na corrida presidencial, o discurso armamentista, tal como ocorreu na campanha eleitoral, é capaz de produzir diferentes efeitos de sentidos, dependendo do lugar no qual o sujeito está inserido. Considerando esses aspectos, o discurso armamentista esteve presente nas eleições de 2018, com o candidato Bolsonaro sendo o defensor da proteção dos cidadãos, por meio do uso de armas, enquanto Haddad é contrário a essa opinião do adversário. Ambos os candidatos usam a mídia para discutir, apresentar e debater seus pontos de vista, sendo função do eleitorado saber fazer a melhor escolha. Tanto o discurso político quanto o discurso midiático utilizam-se do jogo da manipulação e da persuasão, para convencer a população que cada um dos concorrentes está com a “razão”. No final das eleições, observou-se que a população escolheu o candidato a favor do armamento, evidenciando o poder da linguagem e da palavra pelo candidato Bolsonaro. Nos discursos de Bolsonaro e Haddad, houve uma produção de sentido, e os sentidos enunciados por eles são ideologias materializadas na língua. A língua e o poder da palavra como instrumentos de manipulação ideológica, necessária para a formação do indivíduo, ou seja, o sujeito enunciativo é exposto à massa da comunicação midiática e/ou política. Nas palavras de Orlandi (2007), ao parafrasear Pêcheux, há as condições de base, a língua e o processo, que é discursivo, no qual a ideologia torna possível a relação entre o pensamento, à linguagem e o mundo, ou seja, reúne sujeito e sentido. O sujeito, portanto, constitui-se, e o mundo se significa pela ideologia. Sendo assim, o discurso político e o discurso midiático estão relacionados ao discurso armamentista, cumprindo funções determinadas pelas relações histórico-institucionais que estruturam o direito democrático brasileiro. A partir desta pesquisa, foi possível, portanto, aprofundar-se frente aos posicionamentos dos candidatos Bolsonaro e Haddad ao cargo a presidente e observar o quanto as instâncias políticas e midiáticas influenciam o eleitorado. Observa-se, como conclusão, que a produção de sentido se dá a partir do lugar que o ator político institui para si como sujeito enunciador, por meio da sua imagem (ethos), que passa pelo afeto (pathos), sendo estruturada por aquilo que o discurso demonstra ou encobre (logos). 36 Por fim, dada a importância do assunto, torna-se necessário o desenvolvimento de novas pesquisas voltadas para o discurso armamentista, o discurso político, o discurso midiático e as relações entre essas instâncias, pelo fato de haver uma gama de temas para o enriquecimento dos estudos de discursos. 37 REFERÊNCIAS À IMPRENSA estrangeira, Haddad diz temer „escalada armamentista‟ na América Latina. Gazeta do Povo [on-line], 2018. Disponível em: <https://www.gazetadopovo.com.br/politica/republica/a-imprensa-estrangeira-haddad-diz- temer-escalada-armamentista-na-america-latina-5y34ojbyo5lkjjciypm7np5x0/>. Acesso em: 17 mar. 2020. ALESSI, Gil. 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