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NOTAS E CÉDULAS DE CRÉDITO
1 CONCEITO
Cédulas e notas de crédito são títulos representativos de operações de financiamento, tendo por negócio de base empréstimos concedidos por instituições financeiras, ou entidade a essas equiparadas, a quem se dedique a determinadas áreas econômicas, como atividades rurais, industriais, comerciais, imobiliárias, exportação e/ou importação. Essa lista é acrescida por alguns títulos que, embora intitulados cédula de crédito, mantêm distinções vitais, a exemplo da cédula de debêntures, prevista no artigo 72 da Lei no 6.404/76, e a cédula de crédito bancário, regida pela Lei no 10.931/04, que se estudará em apartado ao final deste capítulo.
As cédulas e as notas são títulos de crédito causais que surgem de negócio jurídico necessário e que têm ambiente negocial próprio, uma vez que somente pode originar-se de operação financeira que tem por credor, obrigatoriamente, um banco ou instituição assemelhada. Esse credor, aliás, após o ajuste do negócio, abrirá, com o valor do financiamento, conta vinculada à operação, que o financiado movimentará por meio de cheques, saques, recibos, ordens, cartas ou quaisquer outros documentos, na forma e no tempo previstos na cédula ou no orçamento a ela anexo, caso a instituição credora o tenha exigido. Aliás, a destinação do empréstimo, nas cédulas e notas temáticas (rural, industrial, comercial e de exportação), é elemento essencial do título e de sua formação, não sendo lícita a emissão em circunstâncias outras que não as previstas nas legislações de regência.
Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, julgando o Recurso Especial 162.032/RS, afirmou não ser exequível a cédula “cujo financiamento é aplicado em finalidade diversa daquela prevista na lei de regência”. Os julgadores destacaram que tais títulos foram criados especificamente para estimular a produção, devendo respeitar as condições impostas para tais pelo legislador, cujo intuito foi, visivelmente, “evitar, ao máximo, situações fraudulentas, como é o caso do devedor que se beneficia do financiamento, dando-lhe outra destinação, que não a contraprestação de empreender”. A extinção da execução, destarte, justificou-se pela descaracterização causal do título, sendo que o respeito às tais orientações é uma obrigação das instituições financeiras credoras.
1.1 Tipologia
Em boa técnica, a diferença essencial entre cédulas de crédito e de notas de crédito é a existência, nas primeiras, de garantia real, indicada na própria cártula. As notas não gozam de garantia real, mas constituem crédito especial, aplicando--se os artigos 963 c/c 965, VIII, do Código Civil de 2002. Esse privilégio especial está anotado no artigo 28 do Decreto-lei no 167/67 e no artigo 17 do Decreto--lei no 413/69. A Lei no 10.931/04 mostra pouco domínio da técnica, chamando genericamente de cédula de crédito bancário títulos com ou sem garantia real; essa falha normativa, todavia, não tem o condão de afastar a tipologia jurídica, e é necessário reconhecer que existem tanto cédulas de crédito bancário, quanto notas de crédito bancário.
Nas cédulas de crédito, a garantia real pode ser representada por bem móvel ou imóvel, ou mesmo por ambos, o que nos permitirá classificá-las em:
1. cédula hipotecária – quando a garantia é a hipoteca constituída sobre um imóvel;
2. cédula pignoratícia – quando a garantia é o penhor sobre determinados bens móveis;
3. cédula fiduciária – quando a garantia é a alienação fiduciária de bens adquiridos com o financiamento ou mesmo bens do próprio patrimônio do devedor;
4. cédula pignoratícia e hipotecária – quando o adimplemento apresenta--se garantido tanto pelo penhor de bens móveis, quanto pela hipoteca de bem imóvel.
Por fim, há uma classificação que se constrói em torno da finalidade da operação de financiamento, podendo classificar os títulos, como já se viu, em seis categorias: rural, industrial, comercial, de exportação, bancária e imobiliária.
Essa distinção doutrinária permite fácil compreensão dos títulos. Assim, uma cédula [de crédito] rural pignoratícia é um título de crédito originário de um financiamento rural que está garantido por penhor; já uma cédula [de crédito] industrial hipotecária seria um título de crédito originário de um financiamento para atividade industrial que se apresenta garantido por uma hipoteca; e uma nota de crédito à exportação seria um título de crédito originário de um financiamento para atividades relacionadas à exportação de bens que não apresenta garantia real.
O legislador, porém, não mostrou essa preocupação com coerência doutrinária, tendo previsto rótulos que se apresentam desordenados:
1. cédula rural pignoratícia (Decreto-lei no 167/67);
2. cédula rural hipotecária (Decreto-lei no 167/67);
3. cédula rural pignoratícia e hipotecária (Decreto-lei no 167/67);
4. nota de crédito rural (Decreto-lei no 167/67);
5. cédula de crédito industrial (Decreto-lei no 413/69);
6. nota de crédito industrial (Decreto-lei no 413/69);
7. cédula de crédito à exportação (Lei no 6.313/75);
8. cédula de crédito comercial (Lei no 6.840/90);
9. nota de crédito comercial (Lei no 6.840/90);
10. cédula de produto rural (Lei no 8.929/94);
11. cédula de crédito bancário (Lei no 10.931/04);
12. cédula de debênture (Lei no 6.404/76);
13. cédula hipotecária (Decreto-lei no 70/66); e
14. cédula de crédito imobiliário (Lei no 10.931/04).
1.2 Um contrato
As cédulas e as notas de crédito são títulos de crédito, por expressa disposição legal, mas apresentam estrutura formal de contratos, trazendo cláusulas diversas. Portanto, são contratos com natureza jurídica (ex vi legis) de títulos de crédito, comungando dos princípios e das regras do Direito Contratual e do Direito Cambial. Assim, apesar de serem inequivocamente títulos executivos, como reconhecido pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, julgando o Recurso Especial 215.265/GO, comportam revisão judiciária, mormente por serem suas cláusulas previamente elaboradas pela instituição bancária, caracterizando um contrato de adesão. Aliás, examinando o Agravo Regimental no Recurso Especial 985.679/ RS, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça se referiu, expressamente, a contrato de cédula de crédito bancário, ao passo que, diante do Agravo Regimental no Recurso Especial 963.667/MS, afirmou-se, em relação a uma cédula de crédito industrial, ser “possível a revisão de contratos extintos pelo pagamento”.
Sua emissão faz-se por escrito, em tantas vias quantas forem as partes que nela intervierem, sendo assinadas pelo emitente e pelo terceiro garantidor, se houver, ou por seus respectivos mandatários, devendo cada parte receber uma via na qual estará impressa a expressão não negociável, uma vez que somente a via do credor pode ser transferida, por endosso ou cessão de crédito. Não se exigem assinaturas de testemunhas e mesmo a assinatura do credor é considerada despicienda, pois o título, por si e por seu registro na respectiva contabilidade, prova a vinculação da instituição financeira ao documento elaborado por seus prepostos. Em acréscimo, manifestando uma vez mais sua característica contratual, a cédula e a nota de crédito podem ser aditadas, retificadas ou ratificadas mediante documento escrito, datado e assinado pelo devedor, pelo terceiro garantidor, se houver, ou por seus respectivos mandatários, devendo cada parte receber uma via.
A situação geradora das cédulas e notas de crédito, bem como sua estrutura jurídica, mitigam o princípio da autonomia cambiária. Afinal, o negócio de base está expresso na cártula e em seus anexos, em minúcias. A solução, porém, varia caso a caso, e não é adequado pretender tratar-se de uma regra geral.
2 REQUISITOS
Não obstante a cédula e a nota de crédito encontrem variações nas diversas legislações que se encarregaram de prevê-las, bem como de definir-lhes o regime específico, há um conjunto de elementos comuns que definem requisitos mínimos que devem ser apresentados em todos os títulos, requisitos facultativos e, finalmente, requisitos que sejam próprios de determinadostítulos.
Passarei nesta seção à análise dos requisitos comuns, obrigatórios ou facultativos, deixando para o tratamento específico dos títulos os requisitos que lhe sejam exclusivos. Os requisitos comuns são os seguintes:
1. denominação;
2. promessa de adimplemento;
3. forma de pagamento;
4. indicação do credor;
5. valor do crédito;
6. finalidade do financiamento;
7. definição da garantia real;

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