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Ano 04, no 03 R$ 0,00 Equinócio de Primavera 21 Setembro, 2013 e.v. A in f, B in a, Dies G Anno IV:xxi ALQUIMIA NA MISSA GNÓSTICA Uma análise de como os processos de transformação da alqUimia estão contemplados no rito central da o.t.o.: a missa Gnóstica. pág. 8 Revista da Loja Quetzalcoatl, Ordo Templi Orientis Índice Editorial pág. 3 Notícias pág. 3 Quem são os Alquimistas pág. 4 Armas Alquímicas pág. 6 Estudos Poder Mágico pág. 13 Biblioteca Thelêmica O Chamado do 24º Aethyr pág. 17 Hooráculo pág. 20 Alquimia na Missa Gnóstica escreva para nós! Além de ajudar a melhorar nosso trabalho com sua opinião, apro- veite nosso espaço de comunica- ção para tirar dúvidas, dar ideias e manter contato com os membros da O.T.O. no Brasil. E-mails para: estrelarubi@quetzalcoatl-oto.org 8 ExpEdiEntE Ano 04, Num 03, Ed nº 13, 21 de Setembro de 2013 e.v. Ordo Templi Orientis Internacional Frater Superior ................. Fra. Hymenaeus Beta Grande Secretário Geral ........................ Fra. Aion Grande Tesoureiro Geral .........................Fra. SQL O.T.O. Brasil Repr. do Fra. Superior .... Sor. Tara Shambhala Loja Quetzalcoatl Maestria ................................ Fra. Apollôn Lycaeus Secretaria ..........................................................Fra. Eros Tesouraria ....................................................Fra. Kin Fo Editoria Editor ......................................Fra. Apollôn Hekatos Jornalista ...........................................................Fra. Eros Design Editorial ................Fra. Apollôn Hekatos Ilustrações .................................. Loja Quetzalcoatl Assinaturas Assinatura anual (4 ed./ano) ..................R$ ??,00 Edição atrasada ..............................................R$ ??,00 Pedidos .....estrelarubi@quetzalcoatl-oto.org Estrela Rubi é uma publicação trimestral da Loja Quetzalcoatl, Corpo Local Oficial da Ordo Templi Orientis internacional para a cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Todos os direitos reservados. Proibida cópia, utilização ou alteração dos textos e/ou imagens contidos nesta publicação sem expressa autorização dos Oficiais da Loja Quetlzalcoatl ou outro representante autorizado pela Ordo Templi Orientis Brasil ou Ordo Templi Orientis Internacional. As informações e opiniões aqui contidas são de inteira responsabilidade de seus autores e não são necessariamente compartilhadas pela O.T.O., seus Oficiais ou os demais membros da Ordem. Em caso de dúvidas, entre em contato com a Secretaria da Loja Quetzalcoatl. © 2013, Loja Quetzalcoatl, Ordo Templi Orientis Brasil e Ordo Templi Orientis Internacional Estrela Rubi 3 notÍcias Celebração da primeira noite do Profeta e sua Noiva No dia 12 de agosto foi celebrada a Primeira noite do Profeta e sua Noiva: a celebração das núpcias de Crowley com Ouarda, a Vidente. Um brinde a Aleister Crowley e a Rose Edith Kelly, que, unidos, oca- sionaram na revelação do Livro da Lei! Equinócio de Primavera Neste dia 21 de setembro estamos celebrando o Equinócio de Pri- mavera, marcando o momento em que o Sol cruza o plano da Linha do Equador, iluminando a terra em sua exata metade, tendo dia e noite a mesma duração. Assim como no Liber Resh Rá a cada manhã ascende à hora do le- vante do Sol, a vida volta a se manifestar com o raiar da Primavera. Que esta seja uma estação de força e renascimento para todos! Novos Minervais No dia 21 de setembro de 2013 e.v. foram iniciados, na Loja Quet- zalcoatl, os Novos Minervais da Ordo Templi Orientis. Sejam bem- -vindos! Que esse seja o início de uma caminhada de Sucesso. “ E, assim como a comida e a bebida são diariamente transmu-tados em nós em substância espiritual, eu creio no Milagre da Missa.” É à transubstanciação da matéria em Energia Divina a qual nos re- ferimos. Transmutação esta que também ocorre dentro dos comu- nicantes durante a comunhão na celebração de Liber XV - A Missa Gnóstica. Mas como um homem entre os homens se torna digno de conferir as virtudes aos irmãos? Como pode o Sacerdote se propor a trans- mutar o Bolo de Luz no Corpo de Deus e cometer o mais blasfemo ato ao se proclamar Deus? O mesmo indivíduo que preguiçosamente desperdiça horas vendo televisão ou comete variados ‘pecados’ do dia-a-dia, dificilmente se enquadra na imagem que a grande massa tem de Deus. No entanto o Sacerdote dos Mistérios assim o é. O Novo Aeon nos trouxe a realização que o Homem pode ser ele- vado e se reconhecer como Deus, no entanto isso não significa que Deus será reduzido ao estado humano. editorial Frater apollôn lycaeus Mestre da Loja QuetzaLcoatL - rio de janeiro O rd o Te m pl i O rie nt is — Lo ja Q ue tz al co at l 4 A rt ig o Um panorama histórico sobre os personagens da alqUimia e sUa bUsca qUem sÃo os alqUimistas A alquimia é assunto que intriga muitas pessoas des-de os tempos mais remotos. Já é uma prática antiga, de origem incerta, mais provavelmente proveniente do Antigo Egito, assim como muitas outras práticas herdadas desse povo. A alquimia é certamente má interpretada pelos leigos, talvez em grande parte por culpa de suas metáforas baseadas em arquétipos de um tempo distante, uma lingua- gem diferente. Os alquimistas, os praticantes da alquimia, buscam conhecimento e foram os pioneiros na busca cien- tífica. A alquimia é uma prática que combina elementos de quí- mica, física, astrologia, arte, semiótica, metalurgia, medicina, misticismo e religião. Dois objetivos buscados pelos alqui- mistas eram a Pedra Filosofal, uma substância mítica que permitira a transmutação dos metais comuns em ouro; e o Elixir da Longa Vida, um remédio capaz de curar todas as do- enças imagináveis e de prolongar a vida indefinidamente. A alquimia pode ser considerada a precursora da química mo- derna, antes da formulação do método científico. A palavra alquimia vem do árabe al-kimiya ou al-khimiya (ءايميكلا ou que provavelmente é formada pelo artigo AL e a ,(ءايميخلا palavra grega khumeia (χυμεία), que significa “colocar junto”, “derramar junto”, “ligar”. O alquimista tenta transformar chumbo em ouro. Uma das características mais notáveis deste metal precioso é justa- mente não se deteriorar. Assim, imaginava-se que, se fosse possível reproduzir esta característica de resistência e dura- bilidade, seria possível curar doenças e prolongar a vida. Mas, como todos os assuntos alquímicos, este também deve levar em consideração o lado espiritual, mental, onde esta metá- fora simboliza a transformação do bruto no puro, do feio no belo, do ruim no bom, do ódio no amor e etc. Esta é uma das práticas do alquimista. Isto nos lembra o romance A Obra em Negro, de Marguerite Yourcenar, onde o protagonista Zênon, alquimista, médico e filósofo no século XVI, busca a Grande Obra, a posse da Pedra Filosofal. A investigação alquímica do personagem confunde-se com a busca de si mesmo, em meio ao obscurantismo, pestes, guerras, heresias e execu- ções. A alquimia teve seu auge na Idade Média e contou com mui- tos praticantes conhecidos até hoje. Até o século XVIII, a al- quimia era considerada uma ciência séria na Europa e po- demos citar como exemplos de alquimistas o grande Isaac Newton, que devotava grande parte do seu tempo ao estudo desta arte, entre outros. Grandes nomes deste tempo são Ro- ger Bacon, Thomas Aquinas, Thomas Browne e Tycho Brahe. O declínio da alquimia se deu com o surgimento da química moderna, ainda no século XVIII, pois esta trazia resultados mais precisos e uma área de trabalho mais confiável para a medicina e transmutações de matéria, dentro de uma nova perspectiva baseada no racionalismo material. Apesar disso, a alquimia não foi totalmente abandonada. Grandes estudiosos modernos aindaestudam este assunto. Carl Jung começou a perceber o significado do trabalho al- químico como um caminho espiritual, ao reexaminar a sim- bologia e teoria alquímica. Frater thoth Estrela Rubi 5 A rtigo chumbo em ouro, e por isso foram chamados de bruxos e magos, perse- guidos e executados. Outro notável alquimista do século XVI era Heinrich Cornelius Agrippa, que dizia ser um mago capaz de invocar espíritos. Ele se esforçou para que a alquimia fosse vista não mais como uma filosofia mística, mas como ma- gia ocultista. Seus escritos também in- f luenciaram alquimistas das gerações posteriores. Ele manteve viva a filosofia dos alquimistas anteriores a ele, como a experimentação e a numerologia, mas ele adicionou a teoria mágica, o que fez com que se passasse a ter uma visão diferente da alquimia. Talvez o nome mais importante des- ta época tenha sido Paracelso (Theo- phrastus Bombastus von Hohenheim, 1493–1541), que não se via como mago, abdicando das teorias mágicas na al- quimia que foram trazidas por Flamel e Agrippa. Ele promovia o uso de ob- servações e experimentos para apren- der sobre o corpo humano. Foi o pio- neiro no uso de químicas e minerais na medicina. Suas ideias baseavam-se no princípio hermético de que toda doença é causada por uma desarmo- nia entre o homem, o microcosmo, e a natureza, o macrocosmo. Ele tinha uma abordagem diferente daqueles que o precederam, não pensando na alquimia como purificadora da alma, mas como um estudo medicinal, onde o corpo humano tem um balanço de minerais e certas doenças poderiam ser curadas com remédios químicos. Na Inglaterra do século XVI, Doutor John Dee (1527-1608) era o alquimista de confiança de sua majestade Rainha Elizabeth I para consultas científicas. Era referência no assunto e conhecia tanto sobre Roger Bacon que chegou a escrever um livro chamado “Monas Hieroglyphica”, de 1564, inf luenciado pela Qabbalah. A alquimia não ficou restrita ao mun- do ocidental. Também teve grandes Roger Bacon (1214-1294) pode ser considerado o primeiro alquimista da Idade Média ocidental. Franciscano de Oxford, estudioso de ótica e lingua- gens, além de alquimia, trouxe gran- des contribuições para o estudo deste assunto. Bacon trouxe o pensamento Franciscano da experimentação, que seria a melhor forma de adquirir co- nhecimento, a mais satisfatória para o intelecto. Muitos outros alquimistas dos séculos posteriores basearam seus trabalhos nos preceitos estabelecidos por Bacon. É verdade que muitos al- quimistas eram também clérigos, ou seja, faziam parte da igreja. Isso por- que poucas pessoas na época tinham a educação necessária para entender os textos estrangeiros, principalmente os escritos em árabe, que são os me- lhores registros que se tem até hoje. Também a igreja apoiava a alquimia como ferramenta de desenvolvimento da teologia, pois oferece uma visão ra- cionalista do universo. Eles praticavam a arte: experimentavam com química e faziam observações e teorias de como o universo funciona. Durante os séculos tortuosos da Pes- te Negra, a alquimia foi deixada de lado e até mesmo banida da igreja por meio de uma ordem do Papa João XXII. Nestes tempos atribulados, poucos se dedicavam ao estudo desta arte, en- tre eles Nicholas Flamel (1330-1417). Diferentemente de seus antecessores, Flamel não era clérigo. Apenas se in- teressava pela busca da Pedra Filosofal – que dizem ter achado – e seu traba- lho é um grande compêndio de descri- ções de processos e reações, mas que nunca realmente dá a fórmula para as transmutações. Muito de seu trabalho foi reunir o conhecimento que existia anteriormente a ele, principalmente no tocante à Pedra Filosofal. No período da Alta Idade Média, os alquimistas eram muito como Flamel: não eram clérigos e buscavam a Pedra Filosofal e o Elixir da Vida, que acredi- tavam serem coisas diferentes. Viam a purificação da alma como transformar contribuições do mundo islâmico, que até tem registros históricos mais bem conservados e em maior quantidade. Como exemplo de alquimista islâmico, podemos citar Abu Bakr Mohammad Ibn Zakariya al-Razi que contribuiu com descobertas muito importantes para a química, como a técnica de destilação, o muriático, o sulfúrico, os ácidos nítricos, soda e alcalina. Não só no campo da química temos destaque dos alquimistas islâmicos, mas tam- bém no campo da filosofia com Jabir Ibn Hayyan, que relacionou cada ele- mento com uma qualidade, a saber, ca- lor, frio, secura e umidade. A partir disto, ele destacou que cada metal tem to- das essas qualidades, duas interiores e duas exteriores. Então, ele teorizou que se fosse possível reorganizar as essas qualidades de um metal, um me- tal diferente surgiria. Desta forma seria possível transformar chumbo em ouro. Assim podemos ver como toda a teoria alquímica é abrangente, multidiscipli- nar. Esta enorme variedade de temas e áreas inspiradas pela alquimia, nos re- mete à Teoria da Complexidade de au- tores recentes como Edgar Morin, que defende a análise científica levando em consideração os mais diversos as- pectos, envolvendo disciplinas e áreas de conhecimento que poderiam pare- cer não estar relacionadas. A alquimia foi a mãe da química e medicina mo- dernas, levantando as primeiras con- siderações e métodos de averiguação de hipóteses. Os alquimistas foram os primeiros cientistas a tentar entender, explicar e documentar o universo, uma busca muito importante para a huma- nidade. O rd o Te m pl i O rie nt is — Lo ja Q ue tz al co at l 6 A rt ig o como os elementos da alqUimia estÃo presentes nas armas da magia cerimonial armas alqUÍmicas Faze o que tu queres será o todo da Lei Mensalmente, a Loja Quetzalcoatl promove palestras abertas para seus membros e convidados. O tema da palestra de junho foram as Armas Mágickas. Na ocasião, tivemos a opor- tunidade de conversar sobre o que são e para o que servem, além de conversarmos sobre alguns casos específicos. Caso você tenha perdido a oportunidade da palestra, recomendo uma leitura do estudo publicado na edição 4 da Revista Estrela Rubi. Nesse artigo, vamos falar um pouco sobre uma interessante correlação entre magia cerimonial e alquimia que podemos fazer com as armas má- gicas. Esse estudo é baseado na obra de Aleister Crowley, em especial o seu Liber ABA – Book Four. Falemos um pouco sobre Alquimia. A Alquimia é uma das correntes de pensamento esotérico mais antigas da qual temos conhecimento. Embo- ra no imaginário popular a palavra alquimista traga à mente a figura de um sujeito com roupas da idade média trabalhando em um laboratório de química rústico, é difícil dizer que ela seja um produto europeu ou medieval. Em si, a alquimia carrega elementos gregos, egípcios, islâmicos, babilônicos e até do extremo oriente asiático. Embora não seja possível falar em uma corrente única e concisa do pensa- mento alquímico, podemos identificar alguns elementos comuns e rele- vantes aos diferentes grupos que se utilizam dessa denominação. A trans- mutação de corpos e a criação de elementos universais são os grandes objetivos da alquimia, seja da mera transmutação do chumbo em ouro até a do espírito grosseiro à mente esclarecida. Na história da ciência, a Alquimia foi responsável pela sistematização do pensamento da Química moderna. Os alquimistas europeus buscavam a precisão de suas experiências e a capacidade da reprodução de seus resultados. Não à toa a Alquimia era chamada de Arte da Balança pelos seus críticos renascentistas. A separação entre Química e Alquimia somen- te ocorreu no século XVII com o lançamento de “O Químico Cético” de Robert Boyle, que trouxe à tona o primeiro modelo de átomo, dando um pontapé para uma nova visão de mundo diferente à de Paracelso e de outros alquimistasdo passado. A Alquimia europeia se desenvolveu com base no pensamento aristotéli- co de que os corpos existentes eram formados por diversas quantidades de elementos arquetípicos chamados terra, ar, fogo, água e aether. Assim, o percentual de um elemento na formação do corpo seria responsável pela energia que ele sofreria. Um corpo com maior quantidade de ar so- freria menos ação da gravidade que um outro corpo com maior formação de terra. A exceção seria o aether, cuja função seria preencher os espaços não ocupados pelos outros quatro elementos. Algumas armas mágickas possuem certas características que permitem a sua análise associada a outras armas. Um exemplo é açoite, a adaga e a corrente, que juntos representam os três elementos alquímicos, ou seja, o enxofre, o mercúrio e o sal. Mas por que dessa associação e qual a função desses três elementos? Antes de mais nada, é preciso termos em mente que quando falamos de enxofre, sal e mercúrio nós não nos referimos aos elementos como conce- bidos pela química hoje, e sim a certos princípios místicos que são ilustra- dos através das características desses. Assim, o enxofre está associado ao calor, ao fogo, a ação, pois o elemento químico enxofre tem como característica ser um excelente combustível. No caso da alquimia esse fogo é o ímpeto humano, a libido. A arma má- gica associada a esse elemento é o açoite cuja aplicação atinge a alma animal do indivíduo, sempre em busca de novos estímulos. O açoite não funciona como ferramenta de punição, mas disciplina do indivíduo. O mercúrio representa o princípio volátil. O elemento químico é brilho- so, e ao ser aquecido é capaz de brilhar e adaptar sua forma ao meio em que se encontra. Você se lembra daquele velho termômetro guardado no banheiro da sua casa? Pense que basta a mudança de poucos graus na temperatura para que ele adote nova forma e dimensão. A adaga é asso- ciada ao elemento mercúrio. Sua grande característica é a calma. Através da adaga o adepto direciona a sua vontade para o fim da Grande Obra. O sal por sua vez representa a união do mercúrio com o enxofre, pois é Frater Kin-Fo Estrela Rubi 7 A rtigo uma característica química que o mesmo se origine através do trabalho com os elementos. Sua característica é a união, no sentido de nos permitir agregar nossos pensamentos disper- sos em torno de um propósito comum. Assim a corrente passa a ser associada ao sal, e seu uso ao redor do pescoço permite unir os pen- samentos para o grande fim. É possível pensar na relação entre enxofre, mercúrio e sal através de polaridades elétricas. O enxofre é positivo, mercúrio é negativo e o sal é neutro. Podemos também pensar nesses elementos como o enxofre sendo masculino, mercúrio feminino e o sal como a união destes. Também é interessante notar como cada ele- mento desses traduz características do espírito humano, e como a arma mágica associada a esse elemento nos permite trabalhar com a característica envolvida. Tal como o trabalho de mistura do enxofre, do mercúrio e do sal deve ocorrer por um tempo que o permita ser banhado com o orvalho da noite, o trabalho com a adaga, o açoite e a corrente deve ser coroado com a utilização do óleo sagrado pelo magista. Esse óleo, ou orva- lho, representa a aspiração do magista, consa- grando-o em sua missão na Grande Obra. Muitas lições podem ser aprendidas a partir de cada uma das armas mágicas, e de sua uti- lização com as demais. Espero que esse breve texto tenha permitido a vocês vislumbrar um pouco mais esse potencial. Amor é a lei, amor sob vontade Um fraterno abraço a todos, O rd o Te m pl i O rie nt is — Lo ja Q ue tz al co at l 8 A rtigo Frater eros Estrela Rubi 9 M atéria de C apa A Alquimia até hoje é objeto de muita especulação. A tentativa de análise de sua literatura clássica levou diversos pesquisadores a diversas interpretações possíveis sobre o que, de fato, tratava-se essa proto-ciência: se era uma pesquisa química, um modelo espiritual, um mé- todo de investigação da natureza etc. Desenvolvido como método empírico, com variações de linguagem e de símbo- los entre os grimórios de seus autores, os objetos do inte- resse central da Alquimia eram, no entanto, os mesmos: a imortalidade, o elixir da vida, a medicina dos metais, o ouro alquímico – todos esses sendo emblemas da completude da Grande Obra. Como consta na Tábua de Esmeralda, atribuída a Hermes Trimegistos: “(...) assim como todas as coisas vie- ram do Um, assim todas as coisas são únicas, por adaptação”. A obra dos Alquimistas residia, assim, em encontrar este Um, esta matéria-prima fundamental da existência, cujo símbo- lo mais destacado é a pedra filosofal. A descoberta dessa Unidade equivalia à consecução de Deus e a realização do homem como Criador. Esse Criador, afinal, seria capaz de transmutar o chumbo em ouro – isto é, redimir e transformar a matéria, recriando-se a si mesmo ou criando o mundo em sincronia com sua Obra. Em Magick essa dinâmica é fundamental. Nós identificamos que o ser humano é o cientista e artista que muda a reali- dade de acordo com sua Vontade. A indagação do Magista sobre o que é realidade – e qual é a sua substância – é de in- teresse primário. Para nos consumarmos como criadores efi- Uma análise de como os processos de transformaçÃo da alqUimia estÃo contemplados no rito central da o.t.o.: a missa gnóstica alqUimia na missa gnostica´ Frater eros O rd o Te m pl i O rie nt is — Lo ja Q ue tz al co at l 10 M at ér ia d e C ap a cientes, é necessário aprendermos a identificá-la. Em 1659, o lendário alquimista Basil Valentine ilustrou essa substân- cia como o “Azoth dos Filósofos”, sendo este Azoth o “Alfa e o Ômega”, tanto a prima materia caótica do início da Obra, como o aperfeiçoado lapis philosophorum, a Pedra dos Fi- lósofos. Isto se torna especialmente importante para nosso contexto quando no manifesto da O.T.O. (Liber LII) consta que a Ordem “possui o segredo da Pedra Filosofal, do Elixir de Imortalidade e da Medicina Universal”. Sim – clamamos possuir o segredo da substância fundamental da Magia, cujo manuseio iguala o homem a Deus. No Liber ABA (Book 4), Parte III, cap. XX (“Da Eucaristia: e da Arte da Alquimia”) está escrito sobre esta operação: “Isto consiste em tomar coisas comuns, transmutá-las em coisas divinas e então consumi-las”. Essa prática, no entanto, não pode ser explicada por algumas palavras numa instrução, mas só pode ser consumada por cada Iniciado através da experiência própria, geralmente facilitada por um curso de treinamento. E esse método está contemplado na jornada iniciática da O.T.O. e, como não poderia ser diferente, sua fórmula está aplicada no seu rito central, a Missa Gnóstica. É com base no seu enredo que faremos uma breve análise dos processos de transformação da Alquimia dentro da O.T.O. Ainda no começo do Ritual, o Sacerdote é desperto de sua Tumba – que podemos também ler como uma forma da ni- gredo, a noite da alma e a mortificação da matéria – pela força maior do amor da Sacerdotisa, que atua como sua Ini- ciadora. Diante disso, a primeira pergunta dele é da maior importância: “Eu sou um homem entre os homens. Como pode- rei eu ser digno de conferir as virtudes aos irmãos?” A sua pre- ocupação ao despertar é, portanto, a de ser um veículo das virtudes. Inicialmente, ele é essencialmente individual (“um homem”), mas identifica sua condição como semelhante a da humanidade em geral (“entre o homens”). A purificação (com água e sal) e a consagração (com ar e fogo) represen- tam marcas de distinção e culminam no Sacerdote trajado como realeza e, enfim, coroado com a Serpente (o Uraeus dos Faraós, ou a Kundalini desperta). A estimulação que se segue da Lança – seu phallus, ou poder criador – resulta na injunção, proclamada pela Sacerdotisa: “Esteja oSenhor pre- sente entre nós!” Este Senhor – identificado no Credo da Mis- sa como “Senhor secreto e inefável” – é o próprio Espírito, cuja Alquimia pretendia encarnar (ou coagular) na matéria, preparando-o para a manifestação através das etapas de sua obra. As virtudes são fruto da aparição deste Espírito no mundo – aparição que é como o Sol, cuja expressão visível e doação de luz e vida são o símbolo mais próximo dos atribu- tos que concebemos serem os de Deus. Aqui vemos como o Liber XV também identifica neste Senhor, o Espírito, aquele capaz de ministrar as virtudes, isto é, produzir e conferir o Sacramento. O Espírito é aquele que transforma a matéria, tornando sagrado aquilo que era ordinário, tornando divina o que até então era a alma adormecida. Purificações e Consagrações Podemos perceber alguns processos da Alquimia diluídos em toda a Missa – por vezes repetidamente e de forma dinâ- mica, mas em escalas diferentes – e selecionaremos alguns desses momentos para ilustrar como essas fórmulas são tan- to importantes para a Magia no geral, como essenciais para o caminho do Espírito na produção do seu Sacramento: o que já identificamos como sendo o norte da fórmula con- tida no Ritual da Missa. Aprendendo a ler essas operações, teremos adquirido uma nova linguagem e nos aberto a uma nova riqueza de interpretações. As primeiras fórmulas estão nas preparações que a Sacerdo- tisa imprime sobre o Sacerdote, associadas aos elementos. “Que o sal da terra exorte a Água a carregar a virtude do Grande Mar”, diz a Sacerdotisa, em seguida da rogativa: “Mãe, sê tu adorada!” As águas amnióticas do Grande Mar estão intima- mente associadas a Babalon, de modo que o louvor à Mãe se torna claro. A fase da Dissolução (Solutio) na Alquimia muitas vezes é representada pelo Rei e a Rainha banhan- do-se juntos numa banheira, ou mesmo por imagens de inundação. O Grande Mar é a Aqua Regia que os alquimistas consideravam ser capaz de dissolver mesmo o ouro alquí- mico. Dialogando com a psicologia – especialmente com a psicologia analítica de Carl G. Jung, que se aventurou nas obras alquímicas clássicas – isso representaria uma imersão dos conteúdos psíquicos no Grande Inconsciente. Realizada com eficiência iniciática – isto é, sendo bem sucedida em produzir uma iluminação –, essa imersão nas águas, que são o próprio sangue da vida, é uma forma de Batismo. Por sua vez, o sal da terra (ou Sal Salis) é a matriz que mais tarde concretiza a Pedra Filosofal, isto é, a base material ou sólida do Espírito. Devemos lembrar a Tábua de Esmeralda, quando ela nos diz sobre a substância das substâncias: “a Terra é sua nutriz”. O sal então, na Alquimia, não aparece só como base material, mas como nutrição do Espírito. Ora, o “sal da terra” está associado ao suor do rosto derramado pelo trabalho e também a nossas experiências e sensações sobre a terra. As- sim, as marcas da labuta e do prazer que levamos na pele são veículo e também alimento do Espírito. O sal está também ligado ao processo que a Alquimia cha- mou de Calcinação, ou a redução das impurezas a cinzas. A calcinação se refere ao cálcio, que remete a calcário e a osso, o fundamental da nossa própria estrutura material. O sal, o fundamental de nossos ossos e de nossa estrutura material, e também o suor de nossa ação, é derramado nas águas do Grande do Mar e, graças a isso, exorta-a a transmitir suas vir- tudes. O sal permite a formulação do mar infinito em expe- riências concretas. Temos aqui uma importante lição sobre nossas experiências práticas serem aquilo que nos sustenta Estrela Rubi 11 M atéria de C apa e também a pedra angular da Iniciação. Após essas operações, a Sacerdotisa asperge o Sacerdote e conclui: “Seja o Sacerdote puro de corpo e alma!” Essas são, para que recordemos, as condições primárias para que ele “possa ministrar as virtudes aos irmãos”. A pureza do Sacer- dote é sua Castidade. Nas notas editoriais do Book 4, encon- tramos o comentário de Frater Hymenaeus Beta: “A Palavra Castidade é usada por iniciados para significar um certo estado de alma e da mente determinante de um certo hábito do corpo que não é de nenhum modo idêntico ao que é vulgarmente en- tendido. Castidade em seu verdadeiro sentido mágico é incon- cebível para aqueles que não estejam completamente emanci- pados da obsessão pelo sexo”. Em seguida, a Sacerdotisa mistura incenso ao turíbulo, que arde. Sua rogativa é que “o Fogo e o Ar façam doce o mundo!” e, por fim, clama: “Pai, sê tu adorado!” Conciliando este mo- mento ao de anterior adoração à Mãe, já vemos a estrutura da união dos opostos (Coniunctio), ou do Casamento Alquí- mico do Pai e Mãe, ou Rei e Rainha fundamentais, que estão expressos nos próprios Sacerdote e Sacerdotisa. O elemento Ar pode ser lido como a propriedade do Ruach de soprar em todas as direções e a tudo penetrar – faculda- de íntima ao Prana hindu e associada também à nossa pró- pria atividade mental. Dessa forma, o Ar tem imbuído em si a capacidade analítica da Razão. A análise opera pela discri- minação, de modo que podemos tecer analogia com a ope- ração alquímica da Separação, ou Separatio. “Nesse degrau da Escada dos Sábios”, diz Daniel Mylius em seu Philosophia Reformata (1622), “os elementos em guerra (...) e distintos um do outro são separados por uma destilação retifican- te. Portanto, o terceiro passo é chamado Nossa Separação”. Mais uma vez remetemos à Tábua de Esmeralda: “Separarás a Terra do Fogo, o sutil do denso, suavemente e com grande perícia”. Junto do Fogo, esses processos também podem ser lidos à luz da Sublimação (Sublimatio), isto é, a volatização do denso. A importância do Fogo é tal que o alquimista moderno Ful- canelli menciona: “Todas nossas purificações são feitas no fogo, pelo fogo, e com fogo”. O Fogo que arde no turíbulo do Ritual é análogo ao que alimenta o Athanor (o forno) do Alquimista. “Inf lama-te em oração e invoca constantemen- te”, dizia Crowley, amparado por Abramelin, o Mago. O fogo é a devoção que nos compele à ação entusiasmada, isto é, repleta de sentido divino. Além disso, as injunções da Sa- cerdotisa são: “Seja o Sacerdote ardente de corpo e de alma!” Puro – ou seja, reto espiritualmente – e com a sua libido – ou seja, energia criativa – ardente: essas são as condições que definem o Sacerdote. Naturalmente, o Senhor (o Espírito), que é o quinto ele- mento, pode estar “presente entre nós” quando os quatro elementos estão equilibrados. Nesse primeiro momento foi trabalhada a fórmula do Pentagrama, ou do Microcosmo. O diagrama de Eliphas Levi (que pode ser encontrado em seu “Dogma e Ritual da Alta Magia”) detalha as forças implicadas no Pentagrama, e o Alfa e Ômega ali contidos – assim como outros opostos complementares, como o Sol e Lua, Mercúrio e Vênus – sinalizam a produção do Azoth, ou da Pedra Filo- sofal. Quando o Sacerdote foi bem-sucedido em trabalhar os mistérios menores – do Microcosmo – ele se torna hábil para veicular sua Vontade no Macrocosmo. Estando pronto, ele pode realmente começar a Criar. Coniunctio “Eu, Sacerdote e Rei te tomo, Virgem pura e sem mácula; Eu te ergo; Eu te conduzo para o Leste; Eu te coloco sobre o ápice da Terra.” Dessa vez, é ele quem conduz a Sacerdotisa ao Leste, ao “ápice da Terra”, onde gradualmente irão realizar o Casa- mento Alquímico. O Leste é tanto o lugar do amanhecer – o nascer da lumen novum (nova luz) alquímica, ou de uma nova consciência – como o lugar onde, no Éden, “o Senhor Deus tinha plantado um jardim” (Gênesis 2:8-9). Nesse jardim, en- contram-se as conhecidas Árvores mitológicas da Vida e do Conhecimento. Não é exagerada a analogia de o Sacramento produzido pelo Casamento da Missa ser o fruto dessas Árvo- res, que igualam o humano aos deuses (““Agora o homem se tornou como um de nós”, Gênesis 3:22) e que também propiciam aqualidade da vida eterna. No Liber ABA, cap. XX, encontramos essa alusão: “Pois esse Sacramento é a própria Árvore da Vida, e aqueles que partilharem do fruto dela jamais morrerão”. Podemos também ver alguns emblemas dessa Coniunctio no Tarô de Thoth, no Atu VI (“Os Amantes”), onde está demons- trado o Casamento entre Sacerdote e Sacerdotisa. A dinâmi- ca da operação está ilustrada nos detalhes da carta e suas funções alquímicas estão representadas pelo Leão Vermelho e pela Águia Branca. No Livro de Thoth, a descrição do Arca- no menciona: “Estes são símbolos dos princípios masculino e feminino na Natureza; eles são, portanto, iguais em vários estados de manifestação, Sol e Lua, Fogo e Água, Ar e Terra”. Sua união produz o ovo órfico na base da carta: o Sacramen- to que é a criança mágica produzida por ambos. Se esta carta discrimina os pares opostos (homem e mu- lher, yang e yin, ego e não-ego) envolvidos no Casamento, o Atu XIV (“Arte”) revela como combiná-los no caldeirão – o Athanor que queima com a união dos elementos. Crowley continua explicando: “apenas duas operações são, em última instância, possíveis – análise e síntese”. E mais: “A primeira questão indagada pela ciência é: ‘Do que as coisas são com- postas?’ Sendo isto respondido, a próxima questão é: ‘Como O rd o Te m pl i O rie nt is — Lo ja Q ue tz al co at l 12 M at ér ia d e C ap a podemos recombiná-las para nossa máxima vantagem?” Isso expressa com precisão o método da Alquimia e também a estrutura da Missa Gnóstica. A história de amor entre Sacerdote e Sacerdotisa são as eta- pas até que consumem a união dos opostos. Em termos dos elementos primordiais da Alquimia, o Sacerdote representa o enxofre – o aspecto instável e dinâmico da realidade – e a Sacerdotisa o Sal – o aspecto sólido e estável, unidos através da conjunção mercurial, que tem a habilidade de “recombi- ná-los para a nossa máxima vantagem”. No Leste, agora é o Sacerdote quem consagra a Sacerdotisa com os elementos, alçando toda a operação a um novo ní- vel. Após isso, separa-se dela temporariamente para vagar no mundo: apesar da peregrinação, o foco dele é sempre a ponta de sua Lança, a sua própria Vontade direcionada. Então, as invocações realizadas introduzem a Coniunctio : o Sacerdote, identificado como Hadit, clama por Nuit, identifi- cada na Sacerdotisa do outro lado do Véu. E ela, como Nuit, invoca Hadit no Sacerdote, como é instruído no Livro da Lei: “Em todos os meus encontros convosco deverá a sacerdotisa di- zer — e seus olhos arderão de desejo enquanto ela se mantém nua e regozijante em meu templo secreto — A mim! A mim! cha- mando para fora a chama dos corações de todos em seu cântico de amor” (AL I:62). O Sacramento O produto da Eucaristia – que é Hórus, fruto de Nuit e Ha- dit – é descrito no terceira invocação, quando o Sacerdote atesta: “Tu que és Um, nosso Senhor no Universo, o Sol, nosso Senhor em nós mesmos cujo nome é Mistério do Mistério, supre- mo ser cujo esplendor iluminando os mundos é também o alen- to que faz todo Deus e até mesmo a morte tremerem diante de Ti”. Em seguida, ele determina as injunções: “Abre o caminho da criação e da inteligência entre nós e nossas mentes. Ilumina nosso entendimento. Encoraja nossos corações. Que Tua luz se cristalize em nosso sangue, preenchendo–nos de Ressurreição”. Essa é uma fórmula cuja análise tem diversas camadas. Ten- taremos abordar algumas delas. Primeiramente, vale notar que o Sol e a Pedra dos Filósofos são análogos, ambos sendo símbolos da Unidade. Estamos, portanto, elencando e invo- cando os atributos desta Pedra que, como já vimos, é a subs- tância das substâncias e também o Elixir da Vida. Pensemos nela como uma espécie de célula-tronco de todo processo da Natureza. Em segundo lugar, ainda no cap. XX do Book 4, Crowley nos diz sobre o propósito deste Sacramento: “O magista se torna preenchido de Deus, alimentado de Deus, intoxicado de Deus. Pouco a pouco seu corpo se tornará purifi- cado pela lustração interna de Deus; dia pós dia sua estrutura mortal, mudando seus elementos terrestres, se tornará em ver- dade o Templo do Espírito Santo. Dia pós dia matéria é substitu- ída pelo Espírito, o humano pelo divino; finalmente a mudança será completa: Deus manifestado na carne será o seu nome”. Além disso, a luz que se “cristaliza em nosso sangue, preen- chendo-nos de Ressurreição” descreve a operação alquímica da Coagulação (Coagulatio). Ela ref lete a união do espírito e da matéria ou, pondo de outro modo, a encarnação ou manifestação desta Luz. Com o Véu aberto e com a Sacerdo- tisa novamente revelada sobre o altar – desnuda, num novo momento de sua fórmula –, temos a exaltação do Espírito. Em seguida, teremos a transubstanciação dos elementos que servirão como veículo para este Espírito. O Sacerdote declara: “Pela virtude da Baqueta, seja este pão o Corpo de Deus!” Em seguida, ele profere: “TOUTO ESTI TO SÔMA MOU” que, em grego, significa: “Este é meu corpo”. Este Corpo, que é de Deus, é também o meu: a transmutação não é só da hóstia, mas também realiza a identidade humana como di- vina. Em seguida, ele toma a Taça: “Pela virtude da Baqueta, seja este Vinho o Sangue de Deus!” e então: “TOUTO ESTI TO PO- TÊRION TOU HAIMATOS MOU” ou “Esta é a Taça do meu San- gue”. Ademais, o Pão é descrito como “fruto do trabalho e sustento do esforço”, enquanto o Sangue é “conforto do tra- balho e inspiração do esforço”. Podemos identificar nestes elementos um ciclo perfeito: a inspiração, o trabalho, o fruto e a saciedade. No cap. XX do Book 4, ainda lemos: “Isto é mais importante que qualquer outra cerimônia mágica, pois é um círculo completo. A totalidade da força despendida é completamente reabsorvida”. O esforço é, assim, inteiramen- te saciado. No cap. 69 do Liber 333 (O Livro das Mentiras), está escrito sobre o Hexagrama, que é o emblema gráfico da união dos opostos, ou Coniunctio : “Esta Obra também devo- ra a si mesma, alcança seu próprio fim, alimenta o obreiro, não larga sementes, é perfeita em si mesma”. Devemos lem- brar que um dos emblemas da obra alquímica é o ouroboros, a serpente que devora a si mesma. Em termos alquímicos, encontramos referência à transubs- tanciação dos elementos nas notas editoriais ainda do Book 4: “A Lança e o Graal são primeiramente dedicados ao Espí- rito Santo da Vida, em Silêncio. O Pão e o Vinho são então fermentados e manifestados pela vibração e recebidos pela Mãe Virgem”. Estamos falando do processo alquímico da Fermentação (Fermentatio). A Fermentação introduz nova vida aos elementos da Conjunção. Do mesmo modo que o trigo se converte em pão e, o pão, em corpo de Deus; e a uva se converte em vinho e, o vinho, em sangue de Deus, há um processo de transformação, ou morte-renascimento contemplado na Fermentação. Esse momento contém, por- tanto uma Putrefação, ou a Putrefactio alquímica. Uma das diferenças do Novo Aeon para o Aeon passado é que esse processo, para nós, é mais uma etapa e uma ferramenta de trabalho do que a apoteose de nosso enredo. Vemos essa Estrela Rubi 13 M atéria de C apa constatação na fala do Sacerdote: “Aceita, Ó Senhor, este sacri- fício de vida [aponta a pátena] e alegria [aponta a taça], verda- deiras garantias da Promessa Divina de Ressurreição”. Em seu Chemisches Lustgaertlein (1625), o alquimista Daniel Stolcius diz: “A destruição traz a Morte do material. Mas o espírito renova, como antes, a Vida. Providencie que a se- mente seja putrificada no solo correto – de outra forma todo esforço, trabalho e arte serão em vão”. Isso é sinal de como a sintonia entre o Sacerdote (que consagra a semente) e a Sacerdotisa (“o solo correto”, como Mãe Terra ou “Mãe Vir- gem” que recebe os elementos) é essencial para a operação. O modo que a “Mãe Virgem” recebe os elementos está re- presentado no Arcano de Tarô“A Arte”, onde a deusa virgem Diana – que também é a mãe da fertilidade – mistura os elementos da Coniunctio em seu caldeirão. O caldeirão da Arte, o espaço onde a opus se realiza, é a própria Sacerdotisa, onde jaz inscrita a fórmula alquímica de máxima importân- cia V.I.T.R.I.O.L (Visita Interiora Terrae Rectificando Invenies Oc- cultum Lapidem), ou “Visita o interior da terra: por retificação encontrarás a pedra oculta”. Outro modo de ler a fórmula é apresentado na experiência descrita no Liber 418 (A Visão e O rd o Te m pl i O rie nt is — Lo ja Q ue tz al co at l 14 M at ér ia d e C ap a a Voz), no aethyr NIA: Vir introit tumulum regis, invenit oleum lucis, que significa “O homem que entra no túmulo do rei en- contra o óleo da luz”. A consciência, atribuída como masculi- na, morre e renasce no inconsciente uterino, atribuído como feminino. A Sacerdotisa torna possível o elo entre o divino e o mortal. Entronada no altar, ela é o Portal dos Deuses. No Arcano “O Hierofante” do Tarô de Thoth, está ilustrado como a Sacerdotisa preenche uma das pontas do Hexagrama (ou Macrocosmo), operando em harmonia com o grande Hiero- fante, que é uma expressão do Sagrado Anjo Guardião. A Comunhão A bênção dos elementos é então realizada pelo Sacerdote: “Senhor mais secreto, abençoa este alimento espiritual em nos- sos corpos, outorgando–nos saúde e riqueza, força e alegria, paz e a realização da vontade e do amor sob vontade que é perpétua felicidade.” As qualidades destacadas caracte- rizam a Eucaristia de sete elementos (que, como vemos no cap. XX do Book 4, é misticamente idêntica àquela mais ele- vada, de Um elemento). Temos aqui as qualidades dos sete planetas: respectivamente Mercúrio, Júpiter, Marte, Vênus, Saturno, Sol e Lua, todos materializados na “perpétua feli- cidade” da Terra. Na Alquimia, os planetas representam a escada espiritual até a verdade. A união de suas tendências resulta na realização da Obra. Por fim, o Sacerdote quebra uma partícula da Hóstia e decla- ma: “TOUTO ESTI TO SPERMA MOU. HO PATÊR ESTIN HO HUIOS DIA TO PNEUMA HAGION” ou “Esta é minha Semente. O Pai é o Filho através do Espírito Santo”. O Pai, ou o Rei, se renova no Filho, o Príncipe. O que está ocorrendo é que o poder do rejuvenescimento – ou o Eli- xir da Vida – está sendo produzido diante de nossos olhos. Esse rejuvenescimento também é do mundo, sendo esta a fórmula do Novo Aeon tanto em nossos corpos como em escala global. A dinâmica dessa operação pode ser entendi- da na união da partícula com o vinho, ou de Hadit com Nuit. “Por um beijo tu então estarás querendo dar tudo, mas aquele que der uma partícula de pó perderá tudo nessa hora” (Liber AL I:61). O Sacerdote está, sim, a um passo de perder tudo na sua entrega ao infinito. Essa dissolução é também o entregar da última gota na Taça de Babalon. Como também está escrito no Liber 418, 12º aethyr: “Pois meu Pai está esgotado do esforço do passado, e não foi à cama dela. Que seja esse vinho perfeito a quintessência, e o elixir, e assim pelo sorver poderá ele renovar sua juventude; e assim será eternamente (...)”. O velho Rei do Graal é renovado e, com ele, todo seu Reino: essa alegoria monarca revela como Deus renova constantemente a Si Mes- mo e o Universo. Usufruir do sumo desta força criativa é o objetivo da Missa Gnóstica. O momento do Hriliu – que é a palavra para orgasmo em Ba- tílico, a linguagem mágica que consta no 2º Aethyr do Liber 418 – é a derradeira união de Hadit e Nuit, ou da partícula com o vinho. O Sacramento foi produzido: Hórus nasceu. Ao consumi-lo, o magista vai ser, como vimos antes, “alimentado de Deus, intoxicado de Deus”. Essa assimilação da divindade pela ingestão – tema que vemos desde a antiguidade em diversos ritos, inclusive os canibais – é um processo de Coa- gulatio, a coagulação daquela energia no corpo. E essa ener- gia é identificada também com o Leão-Serpente gnóstico: “Ó Leão e Ó Serpente que destrói o destruidor, sê poderoso en- tre nós”. Abraxas é o nome deste Leão-Serpente que rompe todos os limites (“destrói o destruidor” ) e que é também um glifo alquímico. Carl G. Jung escreveu, em seu “Sete sermões aos mortos”: “Se o Pleroma tivesse uma essência, Abraxas seria a sua manifestação”. Estamos falando, então, da aparição do indizível, do infinito se formulando em finito. Sua manifes- tação é paradoxal exatamente porque ele reuniu em si os opostos, como Jung prossegue nos descrevendo: “Por isso Abraxas é temível. É soberbo como o leão no instante em que vence a sua vítima. É belo como um dia de primavera. É o cheio quando se une ao vazio. É a cópula sagrada, é o amor e seu ho- micídio, é o santo e seu traidor. É a mais clara luz do dia e a mais profunda noite do absurdo”. O Um da totalidade precisa reunir em si todo antagonismo, tornando-se para além do bem e do mal e abrindo caminho para a compreensão do Universo além da parcialidade de seus pares duais. A “vida do Sol” e a “alegria da terra” é o que está na boca do Sacerdote quando ele comunga, realizando não só a encar- nação deste Deus mais elevado, mas também a identidade comum entre aquele que semeia (o Sol) e aquilo que é se- meado (a Terra) – ou, também, a identidade entre Sacerdote e Sacerdotisa, alquimista e sua opus. Após toda essa jornada, a Congregação também se tornou apta a desfrutar do Sa- cramento e se embriagar de Deus. Um a um, todos se enca- minham para o Altar para partilhar da Eucaristia. A virtude pode ser distribuída graças ao processo da Multiplicatio (Multiplicação). O alimento espiritual pode ser repartido en- tre todos os membros, pois a inspiração da jornada propicia uma cadeia de despertares em cada um presente. O Sacerdote pôde, finalmente, “ministrar as virtudes aos ir- mãos”. A iluminação pessoal assume uma função ecológica, como fonte de inspiração de toda a humanidade. A realiza- ção da Obra possibilita a fraternidade universal das consci- ências despertas e a renovação do mundo através da reno- vação de si mesmo, que é o marco da contínua revitalização e realização de Deus. Essa era a opus da Alquimia, quando seus autores clássicos pretendiam trabalhar a matéria para redimir dela a alma do mundo adormecida. Essa é a opus da O.T.O., quando pretendemos despertar no homem a nature- za divina que sempre foi, é e será, e permitir que ela realize a sua Vontade, criando e se regozijando na sua Criação do mundo. Estrela Rubi 15 E studos Quando discutimos sobre eficiência em Magia, em algum momento seremos remetidos à ideia de um “Poder” que, especialmente neste campo, não raro é revestida de mis- tificação e superstição. É urgente debatermos não só a natureza de poderes – dons ou talentos, no plural – que podem ser obtidos atra- vés do método mágicko, mas o que representa de fato este “Poder” para o indivíduo. Primeiramente, é preciso relembrar o conceito que temos de Ma- gia, ou, mais especificamente, Magick: “Magia é a Ciência e a Arte de causar mudanças de acordo com a Vontade” (Liber ABA, Introdução). Esse conceito nos abre um extenso leque de apreciação e ao mes- mo tempo nos situa, evitando divagação. Crowley frisa para nós, no capítulo “Poder mágico” do livro “Magick without tears (Magia sem lágrimas”): “Lembre-se que Magia é Ciência, que as Leis da Natureza permanecem as mesmas, não importa quão sutil seja o material com o qual a pessoa está trabalhando”. Posto de outro modo, ele ainda nos diz: “É minha Vontade informar o Mundo de certos fatos do meu conhecimento. Eu então tomo minhas “armas mágickas”, caneta, tin- ta e papel; eu escrevo “encantamentos” – aquelas sentenças – numa “linguagem mágicka” ie, aquilo que é compreendido pelas pessoas que eu desejo instruir; eu convoco “espíritos”, tais como gráficos, edi- tores, vendedores e assim por diante e os compilo a transmitir minha mensagem a estas pessoas”.Extraímos, com isso, a Magia do campo do improvável e do nebu- loso, e a situamos como toda ação consciente que tenha um ob- jetivo e conhecimento (ciência) das ferramentas utilizadas e como combiná-las (arte) de modo a obter o seu melhor resultado. Uma refeição consciente, com a intenção de fortalecermos os nossos corpos, seja para os trabalhos daquele dia ou para a Grande Obra como um todo, é mágicka como um Rito de invocação a um deus. “Afinal de contas, qual é a diferença moral ou mágicka que existe entre o poder de alguém dirigir sua comida e aquele de transformar a si mesmo num falcão?” (ibid). Magick é, portanto, uma posição consciente na Vida. Essa posição consciente acarreta numa série de transformações (alquímicas) da substância da própria Vida em nós. Posto isto, nos deparamos com a questão do Poder, sobre a qual outros autores, além de Crowley, se debruçaram. Michel Foucault analisou que não podemos falar de um “poder em si”, absoluto, mas sempre em relações de poder. Se o poder está numa relação, até que ponto nós podemos falar de meu poder? Podemos, em vez disso, pensar em poder como um posicionamento de indivíduos o qUe significa, para thelema, poder e eficiência dentro de magia? poder mágico O rd o Te m pl i O rie nt is — Lo ja Q ue tz al co at l 16 E st ud os profunda e mais abrangente que qualquer aquisição técnica”. Tais fenômenos, ou técnicas, ou “poderes”, procedem naturalmente quando estamos posicionados no mundo mágico – que podemos designar pelo abrangente termo “Universo”. Devíamos, no entanto, perguntar-nos se o movimento de avidez em conquistar um fenô- meno específico não resulta na nossa identificação com este fenô- meno que devia ser ferramenta. No momento que a ferramenta se torna obsessão, a Ciência (a consciência, que é um dos critérios de Magick) se esgota. No entanto, que isto não sirva de apologia a um “purismo” de não nos relacionarmos com instrumentos que podem nos servir como poderes. Eles podem e devem ser utilizados, à me- dida que o magista os compreenda como úteis à sua Obra, seja ela qual for. Conquistá-los depende de um treino específico e da ex- periência com determinados símbolos – que podemos entender didaticamente como “partes” do Universo. O Liber 777, por exemplo, sugere os caminhos da Árvore da Vida onde certas aquisições seriam obtidas, tais como clarividência, consagrar talismãs, o poder de reali- zar evocações, transmutações alquímicas etc. Ao contrário dos hindus, que entendiam as siddhi (tais poderes) como tentações que nos deviam do fim último, isto é, o moksha, ou libertação, nós não entendemos a Natureza como um cárcere, mas como uma aliada. Podemos usar tais possibilidades como recursos de encontro com nós mesmos. Um magista com mais ferramentas desenvolvidas é capaz de se adaptar a situações e a se veicular no mundo de maneira mais eficiente. Ele se torna mais potente à medi- da que explora suas possibilidades. Temos, no entanto, que recordar que eficiência implica num uso econômico de energia, isto é, aplicar ao alvo a quantidade precisa de força, no momento preciso, da for- ma precisa. Se desejo cortar um tronco de madeira, um machado é preferível à sutileza de um bisturi. Se desejo atuar como neurocirur- gião, o machado seria de uma grosseria catastrófica. Para ilustrar tal situação, Crowley dá ainda outra instrução: “Aqui vai mais uma destas histórias orientais para você! Um certo Yogi pensou que seria um feito admirável andar através do Gan- ges. Após quarenta anos ele foi bem-sucedido e foi até seu Guru demonstrar seu poder e receber sua devida recompensa de louvor. Acontece que este Guru era um pouco como eu mesmo, ao menos no que toca seu temperamento desagradável; e quando o discípulo veio alegremente caminhando para o outro lado do Córrego Sagra- do, esperando elogios, ele foi recebido com: ‘Bem, eu acho que você foi um completo tolo todos estes anos, seus vizinhos têm ido e vin- do numa jangada por um par de moedas!” (ibid). A apreciação da Magia enquanto relações conscientes com o Uni- verso torna a vida cotidiana mágica, e isso redimensiona o nosso olhar, nossa posição no mundo, tudo. O modo que fazemos uma reunião se torna profundamente significante. O modo como traba- lhamos, como amamos. É o primeiro passo para apreciarmos como a Magia opera em níveis sutis, através de sincronicidades e sinais. Tudo se origina da apreciação que o verdadeiro ritual é a vida. Tudo é potencialmente mágico enquanto campo de ação nela. dentro de um sistema, ou seja, como um processo acontecendo de modo contínuo. A noção do poder como um posicionamento diante do Universo nos ajuda inclusive a compreender as diversas aquisições mágicas de cunho prático como produtos de um modo de enxergarmos ou nos comportarmos diante de nossa própria sub- jetividade e do Universo. Existe algo importante nesse cenário: nós só mudamos o Universo quando entendemos como nos relacionamos com ele, como nos posicionamos diante dele. Então essa relação com o “Poder” é, em nível básico, uma relação conosco mesmo. Todo o resto, inclusive os fatos objetivos e mensuráveis, são fenômenos do posicionamento que assumimos a partir daí. Nunca é demais falar: todo progresso sólido em Magia resulta do autoconhecimento. Ainda em “Magick without Tears”, Crowley nos dá um exemplo polê- mico: Hitler. Como ele nos descreve: “Ele se tornou mestre da Alemanha, e, por um tempo, de quase toda a Europa, tocando em instrumentos existentes da paixão humana, a vingança, a luxúria da Europa Central, o pânico dos dirigíveis e junkers, o descontentamento das classes carentes, o orgulho e am- bição da camarilha militar prussiana, e assim por diante (...) Mas não se enganem! O poder mágico por trás de todas as suas ações esta- va em si mesmo. Ele tinha conseguido fazer-se um profeta, como Mohammed, até mesmo um símbolo, como a Cruz de Malta. A sua técnica mágica era indescritivelmente admirável, ele adotou a su- ástica, o Martelo de Thor, o vestido distintivo, o slogan, os gestos, a saudação , ele mesmo impôs um Livro Sagrado sobre o povo. Se esse livro tivesse sido apenas mais místico e incompreensível, em vez de racional, difuso e insuportavelmente chato, ele poderia ter feito melhor.” O estilo irônico de Crowley nos confirma algumas questões sobre Magia: que sua substância é o próprio Universo, composto de pro- babilidades e também de nossas paixões, e que não há finalidade “boa” ou “ruim” em sua natureza, apenas o manejo dessa substân- cia. Embora Thelema nos infunda com um questionamento ético constante, o fato de nos assombramos com o fantasma das tiranias passadas só confirma que elas se enraizaram em símbolos vivos e paixões atemporais – não são, portanto, tão antigas assim. Enten- der isso é, mais uma vez, entender como o poder do magista opera através de sua relação com as circunstâncias e do entendimento de como se colocar nelas. Ainda nas instruções relacionadas ao Poder, Crowley prossegue, es- crevendo para sua discípula: “Eu suspeito que sua questão não con- temple tanto o Poder, mas poderes: coisas como curar os doentes, ficar invisível, acender uma chama sem combustível, enfeitiçar as va- cas do vizinho, licantropia, estragar a lua de mel de seu amigo, fasci- nações de todos os tipos, levitação, licantropia, necromancia, todas as coisas comuns das lendas e fábulas (...) A moral, querida criança, é que tais poderes nunca devem ser considerados como objetivo central; deveria ser óbvio que a Verdadeira Vontade precisa ser mais Estrela Rubi 17 B iblioteca Th elêm ica Um anjo toma a dianteira dentro da pedra como um guerrei- ro vestido em cota de malha. Sobre sua cabeça estão plumas cinzas espalhadas como a cauda de um pavão. Aos seus pés um grande exército de escorpiões e cachorros, leões, elefan- tes e muitas outras bestas selvagens. Ele estica seus braçospara o céu e clama; No crepitar do relâmpago, no rolar do trovão, no colidir de espadas e no lançar de f lechas: seja teu nome exaltado! Córregos de fogo saem dos céus, um pálido azul brilhante, como plumas. E eles se unem uns aos outros e se assentam em seus lábios. Seus lábios são mais vermelhos que rosas, e as plumas azuis se unem numa rosa azul e debaixo das péta- las de rosa vêm beija-f lores coloridos, e orvalho cai da rosa cor-de-mel. Eu estou sob seu chuveiro. E uma voz sai da rosa: Venha! Nossa carruagem é levada por pombas. De madrepérola e marfim é nossa carruagem e suas rédeas são as cordas do coração dos homens. Cada momen- to em que nós voamos deverá cobrir um aeon. E todo lu- gar onde nós descansamos deverá ser um universo jovem regozijando-se em sua força; os prados devem ser cobertos com f lores. Ali nós descansaremos apenas uma noite e pela manhã nós voaremos, descansados. Agora, para mim mesmo, eu imaginei a carruagem da qual a voz falou, e eu olhei para ver quem estava comigo na carru- agem. Era um Anjo de cabelo dourado e pele dourada, cujos olhos eram mais azuis que o mar, cuja boca era mais verme- lha que o fogo, cujo hálito era ar ambrosíaco. Mais finos que uma teia de aranha eram os robes dela. E eles eram das sete cores. Tudo isto eu vi; e então a voz secreta falou em tom baixo e doce: Venha! O preço da jornada é pequeno, embora seu nome seja morte. Tu deverás morrer para tudo que temeste e ansiaste e odiaste e amaste e pensaste que tu eras. Sim! Tu morrerás, como tu deves morrer. Pois tudo que tu tens, tu não tens; tudo que tu és, tu não és! NENNI OFEKUFA ANANAEL LAIADA I MAELPEREJI NONUKA AFAFA ADAREPEHETA PEREGI ALADI NIISA NIISA LAPE OL ZO- DIR IDOIAN. E eu disse: ODO KIKALE QAA. Por que tu estás escondido de mim, tu, que eu escuto? E a voz respondeu e disse para mim: A audição é do espírito só. Tu és um participante do mistério quíntuplo. Tu deves enrolar os divinos dez como um pergaminho e moldar dali uma estrela. Ainda que tu devas apagar a estrela no coração de Hadit. Pois o sangue do meu coração é como um banho quente de mirra e âmbar; banhai a si mesmo nele. O sangue do meu coração está todo reunido em meus lábios caso eu o beije, queima na ponta dos meus dedos caso eu o acaricie, queima no meu ventre quando tu és apanhado na minha cama. Poderosas são as estrelas; poderoso é o Sol; poderosa é a lua; poderosa é a voz daquele sempre-vivente e os ecos de seu sussurro são os trovões da dissolução dos mundos. Mas o meu silêncio é mais poderoso do que eles. Fechais os mundos semelhantes a uma casa cansada; fechai o livro do arquivista e permiti que o véu engula o santuário, pois eu estou erguida, Ó, meu querido, e não há mais a necessidade destas coisas. Se uma vez eu te separei de mim, foi pelo prazer do jogo. Não é a vazante e o f luxo da maré a música do mar? Venha, vamos nos elevar em Nuit, nossa mãe, e nos perdermos! Que o ser seja esvaziado no abismo infinito! Pois apenas por mim tu deverás se elevar; tu não tens outras asas que não as mi- nhas. Tudo isto enquanto a Rosa esteve disparando chamas azuis, coruscantes como serpentes, através de todo o Ar. E as ser- pentes tomaram a forma de sentenças. Uma delas é: Sub um- bra alarum tuarum Adonai quis et felicitas. E outra: Summun bonum, vera sapientia, magnanima vita, sub noctis nocte sunt. E outra é: Vera medicina est vinum mortis. E outra é: Libertas evangelii per jugum legis ob gloriam dei intactam ad vacum ne- quaquam tendit. E outra é: Sub aqua lex terrarum. E outra é: Mens edax rerum, cor umbra rerum; intelligentia via summa. E outra é: Summa via lucis: per Hephaestum undas regas. E outra é: Vir introit tumulum regis, invenit oleum lucis. E todo o conjunto destas coisas são as letras TARO; mas a luz é tão terrível que eu não posso ler as palavras. Eu irei ten- tar novamente. Todas estas serpentes estão reunidas juntas muito espessamente nas bordas da rosa, pois há um número incalculável de sentenças. Uma é: tres annos regimen oraculi. o chamado do 24º Æthyr o qUal é denominado nia nia O rd o Te m pl i O rie nt is — Lo ja Q ue tz al co at l 18 B ib lio te ca Th el êm ic a E outra é: terribilis ardet rex עליון. E outra é: Ter amb (amp?) (não consigo ver) Rosam oleo (?). E outra é: Tribus annulis reg- na olisbon. E a maravilha é que, com essas quatro letras, você obtém um conjunto completo de regras para fazer tudo, tan- to magia branca como negra. E agora eu vejo o coração da rosa novamente. Eu vejo a face dele que é o coração de rosa, e na glória daquela face eu es- tou terminado. Meus olhos estão fixos sobre seus olhos; meu ser é sugado através dos meus olhos para dentro daqueles olhos. E eu vejo através daqueles olhos, e olhe! o universo, como rodopiantes centelhas de ouro, soprados como uma tempestade. Eu pareço crescer novamente dentro dele. Mi- nha consciência preenche todo o Aethyr. Eu ouço o chama- do de NIA, tocando várias e várias vezes dentro de mim. Soa como música infinita, e atrás do som está o significado do Aethyr. Novamente não há palavras. Todo este tempo as centelhas rodopiantes de ouro pros- seguiram, e elas são como o céu azul, com uma grande quantidade de finas nuvens brancas lá fora. E agora eu vejo montanhas em volta, distantes montanhas azuis, montanhas púrpuras. E no meio está um pequeno vale verde de musgo, que está todo cintilante com o orvalho que pinga da rosa. E eu estou jazendo neste musgo com minha face para cima, bebendo, bebendo, bebendo, bebendo, bebendo do orva- lho. Eu não posso descrever para você a alegria e a exaustão de tudo que foi e a energia de tudo que é, pois tudo é apenas um corpo que jaz no musgo. Eu sou a alma do Aethyr. Agora isto reverbera como as espadas dos arcanjos, chocan- do-se nas armaduras dos condenados; e parecem ser os fer- reiros do céu batendo o aço dos mundos nas bigornas do inferno, para fazer um teto para o Aethyr. Pois se a grande obra fosse concluída e todos os Aethyrs fossem reunidos em um, então a visão falharia; então a voz ficaria quieta. Agora tudo se foi da pedra. Ain el Hajel. 26 de Novembro, 1909. 2-3:25 p.m. Estrela Rubi 19 B iblioteca Th elêm ica tábUa de esmeralda (de hermes trismegistos) (01) É verdade, certo e muito verdadeiro: (02) O que está embaixo é como o que está em cima e o que está em cima é como o que está embaixo, para realizar os milagres de uma única coisa. (03) E assim como todas as coisas vieram do Um, assim todas as coisas são únicas, por adaptação. (04) O Sol é o pai, a Lua é a mãe, o vento o embalou em seu ventre, a Terra é sua nutriz; (05) O Pai de toda Telesma do mundo está nisto. (06) Seu poder é pleno, se é convertido em Terra. (07) Separarás a Terra do Fogo, o sutil do denso, suavemente e com grande perícia. (08) Sobe da terra para o Céu e desce novamente à Terra e recolhe a força das coisas superiores e inferiores. (09) Deste modo obterás a glória do mundo. (10) E se afastarão de ti todas as trevas. (11) Nisso consiste o poder poderoso de todo poder: vencerás todas as coisas sutis e penetrarás em tudo o que é sólido. (12) Assim o mundo foi criado. (13) Esta é a fonte das admiráveis adaptações aqui indicadas. (14) Por esta razão fui chamado de Hermes Trismegistos, pois possuo as três partes da filosofia universal. (15) O que eu disse da Obra Solar está completo. O rd o Te m pl i O rie nt is — Lo ja Q ue tz al co at l 20 B ib lio te ca Th el êm ic a HOORÁCULOHOOR A Rosacruz não é um conceito do misticis- mo cristão? Como isto é aproveitado para Thelema? A grande inovação não é de Thelema, mas da Consciência Humana, da qual Thelema é um dos frutos. A Rosacruz é um símbolo hermético complexo que inclui em sua simbologia elementos alquímicos, cabalísticos, mágicos e espirituais de várias origens, elaborado com a finalidade de exemplificara Gran- de Obra, alcançada através da união dos opostos. Ela é um símbolo universal e não pode ser confinada a um sistema religioso específico. Como símbolo iniciático representa o anseio humano pela superação de sua própria natureza, pelo desvelar de seu fator divino. Sua sim- bologia exemplifica o núcleo místico e mágico da filosofia Telêmica. Compartilho aqui um texto de Fernando Pessoa que em seus estudos sobre a Rosea Cruz compreendeu de modo profundo a sua simbo- logia: “A Rosa tem quantas pétalas, de que cor ou cores, onde está no corpo e na alma? Cresce, diminui, abre-se e fecha-se, roda? A Rosa que é o espírito manifestado como beleza e sutileza, o orvalho materializado, tem um caule rugoso e espinhoso, sinal da força com que se apoia no corpo e na terra, e dos espinhos da dor e da luta. Erguendo-se das raízes minerais, ela pode desabrochar então em bo- tão, e surgir como a flor da perfeição. As folhas e a seiva alimentam- -na. A luz a que aspira e recebe, bem como o calor ambiental, físico e psíquico, fazem-na crescer e abrir-se. Tudo na Rosa é símbolo e acção. As pétalas abrem-se e manifestam a vida divina que brota do apa- rente vazio central onde, da obscuridade, ressalta um luz ultima em forma de estrela de cinco pontas. Di-se-ão então que a rosa é a alma, que o centro do círculo da rosa é o Espírito e que a rosa de várias cores é sinal das várias qualidades que o Espírito assume como alma, como consciência activa e operante no mundo. Há rosas brancas, vermelhas, amarelas, rosadas, rubras, laranja, e ou- tras nuances da natureza. E no interior do ser humano? Qual a cor da tua rosa? A tua rosa és tu próprio, e a sua cor será, então, a tua cor como ser espiritual. A tua rosa é o centro do teu ser, o coração da tua alma. [...] Se a Rosa principal é a do coração, a do Amor, quem saberá o que se passa e se deve realizar em cada ser a cada momento do seu cami- nho? [...] Rosa, Rosa, és um mistério. E uma beleza. Foste-o desde sempre. Imortalizada em Isis e Nefertiti, ou, como os lírios de Salomão, rosa do vale, Rosa de Sharom. Os árabes te cuidaram pelas mãos doces dos Sufis de Isfaham e te cantaram em Rumi ou Hafiz; os zelosos gnósticos te tingiram de púrpura em Alexandria. Os templários e os cátaros trouxeram-te do Oriente e os trovadores cantaram-te oculta, enquanto Dante, fiel do Amor, te viu aberta no sidéreo céu da divindade. Por fim, enlaçada na Cruz, qual serpente erguida, brilhas como o símbolo da Rosa Cruz. Pétala da Tradição, pétala da Iniciação, pétala da Fraternidade, pétala do Espírito, pétala do Amor, sê em nós, ó Rosa Divina, ó Rosea Cruz. “ O Hooráculo é a resposta a uma pergunta. A cada edição, a pergunta de um leitor da Estrela Rubi será selecionada e a resposta a ela será dada por um ou mais membros da Loja Quetzalcoatl. Caso queira submeter sua pergunta de cunho mágicko ou thelêmico ao Hooráculo, a envie para estrelarubi@quetzalcoatl-oto.org. Nossa equipe editorial vai ava- liar a pergunta mais inteligente e instigante e, se selecionada, vamos estudá-la, respondê-la e publicá-la na próxima edição. O Hooráculo só terá olhos – ou melhor, Olho – às perguntas mais desafiadoras e que possam ser de interesse geral. Estrela Rubi 21 OrdO Templi OrienTis inTernaciOnal Frater Superior: Hymenaeus Beta JAF Box 7666 New York, NY 10116 USA Grande Secretário Geral: Frater Aion PO Box 33 20 12 D-14180 Berlin, Germany Grande Tesoureiro Geral: Frater S.L.Q. 24881 Alicia Parkway #E-529 Laguna Hills, CA 92653 USA Secret. Internac. Iniciações: Frater D.S.W. P.O. Box 4188 Sunnyside, NY 11104 USA OrdO Templi OrienTis Brasil Site: www.otobr.com Rep. Fra. Superior: Sor. Tara Shambhala contatos@otobr.com lOja QueTzalcOaTl Site: www.quetzalcoatl-oto.org Maestria: Fra. Apollôn Hekatos maestria@quetzalcoatl-oto.org Secretaria: Fra. Eros secretaria@quetzalcoatl-oto.org Tesouraria: Fra. Kin-Fo tesouraria@quetzalcoatl-oto.org Correios: Caixa Postal 55525 — CEP 22790–970 Avenida das Américas Recreio dos Bandeirantes Rio de Janeiro, RJ — Brasil a loja qUetzalcoatl a Loja Quetzalcoatl é um corpo ofi-cial da Ordo Templi Orientis Inter-nacional, fundado em 23 de maio de 2000 e.v. na cidade do Rio de Janeiro. Somos uma comunidade de homens e mu- lheres livres que se dedicam ao processo do auto-conhecimento e sua consequente expansão de consciência através dos prin- cípios de Vida, Luz, Amor e Liberdade, pila- res essenciais da Lei de Thelema. Temos como um de nossos principais ob- jetivos auxiliar no desenvolvimento de uma sociedade verdadeiramente livre da superstição, tirania e opressão onde o ser humano possa expressar a sua Verdadeira Vontade em plena harmonia com a essên- cia divina que nele habita. Acreditamos que cada ser humano é uma estrela individual e eterna que possui sua própria órbita e que o objetivo primordial de sua encarnação não é outro senão descobrir as coordenadas dessa órbita e cumprir a sua Verdadeira Vontade, realizando a Grande Obra e alcançando a Felicidade Perfeita. Nossos objetivos são alcançados através de um conjunto de Ritos Iniciáticos que visam despertar e ativar os chakras, propiciando a ascenção da kundalini e o acesso a estados mais elevados de consciência. Realizamos também o estudo teórico e prático da Filo- sofia de Thelema, Magia, Alquimia, Cabala, Tarot, Tantra, e demais ciências herméticas que possam colaborar com o caminho de auto-iluminação dos nossos iniciados. Caso deseje informações sobre nossas ativi- dades ou sobre a afiliação à O.T.O., consulte nosso site no endereço www.quetzalcoatl- oto.org ou entre em contato conosco. saiba mais sobre... a ordo templi orientis a Ordo Templi Orientis foi fundada em 1904, na Alemanha, por Karl Kellner e Theodore Reuss — seu primeiro líder —, que buscavam estabelecer um Academia para maçons de altos Graus onde estes pudessem ter contato com as revelações iniciáticas descobertas por Kell- ner em suas viagens ao Oriente. A entrada de Aleister Crowley, em 1912, veio a alterar profundamente a Ordem, até que, naquele mesmo ano, a O.T.O. rompe seus laços com a Maçonaria e assume–se como uma orga- nização independente e soberana. A principal mudança trazida por Crowley para a ordem foi a implantação da Lei de Thelema, conforme definida no Livro da Lei – Liber AL vel Legis, e o alinhamento da O.T.O. com as energias no Novo Eon, tor- nando esta Ordem a primeira nascida no Velho Eon a migrar para o novo. Em 1922 Crowley, com a morte de Reuss, assumiu a liderança da O.T.O.. Seu suces- sor indicado foi o alemão Karl Germer, que governou a Ordem de 1947 a 1962. Como Germer não indicou um sucessor, após sua morte vários membros e não membros da Ordem tentaram assumir o controle da O.T.O. o que colocou a Ordem em sério risco de extinção. Assim, Grady McMurtry lançou mão de um documento expedido por Crowley que o autorizava a tomar o po- der da O.T.O. caso esta se visse ameaçada. Assim, McMurtry tornou-se líder da Ordem em 1969, posição onde permaneceu até sua morte, em 1985. Após isso, por meio de um processo eleitoral levado a cabo pelos altos Graus da Ordem, foi empossado o atual Frater Superior, Hymenaeus Beta. Atualmente a O.T.O. está presente em mais de 70 países. No Brasil, a O.T.O. encontra–se desde 1995, com o antigo Acampamento Sol no Sul, substituído em 2000 pelo Oásis Quetzalcoatl, atual Loja Quetzalcoatl. Dan- do continuidade ao trabalho, em fevereiso de 2010 ev foi aberto em Minas Gerais o Acampamento Opus Solis. Ordo Templi Orientis — Brasil Loja Quetzalcoatl — Rio de Janeiro Caixa Postal 55.525 – CEP 27790-970 Rio de Janeiro – RJ, Brasil