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Libras Editorial Presidente do SEB (Sistema EducacionalBrasileiro S.A) Chaim Zaher Vice-Presidente do SEB Adriana Baptiston Cefali Zaher Diretoria Executiva do SEB Nilson Curti Rafael Gomes Perri Diretor da Faculdade Dom Bosco José Antonio Capito Coordenação da EaD da Faculdade Dom Bosco Edelclayton Ribeiro Coordenação do Curso de Administração Adriana Franzoi Coordenação do Curso de Tecnologia em Recursos Humanos Coordenação do Curso de Tecnologia em Gestão Financeira Coordenação do Curso de Tecnologia em Gestão de Marketing Adriana Franzoi Material elaborado por Andrei Albuquerque Natália Diniz, Eduardo Rodrigues, Paula Nardi Murilo Carneiro Luciana Rodrigues Produção Editorial Pricila Massuchetto Letícia Marcelino © Faculdade Dom Bosco – Dom Interativo Todos os direitos desta edição reservados ao Dom Interativo modalidade de educação a distância da Faculdade Dom Bosco. Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, de qualquer forma ou meio eletrônico, e mecânico, fotográfico e gravação ou qualquer outro, sem a permissão expressa Dom Interativo. A violação dos direitos autorais é punível como crime (Código Penal art. 184 e §§; Lei 6.895/80), com busca, apreensão e indenizações diversas (Lei 9.610/98 – Lei dos Direitos Autorais – arts. 122, 123, 124 e 126) A pr es en ta çã o LibrasA proposta da disciplina é estudar a definição e a classificação da surdez. Além disso, serão analisadas as abordagens educacionais na educação do surdo, as LIBRAS e a educação bilíngue. Também serão focos do nosso estudo a educação precoce, os aspec- tos reabilitadores (métodos - sistemas de intervenção), os aspectos educativos da surdez e a adequação curricular. A visão crítica das metodologias abordadas, o contexto da Es- cola Brasileira bem como a dinâmica da sala de aula quanto ao ensino de LIBRAS serão estudados. GF_3.2_2013-2.indb 389 11/04/2013 16:39:19 U ni Ua Ue UU U Caminhos históricos da educação de surdos Prezado aluno, no módulo sobre Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), você terá conhecimento da área da surdez. O objetivo é mostrar como ocorreu a educação das pessoas com surdez até chegarmos ao século XXI, trabalhando em busca de um espaço bilíngue. A Educação neste início de milênio tem como priori- dade o processo ensino-aprendizagem dentro de um sistema que vê no respeito à diversidade o caminho para um futuro mais democrático, a fim de refletir uma educação de qualidade para todos. As pessoas são diferentes em vários níveis: intelectual, econômico, cultural, entre outros. A inclusão de todas as pessoas, em todos os seus graus e a conscientização dos alunos e professores no respeito às diferenças é a meta da educação do século XXI. Imber- nón (2001,p.79) diz que: [...] a diversidade não pode ser entendida como uma simples ação que facilita a aprendizagem dos alunos com ritmos diferentes de maturidade, não é unicamente a apresentação de estratégias di- dáticas alternativas para estimular os alunos desmotivados, não é apenas a incorporação das ferramentas educativas adequadas para cada realidade acadêmica individual, a atenção à diversidade deve ser entendida como a aceitação de realidades plurais, como uma ideologia, como uma fórmula de ver a realidade social defendendo ideais democráticos e justiça social. A inclusão deveria estar baseada no que Freire (1996,p.139) aponta: [...] é preciso desenvolver novas formas de linguagem crítica que nos permitam, por um lado, desvelar o currículo oculto e, por outro, descobrir outras maneiras de ver o mundo e a Educação. Nesse sentido precisamos analisar o progresso de uma maneira não linear nem monolítica, mas integrando outras identidades sociais, outras manifestações culturais da vida cotidiana e outras vozes secularmente marginalizadas. GF_3.2_2013-2.indb 391 11/04/2013 16:39:19 392 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo Pensar na educação das pessoas com necessidades educacionais especiais, como os surdos, faz com que seja necessário estudar a história, as filosofias de comunicação (oralismo, comunicação total e bilinguismo), algumas definições quanto às nomenclaturas “surdo” e “deficiente auditi- vo”, as diferenças entre as línguas orais e de sinais, entre outros, para que se entenda como atualmente está organizada a linguística da Língua Bra- sileira de Sinais (LIBRAS), enfoque principal desta disciplina. Durante muito tempo, as pessoas com surdez tiveram sua formação baseada nas línguas orais, mas, com o passar do tempo, percebeu-se que a língua de sinais que este grupo utilizava era uma língua/idioma, com ca- racterísticas próprias (gramática, semântica, sintaxe e morfologia), sendo esta a língua materna para os surdos e a língua oficial do país, a segunda. Atualmente, uma das principais discussões é como alfabetizar no segundo idioma, o português; este assunto será abordado, porém seu aprofundamento ficará para um próximo estudo, pois antes precisamos conhecer, respeitar e aceitar a LIBRAS como língua/idioma oficial utili- zado por alunos, cidadãos, pessoas surdas. Nesta disciplina, buscaremos trazer conhecimentos específicos quanto a educação, língua e inclusão das pessoas com surdez. Para melhor entender as mudanças na formação oferecida às pesso- as com surdez, é necessário saber a trajetória percorrida, para que hoje, no século XXI, tenhamos um ensino baseado na língua de sinais e a opção de a educação ser em escolas comuns. Vamos voltar no tempo e conhecer as principais concepções que existiam quanto a “ser surdo” e suas possibilidades sociais, educacionais e legais, sempre contextualizando as questões mundiais, as influências reli- giosas e as tendências políticas. Podemos citar o que Darwin dizia quanto à evolução do homem e de todos os animais que vivem hoje: eles passaram por um processo de seleção natural constante e severo e depois desta seleção sobreviveram os mais aptos, para viver segundo as condições de vida do meio e da época em que existiam. Era uma guerra pela existência, em que somente os “me- lhores” sobreviviam. Com a evolução surgiram dúvidas, questionamentos e incertezas quanto a tudo que rodeava as pessoas: questões sobre a vida, a morte, en- fim, como se dava a formação da sociedade. GF_3.2_2013-2.indb 392 11/04/2013 16:39:19 393 Caminhos Históricos da Educação de Surdos – Unidade 1 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo Nesta primeira unidade, iniciaremos nosso estudo de como foi a educação dos surdos desde a Antiguidade até os dias atuais. Vamos fazer uma viagem no tempo. Objetivos da sua aprendizagem Mostrar os percursos, as barreiras e as dificuldades impostas às pessoas com surdez da Antiguidade até o século XXI, para que hoje pos- samos pensar no paradigma de inclusão. Você se lembra? Pergunte a seus pais e irmãos mais velhos e responda também você: Com quantos alunos surdos vocês estudaram? A maioria das respostas deve ser “com nenhum”, mas hoje podemos estar contribuindo para mu- dar essas respostas. GF_3.2_2013-2.indb 393 11/04/2013 16:39:19 394 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo U.UUAntiguiUaUe Na Antiguidade, a deficiência era vista como incapacidade; as pes- soas não podiam produzir nem eram livres para “cuidar” de suas vidas. Segundo Perlin (2002,p.16): A história dos surdos é escrita pela história da educação e a história da educação dos surdos foi sempre contada pelos ouvintes. É na- tural que muitos surdos tenham se apropriado dela como se fosse verdade absoluta e a tenha absorvido exatamente como lhes foi dito, isto é, que eles eram deficientes, menos válidos, incapazes [...]. No livro da lei dos hebreus (século XIII a.C) a Torá, podia-se ler: “[...]quem dá a boca ao homem? Quem o torna mudo ou surdo, capaz de ver ou cego? Não sou Eu, Javé?”(Êxodo, IV:11). “— Ser surdo e ser mudo é a vontade do Senhor e, por isso, que pode o homem fazer?” A deficiência era justificada pela religião, por castigo. Consequen- temente, não se prestava atendimento educacional e social. O deficiente nem mesmo participava da família como um de seus membros. Entretanto, no século V a.C, Sócrates (470-399 a.C) já afirmava que os surdos tinham que usar o gesto e a pantomima para se comunicarem. Sócrates, em 360 a.C, fez a seguinte reflexão: “Se não tivéssemos voz nem língua, mas apesar disso desejássemos manifestar coisas uns para os outros, não deveríamos, como as pessoas que hoje são mudas, empenhar-nos em indicar o significado pelas mãos, pela cabeça e por ou- tras partes do corpo?” W ik im iD ia Sócrates e Platão GF_3.2_2013-2.indb 394 11/04/2013 16:39:20 395 Caminhos Históricos da Educação de Surdos – Unidade 1 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo Naquela época, nascer surdo era visto como uma punição dos deu- ses. Para Aristóteles (384-322 a.C), a falta da audição fazia com que o aprendizado fosse comprometido ou mesmo nem ocorresse. Também, segundo ele, era inútil o Estado investir na educação da pessoa surda, pois “o pensamento é impossível sem a palavra”. Sêneca faz uma das citações mais drásticas quanto a nascer com deficiência: Matam-se cães quando estão com raiva; exterminam-se touros bra- vios; cortam-se as cabeças das ovelhas enfermas para que as demais não sejam contaminadas; matamos os fetos e os recém-nascidos monstruosos; se nascerem defeituosos e monstruosos afogamo- -os, não devido ao ódio, mas à razão, para distinguirmos as coisas inúteis das saudáveis. (SÊNECA apud SILVA, 1986, p. 129) W ik im eD ia Aristóteles Em Roma, aqueles que nasciam surdos eram privados de seus direi- tos legais, além de não poderem participar de testamentos. Eles nem mes- mo tinham autonomia para desenvolver seus negócios, necessitando ter um curador, segundo Guarinello (2007). Influenciados pelo povo grego, viam os surdos como seres imperfeitos. Era comum lançarem as crianças surdas (especialmente as pobres) ao rio Tibre, para que fossem cuidadas pelas ninfas. Naquela mesma época, em função de suas limitações, os deficientes eram vistos pela Igreja Católica como seres com “almas imortais”, pois não conseguiam verbalizar os sacramentos. São Paulo (Epístola aos Ro- manos, X:17), tendo dito que “a fé deriva da pregação e a pregação é o anúncio da palavra”, também negou aos surdos-mudos o direito à religião, aos sacramentos e mesmo à salvação da alma, isso já no século I. GF_3.2_2013-2.indb 395 11/04/2013 16:39:20 396 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo U.2U IUaUeUMeUia W ik im iD ia Na sociedade medieval, havia posturas contraditórias em relação às pessoas com deficiência: a igreja cuidava delas e fazia caridade; os nobres as usavam como “bobos da corte”. Com o Cristianismo (400 d.C.), a Igreja Católica passou a ter o po- der político. A Antiguidade foi um período de exclusão; na Idade Média, com o monarquismo, houve a ascensão da Igreja Católica, que trouxe o assistencialismo. Os surdos eram considerados inaptos à educação e ao sacerdócio. Somente eram respeitados juridicamente se falassem e casavam-se apenas com a permissão do papa. U.3U IUaUeUMoUernaUAtéUoUSéculoUXXI No século XVI, a deficiência passou a ser concebida e a ser tratada por meio da alquimia, da magia e da astrologia, métodos da incipiente medicina. Naquela época surgiram os asilos e os hospitais psiquiátricos, com o objetivo não de tratar, mas de segregar as pessoas com qualquer tipo de deficiência. “Tais instituições eram pouco mais do que prisões”, segundo Aranha (2001, p.165). Durante os séculos XVII e XVIII, nos hospitais, houve grande desenvolvimento no atendimento às pessoas com deficiência. Havia as- sistência especializada em ortopedia para os mutilados das guerras e para pessoas cegas e surdas. Percebia-se o investimento de alguns médicos e educadores para mostrar que as pessoas com deficiência poderiam ter uma vida acadêmica e se comunicar. GF_3.2_2013-2.indb 396 11/04/2013 16:39:20 397 Caminhos Históricos da Educação de Surdos – Unidade 1 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo De acordo com Carvalho (2007), Bartolo della Marca d’Ancona (1314-1357), escritor italiano, foi o primeiro a expor a possibilidade de o surdo ser ensinado por meio da língua oral ou da “língua gestual”. W ik im eD ia Podemos citar o médico Girolano Cardano, que afirmou que os sur- dos poderiam ser ensinados – ele passou a se interessar pela surdez porque seu primogênito era surdo. Nessa mesma época, Pedro Ponce de Leon, monge beneditino espanhol, iniciou um trabalho educacional com surdos da elite, com o objetivo de “[...] ensinar a falar, escrever, ler, fazer contas, orar e confessar pelas palavras, a fim de ser reconhecidos como pessoas nos termos da lei e herdar seus títulos [...]” (GUARINELLO, 2007, p.21). W ik im iD ia Monge Pedro Ponce de Leon Na França, Laurent Joubert escreveu sobre surdos. Para ele, a ha- bilidade existe em qualquer criança, surda ou com audição perfeita, ou GF_3.2_2013-2.indb 397 11/04/2013 16:39:21 398 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo mesmo naquelas que possam adquirir a surdez com o tempo. Segundo ele, a criança com deficiência auditiva aprenderia a falar mesmo sem ouvir. Sabe-se que, na Europa, as mudanças na postura em relação aos de- ficientes continuaram ocorrendo. Na Espanha, Juan Pablo Bonet publicou, em 1620, a primeira obra impressa sobre a educação de deficientes audi- tivos: Reducción de las letras y artes para enseñar a hablar a los mudos (Redução das letras e artes para ensinar os mudos a falar). Nessa obra levantaram-se questões sobre as causas da deficiência auditiva e dos pro- blemas da comunicação oral, foi citada a idade ideal para as crianças sur- das serem educadas (de 6 a 8 anos) e também a fala era ensinada por meio de alfabeto digital, leitura e gramática. Mesmo usando sinais, percebe-se que o objetivo educacional da época era a oralidade. Em seu método, Bonet apresentava o alfabeto manual (datilologia) no ensino da leitura e da escrita. Entretanto, apesar do uso da datilologia, ele era radicalmente contra o uso da língua gestual. W ik im iD ia Já na Inglaterra, em 1644, o médico John Bulwer publicou Chiro- nomia, or the art of manuall rhetorique, em que apresenta e defende sua teoria de que a linguagem das mãos é natural para todos os homens, prin- cipalmente para pessoas com surdez. (CABRAL,2001) Um dos maiores educadores da história de surdos foi Charles Michel de L’Épée, conhecido como Abbé de L’Épée, que publicou Instruction de sourds et muets par la voix des signes méthodiques (1776). Ele fundou, em Paris, a primeira escola pública para surdos, que tinha o objetivo de que os surdos aprendessem a ler e a escrever. GF_3.2_2013-2.indb 398 11/04/2013 16:39:22 399 Caminhos Históricos da Educação de Surdos – Unidade 1 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo L’ Épée iniciou o seu trabalho na educação de surdos ao substi- tuir seu professor (falecido), que lecionava para duas crianças (gêmeas) surdas. Observou a comunicação gestual existente entre as duas irmãs, interessou-se em aprendê-la e buscou sistematizar o ensino desses sinais (sinais realizados na gramática do francês): sinalizava com uma das mãos enquanto escrevia na lousa com a outra mão. W ik im iD ia Houve algumas tentativas em mudar o conceito e tratamento das pessoas deficientes como Jacob Rodrigues Pereira, em 1747, na tentativa de ensinar surdos congênitos a se comunicar, essas “[...]tentativas foram tão bem suce-didas que estimulou a busca de formas para lidar com outras populações, es- pecialmente a de pessoas com deficiência mental.” (ARANHA, 2001, p.166) Simultaneamente aos avanços feitos pelo Abade de L’Épée, Samuel Heinike (1778) dirigiu, em Leipzig (Alemanha), uma escola de ensino exclusivamente oral para surdos, rejeitando todos os outros métodos, que ele qualificava de inúteis e fraudulentos. Segundo Cabral (2001), ambos os educadores criaram uma polêmica quanto aos métodos de ensino, que ficaram conhecidos como método francês e método alemão. Em 1872, no Congresso de Veneza, foi decido que: o meio humano para a comunicação do pensamento é a língua oral; se orientados, os sur- dos leem os lábios e falam; a língua oral tem vantagens para o desenvolvi- mento do intelecto, da moral e da linguística. No I Congresso Internacional sobre a Instrução dos Surdos-Mudos, em 1878, em Paris, concordou-se que só a instrução oral poderia incluir o surdo na sociedade e que o método articulatório, que abrange a leitura labial, devia ser a base de todo o trabalho educacional. O oralismo, ou filosofia oralista, usava a integração da criança surda à comunidade de ouvintes, dando-lhe condições de desenvolver a GF_3.2_2013-2.indb 399 11/04/2013 16:39:22 400 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo língua oral (no caso do Brasil, o português). O oralismo percebe a surdez como uma deficiência que deve ser minimizada através da estimulação auditiva. (GOLDFELD, 1997, p. 30 e 31) No II Congresso Mundial, em Milão (1880), foram estabelecidas duas resoluções que mudariam toda a história por 100 anos: declarou-se a superioridade incontestável da fala para incorporar os surdos-mudos à vida social e considerou-se que a utilização simultânea dos gestos e da oralidade é prejudicial, pois dificulta a fala, a leitura labial e a precisão das ideias. O Congresso declarou que o método oral puro era ideal para a edu- cação dos surdos. Essas recomendações foram aceitas por vários países, como Alemanha, Itália, França, Inglaterra, Suécia e Bélgica. Somente o grupo americano, liderado por Edward Gallaudet, foi contrário à decisão. Nesse evento, dos 255 participantes, só três eram surdos. Em 1808, Jean-Marc Itard apresentou, na Faculdade de Medicina, as memórias Sur les moyens de rendre la parole aux sourds-muets e Sur les moyens de rendre l’ouïe aux sourds-muets. O seu método se baseia no treino da detecção e da discriminação dos sons, depois das vogais e das consoantes. Os alunos deviam aprender a ler e a escrever, acedendo depois às palavras e às frases simples. Entretanto, em 1821 ele reconsiderou a sua posição anterior, afirmando que a língua gestual é a língua natural dos sur- dos e pode proporcionar as mesmas vantagens da linguagem falada. Em 1815, o americano Thomas Hopkins Gallaudet foi à Europa co- nhecer os diferentes métodos de educação para surdos. No ano seguinte, voltou aos Estados Unidos com Laurent Clerc, um dos primeiros profes- sores surdos, para auxiliá-lo na fundação de uma escola. W ik im éD ia Thomas Hopkins Gallaudet GF_3.2_2013-2.indb 400 11/04/2013 16:39:22 401 Caminhos Históricos da Educação de Surdos – Unidade 1 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo W ik im eD ia Gallaudet University: primeira universidade para surdos no mundo. Também nos EUA, na cidade de Boston, em 1872, Alexander Graham Bell abriu uma escola oralista para professores de surdos. Re- gistrou a patente do telefone em 1873. Propôs a eliminação das escolas residenciais e a proibição do magistério aos professores surdos e do casa- mento entre surdos. De acordo com Carvalho (2007), durante a Segunda Guerra Mun- dial, os nazistas perseguiram todos os surdos, principalmente os judeus, defendendo seu extermínio. Praticava-se o aborto e a eutanásia em bebês com surdez. Eram condenados à morte as crianças encaminhadas a cen- tros especiais (onde os pais acreditavam estar enviando seus filhos para a cura) e os adultos institucionalizados – os quais Hitler autorizou direcio- nar para a câmara de gás e, depois, permitiu retirar os órgãos deles para experiência. Percebendo-se a necessidade de organizar a educação e os rumos a se- rem tomados mundialmente quanto à comunicação das pessoas com surdez, foi fundada a Federação Mundial de Surdos (WFD), em Roma, em 1951. Com os estudos feitos em 1967 por Roy Holcomb, introduziu-se a expressão Total Communication como filosofia de comunicação, e não como um método, associando novamente oralidade e sinais. Temos como uma das definições para essa filosofia de comunicação: A filosofia da Comunicação Total tem como principal preocupação os processos comunicativos entre surdos e surdos e entre surdos e GF_3.2_2013-2.indb 401 11/04/2013 16:39:23 402 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo ouvintes. Essa filosofia também se preocupa com a aprendizagem da língua oral pela criança surda, mas acredita que os aspectos cog- nitivos, emocionais e sociais não devem ser deixados de lado em prol do aprendizado exclusivo da língua oral. Por esse motivo, esta filosofia defende a utilização de recursos espaço-visuais como faci- litadores da comunicação. (GOLDFELD, 1997, p. 35) Um dos primeiros países a reconhecer oficialmente a língua gestual como língua nativa dos surdos foi a Suécia, em 1983. U.4U InicioUUaUEUucaçãoUUeUSurUosUNoUBrasil No Brasil, a história da educação de surdos teve início em 26 de setembro de 1857, quando se criou o Imperial Instituto dos Surdos- -Mudos, pela lei nº 839, esta tinha sua comunicação baseada no método combinado. Essa instituição foi fundada durante o Império de D. Pedro II, com a chegada do professor francês Hernest Huet, que era surdo. O Instituto era um asilo, onde só se aceitavam surdos do sexo masculino, que vinham de todos os pontos do país, sendo que muitos eram abandonados pelas famílias na- quele local. Inicialmente, utiliza- va-se a língua dos sinais, mas em 1911 adotou-se o oralismo como forma de comunicação. O estado de São Paulo tem algumas das mais antigas escolas para surdos do Brasil, como a fundada, em 1929, pelo Bispo Dom Francisco de Campos Barreto, o Instituto Santa Terezinha, na cidade de Campinas/SP, com atendimento para meninas. O Instituto foi, em 1933, transferido para São Paulo e, a partir de 1970, ele passou a atender meninos e meninas surdas. No final da década de 1970, chegou ao Brasil a filosofia da Comunicação Total. Outra instituição de grande importância foi fundada em 1954, o Instituto Educacional de São Paulo (IESP), que em 1969 passou a ser cha- mado de DERDIC, vinculado à Pontifícia Universidade Católica (PUC)/ Conexão INES Instituto Nacional de Educação de Surdos, localizado no Rio de Janeiro, com mais de 150 anos de trabalho oferecido na área da surdez. É referência nacional e tem atualmente um curso de graduação Bilíngue de Pedagogia, o Primeiro Curso de Graduação Bilíngue (Português/Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS). Para conhecer melhor esse trabalho, acesse: http://www.ines. gov.br/ GF_3.2_2013-2.indb 402 11/04/2013 16:39:23 403 Caminhos Históricos da Educação de Surdos – Unidade 1 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo SP. Atualmente, é referência nacional nos estudos desenvolvidos na área de surdez. Para que se organizassem melhor tanto as questões legais como as questões educacionais brasileiras em relação às pessoas com surdez, em 1987 foi criada a FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos). Todos os atuais documentos mundiais falam da importância e da acei- tação da língua de sinais como meio de comunicação dos surdos. Podemos citar a Declaração de Salamanca, de 1994, que traz no seu conteúdo: [...] importância da língua gestual como meiode comunicação entre os surdos [...] deverá ser reconheci- da e garantir-se-á que os surdos tenham acesso à educação na língua gestual do seu país. Atualmente, trabalhamos com um sistema bilíngue para surdos, mas, para que se pudesse entender como se chegou a esta definição, era necessário ter conhecimento do pro- cesso educacional por que passaram as pessoas com surdez até hoje, século XXI, quando a LIBRAS é reconhecida como um idioma e, como tal, pode ser estudado e entendido como aquisição de uma língua, que tem estruturas sintáticas, semânticas e morfológicas próprias. AtiviUaUes Vamos testar os conhecimentos adquiridos. Julgue verdadeiras (V) ou falsas (F) as assertivas a seguir. )( Aristóteles acreditava que os surdos poderiam ser educados. )( Em 1815, o americano Thomas Hopkins Gallaudet foi à Europa co- nhecer os diferentes métodos de educação para surdos. No ano seguinte, voltou aos Estados Unidos com Laurent Clerc, um dos primeiros professo- res surdos, para auxiliá-lo na criação de uma escola. Conexão Agora vamos assistir ao vídeo Orquestra de sinais, que mostrará o processo de inclusão de uma criança no Brasil em uma escola infantil e pública. Disponível em www.dominiopublico.gov.br GF_3.2_2013-2.indb 403 11/04/2013 16:39:23 404 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo )( A primeira instituição para surdos criada no Brasil data de 1875, em São Paulo. )( Sócrates, já na Antiguidade, percebia que a comunicação dos surdos necessitava dos gestos. )( Na Idade Média, surdos eram considerados inaptos à educação e ao sacerdócio. Somente eram respeitados juridicamente se falassem e casa- vam-se apenas com a permissão do papa. )( O II Congresso Mundial, em Milão (1880), declarou que a língua ideal para os surdos se desenvolverem era a língua de sinais. )( O Abade Charles de L’Épée criou a primeira escola pública para sur- dos na França. )( Na Alemanha, foi criado o método alemão, por Samuel Heinike, que aceitava o uso dos sinais. Reflexão Nesta unidade iniciamos uma contextualização dos caminhos árdu- os percorridos pelas pessoas com surdez, seja na família, seja na escola ou na sociedade. A questão central sempre foi a aceitação da diferença. Em cada época, em função de crenças e de objetivos políticos e eco- nômicos, vimos a forma como eram tratados aqueles que tinham alguma deficiência. Alguns entendiam a morte como salvação, outros se deixavam viver, mas em condições subumanas, e, por fim, eles não tinham os seus direitos garantidos nem eram tidos como membros da sociedade. O uso da oralidade e da língua de sinais os conflitos para aceitar qual seria a melhor forma dos surdos se comunicarem e se desenvolverem educacionalmente e na área social, foram os grandes embates vistos na historia, porem também foi observado que na maioria das discussões e tomadas de decisões os surdos pouco participavam ou eram indagados das suas opiniões. LeiturasUrecomenUaUas MAZZOTTA, Marcos J. Silveira. Educação especial no Brasil: histó- ria e políticas públicas. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2005. Essa obra mostra toda a trajetória da educação especial no Brasil, in- dicando as principais instituições que foram base para o atendimento GF_3.2_2013-2.indb 404 11/04/2013 16:39:23 405 Caminhos Históricos da Educação de Surdos – Unidade 1 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo educacional das pessoas com deficiência. Com essa trajetória, também se mostra o processo de segregação até a discussão da diferença entre integração e inclusão. LACERDA, C.B.F. Um pouco da história das diferentes aborda- gens na educação dos surdos. Disponível em: http://www.scielo. br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-32621998000300007- &lng=pt&nrm=iso. Acesso em: 29/05/2011. SACKS, O. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. São Pau- lo: Companhia das Letras, 1998. Referencias ARANHA, M.S. Paradigmas da relação da sociedade com as pes- soas com deficiência. Revista do Ministério Público do Trabalho, Ano XI, no. 21,março, 2001, pp. 160-173. GUGEL, Maria aparecida Gugel. Pessoas com Deficiência e o Direito ao Trabalho. Florianópolis : Obra Jurídica, 2007. SOARES, M.A.L. A Educação do surdo no Brasil. Editora Autores Associados, 2002. 2. ed. NaUpróximaUuniUaUeU Estaremos estudando as questões clinicas, nomenclaturas e se existe diferenças entre surdos e deficientes auditivos. Atenção, pois serão que- brados mitos com relação a preconceito associado a maneira como nos referimos as pessoas com surdez. GF_3.2_2013-2.indb 405 11/04/2013 16:39:23 406 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo GF_3.2_2013-2.indb 406 11/04/2013 16:39:24 U ni Ua Ue U2 U Questões Clínicas da Surdez e as Nomenclaturas Nesta unidade, conversaremos sobre o que é a surdez e como ocorrem as lesões. Entenderemos como a surdez é dividida, quais são seus graus e como isso interfere na vida diária. Percebe-se que, no decorrer da história, muitas nomenclaturas foram sendo alteradas, e na área da sur- dez não foi diferente. Será explicado se existe realmente necessidade dessas mudanças ou se somente são sinônimos. Antes de compreender os tipos de comunicação que são utili- zados pela comunidade de surdos, é fundamental entender como essa deficiência ocorre e quais são as consequências para a vida familiar, escolar e social. Nesta unidade, conheceremos a audição humana e entendere- mos como o som é processado. Também serão discutidas as questões referentes às nomenclaturas, bem como se existem diferenças ou são apenas sinônimos. Objetivos da sua aprendizagem O objetivo desta unidade é levar o aluno ao conhecimento das questões clínicas ligadas à surdez, desmistificando várias nomenclaturas e definições. Você se lembra? Várias doenças e infecções ou mesmo a introdução de objetos no ouvido podem ocasionar a surdez. Você se lembra de ser informado dos cuidados com a sua audição? Já conheceu pessoas que tinham a audição perfeita e, por uma doença ou qualquer outro fato, fica- ram surdas? Pois é, pense nisso. As pessoas não nascem somen- te com a deficiência e podem no decorrer da vida passar a ser pessoas com deficiência. GF_3.2_2013-2.indb 407 11/04/2013 16:39:24 408 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo 2.UUCaracterísticasUClinicasUUaUSurUez A audição é medida em decibéis (db), que é a unidade de medida referente à intensidade de sons. Uma audição normal está entre 0 e 25 db e, quanto maior for o número de decibéis, maior será a perda auditiva. Vamos conhecer como é o caminho percorrido pelo som para que possamos ouvir ou mesmo entender em qual parte pode ter ocorrido um problema que poderá levar à surdez. Ouvido Externo Ouvido Médio Ouvido Interno Estribo Nervo auditivo Janela oval Cóclea Trompa de Eustáquio Canal semicircularOssotemporal Pavilhão Auditivo Canal Auditivo externo Martelo Timpano Bigorna Lenticular ( 1 ) ( 2 ) ( 5 ) ( 3 ) ( 4 ) que vibra os ossiculos O som chega pelo meato, vibra o tímpano a propagação da sai cóclea para a trompa de Eustáquio A base do estribo transmite a vibração para dentro do líquido e a onda se propaga fazendo a membrana basilar ressonar de acordo GF_3.2_2013-2.indb 408 11/04/2013 16:39:35 409 Questões Clínicas da Surdez e as Nomenclaturas – Unidade 2 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo CURIOSIDADE O ouvido é dividido em três partes: externo, médio e interno.Ouvido externo: é formado pela orelha e pelo canal auditivo, com a membrana timpânica no fundo do canal. Ouvido médio: nele estão os três ossículos (mar- telo, bigorna, estribo) e a abertura da tuba auditiva. Ouvido interno: também chamado de labirinto, é formado pelo aparelho vestibular (equilíbrio)e pela cóclea (audição). A diminuição da audição (surdez) produz re- dução na percepção de sons e dificulta a compreensão das palavras. Agora que entendemos como é o processo para que possamos ouvir, fica mais fácil ter cuidado para não lesionar alguma região do ouvido. De- vemos ficar atentos a infecções no ouvido médio (otite). Continuando o estudo da au- dição e do que pode causar a surdez, entenderemos a im- portância do período de aquisição da linguagem, que é fundamental para a organização dos atendi- mentos às crianças surdas. A aquisição está divi- dida em pré-lingual, ou seja, ocorreu antes da aquisição da linguagem, ou pós-lingual, que ocorreu depois da aquisição da linguagem. Saber esses dados auxilia na organização das formas de comunicação, oral ou gestual. Da ro ly n / D re am St im e. co m Marchesi (1997) constatou que quase 100% de um segmento signifi- cativo de adolescentes que haviam perdido a audição após os três anos de idade tinham desenvolvido uma linguagem interna. Tal afirmativa deve-se ao fato de que, tendo perdido a audição após essa idade, a criança já havia tido uma dominância cerebral consolidada, o que lhe permitiu o registro da experiência auditiva. GF_3.2_2013-2.indb 409 11/04/2013 16:39:37 410 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo De acordo com Araujo (2005, p.244) Como, até os três primeiros anos de vida, a organização das fun- ções neurológicas está se fazendo, a competência linguística é de- masiadamente frágil. As crianças que ficam surdas nesse período, considerado pré-linguístico, fase em que não está estruturada ainda a linguagem dos ouvintes, não deixam de poder desenvolver uma linguagem a fim de se comunicar, porém isso ocorre com uma es- truturação diferente. Com essas informações, fica evidente o quanto é fundamental saber- mos a época em que ocorreu a surdez. A surdez pode ser dividida em dois grandes grupos (BRASIL, 2006): • congênitas: o indivíduo já nasceu surdo; • adquiridas: o indivíduo perde a audição no decorrer da sua vida. As causas da surdez estão divididas em três grupos: • pré-natais: surdez causada por fatores genéticos e hereditários, doenças adquiridas pela mãe na época da gestação (rubéola, toxoplasmose, citomegalovírus) e exposição da mãe a drogas ototóxicas (medicamentos que podem afetar a audição); • perinatais: frequentemente causada por parto prematuro, anó- xia cerebral (falta de oxigenação no cérebro logo após o nas- cimento) e trauma de parto (uso inadequado de fórceps, parto excessivamente rápido, parto demorado); • pós-natais: doenças adquiridas pelo indivíduo ao longo da vida, como meningite, caxumba, sarampo. Além do uso de me- dicamentos ototóxicos, outros fatores também têm relação com a surdez, como avanço da idade e acidentes. De acordo com o local onde ocorreu a lesão, têm-se características distintas: Condutiva: quando está localizada no ouvido externo e/ou no ou- vido médio; as principais causas deste tipo são as otites, rolha de cera, acúmulo de secreção que vai da tuba auditiva para o interior do ouvido médio, prejudicando a vibração dos ossículos (geralmen- te aparece em crianças frequentemente resfriadas). Na maioria dos casos, essas perdas são reversíveis após tratamento. GF_3.2_2013-2.indb 410 11/04/2013 16:39:37 411 Questões Clínicas da Surdez e as Nomenclaturas – Unidade 2 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo • Neurossensorial: quando a alteração está localizada no ouvido in- terno (na cóclea ou em fibras do nervo auditivo). Esse tipo de lesão é irreversível; as causas mais comuns são a meningite e a rubéola materna. • Mista: quando a alteração auditiva está localizada no ouvido externo e/ou médio e ouvido interno. Geralmente ocorre devido a fatores genéticos, determinantes de má formação. • Central: a alteração pode se localizar desde o tronco cerebral até às regiões subcorticais e córtex cerebral. (BRASIL, 2006, p.16) (BRASIL,2006,p.16) As características da surdez dependem do tipo e da gravidade do problema que a causou. De acordo com o grau da surdez, podem-se obser- var as características que esta perda traz para o indivíduo. Uma criança com perda leve pode apresentar dificuldade em en- tender mensagens, sobretudo com palavras de uso pouco frequente, não identifica totalmente os sons produzidos com voz ciciada, tem melhor per- cepção quando utiliza uma prótese auditiva e pode apresentar pequenas dificuldades articulatórias. Normalmente, essas crianças são consideradas muito distraídas. ga vr il be rn aD / Dr ea m St im e. co m Perda leve Já a criança com uma perda auditiva moderada só identifica palavras produzidas com elevação de voz; é necessária a colocação de uma prótese auditiva para que ela consiga perceber os sons; pode não conseguir acom- panhar uma discussão em grupo; a articulação é bastante imprecisa e a linguagem expressiva oral apresenta-se limitada. Existe a necessidade de GF_3.2_2013-2.indb 411 11/04/2013 16:39:40 412 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo estas crianças usarem próteses auditivas – elas necessitam de treino audi- tivo e de grande estimulação da linguagem. ot na yD ur / Dr ea m St im e. co m Perda auditiva moderada Quando a criança apresenta perda severa, ela consegue ouvir apenas os sons próximos; só consegue perceber algumas palavras se estas forem amplifica- das, e o processo de aquisição da linguagem oral não é feito de forma espontânea. Elas não podem dispensar do uso das próteses e, na maioria das vezes, utilizam a língua de sinais para se expressar, bem como para compreender os outros. m ic u m ir ce a / D re am St im e. co m Perda auditiva severa A deficiência auditiva profunda faz com que a criança não consiga perceber a fala através da audição, mas ela pode perceber sons altos e vi- brações e apresenta muitas limitações para a aquisição da linguagem oral. Deve ser ensinada à criança a língua de sinais. ph ar ti Sa n / D re am St im e. co m Perda auditiva profunda GF_3.2_2013-2.indb 412 11/04/2013 16:39:44 413 Questões Clínicas da Surdez e as Nomenclaturas – Unidade 2 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo O quadro a seguir é um resumo dos graus da surdez. É importante lembrar que podem existir diferenças na abordagem feita por alguns auto- res, mas adotaremos em nossos estudos os dados que se seguem. Leve 26 a 40 db vl aD im ir v or on in / Dr ea m St im e. co m Dificuldade para ouvir o som do tique-taque do relógio ou uma conver- sação sussurrada (cochi- cho). Moderada 41 a 70 db an Dr aS c So nt oS / Dr ea m St im e. co m Dificuldade para ouvir uma voz fraca ou o can- to de um pássaro e para participar de discussões em sala. Usa AASI (apa- relho de amplificação sonora individual). Severa 71 a 90 db W ik im eD ia Dificuldades para ouvir o telefone tocando ou os ruídos das máquinas de escrever num escritório. Profunda Acima de 91 db W ik im eD ia Dificuldades para ouvir o caminhão, o som na discoteca, o ruído de um avião decolando. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 1,5% da popula- ção dos países em desenvolvimento têm problemas relativos à audição, e a surdez, em seus diversos graus, atinge 10% da população mundial. 2.2UNomenclaturasUeUsurUez:UqualUaUimportânciaUemU UiferenciarUsurUosUeUUeficientesUauUitivosU Podemos pensar “o surdo” partindo de duas definições distintas: uma clínica e outra sócio-antropológica. Na visão clínica, enfatiza-se a perda da audição. Skliar (1997, p.45) cita: [...] o surdo é considerado uma pessoa que não ouve e, portanto, não fala. É definido por suas características negativas; a educação GF_3.2_2013-2.indb 413 11/04/2013 16:39:49 414 Libras Pro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo se converte em terapêutica, o objetivo do currículo escolar é dar ao sujeito o que lhe falta: a audição, e seu derivado: a fala. O autor citado também define: Medicalizar a surdez significa orientar toda a atenção à cura do problema auditivo, à correção de defeitos da fala, ao treinamento de certas habilidades menores, mais que a interiorização de instru- mentos culturais significativos, como a língua de sinais. E significa também opor e dar prioridade ao poderoso discurso da medicina frente à débil mensagem da pedagogia. Entretanto, podemos pensar um indivíduo surdo capaz e uma surdez não como fim.Assim define Sánchez (1998, p.51): A surdez não é uma doença que necessita de cura, mas é uma con- dição que deve ser aceita. Os surdos não são inválidos que precisam de reabilitação. Eles são membros de uma comunidade linguística minoritária que deve ser respeitada e possuem o direito inalienável de receber sua educação nesta língua. Capovilla (1998, p.1543) também relata o antagonismo da termino- logia surdo, baseado nestes dois posicionamentos, sendo que a: [...] posição médica que considera a surdez como um problema a ser resolvido e o surdo como portador de uma deficiência a ser curada, há posição antropológica que considera a surdez como uma pecu- liaridade humana e o surdo como portador de uma cultura e uma língua própria a serem respeitadas. Tomando o conceito de surdez enquanto construção social, e não como falta biológica, conseguimos visualizar possibilidades educacionais, sociais, mas é de fundamental importância reconhecer que é por meio da língua de sinais que essas pessoas conseguem realmente participar do mundo, expressando seus desejos e suas vontades e assumindo realmente seu papel na sociedade. As questões de nomenclatura sempre são colocadas é de fundamental importância conhecer como se define tecnicamente, segundo Sassaki (2005): [...] deficiência auditiva é a “perda parcial ou total bilateral, de 25 (vinte e cinco) decibéis (db) ou mais, resultante da média aritmé- tica do audiograma, aferida nas frequências de 500HZ, 1.000HZ, GF_3.2_2013-2.indb 414 11/04/2013 16:39:49 415 Questões Clínicas da Surdez e as Nomenclaturas – Unidade 2 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo 2.000Hz e 3.000Hz” (art. 3º, Resolução nº 17, de 8/10/03, do CONADE – Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência.Porém em 2/12/04, o Decreto nº 5.296, de 2/12/04, alterou de 25 decibéis para 41 decibéis, a definição de Deficiência Auditiva. Uma das definições que poderíamos adotar é a que coloca os surdos como pessoas que utilizam a comunicação espaço-visual como principal meio de conhecer o mundo, em substituição à audição e à fala. Eles são usuários da língua de sinais; sua audição não é funcional na vida comum. Para o hipoacústico (deficiente auditivo), a audição, ainda que deficiente, é funcional com ou sem prótese auditiva. vl aD im ir m uc ib ab ic / Dr ea m St im e. co m Surdo Marques (1998) define que o surdo compreende o mundo pelo visual. Este apresenta um pensamento plástico que atravessa ideias e com- portamentos através de uma linguagem que existe pelas imagens e representações mentais que informam a percepção, de acordo com características intelectivas próprias. A visualidade é o principal canal de processamento de esquemas de pensamento que propicia a aquisição, construção e expressão de conhecimento, valores e vi- vências que levam a uma concepção de mundo muito particular. A linguagem visual para o sujeito surdo é a sistematização e produto de seu desenvolvimento cognitivo e histórico, tornando-se instru- mento para a formulação de generalizações que facilitem a transição da reflexão sensorial espontânea para o pensamento racional através do uso dos signos.(MARQUES,1998 apud DALCIN,2005,p.13) GF_3.2_2013-2.indb 415 11/04/2013 16:39:51 416 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo Para a educação, é de fundamental importância o tipo de comunicação que a pessoa com surdez utiliza, não somente para que assim se possa ga- rantir a presença dos intérpretes de LIBRAS nas escolas, mas também para se organizarem os atendimentos educacionais em LIBRAS e de LIBRAS. Uma reflexão que poderia ser feita é que talvez o mais importante não seja como é chamada a pessoa com surdez, mas como se lida com a deficiência, pois estaríamos discutindo principalmente o preconceito que pode haver por trás das palavras. AtiviUaUes Para reforçar nosso estudo vamos associar: 1. Perda leve ( ) até 25db 2. Perda moderada ( ) 71 a 90db 3. Perda severa ( ) 41 a 70db 4. Perda profunda ( ) 26 a 40db 5. Audição normal ( ) acima de 91db 01. Qual a definição, de acordo com a sócio-antropologia, de surdo e de- ficiente auditivo? 02. O que uma criança com perda auditiva moderada consegue perceber auditivamente? Reflexão Nesta unidade, o objetivo foi mostrar um pouco da deficiência au- ditiva, suas causas, características e necessidades mais elementares. É im- GF_3.2_2013-2.indb 416 11/04/2013 16:39:51 417 Questões Clínicas da Surdez e as Nomenclaturas – Unidade 2 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo portante pensarmos que qualquer pessoa pode vir a ser surda se cuidados não forem tomados para a sua saúde auditiva. Durante a vida, temos a oportunidade de perceber e ter o prazer de ouvir vários sons distintos, como sons dos pássaros, uma música, até mes- mo o barulho dos carros, das buzinas, enfim, podemos perceber o mundo à nossa volta por meio dos sons. Nossa atenção é guiada, muitas vezes, pelo sentido da audição. Para muitos, o silêncio incomoda; imagine nunca ter escutado, nem seu nome, nem a mãe chamando, como seria entender o mundo sem esse sentido? Talvez valha a pena citar Helen Keller, que escreveu um texto cha- mado “Três dias para ver”. Depois faça uma reflexão: Várias vezes pensei que seria uma bênção se todo ser humano, de repente, ficasse cego e surdo por alguns dias no princípio da vida adulta. As trevas o fariam apreciar mais a visão e o silêncio lhe en- sinaria as alegrias do som. De vez em quando testo meus amigos que enxergam para descobrir o que eles veem. Há pouco tempo perguntei a uma amiga que volta- va de um longo passeio pelo bosque o que ela observara. “Nada de especial”, foi a resposta. Como é possível, pensei, caminhar durante uma hora pelos bosques e não ver nada digno de nota? Eu, que não posso ver, apenas pelo tacto encontro centenas de objetos que me interessam. Sinto a de- licada simetria de uma folha. Passo as mãos pela casca lisa de uma bétula ou pelo tronco áspero de um pinheiro. Na primavera, toco os galhos das árvores na esperança de encontrar um botão, o primeiro sinal da natureza despertando após o sono do inverno. Por vezes, quando tenho muita sorte, pouso suavemente a mão numa arvorezi- nha e sinto o palpitar feliz de um pássaro cantando. [...] Eu, que sou cega, posso dar uma sugestão àqueles que veem: usem seus olhos como se amanhã fossem perder a visão. E o mesmo se apli- ca aos outros sentidos. Ouça a música das vozes, o canto dos pássaros, os possantes acordes de uma orquestra, como se amanhã fossem ficar surdos. Toquem cada objeto como se amanhã perdessem o tacto. Sin- tam o perfume das flores, saboreiem cada bocado, como se amanhã não mais sentissem aromas nem gostos. Usem ao máximo todos os sentidos; gozem de todas as facetas do prazer e da beleza que o mundo lhes revela pelos vários meios de contacto fornecidos pela natureza. GF_3.2_2013-2.indb 417 11/04/2013 16:39:51 418 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo LeiturasUrecomenUaUas SASSAKI,R.K. Terminologia sobre deficiência na era da inclusão. Dis-ponível em http://www.educacaoonline.pro.br/index.php?option=com_ content&view=article&id=69:terminologia-sobre-deficiencia-na-era- da-inclusao&catid=6:educacao-inclusiva&Itemid=17 ___________. Nomenclatura na área da surdez. Disponível em http://www.educacaoonline.pro.br/index.php?option=com_conten t&view=article&id=69:terminologia-sobre-deficiencia-na-era-da- inclusao&catid=6:educacao-inclusiva&Itemid=17 No primeiro texto, o autor discute que pensar na perspectiva da edu- cação inclusiva nos remete também a pensar na mudança de alguns voca- bulários para que melhor se encaixem quando se referem a determinados grupos de pessoas. No segundo material, ele pontua a área da surdez e desmistifica vários nomes. Também devemos tomar cuidado para não ro- tular as pessoas, pois elas têm a deficiência, não são a deficiência. Referências BRASIL. Saberes e práticas da inclusão: desenvolvendo competên- cias para o atendimento às necessidades educacionais especiais de alu- nos surdos. 2. ed. SEESP/MEC. Brasília: MEC, 2006. BUENO, J.G.S. Surdez, linguagem e cultura. Cad. CEDES, vol.19, nº46, Campinas, set/1998. SACKS, O. Vendo vozes. São Paulo: Cia. das Letras, 1998. NaUpróximaUuniUaUeU Na próxima unidade estudaremos as línguas orais e as gestuais, suas diferenças e quais características têm para ser consideradas idiomas. E um pouco da história da língua de sinais e da LIBRAS. GF_3.2_2013-2.indb 418 11/04/2013 16:39:52 U ni Ua Ue U3 U Comunicação,Línguas Orais e de Sinais Nesta Unidade, discutiremos as diferen- ças entre as duas línguas: oral e gestual. Também será mostrado como os sinais passaram, com o tempo, a terem características de língua/idioma. Muitas pessoas acreditam que a língua de sinais é universal, o que é um grande equívoco. Cada país tem a sua língua e tem marcas fortes de sua cultura e na maneira como percebem o mundo. As línguas orais têm diferenças de um município para o ou- tro; as línguas de sinais também. Vale lembrar a citação do psiquiatra surdo norueguês Terje Basilier: Quando eu aceito a língua de outra pessoa, eu aceito a pessoa... Quando eu rejeito a língua, eu rejeito a pessoa porque a língua é parte de nós mesmos... Quando eu aceito a Língua de Sinais, eu aceito o surdo, e é importante ter sempre em mente que o surdo tem o direito de ser surdo. Nós não devemos mudá-los, devemos ensiná- los, mas temos que lhes permitir ser surdo. Na Unidade III, estamos falando sobre o foco principal, que é a comunicação. É por meio da comunicação que as pessoas se relacionam, expressam seus sentimentos, enfim, mantêm contato com o mundo que as rodeia. Objetivos da sua aprendizagem O objetivo da unidade III é mostrar a importância da comu- nicação tanto oral como gestual. Você se lembra? Você se lembra do cinema mudo? Conseguimos en- tender Charles Chaplin mesmo sem nada ouvir, apenas observando suas expressões faciais e corporais. GF_3.2_2013-2.indb 419 11/04/2013 16:39:52 420 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo 3.UUComunicação Antes de iniciarmos o estudo das línguas orais e gestuais, vamos pensar a respeito da comunicação, que é a base do nosso estudo. Comunicação vem do latim communicatio, que quer dizer “atividade realizada conjuntamente”, pois a palavra tem este significado religioso: No mosteiro aparecera uma prática que recebeu o nome de com- municatio, que é o ato de “tomar a refeição da noite em comum”, cuja peculiaridade era evidentemente não recair sobre a banalidade do ato de “comer”, mas de fazê-lo “juntamente com os outros”, reunindo então aqueles que se encontravam isolados. A originali- dade dessa prática fica por conta dessa ideia de “romper o isola- mento”, e nisto reside a diferença entre a communicatio eclesiásti- ca e o simples jantar da comunidade primitiva. Não se trata, pois, de relações sociais que naturalmente os homens desenvolvem, mas de uma certa prática, cuja novidade é dada pelo plano de fundo do isolamento. Daí a necessidade de se forjar uma nova palavra, para exprimir novidade dessa prática. (HOHLFELDT, MARTINO, FRANÇA, 2007, p.13) Ou seja, como diz Vanoye (2003, p.1), “[...] toda comunicação tem por objetivo a transmissão de uma mensagem”, que traz a ideia mais simples de conversa, do diálogo entre duas ou mais pessoas (emissor é quem produz a mensagem – receptor é quem recebe a mensagem), e isso pode ocorrer de várias maneiras por gestos, fala, escrita, meios de comunicação etc. A comunicação estabelece uma relação com alguém ou com alguma coisa e através desta relação ocorrem as modificações, pois vivemos em sociedade. Sabe-se que a comunicação nasceu na pré-história, como forma de expressão que ocorria por meio de desenhos nas paredes das cavernas, de- pois retorna na invenção da escrita pelos sumérios, em 3.500 a.C. e assim por diante a comunicação vai se desenvolvendo com as sociedades, pois tem varias funções que são lhe atribuídas através de mensagens como in- formar, persuadir, convencer, prevenir e etc. Durante este capítulo, estudaremos alguns tipos de comunicação, por- que toda comunicação envolve um comportamento social, principalmente a GF_3.2_2013-2.indb 420 11/04/2013 16:39:52 421 Comunicação,Línguas Orais e de Sinais – Unidade 3 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo linguagem, que vai nos ajudar a entender melhor como ocorrem as intera- ções entre alunos com e sem deficiência nesse processo de inclusão, pois a linguagem é tida como um processo fundamental para os homens. A comunicação humana é um processo que envolve a troca de infor- mações; ela tem os sistemas simbólicos como suporte para este fim. Exis- te uma infinidade de maneiras de se comunicar: oralmente ou por meio de gestos e de mensagens enviadas utilizando-se as redes sociais, bem como a escrita, que permite interagir com as outras pessoas e efetuar algum tipo de troca informacional. Para a semiótica, o ato de comunicar é a materialização do pensa- mento/sentimento em signos conhecidos pelas partes envolvidas. Estes símbolos são transmitidos e reinterpretados pelo receptor. Hoje, é interes- sante pensar também em novos processos de comunicação, que englobam as redes colaborativas e os sistemas híbridos, que combinam comunicação de massa, comunicação pessoal e comunicação horizontal. Para entendermos o que é língua, devemos começar conhecendo a palavra-chave da linguística bakhtiniana, que é diálogo. Só existe língua onde há possibilidade de interação social, dialogal. A língua é um traba- lho empreendido conjuntamente pelos usuários, é uma atividade social, é enunciação. Sv it la na 10 / Dr ea m St im e. co m A língua, para Bakhtin, remete-nos a um sistema de referências pro- duzido histórica e socialmente nas relações interativas. E é no sentido bakhtiniano que se pode entender a pessoa com surdez como sujeito produtor de sistemas simbólicos, constituída de consciência, linguagem e pensamento, cuja(s) língua(s) em uso é (são) sistema(s) de referência, social e historicamente produzido(s) nas relações interativas/ nas relações dialógicas. Isso nos leva a sustentar que os sujei- tos surdos se constituem nesse processo, interagindo com os outros, com seus interlocutores; seu conhecimento de mundo resulta desse processo. GF_3.2_2013-2.indb 421 11/04/2013 16:39:53 422 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo 3.2UComunicaçãoUOral A comunicação, como já foi visto, pode ser oral, gestual, corporal ou escrita. Inicialmente, é importante definir que comunicação oral é: [...] uma modalidade de divulgação científica realizada através da exposição verbal de tempo variável, com ou sem auxílio de recursos audiovisuais e amplificadores de voz. O recurso predominantemente utilizado é, portanto, o próprio corpo do expositor, particularmente a sua fala, seus gestos, expressões faciais,direcionamento do olhar e postura. (CARMO, PRADO, 2005, p.2) As pessoas geralmente utilizam da oralidade para se comunicar e para isso utilizam a língua para expressar o que sentem e pensam. A fala é forma dominante de comunicação e expressão social, sendo o vínculo de compreensão entre os seres humanos. Segundo Vanoye (2000, p. 209), existem três aspectos que compreen- dem a comunicação oral: fisiológico, que é a variação de frequência (de altu- ra), de intensidade e de periodicidade das ondas sonoras; psicolinguístico, que é o estudo da língua enquanto conjunto de segmentos conhecidos e reconheci- dos; psicológico, que é vinculado aos problemas de atenção e personalidade. to rS te n Sc ho n / D re am St im e. co m Esses aspectos acontecem quando a comunicação oral passa do apa- relho fonador ao ouvido humano. Para que a comunicação oral ocorra bem, ela precisa ser adaptada à necessidade do interlocutor, para que a mensagem seja transmitida sem interrupções, a fim de que o receptor possa entendê-la. E existem dois tipos de comunicação oral: • Com intercâmbio: quando emissor e receptor podem variar seus papéis. Exemplo: diálogo conversa. • Sem intercâmbio: quando só o receptor fala. Exemplo: aula expositiva, discurso. GF_3.2_2013-2.indb 422 11/04/2013 16:39:56 423 Comunicação,Línguas Orais e de Sinais – Unidade 3 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo Para terminar, destaca-se a importância da comunicação oral na so- ciedade e “[...] enfatizar a importância do emissor e do receptor, visto que são os sujeitos da comunicação.” (KREUZ, 2003, p.3) 3.3ULínguaUUeUsinais As línguas surgem pela comunicação e pela interação de determi- nado grupo de pessoas, podendo ser oral ou por meio dos sinais. Ambas possuem estruturas que possibilitam, segundo Brito (2008): [...] a expressão de qualquer conceito – descritivo, emotivo, racio- nal, literal, metafórico, concreto, abstrato, enfim – permite a expres- são de qualquer significado decorrente da necessidade comunicativa e expressiva do ser humano. O linguista William Stokoe, em 1950, comprovou o status linguís- tico da língua de sinais, afirmando que ela satisfazia todos os critérios linguísticos de uma língua genuína, no léxico, na sintaxe e na capacidade de gerar infinitas combinações a partir de três partes independentes (lo- calização, configuração de mãos de movimento executado) análogas aos fonemas da fala (SACKS, 1998). No Brasil, as pesquisas sobre a Língua Brasileira de Sinais tiveram início em 1981, quando a linguista Lucinda Ferreira-Brito apresentou o bilinguismo na área da surdez. É de 1873 a publicação do mais importante documento encontrado até hoje sobre a Língua Brasileira de Sinais, o Iconographia dos signaes dos surdos-mudos, de autoria do aluno surdo Flausino José da Gama, com ilustrações de sinais separados por categorias (animais, objetos, etc), que estudava no Instituto de Surdos e Mudos do Rio de Janeiro. Em 1969, houve a primeira tentativa de registrar a língua de sinais falada no Brasil. Foi publicado por Eugênio Oates o dicionário Lingua- gem das mãos. Segundo Ferreira Brito (1993), apresentava um índice de aceitação por parte dos surdos de 50% dos sinais listados. Pessoas que ouvem falam diferentes línguas em países diferentes. Os surdos também possuem línguas de sinais distintas, pois estas sofrem influência cultural e também sofrem reflexos do meio onde se desenvol- vem, portanto existem muitas línguas de sinais, como: língua de sinais francesa, chilena, japonesa, americana, espanhola, venezuelana, portugue- sa, inglesa, russa, urubus-kaapor (indígena), entre outras. GF_3.2_2013-2.indb 423 11/04/2013 16:39:56 424 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo As línguas de sinais são utilizadas pela maioria das pessoas sur- das e, como toda língua, “[...] aumentam seus vocabulários com novos sinais introduzidos pelas comunidades surdas em resposta a mudan- ças culturais e tecnológicas” (BRITO,2010). No Brasil, existem duas línguas de sinais: Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e Língua Brasileira de Sinais Kaa- por (LSKB). A primeira é utilizada nos centros urbanos e é reconhecida como primeira língua pelas comunidades surdas; já a língua brasileira de sinais Kaapor (LSKB) é utilizada pelos índios da tribo Urubu-Kaapor – situada ao sul do estado do Maranhão –, que possui alto índice de surdez, é intratribal e há um surdo para cada 75 não surdos indígenas. Dados do Censo (2000) do Instituto Brasileiro de Geografia e Es- tatística (IBGE) apontaram que a surdez é a segunda maior deficiência no Brasil. Os deficientes auditivos (DA) somam, aproximadamente, 5,7 milhões. Destes, quase um milhão apresentam surdez severa. Para melhor perceber as diferenças entre as línguas, observe os alfa- betos de alguns países apresentados a seguir e compare: Conexão: O Ministério da Educação (MEC) não informa quantos dos 163 693 indígenas matriculados na rede pública têm deficiência auditiva - entre os não-índios são 15 mil. Em 2001, com a aprovação do Plano Nacional de Educação, as escolas indígenas conse- guiram garantir a identidade cultural e linguística de suas populações por meio de um currículo diferencia- do. Das 2 323 escolas indígenas existentes no Brasil, 1 818 já oferecem Educação bilíngue. Assista ao vídeo Educação Inclusiva de Índios Surdos - Dourados/MS Dsponível em http:// www.youtube.com/watch?v=Gus1iTA_Eac GF_3.2_2013-2.indb 424 11/04/2013 16:39:56 425 Comunicação,Línguas Orais e de Sinais – Unidade 3 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo A B C D E F G M S Y 5 H N T Z 6 I O U 1 7 J P V 2 8 K Q W 3 9 L R X 4 0 Alfabeto e números em LIBRAS-Brasil ba Sh ee ra De Si gn S | D re am St im e. co m Alfabeto em LIBRAS-Estados Unidos GF_3.2_2013-2.indb 425 11/04/2013 16:40:01 426 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo 3.4UDiferençasUEntreULínguasUOraisUEUDeUSinais Façamos um quadro para facilitar o entendimento da diferença entre as línguas orais e visuais: Línguas orais: português, inglês, espanhol etc. Línguas de sinais: brasileira, americana,francesa etc.Diferenças Orais e auditivas Visual e espacial BRITO (2008) aponta que as línguas de sinais são diferentes das línguas orais porque têm como meio ou canal de comunicação o sistema visual-espacial, e não oral-auditivo. São expres- sas em determinado espaço e percebidas pela visão, ou seja, a comunicação ocorre através de fontes distintas, mas com os mesmos significados. Para se chegar à definição de que as línguas de sinais eram idiomas demorou muito tempo: somente no sé- culo XX isso aconteceu. Nos capítulos anteriores, vimos como ocorreu o desenvolvimento histórico e educacional das pessoas com surdez e já era percebida a influência da oralidade em determinadas épocas da história. As línguas trazem conceitos de determinada cultura, de uma comu- nidade que muitas vezes não faz parte de outras realidades, como afirma Faria (2006, p.179). Os vocábulos das línguas, ao serem concatenados, produzem uma infinidade de trocadilhos cujos significados flutuam dos mais trans- parentes aos mais opacos; dos mais simples aos mais inusitados; dos mais grotescos aos mais poéticos. Essa recursividade encontra- se carregada da cultura vivenciada pelos indivíduos, na comunida- de a que pertence. Por isso, muitas vezes, o que se diz é somente entendido por falantes nativos de dada língua ou por quem se en- Conexão: Para poder observar as diferenças entre as línguas de sinais assista aos filmes: “Quatro casamentos e um funeral”, nele vocês terão a oportunidade de assistir um surdo se comunicando em língua de sinais da Inglaterra e para comparar assista “Velocidade Máxima 2”onde é mostrada a língua de sinais Americana. GF_3.2_2013-2.indb 426 11/04/2013 16:40:01 427 Comunicação,Línguas Orais e de Sinais – Unidade 3 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo contra imerso nessa comunidade, por anos trocando, tropeçando e descortinando construções e interpretações das mais variadas, origi- nadas no arcabouço linguístico e criativo das trocas comunicativas. Exemplo disso está o fato de que questões culturais incorporadas à LP não têm sido transmitidas naturalmente aos surdos brasileiros, como acontece com os ouvintes que, quando crianças, ouvem ex- pressões ‘estranhas’, mas, aos poucos, vão descobrindo o que real- mente elas significam e as naturalizam. AtiviUaUes 01. O que difere as línguas orais das línguas de sinais? 02. No Brasil, quantas línguas de sinais existem? Quais são elas? 03. Quando e por quem foi descoberto o status linguístico da língua de sinais? GF_3.2_2013-2.indb 427 11/04/2013 16:40:02 428 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo 04. O que fez com que a Comunicação Total não conseguisse atingir o desenvolvimento dos surdos por completo? 05. No oralismo, por que os sinais não são aceitos? Reflexão Depois dos estudos realizados, é importante pensar que, sendo a comunicação a base dos relacionamentos entre as pessoas, a língua de sinais ter adquirido caráter de língua auxiliou muito no desenvolvi- mento das pessoas surdas, pois existe uma formalização na comunica- ção. Veremos, nos próximos capítulos, como a legislação auxiliou no processo para as línguas orais e de sinais conviverem harmonicamente no mesmo espaço. LeiturasUrecomenUaUas BRITO,F. Por uma gramática das línguas de sinais. Rio de Janei- ro: Tempo Brasileiro, 1995. Disponível em: http://www.ines.org.br/ ines_livros/FASC7_INTRO.HTM LODI,A.C. Plurilingüismo e surdez: uma leitura bakhtiniana da história da educação dos surdos. Disponível em http://www.scielo.br/ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022005000300006&lng= pt&nrm=iso GF_3.2_2013-2.indb 428 11/04/2013 16:40:02 429 Comunicação,Línguas Orais e de Sinais – Unidade 3 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo Referências FARIA, S.P. Metáfora na LSB: debaixo dos panos ou a um palmo do nosso nariz? Educação Temática Digital, Campinas, v.7, n.2, p178- 198, jun. 2006. FELIPE, T. LIBRAS em contexto. MEC, SEESP: Brasília, 2006. SACKS, O. Vendo vozes. São Paulo: Cia. das Letras, 1998. NaUpróximaUuniUaUeU Na próxima unidade, estudaremos as diferentes filosofias da comu- nicação na área da surdez. Entenderemos como atualmente se dá a edu- cação bilíngue, que mostra o surdo com uma pessoa que tem a língua de sinais como língua materna e o português como segunda língua. GF_3.2_2013-2.indb 429 11/04/2013 16:40:02 430 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo GF_3.2_2013-2.indb 430 11/04/2013 16:40:02 U ni Ua Ue U4 U Filosofias de Comunicação: da Fala à Língua Brasileira de Sinais Sabe-se que a discussão de qual seria o melhor método ou filosofia é bastante antiga como pode- mos observar na citação de Bueno (1993,p.71) Essa polêmica tem sido analisada, até hoje, através dos méri- tos intrínsecos de cada método, que oscilam entre a constatação da dificuldade do surdo adquirir linguagem oral (defesa do gestu- alismo) e a afirmação de que a fala possibilita melhor integração social (defesa do oralismo). A escolha da abordagem educacional que privilegie a oraliza- ção ou a sinalização é muito relativa; é uma opção linguística que a família faz e está relacionada com o significado que o surdo atribui à língua de sinais e à língua oral. É essencial conhecer as diferentes pro- postas, com o intuito de compreender as posturas dos surdos e dos seus familiares. Alguns bilinguistas fazem divisões distintas quanto às correntes de comunicação. Para Behares (1993), são cinco correntes: oralismo, comu- nicação total, bimodalismo, educação bilíngue, bicultural. Já para Ferrei- ra Brito (1993), são três correntes: oralismo, comunicação total e bilin- guismo, sendo que elas podem se fundir em duas especialidades (oralista e bilíngue), já que a comunicação total está vinculada à primeira). Bueno (1998, p. 23) realizou um dos melhores enfoques sobre qual filosofia a ser adotada na educação de surdos. Ele destaca duas correntes, sendo que ambas abordam as consequências da surdez, como limitações para o desenvolvimento social ou educacional do deficiente auditivo: Somente quando nos ativermos ao fenômeno social da deficiência auditiva, considerando as restrições efetivamente impostas por uma condição intrinsecamente adversa (a surdez), aliada às condições sociais das minorias culturais, determinadas por diferenças de classe, raça e gênero, estaremos avançando no sentido de contribuir efetivamente para o acesso à cidadania, acesso esse historicamente negado, quer GF_3.2_2013-2.indb 431 11/04/2013 16:40:02 432 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo pelos defensores do oralismo, quer pelos defensores da língua de sinais, na medida em que nenhum deles conseguiu, efetivamente, desvincular-se das manifestações específicas geradas pela surdez. No Brasil, até a década de 1970, a educação para os surdos era pu- ramente oralista. Entre os anos 1970 e final de 1980, a Comunicação Total era adotada e somente no início da década de 1990 começou a ser difundi- do o bilinguismo. Chegar ao século XXI sabendo que o surdo é uma pessoa bilíngue teve uma longa e difícil trajetória, pois, de acordo com cada época da sociedade, acreditava-se em uma abordagem diferente para o surdo se de- senvolver. Essas mudanças trouxeram sérios comprometimentos para os surdos, que na sua maioria não conseguiram ser alfabetizados. Objetivos da sua aprendizagem O objetivo desta unidade é mostrar todas as abordagens que a comu- nidade surda foi submetida durante a história, para se chegar atualmente ao bilinguismo. Você se lembra? Você se lembra de alguma vez, na sua vida escolar, ter aprendido que a língua dos surdos eram os sinais? Hoje, com todas as mudanças, quantas pessoas você conhece que têm fluência na Língua Brasileira de Sinais? GF_3.2_2013-2.indb 432 11/04/2013 16:40:02 433 Filosofias de Comunicação: da Fala à Língua Brasileira de Sinais– Unidade 4 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo 4.UU Oralismo Essa corrente metodológica foi precursora na educação dos surdos no mundo. A crítica central a esse método é que ele enfatiza que somente depois da aquisição da língua oral os surdos seriam capazes de se desen- volver, tanto social quanto academicamente. Com o Congresso de Milão, houve grande avanço e predomínio, por mais de 110 anos, da língua oral para os surdos. Silva & Favorito (2009) relatam que foram anos que somente trouxeram atrasos no desenvolvi- mento da comunidade surda. Os fracassos das crianças no desenvolvi- mento da fala eram atribuídos à pouca estimulação ou à falha nas técnicas utilizadas, e tais fracassos comprometiam a escolarização e a profissiona- lização, que eram quase nulas. (SKLIAR, 1997; PACCINI, 2007; SILVA & FAVORITO, 2009). O oralismo tem a fala como objetivo. Para que ela se desenvolva, utiliza três procedimentos para esse aprendizado: treinamento auditivo, leitura labial e aparelho de amplificação sonora individual (AASI). Góes (1996, p.40) faz um breve resumo sobre o oralismo ao afirmar que “[...] a visão oralista se impôs, com as teses de que só a fala permite integração do surdo à vida social e de que os sinais prejudicam o desenvolvimento da linguagem, bem como a precisão das ideias”. Behares (1990) entende a educação oralista como sendo uma forma de atendimentoque busca minimizar a deficiência auditiva por meio da fala com a leitura oro-facial. Capovilla (2001, p.102) define: O método oralista objetiva levar o surdo a falar e a desenvolver competência linguística oral, o que lhe permitiria desenvolver-se emocional, social e cognitivamente do modo mais normal possível, integrando-se como um membro produtivo ao mundo dos ouvintes. Para Quadros (1997, p.21), “[...] a proposta oralista fundamenta- -se na “recuperação” da pessoa surda, chamada de deficiente auditi- va. O oralismo enfatiza a língua oral em termos terapêuticos”. Os autores citados entendem o oralismo como cura, buscam a fala como única ma- neira de inserir o surdo na sociedade e na escola. GF_3.2_2013-2.indb 433 11/04/2013 16:40:02 434 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo Dorziat (1999) define oralismo como um método que utiliza a ree- ducação auditiva para surdos, por meio da am- plificação sonora e de técnicas específicas de oralidade. Vários foram os avanços tecnoló- gicos e metodológicos ocorridos a partir da década de 1960 até chegarmos aos anos 1990. Podemos citar: Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI), intervenção precoce, computadores para auxiliar a percepção da fala (Phonator e o Visible Speech) e os implantes cocleares, porém estes beneficiaram os ganhos com relação ao déficit auditivo, mas não em relação à aquisição e ao desenvolvimento normais da linguagem pelo sur- do, como relata Capovilla (2000). Segundo Poker (2008), com o objetivo de normalizar o surdo, a abordagem oralista requer: esforço e dedicação de tempo por parte da criança e da família; a reabilitação deve começar precocemente; os de- fensores do oralismo afirmam que o uso de sinais tornará a criança “pre- guiçosa” para falar; a comunicação deverá ser na modalidade oral, sem o auxílio de sinais, gesticulações ou mesmo do alfabeto datilológico; a participação da mãe e de profissionais especializados (fonoaudiólogos e pedagogos especializados em surdez) é fundamental e o uso de AASI (aparelho de amplificação sonora individual) ou do implante coclear são importantes ou mesmo indispensáveis. 4.2UComunicaçãoUTotal Esta “filosofia” teve sua expansão no século XX, com o declínio do oralismo, que teve muitas dificuldades no processo de integração dos surdos, pois havia grandes dificuldades para essas pessoas nas esferas linguística e cognitiva, além de elas não poderem usar sua língua natu- ral, os sinais. Talvez, a contribuição mais importante da Comunicação Total tenha sido a mudança na concepção do surdo, pois, antes, o cerne da questão eram a deficiência e o deficiente; agora, estudamos a pessoa. De acordo com Ciccone (1996 apud MUNTANER, 2003, p.58), esta “[...] filosofia educacional entende o surdo como uma pessoa, e a surdez como Conexão Para melhor entender como são as técnicas para o estimulo da língua oral, assista ao filme “Seu nome é Jonas”, nele são mostrados as terapias e a busca das famílias pela melhor abordagem a ser escolhida para educar os surdos. Mes- mo sendo um filme antigo mostra com precisão o Oralismo. GF_3.2_2013-2.indb 434 11/04/2013 16:40:02 435 Filosofias de Comunicação: da Fala à Língua Brasileira de Sinais– Unidade 4 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo uma marca, cujos efeitos adquirem, inclusive, as características de um fenômeno com significações sociais”. De acordo com a Comunicação Total, é possível utilizar todos os meios disponíveis para se contemplar uma comunicação com o surdo. Ao focalizar a comunicação, independentemente do recurso utilizado, a aprendizagem da língua oral é privilegiada, mas também é aceita a utiliza- ção de qualquer recurso visuoespacial, inclusive o uso de sinais e gestos para favorecer o desenvolvimento cognitivo, emocional, social e comuni- cativo da pessoa surda. Dentro dessa perspectiva é permitido, na comuni- cação com o surdo, o uso de desenho, escrita, pantomima, sinais, fala oral, alfabeto manual, gestos, entre outros (SILVA & FAVORITO, 2009). Um dos defensores da Comunicação Total, Oliveira (2004, p.12) lembra que o maior mérito dessa filosofia foi: [...] deslocar a língua oral como o grande objetivo na educação de sujeitos com surdez, priorizando a comunicação dos mesmos. O sujeito com surdez deixa de ser visto como portador de uma “pato- logia”, e passa a ser considerado como uma pessoa capaz. vl aD im ir m uc ib ab ic / Dr ea m St im e. co m Ciccone (1990) observa que essa filosofia de comunicação não pode transformar o uso de sinais em um mero suporte para aprender o português. Isso porque a utilização simultânea da língua oral e a de sinais produziria o que chamamos de “português sinalizado”. A fusão das duas línguas é inviável, pois possuem estruturas gramaticais distintas, o que dificulta o aprendizado do surdo. Porém, para alguns defensores dessa filosofia, a fusão é positiva porque: GF_3.2_2013-2.indb 435 11/04/2013 16:40:04 436 Libras Pr o ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo [...] afirmam que o bimoda- lismo deve ser praticado porque noventa por cento dos surdos são filhos de ou- vintes. Assim, o uso de uma lín- gua oral normal- mente é a esco- lhida para que os membros da família comuniquem-se entre si. Por esta razão, o uso da língua oral e de uma forma manual dessa língua pode constituir-se em uma eficiente prática comunicativa. (CICCONE, 1996, p.71) Para Quadros (1997), esse tipo de sistema é inadequado, pois des- considera a estrutura linguística da língua de sinais e desestrutura o por- tuguês. Um dos recursos utilizados pela filosofia em questão é a soletração digital, que existe há mais de 300 anos e representa as letras do alfabeto e os números. Para Freeman, Carbin e Boese (1999,p.171): A Comunicação Total implica em que a criança com surdez con- gênita seja introduzida precocemente em um sistema de símbolos expressivos e receptivos, os quais ela aprenderá a manipular livre- mente e por meio dos quais poderá abstrair significados ao interagir irrestritamente com outras pessoas. A Comunicação Total inclui todo o espectro dos modos linguísticos: gestos criados pelas crian- ças, língua de sinais, fala, leitura oro-facial, alfabeto manual, leitura e escrita [...]incorpora o desenvolvimento de quaisquer restos de audição para a melhoria das habilidades de fala ou de leitura oro- facial, através [...] de aparelhos auditivos individuais e/ou sistemas de alta fidelidade para amplificação em grupo. Conexão O bimodalismo consiste no uso dos sinais na estrutura gramatical da língua oral, sem respeitar as especificidades linguísticas da língua de sinais. Compreendemos que uma tradução termo a termo de uma língua para outra resulta em conflitos na compreensão da mensa- gem e, por esse motivo, houve críticas à Comunicação Total referentes a uma comunicação mais comprometida com a comunidade ouvinte do que com os surdos. No entanto, os defensores dessa “filosofia” acreditam que essa é a melhor forma para atenuar os obstáculos presentes na comunicação entre surdos e ouvintes (POKER, 2008). GF_3.2_2013-2.indb 436 11/04/2013 16:40:04 437 Filosofias de Comunicação: da Fala à Língua Brasileira de Sinais– Unidade 4 E A D -1 3 -G F 3 .2 – P ro ib id a a re p ro d u çã o – © U n iS E B I n te ra ti vo bi ll yF ot o / D re am St im e. co m Pantomina Quanto às críticas ao bimodalismo, elas devem ser feitas, desde que se considerem a evolução e a história da educação dessas pessoas surdas e dos profissionais que atuam com elas. A comunicação total talvez não tenha atingido seus objetivos, por- que a criança/pessoa com deficiência auditiva exposta a essa filosofia educacional não consegue adquirir uma ampla compreensão ou da língua falada ou da língua dos sinais, o que dificulta seu desenvolvimento
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