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Termodinamica_PARA LICENCIATURA (1)

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TERMODINÂMICA
para Licenciatura,
Um Roteiro
Wilson Hugo C. Freire
T1 < T2
1 2
Q
2019
Copyright c©2019 Editora L. F.
1
a Edição
Direção Editorial: J. R.
Digitação, Diagramação, Figuras: Felipe Cavalcante da Rocha.
Capa: L. F.
Revisão: Job Saraiva Furtado Neto.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Freire, Wilson Hugo C.
Termodinâmica para Licenciatura, um Roteiro / Wilson
Hugo C. Freire. - São Paulo: Editora LFLFLFLFLFLFLFLFLF,
2019.
Bibliografia.
ISBN:
1.Termodinâmica para Licenciatura, Um Roteiro I. Título
XX.XXXX CDD-536.7
Índices para catálogo sistemático:
1.Termodinâmica: Física 536.7
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra poderá ser repro-
duzida sejam quais forem os meios empregados sem a permissão da editora.
Aos infratores aplicam-se as sanções previstas nos artigos 102, 104, 106 e 107
da lei n. 9.610, de 19 de fevereiro de 1988.
Editora L. F.
www.xxxxxxxxxx.com.br
Para Vito e Vivi.
Para Cicera Nunes.
E para Minha Mãe.
Apresentação
Estas notas foram escritas com base em minha experiência na disci-
plina de Termodinâmica no curso de Física da Universidade Regional
do Cariri. Os pré-requisitos são essencialmente dois semestres de Fí-
sica Geral e de Cálculo.
O conteúdo é padrão, indicado pelos seus quatro capítulos: 1. Siste-
mas Termodinâmicos, 2. Primeira Lei da Termodinâmica, 3. Entropia
e Segunda Lei, 4. Máquinas e Segunda Lei. O texto é curto e des-
pretensioso e reflete meu desejo de compartilhar minha experiência
didática.
Não farei aqui longas observações pois o próprio texto, conciso, “fala
por si mesmo". Destaco apenas que, considerando o fato de ser a irre-
versibilidade uma característica fundamental de fenômenos macros-
cópicos, a segunda lei é apresentada inicialmente na forma entrópica
(Capítulo 3). Versões tradicionais da segunda lei (Clausius, Kelvin-
Planck) e outros desenvolvimentos são apresentados no Capítulo 4.
Vários ex-alunos me ajudaram com suas observações durante as aulas
e agradeço a eles por isso. Particularmente agradeço à Alan Costa,
Daniela Leite, Marciano Medeiros, Otacílio Vilar, Rosiel Sampaio e
iii
iv TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
Rubbens Anttonio. Agradeço também ao Ítalo Nelson, ex-aluno e
agora professor do IFBA-Barreiros, pelos comentários nas versões ini-
ciais. E, por fim, agradeço ao Departamento de Física da Universi-
dade Regional do Cariri do qual faço parte desde 2010.
Peço aos leitores que me relatem erros e falhas que encontrarem no
texto para futuras correções. Ficarei muito grato.
O Autor
wilson.hugo@urca.br
Agradecimentos Especiais
Sou muito grato a várias pessoas que de alguma forma contribuíram
para minha formação acadêmica. Registro agradecimentos especiais
aos meus professores de graduação em Física da UFPB (finalizada em
1993), em particular Antonio de Andrade e Silva, Maria Espíndola,
Inácio Pedrosa, Oslim Espíndola (in memoriam), Júlio Teixeira (in
memoriam) e Abdoral Souza (in memoriam). Agradeço também aos
professores da pós-graduação em Física da UFPB onde cursei mes-
trado (1997-1999) e doutorado (2001-2004), em especial aos Professo-
res Rubens Freire, Valdir Bezerra, Dionísio Bazeia, Carlos Romero e
Pedro Christiano.
Aprendi muitas coisas com colegas da graduação e da pós-graduação,
atualmente professores. Agradeço a eles, em especial aos amigos
Adriano Barros (UFCG), Sandro Guedes (UNEAL), Geusa Marques
(UFCG), Carlos Alberto Gomes de Almeida (UFPB), Francisco de
Assis de Brito (UFCG), Eduardo Passos (UFCG), Roberto Menezes
(UFPB), Josinaldo Meneses (UFRN), Télio Leite (UNIVASF) e Ales-
sandro Lúcio.
Quero deixar registrado também um agradecimento especial a duas
pessoas que não estão mais aqui mas cuja amizade e convivência
v
vi TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
me foram indispensáveis, pelo caráter humano e profissional e pelo
espírito coletivo. Uma delas, colega de departamento, é a Joelma
Monteiro. A outra é o meu querido amigo Severino Cirino de Lima
Neto (UNIVASF) cuja amizade vinha desde meados dos anos de 1980.
Registro um agradecimento especial a Universidade Regional do Ca-
riri (URCA) e, em particular, aos colegas do Departamento de Física
especialmente aos amigos Eduardo Sousa, Augusto Nobre, Júlio Bas-
tos, Cláudio Dantas e Mickel Ponte (que esteve na URCA no período
2011-2014).
Registro agradecimentos especiais também ao amigo Mario de Assis
Oliveira, do Departamento de Matemática da URCA, aos amigos Jus-
celino Silva e Job Furtado, ex-alunos e hoje professores da UFCA. O
Job me presenteou com a revisão do texto e o prefácio logo adiante.
Agradeço também a Professora Sônia Guimarães, do Instituto Tecno-
lógico da Aeronáutica (ITA), pelas observações e correções advindas
de sua leitura atenta do texto.
Faço um agradecimento muito especial ao parceiro Felipe Cavalcante
da Rocha (UFCA) que pacientemente fez as figuras e realizou toda a
formatação deste texto no LaTeX e também me ensinou a fazê-las.
Por fim registro um agradecimento especial ao ex-Presidente Luiz
Inácio Lula da Silva pelo seu legado democrático, de inclusão social
e de expansão do ensino superior e técnico no período 2003-2010.
O Autor
Prefácio
por Job Saraiva Furtado Neto - UFCA
A termodinâmica enquanto ciência teve seu desenvolvimento a par-
tir da primeira metade do século XIX. Os trabalhos de Joule e Mayer
acerca do equivalente mecânico do calor bem como os trabalhos de
Carnot sobre máquinas térmicas impulsionaram a revolução indus-
trial e levaram Clausius e Kelvin a formularem, independentemente,
a primeira e a segunda lei da termodinâmica. Desde então uma sé-
rie de textos sobre termodinâmica têm sido publicados, tanto com
fins de desenvolvimento da ciência em si, que ainda é um campo de
pesquisa extremamente ativo, quanto com fins didáticos. Os livros
didáticos que tratam sobre termodinâmica são muitos, inclusive em
língua portuguesa excelentes livros estão disponíveis. Então por quê
mais um livro de termodinâmica?
Este livro apresenta os tópicos base da termodinâmica de uma ma-
neira praticamente auto-contida. A forma como o conteúdo é abor-
dada, apresentando a formulação entrópica da segunda lei para só
então falar sobre máquinas térmicas e sobre os enunciados de Clau-
sius e Kelvin, é particularmente interessante além de ser uma forma
não comumente tratada em livros texto. Focando em aspectos teó-
vii
viii TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
ricos da termodinâmica, sem deixar de lado a motivação fenomeno-
lógica, o livro adota uma abordagem estritamente macroscópica mas
apresenta a conexão com a mecânica estatística sempre que neces-
sário. Detalhes matemáticos e um pouco de rigor, que muitas ve-
zes passam despercebidos em estudos iniciais, são aqui explicitados.
Exercícios e exemplos resolvidos estão presentes durante todo o livro,
visando propiciar uma aprendizagem significativa e um amadureci-
mento dos alunos em relação ao estudo da termodinâmica. Além
disso, demonstrações frequentemente omitidas são aqui apresenta-
das. Dito isto, acredito que este livro tem muito a contribuir.
O capítulo 1 aborda de maneira muito clara o escopo da termodinâ-
mica enquanto uma ciência que estuda fenômenos macroscópicos e
que desenvolveu-se originalmente de maneira inteiramente não axio-
mática. Definindo os aspectos fundamentais acerca dos sistemas ter-
modinâmicos, este capítulo aborda o equilíbrio térmico e o equilíbrio
termodinâmico e discute a equação de estado para alguns sistemas
de interesse. São apresentadas também as noções de expansibilidade
e compressibilidade.
O capítulo 2 aborda inicialmente os diversos tipos de processos ter-
modinâmicos e, de maneira formal, os conceitos de trabalho e ca-
lor num processo termodinâmico. Em seguida são apresentadas a
primeira lei da termodinâmica, as capacidades térmicas principais e
vários exemplos para ajudar a elucidar os tópicos em questão.
Já o capítulo 3 versa primordialmente sobre a segunda lei da termo-
dinâmica e oconceito de entropia. Este capítulo é particularmente
interessante uma vez que a segunda lei da termodinâmica é apresen-
tada em sua versão entrópica. Sem se exceder no rigor matemático
este capítulo contém uma seção sobre diferenciais, apresentando a
linguagem para um melhor entendimento das funções termodinâmi-
cas e, em particular, da entropia como funções de estado. A interpre-
tação física acerca da ideia de entropia é discutida ao longo de todo
o capítulo para que, ao final deste, seja destacada a conexão entre
entropia e irreversibilidade.
Por fim, o capítulo 4 discute a segunda lei da termodinâmica nas
ix
formulações de Clausius e Kelvin bem como o conceito de máquinas
térmicas. Em conexão com o capítulo 3 são mostradas a equivalência
entre as formulações entrópica, de Clausius e de Kelvin da segunda
lei. É discutido também o teorema de Carnot e a universalidade da
escala de temperatura Kelvin. E ao final do capítulo há uma pequena
apresentação da terceira lei da termodinâmica.
Não tive a honra de ser aluno do professor Wilson Hugo no curso
de termodinâmica, somente nos cursos de Física I e Mecânica Ana-
lítica. Contudo acompanhei de perto o desenvolvimento deste livro
durante conversas agradáveis com o autor em cafés pela cidade. Um
belíssimo material que certamente contribuirá bastante para a forma-
ção daqueles que almejam estudar termodinâmica. Desejo a todos
uma ótima leitura.
Juazeiro do Norte - CE, 13 de Janeiro de 2019.
Job Furtado.
Sumário
1 Sistemas Termodinâmicos 3
1.1 Escopo da Termodinâmica . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
1.2 Equilíbrio Térmico, Temperatura . . . . . . . . . . . . . 5
1.3 Equilíbrio Termodinâmico, Equações de Estado . . . . 9
1.4 Coeficientes Experimentais, Manipulações Matemáticas 14
1.5 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
2 Primeira Lei da Termodinâmica 23
2.1 Processos Termodinâmicos . . . . . . . . . . . . . . . . 23
2.2 Trabalho e Calor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
2.3 A Primeira Lei . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
2.4 Capacidades Térmicas Principais . . . . . . . . . . . . . 40
2.5 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
3 Entropia e Segunda Lei 53
3.1 Irreversibilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
3.2 Diferenciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
3.3 Entropia do Gás Ideal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
3.4 Entropia de Sistema Simples . . . . . . . . . . . . . . . 64
3.5 A Segunda Lei . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
xi
Sumário 1
3.6 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
4 Máquinas e Segunda Lei 81
4.1 Formulação de Clausius da Segunda Lei . . . . . . . . 81
4.2 Formulação de Kelvin-Planck da Segunda Lei . . . . . 87
4.3 Teorema de Carnot . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92
4.4 Complementos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
4.5 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106
Referências 109
1
Sistemas Termodinâmicos
1.1 Escopo da Termodinâmica
A Termodinâmica aborda fenômenos térmicos de uma maneira par-
ticular.
Fenômenos Térmicos envolvem tipicamente processos de aquecimento,
resfriamento, expansões e/ou compressões de sistemas materiais ma-
croscópicos, chamados sistemas termodinâmicos, tais como amostras
de sólidos ou fluidos (líquidos, gases etc.). Eles podem ser estudados
de duas diferentes maneiras:
Abordagem Microscópica. Esta considera a estrutura atômico-molecular
da matéria. Ela foi introduzida na segunda metade do século XIX por
Ludwig Boltzmann e é conhecida como Teoria Cinética da Matéria ou,
mais geralmente, Mecânica Estatística. Nesta abordagem não se leva em
conta o movimento individual de cada partícula mas o efeito coletivo do
movimento das muitíssimas partículas do sistema em consideração,
usualmente cerca de 1024 partículas!
Abordagem Macroscópica, o enfoque da Termodinâmica. Nesta aborda-
gem os corpos materiais macroscópicos são considerados sem se fazer
referência a sua estrutura atômico-molecular e são tratados como (se
3
4 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
fossem) sistemas contínuos1.
Enfim, a abordagem da Termodinâmica é macroscópica embora, por
razões didáticas e para possibilitar uma visão mais panorâmica, even-
tualmente comentamos algo de caráter microscópico. Além do mais
o enfoque que vamos adotar é fenomenológico, diferentemente de
enfoques estritamente axiomáticos2.
Sistemas Termodinâmicos. Corpos materiais macroscópicos, quer sejam
simples ou de um único componente homogêneo quer sejam compos-
tos com vários componentes separados por paredes apropriadas, são
genericamente chamados de sistemas termodinâmicos. O ambiente ou
meio externo a um sistema termodinâmico (ou o “resto" do universo)
constitui a vizinhança deste sistema. Em termos práticos considera-se
como vizinhança a parte externa ao sistema que pode exercer algum
tipo de influência sobre ele. Um exemplo bastante ilustrativo de sis-
tema termodinâmico é um gás contido num recipiente munido de
uma parede rígida, êmbolo ou pistão, que pode deslizar com atrito
desprezível; este sistema pode estar em contato com um aquecedor
recebendo calor deste (o conceito de calor é abordado no próximo ca-
pítulo) e pode exercer uma pressão mecânica sobre um “peso externo"
através do pistão e, assim, realizar trabalho; veja Fig. 1.1. Dessa forma
o aquecedor e o peso externo constituem a vizinhança do sistema-gás
e podem ser genericamente chamados, respectivamente, de reserva-
tório térmico e reservatório mecânico.
1A Mecânica Estatística “se conecta" com a Termodinâmica (axiomática) num nível
fundamental. Num certo sentido ela antecede a Termodinâmica na medida
em que, a partir de informações acerca das interações (a nível microscópico)
entre as partículas do sistema, fornece relações fundamentais que possibilitam
o cálculo de parâmetros de interesse experimental do sistema termodinâmico
em foco; detalhes em textos avançados como, por exemplo, Thermodynamics and
Introduction to Thermostatistics, H. Callen, Second Edition, John Wiley and Sons,
1985.
2A referência da nota de rodapé anterior adota enfoque axiomático.
CAPÍTULO 1. SISTEMAS TERMODINÂMICOS 5
Gás
Reservatório Térmico
Reservatório Mecânico
Parede Móvel (Pistão)
Figura 1.1: Sistema: Gás num recipiente. Vizinhança: Reservató-
rio térmico (ou de calor) e reservatório mecânico (ou de
trabalho).
1.2 Equilíbrio Térmico, Temperatura
Uma definição prático-operacional de uma quantidade física envolve
basicamente duas coisas:
A) uma noção ou uma idéia intuitiva e
B) uma medida.
Por exemplo, o conceito de força na Mecânica Newtoniana envolveA)
a idéia de puxar, empurrar, interagir por atração ou repulsão etc. e
B) uma unidade de medida, como o newton N, que pode ser definida
usando um instrumento apropriado chamado dinamômetro (vide Fí-
sica Básica 1).
No caso da temperatura temos:
A) Noção Intuitiva. Através do tato podemos notar quando um corpo (sis-
tema) Q está mais quente do que outro F : neste caso dizemos que Q possui
temperatura maior do que a de F . Assim, a temperatura de um sistema cor-
6 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
responde ao “grau de quentura" que o sistema possui. Esta noção intuitiva
de temperatura é notadamente uma idéia incompleta: o que signi-
fica “grau de quentura"? Algo que possamos avaliar com nosso tato?
Bem, notemos que o nosso tato é muito limitado para avaliar tempe-
ratura: se colocarmos a mão direita numa amostra de água quente e
a esquerda numa de água fria e depois mergulharmos as duas mãos
numa amostra de água morna, esta parecerá fria para a mão direita e
quente para a esquerda. Enfim, para que a idéia de temperatura te-
nha significado prático-operacional devemos definir uma medida de
temperatura.
B) A Medida da Temperatura de um sistema pode ser feita com um ins-
trumento chamado termômetro. Mas há uma questão delicada aqui:
o que sustenta o fato de podermos medir temperatura?Isto não é
tão simples quanto possa parecer. Indo “direto ao ponto" a medida
da temperatura é fundamentada pela chamada lei zero da Termodi-
nâmica que, curiosamente, foi formulada bem depois da primeira,
da segunda e da terceira leis. Não faremos aqui uma apresentação
detalhada da lei zero3. Sua formulação se baseia no conceito de equi-
líbrio térmico entre dois sistemas em contato: este corresponde ao
estado que eles atingem quando certas quantidades macroscópicas
(por exemplo, volume, pressão etc.) de cada sistema não variam mais
com o passar do tempo desde que não haja interferência externa.
Com isto a lei zero diz que dois sistemas estão em equilíbrio térmico
se cada um deles, separadamente, estiver em equilíbrio térmico com
um terceiro sistema. Assim, quando vários sistemas estão em equilí-
brio térmico associamos uma propriedade comum a eles: todos têm
a mesma temperatura.
Podemos construir um termômetro na escala Celsius escolhendo como
sistema termométrico um pequeno tubo fino de vidro com um bulbo
contendo mercúrio de modo que a temperatura será indicada pela
altura da coluna de mercúrio no tubo; demarcam-se no tubo dois va-
lores de referência: 0 e 100 para as temperaturas do gelo derretendo e
3Veja, por exemplo, Calor e Termodinâmica, M. Zemanski, Quinta Edição, Editora
Guanabara Koogan, 1978; ou Equilibrium Thermodynamics, C. Adkins, Third Edi-
tion, Cambridge University Press, 1983.
CAPÍTULO 1. SISTEMAS TERMODINÂMICOS 7
da água fervente, respectivamente, quando colocados separadamente
em contato com o sistema termométrico sob pressão atmosférica pa-
drão ∼ 105N/m2. Por fim, demarcam-se 100 subdivisões idênticas
cada qual correspondendo a variação de 1 grau: temos, dessa forma,
um termômetro na escala Celcius. Não entraremos em detalhes a res-
peito da escolha do sistema termométrico, do critério de demarcação,
da quantidade de pontos fixos de referência etc.
Uma outra escala de temperatura é a Fahrenheit, cuja relação com a
escala de Celsius é dada por
TF =
9
5
TC + 32,
detalhes à parte. Notemos a presença de uma parcela aditiva nesta
relação, diferentemente de outras medidas físicas cujas mudanças de
unidades se dão via somente fatores multiplicativos. Esta parcela adi-
tiva pode trazer inconvenientes. Por exemplo não podemos dizer que
200C significa uma temperatura correspondente ao dobro de 100C,
diferentemente do fato de que uma barra de 20 m possui o dobro do
comprimento de uma barra de 10 m. Com efeito, notemos que 100C
= 500F e 200C = 680F e 68 não é o dobro de 50.
Além do mais uma escala definida num termômetro de mercúrio e
uma definida num de álcool podem fornecer valores numéricos dife-
rentes para a temperatura de um dado sistema. Enfim, estas escalas
também possuem limitações.
Entretanto há uma importante escala de temperatura conhecida como
escala de Kelvin ou escala absoluta que é baseada num comporta-
mento universal da matéria conforme veremos no Capítulo 4. Por
enquanto, vamos considerar o seguinte fato experimental: laborató-
rios de sistemas em baixas temperaturas apontam a existência de um
limite inferior para temperatura que é cerca de −2730C. Na escala ab-
soluta esta temperatura corresponde à 0 K, o chamado zero absoluto,
e a relação (aproximada) desta escala com a Celsius é dada por
T = TC + 273.
8 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
Nesta escala temos sempre4 T > 0K. Estudos apontam para a inatin-
gibilidade do zero absoluto, o que constitui uma versão da chamada
terceira lei da Termodinâmica conforme veremos no final do Capítulo
4. Frizemos que na escala Kelvin escrevemos, por exemplo, T = 300
K e não T = 3000K.
Equilíbrio Térmico de Um Sistema. Um sistema está em equilíbrio tér-
mico quando todas as suas partes estão em equilíbrio térmico umas
com as outras, ou seja, quando sua temperatura tem o mesmo valor
para todas as suas partes: isto quer dizer que, no equilíbrio térmico, a
temperatura do sistema está bem definida.
Como vimos, para definir escalas de medida de temperatura basta
considerar uma abordagem macroscópica (estritamente termodinâ-
mica) que é operacionalmente direta do ponto de vista experimen-
tal (equilíbrio térmico, lei zero etc.). Vale salientar que o conceito
de pressão foi definido na Mecânica Newtoniana num contexto ma-
croscópico: força distribuída sobre uma superfície de um corpo por
unidade de área desta superfície.
Todavia há um “link" entre a Termodinâmica (macroscópica) e a Me-
cânica Estatística (microscópica): em nível microscópico a tempera-
tura de um gás, por exemplo, tem a ver com a velocidade média das
suas moléculas em relação ao centro de massa e a pressão do gás têm
a ver com as colisões das moléculas com as paredes do recipiente.
Mas... temperatura pode ser definida a partir de grandezas mecâni-
cas? Poderíamos reduzir a Termodinâmica à Mecânica? Bem, existe
a Mecânica Estatística mas isto não quer dizer que se possa fazer um
tal reducionismo: a análise mecânico-estatística foca no efeito coletivo
do movimento das moléculas. Sobre estas questões destacamos o que
diz o livro Física Básica - Mecânica, Alaor Chaves - LAB/LTC 2007,
nas págs. 227-228: “A discussão sobre o caráter dessa nova grandeza
(temperatura) ainda não levou a um consenso... temos que aceitar a
possibilidade de que o reducionismo seja um programa irrealizável,
4Há discussões sobre temperaturas negativas; vide, por exemplo, referência da
primeira nota de rodapé deste capítulo.
CAPÍTULO 1. SISTEMAS TERMODINÂMICOS 9
não por razões práticas, mas por razões fundamentais."
Exercício 1.
Temperatura é um conceito microscópico ou macroscópico? É
adequado se atribuir uma temperatura para um sistema de três
partículas? Pode ser atribuída uma temperatura ao vácuo (sis-
tema de “zero partículas")?
Exercício 2.
Mais quente significa temperatura maior ou trata-se de uma con-
venção? Observação: Celsius atribuiu 00C ao ponto de vaporiza-
ção e 1000C ao ponto de congelamento da água.
Exercício 3.
Encontre a temperatura para a qual os valores numéricos nas es-
calas Celsius e Fahrenreit coincidem. Idem para as escalas Kelvin
e Fahrenreit.
Resposta: −400C = −400F e 5740F = 574 K.
1.3 Equilíbrio Termodinâmico, Equações de
Estado
Um sistema se encontra num estado de equilíbrio termodinâmico se ele
possui valores bem definidos de seus parâmetros macroscópicos tais
como volume, pressão, temperatura, densidade, massa etc. O equi-
líbrio termodinâmico é uma situação idealizada; na prática há flu-
tuações mas, mediante controle experimental, o sistema pode estar
suficientemente próximo do equilíbrio. Quantos e quais parâmetros
10 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
são requeridos para caracterizar este estado? Depende do sistema.
Por exemplo, no caso de um sistema sólido, líquido ou gasoso de um
único componente homogêneo e com massa fixa, chamado sistema
simples5, o estado de equilíbrio termodinâmico pode ser especificado
pelo volume V, pela pressão P e pela temperatura T. Quando um sis-
tema atinge o estado de equilíbrio termodinâmico então, na ausência
de fatores externos, suas coordenadas termodinâmicas (P, V, T) não
mudam com o tempo. Assim, no equilíbrio termodinâmico, o sistema
deve estar em equilíbrio térmico (T bem definida), em equilíbrio mecâ-
nico (V e P bem definidos) e quimicamente inerte (não sofrer reações
químicas).
Por outro lado, sob controle experimental adequado, podemos ter um
processo suficientemente lento (quase-estático) em que um sistema
passa por uma “sucessão contínua" de estados de (quase-)equilíbrio,
conforme abordaremos no Capítulo 2.
Equação de Estado. Mais ainda, o estado de equilíbrio termodinâ-
mico de um sistema simples pode ser representado por qualquer par
(P, V), (P, T) ou (V, T) tendo em vista que o valor do terceiro pa-
râmetro está relacionado com os outros dois por intermédio de uma
relação experimental da forma
f (P, V, T) = 0 (1.1)
chamada equação de estado do sistema. Cada sistema possui sua própria
equação de estado mas todos os gases em baixa densidade (comparada,
por exemplo,com a atmosfera padrão) possuem aproximadamente a
mesma forma da equação de estado conforme apresentaremos adi-
ante.
Sólidos e Líquidos. Um sistema sólido ou líquido homogêneo e isotró-
5Vamos supor também que a influência de campos gravitacionais, eletromagnéti-
cos etc. sobre os sistemas termodinâmicos em consideração seja irrelevante.
CAPÍTULO 1. SISTEMAS TERMODINÂMICOS 11
pico6 tem, aproximadamente, a seguinte equação de estado
V = V0[1 + α(T − T0)− κ(P− P0)] (1.2)
ou, na forma (1.1),
f (P, V, T) ≡ V −V0[1 + α(T − T0)− κ(P− P0)] = 0
onde V0 é um parâmetro do sistema que corresponde ao seu vo-
lume na temperatura T0 e na pressão P0. Os parâmetros α e κ são
constantes características da substância material e são chamados, res-
pectivamente, de coeficiente de dilatação (expansibilidade) térmica e
coeficiente de compressão (compressibilidade) isotérmica da referida
substância. Mais adiante definiremos estes dois parâmetros de uma
forma geral válida para sólidos, líquidos e também para gases.
No caso em que o sistema sólido ou líquido sofre um processo que se
inicia no estado de equilíbrio (P0, T0) e termina no estado (P, T) sob
pressão constante P = P0 temos, pela Eq. 1.2,
V −V0 = αV0(T − T0), ou seja, ∆V = αV0∆T, (1.3)
que é a expressão que descreve (aproximadamente) a dilatação tér-
mica volumétrica de um sólido ou líquido.
Exercício 4.
Um sistema sólido (homogêneo e isotrópico) de massa M, cujo
material possui densidade ρ0 na temperatura T0 tem sua tempe-
ratura aumentada para T0 + ∆T, sob pressão constante P = P0.
Considerando a equação de estado aproximada,
V = V0[1 + α(T − T0)− κ(P− P0)],
6Homogêneo = mesma densidade em todas as partes do sistema; isotrópico = as
propriedades físicas do sistema não dependem da direção espacial.
12 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
a) o que acontece com a massa do sistema neste processo?
b) qual a densidade ρ do sólido na temperatura T0 + ∆T em fun-
ção de ρ0, α e ∆T? A densidade aumentou, diminuiu ou não se
alterou?
Resposta: b) ρ = ρ0/[1 + α∆T], diminuiu.
Gás Ideal. Qualquer gás muito diluído ou rarefeito, ou seja, em baixís-
sima densidade (quando comparada, por exemplo, com a da atmos-
fera padrão, em ≈ 273 K e ≈ 105 N/m2), tem equação de estado da
forma
f (P, V, T) ≡ PV − nRT = 0 ou PV = nRT (1.4)
onde n é o número de mols do gás7, R ≈ 8.3 J/mol·K é a constante
universal dos gases e T é a temperatura absoluta. A Eq. (1.4) é cha-
mada equação de estado do gás ideal (Clapeyron, 1834) e de acordo
com ela temos que
PV =
M
M0
RT =
ρV
M0
RT ∴ ρ =
M0
R
· P
T
.
Assim uma situação de baixa densidade pode ser realizada pondo o
gás sob baixa pressão e alta temperatura, usualmente temperaturas
acima de 273 K e pressões abaixo de 105 N/m2.
Exercício 5.
Calcule a pressão P de 0, 5 mol de gás ideal à 270C dentro de um
recipiente com capacidade de 500 l. Dado: a constante dos gases
ideais é R ≈ 8, 3 J/K.mol. Você considera esta pressão muito alta?
71 mol de gás é uma amostra de Na = 6, 02× 1023 moléculas do gás (Na é chamado
número de Avogadro). Assim o número de mols de um gás com N moléculas é
n = N/Na = M/M0 onde M é a massa do gás e M0 é a massa de 1 mol do gás
(que é numericamente a massa de uma molécula do gás em unidades de massa
atômica “u.m.a.", mas substituindo u.m.a. por grama). 1 u.m.a.=1/12 de um
átomo de Carbono.
CAPÍTULO 1. SISTEMAS TERMODINÂMICOS 13
Compare com a pressão atmosférica padrão P ≈ 105 N/m2.
Resposta: P = 2, 5× 103 N/m2.
Exercício 6.
Um gás ideal de massa fixa está inicialmente no estado de equi-
líbrio designado por (Pi, Vi, 270C). Após algum processo o gás
vai para um novo estado de equilíbrio (Pf , Vf , 1270C) em que seu
volume fica reduzido em 1/3 do volume inicial. Qual a nova
pressão Pf em função da pressão de equilíbrio inicial Pi?
Resposta: Pf = 4Pi.
Gás de Clausius. Em algumas situações, para um gás “menos diluido",
a equação de estado mais adequada é a equação de Clausius (meados
do séc. XIX)
P(V − nβ) = nRT
onde β depende do tipo de gás. Em nível microscópico isto cor-
responde a um gás onde as moléculas estão “menos distantes" e o
volume efetivo disponível ao gás torna-se um pouco menor: Ve f f =
V − nβ < V.
Gás de Van der Waals. Para gases “mais densos" temos a equação de
Van der Waals (1873)[
P + γ
( n
V
)2]
(V − nβ) = nRT
onde γ e β são constantes características do gás; o termo adicional
γ (n/V)2 está relacionado microscopicamente com a atração entre as
moléculas decorrente da proximidade entre elas (gás denso) acarre-
tando uma pressão efetiva Pe f f = P + γ(n/V)2 maior sobre o gás.
14 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
1.4 Coeficientes Experimentais,
Manipulações Matemáticas
Coeficiente de Dilatação (Expansibilidade). Da Eq. (1.3), válida aproxi-
madamente para um sistema sólido ou líquido, temos
α =
1
V0
∆V
∆T
onde supomos pressão constante P = P0. Para um sistema termo-
dinâmico simples qualquer, sólido, líquido ou gasoso, o coeficiente de
expansão térmica é definido pela expressão geral
α =
1
V
∂V
∂T
∣∣∣∣
P
(1.5)
onde a função V = V(P, T) pode ser determinada da equação de es-
tado, f (P, V, T) = 0, do sistema em consideração. A notação ∂V/∂T|P
indica V como função de (P, T) e que, na derivada com respeito à T,
a coordenada P é tratada como se fosse constante.
Coeficiente de Compressão (Compressibilidade). Se tomarmos a equação
de estado aproximada de um sistema sólido ou líquido, Eq. (1.2), e
considerarmos um processo em que o sistema vai do estado (V0, P0)
para o estado (V, P), sob volume constante V = V0, obtemos
κ = − 1
V0
∆V
∆P
.
Para um sistema termodinâmico simples qualquer definimos o coefi-
ciente de compressão por
κ = − 1
V
∂V
∂P
∣∣∣∣
T
. (1.6)
Aqui a notação ∂V/∂P|T indica V como função de (P, T) e que, na
derivada com respeito à P, a coordenada T é tratada como se fosse
CAPÍTULO 1. SISTEMAS TERMODINÂMICOS 15
constante.
Exemplo 1.1.
Vamos calcular a expansibilidade e a compressibilidade do gás
ideal. De PV = nRT temos V(P, T) = nRT/P de modo que
α =
1
V
∂V
∂T
=
nR
VP
=
nR
nRT
=
1
T
.
Por outro lado,
κ = − 1
V
∂V
∂P
=
nRT
VP2
=
nRT
(PV)P
=
nRT
nRTP
=
1
P
.
Notemos que todos os gases em baixa densidade possuem aproxima-
damente os mesmos coeficientes de dilatação e de compressão, diferen-
temente de sólidos e líquidos.
Exercício 7.
Considere a equação de estado de um sólido ou líquido dada por
V = V0 · ea(T−T0)−b(P−P0),
em que a e b são constantes.
a) Mostre que a expansibilidade e a compressibilidade são, res-
pectivamente, dadas por α = a e κ = b.
b) Use expansão de Taylor exponencial e mostre que, se despre-
zarmos termos em a2, b2, ab, a3, b3, a2b etc., então esta equação se
reduz a forma aproximada dada por
V = V0[1 + a(T − T0)− b(P− P0)].
Observação: os valores experimentais de a e b para sólidos e líqui-
dos são tipicamente de ordem de 10−4 K−1 e 10−10 m2/N, res-
pectivamente, de modo que esta equação de estado aproximada
é aceitável em intervalos de variação de temperatura e de pressão
16 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
usuais (por exemplo, T entre 273 K e 373 K e P entre 104 N/m2 e
106 N/m2).
Exercício 8.
Considere como sistema uma amostra de certa substância com
equação de estado dada por V + aP− bT2 = c onde a, b e c são
constantes positivas. Encontre os coeficientes de expansão tér-
mica e de compressão (isotérmica) desta substância.
Resposta: α = 2bT/V = 2bT/(bT2 − aP + c);
κ = a/V = a/(bT2 − aP + c).
Manipulações Matemáticas
Conforme já abordado, a equação de estado de um sistema simples é
da forma f (V, P, T) = 0 o que define implicitamente T como função
de (V, P) ou P como função de (V, T) ou V como função de (P, T).
Vamos considerar uma situação geral onde a equação f (x, y, z) = 0
fornece x como função de (y, z) e y como função de (x, z) de modo
que
dx =
∂x
∂y
∣∣∣∣
z
dy +
∂x
∂z
∣∣∣∣
y
dz,
dy =
∂y
∂x
∣∣∣∣
z
dx +
∂y
∂z
∣∣∣∣
x
dz.
Pondo a segunda na primeira destas equações temos
dx =
∂x
∂y
∣∣∣∣
z
{
∂y
∂x
∣∣∣∣
z
dx +
∂y
∂z
∣∣∣∣
x
dz
}
+
∂x∂z
∣∣∣∣
y
dz
donde {
∂x
∂y
∣∣∣∣
z
∂y
∂x
∣∣∣∣
z
− 1
}
dx +
{
∂x
∂y
∣∣∣∣
z
∂y
∂z
∣∣∣∣
x
+
∂x
∂z
∣∣∣∣
y
}
dz = 0.
CAPÍTULO 1. SISTEMAS TERMODINÂMICOS 17
Assim, com x e z tomados como variáveis independentes, temos
∂x
∂y
∣∣∣∣
z
∂y
∂x
∣∣∣∣
z
= 1 =⇒ ∂x
∂y
∣∣∣∣
z
=
1
∂y
∂x
∣∣∣
z
, (1.7)
∂x
∂y
∣∣∣∣
z
∂y
∂z
∣∣∣∣
x
= − ∂x
∂z
∣∣∣∣
y
. (1.8)
Trocando y e z na Eq. (1.7) temos
∂x
∂z
∣∣∣∣
y
=
1
∂z
∂x
∣∣∣
y
que, pondo na Eq. (1.8), nos fornece
∂x
∂y
∣∣∣∣
z
∂y
∂z
∣∣∣∣
x
= − 1
∂z
∂x
∣∣∣
y
∴
∂x
∂y
∣∣∣∣
z
∂y
∂z
∣∣∣∣
x
∂z
∂x
∣∣∣∣
y
= −1. (1.9)
Agora pondo (x, y, z) = (V, P, T) e considerando a equação de estado,
que é da forma f (V, P, T) = 0, temos a relação termodinâmica
∂V
∂P
∣∣∣∣
T
∂P
∂T
∣∣∣∣
V
∂T
∂V
∣∣∣∣
P
= −1. (1.10)
Exemplo 1.2.
Vamos verificar a Eq. (1.10) para o gás ideal. De PV = nRT temos
∂V
∂P
∣∣∣∣
T
= −nRT
P2
,
∂P
∂T
∣∣∣∣
V
=
nR
V
,
∂T
∂V
∣∣∣∣
P
=
P
nR
,
e assim
∂V
∂P
∣∣∣∣
T
∂P
∂T
∣∣∣∣
V
∂T
∂V
∣∣∣∣
P
= −nRT
P2
nR
V
P
nR
= −PV
P2
P
V
= −1.
18 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
Exercício 9.
Usando a Eq. (1.10) mostre que a expansibilidade α e a compres-
sibilidade κ de um sistema simples se relacionam por
α
κ
=
∂P
∂T
∣∣∣∣
V
.
CAPÍTULO 1. SISTEMAS TERMODINÂMICOS 19
1.5 Exercícios
1. Considere dois sistemas A e B cada qual em equilíbrio térmico com
um termômetro M. Sejam (P, V), (PA, VA) e (PB, VB) coordenadas ter-
modinâmicas de M, A e B respectivamente. A equação que descreve
o equilíbrio térmico entre A e M é
PAVA − CPA − PV = 0, C const.,
e a que descreve o equilíbrio térmico entre B e M é
PBVB − PV
[
1 +
K
VB
]
= 0, K const.
Qual a equação que expressa o equilíbio térmico entre A e B?
Resposta: PAVA − CPA = PBVB/[1 + K/VB].
2. Hipótese de Avogadro. 1 mol de um gás qualquer ocupa, em con-
dições normais de temperatura e pressão, um volume bem definido:
Va = 22, 4 l. Usando a equação de estado do gás ideal obtenha o
valor do “volume de Avogadro" (Va). Considere T = 00C = 273 K e
P = 1, 01× 105 Nm−2 como temperatura e pressão normais. Dado:
R = 8, 31 J/mol ·K.
3. Suponha que um gás ideal está inicialmente num estado de equi-
líbrio de pressão Pi, volume Vi e temperatura (absoluta) Ti. Após
algum processo o gás passa para um novo estado de equilíbrio onde
a pressão é Pf , o volume é Vf e a temperatura é Tf . Mostre que a
massa do gás no novo estado de equilíbrio é dada por
M f =
Pf Vf
PiVi
Ti
Tf
·Mi,
onde Mi é a massa do sistema gasoso no estado de equilíbrio inicial.
20 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
Gás A Gás B
Figura 1.2: Referente ao Exercício 4.
4. Um recipiente contém dois gases diluídos (rarefeitos) A e B sepa-
rados por uma parede que pode se mover sem atrito, conforme a Fig.
1.2 a seguir. Suponha que o sistema composto está completamente
isolado mas a parede móvel entre os gases não é isolante, embora
não permita troca de matéria (ou de moléculas) entre eles. Mostre
que após o sistema composto atingir o equilíbrio termodinâmico os
volumes de equilíbrio dos gases estão relacionados por
VA
nA
=
VB
nB
.
5 Lei de Dalton. Considere uma mistura suficientemente rarefeita
(ideal) composta por n1, n2, ..., nl mols de gases 1, 2, ..., l, respectiva-
mente, todos quimicamente inertes e com a mistura em equilíbrio
termodinâmico na pressão P, na temperatura T e ocupando um vo-
lume V. Define-se a pressão parcial do j-ésimo gás como sendo a
pressão Pj que este teria se estivesse sozinho no lugar da mistura
ocupando o mesmo volume V e na mesma temperatura T. Mostre
que ∑lj=1 Pj = P.
6. Um recipiente de volume V contém um gás rarefeito mantido em
temperatura T constante. Suponha que o gás vai gradativamente es-
capando do recipiente através de um pequeno orifício e que a taxa de
variação de massa do gás, em cada instante, é proporcional a massa
que fica (instantaneamente) no recipiente. Mostre que a pressão do
CAPÍTULO 1. SISTEMAS TERMODINÂMICOS 21
gás num instante t qualquer é dada por
P(t) = P0 · e−Kt
onde P0 é a pressão inicial do gás (no instante t = 0) e K é uma
constante positiva.
7. Em física do estado sólido a equação de estado de um sólido mo-
noatômico é dada pela equação de Grüneisen
bP + g(V) = aT + c, a, b, c constantes.
a) Encontre os coeficientes de dilatação e de compressão deste mate-
rial. Sugestão: derivada de função implícita e regra da cadeia para
derivação de funções compostas.
b) Encontre também uma função g(V) e constantes a, b e c de forma
que a equação de Grüneisen possa ser escrita na forma V = V0[1 +
α(T − T0)− κ(P− P0)].
Resposta: a) α = a/[V · g′(V)], κ = b/[V · g′(V)],
b) g(V) = V, a = αV0, b = κV0, c = V0[1− αV0 + κP0].
8. Defina o coeficiente de dilatação linear de um sistema sólido (ho-
mogêneo e isotrópico) por
α1 =
1
L
∂L
∂T
∣∣∣∣
P
onde L = L(T, P) é a função comprimento de uma certa porção em
forma de cubo feita do material em consideração. Mostre que o coefi-
ciente de expansividade deste material é α = 3α1. Sugestão: Escreva
V(T, P) = [L(T, P)]3 e use a regra da cadeia para derivadas de fun-
ções compostas.
9. Considere um gás de Van der Waals cuja equação de estado é dada
22 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
por [
P +
a
V2
]
(V − b) = nRT.
Note que se tentarmos expressar V como função de (P, T) teremos
uma equação cúbica em V. Use então a regra de derivada de funções
implícitas para mostrar que, para este sistema,
a) o coeficiente de expansividade é
α(V, T) =
nRV2(V − b)
nRTV3 − 2a(V − b)2 ,
b) o coeficiente de compressibilidade é
κ(V, T) =
V2(V − b)2
nRTV3 − 2a(V − b)2 .
c) Como ficam estas expressões de α e κ para os casos a = 0 (gás de
Clausius) e a = b = 0 (gás ideal)?
10. Um certo sistema termodinâmico possui compressibilidade κ =
a/V e expansividade α = 2bT/V. Mostre que sua equação de estado
é da forma V − bT2 + aP = const.
11. Considerando a equação de estado f (V, P, T) = 0 de um sistema
na forma V = V(P, T), mostre que d(ln V) = dV/V = α(P, T)dT −
κ(P, T)dP. Usando este resultado obtenha a equação de gás ideal,
PV/T = const., a partir de seus parâmetros α = 1/T e κ = 1/P.
2
Primeira Lei da Termodinâmica
2.1 Processos Termodinâmicos
Processos ou Transformações
No capítulo anterior vimos que um estado de equilíbrio de um sis-
tema termodinâmico simples, digamos um fluido homogêneo (puro)
de massa fixa, pode ser descrito por valores bem definidos de (V, P),
(V, T) ou (P, T) tendo em vista a equação de estado f (V, P, T) = 0 do
sistema. Escolhendo (V, P) como variáveis independentes podemos
representar os estados de equilíbrio do sistema por pontos do plano
VP.
Vamos considerar agora um processo termodinâmico, ou transfor-
mação termodinâmica, em que o sistema passa de um estado de
equilíbrio inicial i = (Vi, Pi) para um estado de equilíbrio final f =
(Vf , Pf ), passando possivelmente por estados intermediários de não-
equilíbrio.
Lentos, Quase-Estáticos...
Se um processo termodinâmico for realizado com certa rapidez o sis-
tema passará por estados fora do equilíbrio. Por exemplo, considere
23
24 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
uma rápida compressão de um gás. Logo após o início desta com-
pressão, a pressão e a temperatura do gás ficarão com valores mal
definidos: a parte do gás próxima da parede compressora passa a
sofrer momentaneamente uma pressão maior do que a parte do gás
mais distante da parede etc. Entretanto, finalizada a compressão e es-
perarando um tempo de relaxação suficiente, o sistema pode atingir
um estado final de equilíbrio termodinâmico (a menos de pequenas
flutuações).
Por outro lado, processos suficientemente lentos e experimentalmente
controlados podem transcorrer passando por sucessivos estados de
(quase-)equilíbrio. Enfim, os conceitos de equilíbrio termodinâmico e
de processos quase-estáticos ou “extremamente lentos", constituem im-
portantes idealizações aproximativas. Vamos destacar:
Processo Quase-Estático. Um processo pelo qual um sistema evolui do
estado de equilíbrio i para o estado de equilíbrio f é dito ser quase-
estáticose as condições externas variam tão lentamente que a cada
instante o sistema se encontra praticamente em equilíbrio. Tal pro-
cesso é essencialmente constituído por uma sucessão de estados de
equilíbrio e pode ser representado (aproximadamente) por uma curva
no plano VP parametrizada por alguma função contínua e suficien-
temente diferenciável α(t) = (V(t), P(t)) com t ∈ [ti; t f ], vide Fig.
2.1.
P
V
i
f
Figura 2.1: Processo quase-estático.
Processos quase-estáticos podem ser revertidos? Vejamos.
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 25
Reversíveis, Irreversíveis...
Processo Reversível. Um processo termodinâmico é reversível se, uma
vez realizado, for possível fazer com que ocorra o processo inverso
de modo que o sistema e a vizinhança possam reverter sua história
no tempo. Neste caso o sistema poderia evoluir pela mesma curva no
diagrama VP no sentido invertido.
Todo processo reversível é quase-estático. Se um processo reversível não
fosse quase-estático então a sua rapidez afastaria o sistema do equi-
líbrio, o que impossibilitaria realizar sua reversão: não haveria uma
representação curvilínea deste processo no diagrama VP e, assim, não
faria sentido uma curva com orientação invertida; assim, o processo
seria irreversível e representado por no máximo dois pontos: o estado
inicial i e o estado final f , se estes forem de equilíbrio1. Considerando
a Fig. 1.1 do capítulo anterior podemos imaginar um processo quase-
estático reversível produzido lentamente por acréscimos ou retiradas
de pequenos grãos sobre a parede móvel e/ou por trocas sucessivas
do reservatório térmico por uma série de outros cada qual diferindo
do anterior por, no máximo, uma variação infinitesimal (muito pe-
quena) de temperatura. Aqui estamos supondo que não há atrito na
junção entre a parede móvel e o recipiente.
Mas nem todo processo quase-estático é reversível. Por exemplo, uma
expansão quase-estática de um gás empurrando uma parede móvel
com atrito na junção é um processo irreversível2.
Consideraremos, nestas notas, processos
(a) reversíveis (logo, quase-estáticos) e
1A princípio qualquer processo “real" (quase-estático ou não) poderia ser imagi-
nado como reversível: se filmarmos o processo e depois rodarmos o filme no
sentido invertido, do fim para o começo, veremos o que poderia ser o processo
inverso. Mas este pode não ocorrer no “mundo real" por razões fundamentais
ligadas a segunda lei da Termodinâmica, assunto do próximo capítulo.
2Mais ainda, nem todo processo quase-estático e sem atrito é reversível. Um exemplo
interessante de processo irreversível, porém quase-estático e sem atrito, é encontrado
no livro Statistical Mechanics, K. Huang, Jonh Wiley and Sons, 1987. Tal processo
envolve um gás evoluindo por uma sucessão de expansões livres infinitesimais.
Falaremos sobre a expansão livre (finita) mais adiante.
26 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
(b) certos processos irreversíveis, principalmente os que começam e
terminam em estados de equilíbrio termodinâmico.
Noção de Calor
Os processos envolvidos nos fenômenos naturais na escala macroscó-
pica são irreversíveis. Um exemplo notável é o aquecimento espon-
tâneo de um corpo (ou sistema) inicialmente frio quando em contato
com um outro inicialmente quente e o correspondente resfriamento
deste até o equilíbrio térmico de ambos. Este processo é irreversível:
não observamos, após o equilíbrio, um dos sistemas se aquecer e o
outro se resfriar espontaneamente.
Neste processo o sistema de maior temperatura transferiu, de alguma ma-
neira, energia ao de menor temperatura. Esta forma de transferência de
energia é chamada transferência de calor ou, simplesmente, calor. As-
sim o sistema de maior temperatura inicial, ao ceder calor, tem sua
temperatura diminuída e o sistema de menor temperatura inicial, ao
receber calor do primeiro, tem sua temperatura aumentada até o mo-
mento em que o equilíbrio térmico entre eles ocorre. Na próxima
seção estenderemos esta noção de calor.
2.2 Trabalho e Calor
Durante um processo termodinâmico em que um sistema de massa
fixa passa de um estado inicial i para um estado final f , podem ocor-
rer trocas de energia entre sistema e vizinhança de duas maneiras:
a) pela realização de trabalho mecânico, por exemplo na compressão
ou expansão de um gás, e/ou
b) por trocas de calor, que é uma forma não-mecânica de transmissão
de energia, ou seja, não está associada a realização de trabalho e de-
corre, em geral, de uma diferença de temperatura entre o sistema e a
vizinhança.
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 27
Calor e tabalho são possíveis formas de transferência de energia entre sistema
e vizinhança.
Calor por Condução e por Radiação
A transferência de calor pode decorrer diretamente de uma diferença
de temperatura entre sistema e vizinhança ou entre dois sistemas
(onde cada um deles é vizinhança do outro). É o que ocorre na ter-
malização espontânea de dois corpos em temperaturas iniciais dife-
rentes, descrita no final da seção anterior: esta forma de transferência
de calor é designada como calor por condução3.
Por outro lado a energia eletromagnética enviada pelo Sol e recebida
pela Terra não é transmitida por causa da diferença de temperatura
entre o Sol e a Terra. Embora haja esta diferença de temperatura,
não é ela que provoca a radiação eletromagnética: de fato, a radia-
ção eletromagnética emitida pelo Sol se propagaria pelo espaço vazio
mesmo que a Terra não existisse! Esta radiação advém de processos
que ocorrem no interior do Sol. A transmissão de radiação eletro-
magnética do Sol para Terra, não estando associada à uma pressão
mecânica, pode ser designada como calor por radiação4.
Trabalho num Processo Reversível
Quando o sistema “vai" do estado i para o estado f o trabalho reali-
zado pelo sistema e o calor por ele recebido dependem do processo
pelo qual o sistema evolui do estado i para o estado f , conforme
veremos a seguir.
Suponha que um sistema fluido simples segue um processo reversível
descrito por uma relação funcional P = P(V), com V variando de Vi
3No Exemplo 2.5 mais adiante veremos que, num processo reversível com tempe-
ratura constante de gás ideal, há transferência de calor entre o sistema-gás e a
vizinhança-reservatório embora não haja (idealmente falando) diferença de tem-
peratura entre eles pois se houvesse teríamos um processo fora do equilíbrio,
logo irreversível. Mas na prática podemos considerar, neste caso, uma diferença
de temperatura muito pequena (“infinitesimal") entre sistema e vizinhança.
4Vale salientar que todo corpo irradia de acordo com a lei de Stefan-Boltzmann,
conforme veremos na disciplina de Física Moderna.
28 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
para Vf , como ilustrado na Fig. 2.2.
Fluido
F
X
x x + dxxi x f
Figura 2.2: Processo reversível com o volume V variando de Vi (asso-
ciado à xi) para Vf (correspondente à x f ).
Então o trabalho realizado pelo sistema neste processo é dado por
W =
ˆ x f
xi
F · dx =
ˆ x f
xi
P · (A · dx) ∴ W =
ˆ Vf
Vi
P(V) · dV. (2.1)
Aqui F é a força que o sistema imprime sobre a vizinhança através da
parede móvel (pistão) e A é a área desta parede (transversal à figura).
A integral (2.1) correspondende, no diagrama VP, a “área" (mas não
em comprimento ao quadrado) sob a curva P = P(V) em [Vi; Vf ]
e, portanto, depende desta curva. Ou seja, o trabalho W depende
do “caminho" P = P(V) ou, ainda, do processo termodinâmico pelo
qual o sistema evoluiu do estado i para o estado f e não apenas destes
estados. Adotamos a convenção de que W representa o trabalho reali-
zado pelo sistema. Assim se W > 0 este trabalho foi, de fato, realizado
pelo sistema; mas se o trabalho realizado pelo sistema for negativo,
W < 0, então foi a vizinhança que realizou trabalho positivo (−W)
sobre o sistema.
No caso geral em que o processo reversível é descrito por uma curva
qualquer, suficientemente diferenciável (e possivelmente fechada), Γ =
{α(t) = (V(t), P(t)); t ∈ [ti; t f ]}, a expressão do trabalho acima
CAPÍTULO2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 29
torna-se
W =
ˆ
Γ
PdV =
ˆ t2
t1
P(t)
dV(t)
dt
dt. (2.2)
Notemos que esta é uma integral curvilínea da forma
´
Γ f (V, P)dV +
g(V, P)dP (onde f (V, P) = P e g(V, P) ≡ 0) e, portanto, é invari-
ante sob reparametrizações que preservam orientação da curva. E,
caso seja curva fechada, esta integral é invariante sob relocalização
do ponto inicial i (consulte livros de Cálculo).
Exemplo 2.1.
Calculemos o trabalho realizado por um sistema numa expansão
reversível descrita por P = aVb, a e b constantes, com b 6= −1,
V ∈ [Vi; Vf ] e Vi < Vf .
Pela Eq. (2.1),
W =
ˆ Vf
Vi
P · dV =
ˆ Vf
Vi
aVb · dV = a
b + 1
(
Vb+1f −V
b+1
i
)
.
Atenção. Nomes de 5 tipos de processos:
isovolumétrico ou isocórico = sob volume V constante;
isobárico = sob pressão P constante;
isotérmico = sob temperatura T constante;
adiabático = sem troca de calor entre sistema e vizinhança;
cíclico ou um ciclo = quando o estado inicial do sistema é igual ao
estado final, i = f .
Exercício 1.
Considere um sistema que evoluiu reversivelmente por uma trans-
formação “P-isobárica" de um volume Vi para um volume Vf .
Mostre que o trabalho realizado pelo sistema foi de W = P(Vf −
Vi).
30 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
Exercício 2.
Mostre que o trabalho realizado por um gás ideal num processo
isotérmico reversível sob temperatura T é dado por
W = nRT · ln
Vf
Vi
.
Trabalho Num Ciclo Reversível
Processos cíclicos são particularmente importantes no estudo de má-
quinas térmicas e refrigeradores, que abordaremos no Capítulo 4. Va-
mos verificar agora que, para um ciclo reversível representado no di-
agrama VP por uma curva fechada, o trabalho realizado pelo sistema
é positivo (respectivamente, negativo) se o ciclo for percorrido no
sentido horário (respectivamente, anti-horário). Considere o caso em
que o ciclo é representado por uma curva fechada simples descrita
por duas funções contínuas PA(V) > PB(V) > 0 com V ∈ (V1; V2)
tais que PA(V1) = PB(V1) e PA(V2) = PB(V2) conforme a Fig. 2.3.
V
P
V1 V2
P1
P2
PA(V)
PB(V)
Figura 2.3: Ciclo reversível.
No caso em que o sistema parte do estado inicial i = (V1, P(V1)) e
retorna a este percorrendo o sentido horário temos que o trabalho
realizado pelo sistema é dado por
W =
fi
P · dV =
ˆ V2
V1
PA · dV +
ˆ V1
V2
PB · dV
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 31
∴W =
ˆ V2
V1
PA · dV −
ˆ V2
V1
PB · dV
onde na segunda parcela trocamos V1 com V2, daí o aparecimento do
sinal negativo. Logo
W =
ˆ V2
V1
[PA − PB]dV > 0
pois PA(V) − PB(V) > 0 para todo V ∈ (V1; V2). A verificação de
que W é negativo para o caso anti-horário é análoga. Para curvas
fechadas simples mais gerais o cálculo correspondente envolve mais
matemática, mas o resultado é qualitativamente o mesmo.
Calor num Aquecimento ou Resfriamento Reversível
Um sistema pode, num dado processo, receber calor da (ou liberar
calor para a) vizinhança sem que haja alterações apreciáveis na sua
temperatura. Por exemplo, um cubo de gelo sob pressão atmosfé-
rica padrão (≈ 105 N/m2) derrete sob temperatura constante de 00C
= 273 K mesmo recebendo calor: este provoca apenas a fusão do
gelo. Outro exemplo: um gás ideal que se expande isotérmica e re-
versivelmente recebe calor de algum reservatório térmico, detalhes
mais adiante no Exemplo 2.5.
Suponhamos, porém, que um sistema tem sua temperatura alterada
de Ti para Tf durante um processo reversível Γ, com Ti < Tf (aqueci-
mento) ou Ti > Tf (resfriamento). Num tal processo podemos desig-
nar uma função CΓ(T), chamada capacidade térmica do sistema no
referido processo. Ela é tal que o calor Q absorvido pelo sistema neste
processo seja dado por
QΓ =
ˆ Tf
Ti
CΓ(T) · dT (2.3)
Notemos que a Eq. (2.3) é, ressalvadas observações posteriores, um
tanto semelhante a Eq. (2.2) referente a expressão do trabalho num
processo reversível. O calor QΓ recebido pelo sistema também de-
32 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
pende, em geral, do referido processo Γ que vai de i para f .
Exemplo 2.2.
Vamos calcular o calor recebido por um sistema de capacidade
térmica C(T) = A · T, com A constante, quando este é aquecido
de T0 para T0 + ∆T.
Pela Eq. (2.3) temos
Q =
ˆ T0+∆T
T0
C · dT =
ˆ T0+∆T
T0
AT · dT = A
2
· [(T0 + ∆T)2 − T20 ],
∴ Q = A ·
[
T0 · ∆T +
(∆T)2
2
]
.
T1 < T2
1 2
Q
Figura 2.4: Fluxo espontâneo de calor “do mais quente para o mais
frio", referente ao Exemplo 2.3.
Exemplo 2.3.
Termalização Espontânea de Dois Corpos. Vamos considerar dois
corpos de capacidades térmicas constantes C1 e C2, com tempera-
turas iniciais T1 e T2 > T1 respectivamente, Fig. 2.4. Após serem
colocados em contato eles atingem, depois de algum tempo, o
equilíbrio térmico numa temperatura Tf que vamos calcular a se-
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 33
guir.
Sejam Q1 o calor recebido pelo corpo inicialmente em T1 e Q2
o calor recebido pelo corpo inicialmente em T2. Considerando-
os isolados do ambiente externo temos que, por conservação de
energia, Q1 + Q2 = 0, ou seja, o calor (Q1) recebido pelo corpo
inicialmente mais frio é igual ao calor (−Q2) cedido pelo corpo ini-
cialmente mais quente. Aqui já estamos usando a chamada pri-
meira lei da Termodinâmica, apresentada adiante de forma mais
abrangente. Mas, pela Eq. (2.3), temos
Q1 =
ˆ Tf
T1
C1 · dT = C1(Tf − T1) e Q2 = C2(Tf − T2).
Assim, Q1 + Q2 = C1(Tf − T1) + C2(Tf − T2) = 0 donde
Tf =
C1T1 + C2T2
C1 + C2
.
Notemos que, sendo C1 e C2 positivos e T1 < T2,
T1 =
C1T1 + C2T1
C1 + C2
<
C1T1 + C2T2
C1 + C2
= Tf <
C1T2 + C2T2
C1 + C2
= T2,
ou seja, Tf é intermediária entre T1 e T2: ela é a média ponderada
de T1 e T2 com pesos estatísticos C1/(C1 + C2) e C2/(C1 + C2),
respectivamente. Notemos ainda que se C1 = C2 então Tf será a
média aritmética de T1 e T2:
Tf =
T1 + T2
2
.
Exercício 3.
A capacidade térmica molar (ou por mol) de qualquer sistema
sólido em temperaturas suficientemente elevadas (temperaturas
ambientes) é constante e cerca de 6 cal/mol·K (Dulong-Petit, 1819).
34 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
Mas nas vizinhanças do zero absoluto (0 K) ela é dada pela lei de
Debye (1912): C = A · T3 com A sendo uma constante caracterís-
tica do material.
a) Qual a unidade de A no sistema padrão MKS?
b) Calcule o calor necessário para aquecer um mol de sólido desde
0 K (supondo possível) até a temperatura T (ainda suficiente-
mente baixa no regime da lei de Debye).
Resposta: a) J/K4, b) Q = AT4/4.
2.3 A Primeira Lei
Lembremos que o calor Q recebido e o trabalho W realizado por um
sistema de massa fixa, quando vai do estado i para o estado f , de-
pendem em geral do processo ou caminho que o sistema percorreu
de i para f ; Fig. 2.5. Entretanto, em concordância com o princípio
de conservação de energia, a diferença Q −W entre o calor Q que
“entrou" no sistema e o trabalho W que “saiu" do sistema foi acres-
centada (se Q −W > 0) à chamada energia interna do sistema. E a
diferença Q −W não depende do caminho i f mas apenas dos
pontos i e f . Este é, essencialmente, o conteúdo da primeira lei da
Termodinâmica que enunciamos a seguir.
Sistema
(i f )
Q W
Figura 2.5: Sistema evoluindo por um processo i f durante o qual
recebe calor Q e realiza trabalho W.
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 35
Primeira Lei da Termodinâmica: Cada sistema simples de massa fixa possui
uma função U, definida no conjunto dos estados de equilíbrio acessíveis ao
sistema (uma função de estado), chamada energia interna. Quando o sistema
evolui de um estado de equilíbrio i para um estado de equilíbrio f recebendo
uma quantidade de calor Q e realizando um trabalho W então
∆U ≡ U( f )−U(i) = Q−W.
A primeira lei estende o princípio de conservação de energia aos pro-
cessos térmicos, englobando os conceitos de calor e energia interna.
No caso de um processo infinitesimal a expressão da primeira lei
torna-se
dU = dQ− dW.
Aqui dU é uma diferencial exata, pois U é função de estado, mas
dQ e dW não são diferenciais exatas por envolver Q e W que não
são funçõesde estado pois dependem do particular processo termo-
dinâmico em consideração; detalhes matemáticos sobre diferenciais
exatas e não exatas no próximo capítulo.
Estamos supondo que a fronteira entre o sistema e a vizinhança, em-
bora possa permitir transferências de energia (Q e W), é constituída
de paredes impermeáveis, ou seja, não permite trocas de matéria en-
tre eles: temos um sistema fechado (não necessariamente isolado),
portanto de massa fixa. Se assim não fosse, a expressão da primeira
lei seria
dU = dQ− dW + dWq
onde o terceiro termo estaria associado às trocas de partículas mate-
riais entre sistema e vizinhança; não consideraremos estes casos.
Vale salientar que a primeira lei da Termodinâmica não fornece re-
ceita para cálculo da energia interna do sistema em foco, apenas pos-
tula sua existência e indica como calcular sua variação em função do
calor e do trabalho (macroscópicos) que o sistema troca com a vizi-
nhança no processo em consideração. Todavia a Teoria Cinética (ou
a Mecânica Estatística) define a energia interna em termos da soma
das energias potenciais e cinéticas das moléculas (microscópicas) do
36 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
sistema, detalhes à parte.
Exemplo 2.4.
Considere um sistema termodinâmico cuja equação de estado é
dada por P = AB · T − B · V e cuja energia interna é U(V, T) =
(BV2)/2 + CT, onde A, B e C são constantes. Suponha que
este sistema se expande isotérmica e reversivelmente de Vi para
Vf > Vi. Calculemos, para este processo, o trabalho realizado
pelo sistema, a variação de energia interna do sistema e o calor
recebido pelo sistema.
Pela Eq. (2.1) temos, sendo um processo isotérmico,
W =
ˆ Vf
Vi
(AB · T − B ·V)dV = AB · T · (Vf −Vi)−
B
2
(V2f −V2i ).
A variação de energia interna é
∆U = U(Vf , T)−U(Vi, T) =
[
B ·V2f
2
+ C · T
]
−
[
B ·V2i
2
+ C · T
]
∴ ∆U =
B
2
(V2f −V2i ).
Portanto, pela primeira lei da Termodinâmica, o calor recebido
pelo sistema no processo é
Q = ∆U + W = AB[·T · (Vf −Vi)].
Exercício 4.
Um sistema líquido é agitado em um recipiente de volume cons-
tante, fechado, de paredes rígidas e termicamente isolantes (ou
adiabáticas). Considere como sistema o líquido mais o recipiente.
Foi transferido calor ao sistema? Foi realizado trabalho sobre o
sistema? Qual é o sinal da variação de energia interna do sis-
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 37
tema? A energia interna do sistema aumentou, diminuiu ou não
se alterou?
Exercício 5.
Uma experiência de combustão é realizada em uma mistura de
combustível e oxigênio contidos em um recipiente não-adiabático
de volume constante circundado por um banho de água. A tem-
peratura da água sobe durante o processo. Considere a matéria
dentro do recipiente como sendo o sistema. Foi realizado trabalho
sobre o sistema? Foi transferido calor entre sistema e vizinhança?
A energia interna do sistema se alterou?
Expansão Livre, Energia do Gás Ideal
Vamos considerar um recipiente adiabático de dois compartimentos
um dos quais contendo um gás rarefeito (ideal) em equilíbrio numa
temperatura Ti = T. No outro compartimento há vácuo e, quando a
passagem entre eles é aberta, o gás se expande de modo que parte
de sua massa migra rápida e irreversivelmente para o compartimento
inicialmente vazio conforme esquema da Fig. 2.6.
Após um certo tempo podemos notar que o gás atinge um estado
de equilíbrio final de temperatura Tf ≈ Ti = T, resultado obtido
nas diversas reproduções do experimento. Atenção: não se trata de
um processo isotérmico pois, enquanto ele ocorre, o gás está fora do
equilíbrio termodinâmico; o que temos é, simplesmente, Tf = Ti = T.
Notemos que, neste processo, o gás não realiza trabalho (não há tra-
balho sobre o vácuo no compartimento inicialmente vazio) e não troca
calor com o ambiente: W = Q = 0. Logo, considerando o dado
experimental Ti = Tf = T, a primeira lei nos fornece U(Vf , T) −
U(Vi, T) = Q−W = 0 com Vi e Vf escolhidos arbitrariamente nos ex-
perimentos. Isto aponta que, para cada T, a energia interna U(V, T)
do gás ideal é independente do volume V e, portanto, é função ape-
nas da temperatura absoluta: Ugás ideal = U(T). Isto está relacionado
com o fato de que, no gás ideal, as moléculas estão suficientemente
38 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
Antes
Depois
Figura 2.6: Expansão livre de gás ideal.
afastadas umas das outras de forma que a energia potencial deste sis-
tema é praticamente nula e, daí, uma alteração de volume do gás não
deve influenciar na energia interna. Veremos, depois que abordar-
mos o conceito de entropia no próximo capítulo, que este resultado
pode ser deduzido teoricamente sem referência ao experimento de
expansão livre. Frizemos:
• A energia interna ou, simplesmente, a energia do gás ideal é função so-
mente da temperatura absoluta: Ugás ideal = U(T).
Exemplo 2.5.
Considere uma transformação isotérmica de gás ideal. Como
Ugás ideal = U(T) temos ∆U = U(Tf )−U(Ti) = 0, pois Ti = Tf .
Logo, pela primeira lei, Q−W = ∆U = 0 e então, pelo resultado
do Exercício 2,
Q = W = nRT ln
Vf
Vi
.
Se Vi < Vf (expansão isotérmica) temos Q = W > 0 de modo que
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 39
o gás recebe calor (de um reservatório) da vizinhança e realiza
trabalho sobre a vizinhança. Se Vi > Vf (compressão isotérmica)
temos Q = W < 0, a vizinhança realiza trabalho sobre o gás e
este entrega calor para a vizinhança.
Exercício 6.
Um gás ideal (de massa fixa) segue o processo cíclico reversível
descrito pelas seguintes etapas: Primeira) uma expansão isobá-
rica (P1, V1) −→ (P1, V2), Segunda) uma queda isovolumétrica de
pressão (P1, V2) −→ (P2, V2), Terceira) uma redução isobárica de
volume (P2, V2) −→ (P2, V1), Quarta) um aumento isovolumétrico
de pressão (P2, V1) −→ (P1, V1). Aqui V1 < V2 e P1 > P2.
a) Desenhe um diagrama VP deste processo.
b) Qual o trabalho realizado pelo gás neste ciclo?
c) Qual o trabalho realizado pelo gás em 100 ciclos?
d) Obtenha a variação de energia interna do gás e a quantidade
de calor recebida pelo gás num ciclo.
Resposta: b) W = (P1 − P2)(V2 −V1), d) ∆U = 0 e
Q = (P1 − P2)(V2 −V1).
Exercício 7.
É possível fornecer calor a um sistema sem aumentar sua tempe-
ratura nem provocar uma transição de fase? Em caso afirmativo,
isto contradiz o conceito de calor como energia transferida devido
a diferenças de temperatura? Comente.
Exercício 8.
Conforme o texto temos que a energia interna do gás ideal é fun-
ção apenas da temperatura: Ugás ideal = f (T). Mas notemos que
PV = nRT ⇒ T = PV/nR e, assim, Ugás ideal = f (PV/nR) =
40 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
g(V, P) de modo que Ugás ideal agora depende do volume V. Expli-
que.
2.4 Capacidades Térmicas Principais
Conforme mencionamos, o calor recebido por um sistema durante
um processo termodinâmico i f depende, em geral, do caminho
que o sistema percorre de i para f . Num dado processo quase-estático
reversível Λ, em que o sistema tem sua temperatura alterada de Ti
para Tf , podemos designar a capacidade térmica CΛ do sistema neste
processo de tal forma que a Eq. (2.3) forneça o calor recebido pelo
sistema no processo em foco. A versão infinitesimal desta equação é
dQΛ = CΛ · dT. (2.4)
Para um dado sistema existem duas capacidades térmicas principais,
cada qual associada a um tipo particular de processo: a capacidade
térmica CV associada a processos sob volume V constante e a ca-
pacidade térmica CP associada a processos sob pressão P constante.
Denotamos:
dQV = CV · dT e dQP = CP · dT.
Vamos obter expressões adequadas para elas em termos de funções
termodinâmicas.
Considerando U = U(V, T) temos, pela primeira lei,
CV · dT = dQV = dU + PdV =
∂U
∂T
∣∣∣∣
V
dT +
∂U
∂V
∣∣∣∣
T
dV + PdV.
Num processo com V = const. temos dV = 0 e então
CV · dT =
∂U
∂T
∣∣∣∣
V
dT ⇒ CV(V, T) =
∂U
∂T
∣∣∣∣
V
(2.5)
que é a expressão geral de CV . No caso particular do gás ideal temos
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 41
simplesmente U = U(T) e então
CV(T) =
dU
dT
.
Exercício 9.
Mostre que a energiainterna de um gás ideal, para intervalos de
temperatura em que CV é constante, é da forma U(T) = CVT +
const.
Consideremos agora U = U(P, T). Pela primeira lei temos
CP · dT = dQP = dU + PdV =
∂U
∂T
∣∣∣∣
P
dT +
∂U
∂P
∣∣∣∣
T
dP + PdV
de modo que, sob P =constante (dP = 0),
CP · dT =
∂U
∂T
∣∣∣∣
P
dT + PdV. (2.6)
Mas pela equação de estado do sistema, V = V(P, T), temos
dV =
∂V
∂T
∣∣∣∣
P
dT +
∂V
∂P
∣∣∣∣
T
dP.
Com dP = 0 temos
dV =
∂V
∂T
∣∣∣∣
P
dT.
Pondo este resultado na Eq.(2.6) obtemos
CP · dT =
[
∂U
∂T
∣∣∣∣
P
+ P
∂V
∂T
∣∣∣∣
P
]
dT
de modo que
CP(P, T) =
∂U
∂T
∣∣∣∣
P
+ P
∂V
∂T
∣∣∣∣
P
. (2.7)
42 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
Esta expressão geral para CP requer a energia interna U(P, T) e a
equação de estado V = V(P, T) do sistema.
Exemplo 2.6.
Vamos calcular CP e CV para o sistema do Exemplo 2.4 para o
qual a equação de estado e a função energia interna são dados,
respectivamente, por P = AB · T − B · V e U = (BV2)/2 + CT,
onde A, B e C são constantes.
Temos, pela Eq.(2.5),
CV =
∂U
∂T
∣∣∣∣
V
=
∂
∂T
[
BV2
2
+ CT
]
= C.
Por outro lado,
P = ABT − BV =⇒ V = AT − P
B
, (2.8)
U =
BV2
2
+ CT ∴ U(P, T) =
B(AT − P/B)2
2
+ CT. (2.9)
Assim, pelas Eqs. (2.7), (2.8) e (2.9),
CP =
∂U
∂T
∣∣∣∣
P
+ P
∂V
∂T
∣∣∣∣
P
=
=
∂
∂T
[
B(AT − P/B)2
2
+ CT
]
+ P
∂
∂T
[
AT − P
B
]
∴ CP =
[
B
(
AT − P
B
)
A + C
]
+ P · A =⇒ CP = C+ A2BT.
Exercício 10.
Mostre que, para uma amostra de gás ideal, as capacidades tér-
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 43
micas principais CV e CP estão relacionadas por
CP = CV + nR.
Sugestão: use PV = nRT, U = U(T) e as definições de CV e CP.
Interpretação Física do Resultado do Exercício 10. Notemos que, para o
gás ideal, CP = CV + nR > CV pois nR > 0. Logo
QP =
ˆ T+∆T
T
CPdT =
(ˆ T+∆T
T
CVdT
)
+nR∆T = QV +nR∆T > QV .
Isto é, para provocar um mesmo aumento de temperatura ∆T em um
gás ideal, o calor que deve ser fornecido ao gás é maior sob pressão
constante do que sob volume constante. Fato semelhante a este acon-
tece quando cozinhamos alimentos numa panela de pressão. Dentro
da panela o volume (e não a pressão) do sistema alimentos+vapores
é mantido praticamente constante. Dessa forma, ao receber calor
sob volume constante, o sistema tem sua temperatura (e sua pressão)
aumentada num tempo menor quando comparado com o tempo de
aquecimento numa panela comum sob pressão atmosférica constante.
Logo, na panela de pressão, o sistema alimento+vapores absorvem
menos calor e, assim, consomem menos gás de cozinha.
Entalpia
Dado um sistema termodinâmico simples com equação de estado
V = V(P, T) e energia interna U = U(P, T) define-se a entalpia do
sistema por
H(P, T) = U(P, T) + P ·V(P, T). (2.10)
Notemos que entalpia é função de estado. Com ela temos
CP =
∂U
∂T
∣∣∣∣
P
+ P
∂V
∂T
∣∣∣∣
P
=
∂
∂T
[U(P, T) + P ·V(P, T)]
∣∣∣∣
P
∴ CP =
∂H
∂T
∣∣∣∣
P
.
(2.11)
Notemos que, para um gás ideal, temos PV = nRT e U = U(T) de
modo que H = U(T) + PV = U(T) + nRT, portanto função apenas
44 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
da temperatura. Além disso temos, pela Eq.(2.11),
CP =
dH
dT
=
d
dT
[U(T) + nRT] =
dU
dT
+ nR = CV + nR,
como no Exercício 10. Assim, para o gás ideal, temos (CP/n) −
(CV/n) = R. Independente de qual seja o sistema, as quantidades
cV = CV/n e cP = CP/n, chamadas capacidades térmicas por mol ou
capacidades térmicas molares ou, ainda, calores específicos molares,
são características da substância.
Exercício 11.
Encontre a entalpia do sistema do Exemplo 2.6, para o qual a
equação de estado e a energia interna são, respectivamente, P =
AB · T− B ·V e U = (BV2)/2 + CT com A, B e C são constantes.
Resposta: H = −(P2/2B) + (A2BT2/2) + CT.
Processos Adiabáticos Reversíveis de Gás Ideal
Se o gás ideal sofre um processo reversível adiabático (dQ = 0) pode-
mos escrever, de acordo com a primeira lei,
CVdT = dU = −PdV. (2.12)
Diferenciando a equação de estado nRT = PV temos nRdT = PdV +
VdP e, considerando nR = CP − CV , segue que (CP − CV)dT =
PdV + VdP. Pondo esta na Eq. (2.12) temos
CV
CP − CV
[PdV + VdP] = −PdV
e, após simplificações,
VdP + γPdV = 0 onde γ =
CP
CV
.
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 45
Dividindo esta equação por PV temos
1
P
dP +
γ
V
dV = 0
de modo que, supondo γ constante,
d{ln(PVγ)} = 0.
Portanto
P ·Vγ = const. (2.13)
Este resultado nos diz que para o gás ideal as curvas adiabáticas,
P = const./Vγ, têm decrescimento mais pronunciado do que as cur-
vas isotermas, P = nRT0/V, pois γ = CP/CV = (CV + nR)/CV =
1 + nR/CV > 1. Isto pode ser interpretado notando que na expansão
adiabática o gás usa parte de sua energia interna para realizar traba-
lho e com isto a sua temperatura cai (dU = −PdV) enquanto que na
expansão isotérmica a temperatura (e, portanto, a energia interna) é
constante, vide Fig. 2.7.
P
V
Isoterma(T constante)
Adiabática(T decrescente)
Figura 2.7: Para o gás ideal uma curva adiabática decresce mais rá-
pido do que uma isoterma.
Vale salientar que os valores de cP, cV e, portanto, de γ = cP/cV
dependem da estrutura ou modelo molecular do gás (Mecânica Esta-
tística).
46 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
Exercício 12.
Oito litros de gás ideal sob pressão de 4 atm na temperatura de
2000C se expande até sua pressão ficar reduzida para 1 atm. Em
cada caso a seguir encontre o volume e a temperatura (absoluta)
final do sistema, o trabalho realizado e o calor recebido pelo sis-
tema. Dados: 1atm∼= 1, 0× 105N/m2, 1litro= 10−3m3.
a) Expansão isotérmica reversível;
b) Expansão adiabática reversível com γ = cP/cV = 5/3;
c) Expansão adiabática livre.
d) Compare as quantidades de trabalho obtidas nos ítens (a) e (b)
e interprete a diferença.
Resp.: a) Vf = 32 litros, Tf = 473 K, W = Q = 3, 2(ln 4)× 103 J;
b) Vf = 16
5
√
2 litros, Tf = [(
5
√
2)/2]473 K,
W = 24(2− 5
√
2) atm·litro∼= 2, 4(2− 5
√
2)× 103 J, Q = 0;
c) Vf = 32 litros, Tf = 473 K, W = Q = 0.
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 47
2.5 Exercícios
1. Calcule o trabalho realizado por um gás de Van der Walls, com
equação de estado (P + a/V2)(V − b) = nRT (a e b constantes), em
cada um dos processos reversíveis de Vi para Vf dados a seguir.
a) Sob temperatura T constante.
b) Sob pressão P constante.
c) Sob volume V constante.
Resposta: a) W = nRT ln[(Vf − b)/(Vi − b)] + a[(1/Vf )− (1/Vi)];
b) W = P(Vf −Vi); c) W = 0.
2. Mostre que o trabalho realizado por um 1 mol de gás ideal no
processo V = aTb, a e b constantes não nulas, de T0 para T0 + ∆T é
dado por W = bR · ∆T.
3. Suponha que a capacidade térmica por mol de um sistema termo-
dinâmico é dada por C(T) = A · T2, onde A = const. Calcule o calor
recebido pelo sistema quando aquecido de Ti para 2Ti.
Resposta: Q = 7AT3i /3.
4. Mostre que, numa transformação reversível e isotérmica de gás
ideal, o trabalho realizado e o calor recebido pelo gás são dados por
W = Q = −
´ Pf
Pi
VdP onde Pi e Pf são as pressões inicial e final do
processso em foco.
5. Uma amostra de gás ideal tem sua pressão alterada de P para
aP, a > 0 constante, numa transformação isotérmica reversível na
temperatura (absoluta) T. Mostre que o trabalho realizado e o calor
recebido pelo gás são dados por W = Q = −nRT ln a.
6. Um gás ideal está contido num recipiente cilíndrico equipado com
um pistão sem atrito e é levado do estado i para o estado f ao longo
do processo reversível ia f esquematizado na Fig. 2.8. Neste processo,
48 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
80 J de calor fluem para dentro do sistema e este realiza 30 J de tra-
balho. a) Qual o calor recebido pelo sistema no processo ib f se, neste
caso, o trabalho realizado pelo gás foi de 10 J? b) Quando o sistema
vai de f para i ao longo do caminho curvilíneo, o trabalho realizado
sobre o sistema é de 20 J. Qual o calor recebido pelo gás neste pro-
cesso? c) Se Ui = 0 e Ub = 40 J calcule os calores recebidos pelo gás
nos processos ib e b f .
P
V
i
fa
b
Figura 2.8: Referente ao Exercício 6.
Resp.: a) Qib f = 60 J, b) Q f i = −70 J, c)Qib = 50 J e Qb f = 10 J.
7. Considere como sistema termodinâmico uma amostra de água
sob pressão atmosférica padrão (∼ 105 N/m2) à 373 K, que é sua
temperatura de vaporização ou fervura na pressão dada. Suponha
que durante uma vaporização reversível nesta temperatura a amostra
de água realiza 8 kJ de trabalho e sua energia interna aumenta de
80 kJ. Calcule aproximadamente a massa de água vaporizada, dado
que o calor para vaporização da água é em torno de 540 cal/g (ou
seja, cada grama de água se vaporiza ao receber 540 cal, sob pressão
padrão, à 373 K). Observação: 1 cal = 4, 19 J e 1 kX = 103 X.
Resposta: M ≈ 40 g.
8. Um gás ideal está contido num cilindro equipado com uma pa-
rede móvel (êmbolo) sem atrito, sob pressão P e volume V. O gás
é aquecido reversivelmente sob volume constante até sua tempera-
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 49
tura duplicar e então é resfriado sob pressão constante até atingir a
temperatura inicial. Mostre que o trabalho realizado sobre o gás é
Ws/g = PV.
9. Um gás ideal passa por um processo adiabático reversível descrito
por PVγ = const. de Vi para Vf . Aqui γ = CP/CV > 1. Mostre que o
trabalho realizado pelo gás é W = (PiVi − Pf Vf )/(γ− 1).
10. Mostre que as seguintes relações são válidas para uma transfor-
mação reversível adiabática, PVγ = const., de um gás ideal:
TVγ−1 = const.,
T
P1−1/γ
= const.
11. Considere um processo politrópico, em que o calor fornecido a
um gás ideal por variação de temperatura é dQ/dT = Φ = const. Se
CV e CP são constantes mostre que a curva deste processo é descrita
por PVa = const., onde a = (CP −Φ)/(CV −Φ). O que acontece se
Φ = 0?
12.
a) Explique porque duas curvas isotermas (reversíveis) de um sistema
qualquer não podem se intersectar.
b) Mostre que duas curvas adiabáticas (reversíveis) de um sistema
simples qualquer não podem se intersectar. Ajuda: Usando a pri-
meira lei da Termodinâmica com dQ = 0 (condição de adiabatici-
dade) obtenha
0 = dQ = dU + P · dV =⇒
(
∂U
∂V
∣∣∣∣
P
+ P
)
dV +
∂U
∂P
∣∣∣∣
V
dP = 0
50 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
que é uma equação da forma
f (V, P) + g(V, P)
dP
dV
= 0.
Esta é uma equação diferencial de primeira ordem cujas soluções são
adiabáticas. Complete o argumento.
13. Teorema de Equipartição e Capacidades Térmicas. De acordo com
o teorema da equipartição de energia da Mecânica Estatística Clás-
sica, cada “grau de liberdade" microscópico (veja adiante) contribui
na energia interna de um gás ideal com kT/2 onde k = nR/N é a
constante de Boltzmann.
a) Consideremos um gás de N “moléculas monoatômicas" de modo
que cada uma possui apenas um único átomo quimicamente estável.
Este gás tem 3N graus de liberdade correspondentes às 3N compo-
nentes x, y e z das energias cinéticas de translação das moléculas
(átomos). Assim, a energia interna de um gás ideal monoatômico clás-
sico é dada por
U = 3N
kT
2
=⇒ U(T) = 3
2
nRT.
b) Para um gás de N moléculas diatômicas rígidas (tipo halteres), além
dos 3N graus de liberdade de translação, existem 2N graus de liber-
dade de rotação das moléculas. Estes correspondem, para cada mo-
lécula, as duas possíveis rotações em torno dos dois respectivos eixos
X e Y perpendiculares à reta Z que passa pelos dois átomos. Assim,
para este gás, temos um total de 5N graus de liberdade e então sua
energia interna é dada por
U = 5N
kT
2
=⇒ U(T) = 5
2
nRT.
c) No caso de um gás de moléculas diatômicas flexíveis (como se os
dois átomos de cada molécula fossem ligados por uma mola), além
dos 5N graus de liberdade de translação e rotação, há N graus de
CAPÍTULO 2. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 51
liberdade associados às energias cinéticas de vibração mais N graus
de liberdade associados às energias potenciais de vibração. Assim,
para este gás, temos 7N graus de liberdade de modo que sua energia
interna é
U = 7N
kT
2
=⇒ U(T) = 7
2
nRT.
Mostre que:
a) para um gás ideal monoatômico clássico temos CV = 3nR/2 e CP =
5nR/2;
b) para um gás ideal diatômico clássico de moléculas rígidas temos CV =
5nR/2 e CP = 7nR/2;
c) para um gás ideal diatômico clássico com moléculas flexíveis temos
CV = 7nR/2 e CP = 9nR/2.
Comentário: Para os gases monoatômicos, diatômicos e diatômicos vi-
bracionais a previsão do modelo cinético (mecânico-estatístico) clás-
sico fornece, nesta ordem, as seguintes capacidades térmicas molares
a volume constante: cV = 3R/2 ≈ 12, 5 J/mol·K, cV = 5R/2 ≈ 20, 7
J/mol·K, cV = 7R/2 ≈ 29 J/mol·K. Os resultados experimentais (em
condições de pressão e temperatura padrões, ∼ 105 N/m2 e ∼ 273 K)
confirmam, com boa precisão, as previsões para os casos monoatômi-
cos (He, Ar, Ne, Kr) e para uma boa parte dos diatômicos mediante
o modelo de halteres (H2, N2, O2, CO). Entretanto para o diatômico
Cl2 o resultado experimental é cV = 25, 7 J/mol·K, que está entre
os valores previstos pelo modelo de halteres e pelo modelo vibracio-
nal. Se aplicarmos o teorema de equipartição para o caso dos gases
poliatômicos aparecem mais discrepâncias com os resultados experi-
mentais: os valores medidos de cV são maiores do que os previstos
pelo modelo microscópico clássico. Aqui chegamos a um dos limites
da Mecânica Clássica: da mesma forma que ela falha para descre-
ver movimentos de partículas com velocidades comparáveis à da luz
no vácuo (onde a teoria da relatividade é requerida), ela falha tam-
bém nos domínios atômico-molecular e subatômico (onde a descrição
adequada é feita pela Mecânica Quântica).
3
Entropia e Segunda Lei
3.1 Irreversibilidade
Processos termodinâmicos com suficiente controle experimental, di-
gamos realizados de forma quase-estática, sob atrito desprezível etc.,
são (praticamente) reversíveis e formados (aproximadamente) por su-
cessões de estados de equilíbrio termodinâmico. No entanto os pro-
cessos envolvidos em fenômenos macroscópicos que observamos na
natureza são irreversíveis, ocorrem fora do equilíbrio.
Notemos que se um dado processo ocorre, com um sistema “indo"
de um estado i para um estado f , seria a princípio possível e sem
violar primeira lei (conservação de energia) que ocorresse o processo
inverso f i, como num filme do processo i f executado do final para
o começo. Mas este processo inverso em geral não ocorre “no mundo
real".
Exemplo 3.1.
a) Se colocarmos um cubo de gelo a 00C sobre uma mesa à tempe-
ratura ambiente, digamos a 200C, o gelo recebe calor do ambiente
e, após derreter, sua temperatura se eleva; no entanto o gelo po-
53
54 TERMODINÂMICA para Licenciatura, Um Roteiro
deria, a princípio, ceder calor para o ambiente (mais quente) e
ficar “mais gelado" mas isto não ocorre!
b) Quando colocamos uma panela com água sobre uma chama,
podemos notar a água aquecendo ao receber calor da chama; no
entanto a água poderia também, revertendo o processo, ceder ca-
lor para a chama e se resfriar mas isto não acontece. Enfim:
• A passagem espontânea de calor de um sistema para outro de menor
temperatura é um processo irreversível.
Exemplo 3.2.
Também não ocorre o processo inverso da expansão livre de um
gás.
• A expansão livre é um processo irreversível.
Outras situações:
Exemplo 3.3.
Ao cair, uma xícara vai convertendo energia potencial em cinética
até colidir com o piso e se fragmentar. Este processo é irreversível:
os fragmentos da xícara não se reaglomeram nem sobem espon-
taneamente... podemos até filmar a queda e passar o filme ao
contrário, onde a xícara é reconstituída de modo a “recuperar" a
energia potencial inicial, mas isto não ocorre de fato.
Exemplo 3.4.
Um ser vivo nasce, cresce e morre. Este processo é irreversível.
Processos irreversíveis são unidirecionais no tempo e isto nos per-
mite, de certa forma, imaginar uma seta do tempo termodinâmica: o sen-
tido “passado futuro" pode ser associado com a ocorrência de um
processo “i f " em que um sistema vai irreversivelmente do estado
i para o estado f . Detalhes à parte, a seta do tempo é um problema
em aberto.
CAPÍTULO 3. ENTROPIA E SEGUNDA LEI 55
Mas... o que ou que lei física proíbe que haja reversibilidade

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