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O CONHECIMENTO
 
Até se parece conosco: investiga, pergunta aos outros, lê, pergunta a si mesma. Haja cabeça,não!? É... ela está envolvida com um problema difícil!
Aliás, não é só ela que se ocupa disso.
O que conhecemos, como conhecemos, como retemos esse conhecimento, é algo que merece reflexão, você não acha?
Sem dúvida, a questão do conhecimento é uma questão importante na História da Filosofia. Vimos, nas duas primeiras Unidades deste Caderno, que filosofia significa, etimologicamente, amor ao conhecimento. E, também, como alguns filósofos pensaram sobre essa questão.
 
O QUE É CONHECIMENTO?
Platão, filósofo que foi discípulo de Sócrates, e viveu no século IV antes de Cristo, em Atenas, na Grécia, como você já estudou, tratou da questão do conhecimento. Preocupou-se em saber se nós podemos ter um conhecimento verdadeiro sobre o mundo. Ele concebia o cosmos, o universo, como dois mundos: o mundo sensível, de nossa experiência imediata, e o mundo inteligível, das ideias ou das essências verdadeiras, do Ser.
O primeiro é o mundo das aparências, do não-Ser, que é como uma cópia deformada do que existe sempre da mesma forma, permanecendo sempre o mesmo. Admitia que assim como há dois mundos, há duas formas de conhecermos: podemos conhecer pelos sentidos ou pela razão (pensamento). Platão concluiu que o conhecimento que adquirimos pelos sentidos (visão, audição, tato, paladar, olfato) é mutável, transitório e contraditório, e que, portanto, não é um conhecimento confiável, porque precisamos conhecer como o mundo é e não como ele está a cada momento. O Ser pode ser conhecido pelo intelecto, pela razão ou pensamento, que alcança a essência das coisas, as ideias.
 
Assim, de acordo com esse filósofo, podemos ter um conhecimento ilusório e o conhecimento verdadeiro. Distingue quatro graus de conhecimento, do mais inferior ao superior: crença, opinião, raciocínio, intuição intelectual. Os dois primeiros são ilusórios e não têm a ver com a investigação filosófica. E os dois últimos são válidos para o conhecimento filosófico. O raciocínio treina nosso pensamento e o purifica intelectualmente para permitir as intuições das ideias verdadeiras ou essências das coisas - o Ser. A Matemática e a Música, que não são um conhecimento direto das coisas, mas das relações entre elas, preparam nosso pensamento para filosofar. E a Filosofia, que para Platão é um conhecimento que se constrói no diálogo, é a maneira mais elevada de se conhecer o Ser, que inclui a Verdade, o Belo e o Bem. O conhecimento, para Platão, eleva-nos, no sentido de conhecermos, de termos a intuição do que é verdadeiro, do que é bom e do que é belo, ou seja, o Ser em sua perfeição.
  
Você já leu sobre a Alegoria da Caverna. Platão mostra como nós, seres humanos, vivemos presos a um mundo ilusório, e que podemos nos libertar do conhecimento imediato que nos é proporcionado pelos sentidos. Saber que o mundo sensível é enganoso nos leva a buscar a verdade por outro meio que não nossos sentidos. Esse meio é a Filosofia, que é o conhecimento mais puro e verdadeiro e vale para todo tempo e lugar, ou seja, é universal. Você viu como é interessante a maneira de Platão pensar? Ele escreveu vários diálogos filosóficos, como você já sabe. E importante conhecermos as características da época em que ele viveu e compreendermos que havia escravos na sociedade grega antiga e esses, que eram estrangeiros vencidos em guerras, forçados a realizar todo o trabalho manual e que exigisse força, ocupando-se o tempo todo para viabilizar a vida dos cidadãos de Atenas. Ora, dessa forma, as condições para o filosofar eram reservadas aos homens gregos adultos, livres, que tinham tempo de sobra para se dedicar a tal atividade, dialogar, e, assim, chegar ao conhecimento da verdade. Nem as mulheres, nem as crianças, na época, eram consideradas cidadãs e, portanto, não tinham a oportunidade de filosofar.
 
Não podemos, portanto, imaginar a personagem Mafalda, que hoje filosofa e nos inspira a filosofar, nem nós, mulheres, lendo esse texto e filosofando, como cidades daquela época!
É... o mundo humano muda muito ao longo da História, não é?!
Hoje nós sabemos que as crianças têm uma atitude filosófica diante do mundo e dos fatos, e fazem perguntas sobre temas que, muitas vezes, nós, adultos, nunca tínhamos problematizado.
 
Agora, vamos continuar nosso trabalho de investigação sobre o que é o conhecimento.
Leia a seguinte frase:
"Todos os homens têm, por natureza, desejo de conhecer..."
Essa afirmação é de Aristóteles, um filósofo já conhecido seu, não é?
Por que o filósofo grego diz isso? Por que ele acredita que todo homem tem naturalmente o desejo de conhecer?
Em nossa vida cotidiana, não é tão fácil constatarmos isso.
Essa é uma afirmação de Aristóteles. Acompanhemos a argumentação do filósofo:
Todos os homens têm, por natureza, desejo de conhecer: uma prova disso é o prazer, das sensações, pois, fora até de sua utilidade, elas nos agradam por si mesmas e, mais do que todas as outras, as visuais. Com efeito, não só para agir, mas até quando não nos propomos operar alguma coisa, preferimos, por assim, dizer, a vista aos demais. A razão é que ela é, de todos os sentidos, o que melhor nos faz conhecer as coisas e mais diferenças nos descobre.
O homem, para ele, tem prazer em ver as coisas e o mundo. E o conhecimento é um processo que se inicia com as sensações em geral. Entretanto, não basta termos sensações para conhecermos. Precisamos da memória, para retermos o conhecimento adquirido pelos sentidos. Se assim não fosse, teríamos que ter as sensações a cada momento novamente, para continuarmos conhecendo o real.
Os animais, como o ser humano, têm sensações e as memorizam. Com os dados memorizados construímos nossa experiência, que é o próximo passo do processo do conhecimento, exclusivamente humano. Na experiência, fazemos relações entre os dados retidos na memória e, com base na identificação da repetição e da regularidade desses dados, fazemos associações e daí, tiramos certas conclusões e temos algumas expectativas.
A experiência é o conhecimento prático, que é construído a partir da expectativas de novas ocorrências e sequências de ocorrências de fatos no mundo. Por exemplo, se tive a experiência de viver uma situação em que o céu ficou muito escuro de dia e depois choveu, nas próximas vezes em que o céu ficar escuro de dia vou ter a expectativa de que chova. Esse tipo de conhecimento prático orienta o nosso fazer, a nossa ação no mundo.
 
A próxima etapa é a da arte, ou técnica, em que se sabe como fazer algo, artística ou tecnicamente, conhecendo-se as regras de produção de algo, o porquê desse algo, suas causas. Esse tipo de conhecimento permite que ensinemos a outros a fazer algo, a seguir regras. É um conhecimento não só prático, mas em que sabemos o que estamos fazendo e porque o que fazemos resulta num produto determinado. Por exemplo, dizemos que urna pessoa conhece a técnica de fazer uma mesa, quando ela não só sabe como fazer uma mesa, mas está ciente de precisar seguir regras e procedimentos para obter as dimensões corretas, de modo que ela seja adequada para as pessoas a usarem para comer ou escrever. 
A etapa seguinte, última e mais elevada, do processo de conhecimento, é a episteme, a ciência ou saber teórico. É um saber abstrato e o mais genérico sobre o real, o conhecimento de conceitos e princípios, que consistem nas leis da natureza ou do cosmos. E um saber contemplativo, segundo Aristóteles, e tem como finalidade o conhecimento da verdade, e não um objetivo prático. Ele satisfaz a curiosidade natural do ser humano, que é o desejo de conhecer 
A Filosofia, dentre essas formas abstratas de saber, é a mais elevada, mais afastada dos sentidos, e nos permite conhecer as causas primeiras e universais, os princípios de tudo o que existe.
 
Para Aristóteles, portanto, todos os seres humanos desejam conhecer, têm uma curiosidade natural e podem filosofar, ou buscar compreender as primeiras causas de tudo. O método que usamos para conhecer, segundo ele, segueas etapas: sensações, memória, experiência, técnica e saber teórico, ciência, filosofia. Também propõe uma linguagem para se usar na construção e comunicação do conhecimento: a lógica. 
Veja como, em Platão, podemos notar uma preocupação em escapar da ilusão, do erro, nos quais estamos mergulhados no nosso cotidiano. Aristóteles, por sua vez, propõe que podemos conhecer de várias maneiras, temos a possibilidade de construir vários tipos de saberes. Ele aceita a condição humana, e não a considera ilusória, como seu mestre. E é a partir dessa condição, com nossas limitações, que vamos conhecendo, realizando etapas no processo que vai da sensação até a Filosofia. Assim, ele propõe uma classificação das várias ciências que o ser humano produz.
 
Ao longo da História da Filosofia, muitos pensadores têm tratado da questão do conhecimento. É importante que compreendemos como as concepções de conhecimento se modificam, dependendo do momento histórico em que vivem os filósofos. Em cada momento, as relações econômicas, políticas e religiosas têm uma especificidade e a Filosofia também se faz conforme essas determinações e possibilidades.
Também a concepção de verdade muda ao longo da História. O mais interessante é que um pensador de muito tempo atrás pode ter concebido a verdade de uma maneira que hoje em dia nós aceitamos, e outro, contemporâneo nosso, pode pensar de um modo com o qual não concordamos. Isso significa que as ideias filosóficas não se sucedem, necessariamente, de modo que uma das mais antigas seja menos interessante ou aceitável do que outra mais moderna.
Vamos considerar as concepções de Verdade de alguns filósofos, além das de Platão e Aristóteles, sobre as quais já falamos um pouco, apresentadas por Japiassu (2000).
 
ATIVIDADE LÚDICA
Vamos realizar uma atividade divertida que mostrará a você alguns dos vários olhares possíveis sobre uma história.
O CASO DE MIGUEL
Relato n° 1 - De sua mãe
Miguel levantou-se correndo, não quis tomar café e nem ligou para o bolo que eu havia feito especialmente para ele. Não quis colocar o cachecol que eu Ihe dei. Disse que estava com pressa e reagiu com impaciência a meus pedidos para se alimentar e se abrigar direito. Ele continua sendo uma criança que precisa de atendimento, pois não reconhece o que é bom para si mesmo.
 
 
Relato n° 2 - Do garçom da boate
Ontem à noite, ele chegou aqui acompanhado de uma morena, bem bonita, por sinal, mas não deu a mínima para ela. Quando entrou uma loura, de vestido colante, ele me chamou e queria saber quem era ela. Como eu não a conhecia, ele não teve dúvidas: levantou-se e foi à mesa falar com ela. Eu disfarcei, mas só pude ouvir que ele marcava um encontro, às 9 da manhã, bem nas barbas do acompanhante dela. Sujeito peitudo!
Relato n° 3 - Do motorista de táxi
Hoje de manhã, apanhei um sujeito e não fui com a cara dele. Estava de cara amarrada, seco, não queria conversa. Tentei falar sobre futebol, política, o trânsito e ele sempre me mandava calar a boca, dizendo que precisava se concentrar. Desconfio que ele é daqueles que o pessoal chama de subversivo, desses que a polícia anda procurando ou desses que assaltam motorista de táxi. Aposto que anda armado. Fiquei louco para me livrar dele.
  
Relato n° 4 - Do zelador do edifício
Esse Miguel, ele não é certo da bola, não! Às vezes cumprimenta, às vezes finge que não vê ninguém. As conversas dele a gente não entende. E parecido com um parente meu que enlouqueceu. Hoje de manhã, ele chegou falando sozinho. Eu dei bom dia e ele me olhou com um olhar estranho e disse que tudo no mundo era relativo, que as palavras não eram iguais para todos, nem as pessoas. Deu um puxão na minha gola e apontou para uma senhora que passava. Disse, também, que quando pintava um quadro, aquilo é que era a realidade. Dava risadas e mais risadas... Esse cara é um Iunático!
  
Relato n° 5 - Da faxineira
Ele anda sempre com um ar misterioso. Os quadros que ele pinta, a gente não entende.Quando ele chegou, na manhã de ontem, me olhou meio enviesado. Tive um pressentimento ruim, como se fosse acontecer alguma coisa ruim. Pouco depois chegou a moça loura. Ela me perguntou onde ele estava e eu disse. Daí a pouco ouvi ela gritar e acudi correndo. Abri a porta de supetão e ele estava com uma cara furiosa, olhando para ela cheio de ódio. Ela estava jogada no divã e no chão tinha uma faca. Eu saí gritando: Assassino! Assassino!
 
Relato do próprio Miguel sobre o ocorrido nesse dia.
Eu me dedico à pintura de corpo e alma. O resto não tem importância. Há meses que eu quero pintar urna Madona do século XX, mas não encontro urna modelo adequada, que encarne a beleza, a pureza e o sofrimento que eu quero retratar. Na véspera daquele dia, urna amiga me telefonou dizendo que tinha encontrado a modelo que eu procurava e propôs nos encontrarmos na boate. Eu estava ansioso para vê-Ia. Quando ela chegou, fiquei fascinado; era exatamente o que eu queria. Não tive dúvidas. Já que o garçom não a conhecia, fui até a mesa dela, me apresentei e pedi para ela posar para mim. Ela aceitou e marcamos um encontro no meu ateliê, às 9 horas da manhã. Eu não dormi direito naquela noite. Levantei-me ansioso, louco para começar o quadro, nem pude tomar café, de tão afobado.
No táxi, comecei a fazer um esboço, pensando nos ângulos da figura, no jogo de luz e sombra, na textura, nos matizes... Nem notei que o motorista falava comigo.
Quando entrei no edifício, eu falava baixinho. O zelador tinha falado comigo e eu nem tinha prestado atenção. Aí, eu perguntei: o que aquele dia significava para mim? Sonhos, fantasias e aspirações...
Tudo iria se tornar real, enfim, com a execução daquele quadro. Eu tentei explicar para ele que a verdade era relativa, que cada pessoa vê a outra à sua maneira. Ele me chamou de Iunático. Eu dei uma risada e disse: está aí a prova do que eu disse. O Iunático que você vê, não existe. Quando eu pude entrar, dei de cara com aquela velha mexeriqueira.
 
Entrei no ateliê e comecei a preparar a tela e as tintas.
Foi quando ela chegou. Estava com o mesmo vestido da véspera e explicou que passara à noite em claro, numa festa.
Aí eu pedi que sentasse no lugar indicado e que olhasse para o alto, que imaginasse inocência, sofrimento... que...
Aí ela me enlaçou o pescoço com os braços e disse que eu era simpático. Eu afastei seus braços e perguntei se ela tinha bebido. Ela disse que sim, que a festa estava ótima, que foi pena eu não ter estado lá e que sentiu minha falta. Enfim, que estava gostando de mim. Quando ela me enlaçou de novo, eu a empurrei e ela caiu no divã e gritou... Nesse instante a faxineira entrou e saiu berrando: Assassino! Assassino!
A loura levantou-se e foi embora. Antes me chamou de idiota. Então, eu suspirei e disse: ah, minha Madona!
UM POUCO DA HISTÓRIA DA FILOSOFIA MODERNA E CONTEMPORÂNEA
 
A história da Filosofia moderna começa no século XVII, com o pensamento do filósofo francês René Descartes (1596 - 1650). Nesse período, que se estende até o início do século XIX, a reflexão filosófica é especialmente influenciada pelo desenvolvimento da ciência moderna. Boa parte do pensamento do período, especialmente entre o final do século XVII e o final do século XVIII, é marcado por um grande otimismo, no que diz respeito às possibilidades da ciência e da razão. E o período conhecido como Iluminismo.
Nessa época, começam a surgir as sociedades chamadas democráticas tendo a independência dos Estados Unidos da América, em 1776, e a Revolução Francesa, em 1789, como marcos da democratização das ideias. Sobretudo, nas ideias que integravam liberdade individual com igualdade social.
 
ALGUNS FILÓSOFOS DA ÉPOCA MODERNA
René Descartes - 1596 - 1650
René Descartes nasceu na França, em 1596. Teve uma educação esmerada, baseada, como era comum na época, no estudo da Filosofia e das Letras, mas cedo passou a considerá-Ia limitada, porque esses conhecimentos não lhe davam certeza sobre muitas coisas.
Em contraste, encontrou segurança e certeza na Matemática, cujo rigor, então, adotou como modelo para todaa ciência. Sua Filosofia começou com a preocupação de construir o alicerce seguro sobre o qual erguer o edifício da ciência. Para isso, acreditava que deveria encontrar pelo menos uma crença que não pudesse de maneira nenhuma ser posta em dúvida, que fosse absolutamente certa e segura para funcionar como aquele alicerce procurado. Para ele, essa crença indubitável seria a de que "se eu penso, eu existo": mesmo que tudo o mais seja incerto, não é possível que eu, que penso, não seja algo.
Descartes foi também um matemático e um físico importante. Inventou a chamada geometria analítica e até hoje chamamos de coordenadas cartesianas, em sua homenagem, os dois eixos perpendiculares que formam um gráfico. Deu contribuições importantes para a óptica, tendo desenvolvido uma teoria da gravitação, suplantada apenas por Isaac Newton, o pai da Física moderna. Suas obras principais foram: Discurso sobre o Método; Meditações e Princípios da Filosofia.
 
David Hume - 1711 - 1776.
Nasceu em Edimburgo, na Escócia. Sua família queria que ele estudasse Direito, mas o seu maior interesse era pela Filosofia e, aos 27 anos, publicou o seu primeiro livro: Tratado da Natureza Humana, que depois desdobrou em dois: Investigações sobre o entendimento humano e Investigações sobre os princípios da moral.
Em sua época, Hume não obteve grande reconhecimento como filósofo, até porque suas ideias eram bastante críticas, a ponto de seus contemporâneos acreditarem que ele estava querendo negar toda a possibilidade de conhecimento ou de ciência. Um de seus argumentos mais famosos gira em torno da ideia de causalidade, ou seja, da relação entre a causa e os seus efeitos. Mais tarde, escreveu uma coleção de seis livros sobre a História da Inglaterra e obteve muito reconhecimento. Posteriormente, seu pensamento filosófico foi redescoberto e influenciou muitos pensadores importantes. Ainda hoje, Hume é um dos filósofos mais estudados e comentados.
 
Immanuel Kant- 1724 - 1804.
Immanuel Kant nasceu em 22 de abril de 1724, na cidade de Kõnigsberg, que fazia parte da Prússia. Kant, que atribui o impulso para desenvolver suas ideias mais inovadoras à leitura da obra de David Hume, foi um dos mais importantes e influentes filósofos da modernidade. Seus estudos e ensinamentos nos campos da Metafísica, Epistemologia, Ética e Estética tiveram grande impacto sobre a maioria dos movimentos filosóficos posteriores.
Sua filosofia, vasta e revolucionária, marcou, de certo modo, o ponto mais alto da filosofia moderna e lança as bases para a filosofia contemporânea. Considerava que ao nascer todos nós trazemos para o mundo conceitos a priori, isto é, que não vêm da experiência. Sem esses conceitos seria impossível explicar a realidade, de acordo com a sua visão. Suas principais obras são: Crítica da razão pura; Crítica da razão prática; Crítica da faculdade ao juízo; Fundamentação da metafísica dos costumes.
 
FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA
A história da Filosofia contemporânea se inicia, justamente, quando o otimismo, típico da Filosofia moderna, começa a diminuir. Um nome importante na transição do pensamento moderno para o contemporâneo é o de Georg W. Friedrich Hegel (1770 - 1831), filósofo alemão que criou um sistema filosófico muito vasto, apontando uma série de limitações da Filosofia moderna.
A partir da segunda metade do século XIX, grandes filosofias críticas começaram a surgir. Pensadores como Friedrich Nietzsche e Karl Marx, de maneiras muito diferentes, abriram caminhos de crítica à sociedade e ao pensamento, que terão impactos importantes no desenvolvimento não só da Filosofia, mas, também, da Política, da Arte, por exemplo.
No início do século XX, começaram a se estruturar algumas vertentes que ainda hoje dividem as preferências dos filósofos. A primeira delas é a vertente conhecida como Fenomenologia, que surgiu com a obra do filósofo austríaco Edmund Husserl, e se desenvolveu com o pensamento de Martin Heidegger, um dos filósofos contemporâneos mais influentes.
Uma outra, conhecida como Filosofia Analítica, surgiu na Inglaterra, a partir da obra de filósofos como George Edward Moore, Bertrand Russell e Ludwig Wittgenstein. Atualmente, a Filosofia caracteriza-se por uma grande pluralidade de tendências, pois a partir dessas primeiras surgiram muitas outras. Da vertente fenomenológica, desenvolveram-se diversas tendências, como o existencialismo. Da vertente analítica, surgiram diversas filosofias da ciência e da linguagem.
 
ALGUNS FILÓSOFOS DA ÉPOCA CONTEMPORÂNEA
Georg W. Friedrich Hegel - 1770 - 1831.
Nasceu em Stuttgart, na Alemanha. Hegel concebeu um modelo de análise da realidade, conhecido como dialética, que influenciou vários pensadores - entre eles Karl Marx, que adaptou a dialética hegeliana ao seu pensamento sobre a História e a sociedade.
A Filosofia hegeliana é conhecida por sua vastidão e por sua grande complexidade. Sua obra abrange diversas áreas do conhecimento, como Lógica, Direito, Religião, Arte, Moral, Ciência e História da Filosofia. Suas principais obras foram: Fenomenologia do Espírito; Ciência da Lógica, Enciclopédia das ciências filosóficas em esboço, A Filosofia da História e a Filosofia do Direito.
Karl Marx - 1818 - 1883.
Nasceu na cidade alemã de Trier, filho de judeus que se converteram ao Iuteranismo. Mas já na adolescência se afastou da religião e se tornou um militante antirreligioso. Iniciou seus estudos em Direito, passando depois para a Filosofia e a História. De origem pobre, passou toda a sua vida dependendo da ajuda de seus amigos, entre eles Friedrich Engels, com quem compartilhava muitas de suas ideias e escreveu muitas de suas obras. Juntamente com Engels, Marx construiu um sistema filosófico que passou a ser conhecido como Marxismo e que influenciou gerações de pensadores em diferentes campos, das artes à política.
Marx sonhava com uma sociedade melhor, em que o dinheiro não governaria e tudo seria dividido entre as pessoas. Um de seus textos mais famosos é o Manifesto Comunista, onde ele argumenta que o capitalismo escraviza as pessoas, forçando-os a produzir bens que provavelmente nunca usarão. Principais obras: A pobreza da filosofia, A luta de classes na França, Contribuição para a crítica da economia política, O Capital.
Nietzsche - 1844 - 1900.
Friedrich Nietzsche nasceu de uma família Iuterana, sendo destinado a ser pastor como seu pai. Entretanto, Nietzsche perdeu a fé durante sua adolescência, e os seus estudos de Filologia acabaram de afastá-Io da religião. Nietzsche desenvolveu uma Filosofia extremamente crítica da religião e dos valores religiosos, defendendo a necessidade de superarmos as velhas limitações humanas para construirmos um novo ser humano. Suas principias obras foram: O nascimento da tragédia; Humano, demasiado humano; Além do bem e do mal; A genealogia da moral; Assim falou Zaratustra.
 
Martin Heidegger - 1889 - 1976.
Nasceu em 26 de setembro de 1889, em Messkirch, na Schwarzwald (Floresta Negra), Alemanha. Foi aluno de Edmund Husserl, tornando conhecimento da nova abordagem da Filosofia que esse filósofo batizou de Fenomenologia. Heidegger estende e aprofunda o método fenomenológico, aplicando-o, em especial, à própria existência humana, abrindo, assim, o caminho para o Existencialismo. Sua principal obra é Ser e Tempo.
 
Ludwig Wittgenstein - 1889 - 1951.
Nasceu em Viena, na Áustria, mas passou grande parte de sua vida na Inglaterra, na Universidade de Cambridge. Seu pai foi um grande magnata em sua terra natal e dele herdou sua fortuna. Recebeu uma sólida educação como engenheiro, aproximando-se da Filosofia apenas mais tarde. Sua ambição era resolver todos os problemas filosóficos tradicionais. 
Acreditava poder chegar a isso a partir da análise da linguagem: se tivermos clareza sobre o que a linguagem pode ou não fazer, ou seja, sobre o que podemos falar com sentido e sobre o que não tem significado, então poderemos livrar-nos dos falsos problemas e concentrar-nos nas questões realmente significativas. Suas principais obras são: Tractatus logico-philosophicus;Investigações filosóficas; Observações sobre os fundamentos da Matemática.
 
Jean-Paul Sartre - 1905 - 1980.
Jean-Paul Sartre nasceu em Paris. Foi um escritor brilhante, um teatrólogo e o maior intelectual do Existencialismo. Acreditava que a consciência da própria liberdade induzia as pessoas à angústia. Se vivemos num mundo sem Deus, não temos alternativa senão escolher e criar nossos próprios valores. E, ao criar os nossos valores, temos de fixar as regras básicas de nossas próprias vidas.
Fez seus estudos na famosa École Normale Supérieure de Paris, onde conheceu Simone de Beauvoir, também filósofa e escritora, que foi sua companheira por toda a vida. Estudou também na Alemanha, onde teve contato com os pensamentos de Husserl e Heidegger, fundamentais para a constituição do Existencialismo. Foi um intelectual brilhante e profundamente envolvido na política, adotando sempre urna postura esquerdista e revolucionária. Suas principais obras são: A Náusea; O imaginário; O Ser e o Nada; O existencialismo é um humanismo; A idade da razão; O problema do método. 
Simone de Beauvoir - 1908 - 1986.
Nasceu em Paris, onde viveu grande parte de sua vida. De uma família de classe alta teve uma infância tranquila e marcada pela dedicação aos estudos. Foi uma aluna brilhante. Uma escritora revolucionária, considerada por muitos como a mãe do feminismo. Seu livro O segundo sexo foi a primeira tentativa real de explorar por que as mulheres se deixavam dominar pelos homens.
Acreditava que as pessoas deveriam ser livres de preconceitos sobre o sexo. Participou ativamente da vida política junto com Sartre. Formavam um casal polêmico, pois viviam de acordo com as suas ideias de liberdade. Principais obras: A convidada; O segundo sexo; Memórias de uma moça bem comportada; Todos os homens são mortais; e uma coletânea de vários livros sobre suas memórias.
 
Michel Foucault- 1926 - 1984.
Nasceu na França. Foi filósofo e professor no College de France de 1970 a 1984. Com seus estudos sobre a história do pensamento, Foucault apresentava outra face da natureza humana, mostrando, por exemplo, como os loucos já foram considerados profetas e tratados com respeito, diferente de hoje, que são isolados do convívio social. Suas obras mais importantes são: História da loucura; Nascimento da clínica; As palavras e as coisas; Arqueologia do saber; Vigiar e punir; História da sexualidade.
 
Jacques Derrida - 1930 - 2004.
Nasceu no Marrocos, no norte da África, mas viveu grande parte de sua vida na França. Foi o criador do método filosófico chamado desconstrução. Esse pensamento questiona as principais ferramentas usadas para descrever o pensamento filosófico, as palavras. Ele “desconstroi", ou desmancha, a língua para mostrar como não pode ter significado fixo. As palavras são pedras no caminho da busca pela verdade. Entre as principais influências de Derrida encontram-se Sigmund Freud e Martin Heidegger.
 
Marilena Chauí - 1941 -
Nasceu no Brasil em 1941. Professora de filosofia da Universidade de São Paulo - USP. Participa ativamente do debate político e intelectual no País e procura pensar a realidade brasileira com o auxílio da reflexão filosófica e da militância política. Foi secretária de cultura da prefeitura de São Paulo no governo de Luiza Erundina (1989-1992). Entre suas obras destacam-se: Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas; O que é ideologia; Convite à Filosofia e outros.
 
O FILÓSOFO EM NÓS
Após conhecermos um pouco sobre a história da Filosofia e de alguns de seus filósofos, podemos concluir que eles se destacaram na nossa história porque adotaram, cada um dentro do seu contexto social e cultural, uma atitude filosófica - aquela atitude de que falamos no final da unidade I, que indaga sobre as razões e as causas das coisas - e elaboraram, a partir dessa atitude, teorias e conceitos que, em muitos casos, mudaram nossa maneira de ver o mundo. Assim, podemos aprender, com as ideias desses e de outros pensadores, a questionar os problemas de nossa sociedade e refletir sobre os acontecimentos atuais. Podemos ter um filósofo em nós, ou algumas de suas ideias, que nos guiem nesta busca de ver o mundo de uma forma menos receptiva e mais reflexiva.
 
Muitos dos filósofos aqui apresentados não foram compreendidos em sua época por estarem pensando além da realidade aceita pelo senso comum. No entanto, em muitos casos, suas teorias e seus conceitos ajudaram a entender - e, algumas vezes, a criar - um mundo novo. As ideias de Descartes foram fundamentais para que as pessoas entendessem o novo mundo proposto pela ciência moderna, superando os conceitos aristotélicos e medievais que predominavam. As ideias de Marx provocaram profundos impactos políticos e econômicos, influindo na vida de milhões de pessoas ao longo da história do século XX.
O Existencialismo de Sartre provocou grandes mudanças comportamentais, que abriram o caminho para importantes conquistas sociais e políticas nas décadas de 1960 e 1970. Como sugeria Sócrates, há quase 20 séculos, é necessário pensar corretamente para viver bem-justamente porque as ideias têm um impacto importante sobre a forma como vivemos. A Filosofia, que se define em boa parte por esse esforço de pensar bem, tem contribuído, ao longo da história, de forma decisiva - às vezes com mais sucesso, às vezes cometendo erros - para definir os rumos da forma como vivemos.
Vamos procurar entender, na próxima unidade, as relações da Filosofia com a nossa vida cultural e social. Quem podemos ser? e O que poderemos conhecer?
 A FILOSOFIA: DEFINIÇÃO, SURGIMENTO E PRÁTICA
Vamos iniciar a nossa investigação começando pelo primeiro problema da filosofia, o seu próprio significado, e tentar construir juntos uma definição.
Uma boa sugestão para tentar entender um conceito é ver se a etimologia da palavra pode nos ajudar a descobrir seu significado.
A palavra filosofia vem do grego e é um substantivo composto de duas outras palavras: philia, que significa amizade e respeito entre os iguais, e sophia, que significa sabedoria e conhecimento. Ou seja:
Filosofia, etimologicamente falando, é amizade pela sabedoria ou, ainda, amor e respeito pelo saber.
 
O QUE É A FILOSOFIA?
Mas o que é ser amigo do saber ou da sabedoria?
Sabedoria se relaciona com conhecimento. Podemos aceitar, a princípio, que sabedoria é um acúmulo de conhecimentos. Ainda simplificando, podemos dizer que conhecimento é um conjunto de ideias concatenadas para produzir algum conceito.
A Filosofia, ou melhor, a amizade pela sabedoria, seria então a investigação de ideias para torná-las em conceitos.
Quem faz Filosofia então?
Essa parece uma pergunta fácil: ora, os filósofos fazem filosofia.
Podemos propor, agora, uma primeira definição de filósofo:
O filósofo é uma pessoa que busca encontrar; analisar e se relacionar com ideias para transforma-las em conceitos. É alguém que busca compreender as razões de suas ideias, das concepções que foram recebidas de outros, transformando-as em conceitos e, dessa forma, apropriando-se delas.
Na História da Filosofia, há uma figura que encarnou de maneira especialmente exemplar essa ideia de filosofia:
O filósofo grego Sócrates, que viveu na cidade de Atenas entre 470 e 399 a. C. Seu impacto na História da Filosofia foi tão grande que os historiadores costumam dividir o período inicial da História da Filosofia em dois: antes e depois de Sócrates. A influência de Sócrates ainda hoje inspira muitos filósofos.
 
Sócrates - 470 - 399 a.C
Foi o primeiro grande filósofo grego. Nasceu e viveu em Atenas. Estava sempre miseravelmente vestido e descalço. Passava os dias perambulando por Atenas, fazendo perguntas básicas sobre moralidade e política a quem pudesse ouvi-Io. Ele acreditava que a felicidade era levar uma boa vida. Mas o que é bom? Essa era a grande questão. Sócrates acreditava que descobriria isso se conversasse com muitas pessoas. Quanto mais questionasse, mais saberia, e o conhecimento era sem dúvida uma coisa boa. Sócrates foi um filósofo peculiar. Consta que, por escolhaprópria, nunca escreveu nenhuma obra. Recusava-se a se apresentar como professor ou como sábio, mesmo reconhecido por muitos como mestre e exemplo acabado de sabedoria. O exemplo de Sócrates ajuda-nos fixar com mais clareza a ideia de filosofia apresentada em nossa primeira definição.
 
Como foi dito, Sócrates não nos deixou nenhum texto escrito. Conhecemos sua história e seu pensamento apenas por intermédio dos testemunhos de alguns de seus contemporâneos. Um deles, o filósofo Platão, deixou-nos um grande número de escritos, na forma de diálogos, em que Sócrates, freqüentemente, assumia um papel importante. Vamos aqui nos referir a duas obras platônicas, importantes tanto para refletirmos sobre a figura de Sócrates quanto sobre a questão "o que é a Filosofia?".
 
A primeira dessas obras é conhecida como a Apologia (ou a Defesa) de Sócrates. 
Esse é o famoso quadro do pintor francês David, concluído em 1787, que mostra Sócrates prestes a beber o veneno que o mataria. No quadro, Sócrates aponta para o reino superior, que considerava ser seu destino final.
 
Essa obra relata o que teria sido o julgamento de Sócrates em Atenas. Sócrates sofreu um processo, movido especialmente por seus inimigos, sob a acusação de impiedade (foi acusado de não reconhecer os deuses da religião oficial de Atenas) e de corromper a juventude com suas ideias.
Por isso, foi levado a julgamento e, finalmente, condenado à morte. No julgamento, os juízes ofereceram a Sócrates uma saída negociada: à pena de morte, geralmente atribuída aos seus supostos crimes, poderia ser trocada pela pena de banimento ou pela de reclusão e de silêncio. Ou seja, Sócrates poderia continuar vivo e afastar-se de Atenas ou, se quisesse permanecer em sua cidade, encerrar-se em sua casa e parar de filosofar.
Sócrates, para surpresa dos juízes, recusou ambas as propostas e se submeteu, portanto, à pena de morte. Para justificar sua recusa, contou a história de como e por que começou a fazer Filosofia - história que, se não for verdadeira, ao menos é uma bela ilustração da maneira como Sócrates entende a tarefa do filósofo.
 
A história é a seguinte:
Havia, na Grécia antiga, um importante e venerado templo, dedicado ao Deus Apolo na cidade de Delfos. Nesse templo, funcionava um oráculo, que atraia multidões de peregrinos de toda a Grécia. Sócrates contou que um velho amigo, Xenofonte, indo uma vez a Delfos, perguntou ao oráculo, um pouco de brincadeira, se havia em toda a Grécia alguém mais sábio do que Sócrates - e o oráculo, para sua surpresa, teria respondido que não. Ora, para os que acreditam no oráculo,seria o próprio deus Apolo que estaria falando - e um deus, supostamente, não deveria dizer uma mentira. Diante da resposta do oráculo, Sócrates, então, que não se sentia sábio de maneira nenhuma, começou a se perguntar:
- Como pode ser que eu seja o mais sábio, quando eu mesmo conheço muitos outros que sabem mais coisas, que são mais corajosos, que são mais justos etc.? Diante da resposta surpreendente do oráculo, Sócrates começa a refletir seriamente, voltando seu pensamento para ele próprio, adotando como lema pessoal um dos preceitos da religião délfica (referente ao Oráculo de Delfos):
Conhece-te a ti mesmo.
Mas Sócrates percebeu que só a reflexão não seria suficiente. Logo procurou aqueles que julgava mais sábios que ele próprio, a fim de testar a veracidade do oráculo. Mas cedo percebeu que a "sabedoria" deles era falsa ou sem fundamento: eles pareciam sábios, até mesmo acreditavam que o eram, mas não tinham nenhuma sabedoria real. Ou seja, não conheciam a si mesmos, desconheciam sua própria ignorância. Sócrates então entendeu o que o oráculo teria dito: ele era o mais sábio, não porque sabia mais coisas, mas porque sabia que não sabia nada - e sabendo isso, estava pronto para começar a aprender, enquanto que aquele que achava que sabia, mas não sabia, não se esforçava para superar sua própria ignorância.
Esse trabalho de reflexão é, segundo essa concepção socrática de Filosofia, essencial à tarefa do filósofo. Ainda no seu discurso de defesa, diante dos juízes que o condenariam à morte, Sócrates disse: "uma vida sem exame não vale a pena ser vivida" - ou seja, para que tenha pleno valor, a vida precisava incluir a reflexão.
E, por essa razão, sugeriu Sócrates, ele não poderia aceitar as alternativas propostas pelos juízes: se saísse de Atenas, indo para outra cidade, lá seria estrangeiro e não teria a mesma liberdade de filosofar que tinha em sua cidade natal; se aceitasse se retirar para sua privacidade e parasse de fazer Filosofia, também estaria abrindo mão daquilo que ele pensava, tornar sua vida valiosa; assim, preferiu aceitar a pena de morte.
A segunda obra de Platão a que gostaríamos de fazer referência aqui, sempre em relação à figura de Sócrates e à ideia de filosofia que se encarna nela, é um de seus mais famosos diálogos, intitulado O Banquete.
O Banquete tem como pano de fundo um encontro de amigos que se reúnem para celebrar a premiação de um deles em um concurso de poesia. Reunidos, resolvem fazer uma espécie de concurso entre eles próprios: cada um, a seu turno, deveria fazer um discurso de elogio ao amor.
Ao chegar a vez de Sócrates, logo fica claro que um dos temas implícitos do diálogo não é o amor em geral, mas um tipo específico de amor: o amor à sabedoria, ou seja, a própria filosofia. Sócrates, ao invés de fazer um elogio ao amor, relatou uma conversa que teria tido, quando jovem, com uma mulher chamada Diotima de Mantinéia, na qual ela associava o desejo ou a aspiração amorosa com a aspiração à sabedoria - com a filosofia, portanto. Ela diz:
"Nenhum deus filosofa ou deseja ser sábio - pois já é -, assim como se alguém mais é sábio, não filosofa. Nem também os ignorantes filosofam ou desejam ser sábios; pois é nisso mesmo que esta o difícil da ignorância, no pensar, quem não e um homem distinto e gentil, nem inteligente, que lhe basta assim. Não deseja portanto quem não imagina ser deficiente naquilo que não pensa lhe ser preciso.
- Quais então, Diotima - perguntei-lhe - os que filosofam, se não são nem os sábios nem os ignorantes?
- É o que é evidente desde já - respondeu-me - até a uma criança: são os que estão entre esses dois extremos, e um deles seria o Amor. Com efeito, uma das coisas mais belas é a sabedoria, e o Amor é amor pelo belo, de modo que é forçoso o Amor ser filósofo e, sendo filósofo, estar entre o sábio e o ignorante."
O diálogo, que inicialmente parecia girar em torno do tema do amor, transforma-se, com Sócrates, em uma reflexão sobre a Filosofia. Uma última reviravolta é introduzida no final do texto, com a chegada inesperada de mais uma pessoa: o que começou como uma série de elogios ao amor e transformou-se em um elogio da Filosofia, termina como um elogio a Sócrates, que é mostrado, assim, como a própria personificação da Filosofia.
O exemplo de Sócrates mostra algumas características importantes da Filosofia: está comprometida essencialmente com a reflexão; impõe exigências de rigor para nossos conceitos; tem um caráter pedagógico, no sentido de que pretende nos pôr a caminho da sabedoria. Sobretudo, a Filosofia implica a promessa de alcançar um tipo de compreensão (por meio da apreensão de conceitos) que não seria alcançável de outra maneira.
 
Os historiadores geralmente concordam em dizer que a Filosofia nasceu na Grécia, no início do século VI a.C. Mais precisamente, a Filosofia, segundo a tradição historiográfica, nasceu no ano de 585 a.C., ano em que um pensador chamado Tales de Mileto teria previsto um eclipse solar.
Tales de Mileto é, de modo geral, considerado como o primeiro filósofo. Ficou conhecido por esse nome por ter nascido na cidade de Mileto, que, naquela época, era um atribulado porto grego na costa da Ásia Menor, que hoje conhecemos como Turquia. Note que o fato que o tornou célebre e determinou que fosse qualificado como "sábio" - ou seja, a previsão da ocorrência de um eclipse solar - não é algo que normalmente associamos à Filosofia; prever eclipses é, diríamos hoje,próprio dos astrônomos, não dos filósofos. Mas isso é significativo: no início, o que chamamos hoje de Filosofia e de Ciência se confundiam. 
Ciência e Filosofia eram uma coisa só; depois, ao longo dos séculos, as duas vão se separar. Entretanto, pelo menos até o século XVII, o que hoje chamamos de ciências fazia parte da Filosofia. Essa aproximação que havia entre Filosofia e Ciência permite que entendamos melhor a novidade do tipo de pensamento que estava surgindo.
 
COMO NASCEU A FILOSOFIA?
O ponto é: o que estava em jogo naquele momento inicial, lá no século VI a.C., era a busca de explicações para o mundo, o surgimento de um modo específico de explicar as coisas, pela ação e pela reflexão. Esse foi o novo modo de explicação que caracterizava o início da Filosofia.
Desde sempre, as pessoas se interessaram em explicar o mundo. Qual é a origem de todas as coisas? Como podemos explicar que o mundo está sempre mudando, mas, ainda assim, permanece o mesmo? O que é esta ordem que podemos frequentemente entrever por trás do aparente caos e da enorme multiplicidade dos fenômenos naturais?
Antes dos filósofos e dos cientistas - e não apenas entre os gregos antigos, mas em todas as culturas humanas - as pessoas já se colocavam questões como essas e buscavam respostas para elas. Nas religiões e na literatura, por exemplo, encontramos inúmeras tentativas de respondê-las. Qual a novidade da Filosofia (e da Ciência)? Para entender isso, vamos comparar dois textos. O primeiro é um trecho do poema intitulado Teogonia (ou seja, “origem dos deuses"), do poeta grego Hesíodo, que viveu no século VII a.C. O segundo, um texto de Aristóteles, filósofo que viveu bem mais tarde, no século IV a.C., sobre Tales de Mileto (nada de que Tales teria escrito chegou até nós).
Teogonia
Salve, ó filhas de Zeus, assegurai um doce canto
E celebrai a sagrada raça dos imortais que existem para sempre,
Os que nasceram da Terra e do Céu estrelado
E da Noite escura, e aqueles que o Mar salgado criou.
Dizei como no princípio os deuses e a terra passaram a existir,
E os rios e o ilimitado mar de impetuosas vagas,
E os astros fulgurantes e o amplo céu acima (...).
Dentre todos, primeiro veio o Caos; seguindo-se
A Terra de amplo seio, morada perene e segura de todos
 
Os imortais que guardam as alturas do nevado Olimpo,
E o nevoento Tártaro nos recessos do chão de largos caminhos,
E o Amor, o mais formoso dentre os deuses imortais (...).
Do Caos nasceram a negra Escuridão e a Noite;
E da Noite nasceram o Éter e o Dia
Aos quais ela concebeu e pariu depois de unir-se em amor com a Escuridão.
Primeiro pariu a Terra, igual em extensão a si mesma,
O Céu estrelado, para que a encobrisse por inteiro (...).
E pariu as altas Montanhas (...).
E pariu ainda a infatigável profundeza de impetuosas vagas,
 
O Mar, desprovido de amor desejável; e depois
Deitou-se com o Céu e pariu o Oceano de profundos torvelinhos
E Coió e Crio e Hipérion e Jápeto
E Teia e Reia e Justiça e Memória
E Febe, coroada de ouro, e a amorosa Tetis.
E depois deles, o mais jovem, o voluntarioso Crono, nasceu,
o mais terrível dentre sua prole; que a seu vigoroso pai odiava.
(Hesíodo, Teogonia)
 
[Diziam os primeiros filósofos] que o elemento e o princípio originário das coisas que existem é aquilo de que todas são constituídas, do qual primeiros se originam e em que por fim se dissolvem, permanecendo sua substância e alterando-se suas propriedades (...). Deverá existir alguma natureza - quer uma ou mais de uma - da qual as outras coisas se originam, ela mesma mantendo-se preservada. (...) Tales, o fundador desse tipo de filosofia, afirma tratar-se da água (por isso declara que a terra repousa sobre a água). Talvez tenha sido levado a essa concepção ao observar que o nutrimento de todas as coisas é úmido e que o próprio calor disso provém e disso vive (sendo aquilo de onde provém algo o seu princípio originário) - chegou à sua concepção tanto por essa razão como pelo fato de as sementes de todas as coisas apresentarem uma natureza úmida, e a água é o princípio natural das coisas úmidas.
(Aristóteles, Metafísica)
 
O que podemos dizer sobre esses dois textos? De início, podemos dizer que tocam em uma mesma questão: a origem de todas as coisas. Poderíamos imaginar alguém perguntando a Hesíodo: "Qual é a origem de toda esta multiplicidade que observamos no mundo - mares, montanhas, céu e terra? Como essas coisas vieram a existir da forma como existem? Como explicar as mudanças pelas quais passam e a ordem que observamos nessas mudanças?" A resposta de Hesíodo teria um caráter peculiar: é uma longa genealogia - é a história de urna família. No início, havia o Caos e a Terra. Do Caos, vieram a Escuridão e a Noite. Da Terra, o Céu, o Mar, e assim por diante. Hesíodo, contando essa história, quis oferecer uma explicação do mundo tal como o conhecemos. Já uma explicação diferente é oferecida por Tales, segundo Aristóteles.
 
Imaginemos agora alguém dirigindo aquelas mesmas questões a Tales. Sua resposta teria um caráter bem diferente e, em certa medida, desconcertante. Tales diria, simplesmente: toda a multiplicidade que vemos se origina de modificações da água; a regularidade que essa multiplicidade de fenômenos manifesta deve-se, primeiro, justamente, ao fato de, "por trás" dessa multiplicidade e das transformações que sofrem, estar uma mesma "base", uma mesma "substância", a água; e, segundo, ao fato de existir uma "lei" que rege as modificações da água, não ocorrendo simplesmente ao acaso. Em que a resposta de Tales difere da resposta de Hesíodo? A interpretação que Aristóteles oferece do pensamento de Tales fornece algumas indicações interessantes. Aristóteles diz que Tales pode ter chegado à sua tese a partir de um raciocínio, que poderíamos reconstruir assim: (a) o nutrimento de todas as coisas é úmido; (b) o próprio calor vive do úmido; (c) as sementes de todas as coisas apresentam natureza úmida; (d) aquilo de onde provém algo é o seu princípio; (e) a água é o princípio natural das coisas úmidas; (f) logo, a água é o princípio de todas as coisas.
 
Vamos analisar mais de perto esse raciocínio. Tales, segundo Aristóteles, parte de determinadas observações (expressas nas sentenças a, b, c), e, também, de determinados pressupostos conceituais, como o expresso na sentença d, que faz menção ao conceito de princípio, extremamente importante para os primeiros filósofos. Com esse conceito, Tales está direcionando sua investigação e organizando sua resposta àquelas questões que colocamos antes. Ele está dizendo-nos que nossa curiosidade sobre a origem das coisas pode ser respondida por uma investigação acerca dos princípios. Disso tudo, segue-se urna conclusão, expressa na sentença f.
Assim, ao contrário de Hesíodo, Tales está em melhores condições para nos dizer por que acredita ser a água o princípio de todas as coisas e por que essa tese funciona como uma resposta àquelas perguntas que fizemos. Ele pode apresentar suas razões. Hesíodo, por sua vez, pode apenas dizer, como sugere no início de seu poema, que aquela história lhe foi contada pelas Musas, aquelas "filhas de Zeus" a que alude no início.
 
Segundo Aristóteles, Tales pode fazer outro uso da sua tese de que a água é o princípio de todas as coisas. Tales, diz Aristóteles, afirmava que a terra repousava sobre a água. Isso era usado por ele como parte de uma explicação dos terremotos. Por que ocorrem terremotos?
Porque a terra repousava sobre a água, princípio de todas as coisas, e o movimento eventual da água se refletia na terra, causando os terremotos. Ou seja, Tales é capaz de ampliar a sua tese, explicando novos fenômenos naturais a partir de um único princípio, ampliando nossa compreensão da natureza e de suas regularidades.
Enfim, na estranha tese de Tales - a tese de que tudo é água - encontramos uma série de elementos (mesmo que ainda em germe) verificados também nas sofisticadas teorias científicas da ciência moderna. Embora hoje digamos que a tese de Tales é simplesmente falsa, sua estrutura, o modelo de explicação queimplica, não é muito diferente do que atualmente aceitamos como uma explicação cientifica. Foi a introdução dessa forma nova de explicar a realidade, no inicio do século VI a.C., que marcou o nascimento da filosofia (e da ciência). Você terá adiante a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre a evolução da filosofia ao longo de sua história.
 
Como se faz Filosofia? Atitude filosófica e reflexão filosófica: perguntar, duvidar, problematizar, investigar.
Agora que temos um conceito sobre o que é Filosofia, e já estudamos sobre o seu nascimento, podemos nos indagar: como se faz Filosofia?
Por exemplo, voltemos ao exemplo do conceito de FELICIDADE. Como já falamos, temos algumas ideias prévias sobre o conceito de FELICIDADE, ideias comuns e compartilhadas por muitas pessoas - ideias que, muitas vezes, aceitamos justamente por serem comuns e compartilhadas.
Como dissemos antes, aproximamos-nos da Filosofia quando buscamos refletir mais profundamente sobre um conceito, quando procuramos saber como ele realmente funciona, como ele se relaciona com outros conceitos. Ou seja, fazer Filosofia implica duas características principais:
  
1) A primeira seria negativa, pelo fato de negarmos um conceito recebido e tido como "verdadeiro".
2) A segunda seria mais positiva, pois no momento em que nos predispomos a avaliar um conceito tido como "verdadeiro" para a maioria das pessoas, interrogando-o para saber o que é, como é, por que é, estamos assumindo uma atitude filosófica, pois estamos nos afastando das ideias comuns e investigando mais detalhadamente sobre elas.
Examinemos mais de perto.
Quando nos perguntamos:
O que é? Estamos nos questionando sobre o que é a coisa ou a ideia que pretendemos investigar - qual é sua realidade ou natureza, qual é a sua significação. 
Como é? Estamos indagando qual é a sua estrutura e quais são as relações que a constituem.
Por que é? Estamos nos indagando sobre a origem ou a causa de uma coisa ou uma ideia.
 
 
Como vimos, a Filosofia está comprometida com uma reflexão sobre ideias pré-concebidas, buscando as causas e as razões dessas ideias, para que sejam apropriadas na forma de conceitos fundamentados.
Essa reflexão se inicia quando adotamos uma atitude filosófica, indagando: O que é? Como é? Por que é?, que são perguntas sobre a essência, a significação, a estrutura e a origem dessas ideias. Essa atitude filosófica se aproxima da atitude tomada por Sócrates quando começou a interrogar as pessoas que julgava mais sábias do que ele próprio. Sócrates logo percebeu que essas pessoas, na verdade, não tinham nada a ensinar que não fossem as ideias comumente repetidas por todos, sem maior crítica ou preocupação com o rigor. Em muitos casos, as pessoas com quem ele falava se sentiam ofendidas - não por acaso. Sócrates acumulou muitos inimigos ao longo de sua vida. Em outros casos, as pessoas percebiam que lhes faltava alguma coisa, e mudavam sua atitude, como dizia Sócrates, colocavam-se na posição de começar a filosofar.
 
Essa atitude filosófica lembra-nos também uma outra ideia, vista em Platão e Aristóteles, os quais diziam estar a Filosofia ligada ao espanto, à admiração. Platão afirmava no diálogo de Teeteto ser a admiração a verdadeira característica do filósofo e que a Filosofia não teria outra origem. Aristóteles declarou: "Foi, com efeito, pela admiração que os homens, assim hoje como no começo, foram levados a filosofar (...), [pois justamente] quem duvida e se admira, julga ignorar" (Aristóteles, Metafísica, Livro l). Esse trabalho inicial de questionamento - essa admiração - desdobra-se, então, na reflexão filosófica, que dirige as questões iniciais em busca de respostas a elas. A Filosofia não é uma pesquisa de opinião, não é um "eu acho que...". Ela trabalha com ideias e conceitos precisos, construídos de forma rigorosa. Quando buscamos um encadeamento entre eles é que conseguimos sair do "eu acho que" e chegamos ao "eu penso que". Assim nos distanciamos do que chamamos de senso comum para construirmos um conhecimento filosófico.
 
PARA QUE SERVE A FILOSOFIA?
Qual é a finalidade de estudarmos Filosofia? Ou ainda, qual a sua utilidade para o homem? Estamos sempre nos perguntando o para quê das coisas, qual a sua utilidade na nossa vida.
Parece muito fácil entendermos, por exemplo, a utilidade das ciências: Biologia, Química, Física etc. Para começar, parece que o objeto de estudo dessas ciências é bem definido e fácil de ser encontrado. Por exemplo, sabemos que a Biologia estuda a vida em seus diferentes contextos, a Química estuda as propriedades e as características das substâncias e dos elementos, a Física, os fenômenos físicos da natureza. E, então, como fica a Filosofia? Qual seria o seu objeto de estudo?
A Filosofia não é uma ciência no mesmo sentido daquelas que mencionamos, mas se preocupa em alcançar um tipo de conhecimento. O seu objeto de estudo é o mundo em todas as suas dimensões e o homem enquanto ser racional que vive neste mundo. Por ter um objeto de estudo tão abrangente, muitos acham que a Filosofia não serve para nada. Ou, ainda, que serve para tudo. Qual seria então a sua utilidade?
  
Veja, a seguir, o texto da filósofa Marilena Chauí, que tenta dar algumas respostas à questão:
Qual seria, então, a utilidade da Filosofia?
Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se deixar guiar pela submissão às ideias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da história for útil; se conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciências e na política for útil; se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para serem conscientes de si e de suas ações numa prática que deseja a liberdade e a felicidade para todos for útil, então podemos dizer que a Filosofia é o mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes. (Marilena Chauí - Convite à Filosofia)
O texto nos ajuda a pensar que a filosofia está presente em nossas vidas em diferentes contextos. E ainda, se ela é útil ou não para a nossa vida dependerá da forma como escolhemos viver. Assim, lembrando do exemplo de Sócrates, podemos escolher ou não seguir seu lema pessoal "Conhece-te a ti mesmo".
 
E para que serve a Filosofia hoje? Devido à abrangência do campo de estudos da Filosofia, ela sempre fez parte da vida das pessoas. Mesmo quando não sabemos o que é a Filosofia, muitas vezes nos encontramos naquele estado de admiração ou de espanto que nos faz refletir. Muitas vezes, adotamos uma atitude filosófica, mesmo sem ter Iido o que os filósofos escreveram ou sem conhecer as teorias filosóficas. Assim, podemos dizer, a princípio, que todos nós podemos fazer Filosofia, ou seja, temos a capacidade de pensar, de usá-Ia como um método de construção das nossas ideias em todas as áreas do conhecimento.
Você deve ter notado que muitos filósofos são entrevistados em jornais, TV e rádios para comentarem sobre os acontecimentos cotidianos. Isso porque a Filosofia os prepara para pensar claramente sobre os problemas da vida, devido ao seu extenso campo de atuação. Conhecer o que os filósofos já acumularam ao longo do tempo, os conceitos que propuseram, os argumentos que apresentaram, o exemplo de reflexão que nos deixaram ajuda a enriquecer nossa própria reflexão.
 
Oráculo de Delfos
Durante mais de 15 séculos, do nascimento ao fim da cultura grega antiga, o Oráculo de Delfos, ou templo de Apolo, serviu como local onde os peregrinos, vindos das mais diversas latitudes do mundo helênico, consultavam as pitonisas, as sacerdotisas oraculares, para saber qual o seu destino, o de sua família ou o de sua pátria. Delfos tornou-se um dos lugares sagrados mais venerados pelos gregos, sendo que suas previsões e predições tiveram enorme repercussão nos destinos de reis, de tiranos e de muita gente famosa daqueles tempos.
 
Aprendendo a filosofar
A Filosofia é um modo de pensar que acompanha o ser humano na tarefa de compreender o mundo e agir sobre ele. Mais que postura teórica, é uma atitudediante da vida, tanto nas condições corriqueiras como nas situações-limites que exigem decisões cruciais. Por isso, no encontro com a tradição filosófica não devemos nos restringir a recebê-lo passivamente como um produto, mas sermos capazes, cada um de nós, de nos aproximarmos da filosofia como processo, ou seja, como reflexão crítica e autônoma a respeito da realidade vivida.
Lembrando Jaspers, a filosofia é a procura da verdade, não a sua posse, porque “fazer filosofia é estar a caminho; as perguntas em filosofia são mais essenciais que as respostas e cada resposta transforma-se numa nova pergunta”.
(Extraído de: ARANHA, M. Lucia A.; MARTINS, M. Helena P. Filosofando; introdução à Filosofia. 3 ed. Revista. São Paulo: Moderna, 2003. p. 91)
ASPECTOS DA HISTÓRIA DA FILOSOFIA
 
A história da Filosofia é dividida em quatro grandes períodos, correspondentes aos quatro períodos em que tradicionalmente se divide a História: antiguidade, idade média, idade moderna e idade contemporânea. Vamos agora falar brevemente de algumas características da Filosofia em cada um desses períodos.
 
 
FILOSOFIA ANTIGA
O período da história da Filosofia antiga se estende desde o início do século VI a.C (585 a.C.), quando nasce a Filosofia, até o ano de 529 d.C., quando o Imperador Império Romano do Oriente, Justiniano, manda fechar as escolas filosóficas que ainda existiam na cidade grega de Atenas - entre elas a Academia, fundada por Platão. Abrange, portanto, um longo período de mais de um milênio, dominado por diversas correntes filosóficas, basicamente de origem grega, organizadas, geralmente, na forma de escolas. 
Esse longo período, de 10 séculos, é tradicionalmente dividido em dois: o período pré-socrático e o socrático. O período que vai de 585 a.C. até mais ou menos o final do século V a.C. é conhecido como período pré-socrático. Nesse período, a atividade filosófica se concentrava em torno da questão cosmológica, ou seja, na procura de respostas às perguntas sobre a origem do cosmos (ou do universo), sobre o princípio de todas as coisas, sobre a regularidade da natureza.
Os filósofos desse período, portanto, estavam preocupados basicamente em explicar a natureza (em grego, natureza é physis; por essa razão, Aristóteles se refere a eles como fisiólogos, ou seja, estudiosos da natureza). Não que ignorassem outras questões como as éticas ou políticas, por exemplo, mas sua preocupação principal era construir teorias sobre o mundo e sobre a natureza. Isso muda, justamente, com o exemplo de Sócrates, que você viu antes. Sócrates volta a preocupação dos filósofos para questões humanas tais como: o que são as virtudes? Como posso alcançar uma vida virtuosa? O que é a justiça? Como podemos organizar nossa vida social e política de forma mais justa ? O que é o conhecimento e a ciência?
Depois de Sócrates, a Filosofia entrou em um período de grande fertilidade - era a idade de ouro da Filosofia antiga. No século IV a.C., dois grandes filósofos desenvolveram suas atividades, criando sistemas filosóficos que, até hoje, são referências importantes para o pensamento.
O primeiro deles foi Platão (428 a.C. - 347 a.C.), discípulo de Sócrates e fundador de uma escola que ficou conhecida como a Academia. O segundo filósofo importante foi Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.), discípulo de Platão e fundador da escola conhecida como Liceu. Em 338 a.C., os Macedônios (povo vizinho aos gregos) conquistaram a Grécia, e as cidades-estado gregas perderam sua autonomia. No novo contexto social e político, uma série de novas escolas filosóficas surgiram. Duas delas são particularmente importantes, em função da durabilidade de suas ideias e da influência que exerceram na filosofia: a escola estóica, fundada em Atenas pelo filósofo Zenão de Cicio (336 a.C.- 264 a.C.), e a escola epicurista, fundada também em Atenas por Epicuro de Samos (342 a.C. - 271 a.C.). O pensamento dessas escolas teve uma influência bastante grande no desenvolvimento do pensamento filosófico na Roma antiga, antes e depois do surgimento do cristianismo.
 
 
ALGUNS FILÓSOFOS DA ÉPOCA
Platão - 427 a.C. - 354 a.C.
Nasceu em Atenas, na Grécia, em 427 a. C., de família aristocrática. Foi o mais famoso discípulo de Sócrates e contribuiu para perpetuar as ideias de seu mestre, registrando, em diversos diálogos, os seus ensinamentos.
Sua obra é vasta, abrangendo temas científicos, religiosos, morais, políticos e estéticos. Sua filosofia se fundamenta na noção de que existem dois mundos: um mundo aparente, que é o mundo que conhecemos por meio de nossos sentidos, que se caracteriza pela mutabilidade; e um mundo real, composto pelo que chamava de ideias ou formas, que, ao contrário, são imutáveis, fixas e perfeitas.
O verdadeiro conhecimento, sustentava ele, é o conhecimento das ideias, pois só no mundo imutável das formas é possível encontrar a verdade. O objetivo de sua filosofia era, então, levar-nos para além do mundo das aparências, em direção ao mundo das ideias, de modo que pudéssemos conquistar o verdadeiro conhecimento. Fundou uma escola de Filosofia, conhecida como a Academia, assim chamada por localizar-se nos jardins de Academos, perto de Atenas. Algumas de suas obras mais conhecidas são: A República; O Banquete, Apologia, Fédon e Criton.
 
Aristóteles - 384 a.C - 322 a.C.
Nasceu em Estagira, na Grécia, em 384 a.C. Ainda jovem, mudou-se para Atenas para estudar na Academia de Platão, de quem se tornou discípulo aos 17 anos. Aristóteles aprendeu muito com o mestre Platão, porém, rejeitava a ideia platônica da existência de dois mundos. Para Aristóteles só existe um mundo sobre o qual se pode filosofar, que é aquele em que vivemos. A sua vontade de conhecer o mundo o levou a estudar diferentes áreas do conhecimento, como Lógica, Física, Ciência Política, Metafísica, Ética.
 
Por volta de 335 a. C., fundou em Atenas sua própria escola, que passou a ser conhecida como Liceu, por localizar-se próxima ao templo dedicado a Apolo Liceano, e apelidada de escola dos peripatéticos, devido ao hábito de Aristóteles ensinar passeando com seus discípulos pelas avenidas arborizadas (peripatoi, em grego) que circundavam o templo. Sua Filosofia baseou a visão do mundo ocidental por muito séculos, até o surgimento da ciência moderna, no século XVII. Algumas de suas obras importantes são: a Ética a Nicômaco, Política, Poética, Retórica, Física e Metafísica.
Zenão de Cício - cerca de 334 a.C. - 262 a.C.
Nasceu na ilha de Chipre, na Grécia Antiga. Por volta de 312 a.C. - 311 a.C, foi morar em Atenas, onde teve contato com as ideias socráticas e platônicas. Fundou uma escola chamada Estoicismo, assim conhecida porque Zenão reunia seus discípulos perto de um dos pórticos (stoa, em grego) que marcavam a entrada da cidade de Atenas. Os estoicos desenvolveram uma Lógica e uma Física muito avançadas, mas foi sobretudo por seus ideais éticos que se tornaram conhecidos. Defendiam ideias bastante rigorosas, estabelecendo como ideal do sábio a autarquia (ou seja, a independência) e a ataraxia (a indiferença ou o autocontrole absoluto sobre suas paixões, emoções, sentimentos). 
Os estoicos se recusavam a ser governados por seus sentimentos, porque as emoções se tornariam obstáculo a um bom julgamento. Nenhuma obra completa dos estoicos gregos chegou até nós, mas suas ideias tiveram grande sucesso entre os romanos. Muitos grandes filósofos latinos, como Sêneca, inspiraram-se nas ideiasestoicas, que tiveram, também, grande impacto político, sendo adotadas por vários políticos importantes da história romana - inclusive imperadores, como o grande imperador Marco Aurélio, que reuniu suas reflexões e ideias no livro Meditações.
 
Epicuro de Samos - 341 a.C. - 270 a.C.
Nasceu em 341 a.C., na ilha de Samos, na Grécia. Fundou uma escola no jardim da sua casa, em Atenas (306 a.C.) e, ao invés de reunir seus discípulos para as aulas, passava o dia convivendo com eles como uma comunidade. Os epicuristas, como os estoicos, também desenvolveram uma Física avançada. Abraçaram e desenvolveram a ideia de quetudo é composto de pequenas partículas ou átomos, teoria proposta anteriormente pelo filósofo pré-socrático Demócrito, mas se destacaram sobretudo por suas ideias éticas.
O objetivo de Epicuro era libertar as pessoas do medo, não só do medo da morte, mas do medo da vida, ensinando-as a buscar a felicidade e a realização de suas vidas privadas. O modo de alcança-Ia consistia em desligar-se da violência e das incertezas da vida pública e retirar-se em comunidades. As comunidades eram abertas para qualquer um, inclusive mulheres e escravos, e nelas eram valorizadas a saúde física e as boas relações interpessoais. Os epicuristas, como os estoicos, também buscavam um ideal de autocontrole e tranquilidade da alma, mas não aceitavam que os sentimentos, emoções ou paixões fossem intrinsecamente maus.
 
FILOSOFIA MEDIEVAL
Convenciona-se encerrar o período da Filosofia antiga em 529 d.C. Começou aí a história da Filosofia medieval, que vai se caracterizar sobretudo pelas várias tentativas de aproximar o pensamento filosófico grego das novas ideias introduzidas junto com o cristianismo. A aproximação entre o pensamento filosófico e o cristão já havia começado antes, desde os primeiros tempos do cristianismo. Esse período de transição entre o pensamento grego e o medieval, no qual as ideias cristãs são pouco a pouco associadas aos conceitos filosóficos gregos, é conhecido como patrística, porque os principais filósofos desse período são chamados, pela igreja católica, de País da Igreja.
A Filosofia medieval ficou fortemente associada ao desenvolvimento de uma forma de pensar que ganhou o nome de Escolástica, nome que se dá à mistura de filosofia e teologia cristã típica da Idade Média. A Escolástica começou a definir-se como a forma predominante de fazer Filosofia por volta do século IX e atingiu seu auge no século XIII, com a Filosofia de Santo Tomás de Aquino (1225 - 1274). Entrou em decadência quando se anunciavam os primeiros sinais do Renascimento, amplo movimento cultural que, do século XIV ao século XVII, transformou o panorama intelectual da Europa.
 
Santo Agostinho - 354 - 430.
Agostinho nasceu na cidade de Hipona, no norte da África, onde hoje é a Argélia. Seu pai era pagão, mas sua mãe, pelo contrário, era uma cristã praticante, e foi quem o influenciou para a religião (mais tarde, sua mãe seria canonizada como Santa Mônica). Agostinho estudou para ser professor de retórica, mas foi atraído para a Filosofia e para a religião por sua preocupação com o problema do mal: o que é o mal? Como pode ser que Deus, criador de todas as coisas e infinitamente bom, tenha permitido a existência do mal? Agostinho encontrou inspiração na filosofia de Platão, que associou com a teologia cristã.
Em sua resposta ao problema do mal, procurou mostrar que o mal não é uma realidade, mas é uma falta (assim como a sombra não é uma realidade, mas apenas a falta de luz) e que Deus não é responsável por ele, mas, sim, o próprio homem com seu livre- arbítrio. Em 391, foi ordenado padre e, poucos anos depois, foi consagrado bispo. Governou a igreja de Hipona até a morte, em 28 de agosto do ano 430. Principais obras: As confissões e A cidade de Deus.
 
 
 
Santo Tomás de Aquino - 1225 - 1274.
Nasceu em Nápoles, na Itália. Baseou seus estudos principalmente em Aristóteles. Tomás de Aquino entrou para a Ordem dos Dominicanos em 1243 e em 1248 ordenou-se sacerdote. O seu grande trabalho filosófico foi realizar uma importante síntese sobre tudo o que fora debatido no pensamento ocidental até sua época e mostrar que isso era compatível com a crença cristã. Foi professor de Filosofia e Teologia na Universidade de Paris, consolidando ali um método e um estilo de fazer Filosofia, que passou a caracterizar o que se conhece como escolástica. Principais obras: Suma teológica e Summa contra Gentilles.

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