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Geopolítica Geral e do Brasil Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Ms. Flávio Silva Revisão Textual: Profa. Esp. Kelciane da Rocha Campos Geopolítica no Brasil 5 · O início do pensamento geopolítico no Brasil · A geopolítica brasileira no início do Século XX · A geopolítica brasileira após a Segunda Guerra Mundial · Os Governos Militares · Nesta unidade, analisaremos a Geopolítica do Brasil do início do século XX e as relações de poder geradas pela Segunda Guerra Mundial, até o regime militar. Esta unidade sobre Geopolítica tem o objetivo de destacar a geopolítica do Brasil até o final dos governos militares, considerando a definição das fronteiras no “pós-tratado de Tordesilhas”, passando pelas arbitragens internacionais ou acordos bilaterais e finalizando na tentativa de influência dos governos militares na América do Sul. É importante que você leia todo material teórico com atenção e assista às videoaulas para que possa construir conhecimentos acerca do tema. Ao final, as referências bibliográficas poderão ser utilizadas, caso queira, para que você se aprofunde no tema. Lembre-se também de que esta disciplina faz parte da grade curricular do seu curso; portanto, é importante ao seu processo de formação. Geopolítica no Brasil 6 Unidade: Processos Erosivos e as Rochas Sedimentares Contextualização O Brasil e os países da região amazônica Com a intensificação do seu desenvolvimento industrial, o Brasil voltou-se mais e mais para os países da região amazônica, ou seja, para a Bolívia, Peru, Equador, Venezuela, Colômbia, Suriname e Guiana, cuja massa demográfica, no conjunto, representava por volta da primeira metade dos anos 80 do século XX um mercado da ordem de 87 milhões de habitantes, o equivalente a 61% da população brasileira, espalhando-se até o Oceano Pacífico e o Caribe. Era necessário abrir mercados para as suas manufaturas e o comércio da região amazônica com as repúblicas do Pacífico saltou de US$ 173 milhões, em 1972, para US$ 2,3 bilhões em 1982 (Ricupero, janeiro/março, 1984, Senado Federal, p. 63). E seu fomento, visando a integração e unificação da América do Sul, requeria o desenvolvimento dessa imensa região, a Amazônia, que separava os mercados às margens do Pacífico e do Caribe dos centros industriais do Brasil, situados no litoral do Atlântico. O desenvolvimento da Amazônia dependia, entretanto, da cooperação com os países vizinhos, porquanto sete das dez fronteiras internacionais do Brasil localizavam-se quase integralmente naquela região, somando 12.114 km, o que representava cerca de 80% do total de sua fronteira terrestre. Assim, com o propósito de incrementar o desenvolvimento trans-fronteiriço, o Itamaraty, durante o governo do general Ernesto Geisel (1974-1979), empreendeu as negociações, a cargo do embaixador Rubens Ricupero, para a celebração, em 3 de julho de 1978, do Tratado de Cooperação Amazônica. O que inspirou a negociação desse Tratado, com características similares ao Tratado da Bacia do Prata, foi possibilitar sua ocupação de forma racional e evitar que potências estranhas à região se introduzissem na Amazônia, sob qualquer pretexto. Essa preocupação levou o presidente João Batista Figueiredo a evitar que os Estados Unidos, em 1981, interviessem no Suriname, conforme o presidente Ronald Reagan pretendera, para depor o governo de Desiré Delano (Desi) Bouterse, sob a alegação de que ele estava a acercar-se politicamente de Cuba. Assumiu a tarefa de resolver o problema. E conseguiu-o. (Fonte: BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. O Brasil como potência regional e a importância estratégica da América do Sul na sua política exterior. Disponível em http://www.espacoacademico.com.br/091/91bandeira.htm. Acesso em: 18 jan. 2015. Trecho reproduzido integralmente.) 7 O início do pensamento geopolítico no Brasil A formação do Brasil, através da colonização portuguesa, tem por consequência um processo histórico que não pode ser desassociado ao de Portugal, e o país tinha dimensões territoriais bem diferentes da que conhecemos na atualidade: [...] Nasceu com dimensões territoriais modestas – aproximadamente 2800000 km2, segundo o Meridiano de Tordesilhas – e teve esse território consideravelmente ampliado, graças à anexação de porções que se encontravam sob o domínio espanhol (Mapa 1). (ANDRADE, 2001, p. 11) Mapa 1 - Tratado de Tordesilhas Fonte: estudopratico.com.br O processo geopolítico brasileiro foi implementado pelas suas elites desde que era colônia, segundo textos e documentos de pensadores, de políticos e de militares. A interferência do diplomata Alexandre de Gusmão foi fundamental para que o território pertencente a Portugal se expandisse a oeste, ou seja, às terras sob o domínio espanhol, através de um princípio denominado Uti possidetis, que é uma forma diplomática que estabelece o direito de um país a um território, baseada em sua ocupação pacífica. 8 Unidade: Processos Erosivos e as Rochas Sedimentares Você sabia? Por ocasião da independência do Brasil, o cientista e político José Bonifácio de Andrada e Silva dirigiu a política do novo Estado a fim de manter as estruturas coloniais conservadoras como a forma monárquica de governo; para manter a credibilidade do seu projeto, programou a transferência da capital do Império para o Planalto Central e defendeu uma política de libertação gradativa da escravidão. Compreendia ele que, no século XIX, os Estados não podiam se consolidar apenas em torno dos interesses dinásticos, mas que deveriam se formar em torno das nações. No período imperial, os estadistas mais proeminentes procuravam manter fechada à navegação estrangeira a bacia Amazônica, na mesma ocasião em que defendiam a abertura da navegação do rio da Prata. Essa política levou o Brasil a intervir no Prata, muitas vezes, como durante a incorporação do Uruguai – 1816-1828 –, período da tentativa de Rosas de realizar a unificação da Argentina em torno dos limites do antigo Vice-Reinado do Rio da Prata (1851-1852) e, finalmente, de 1864 a 1870, quando, aliado à Argentina e ao Uruguai, destruiu o Estado autárquico que se formava no Paraguai, mediante a ditadura de Lopez. ANDRADE, 2001, p. 11 – Reproduzido integralmente. A geopolítica brasileira no início do Século XX No início do século XX, houve uma grande rivalidade entre o Brasil e a Argentina com disputas por áreas de influência no Paraguai, Uruguai e Bolívia. No pós-Segunda Guerra, o desenvolvimento industrial do Brasil foi bem mais acelerado do que o argentino, tendo intensificado sua política de expansão na região Centro-Oeste na Amazônia, inclusive se fazendo presente nas Guianas, nos países da bacia amazônica e nos próprios países platinos. Na região amazônica, no entanto, existia a questão fronteiriça com as Guianas. De acordo com o Tratado de Utrecht, a fronteira entre o Brasil e a Guiana Francesa seria o rio Vicente Pinzõn, mas em grandes trechos a leste desse rio, que o Brasil fazia corresponder ao Oiapoque, havia uma forte penetração dos franceses, que pretendiam estender os seus domínios até as proximidades do rio Amazonas e advogavam que o rio Vicente Pinzõn era o Araguari e não o Oiapoque. (ANDRADE, 2001, p. 39) Essa discussão se manteve por mais de cem anos até que, em 1900, o presidente Walter Hauser da Suiça arbitrou, com o consenso dos dois países, a favor do Brasil, ou seja, que a fronteira deveria ser, efetivamente, no Oiapoque. 9 Os ingleses se estabeleceram nas Guianas, no século XIX, conquistando terras à Holanda e à Venezuela para formar a atual República da Guiana; daí tentaram se expandir em direção às nascentes do Amazonas, reivindicando a posse dos campos de Pirara. (ANDRADE, 2001, p. 40) Esse impasse foi decidido, a favor do Brasil, por laudo arbitral pelo rei da Itália, tendo dividido a área entre os dois países, em 1904, após disputas entre o Brasil e a Inglaterra. Mas, ao contrário do que possa parecer, a questão das Guianas nãoteve um desfecho final, já que a Guiana Francesa permanece como um departamento da França. Já as outras Guianas mantiveram suas permanências aos estatutos coloniais - a inglesa até 1961 e a holandesa até 1975. Houve várias propostas em relação à questão, como, por exemplo, a que ocorreu em 1947, quando o brigadeiro Lysias Rodrigues propôs o controle mais eficaz da foz do Amazonas com a aquisição da Guiana Francesa. O povoamento da área que compreende a porção oriental da Bolívia e do Peru, realizado por seringueiros nordestinos que adentravam a região pelos rios Acre, Juruá e Purus e a falta de condições por parte daqueles países de controlarem aquele território, cumprindo, assim, o Tratado de Madri, fez com que os dotes diplomáticos de Rio Branco promovessem um acordo com a Bolívia, a fim de que a região do Acre fosse repassada ao Brasil ao custo de dois milhões de esterlinas, a construção de uma ferrovia que transportasse a produção da Amazônia da parte boliviana para o Atlântico e alguns ajustes de regiões de fronteira. Para finalizar o acordo, em 1909 finalizou-se a questão em relação à definição das fronteiras com a assinatura, em conjunto com o Peru, do Tratado de Petrópolis. Nos fins do século XIX, o Brasil manteve uma questão fronteiriça com a República Argentina, que pretendia expandir o território de Missones por terras hoje pertencentes ao Paraná e à Santa Catarina. Advogavam os argentinos que os rios Cochim e Chapecó serviam de divisa entre os dois países, região à qual denominavam área de Missões, ao passo que os brasileiros achavam que a demarcação deveria correr pelos rios Peperiguassu e Santo Antônio, a oeste. (ANDRADE, 2001, p. 42) Para a resolução desse impasse, houve a necessidade de mediação internacional, sendo essa questão mediada pelo então presidente norte-americano Grover Cleveland, em 1895, tendo entendido que a questão era favorável ao Brasil. Quanto aos demais acordos em relação ao estabelecimento das fronteiras, o Brasil os estabeleceu com o Uruguai em 1851, com a Venezuela em 1859 e com a Colômbia em 1907. Até a década de 1920, os limites fronteiriços do Brasil estavam delimitados, no entanto com a necessidade de seu povoamento. Nos dias atuais, porém, pode-se observar a movimentação 10 Unidade: Processos Erosivos e as Rochas Sedimentares de pessoas, como ocorre em relação à Guiana Francesa, cujos salários são mais altos, além de haver uma demanda a trabalhadores, ou ainda, como ocorre em relação ao Paraguai, Peru, Bolívia, Venezuela e Colômbia, com o avanço de brasileiros; além do Uruguai e da Argentina, em que, além da presença de brasileiros, existe a proliferação da cultura e da língua. Conforme conclui ANDRADE (2001), a integração política do território está sendo complementada pela integração econômica e social. As questões de fronteira discutidas poderão ser mais facilmente visualizadas através do mapa a seguir, em que são identificados os principais pontos de contestação, englobando ao Norte as Guianas e suas fronteiras com os Estados de Roraima e do Amapá; a Oeste, o Peru e a Bolívia e suas fronteiras com os Estados do Amazonas e do Acre, e ao Sul, o Paraguai, Uruguai e a Argentina e suas fronteiras com os Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Mapa 2 - A República e as Questões de Fronteira Fonte: ANDRADE, 2001, p. 41. Getúlio Vargas, ao assumir a presidência, tinha como meta concentrar as decisões políticas e econômicas do Brasil, mudando, assim, o eixo político e econômico que assumiria, então, uma tendência nacionalista. Vargas havia assumido o governo com a ajuda dos militares, assumindo os poderes executivo e legislativo até a promulgação de uma nova Constituição. A geografia militar passa a ser uma disciplina obrigatória e base para as reflexões políticas à época. Nesse cenário, e com o objetivo de combater os movimentos com ideologias regionalistas e reaparelhar o Estado, 11 [...] foi criado, em 1931, o Conselho Nacional de Estatística, e em seguida foram organizados os Serviços Geográficos. Em 1932, foi organizado o Serviço Geográfico e Histórico do Exército, em substituição ao Serviço Geográfico Militar. Em 1934 foi instituído o Conselho Brasileiro de Geografia, mais tarde Conselho Nacional de Geografia. Ambos os Conselhos (de Estatística e de Geografia) comporiam em 1938 o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -IBGE. Com essas iniciativas, o Estado passava a dispor de instrumentos que lhe permitiam levar adiante a sua “ação modernizante”, o que incluía um novo tipo de gestão territorial [...]. (COSTA, 1992, p. 193) O objetivo, segundo alguns estudiosos, era que, através do conhecimento mais detalhado do território brasileiro, o governo pudesse fixar normas precisas para a “racionalização territorial” e a construção do Estado e da Nação, o que não será objeto de estudo neste momento. A geopolítica brasileira após a Segunda Guerra Mundial Como já pôde ser estudado na Unidade II, após a Segunda Guerra Mundial houve uma bipolaridade no mundo entre os Estados Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Em um primeiro momento, o Brasil tentou manter uma neutralidade sobre a questão, tendo, no entanto, aderido a um alinhamento com os EUA, situação esta que promoveu a recepção de uma orientação política, com a participação da Força Interamericana de Paz (FIP)1 e a assinatura do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (Tiar)2 . Segundo Andrade, a assinatura dos tratados pode ser entendida como uma nova fase na relação com os norte-americanos. Admitia assim, de acordo com o pensamento produzido pelos norte-americanos, que a fase da independência nacional estava ultrapassada, sendo substituída por uma interdependência e uma aliança incondicional com a potência que exercia a liderança no mundo ocidental – os Estados Unidos. (ANDRADE, 2001, p. 55) Tal situação promoveu sucessivas trocas de informações na esfera das Forças Armadas, sob o âmbito ideológico, levando, na década de 1960, em conjunto com os demais países do continente americano, ao rompimento de relações com Cuba e o apoio à intervenção dos EUA na República Dominicana. 1 A Força Interamericana de Paz foi criada pela OEA (Organização dos Estados Americanos) com o objetivo de intervir na crise política que havia surgido na República Dominicana entre 1965 e 1966. A força brasileira era composta por um efetivo de um batalhão reforçado, com tropas da Marinha e Exército Brasileiro e denominava-se Força Interamericana - Brasil (FAIBRAS). 2 O Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) foi assinado em 1947 e seu principal objetivo era o de assegurar a paz por todos os meios possíveis, prover auxílio recíproco efetivo para enfrentar os ataques armados contra qualquer Estado Americano e conjurar as ameaças de agressão contra qualquer deles. 12 Unidade: Processos Erosivos e as Rochas Sedimentares Além da questão ideológica, na esfera da economia, o Brasil se abriu ao capital estrangeiro e passou a depender da política externa, levando o Brasil à construção de grandes obras, concessões de áreas de minerações, que, além de produzirem danos financeiros, já que eram desvantajosas ao país, ainda promoveram danos irreparáveis ao meio ambiente, tal como aconteceu no Projeto Carajás. Além disso, houve sucessivos escândalos financeiros e, como recompensa, a maior dívida externa do mundo à época. Grandes corporações se instalaram no Brasil, principalmente nas regiões da Amazônia, Goiás e Mato Grosso. Na década de 1940, houve a proposta da criação do Instituto da Hiléia Amazônica, que seria composto pelo Brasil, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia, além dos controladores das Guianas: Inglaterra, Holanda e França. Tal situação promoveu um embate na Câmara dos Deputados, sendo que o ex-presidente (e na época deputado) Artur Bernardes reuniu esforços como oposição, para que o projeto fosse retirado da pauta e, portanto, nuncafosse sequer votado. Entendia-se que essa proposta traria consequências danosas à região amazônica, já que permitiria iguais direitos a países que tinham diferentes porções do território, além dos EUA e da Itália, que também teriam os mesmos direitos sem terem qualquer ligação territorial. Na década de 1960, no entanto, houve uma nova tentativa de se “investir” na região. Dessa vez, foi pelo Hudson Institute3, que propunha a criação de grandes lagos, através da construção de barragens, com objetivo de facilitar o escoamento da produção de minérios, como o ferro, manganês, bauxita e até ouro. Na verdade, o projeto não visaria o Brasil exatamente, mas sim o Peru, tendo sido fruto de um estudo solicitado pelo embaixador (e futuro ministro) brasileiro Roberto Campos ao Hudson, sobre a possibilidade de aproveitamento do Amazonas. Pelo fato de o instituto ter uma estreita ligação com a CIA e a consequente reação crítica pelo Brasil, o projeto foi entendido como sendo um instrumento a serviço dos interesses imperialistas dos EUA na Amazônia, tendo sido propositalmente esquecido. Figura 1 - Amazônia Brasileira e Amazônia Internacional Fonte: Portal Amazônia 3 O Hudson Institute de Nova York foi criado e dirigido pelo primeiro futurólogo do mundo, Herman Khan, e prestava serviços à CIA, a central de inteligência dos Estados Unidos. 13 Os militares brasileiros e a Geopolítica Em 1949, com a criação da Escola Superior de Guerra (ESG), o pensamento político brasileiro começou a se estruturar em bases realísticas e científicas. É a ESG responsável por uma doutrina política essencialmente brasileira,·fundamentada na dinâmica da aplicação do poder nacional. Assentada na relação de mútua causalidade entre Segurança e Desenvolvimento. Incorporou a ESG, no realismo de sua doutrina, os valores geopolíticos que vinham sendo levantados por todos aqueles que a precederam como instituto superior de altos estudos. De 1949 a 1964, durante 14 anos, a ESG não teve influência maior nas decisões de governo. Quando veio a Revolução de 1964, a doutrina da Escola Superior de Guerra já estava formulada e exercitada em termos laboratoriais e escolares. Foi fácil para o Chefe da Revolução, o Presidente Castelo Branco, e seus principais assessores, Golbery, Ernesto Geisel, Juarez Távora, Cordeiro de Fadas, todos ex-militares, participantes ativos na formulação dessa doutrina, pois todos haviam pertencido aos quadros da ESG, transferirem para a prática governamental a doutrina formulada durante 14 anos no casarão do Forte de São João. (COSTA, 1992, p. 216) – Reproduzido integralmente Os Governos Militares Os governos militares no Brasil tinham como discurso, no campo geopolítico, a ocupação e valorização da região amazônica, através de seu mapeamento e de políticas de desenvolvimento, tal como ocorreu no governo Médici através do Plano de Integração Nacional, e no governo Geisel com o Programa Polamazônia. Em 1967, foi criada a Zona Franca de Manaus, que não tinha somente um aspecto de ocupação territorial, mas também de impulso econômico à região, já que durante a década de 1960 empresas e contrabandistas adentraram a região da Amazônia, a fim de detectarem jazidas minerais, além de aviões da Força Aérea norte-americana fotografarem a região com equipamentos de detecção de jazidas de minerais radioativos. Em 1968, o Congresso brasileiro realizou uma investigação sobre vendas de terras a pessoas físicas ou jurídicas, identificando-se a comercialização de, aproximadamente, 20 milhões de hectares. A disposição dessas terras, segundo a CPI, “formam um cordão para isolar a Amazônia do resto do Brasil” (GALEANO, 2010). Também, em depoimento na CPI, o general Riograndino Kruel afirmou “que o volume de contrabando de materiais que contém tório e urânio alcança a cifra astronômica de um milhão de toneladas” (GALEANO, 2010). 14 Unidade: Processos Erosivos e as Rochas Sedimentares Em outubro de 1970 criou-se o Projeto RADAM - Radar na Amazônia, priorizando a coleta de dados sobre recursos minerais, solos, vegetação, uso da terra e cartografia da Amazônia e áreas adjacentes da região Nordeste. Em junho de 1971 iniciou-se o aerolevantamento. Devido aos bons resultados do projeto, em julho de 1975 o levantamento de radar foi expandido para o restante do território nacional, visando o mapeamento integrado dos recursos naturais e passando a ser denominado Projeto RADAMBRASIL. (Fonte: Serviço Geológico do Brasil, 2014) Com o projeto RADAM e RADAMBRASIL, o governo brasileiro passou a documentar internamente os recursos disponíveis, que tanto interessavam a países estrangeiros. Uma questão originou um foco de tensão no sul do país. Em 1973, Brasil e Paraguai assinaram o Tratado de Itaipu para a construção da usina hidrelétrica binacional. No entanto, no mesmo ano, Argentina e Paraguai assinaram o Tratado de Yacyretá, que idealizava o projeto da usina hidrelétrica de Corpus Christi, localizada entre Itaipu e Yacyretá. A assinatura do tratado entre o Brasil e o Paraguai colocou fim a qualquer disputa por Sete Quedas, no entanto criou um quadro de tensão entre os dois governos militares, do Brasil e da Argentina, pois a hidrelétrica de Corpus Christi inviabilizaria a construção de Itaipu, já que a vazão de água da usina de Corpus ficaria a 120m, enquanto a vazão de Itaipu ficaria em 105m (abaixo de Corpus), o que alagaria suas turbinas de geração de energia, conforme pode ser demonstrado na figura a seguir: Figura 2. Usinas de Itaipu e Corpus Christi Fonte: VEJA; n.° 464, 27 de julho de 1977; p. 20 (adaptado). 15 O impasse foi resolvido em 1979 no governo Figueiredo, em uma situação de política externa do Brasil voltada ao fortalecimento das relações com os demais países latino- americanos, com a assinatura de um acordo que previa o aproveitamento de Itaipu e Corpus, simultaneamente, através da readequação dos projetos. Em 1978, foi realizada a assinatura do Tratado de Cooperação Amazônica, que consistia na constituição de um sistema de cooperação entre os vários países em que a região amazônica fazia parte. Além disso, esse projeto panamazônico não tinha a influência de outros países, como os Estados Unidos ou os países da Europa, por exemplo, já que valorizaria os aspectos continentais do continente sul americano. Apesar de os governos militares prezarem a hegemonia da região amazônica brasileira, entre 1979 a 1986 houve a implantação do Projeto Carajás pela norte-americana United States Steel, que, mesmo antes do projeto Radam, vinha procurando manganês na região da Amazônia. Entendia-se que tal situação, no entanto, trazia um benefício: o controle do território pelo controle econômico, já que seria desnecessária a ocupação militar. Durante o período dos governos militares, o Brasil passou a intervir na política de seus vizinhos, tendo colaborado, segundo a imprensa, com golpes de extrema direita, dos quais se pode citar a deposição de Salvador Allende, no Chile, ou de Juan José Torres, na Bolívia. Com a participação do Brasil, a CIA (Agência Central de Inteligência dos EUA) promoveu a desestabilização dos governos com a criação de situações para que os golpes fossem bem sucedidos. Complementando o conhecimento... Quando em 1980 o coronel Desiré Bouterse assumiu o poder no Suriname, país muito rico em bauxita e, portanto, área de grande interesse para empresas mineradoras transnacionais, os norte-americanos ficaram apreensivos diante de uma possível aproximação desse país com o governo de Cuba, sobretudo depois que a Holanda cortou o auxílio que dava ao Suriname. Para evitar uma intervenção americana que poderia trazer problemas para o prestígio dos Estados Unidos na opinião pública internacional, o Brasil tratou de se aproximar e de “amaciar” o coronel ditador, fornecendo créditos e vendendo armas, afastando-o de uma maior aproximação com Cuba. ANDRADE, 2001, p. 57 – Reproduzido integralmente. A geopolítica brasileira, segundo a correntemilitar, baseou-se no “triunfalismo do discurso geopolítico”, pois tendeu à projeção de políticas externas hegemônicas no Terceiro Mundo, especialmente na América do Sul, e a um alinhamento automático às potências industriais. Tal situação ocorreu, segundo ANDRADE (p. 221), pelo fato de a metodologia utilizada pelos militares nesse pensamento estar relacionada à questão do espaço e da posição do país, aliada à sua organização em torno de indicadores quantitativos, como o Produto Nacional Bruto (PNB), sua extensão territorial, seus recursos naturais e a população, sem levar, no entanto, em consideração qualquer aspecto qualitativo desses indicadores, tais como o grau de segurança que seria desejável à sociedade civil e a capacidade do país na organização das relações de poder no mundo. 16 Unidade: Processos Erosivos e as Rochas Sedimentares Ao demolir o mito do “Brasil-Potência”, verdadeiro ícone do regime militar, Cavagnari expõe com toda a crueza a fragilidade da base sobre a qual se erigiu esse mito: a velha geopolítica dos generais e seus acólitos, cujas teses povoaram as esferas do poder civil e militar do país desde o advento da República. De fato, para os que defendem projetos de grandeza, (explícitos em Golbery e Meira Mattos, por exemplo), desde a década de 50, constitui um duro golpe reconhecer as limitações e o desempenho modesto de um país territorialmente grande mas social e economicamente frágil. (ANDRADE, 2001, p. 222 e 223) O Brasil não dispunha de um poder excedente para desempenhar o papel se superpotência, já que, à época dos presidentes militares, havia uma divisão geopolítica do globo entre os americanos e os soviéticos. Poderia se inserir apenas como uma potência regional sul americana, já que no continente americano (como um todo) existia a hegemonia norte-americana. Ao contrário do que os líderes brasileiros acreditavam, o Brasil apenas se tornou um intermediário nas negociações norte-americanas, ou seja, não estava a caminho de se tornar uma grande potência. 17 Material Complementar No artigo Geopolítica da Amazônia, a autora Bertha K. Becker discorre sobre a questão geopolítica da região amazônica no momento histórico atual, no entanto citando suas causas, que é objeto de estudo desta unidade. Becker cita a mercantilização da natureza, situação esta que sempre esteve presente nas justificativas exploratórias ao longo das décadas. Trata-se de um material complementar interessante para não só complementar o conhecimento, mas também como objeto de reflexão. Sites: Para baixar a publicação, acesse: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_pdf&pid=S0103-40142005000100005&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt BECKER, Bertha K. Geopolítica da Amazônia. Estudos avançados, São Paulo, v. 19, n. 53, abr. 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S0103-40142005000100005&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt Acesso em: 18 jan. 2015. 18 Unidade: Processos Erosivos e as Rochas Sedimentares Referências ANDRADE, Manuel Correia de. Geopolítica do Brasil. Campinas-SP: Papirus, 2001. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS FORÇAS INTERNACIONAIS DE PAZ NA ONU. A Participação Brasileira nas Forças de Paz na ONU. Disponível em: http://www.abfiponu.org.br/historia02.html. Acesso em: 12 dez. 2014. BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. O Brasil como potência regional e a importância estratégica da América do Sul na sua política exterior. Revista Espaço Acadêmico, nº 91, mensal. Disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/091/91bandeira.htm. Acesso em: 14 dez. 2014. CENTRO DE ESTUDOS EM SUSTENTABILIDADE DA EAESP/FGV. Os grandes lagos: a CIA na Amazônia. In: Índice de Sustentabilidade Empresarial. Publicado em: 17 set. 2012. Disponível em: http://isebvmf.com.br/index.php?r=noticias /view&id=247303. Acesso em 13 dez. 2014. COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR – CNEN. Tratado Interamericano de Assistência Recíproca e Respectivo Protocolo de Reforma (Pacto do Rio). Disponível em: http://www.cnen.gov.br/Doc/pdf/Tratados/TRAT0005.pdf. Acesso em: 12 dez. 2014. COSTA, Wanderley Messias da. Geografia Política e Geopolítica: discursos sobre o território e o poder. São Paulo: Hucitec; Edusp, 1992. GALEANO, Eduardo Hughes. As veias abertas da America Latina. Porto Alegre: L&PM Editores, 2010. MORAES, Marcos Antonio de. FRANCO, Paulo Sergio Silva. Geografia Econômica: Brasil, de colônia a colônia. Campinas-SP: Editora Átomo, 2010. 2ª Edição. PORTAL AMAZÔNIA.COM. Amazônia, Amazônia Legal e Região Norte. Disponível em: http://www.portalamazonia.com.br/editoria/files/2014/06/amazonia-legal-brasileira-regiao-norte-2.jpg. Acesso em: 13 dez. 2014. SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL. Projeto RADAM-D - Preservação e disseminação das imagens originais geradas pelos projetos RADAM e RADAMBRASIL. Disponível em: http://www.cprm.gov.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=796&sid=9. Acesso em: 13 dez. 2014. 19 Anotações
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