Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Patrimônio e Restauro Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Me. Renata Guimarães Puig Revisão Textual: Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira As Cartas Patrimoniais • Critérios e Abordagens Adotadas por Documentos Internacionais. • Conhecer e entender o que são as Cartas Patrimoniais e sua importância. OBJETIVO DE APRENDIZADO As Cartas Patrimoniais Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam- bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE As Cartas Patrimoniais Critérios e Abordagens Adotadas por Documentos Internacionais As Cartas Patrimoniais são documentos bastante concisos a respeito de conceitos e medidas pertinentes à restauração, à conservação e à promoção do patrimônio histórico e artístico, que servem para orientar os países no trato de seus bens culturais. Elas não são redigidas em favor de uma ou outra linha teórica, mas sim, a partir de um consenso dentre as ideias mais amplamente discutidas naquele momento histórico. Por isso, cada uma das cartas apresenta conceitos e medidas que, a prin- cípio, podem parecer contraditórios. As cartas têm caráter indicativo ou, prescritivo, mas nunca normativo. Muitas das decisões tomadas em projetos que intervêm em edifícios históricos, princi- palmente esses de longa data, são pautadas num documento emitido em 1964, conhecido como Carta de Veneza, que logo estudaremos. Esta Carta teve como principal influência os princípios do restauro crítico, abordado na unidade anterior (Figura 1). Conheceremos algumas destas Cartas ao longo da unidade. Figura 1 – Escavações Fonte: Colegio de Arqueólogos del Cusco Conferência de Atenas (1931) O problema da conservação e do restauro foi ampliado ao longo do século XX, não apenas devido aos esforços dos teóricos e críticos como Camillo Boito, Alois Riegl e Cesare Brandi, mas também a um importante evento que consolidou os princípios e as doutrinas concernentes à preservação patrimonial, o 1º Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos de Monumentos Históricos, organizado em Atenas, no ano de 1931, pelo Escritório Internacional de Museus da Sociedade das Nações. 8 9 Nessa conferência, abandonou-se a ideia de restauro estilístico como uma abor- dagem possível no século XX, em favor do respeito à obra histórica e artística do passado. O documento produzido nessa ocasião foi intitulado Carta de Atenas de 1931, inaugurando uma série de outros que seriam identificados como Cartas Patrimoniais, que estudaremos nesta unidade. Assim, a Carta de Atenas serviu de embasamento para a (re)formulação das legislações de cada um dos países que atenderam à conferência. No caso brasileiro, a primeira lei para proteção de monumentos históricos seria promulgada em 1937. Um dos aspectos mais inovadores da Carta é que ela preza não só pela valorização e preservação do monumento em si, mas também de seu entorno. Já naquela época, chamava-se a atenção para elementos como cartazes publicitários, postes de eletricidade, ruídos e estruturas muito altas que pudessem comprometer os monumentos. Especificamente em relação aos procedimentos de restauro, a Carta de Atenas le- vantou o problema da necessária distinção entre os materiais utilizados na restauração em relação aos originais, orientando que os técnicos empregassem “materiais moder- nos para a consolidação dos edifícios antigos” (SOCIEDADE DAS NAÇÕES, 1931). Além de modernos, os materiais do restauro deveriam ser reconhecíveis, evitan- do-se assim a criação de falsos históricos, como apontado por Brandi. O documen- to cita como exemplo o trabalho de restauro que vinha sendo realizado na Acrópo- le de Atenas, no qual foi utilizado cimento para completar os tambores das colunas que precisavam ser substituídos, contrastando com o mármore original do templo. A obra foi um dos primeiros gran- des exemplos de aplicação da anastilose na restauração (Figura 2). Figura 2 – Propileus de Atenas, ilustração de livro de Gustavo Giovannoni Fonte: Bolletino d’Arte do Ministério da Educação Nacional 9 UNIDADE As Cartas Patrimoniais A conferência apontou ainda que, para além dos aspectos técnicos, era neces- sário destacar o papel da educação para garantir a conservação dos monumen- tos. Ao se conscientizarem da importância dos monumentos, os diferentes povos garantiriam a preservação dos testemunhos das civilizações passadas. Conclusões Gerais As discussões culminaram na famosa teoria de organização espacial obede- cendo as distintas atividades humanas básicas: trabalhar – habitar – cultivar o corpo e o espírito – circular. Acreditava-se firmemente que as decisões toma- das na prancheta poderiam guiar as cidades e até mesmo a vida dos indivíduos de maneira direta e completa. Uma marca importante da carta é a prevalência dos meios de transporte individuais em detrimento dos coletivos. A Carta deAtenas é um documento de compromisso, datado de 1933, re- digido e assinado por grandes arquitetos e urbanistas internacionais do início do século XX, entre os quais se destaca Le Corbusier. A Carta foi re- digida como conclusão do Congresso Internacional de Arquitetos e Técni- cos de Monumentos Históricos que teve lugar em Atenas, na Grécia, em outu- bro de 1931. Ao dar linhas de orientação sobre o exercício eo papel dourbanismo den- tro da sociedade, serviu de inspiração à arquitetura contemporânea. O documento final foi redigido por Le Corbusier. O tema do congresso de 1933 foi “Cidade Funcional” e havia uma intenção de renovação de função e de estética para os espaços em geral. I - Doutrinas: Princípios Gerais Nos casos em que uma restauração pareça indispensável devido a deterioração ou destruição, a conferência recomenda que se respeite a obra histórica e artísti- ca do passado, sem prejudicar o estilo de nenhuma época. Recomenda que se mantenha uma utilização dos monumentos, que assegu- re a continuidade de sua vida, destinando-os sempre a finalidades coerentes com o seu caráter histórico ou artístico. II - Administração e legislação dos monumentos históricos A conferência aprovou unanimemente a tendência geral que consagrou nessa matéria um certo direito da coletividade em relação à propriedade privada. Em consequência,a conferência espera que as legislações sejam adaptadas às circunstâncias locais e à opinião pública, de modo que se encontre a menor oposição possível, tendo em conta os sacrifícios a que estão sujeitos os pro- prietários, em benefício do interesse geral. Votou-se que em cada Estado a autoridade pública seja investida do poder do tomar, em caso de urgência, medi- das de conservação. 10 11 III - A valorização dos monumentos Em certos conjuntos, algumas perspectivas particularmente pitorescas devem ser preservadas. Deve-se também estudar as plantações e ornamentações vegetais convenientes a determinados conjuntos de monumentos para lhes conservar a caráter antigo. Recomenda-se, sobretudo, a supressão de toda publicidade, de toda presença abusiva de postes ou fios telegráficos, de toda indústria ruidosa, mesmo de altas chaminés, na vizinhança ou na proximidade dos monumentos, de arte ou de história. IV – Os materiais de restauração Os técnicos receberam diversas comunicações relativas ao emprego de ma- teriais modernos para a consolidação de edifícios antigos, especialmente o ci- mento armado. Especificam que esses meios de reforço devem ser dissimulados, salvo impossibilidade, a fim de não alterar o aspecto e o caráter do edifício a ser restaurado. V - A deterioração dos monumentos A conferência recomenda: 1. A colaboração em cada país dos conservadores de monumentos e dos arquitetos com os representantes das ciências físicas, químicas e natu- rais para a obtenção de métodos aplicáveis em casos diferentes. 2. A conferência, no que concerne à conservação da escultura monumen- tal, considera que retirar a obra do lugar para o qual ela havia sido criada é, em princípio, lamentável. Recomenda, a título de precau- ção, conservar, quando existem, os modelos originais e, na falta deles, a execução de moldes (IPHAN, Carta de Atenas, 1931). Figura 3 – Réplica de Davi, Michelangelo – Pallazo Vecchio, Florença Fonte: Wikimedia Commons 11 UNIDADE As Cartas Patrimoniais Figura 4 – Original de Davi, Michelangelo – Galeria da Accademia de Belas Artes , Florença Fonte: Wikimedia Commons VI - Técnica da conservação Quando se trata de ruínas, uma conservação escrupulosa se impõe, com a reco- locação em seus lugares dos elementos originais encontrados (anastilose), cada vez que o caso o permita; os materiais novos necessários a esse trabalho deverão ser sempre reconhecíveis. Quando for impossível a conservação de ruínas descobertas durante uma escavação, é aconselhável sepultá-las de novo depois de haver sido feito um estudo minucioso. Assim, a Carta de Atenas de 1931 inaugurou uma série de documentos que co- meçariam a ser produzidos a partir da segunda metade do século XX, que ficariam conhecidos como Cartas Patrimoniais. Essas cartas refletem a estruturação das dis- cussões acerca da preservação patrimonial em todo o mundo e, por isso, tiveram influência direta sobre as legislações nacionais. Dessa forma, as cartas patrimoniais promoveram uma maior aproximação entre teoria e prática, frente a tantas linhas de pensamento divergentes que se apresen- tavam desde o século XIX. Importante! No portal do IPHAN (www.iphan.gov.br), você tem acesso a todas as Cartas Patrimoniais, muitas delas traduzidas para língua portuguesa. Dentre as principais estão a Carta de Atenas de 1931, a Carta de Veneza de 1964, a Carta do Restauro Italiana de 1972, a Declaração de Amsterdã de 1975, a Conferência de Nara de 1994, a Carta de Brasí- lia de 1995, a Recomendação de Paris de 2003 e a Carta de Burra de 2013. Importante! Na década de 1960, vários especialistas deram início a uma série de reuniões que vinham discutir a preservação patrimonial, enfatizando, sobretudo, a urgência no tra- tamento dos monumentos destruídos pela guerra. Dessas reuniões, resultou uma das principais e mais criteriosas cartas, até hoje influente: a Carta de Veneza de 1964. 12 13 Carta de Veneza (1964) Princípios dos sete temas contidos na Carta (Figura 5), divididos em 16 artigos: I. Defi nições – Artigos 1º e 2º; II. Finalidade – Artigo 3º; III. Conservação – Artigos 4º, 5º, 6º, 7º e 8º; IV. Restauração – Artigos 9º, 10º, 11º, 12º e 13º; V. Sítios Monumentais – Artigo 14º; VI. Escavações – Artigo 15º; VII. Documentação – Artigo 16º. Figura 5 − Veneza, Itália Fonte: Wikimedia Commons A motivação para a redação da Carta de Veneza foi a necessária discussão acerca dos monumentos como testemunhos de tradições seculares, que mereciam ser preservados para a posteridade. O texto da Carta de Veneza se inicia com a definição de monumento histórico como “a criação arquitetônica isolada, bem como o sítio urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma evolução significativa ou de um acontecimento histórico” (ICOMOS, 1964). Foi a partir desse documento que o conceito de monumento histórico passou a incluir também construções mais modestas, que, embora não grandiosas, tinham importância cultural. Em função das severas destruições que a guerra havia causado, a conservação e a restauração arquitetônicas deveriam propor medidas que evitassem a perda total desse patrimônio. Importante! São orientações da Carta para conservação dos monumentos: sua manutenção perma- nente; sua destinação útil à sociedade; e a proibição da alteração de volumes, cores e esquemas originais da edifi cação em questão. Importante! 13 UNIDADE As Cartas Patrimoniais A restauração deveria acontecer somente em caráter excepcional. Quando neces- sária, a restauração deveria então prezar pelo respeito à história do edifício e à con- tribuição de cada período sobre a conformação de seu aspecto no tempo presente. Artigo 11º. As contribuições válidas de todas as épocas para a edificação do monumento devem ser respeitadas, visto que a unidade de estilo não é a finalidade a se alcançar no curso de uma res- tauração, a exibição de uma etapa subjacente só se justifica em circunstâncias excepcionais e quan- do o que se elimina é de pouco interesse e o material que é revelado é de grande valor histórico, arqueológico, ou estético, e seu estado de conservação é considerado satisfatório (ICOMOS, 1964). Ex pl or Talvez uma das maiores contribuições da Carta tenha sido a apresentação de uma nova noção sobre o estado original dos monumentos. O conceito de original em edifícios completamente destruídos pela guerra tornava tal discussão ainda mais difícil. Cientes de que, nesses casos, haveria a necessidade de se completar as partes faltantes, os especialistas presentes na reunião de 1964 chegaram a um consenso de que tais completamentos deveriam ser distinguíveis do objeto original para não criar falsos históricos, ou seja, eles deveriam estampar as marcas de seu tempo. Apesar de tal distinção, o restaurador deveria ser cuidadoso para que a substi- tuição das peças faltantes pudesse ser harmoniosamente integrada ao restante do conjunto, respeitando-se o equilíbrio da composição arquitetônica e as característi- cas do entorno em relação a materiais, gabarito, afastamentos, insolação etc. A Carta aponta ainda para a importância de se conduzir as escavações arqueológi- cas em conformidade com os padrões científicos da época. A partir dessas escavações, poderiam ser encontradas peças desmembradas, e até então soterradas, do monu- mento ali situado. Nesses casos, seria admitida a anastilose, ou seja, a recomposição de fragmentos encontrados. Por ser um processo bastante delicado, recomenda-se que qualquer escavação arqueológica seja acompanhada de uma sistemática de registros com os levantamentos métricos-arquitetônicos, desenhos e fotografias. Ainda no âmbito da documentação, na Carta pede-se que todos os trabalhos de conservação, restauração e escavação sejam acompanhados de relatórios analíticos e críticos que apresentem todas as etapas perscrutadas pelos técnicos, disponibilizando- -os posteriormente a pesquisadores e publicando-os para acesso de toda a população. Como os edifíciostêm anos de história e também anos de modificações, não temos como falar de um estado de originalidade absoluto. É mais interessante tentar reconhe- cer todo o ciclo de vida do objeto arquitetônico para não criar falsos históricos. Assim, admitiu-se que, em caso de reconstrução, seria possível a recomposição de fragmentos. O deslocamento de todo monumento ou de parte dele não pode ser tolerado, exceto quando a salvaguarda do monumento o exigir ou quando o justificarem razões de grande interesse nacional ou internacional, por exemplo, o que ocorreu com o deslocamento para cima e para o interior com o templo de Ramsés, em Abu Simbel, em 1964, com a colaboração de pesquisadores de vários países (Figuras 6 e 7). 14 15 Figura 6 – Templo de Ramsés, Abu Simbel Fonte: Wikimedia Common Figura 7 – Templo de Ramsés – deslocamento Fonte: Wikimedia Common Dos encontros que resultaram na Carta de Veneza, também derivaram outros documentos, dentre os quais a resolução para a criação de um órgão não gover- namental, de especialistas da área de preservação patrimonial, envolvidos com a salvaguarda de bens culturais, que foi chamado de Conselho Internacional de Monumentos e Sítios, o ICOMOS, vinculado à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, a Unesco. Normas de Quito (1967) Os monumentos de interesse arqueológico, histórico e artístico constituem recursos econômicos da mesma forma que as riquezas naturais do país. Consequentemente, 15 UNIDADE As Cartas Patrimoniais as medidas que levam a sua preservação e adequada utilização não só guardam relação com os planos de desenvolvimento, mas fazem ou devem fazer parte dele (IPHAN, Normas de Quito, 1967). As obras de restauração nem sempre são suficientes, por si só, para que um monu- mento possa ser explorado e passe a fazer parte do equipamento turístico de uma região (Figuras 8 e 9). Podem ser necessárias outras obras de infraestrutura, tais como um caminho que facilite o acesso ao monumento ou um albergue que aloje os visitantes ao término de uma jornada de viagem. Tudo isso, mantido o caráter ambiental da região. Figura 9 – Mosteiro de São Bento, Rio de Janeiro - interior Fonte: Wikimedia Common Figura 8 – Mosteiro de São Bento, Rio de Janeiro - fachada Fonte: Wikimedia Common Carta do Restauro (1972) Entende-se por salvaguarda toda e qualquer medida conservativa que não implique a intervenção direta sobre a obra; entende-se por restauro toda e qualquer intervenção destinada a manter em eficiência, a facilitar a leitura e a transmitir integralmente para o futuro as obras e os objetos. (IPHAN, Carta do Restauro, 1972, p. 1-2) Fica proibido para todas as obras, entre outros aspectos, remoções ou demolições que apaguem a passagem da obra através do tempo, a menos que não se trate de alterações limitadas, deturpadoras ou incongruentes, em relação aos valores históricos da obra, ou de complementos em estilo que falsifiquem a obra (Figura 10); remoção, reconstrução ou recolocação em lugares diversos dos originais; a menos que isso seja determinado por superiores razões de conservação. 16 17 Figura 10 − Carta de Restauro Fonte: Acervo do Conteudista Declaração de Amsterdã (1975) A política de planejamento regional deve ter em consideração a conservação do patrimônio arquitetônico e para ele contribuir. Em particular, pode induzir o estabelecimento de novas atividades em áreas economicamente decadentes para se evitar o despovoamento e, portanto, evitar a deterioração dos edifícios antigos. Além disso, as decisões sobre o desenvolvimento das áreas urbanas periféricas podem ser de forma tal que reduzam a pressão sobre os bairros antigos (IPHAN, Declaração de Amsterdã, 1975). Para se conseguir resolver os problemas econômicos de uma política de conser- vação integrada é importante – e este é um fator decisivo – preparar-se legislação que submeta os edifícios novos a certas restrições correspondentes ao seu volume e dimensões (altura, coeficiente de utilização etc.) que os faça serem harmoniosos com as respectivas envolventes (Figura 11). Figura 11 – Declaração de Amsterdã Fonte: Acervo do Conteudista Recomendação de Nairóbi (1976) Cada conjunto histórico ou tradicional e sua ambiência deveria ser consi- derado em sua globalidade, como um todo coerente cujo equilíbrio e cará- ter específico dependem da síntese dos elementos que o compõem e que 17 UNIDADE As Cartas Patrimoniais compreendem tanto as atividades humanas como as construções, a estru- tura espacial e as zonas circundantes. Dessa maneira, todos os elementos válidos, incluídas as atividades humanas, desde as mais modestas, têm, em relação ao conjunto, uma significação que é preciso respeitar. [...] Nas condições da urbanização moderna, que produz um aumento considerável na escala e na densidade das construções, ao perigo da destruição direta dos conjuntos históricos ou tradicionais se agrega o perigo real de que os novos conjuntos destruam indiretamente a ambiência e o caráter dos conjuntos históricos adjacentes. Os arquitetos e urbanistas deveriam empenhar-se para que a visão dos monumentos e conjuntos históri- cos, ou a visão que a partir deles se obtém, não se deteriore e para que esses conjuntos se integrem harmoniosamente na vida contemporâ- nea (Figura 12). (IPHAN, Declaração de Nairóbi, 1976, p. 3) Figura 12 – Vista panorâmica de Paris, França Fonte: Wikimedia Commons Uma política de revitalização cultural deveria converter os conjuntos históricos em polos de atividades culturais e atribuir-lhes um papel essencial no desenvolvi- mento cultural das comunidades circundantes. A UNESCO Ampliando ainda mais a noção de monumento histórico, a UNESCO aprovou, em 1972, a Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natu- ral. Momento a partir do qual passou-se a utilizar com maior frequência o termo patrimônio cultural, ao invés de monumentos históricos. Três foram as categorias consideradas Patrimônio Cultural: • Os monumentos: Obras arquitetônicas, de escultura ou de pintura monu- mentais, elementos de estruturas de caráter arqueológico, inscrições, grutas e grupos de elementos com valor universal excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da ciência; • Os conjuntos: Grupos de construções isoladas ou reunidos que, em virtude da sua arquitetura, unidade ou integração na paisagem têm valor universal excep- cional do ponto de vista da história, da arte ou da ciência; • Os locais de interesse: Obras do homem, ou obras conjugadas do homem e da natureza, e as zonas, incluindo os locais de interesse arqueológico, com um valor universal excepcional do ponto de vista histórico, estético, etnológico ou antropológico (UNESCO, 1972). 18 19 Além dessas categorias, que têm em comum serem obras humanas, a Convenção considerou que alguns sítios naturais também deveriam ser protegidos pelo seu excepcional interesse estético, científico ou conservativo. Dentre eles, estariam formações físicas, biológicas e geológicas, além das zonas naturais que são, dentre outros aspectos, habitat de espécies animais e vegetais ameaçadas de extinção. Aqueles bens chamados de “patrimônio” são, na verdade, uma espécie de “pa- trimônio oficial”, ou seja, “aquele que legalmente reúne poucos e escolhidos bens eleitos como preserváveis à posteridade” (LEMOS, 1981, p. 12). Um dos principais exemplos do chamado patrimônio cultural oficial é a Lista do Patrimônio Mundial, cujos bens são incluídos pela UNESCO a pedido dos Estados que solicitam o reconhecimento de alguns sítios naturais e culturais de excepcional interesse e de necessária salvaguarda. Figura 13 – Frevo: Patrimônio imaterial Fonte: Wikimedia Commons As danças (Figura 13), os rituais, o folclore, as crenças, a literatura, as línguas, os saberes e a culinária são exemplos de heranças culturais transmitidas de geração em geração, mesmo não sendo elementos físicos. A esta categoria de testemunho cultural damos onome de Patrimônio Imaterial, como mencionado em unidade anterior. Uma das primeiras recomendações da UNESCO para a proteção do pa- trimônio imaterial foi a Recomendação sobre a salvaguarda da cultura tradicional e popular, de 1989. Segundo a Recomendação de 1989. A UNESCO tem escritórios em diversos países, inclusive no Brasil. Cada um dos países, por sua vez, têm instituições que, a partir das recomendações internacio- nais, formulam suas próprias legislações. Lembre-se de que as Cartas Patrimoniais não têm caráter normativo, por isso, no Brasil, os assuntos acerca da preservação do patrimônio histórico e arquitetônico ficam sob tutela das leis municipais, esta- duais e nacionais. 19 UNIDADE As Cartas Patrimoniais Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites UNESCO Acesse o site da UNESCO e conheça a lista do patrimônio. https://bit.ly/3a8gjGq IPHAN Visite o portal do IPHAN para conhecer mais sobre o Patrimônio no Brasil. https://bit.ly/3aaArI3 Vídeos Cartas Patrimoniais - Carta de Atenas Assista ao vídeo indicado sobre as Cartas Patrimoniais - Carta de Atenas. https://youtu.be/RB1ZYg6RkCY Leitura Cartas Patrimoniais Consulte as Cartas Patrimoniais disponíveis no site do IPHAN. https://bit.ly/2RyZBYh 20 21 Referências CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Editora da Unesp: Estação Liberdade, 2006. CUNHA, Claudia dos Reis e. Teoria e método no campo da restauração. Pós. Revista do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da FAUUSP, São Paulo, v. 19, n. 31, p. 98-115, jun. 2012. ISSN 2317-2762. Disponível em: <http:// www.revistas.usp.br/posfau/article/view/48070/51836>. Acesso em: 20 nov. 2018. CUNHA, Claudia dos Reis e. Alois Riegl e “O culto moderno dos monumentos”. Revista CPC, São Paulo, n. 2, p. 6-16, out. 2006. ISSN 1980-4466. Disponível em: <http://www. revistas.usp.br/cpc/article/view/15586/17160>. Acesso em: 22 nov. 2018. ICOMOS. Carta de Veneza – Carta para a Conservação e Restauração de Monumentos e Sítios (1964). Veneza: ICOMOS, 1964. Disponível em: <http:// portal.iphan.gov.br/>. Acesso em: 22 de nov. 2018. IPHAN. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/>. Acesso em 19 nov. 2018. KÜHL, Beatriz. VERBETES: Restauração, Restaurar, Restituição, Ruína, Rotunda, n. 2, p. 107117, 2003. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/cpc/article/ viewFile/15601/17175>. Acesso em: 24 nov. 2018. KÜHL, B. M. Notas sobre a Carta de Veneza. Anais do Museu Paulista. v. 18, n. 2, p. 287– 320, jul. 2010. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/anaismp/ article/view/5539>. LEMOS, C. O que é patrimônio histórico. 4. ed. São Paulo: Brasiliense, 1981. SOCIEDADE DAS NAÇÕES. Carta de Atenas. Atenas: [s.e.], 1931. Disponível em: <http:// portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20 Atenas%201931.pdf>. Acesso em: 23 nov. 2018. UNESCO. Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural. Paris: [s.e.], 1972. Disponível em: <http://whc.unesco.org/archive/ convention-pt.pdf>. Acesso em: 24 nov. 2018. 21
Compartilhar