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A literatura de María Teresa Andruetto _ Revista Emília

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20/04/2019 A literatura de María Teresa Andruetto | Revista Emília
revistaemilia.com.br/a-literatura-de-maria-teresa-andruetto/ 1/11
A literatura de María Teresa
Andruetto
POR PILAR MUÑOZ LESCANO | 24 DE MAIO DE 2015 | PROTAGONISTAS |
 
María Teresa Andruetto (1954 -) é poeta e escritora argentina, criadora uma obra extremamente
interessante. Seus livros de excelente qualidade literária, mostram interesses por temas comprometidos.
Andruetto desenvolve uma poética singular. Sua obra percorre quase todos os gêneros, com
transgrissões. Escreve, com a mesma dedicação e cuidado, para crianças, adolescentes e adultos. Resiste
à rótulos (o título que reúne seus ensaios sobre escrita e literatura infantil e juvenil – Por uma literatura sem
adjetivos1 – é mais que significativo) e às edições compulsivas (sua obra não é muito prolífera, mas cada
livro demorou anos para ser escrito).
Resiste também a escrever sobre os temas da moda ou segundo a demanda da pedagogia ou do mercado. Em
sua concepção, a escrita é uma viagem para dentro do mundo interior, por isso suas histórias tratam desses
mundos íntimos, migrações, identidade individual e coletiva, amor, solidariedade; referem-se também ao
universo feminino, à pobreza, aos assuntos políticos e às diferenças sociais. Para ela, a escrita, uma escrita
sempre em diálogo com a tradição e a cultura, é uma constante exploração da língua e das formas, uma
http://revistaemilia.com.br/author/pilar-munoz-lescano/
http://revistaemilia.com.br/categorias/protagonistas/
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20/04/2019 A literatura de María Teresa Andruetto | Revista Emília
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maneira de “ser sempre o caminhante, o que ainda não chegou ao destino, o passageiro em trânsito, o que
atravessa a floresta, o garimpeiro, para que a escrita, em algum momento, aconteça.2 Para que a escrita seja
arte através da arte de escrever, posto que “a arte é um método de conhecimento, uma forma de penetrar no
mundo e encontrar nosso lugar nele”.3
 
Um caminho semeado de palavras
Nasceu em Arroyo Cabral, província de Córdoba. É filha de um partidário da esquerda piemontesa que
chegou à Argentina em 1948 e de uma descendente de piemonteses, que aprendeu a falar espanhol aos
seis anos, na escola. Dessa maneira, não é por acaso que no centro de sua escrita estejam as viagens, as
migrações, os mistérios da língua, a linguagem.
Uma das primeiras aproximações de Andruetto com as palavras ocorreu quando ainda só sabia falar seu nome
e a mandaram fazer uma compra com um papelzinho na mão; como tinha medo de se perder, caminhou
acreditando que se contasse os passos, olhando para os pés, não se perderia; estava tão concentrada nessa
tarefa, que se perdeu; quem a encontrou foi o carteiro, que a colocou na cesta de sua bicicleta e a levou para
casa entre cartas, mensagens e palavras.
Alguns anos depois, descobriu a magia de contar: na escola, no recreio se sentava em um banco e contava a
suas amigas algo que havia lido no dia anterior, agregando detalhes ou suspense, ou terminava porque era hora
de voltar para a aula; sentia vergonha por esconder que eram episódios roubados dos livros, “mas mesmo assim
eu contava, como um vício que não podia conter”.4 Esse ofício de narrar e o valor que isso tem para os seres
humanos contar e escutar uma história estão presentes em sua obra. “Havia uma vez”5 e “Agora que as
cerejeiras floresceram” (Miniaturas, 2011) são relatos em que se explicita a voz que trança palavras e implanta a
urdidura. A novela Stefano6 (1997) alterna o narrador onisciente com a voz do protagonista, quem conta sua
vida. Em Veladuras (2005), a protagonista, com seu pensamento confuso, narra sua história.
Nos anos 1970, Andruetto estudou letras na Universidade Nacional de Córdoba. Depois de uma breve
passagem pela Patagônia e de anos de exílio interno, com o fim da ditadura militar e o retorno do país à
democracia, foi co-fundadora do CEDILIJ (Centro de Difusão e Investigação de Literatura Infantil e Juvenil, um
centro especializado em leitura e literatura para crianças e jovens), secretária editorial da revista Piedra Libre e
membro do corpo assessor da PROPALE (Programa de Promoção e Incentivo à Leitura e à Escrita da
Universidade de Córdoba). Formou parte dos planos de leitura nacionais e estaduais e integrou a equipe de
capacitação docente. Desenvolveu, ainda, oficinas de escrita criativa em que acompanhou o processo de escrita
de crianças e jovens em situação de risco.
Em 1992, sua novela Tama, destinada ao público adulto, ganhou o prêmio municipal Luis de Tejeda. A partir de
então, começou a publicar os escritos que acumulou e, em 1993, vieram à luz os livros destinados a crianças e
jovens: El anillo encantado, um livro que reúne relatos com reminiscências orientais, e Mistérios en la Patagonia,
que continha cinco histórias de suspense e medo, algumas recriadas a partir de lendas e contos populares.
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“A literatura não é, necessariamente, um lugar onde encontrar o igual, às vezes, é a única
janela para somar-se ao diferente”.7
 
A escrita como migração
O álbum ilustrado La durmiente (2009) alude a uma jovem que dormiu cem anos. “Até que o povo fez soar
trombetas./ E tambores./ E fuzis./ E canhões./ Então, a princesa despertou, mas não por causa do beijo de
um príncipe…mas por uma revolução”.8 Nesse sentido, Andruetto rompe com a tradição dos contos infantis
porque aborda como temática – além dos assuntos políticos – a luta de classes e a exclusão social.
Este último tema é retomado pela autora no livro El país de Juan (2003), uma novela curta, mas profunda e
emocionante, em que se produz uma viagem de ida e outra de volta (uma migração do campo para a cidade – e
sua periferia – e o retorno À zona rural); nesse relato, os protagonistas se encontram na busca do próprio
caminho e decidem continuar caminhando juntos. A migração de uma região a outra do país também aparece na
novela Veladuras, em que a protagonista regressa à região de seus ancestrais no noroeste argentino. Em Por
uma literatura sem adjetivos, destaca: “escrita, então, como movimento, como caminho para quem escreve e
para quem lê. Caminho, migração de um lugar a outro”.9
Em outra conferência incluída nesse livro, a autora confessa: “me interessa a vida como viagem (…) a literatura
de viagem e outra ideia a que geralmente ela está associada: ir longe para procurar o que, por acaso, está
perto…”.10 A imigração e a literatura de viagem são os temas centrais de Stefano, uma novela que, se não
relata bem a vida do pai da autora, contém anedotas e traços familiares personificados em um jovem que sobe
em um barco na Itália como criança, e desce na Argentina como homem, e como tal deverá andar muito até
chegar a seu destino. Nessa comovente novela, ainda, migrar implanta sua polissemia porque “tornar-se adulto
é também migrar”.11 Em contrapartida, El árbor de lilas faz referência a buscas e esperas, e a esse outro tipo de
viagem que menciona sua autora, posto que a protagonista vai buscar do outro lado do mundo esse amor, que
estava debaixo da árvore de lilases na praça mais próxima.
Em todos esses livros, para além da viagem, abordam-se os mundos interiores e a construção da identidade
individual e social; isso acontece na novela A menina, o coração e sua casa.12 Aqui, a viagem está presente no
caminho constante que realiza a protagonista entre a casa que vive com seu pai e sua avó e a casa de sua mãe.
Esseir e vir de um lugar a outro faz com que a menina organize seu mundo interior, essa casa a que se refere o
título. Porém, por trás do relato do mundo cotidiano, conta-se a história de uma menina que deseja saber o que
faz de seu irmão uma pessoa diferente e especial. Tanto nesse livro quanto em Veladuras, ambas publicadas
em coleções de livros para jovens, Andruetto aborda o que se consideram “temas difíceis”: os diferentes, a
loucura. Nessas novelas, mais uma vez, sua vida pessoal e sua infância estão presentes: María Teresa foi
criada em Oliva, um povoado no centro da Córdoba cerealista, que tinha um hospício; não se deve esquecer,
porém, que a escrita se faz daquilo que está: “o que migra – e toda escrita é migração – vai em direção de uma
fala que jamais lhe será dada. Dessa perda se forma o escrever. O que temos no começo do projeto não é outra
coisa que não a falta. Escreve-se porque não se sabe, não se compreende. Escreve-se para se confirmar,
repetidas vezes, que não se sabe, que não se compreende”.13
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Por outro lado, nesses livros, assim como nos relatos de El anillo encantado e em Había uma vez, a autora
manifesta seu interesse pelo universo feminino, pelas mulheres que procuram e esperam, que escutam e
contam, por aquelas que em seu papel de mães, esposas, filhas, irmãs, anseiam e lutam, e, às vezes vencem e
outras vezes são vencidas.
“Deixam para trás o Hotel de Imigrantes, o mar, o corre-corre do porto. Vão para a estação Retiro e, a partir dali,
pegam um trem até La Pampa. Não levam bagagem, não têm nada.
Pino diz:
— É como se fossemos recém-nascidos.
— Em compensação, eu acho que já vivemos tudo – disse Stefano”.14
 
A escrita como diálogo
Em uma entrevista, Andruetto destacou que nunca viu a literatura como cogumelos que só nascem no
campo, mas como parte de um sistema. Seus livros são como pontes estendidas para a literatura, a
sociedade, a história, a arte.
Por um lado, sua obra dialoga com a tradição. E isso é possível de observar através de três recursos:
1. A reelaboração de relatos da tradição oriental, como ocorre em Huellas en la arena (1997), de contos
populares italianos, como no caso de “Zapatero pequeñito” (em Benjamino, 2003), de lendas e contos
populares contados no calor do fogo, como os que estão em La mujer vampiro (2001); de histórias zen,
relatos bíblicos, contos sufis e hassídicos, e parábolas, como “Enós y los aprendices (Miniaturas, 2011).
2. A recriação dos tipos de relatos mencionados. São histórias escritas “a maneira de”, como ocorre com as
incluídas em El anillo encantado, relatos que recordam os que foram contados por Sherazade. Podem se
tratar também de versões livres, como a reconstrução da lenda piemontesa “El dragón que vino del Norte”
(Huellas en la arena, 1997).
3. A construção de textos com resquícios deste modo de narrar acontece também em El árbol de
lilas (2008) e Solgo (2004/2011).
Por meio deste diálogo com a tradição, as versões, recriações e relatos com reminiscências admitem ser lidos
em capas, desde o nível mais sensível e literal, até o mais complexo e filosófico. Isto faz com que a literatura de
Andruetto seja legível e profunda ao mesmo tempo.
Em contrapartida, sua obra está em diálogo com outros escritores, posto que são as epígrafes o que dão
origem a muitos de seus textos. Em El incêndio(2008), a partir do fragmento de um relato do filósofo
dinamarquês Sören Kierkegaard se desprende uma verdadeira encenação, já que o poema narrativo conta o
incêndio de um teatro através do jogo entre a inversão e a justaposição, entre o dito e o sugerido. Assim,
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novamente, estamos diante de uma literatura com sutilezas, porque, por um lado, podemos ler a história de
umas senhoras petulantes que aplaudem o palhaço que anuncia o incêndio, ao mesmo tempo, essa leitura em
diálogo com a epígrafe nos remete a uma ideia existencialista: essas pessoas estão festejando, sem saber, seu
próprio fim?
Trenes (2010) tem na epígrafe algumas palavras do pai dos aforismos, Ramón Gomez de la Serna; são
sementes do poema que anda sobre carris e cresce, como o amor, página a página. El caballo de Chuang
Tzu (2012) surge de umas palavras delineadas por Ítalo Calvino em Lezione Americane; a partir das palavras do
escritor italiano, a escritora argentina traça a história de Chuang Tzu, o melhor ilustrador, que precisou se
preparar durante dez anos e “em um instante, com um só gesto, desenhou um cavalo”, como desejava o
imperador, “o cavalo mais lindo jamais visto antes” (2012).
La durmiente (2010) nasce de uma colher de ouro com detalhes em prata, mas é concebida a partir das palavras
de José Antonio Martín. Nesse caso, além de dialogar com os versos iniciais, há também uma ponte
estabelecida entre o conto maravilhoso, evocado desde o título, e a repetição de suas técnicas: fórmulas,
enumerações, acumulações, paralelismos; o texto poético reproduz marcas de oralidade como se fosse um
trovador a cantar.
Ainda assim, os textos de Andruetto dialogam com as imagens. Trenes é um álbum ilustrado em que as
ilustrações do ilustrador argentino Istvansch mostram que tudo o que cerca Juan é amarelo, como o trem em
que ele anda, e o que está em volta de María, que viaja em um trem azul, é da cor do céu. E quando o texto
conta que Juan e María se olham nos olhos, o verde surge na página e tinge as imagens junto com alguns
detalhes vermelhos, símbolo do amor a que se remetem às palavras. Produz-se, também, uma interdependência
com as imagens de Istvansch em Fefa es así (2005), um álbum para leitores que estão nos primeiros passos da
leitura.
Em La durmiente também temos o diálogo com as imagens de Istvansch. Neste livro, o ilustrador mostra o
mundo feminino através de sua iconografia na pintura, em artigos de revistas femininas, em fotos de revistas de
decoração para culminar com imagens de mulheres ativas – e ativistas?. Assim, nesse álbum, a ilustração
reproduz o texto, mas ao mesmo tempo, cria uma história paralela. Dessa maneira, o diálogo entre ambos os
códigos faz com que a história seja a mesma e seja outra ao mesmo tempo.
Em Campeón (2009), o relato conta como corre a notícia de que “O negro é campeão!”, agarrando-se ao ritmo
cotidiano de “um povo como tantos, partido em dois, como a estrada de ferro e a estrada nacional” e
reproduzindo a língua oral e coloquial de qualquer círculo; e é a imagem final de Nicolás Arispe a que permite ao
leitor descobrir quem é o Negro. Em Solgo (2011), o texto entra em diálogo com as deslumbrantes imagens de
Cynthia Orensztajn, que levam a história a novas e infinitas leituras. Agua/cero (2007) reúne poemas em torno
da chuva, o modo em que se enlaçam as palavras, os sons e as letras com imagens de Guillermo Daghero
geram um álbum e é, mais uma vez, a aliança de códigos que convidam a observar e a interpretar.
E se tratarmos de diálogos, Stefano é a novela por excelência. Por um lado, se compõe através de um diálogo
textual, posto que a história se constrói a partir do enlace entre discursos: um narrador em terceira pessoa que
conta a história de Stefano, desde que saiu da Itália deixando para trás sua terra e sua mãe, e um discurso em
primeira pessoa em que o próprioprotagonista conta a uma mulher sua história de vida a partir das recordações
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e da memória afetiva. De modo que se trata de dois discursos em diálogo, mas, por sua vez, reproduz-se um
diálogo em que aquele a quem se dirige a narração de Stefano, ainda que não fale, está presente.
Além disso, o fato da migração ser o tema central da novela, produz-se um constante diálogo entre dois
mundos. Diálogo com a outra terra (a América) e outra cultura. Diálogo com outra língua, inclusive por dupla
partida, já que se pode deduzir que Stefano (cuja língua é o italiano) aprende em seu caminho o espanhol,
língua em que a novela foi escrita, permeada por várias passagens em que se incorporam canções em italiano;
esta é, também, a língua eleita para as epígrafes.
Há também um diálogo com o sexo oposto. As mulheres desfilam pela vida de Stefano, desde sua mãe, cujas
palavras dão início à novela, até a sua mulher Ema, que pronuncia a última frase do relato, revelando quem é o
que escuta a história. Em meio a esses extremos, ao longo da outra migração de Stefano – a que o leva da
infância à vida adulta – o protagonista se vincula com várias e diversas mulheres que colaboram para a
construção de sua identidade.
Ainda assim, em seu caminho, o jovem Stefano dialoga com a outra idade, um quase menino que deve negociar
com a etapa adulta até chegar a se instalar nela definitivamente, como acontece até o final do relato, quando o
leitor descobre que já tem vinte anos e está esperando um filho. Ao mesmo tempo, a novela inteira constrói um
diálogo com a vida através da qual o protagonista busca sua própria identidade.
 
A escrita como arte
O que é para Andruetto a escrita? Em “El ojo en la escena”, ressalta: “sou uma obsessiva pela forma e
também por buscar/provar formas para diferentes projetos de escrita, sob uma ideia mãe, que considera a
escrita como exploração”.15 Sem dúvida, para ela, a escrita é, antes de tudo, busca e experimentação.
Isso pode ser visto, por exemplo, nos seus contos que parecem poemas. A característica mais visível – por ser
gráfica – é a disposição espacial dos enunciados. Algumas orações se posicionam como se fossem versos e se
intercalam entre outras mais convencionais na prosa, reforçando o ritmo e jogando com o espaço em branco,
como acontece em “Los nueve mirlos”:
“E o desejo se fez grande.
Maior que o reino.
Maior que suas riquezas.
Maior que o amor de seu pai.
Seguiu um amanhecer, antes que o sol desnudasse as ladeiras, quando homens e animais
dormiam.” (Tradução livre)
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Por outro lado, seus relatos parecem um ventilador de recursos, entre os que predominam a metáfora e a
repetição em suas diversas formas (anáfora, paralelismo). Inclusive, alguns relatos estão organizados a
partir de estruturas acumulativas semelhantes aos jingles, posto que as passagens se entrelaçam através
de uma acumulação encadeada pela repetição de palavras em posições semelhantes, como ocorre em “El
remédio”:
“Era um homem triste que foi ver um médico para curar a tristeza.
O médico olhou-o dos pés à cabeça e, como não viu nada, encaminhou-o a um homeopata.
Era uma vez um homem triste que foi ver um homeopata para que lhe curasse a tristeza.
O homeopata o olhou dos pés à cabeça e, como não viu nada, encaminhou-o a
um adivinho”.16
Ademais, se assemelha ao jingle o relato que avança a partir da reelaboração do parágrafo anterior, ao
mesmo tempo em que acrescenta informação nova, tal como se observa em “De luz y de sombra”:
“Era uma vez, uma cidade.
Uma cidade antiga e luminosa, povoada de torres e campanários.
Naquela cidade antiga e luminosa povoada de torres e campanários, havia uma praça.
Uma praça verde salpicada de heliotrópios e jasmins.
Na praça verde salpicada de heliotrópios e jasmins daquela cidade antiga povoada de torres e
campanários, havia um banco transpassado de sol.”17
Esta constante experimentação com as formas e com a linguagem desalinha por completo o pertencimento
a um gênero, enfatizando, assim, o transgênero, o que vai para além de toda divisão canônica, deixando
em cena só um modo de contar ou de cantar? Pois o relato se torna canto, cadência, ritmo.
Ao referir-se a sua novela El país de Juan, a autora destaca: “me dediquei a buscar um ritmo (me interessa
muito o ritmo, essa herança que a prosa recebeu da poesia) e uma arquitetura cheia de simetrias. Assim nasceu
esse livro…”.18 É através do ritmo, das repetições e das simetrias que Andruetto escolhe transitar pelas duras
ruas da realidade, ao contar uma história sobre o empobrecimento como se fosse um conto maravilhoso,
porque El país de Juan recorre a todos os lugares comuns dos contos, porque o arquétipo é isso, uma
revalorização do lugar comum, tornado referência, um ponto fixo.19
Andruetto tece as palavras e fios próprios para implantar um enredo de marcas genuínas em que a história
surge entre o dito e o sugerido, entre o que a palavra diz e oculta, como ela mesma ressalta: “escreve-se contra
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a língua, contra o linguisticamente correto, contra o politicamente correto, se escreve contra tudo e, sobretudo,
contra nós mesmos, violentando a linguagem e nos violentando, procurando a saída do que somos nas fendas
que se produzem entre uma palavra e outra, buscando aquilo entre uma frase e outra nessa ruptura que não é
silêncio nem voz, aparece”.20
Nessa constante exploração nas complexidades da língua existe, ainda, uma busca linguística que foca e
revaloriza os matizes de acordo com as regiões, como se observa em Veladuras, novela em que a protagonista
narra confusamente sua dor através das palavras que conhece: as do noroeste argentino. A incursão da autora
faz com que seus relatos contenham uma linguagem que é de todos e ao mesmo tempo único, e isso conduz
sua literatura para o universal e o local ao mesmo tempo.
A escrita de Andruetto se caracteriza por uma experimentação consciente e de uma busca que se aprofunda na
linguagem, despejando e desarrumando, para encontrar a palavra justa: verdadeiro trabalho de ourives que faz
o poeta. Como Andruetto recorda: “Um escritor é um buscador cujo prazer mais puro é encontrar entre milhões
de palavras, as palavras”.21
 
Conclusão
Os livros de María Teresa Andruetto caminham para um leitor capaz de exigir e de assumir um papel ativo
de junção e cooperação; um leitor que está presente na projeção da autora, mas não como um sujeito
individual de determinado lugar ou idade, mas como uma busca a mais, como destaca: “pretendo construir
uma obra, pretendo comover um leitor, espero que um poema ou conto que escrevo na solidão,
profundamente imersa em mim, habite a memória de um leitor quando eu já não esteja mais”.22
A obra de Andruetto resiste aos encarceramentos e responde a suas próprias regras: exploração nas formas,
constante busca pelos matizes da língua, profundidade filosófica e poética no tratamento das temáticas. É por
isso que seu trabalho é apresentado como uma literatura sensível e transgenérica.
A poética de Andruetto é muito pessoal, pode-se analisar e pensar, mas há algo nela que é inapreensível.
Somente é possível entrar em sua essência ao ler seus textos, deter-se nas imagens, não só as ilustradas, mas
as armadas através da palavra, o que esta poeta consegue com maestria.Notas
1. Hacia una literatura sin adjetivos. Córdoba: Comunicarte, 2009. Edição em português,Por uma literatura sem adjetivos,
Editora Pulo do Gato, SP, 2013.
2. Hacia una literatura sin adjetivos. Córdoba: Comunicarte, 2009, pag. 24.
3. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 22-23.
4. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 63.
5. Era uma vez, Editora Casa Amarelinha, SP, 2014.
6. Stefano. Buenos Aires: Sudamericana joven, Buenos Aires, 1997.
http://revistaemilia.com.br/a-literatura-de-maria-teresa-andruetto/#nota20
http://revistaemilia.com.br/a-literatura-de-maria-teresa-andruetto/#nota21
http://revistaemilia.com.br/a-literatura-de-maria-teresa-andruetto/#nota22
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7. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 47.
8. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 30,35,36.
9. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 20.
10. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 70.
11. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 20.
12. A menina, o coração e sua casa, Global, SP, 2011.
13. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 21.
14. Stefano, pag. 43.
15. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 73.
16. Stefano, pag. 43.
17. Misterio en la Patagonia. Buenos Aires: Libros de Quirquincho, 1993, pag. 37.
18. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 73.
19. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 73.
20. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 22.
21. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 21.
22. Hacia una literatura sin adjetivos, pag. 141.
Bibliografia
Andruetto, M. T. (1993) El anillo encantado. Buenos Aires: Sudamericana.
Andruetto, M. T. (1993) Misterio en la Patagonia. Buenos Aires: Libros de Quirquincho.
Andruetto, M. T. (1997) Huellas en la arena. Buenos Aires: Sudamericana.
Andruetto, M. T. (1997) Stefano. Buenos Aires: Sudamericana joven.
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Tradução Thaís Albieri / Imagem Lúcia Hiratsuka
 
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SOBRE O AUTOR
Pilar Muñoz Lescano
Professora, formada em letras, com
especialização em livros e literatura para crianças
e jovens, é editora de literatura infantil e juvenil, e
ministra oficinas de escrita para adultos. Seus
artigos foram publicados em Imaginaria, Cultura
LIJ e na Revista CLIJ. Em 2014, publicou El
caldero de los relatos, sua primeira novela juvenil.
É criadora do blog Cubos de mi torre e El
Canguro Lector. Atualmente é presidente da
associação de literatura infantil e juvenil da
Argentina (ALIJA), seção argentina
do International Board on Books for Young
People (IBBY).
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