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ECAT - CONCEPÇÃO E APLICAÇÃO DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

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Módulo 1 – Compreendendo a Concepção de Criança e Adolescente 
Apresentação do módulo 
Para a Organização Mundial da Saúde, a adolescência é um período da vida que começa 
aos 10 e vai até aos 19 anos. Já para o Estatuto da Criança e do Adolescente, esse período começa 
aos 12 e vai até aos 18 anos. 
Mesmo com definições diferentes, ambas as concepções concordam que é nesse período 
que acontecem importantes mudanças físicas, psicológicas e comportamentais. 
Neste módulo, você estudará as definições legais sobre criança e adolescente, os 
principais aspectos psicossociais presentes na infância e na adolescência, bem como algumas 
questões que concorrem para que a juventude brasileira se encontre em situação de 
vulnerabilidade. 
Objetivo do módulo 
Ao final do estudo deste módulo, você será capaz de: 
 Compreender a definição de criança e adolescência na legislação brasileira; 
 Identificar os aspectos psicossociais das fases de desenvolvimento da infância e 
adolescência; 
 Refletir sobre as questões que concorrem para que a juventude brasileira se 
encontre em situação de vulnerabilidade. 
Estrutura do módulo 
Este módulo é formado por uma aula: 
 Aula 1– Infância e adolescência: definições e concepções. 
 
 
 
 
Aula 1– Infância e adolescência: definições e concepções 
1.1. Definições de criança e adolescente de acordo com a lei 
De acordo com a denominação do art. 2º do Estatuto da Criança e Adolescente (Lei nº 
8.069/1990) temos as seguintes definições sobre criança e adolescente: 
 Criança é a pessoa até 12 anos; 
 Adolescente é a pessoa entre os 12 e os 18 anos de idade. 
A decisão de incluir na esfera de ação do Estatuto o menor de 18 anos está de acordo com 
a Convenção sobre os Direitos da Criança, que, como se sabe, em seu primeiro dispositivo, 
estabelece que, para os efeitos da mesma, "se entende por criança todo o ser humano menor de 18 
anos". 
Importante – O mencionado art. 2º contém uma exceção, quando disposto na lei, 
prevendo que o Estatuto é aplicável aos que se encontram entre os 18 e os 21 anos (p. ex., 
prolongamento da medida de internação até os 21 anos e assistência judicial – não representação 
– para os maiores de 16 e menores de 21 anos, previstos nos arts. 121 e 142). 
1.2. A criança e a importância da primeira infância 
A criança é um ser em pleno desenvolvimento e não um adulto em miniatura. Todas as 
vivências da infância estão interligadas com a forma do seu desenvolvimento futuro, no qual a 
inteligência e o afeto têm uma relação de causa e efeito. O papel dos pais e professores é 
fundamental para o desenvolvimento de um adulto saudável. A atenção integral à criança, com 
amor e imposição de limites, possibilita o seu crescimento com segurança para que se torne um 
adulto integrado socialmente. Contudo, a realidade da maior parcela da população brasileira é 
incompatível com essas necessidades do desenvolvimento infantil. 
Estudos científicos comprovam que o desenvolvimento humano possui uma fase 
primordial, denominada 1ª infância, que compreende o período do nascimento até o sexto ano de 
vida. Nessa fase, o desenvolvimento cerebral é mais rápido, sofrendo influências dos fatores 
 
 
 
biológicos, psicossociais, herança genética e pela qualidade do ambiente em que se vive e se 
convive. Esse processo define o desenvolvimento cognitivo e sócio emocional do ser humano, 
podendo afetar a capacidade estrutural e funcional que ele terá na vida adulta. 
De acordo com o UNICEF (2005), a primeira infância é um excelente investimento. Essa 
afirmativa está baseada em estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 
em 2000. O estudo aponta que uma criança que freqüentou pelo menos dois anos de creche ou 
pré-escola, quando adulta, tem seu poder de compra aumentado em 18%,pois a atenção integral a 
essa faixa etária interfere no sucesso escolar, no desenvolvimento de fatores de resiliência e 
autoestima, na formação das relações e da autoproteção requeridas para independência 
econômica e no preparo para a vida familiar. 
1.3. Adolescência 
Segundo H. Bee (1997), a adolescência é um período (dos 12 aos 20 anos) de mudanças 
da puberdade e um período de transição entre a infância e a adoção completa de um papel adulto. 
 Adolescência inicial (11 ou 12 anos): 
o Período de transição, dominado pela assimilação, no qual acontecem 
mudanças significativas em todos os aspectos do funcionamento da 
criança. 
 Adolescência final (16 ou 17 anos): 
o Período de consolidação e acomodação, quando o jovem estabelece uma 
nova identidade coesa, novos padrões de relacionamento social, com 
compromissos de papel mais claro. 
Ajustando as definições entre adolescência e juventude – Se o termo infância nos 
remete aos termos criança e adolescência, que se encontram referenciados por fortes indicadores 
físicos e fisiológicos, o termo juventude é muito mais recente e nos remete a definições 
socialmente delimitadas (...) o conceito juventude resumiria uma categoria essencialmente 
 
 
 
sociológica, que indicaria o processo de preparação para os indivíduos assumirem o papel de 
adultos na sociedade, tanto no plano familiar quanto no profissional, estendendo-se dos 15 aos 24 
anos, ou 15 a 29, no entendimento das instituições brasileiras. (Mapa da Violência, 2010, p.12). 
1.4. Adolescência e o contexto brasileiro: espaço de vulnerabilidade 
O adolescente vive conflitos afetivos. Deseja ser aceito pelos adultos e pelos amigos 
(referencial). Começa a estabelecer a sua moral, que é referenciada conforme amoral do grupo. 
Importante – A conformidade com o grupo torna-se muito importante para o adolescente 
que precisa ser aceito nele. Por isso, ele tende a buscar a consolidação da auto-imagem e o 
estabelecimento de uma identidade pessoal. 
Entretanto, essa fase conflituosa é agravada no contexto brasileiro, sobre o qual Oliveira 
(2001) considera: 
Em primeiro lugar, o fato de que nesta “onda jovem” predominam sujeitos de baixa renda, 
seja porque 63% dos brasileiros estão localizados em famílias consideradas miseráveis, 
despossuídas ou pobres1, seja porque a taxa de fecundidade2 nestes segmentos é bem maior. Em 
segundo lugar, observa-se que, no mínimo, 1/3 deste total de jovens que vivem no patamar mais 
baixo da pirâmide social está concentrado em áreas mais carentes de equipamentos, como é o 
caso das cidades nordestinas ou dos municípios pequenos de outras regiões do Brasil, com poucas 
alternativas de desenvolvimento econômico e que ficam de fora dos programas nacionais da área 
social ou são alvo apenas de medidas paliativas. 
A juventude da periferia encontra-se em situação de maior vulnerabilidade em função da 
falta de condições apropriadas ao desenvolvimento da criança e do adolescente, bem como das 
condições de inserção na sociedade atual, baseada na cultura da competição e do consumo. 
Oliveira (2001) diz que: 
 
1 Ver o arquivo “Informação 1” em anexo na plataforma. 
2 Ver o arquivo “Informação 2” em anexo na plataforma. 
 
 
 
Trabalhamos com o argumento de que, quanto mais desigual for uma 
nação, maiores serão suas taxas de violência e de criminalidade. Logo, a 
questão não pode ser apresentada a partir de qualquer relação de 
causalidade com a miséria em si mesma, na medida em que muitas nações 
extremamente pobres, mas com menor desigualdade social, possuem 
indicadores de violência reduzidos. 
Refletindo sobre a questão – Tendo em vista que o Estado e a sociedade brasileira não 
cumprem a legislação no que tange à priorização da infância e da juventude, como esperar que o 
jovem cumpra obrigações mediante a cassação de seus direitos e da sua cidadania? 
Após refletir, leia a entrevista Medo e Insegurança a Vida com Carmem Silveira de 
Oliveira, psicóloga e professora na Unisinos, São Leopoldo, RS, que aborda sobre os jovens em 
situação de risco. 
Para ampliar seu conhecimentosobre o tema, assista PROFISSÃO REPÓRTER “Jovens 
em Perigo”, exibido no dia 01/09/2009, terça-feira. 
No Profissão Repórter da terça-feira, 1º de setembro, Caco Barcellos e sua equipe 
passaram 48 horas em três cidades com o maior índice de assassinato de jovens no Brasil. 
Os repórteres Mariane Salerno e Caio Cavechini esteve em Foz do Iguaçu, a cidade 
número 1 no ranking de adolescentes vítimas da violência. Por que eles morrem e matam tanto na 
fronteira? 
Thaís Itaqui e Felipe Gutierrez passaram o fim de semana no Espírito Santo, estado com 
três cidades incluídas entre as 10 mais perigosas para jovens. 
E Caco Barcellos percorreu a Grande Recife e mostrou a rotina de medo e dor numa das 
regiões mais violentas do Nordeste brasileiro. 
1º Bloco | 2º Bloco 
 
 
 
Finalizando... 
Neste módulo, você estudou que: 
 De acordo com o ECA, criança é a pessoa até 12 anos e adolescente é a pessoa 
entre os 12 e os 18 anos de idade. 
 Estudos científicos comprovam que o desenvolvimento humano possui uma fase 
primordial, denominada 1ª infância, que compreende o período do nascimento até 
o sexto ano de vida. Nessa fase, o desenvolvimento cerebral é mais rápido, 
sofrendo influências dos fatores biológicos, psicossociais, herança genética e pela 
qualidade do ambiente em que se vive e se convive. Esse processo define o 
desenvolvimento cognitivo e sócio emocional do ser humano, podendo afetar a 
capacidade estrutural e funcional que ele terá na vida adulta. 
 A conformidade com o grupo torna-se muito importante para o adolescente que 
precisa ser aceito nele. Por isso, ele tende a buscar a consolidação da auto-imagem 
e o estabelecimento de uma identidade pessoal. 
 A juventude da periferia se encontra em situação de maior vulnerabilidade em 
função da falta de condições apropriadas ao desenvolvimento da criança e do 
adolescente, bem como das condições de inserção na sociedade atual, baseada na 
cultura da competição e do consumo. 
 
 
 
 
Módulo 2 – O Estatuto da Criança e do Adolescente 
Apresentação do módulo 
Neste módulo você estudará o que é o Estatuto da Criança e do Adolescente, seus 
antecedentes históricos – legislação – diretivas internacionais de proteção, além da sistemática de 
garantias dos direitos das crianças e adolescentes e dados sobre violência e mortalidade de 
crianças e adolescentes no contexto brasileiro. 
Objetivos do módulo 
Ao final do estudo deste módulo, você será capaz de: 
 Analisar os antecedentes históricos da proteção à criança e ao adolescente; 
 Compreender, de forma desmistificada, o Estatuto da Criança e do Adolescente – 
ECA (Lei n° 8.069, 13 de julho de 1990) e apreender sua aplicação, no sentido de 
garantir o respeito aos direitos da criança e do adolescente; 
 Identificar os sistemas de garantias dos direitos das crianças e adolescentes; 
 Relacionar as medidas protetivas e socioeducativas aos referidos artigos do ECA; 
 Analisar dados sobre a violência e a mortalidade entre crianças e adolescentes. 
Estrutura do módulo 
Este módulo é formado por três aulas: 
 Aula 1– Antecedentes históricos e principais instrumentos normativos de defesa da 
criança e do adolescente em âmbito nacional e internacional. 
 Aula 2– Compreendendo o ECA –sistemática de garantias. 
 Aula 3 – Violência e mortalidade. 
 
 
 
 
Aula 1 – Antecedentes históricos e principais instrumentos normativos de defesa da 
criança e do adolescente em âmbito nacional e internacional. 
1.1. Antecedentes históricos – diretivas internacionais de proteção 
Segundo Mendes (2009), podem ser apontados histórica e cronologicamente fatos e 
alguns instrumentos normativos que fundamentam a doutrina da proteção integral, em âmbito 
nacional e internacional, acerca dos Direitos da Criança, conforme se segue: 
 1919: A Sociedade das Nações cria o Comitê de Proteção da Infância. A existência 
desse Comitê faz com que os Estados não sejam os únicos soberanos em matéria 
dos direitos da criança. 
 1923: EglantyneJebb (1876-1928), fundadora da SavetheChildren, formula junto 
com a União Internacional de Auxílio à Criança a Declaração de Genebra sobre os 
Direitos da Criança, conhecida por Declaração de Genebra. 
 1924: A Sociedade das Nações adota a Declaração de Genebra. 
 1927: Durante o IV Congresso Panamericano da Criança, dez países americanos 
(Argentina, Bolívia, Brasil, Cuba, Chile, Equador, Estados Unidos, Peru, Uruguai 
e Venezuela) subscrevem a ata de fundação do Instituto Interamericano da Criança 
(IIN –Instituto Interamericano delNiño– hoje vinculado à OEA e estendido à 
adolescência), organismo destinado à promoção do bem-estar da infância e da 
maternidade na região. 
 1946: O Conselho Econômico e Social das Nações Unidas recomenda a adoção da 
Declaração de Genebra. Logo após a II Guerra Mundial um movimento 
internacional se manifesta a favor da criação do Fundo Internacional de 
Emergência das Nações Unidas para a Infância –UNICEF. 
 
 
 
 
 1948: A Assembléia Geral das Nações Unidas proclama a Declaração Universal 
dos Direitos Humanos. Nela os direitos e liberdades das crianças e adolescentes 
estão implicitamente incluídos. 
 1959: A Declaração dos Direitos da Criança é adotada por unanimidade. 
Entretanto, esse texto não é de cumprimento obrigatório para os estados-membros. 
 1979: Celebra-se o Ano Internacional da Criança. São realizadas atividades 
comemorativas ao vigésimo aniversário da Declaração dos Direitos da Criança. 
 1983: Diversas ONGs se organizam para elaborar uma Convenção Internacional 
sobre os Direitos da Criança, possuindo o estatuto de consulta junto à ONU. 
 1989: A Convenção sobre os Direitos da Criança é adotada pela Assembléia Geral 
da ONU e aberta à subscrição e ratificação pelos Estados. 
 1990: Celebra-se a Cúpula Mundial de Presidentes em favor da infância. Nesta 
cúpula se aprova o Plano de Ação para o decênio 1990-2000, o qual serve de 
marco de referência para os Planos Nacionais de Ação para cada Estado parte da 
Convenção. 
 1990: No Brasil é promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 
8.069/90, de 13 de junho de 1990 (ECA). 
 2001: É celebrado o Ano Interamericano da Infância e Adolescência. 
As primeiras discussões acerca dos direitos da criança se deram no início do século XX, 
por parte da extinta Liga das Nações e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), 
preocupadas com a situação da infância no mundo. Essas discussões provocaram a adoção de três 
Convenções pela OIT com o objetivo de abolir ou regular o trabalho infantil em 1919 e 1920, e a 
criação de um comitê especial pela Liga das Nações que tratava das questões relativas à proteção 
da criança e da proibição do tráfico de crianças e mulheres. Da mesma forma, na Declaração de 
 
 
 
 
Genebra, de 1924, já se nota a preocupação internacional em assegurar os direitos de crianças e 
adolescentes (Mendes, 2009). 
Entretanto, foi somente depois do fim da Segunda Guerra Mundial, com a criação da 
ONU e sua subsidiária –UNESCO– a partir da década de 1950, que os países passaram a mais 
detidamente debruçar-se sobre a situação das crianças e adolescentes. 
A Declaração dos Direitos da Criança (Resolução da Assembléia Geral da ONU de 
20/11/1959) estabeleceu que a criança precisa de proteção e cuidados especiais, inclusive 
proteção legal apropriada, antes e depois do nascimento, em decorrência de sua imaturidade física 
e mental. O princípio 9° enfatiza que “a criança gozará proteção contra quaisquer formas de 
negligência, crueldade e exploração”. 
Essa proteção foi baseada na premissa da necessidade de proteção à criança, estabelecida 
pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pela Declaração dos Direitos da Criança em 
Genebra, de 1924. A Declaração de 59 foi sendo aprimorada com as chamadas: 
1. "Regras de Beijing”, de 1985 – que estabeleceram Regras Mínimas das Nações 
Unidas para a Administração da Justiça da Infânciae da Juventude; 
2. Regras Mínimas das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas não Privativas 
de Liberdade (Regras de Tóquio), adotadas pela Assembléia Geral das Nações 
Unidas na sua resolução 45/110, de 14 de dezembro de 1990; e 
3. As "Diretrizes de Riade", de 1990, que estabeleceram as Diretrizes das Nações 
Unidas para a Prevenção da Delinqüência Juvenil; 
Nesse campo considera-se que o avanço mais significativo para as Nações, em termos de 
efetivação da garantia de direitos das crianças, ocorreu a partir da Convenção sobre os Direitos 
das Crianças – Resolução nº. 44/25 da Assembléia Geral da ONU em 20/11/1989. 
 
 
 
 
Importante – De acordo com Mendes (2009), sobre as conquistas da Convenção de 1989, 
pode ser citada a consolidação da Doutrina da Proteção Integral da Criança, cuja origem se 
encontra textualmente na Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959). No preâmbulo, a 
Doutrina traz o reconhecimento da necessidade de um sistema de proteção diferenciado para a 
criança, dando-lhe prerrogativas e privilégios concernentes à seguridade social, educação, 
trabalho, convívio, a fim de proporcionar-lhe condições favoráveis ao seu desenvolvimento 
saudável. 
Essa autora destacou alguns artigos da Convenção sobre os Direitos da Criança que 
trazem o conceito de criança (como é o caso do art. 1º) e estabelecem as responsabilidades da 
proteção especial a esse sujeito em desenvolvimento: 
 Artigo 3º: Todas as decisões que digam respeito à criança devem levar em conta o 
seu interesse superior. O Estado deve garantir cuidados adequados à criança, 
quando os pais ou outras pessoas responsáveis por ela não tenham capacidade para 
fazê-lo. 
 Artigo 6º: Todas as crianças têm o direito inerente à vida, e o Estado tem 
obrigação de assegurar a sua sobrevivência e seu desenvolvimento. 
 Artigo 19: O Estado deve proteger a criança contra todas as formas de maus tratos 
por parte dos pais ou de outros responsáveis pelas crianças e estabelecer 
programas sociais para a prevenção dos abusos e para tratar as vítimas. 
1.2. O contexto brasileiro: o nascimento da doutrina de proteção integral 
No Brasil, a partir dos anos 80, por ocasião da redemocratização, as pressões dos 
movimentos sociais em defesa da infância, em torno da Assembléia Constituinte, marcaram uma 
das maiores conquistas pelos direitos da criança: a incorporação de uma nova visão sobre a 
infância na Carta Magna. 
 
 
 
 
Na Assembléia Constituinte, um grupo de trabalho sobre a temática da criança e do 
adolescente incluiu um artigo na Constituição da República de 88, introduzindo a doutrina da 
proteção integral à criança, preconizada nos tratados internacionais da ONU, no direito brasileiro: 
Art.227- É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança 
e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à 
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à 
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, 
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, 
exploração, violência, crueldade e opressão. (Constituição Federal, 1988). 
Ao romper definitivamente com a doutrina da situação irregular, até então admitida pelo 
Código de Menores (Lei 6.697, de 10.10.79), e estabelecer como diretriz básica e única no 
atendimento de crianças e adolescentes a doutrina de proteção integral, o legislador pátrio agiu 
de forma coerente com o texto constitucional de 1988 e documentos internacionais aprovados 
com amplo consenso da comunidade das nações. 
É nesse sentido que a Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na história 
brasileira, aborda a questão da criança como prioridade absoluta, tornando sua proteção dever da 
família, da sociedade, do Estado. 
Se é certo que a própria Constituição Federal proclamou a doutrina da proteção integral, 
revogando implicitamente a legislação em vigor à época, o país clamava por um texto 
infraconstitucional consoante com as conquistas da Carta Magna. 
Aula 2–Compreendendo o Estatuto da Criança e Adolescente – sistemática de 
garantias 
2.1. O ECA 
Como você estudou na aula anterior, a CF/88 proclamou a doutrina de proteção 
integral,estabelecendo a co-responsabilidade entre: família – sociedade – Estado. 
 
 
 
 
Mas o país clamava por um texto específico, infraconstitucional que traduzisse essa 
doutrina. Nesse sentido nasceu a Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990, o Estatuto da Criança e do 
Adolescente (ECA), elaborada por uma comissão formada por representantes da sociedade civil, 
juristas e técnicos dos órgãos governamentais, com a participação fundamental do Movimento 
Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR) e da Pastoral da Criança. 
Importante – O ECA é a lei que reconhece a criança e o adolescente como sujeito de 
direitos em nosso país, defendendo o seu interesse superior. 
Composto por 267 artigos, o referido documento, no Brasil, é um marco histórico em 
termos dos direitos infanto-juvenis. A prioridade absoluta que preceitua o artigo 227 da CF/1988 
foi reafirmada no seu art. 4º. Senão vejamos: 
Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do 
Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos 
direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, 
ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à 
liberdade e à convivência familiar e comunitária. 
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: 
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer 
circunstâncias; 
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância 
pública; 
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais 
públicas; 
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas 
com a proteção à infância e à juventude. 
 
 
 
 
A sistemática do ECA ressalta, dentre o rol dos direitos fundamentais que estão 
interligados, o direito à vida e à saúde e em seu art. 7º preconiza: 
“Art. 7º. A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a 
efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e 
harmonioso, em condições dignas de existência.” 
O direito à vida possibilita a concretização dos outros direitos, como direito à educação, 
ao esporte e ao convívio familiar. Assim, a proteção à vida e à saúde permeia todas as políticas 
públicas voltadas à criança e ao adolescente. 
Refletindo sobre a questão – A realização desse artigo implica a reformulação das 
prioridades nacionais tanto no nível da sociedade como, principalmente, do Estado. Passa a ser 
prioridade o gasto público com as crianças e adolescentes, de modo a garantir-lhes condições 
plenas de vida. (Comentário de Herbert de Souza sobre o Artigo 7º do ECA.) 
Na sua opinião, essa prioridade está sendo seguida? 
2.2. O ECA e os sistemas de garantias 
Conforme Saraiva (2005), no ECA encontram-se os fundamentos dos três grandes 
sistemas de garantias (primário, secundário e terciário) que estabeleceram as diretrizes para uma 
política pública que prioriza as crianças e os adolescentes, reconhecendo a sua condição de 
pessoa em processo de desenvolvimento. São eles: 
Sistema primário – refere-se às políticas públicas de caráter universal para 
atendimento a toda população infanto-juvenil brasileira sem quaisquer distinções (traduzido 
especialmente pelos arts. 4º, 86 e 87, do ECA). 
Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do 
Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos 
direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, 
 
 
 
 
ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à 
liberdade e à convivência familiar e comunitária. 
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: 
a) primazia de receber proteção e socorroem quaisquer 
circunstâncias; 
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância 
pública; 
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais 
públicas; 
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas 
com a proteção à infância e à juventude. 
Art. 86. A política de atendimento dos direitos da criança e do 
adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações 
governamentais e não governamentais, da União, dos Estados, do Distrito 
Federal e dos Municípios. 
Art. 87. São linhas de ação da política de atendimento: 
I. políticas sociais básicas; 
II. políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, 
para aqueles que deles necessitem; 
III. serviços especiais de prevenção e atendimento médico e 
psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, 
abuso, crueldade e opressão; 
 
 
 
 
IV. serviço de identificação e localização de pais, responsável, crianças 
e adolescentes desaparecidos; 
V. proteção jurídico-social por entidades de defesa dos direitos da 
criança e do adolescente”. 
Sistema secundário– possui natureza preventiva e abrange as medidas de proteção 
dirigidas a crianças e adolescentes em situação de risco pessoal ou social que sejam vítimas, 
cujos direitos fundamentais foram violados (especialmente os arts. 98 e 101). Essas medidas 
protetivas são aplicáveis às crianças e adolescentes vitimados. 
Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis 
sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou 
violados: 
I. por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; 
II. por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; 
III. em razão de sua conduta. 
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a 
autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes 
medidas: 
I. encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de 
responsabilidade; 
II. orientação, apoio e acompanhamento temporários; 
III. matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de 
ensino fundamental; 
 
 
 
 
IV. inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à 
criança e ao adolescente; 
V. requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em 
regime hospitalar ou ambulatorial; 
VI. inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação 
e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; 
VII. acolhimento institucional; 
VIII. inclusão em programa de acolhimento familiar; 
IX. colocação em família substituta. 
(Parágrafos 1º. ao 12 – ver no texto oficial) 
Sistema terciário – trata das medidas socioeducativas destinadas a adolescentes em 
conflito com a lei por terem cometido atos infracionais, ou seja, aqueles que passam da condição 
de vitimizados a vitimizadores (refletido especialmente nos arts. 103 e 112. 
Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou 
contravenção penal. 
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente 
poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: 
I. advertência; 
II. obrigação de reparar o dano; 
III. prestação de serviços à comunidade; 
IV. liberdade assistida; 
V. inserção em regime de semi-liberdade; 
 
 
 
 
VI. internação em estabelecimento educacional; 
VII. qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. 
§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua 
capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da 
infração. 
§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a 
prestação de trabalho forçado. 
§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental 
receberão tratamento individual e especializado, em local 
adequado às suas condições. 
Pela legislação brasileira, o direito à proteção especial às crianças e adolescentes abrange 
os aspectos relativos ao trabalho, como idade mínima de 14 anos para a admissão, aquisição de 
direitos trabalhistas e previdenciários; garantia de acesso do trabalhador adolescente à escola; 
conhecimento da atribuição de ato infracional com defesa técnica por profissional qualificado; 
respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, obedecendo aos princípios da 
excepcionalidade na aplicação de medidas privativas de liberdade; estímulo do poder público 
para o acolhimento por guarda de órfãos ou abandonados; acesso a programas de prevenção e 
atendimento especializado aos dependentes químicos. Além disso, a lei prevê a punição contra 
abuso, a violência e a exploração sexual infanto-juvenil. 
Importante – O ECA (Lei nº. 8069/1990) prevê a aplicação das medidas protetivas, 
mediante a ameaça ou violação a direitos, pela ação ou omissão da sociedade ou do Estado, por 
falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis pelas crianças e adolescentes. O acionamento do 
sistema secundário de prevenção, enquanto medida de proteção da criança ou adolescente 
vitimizado tem caráter preventivo da delinqüência. 
 
 
 
 
As medidas específicas de proteção também são aplicáveis à conduta conflitante com a 
lei, nas hipóteses previstas no art. 98 do ECA. Contudo, tais medidas devem levar em conta as 
necessidades pedagógicas, visando o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, o que 
comumente tem se distanciado da prática das instituições responsáveis e do poder público. 
Segundo Saraiva (2005), mediante alguma falha do sistema primário de prevenção, o 
sistema secundário é acionado para proteger a criança ou adolescente, por meio do Conselho 
Tutelar. No caso de adolescente em conflito com a lei ou de ato infracional atribuído a este, são 
determinadas as medidas socioeducativas do terceiro sistema de prevenção, através da 
intervenção da Polícia, do Ministério Público, Defensoria e órgãos executores das medidas 
socioeducativas. 
Investigando a realidade – As políticas de atendimento à criança e ao adolescente são 
hoje temas importantes das agendas dos governos estaduais e municipais. 
Procure saber em seu estado e município quais ações e projetos estão sendo realizados 
para implementação dessa política. 
Aula 3 – Violência e mortalidade 
Apesar da priorização absoluta dos direitos das crianças e dos adolescentes, da clareza das 
regras da proteção integral no sistema jurídico brasileiro, a atenção do Estado dada a estes 
sujeitos ainda é deficitária e por vezes, incongruente com o arcabouço normativo construído no 
âmbito nacional e internacional. 
A realidade da infância e da juventude brasileira se configura numa problemática de 
violações de direitos fundamentais enfrentada cotidianamente, dos quais se destacam, além de 
diversos tipos de violência, os seguintes problemas: 
- a mortalidade infantil e juvenil; 
- a exploração do trabalho infantil; 
 
 
 
 
- o tráfico e a exploração sexual infanto-juvenil. 
Diante da legislação mais avançada acerca dos direitos da criança e do adolescente, o que 
se observa é que há muito ainda o que fazer, em especial para a implementação dos dispositivos 
contidos nos principais tratados internacionais, dos quais o Brasil é signatário e que orientaram a 
legislação sobre os direitos da criança para a consolidação de políticas públicas que garantam a 
proteção integral: a Declaração Universal dos Direitos da Criança e a Convenção Internacional 
sobre os Direitos da Criança. 
Desde os anos 1990, muitos foram os avanços em termos da concepção da proteção 
integral à criança, da criação de um sistema de garantias, dos investimentos em programas 
governamentais na área de saúde e educação que apresentaram reduções nas taxas de 
mortalidade, analfabetismo e desnutrição da população infantil. 
Em vista da realização da 8ª Conferência Nacional da Criança e do Adolescente, o 
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) disponibilizou um 
texto-base para que municípios e estados aprofundassem o debate sobreos eixos prioritários 
dessa conferência. Entre os eixos, consta a “Proteção e Defesa no Enfrentamento das Violações 
de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes” que expressa a preocupação do Conselho com 
o crescimento das denúncias de diversas violências e violações contra crianças e adolescentes na 
mídia. 
Através do Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes (VIVA) do Ministério da 
Saúde, no período de 2006-2007, os dados demonstraram que crianças e adolescentes estão 
expostos às mais variadas formas de violência em 27 unidades da federação. Além de tantos 
estudos que demonstram o recrudescimento das violências, constata-se que os altos índices de 
letalidade possuem um recorte etário, étnico, econômico e de gênero, sendo vitimados 
majoritariamente jovens do sexo masculino, negros e pobres residentes em comunidades 
periféricas. 
 
 
 
 
Conforme Mendes (2009), das condições de vida da população infanto-juvenil, focaliza-se 
a mortalidade, que no Brasil apresenta-se com os seguintes indicadores descritos pela Agência de 
Notícias dos Direitos da Infância (ANDI, 2007): 
a) Mortalidade infantil: 
i. A taxa de mortalidade infantil no País é de 21,1 mortes por mil nascidos 
vivos, a terceira maior da América Latina, atrás da Bolívia e da Guiana. O 
índice brasileiro é considerado médio pelos critérios da OMS. Contudo, em 
alguns estados é bem mais elevado, como em Alagoas (44,4 por mil), 
Maranhão (32,7) e Paraíba (34). 
ii. Acidentes e agressões, juntos, são a primeira causa de morte de meninos e 
meninas com até seis anos no País, de acordo com a Análise da Violência 
Contra a Criança e o Adolescente, do Unicef. A pesquisa A Ponta do 
Iceberg, do Laboratório de Estudos da Criança da Universidade de São 
Paulo (Lacri), estima que apenas 10% dos casos de violência intrafamiliar 
chegam a ser conhecidos. 
b) Mortalidade juvenil: 
Os jovens de 15 a 24 anos continuam sendo as maiores vítimas de homicídio, conforme 
aponta o Mapa da Violência 2006 – Os Jovens do Brasil, da Organização dos Estados Ibero-
Americanos para a Educação, a Ciência e Cultura (OEI). O estudo, que abrange o período de 
1994 a 2004 com base em dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do 
Ministério da Saúde, revela que aconteceram 175.548 assassinatos no período. De toda a 
população dessa faixa etária no País, 39,7% são atingidos pela violência letal. A situação é mais 
grave nos estados de Pernambuco, Rio de Janeiro e Espírito Santo, onde metade dos jovens foram 
alvos de mortes violentas na década analisada. Outro dado apontado pela OEI é de que os 
homicídios cresceram 48,4% no geral da população, mas o acréscimo foi de 64,2% entre os 
 
 
 
 
jovens. No principal grupo de risco estão os adolescentes do sexo masculino, afro descendentes 
que residem em bairros pobres ou nas periferias das metrópoles, com baixa escolaridade e pouca 
qualificação profissional. 
Ampliando seu conhecimento – Apesar dos dados apresentados acima serem do Mapa 
da Violência 2006, eles são bastante significativos, pois fazem parte da série intitulada “Os 
Jovens do Brasil” que tinha como foco a mortalidade violenta da faixa jovem. 
De 2006 a 2010 os dados, além de serem atualizados, ganharam outros recortes: os dados 
são apresentados por unidades federativas, capitais, regiões metropolitanas e municípios, 
conformando um dos capítulos do Mapa da Violência 2010 e possibilitando outras análises sobre 
a questão. 
Acesse o mapa na íntegra nos materiais complementares. 
Segundo o UNICEF, é significativo o número de mortes de crianças com menos de sete 
anos de idade por causas não especificadas: de acordo com o Sistema de Informação de 
Mortalidade do Ministério da Saúde, em 2003, representou 32,5% entre todas as causas externas 
(intoxicação, sequelas de queimadura, operações de guerra, entre outros). 
A tabela abaixo aponta que, no período pesquisado, as mortes por acidentes de transportes 
concentram os índices mais altos em todas as faixas etárias entre menores de um ano e 19 anos. 
Entretanto, as causas externas não especificadas acometeram um percentual considerável de 
crianças menores de um ano (58,24%). A falta de especificação se deve à forma da apresentação 
e classificação e não à irrelevância dos dados. 
 
 
 
 
1 
Finalizando... 
Neste módulo, você estudou que: 
 Segundo Mendes (2009), podem ser apontados histórica e cronologicamente fatos 
e alguns instrumentos normativos que fundamentam a doutrina da proteção 
integral, em âmbito nacional e internacional, acerca dos Direitos da Criança. 
 No Brasil, a Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na história brasileira, 
aborda a questão da criança como prioridade absoluta, tornando sua proteção 
dever da família, da sociedade e do Estado(Art. 227). 
 A Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente 
(ECA) é a lei que reconhece esse público como sujeito de direitos em nosso país, 
defendendo o seu interesse superior. 
 
1 Fonte: UNICEF (2005) 
 
 
 
 
 Apesar da priorização absoluta dos direitos das crianças e dos adolescentes, da 
clareza das regras da proteção integral no sistema jurídico brasileiro, a atenção do 
Estado dada a esses sujeitos ainda é deficitária e, por vezes, incongruente com o 
arcabouço normativo construído no âmbito nacional e internacional. 
 
 
Módulo 3–Adolescentes em Conflito com a Lei 
Apresentação do módulo 
Neste módulo, você estudará sobre o que é ato infracional, a questão da inimputabilidade 
penal, além de refletir sobre o tema da redução da maioridade penal. 
Objetivos do módulo 
Ao final do estudo deste módulo, você será capaz de: 
 Compreender o que é ato infracional e distingui-lo de crime e contravenção penal, 
além de apreender a sistemática da punição dos atos infracionais; 
 Distinguir a aplicação da legislação à criança e ao adolescente infrator; 
 Compreender o que significa inimputabilidade penal e distingui-la de impunidade; 
 Refletir a respeito da redução da maioridade penal no país; 
 Analisar os sistemas de responsabilização adotados em outros países. 
Estrutura do módulo 
Este módulo é formado por três aulas: 
 Aula 1–Adolescentes em conflito com a lei. 
 Aula 2–A Imputabilidade Penal pelo Mundo: Estudo de Direito Comparado. 
 Aula 3–A redução da maioridade penal. 
Aula 1–Adolescentes em conflito com a lei 
A questão fundamental não é saber o que faz do jovem um “infrator da lei”, mas sim 
analisarmos o porquê de adolescentes e crianças, que são as principais vítimas, poderem ser 
também autores de infrações penais. 
 
 
Segundo o Manual para a Medição dos Indicadores da Justiça Juvenil (2006) do Escritório 
de Drogas e Crime da Unicef, as causas sociais subjacentes que levam crianças a estarem em 
conflito com a lei incluem pobreza, lares destruídos, falta de educação e oportunidades de 
emprego, migração, drogas ou mau uso de substâncias, pressão de pares, falta de orientação 
parental, violência, abuso e exploração. 
Nesse sentido, reforça-se importância de se ter as políticas de prevenção da violência 
integradas com as políticas de repressão da criminalidade, em especial quando se trata de crianças 
e adolescentes. 
1.1. A inimputabilidade penal e o ECA 
A idade da responsabilidade criminal ou maioridade penal é a idade a partir da qual um 
indivíduo pode ser responsabilizado penalmente por seus atos. A maioridade penal pode ser 
diferente da maioridade civil, que consiste nas idades mínimas necessárias para dirigir, trabalhar 
e casar. 
De acordo com o referido manual da Unicef, a idade da responsabilidade criminal está 
entre 7 e 18 anos nos países pesquisados, uma vez que a maioridade penal pode variar em cada 
país de acordo com sua jurisdição própria. Existem países que utilizam mais de uma idade de 
responsabilidade criminal, conforme a categoria do ato infracional cometido.O Manual explica que: 
Quando a idade de responsabilidade criminal for especialmente elevada – 
17 ou 18 anos – é possível que o sistema de justiça juvenil do país seja 
voltado basicamente para o bem-estar. Sob tal sistema, as crianças não 
são descritas como tendo cometido um ato infracional, visto que tal 
comportamento por parte das crianças é percebido como uma questão de 
bem-estar, social ou educacional. Mesmo assim, estes tipos de sistema 
ainda assim podem condenar crianças à privação de liberdade em 
instituições tais como estabelecimentos educacionais fechados. [...] 
 
 
Quando a idade de responsabilidade criminal é menor, é mais provável 
que os sistemas nacionais utilizem juizados e tribunais de menores. 
No Brasil, a idade da responsabilidade penal é a partir de 18 anos, pois a legislação 
brasileira determina que as pessoas abaixo dessa idade são penalmente inimputáveis, ou seja, não 
podem ser condenadas pela prática de crimes ou contravenções penais. A maioridade penal foi 
definida no artigo 271 do Código Penal e reforçada pelos artigos 2282da CF/88 e 1043 do ECA. 
Importante – Segundo Saraiva (2005), o desconhecimento sobre o sistema de 
responsabilidade penal juvenil contido no ECA favorece uma confusão acerca dos conceitos de 
inimputabilidade penal e impunidade, ocasionando o pleito de que o sistema penal adulto seja 
estendido ao adolescente em conflito com a lei, bem como de se reduzir a idade de 
imputabilidade penal, desprezando inclusive o dispositivo constitucional. 
Ocorre que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foi concebido com o objetivo 
de garantir legalmente as condições necessárias para o desenvolvimento pleno das crianças e dos 
adolescentes que necessitam de proteção diferenciada, especializada e integral. Todavia, o ECA 
contém os mecanismos de responsabilização penal dos infratores, de modo pedagógico e 
retributivo, por intermédio das medidas socioeducativas. Esse modelo de responsabilização penal 
do adolescente possibilita a aplicação de sanções aptas a interferir, limitar e até suprimir 
temporariamente a liberdade com um caráter socioeducativo e uma essência retributiva. 
Santos (2002) afirma que, 
É verdade que ao criar as medidas sócio-educativas, o legislador tentou 
dar um tratamento diferenciado aos menores, reconhecendo neles a 
 
1Art. 27. Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às 
normas estabelecidas na legislação especial. 
2Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da 
legislação especial. 
3Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas 
previstas nesta Lei. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do 
adolescente à data do fato. 
 
 
condição peculiar de pessoas em desenvolvimento. Nessa linha, as 
medidas deveriam ser aplicadas para recuperar e reintegrar o jovem à 
comunidade, o que lamentavelmente não ocorre, pois ao serem 
executadas transformam-se em verdadeiras penas, completamente 
inócuas, ineficazes, gerando a impunidade, tão reclamada e combatida por 
todos. 
De acordo com Colpani (2003), as Regras de Beijing, recomendadas no 7º Congresso das 
Nações Unidas sobre prevenção de delito e tratamento do delinqüente, realizado em Milão 
(1985), e adotadas pela Assembléia Geral em 29.11.85, estabeleceram uma orientação acerca da 
necessidade de promover o bem-estar da criança e do adolescente, bem como de sua família, 
disponibilizando a Justiça da Infância e da Juventude como parte integrante do processo de 
desenvolvimento de cada país. 
Assim, a Regra 7 prevê: 
Respeitar-se-ão as garantias processuais básicas em todas as etapas do 
processo, como a presunção de inocência, o direito de ser informado das 
acusações, o direito de não responder, o direito à assistência judiciária, o 
direito à presença dos pais ou tutores, o direito à confrontação com 
testemunhas e a interrogá-las e o direito de apelação ante uma autoridade 
superior. 
Em relação aos estudos sobre o perfil do adolescente infrator, Colpani (2003) afirma que 
“depreende-se assim que os motivos que levam o adolescente a cometer atos infracionais 
resultam dos problemas econômicos, sociais e culturais, bem como pela influência de amigos, a 
evasão escolar, o uso de drogas e a pobreza, indicando assim as áreas que as políticas públicas 
devem atuar com maior urgência”. 
Considerando a realidade brasileira e o contexto dos serviços de atendimento 
socioeducacional, a autora defende que a aplicação de medidas socioeducativas esteja interligada 
 
 
ao contexto social, político e econômico no qual o adolescente está inserido. Para reintegrá-lo à 
sociedade, com vistas a diminuir a reincidência e a prática de atos infracionais cometidos por 
adolescentes, é preciso que o Estado promova políticas públicas infanto-juvenis que garantam os 
direitos à convivência familiar e comunitária, à saúde, à educação, à cultura, esporte e lazer, bem 
como aos demais direitos universalizados. 
Importante – Inimputabilidade é diferente de impunidade. 
1.2. O ato infracional atribuído à criança e ao adolescente 
De acordo com o art. 103 do ECA, ato infracional é a conduta descrita na lei correlata a 
crime ou contravenção penal praticada por criança ou adolescente. 
Importante – Tanto crianças como adolescentes poderão cometer ato infracional. 
Entretanto, as conseqüências é que serão diferentes, uma vez que as medidas adotadas sempre 
terão, também, um caráter protetivo. 
Quando a criança ou adolescente pratica um ato infracional, haverá um tratamento 
diferenciado para cada um deles, não obstante possa ocorrer a mesma conduta ilícita. Na verdade, 
a distinção entre criança e adolescente tem importância no Estatuto, posto que, não obstante 
usufruírem dos mesmos direitos fundamentais, recebem medidas diferenciadas na hipótese de 
ocorrência de ato infracional. 
Assim, de acordo com o art. 105, do ECA, às crianças (menores de 12 anos – art. 2º) que 
cometerem ato infracional serão aplicadas as medidas protetivas previstas no art. 101, que 
implicam num tratamento, através da sua própria família ou da comunidade, sem que ocorra 
privação de liberdade. São elas: 
I. encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; 
II. orientação, apoio e acompanhamento temporários; 
III. matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino 
fundamental; 
 
 
IV. inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao 
adolescente; 
V. requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime 
hospitalar ou ambulatorial; 
VI. inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a 
alcoólatras e toxicômanos; 
VII. acolhimento institucional; 
VIII. inclusão em programa de acolhimento familiar; 
IX. colocação em família substituta. 
Importante – Se uma criança for acusada de cometer um ato infracional, deve ser 
encaminhada ao Conselho Tutelar. Caso este não exista, ela deve ser conduzida ao Juiz da 
Infância e da Juventude ou aquele que exerça essa função. 
Quando um ato infracional for atribuído a um adolescente (de doze a 18 anos – art. 2º, Lei 
8.069/90), nos termos do art. 112do ECA, este ficará sujeito às medidas socioeducativas previstas 
no capítulo IV desse diploma legal e, cumulativamente, às medidas de proteção do artigo 101. 
Reveja o que dispõe o art. 112: 
 Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente 
poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: 
i. advertência; 
ii. obrigação de reparar o dano; 
iii. prestação de serviços à comunidade; 
iv. liberdade assistida; 
v. inserção em regime de semiliberdade; 
vi. internação em estabelecimento educacional; 
vii. qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. 
 
 
Vejao que significa cada uma das medidas socioeducativas: 
Advertência– Pode ser conceituada como a admoestação verbal aplicada pela autoridade 
judicial e reduzida a termo. Nesse ato devem estar presentes o juiz e o membro do Ministério 
Público. Na advertência, o juiz normalmente conversa com o adolescente sobre os atos cometidos 
e produz um documento sobre o ocorrido. 
Obrigação de reparar o dano – Ao estabelecer essa medida, a autoridade judicial poderá 
determinar, se for o caso, que o adolescente restitua o objeto, promova o ressarcimento do dano 
ou compense o prejuízo da vítima. 
Prestação de serviços à comunidade–Consiste na realização de tarefas gratuitas de 
interesse geral, por período não excedente a seis meses, em uma jornada máxima de 08 horas 
semanais, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, 
bem como em programas comunitários ou governamentais. 
 Exemplo - Veja a seguir, a título de exemplo, a jurisprudência do Tribunal de 
Justiça de São Paulo, no qual foi aplicada a medida de serviços à comunidade: 
“Ementa: Menor infrator. Ato infracional equiparado ao furto qualificado. 
Prestação de serviços à comunidade decretada. Recurso pretendendo ver 
reconhecido o furto de uso, com a consequente absolvição do adolescente. 
Parecer da Procuradoria Geral de Justiça pelo improvimento do apelo. Em 
sede menorista importa o envolvimento do menor em ato ilícito. 
Adolescente que, aliás, já conta com anterior passagem pelo juízo 
especializado. Medida sócio-educativa bem aplicada. Acerto da decisão. 
Recurso improvido. (Apelação n. 79.297.0/5-00, TJ/SP)”. 
Liberdade assistida – É uma medida que será adotada sempre que a autoridade 
responsável entender seja a alternativa mais viável para o acompanhamento, auxílio e orientação 
do adolescente. Nesse caso, o adolescente e sua família serão acompanhados por um profissional 
por, no mínimo, seis meses. Nesse período, se necessário, eles poderão ser inseridos em projetos 
 
 
sociais e o adolescente terá sua frequência e rendimento escolar acompanhados, além de receber 
incentivo para o ingresso no mercado de trabalho formal, caso sua idade seja compatível. 
Semiliberdade – É a privação parcial da liberdade do adolescente que praticou ato 
infracional. É cumprida da seguinte forma: a) durante o dia – realiza atividades externas 
(trabalho/escola); b) no período noturno – ele é recolhido ao estabelecimento apropriado, com o 
acompanhamento de orientador. No ECA não foi fixada a duração máxima da semiliberdade, 
cabendo à autoridade judicial avaliar cada caso. O regime de semiliberdade pode ser determinado 
desde o início ou como forma de transição para o meio aberto, e a realização das atividades 
externas é possibilitada, independentemente de autorização judicial. 
Internação–É a medida mais grave e complexa imposta aos adolescentes. É conhecida 
como privação de liberdade. Trata-se de restrição ao direito de liberdade do adolescente. Ela é 
aplicada nos seguintes casos e presentes os seguintes requisitos: 
a) ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência à pessoa; 
b) reiteração no cometimento de outras infrações graves; 
c) descumprimento reiterado e injustificável de medida anteriormente imposta (que 
pode ser de internação ou outra medida socioeducativa). 
Importante – O período máximo de internação deverá ser de três anos. Atingido esse 
limite de tempo, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de 
liberdade assistida. 
O STF já consolidou seu entendimento no sentido de que, para a aplicação da medida de 
internação, devem estar presentes esses requisitos. Prova disto é o HC 93900, do Rio de Janeiro, 
julgado pela Segunda Turma, em 10/03/2009: 
EMENTA: Infância e Juventude. Menor. Ato infracional. Fatos 
assemelhados a tráfico de entorpecentes e porte ilegal de armas. Medida 
de internação. Inadmissibilidade. Atos praticados sem violência nem 
grave ameaça. Reiteração ou reincidência não demonstrada. Cassação da 
 
 
medida socioeducativa para que outra seja aplicada. HC concedido para 
esse fim. Inteligência do art. 122, I e II, do ECA (Lei nº 8.069/90). 
Precedente. Não é lícito impor a menor infrator medida de internação, se 
o ato infracional não foi praticado mediante violência nem grave ameaça, 
nem seja caso de reiteração ou reincidência. 
Ampliando seu conhecimento – Antes de continuar seus estudos, leia a entrevista com 
Mário Volpi, gerente de projetos do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e 
coordenador do programa Cidadania dos Adolescentes no Brasil,sobre a medida de internação. 
1.3. Os mecanismos legais a que adolescentes em conflito com a lei podem ser submetidos 
Percebe-se que os adolescentes autores de ato infracional, ao contrário do que o senso 
comum por vezes imagina, não ficam impunes. Estes são julgados e considerados responsáveis 
pelos atos tipificados como crime ou contravenção no Código Penal e na Lei de Contravenções 
Penais. Os artigos 100 a 125 do ECA apresentam os mecanismos legais a que crianças e 
adolescentes em conflito com a lei devem ser submetidos. Entretanto, do ponto de vista jurídico, 
criança e adolescente nunca cometerão crime, que é, junto com ato infracional e contravenção 
penal, espécie do gênero infração penal. 
Nesse sentido, veja a jurisprudência do Supremo: 
EMENTA: Estatuto da Criança e do Adolescente. Ato infracional. 
Equiparação ao crime de roubo qualificado por emprego de arma de fogo 
e concurso de pessoas. Grave ameaça caracterizada. Possibilidade de 
internação. Observância do devido processo legal. HC indeferido. 
Inteligência dos arts. 121 e 122 da Lei nº 8.069/90. A medida sócio-
educativa de internação do menor constitui-se em ato excepcional que se 
configura quando atendidos os requisitos dos artigos 121 e 122 da Lei nº 
8.069/90. A decisão que culminou na aplicação de medida sócio-
educativa de internação demonstrou com suficiente clareza as razões 
 
 
fáticas e jurídicas autorizadoras do ato de segregação. Assim, presentes os 
requisitos previstos nos artigos 121 e 122, inc. I, ambos da Lei nº 
8.069/90, possível é a manutenção da medida de internação. Precedente: 
HC 84.603, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ nº 232 de 03.12.2004. 
Ordem denegada. (HC 94193 / PE, Relator(a): Min. Joaquim Barbosa, 
julgado pela Segunda Turma, em 09/12/2008). 
Exemplo – Veja também inteiro teor de “Acórdão recente do Supremo” em anexo na 
plataforma. 
1.4. Quando há flagrante 
Ainda no caso dos adolescentes, as condutas se distinguem, relativamente à ocorrência de 
flagrante. De acordo com art. 1784 e 2325 do ECA, se houver flagrante, o adolescente deve ser 
encaminhado a autoridade policial especializada, sem algema ou qualquer situação vexatória, em 
veículo comum. A lei estabelece, de acordo com o sistema integrado de proteção, que é o cerne 
do Estatuto da Criança e Adolescente, tratamento diferenciado aos jovens infratores. 
Importante – Novamente é importante reiterar que o Estatuto da Criança e Adolescente 
(ECA) não pretende com isso proteger os autores de ato infracional. Eles são responsabilizados 
por seus atos, mas estão de acordo com sua condição especial de cidadão em desenvolvimento. 
Quanto à utilização de algemas, esta também não se aplica indistintamente aos adultos 
autores de crime. Seu uso deve ser restrito a situações especiais que as exijam. Nesse sentido o 
próprio Supremo Tribunal Federal já se manifestou editando a Súmula Vinculante n. 11, que 
dispõe: 
 
4Art. 178. O adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional não poderá ser conduzido 
ou transportado em compartimento fechado de veículo policial, em condições atentatórias à sua 
dignidade, ou que impliquem risco à sua integridade física ou mental, sob pena de 
responsabilidade. 
5Art. 232. Submeter criança ou adolescente sob sua autoridadeguarda ou vigilância a vexame ou 
a constrangimento: Pena – detenção de seis meses a dois anos. 
 
 
Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio 
de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do 
preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena 
de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e 
de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo 
da responsabilidade civil do Estado. 
Também não se pretende que os profissionais de segurança pública deixem de tomar todas 
as medidas necessárias a sua segurança, à segurança de terceiros e do adolescente infrator. 
Entretanto, suas práticas devem ser pautadas no princípio de que esse adolescente é sujeito de 
direitos e deveres, e os procedimentos previstos no seu tratamento são universais. 
Aula 2–A Imputabilidade Penal pelo Mundo – Estudo de Direito Comparado 
Diferentemente do que tem sido divulgado nos meios de comunicação, a idade de 
responsabilidade penal em nosso país encontra-se em consonância com a maioria dos países do 
mundo. 
De acordo com dados da publicação “Porque dizer não à Redução da Idade Penal”, da 
Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República – de uma lista de 54 
países analisados, incluindo o Brasil, a maioria adota a maioridade penal aos 18 anos. Desse 
universo de 53 países – excluído o Brasil – temos que 79%, ou seja, 42 países, adotam esse 
referencial para a responsabilidade penal. Isso decorre das recomendações internacionais que 
sugerem um sistema de justiça especializado para processar, julgar e responsabilizar os menores 
de 18 anos. 
Estudo dirigido – Acesse o quadro comparativo6 extraído da publicação “Porque dizer 
não à Redução da Idade Penal”, contendo a idade de responsabilidade penal de jovens 
(responsabilidade especial) e adultos em 53 países e acompanhe a seguir a análise. 
Analisando o quadro, observe que: 
 
6 Ver o arquivo “Quadro comparativo” em anexo na plataforma. 
 
 
- Há no mundo a tendência de implantação de legislações e justiças especializadas 
para tratar de menores de 18 anos em conflito com a lei. 
- No que tange à idade mínima de responsabilização7 nesses 53 países, verificou-se 
que a predominância (47%) é a fixação da idade entre 13/14 anos. 
- Adotam a idade mínima de13 anos para responsabilização dez países: Argélia, 
Estônia, França, Grécia, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Polônia, República 
Dominicana e Uruguai. 
- A Alemanha, Áustria, Bulgária, Colômbia, Chile, China, Croácia, Eslovênia, 
Hungria, Itália, Japão, Lituânia, Panamá, Paraguai e Rússia (em casos graves) 
fazem parte do grupo de 15 países que adotam a idade mínima de 14 anos. 
- Há países que fixam o início da responsabilidade penal abaixo dos 12 anos: 
Escócia – em alguns casos – (8 anos), Estados Unidos (10), Inglaterra e País de 
Gales (10 anos), México (11 anos), Suíça – em alguns casos – (7 anos) e Turquia 
(11 anos). 
- Doze são os países que estabelecem a idade de início de “responsabilização” aos 
12 anos (responsabilização especial): Brasil, Bolívia, Canadá, Costa Rica, El 
Salvador, Espanha, Equador, Holanda, Irlanda, Países Baixos, Portugal, Peru e 
Venezuela. 
- Cinco países fixam a idade inicial aos 15 anos: Dinamarca, Finlândia, Noruega, 
República Checa e Suécia. E por fim, aos 16 anos, temos Argentina, Bélgica e 
Romênia. 
Cabe destacar que o direito brasileiro, quanto à idade inicial de incidência da justiça da 
infância e juventude, fixada aos 12 anos em nossa legislação, encontra-se entre os países que 
adotam idades relativamente precoces para responsabilização. 
 
7 Ver o arquivo “Responsabilização” em anexo na plataforma. 
 
 
Aula 3 – Redução da maioridade penal 
Em 1993, foi apresentada no Congresso Nacional a PEC 171/93 com o objetivo de alterar 
o artigo 228 da Constituição da República de 88, reduzindo a maioridade penal para 16 anos. De 
lá pra cá diversas PECs foram apensadas à PEC 171/93 (PEC 37/95; PEC 91/95; PEC 301/96; 
PEC 531/97; PEC 386/96; PEC 426/96; PEC 633/99; PEC 321/01 e PEC 377/01). Em 2007, o 
tema foi objeto de deliberação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal e 
uma votação apertada, de 12 a 10, aprovou o substitutivo de autoria do Senador Demóstenes 
Torres (DEM/GO), que reunia seis propostas de emenda à Constituição. Atualmente, tendo sido 
aprovada na CCJ do Senado, a proposta se encontra no Plenário da Casa para discussão. Se 
aprovada em dois turnos, por 3/5 dos senadores em cada um dos turnos, a matéria será 
encaminhada à Câmara Federal. 
O substitutivo do Senado prevê a redução da maioridade penal para 16 anos nos casos de 
crimes hediondos e equiparados, como tráfico, tortura e terrorismo, desde que um laudo técnico 
psicológico, elaborado por junta médica designada pelo juízo, ateste a plena capacidade de 
entendimento do adolescente infrator. 
Em que pese a PEC esteja tramitando no Congresso Nacional e dado o caráter polêmico 
das várias propostas com esse mesmo teor, nenhuma destas foi efetivada nem debatida 
seriamente com a sociedade. 
Ao contrário, o debate em torno da redução da maioridade no Brasil costuma vir à tona 
em situações extremas, em momentos de grande comoção nacional, quando algum “crime” 
extremamente violento é cometido por um adolescente e acaba se mostrando superficial, 
tendencioso e pouco racional. 
Nesse sentido, você estudará a seguir alguns argumentos tanto favoráveis como contrários 
à redução, para que tenha subsídios para realizar essa discussão de forma qualificada sobre a 
questão. 
 
 
3.1. Argumentos favoráveis à redução da maioridade 
Os que defendem a redução da maioridade penal acreditam que os adolescentes infratores 
não recebem a punição devida; que o Estado é condescendente demais com os menores de 18 
anos. Para eles, o Estatuto da Criança e do Adolescente é muito tolerante com os infratores e não 
intimida os que pretendem transgredir a lei. Eles argumentam que, se a legislação eleitoral 
considera que o jovem de 16 anos tem discernimento para votar, ele tem também idade suficiente 
para responder diante da justiça por seus crimes. Ainda, para os que são favoráveis à redução, 
esta se impõe pela necessidade do Estado em dar uma satisfação à vitima e a seus familiares. 
Nesse sentido, Sandro César Sell refuta com veemência a impossibilidade da redução da 
maioridade penal nos seguintes termos: 
Se a idade de 18 é assim, então, tão arbitrária, por que não se pode 
rediscuti-la? Arbitrária também era a idade de 21 anos para a 
determinação da capacidade civil absoluta; notou-se que era inadequada 
aos novos tempos e se a mudou. Arbitrária também era a idade de 18 anos 
para poder votar em alguém no Brasil, alguns acharam que os tempos 
eram outros e baixou-se para 16 anos. Isso significa que há o 
reconhecimento de que os jovens de hoje podem mais cedo fechar 
contratos civis, sem a assistência de seus pais, podem decidir sobre 
inúmeras coisas que antes lhes eram vedadas, podem também votar nos 
homens que fazem as leis penais, só não podem mesmo é responder por 
elas. (SELL, Sandro César. Maioridade penal: um debate legítimo). 
Luiz Flavio Gomes, por sua vez, embora tenha posicionamento contrário à redução da 
maioridade penal, entende que, quando necessário, devem ser extrapolados os limites de três anos 
de internação ou dos 21 anos de idade: 
Uma coisa é a prática de um furto, um roubo desarmado etc., outra bem 
distinta é a morte intencional (dolosa), especialmente quando causada 
com requintes de perversidade. Para o ECA, entretanto, tudo conta com a 
 
 
mesma disciplina, isto é, em nenhuma hipótese a internação do infrator 
(que é medida sócio-educativa voltada para sua proteção e também da 
sociedade) pode ultrapassar trêsanos (ou sobrepor a idade de 21 anos). 
(GOMES, Luiz Flávio. Redução da maioridade penal). 
3.2. Argumentos contrários à redução da maioridade 
Os que são contrários à redução argumentam que: 
- a redução da maioridade penal é incompatível com a doutrina da proteção integral 
da criança e adolescente, cujo fundamento está na CF/88, em tratados e 
documentos internacionais e no ECA, uma vez que a imposição das medidas 
socioeducativas, e não das penas, aos adolescentes decorre do reconhecimento da 
condição peculiar de desenvolvimento na qual estes se encontram; 
- a redução da maioridade penal afronta compromissos internacionais assumidos 
pelo Brasil, que, nos termos do art. 5º, p. 2º da CF/88, também têm peso de norma 
constitucional; 
- o ECA, quando devidamente aplicado, apresenta bons resultados; 
- o recrudescimento da legislação penal ou as medidas repressivas não coíbem a 
violência; e mais, não há dados que comprovem que o rebaixamento da idade 
penal reduz os índices de criminalidade juvenil. Ao contrário, o ingresso 
antecipado no sistema penitenciário brasileiro exporia os adolescentes a 
mecanismos reprodutores da violência, como o aumento das chances de 
reincidência, já que as taxas das penitenciárias ultrapassam 60%, enquanto no 
sistema socioeducativo se situam abaixo de 20%; 
- a adolescência é uma das fases do desenvolvimento psicológico dos indivíduos e, 
por ser um período de grandes transformações, deve ser pensada pela perspectiva 
educativa; 
 
 
- a redução está na contramão do que se discute na comunidade internacional e do 
que tem sido adotado pelo ordenamento jurídico da maioria dos países (vide – A 
Imputabilidade Penal pelo Mundo: Estudo de Direito Comparado); 
- a redução da maioridade penal é inconstitucional por ferir a principiologia da 
Constituição Federal, que confere tratamento diferenciado a todos os adolescentes, 
e por violar cláusula pétrea, uma vez que ainda que não esteja prevista no rol do 
art. 5º da CF/88, é uma garantia individual, e a Constituição assegura entre as 
cláusulas pétreas os direitos e garantias individuais, nos termos do art. 60, p. 4º, 
inciso IV. 
Saraiva afirma que, a tese do rebaixamento da idade penal, em princípio, é 
inconstitucional, porque o art. 228 da CF constitui-se em cláusula pétrea, devido ao seu conteúdo 
de "direito e garantia individual", referido no art. 60, IV da CF, que não é suscetível à 
interposição de emenda. Além disso, a pretensão de redução da maioridade penal viola o disposto 
no art. 41 da Convenção das Nações Unidas de Direito da Criança, na qual os signatários se 
comprometem a não tornar mais gravosa a lei interna de seus países. Como tal convenção foi 
ratificada pelo Estado brasileiro, seu texto se faz lei interna de caráter constitucional à luz do 
parágrafo segundo do art. 5º da CF. 
Entre os que se posicionam contrários à redução temos instituições como a Unicef, o 
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) e a Conferência 
Nacional dos Bispos do Brasil, além de inúmeras organizações não governamentais. Vale 
ressaltar ainda que essa é também a posição do governo brasileiro. 
Independentemente do entendimento que se possa adotar, é preciso que se tenha em mente 
a multicausalidade dos fenômenos violentos8. Não se pode esquecer que problemas complexos 
exigem soluções igualmente complexas. Assim, a mera redução da maioridade penal nunca será 
suficiente para resolver a questão da violência e criminalidade. 
 
8Exemplo disso é a problemática relativa ao consumo de drogas pelos adolescentes. 
 
 
Por outro lado, é preciso não esquecer que os jovens e adolescentes não são os principais 
autores de crimes violentos, em especial homicídios, no Brasil. Ao contrário, são as vítimas 
preferenciais desse tipo de delito, conforme comprovam diversos estudos9, entre eles os dados do 
Índice de Homicídios de Adolescente (IHA), o Mapa da Violência da Unesco e o estudo 
Homicídios de Crianças e Jovens no Brasil (1980-2002), do Núcleo de Estudos da Violência da 
USP, publicado em 2006. 
Finalizando... 
Neste módulo, você estudou que: 
- Segundo o Manual para a Medição dos Indicadores da Justiça Juvenil (2006) do 
Escritório de Drogas e Crime da Unicef, as causas sociais subjacentes que levam 
crianças a estarem em conflito com a lei incluem pobreza, lares destruídos, falta de 
educação e oportunidades de emprego, migração, drogas ou mau uso de 
substâncias, pressão de pares, falta de orientação parental, violência, abuso e 
exploração. 
- A idade da responsabilidade criminal ou maioridade penal é a idade a partir da 
qual um indivíduo pode ser responsabilizado penalmente por seus atos. A 
maioridade penal pode ser diferente da maioridade civil, que consiste nas idades 
mínimas necessárias para dirigir, trabalhar e casar. 
- No Brasil, a idade da responsabilidade penal é a partir de 18 anos, pois a 
legislação brasileira determina que as pessoas abaixo dessa idade são penalmente 
 
9Segundo o estudo Homicídios de Crianças e Jovens no Brasil, publicado em 2006, no período 
estudado (1980-2002), a participação dos homicídios de crianças e adolescentes cresceu 
drasticamente para ambos os gêneros, especialmente na faixa da população entre 0 e 19 anos, 
representando um incremento na taxa de mortes por causas externas dessa população de 254,4% 
no período. No ano de 2002, os homicídios passaram a representar quase 40% das mortes por 
causas externas de crianças e adolescentes no Brasil. 
 
 
inimputáveis, ou seja, não podem ser condenadas pela prática de crimes ou 
contravenções penais. 
- De acordo com o art. 103do ECA, o ato infracional é a conduta descrita na lei 
correlata a crime ou contravenção penal praticada por criança ou adolescente. 
- Assim, de acordo com o art. 105do ECA, às crianças (menores de 12 anos – art. 
2º) que cometerem ato infracional serão aplicadas as medidas protetivas previstas 
no art. 101, que implicam num tratamento, através da sua própria família ou da 
comunidade, sem que ocorra privação de liberdade. 
- Quando um ato infracional for atribuído a um adolescente (de doze a 18 anos – 
art. 2º, Lei 8.069/90), nos termos do art. 112do ECA, este ficará sujeito às medidas 
socioeducativas previstas no capítulo IV desse diploma legal e, cumulativamente, 
às medidas de proteção do artigo 101. 
- Os adolescentes autores de ato infracional, ao contrário do que o senso comum por 
vezes imagina, não ficam impunes. Estes são julgados e considerados responsáveis 
pelos atos tipificados como crime ou contravenção no Código Penal e na Lei de 
Contravenções Penais. Os artigos 100 a 125 do ECA apresentam os mecanismos 
legais a que crianças e adolescentes em conflito com a lei devem ser submetidos. 
Entretanto, do ponto de vista jurídico, criança e adolescente nunca cometerão 
crime, que é, junto com ato infracional e contravenção penal, espécie do gênero 
infração penal. 
- De acordo com art. 178 e 232do ECA, se houver flagrante, o adolescente deve ser 
encaminhado a autoridade policial especializada, sem algema ou qualquer situação 
vexatória, em veículo comum. A lei estabelece, de acordo com o sistema integrado 
de proteção, que é o cerne do Estatuto da Criança e Adolescente, tratamento 
diferenciado aos jovens infratores. 
 
 
- Diferentemente do que tem sido divulgado nos meios de comunicação, a idade de 
responsabilidade penal em nosso país encontra-se em consonância com a maioria 
dos países do mundo. Cabe destacar que o direito brasileiro, quanto à idade inicial 
de incidência da justiça da infância e juventude, fixada aos 12 anos em nossa 
legislação, se encontra entre os países que adotam idades relativamente precoces 
para responsabilização. 
- Desde 1993 foram apresentadas várias PECs que propõem a redução da 
maioridade penal. Entre os que defendem a reduçãoestão os que acreditam que os 
adolescentes infratores não recebem a punição devida e que o Estado é 
condescendente demais com os menores de 18 anos. Os que são contrários 
baseiam-se, principalmente, na inconstitucionalidade da questão. 
 
 
 
 
Módulo 4 – Prevenção: proteção aos direitos da criança e do adolescente 
Apresentação do módulo 
Neste módulo, você estudará sobre a rede de proteção social e o sistema de garantias no 
contexto brasileiro. 
Objetivos do módulo 
Ao final do estudo deste módulo, você será capaz de: 
 Compreender a rede de proteção social das crianças e adolescentes; 
 Identificar os principais instrumentos de atendimento a vítimas e agressores. 
Estrutura do módulo 
Este módulo é formado por duas aulas: 
 Aula 1 – Rede de proteção social; 
 Aula 2 – Atendimento a vítimas e agressores. 
Aula 1 – Rede de proteção social 
Art. 70. É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da 
criança e do adolescente (ECA). 
Esse artigo impõe à sociedade, às instituições, aos poderes, às pessoas físicas e jurídicas o 
dever de evitar ameaças ou violações aos direitos da criança e do adolescente. 
A prevenção ocorre através da abstenção da prática de atos nocivos ao 
desenvolvimento da criança ou adolescente, mediante iniciativas 
tendentes a promover seus direitos fundamentais e também por meio do 
cumprimento espontâneo de obrigações relacionadas à prevenção 
especial. (Comentando sobre o ECA. Profª. Dirce Maria Bengel de Paula 
 
 
 
 
-Profª. universitária de São Paulo).Vale ressaltar que a família é 
responsável pela primeira socialização da criança, mas está inserida num determinado contexto 
social e faz parte de uma rede de relações que devem apoiá-la. As experiências familiares 
cotidianas influenciam direta e indiretamente o desenvolvimento saudável da criança e do 
adolescente. 
Todavia, a conjuntura socioeconômica, o aprofundamento das desigualdades sociais e o 
recrudescimento da violência atual permite-nos questionar sobre como prevenir a ameaça ou a 
violação dos direitos da criança e do adolescente. Para Francisco Xavier Medeiros Vieira, o 
caminho é investir na educação. Ele afirma que: 
Todos temos o dever de prevenir, como indivíduo ou como partícipe da 
comunidade, a ocorrência de ameaça e, mais que isso, assegurar, com 
absoluta prioridade, a efetivação dos direitos assegurados no art. 4º à 
criança e ao adolescente, colocando-os a salvo de toda forma de 
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade, opressão, 
consoante preceitua o caput do art. 227 do Pergaminho Fundamental. 
Assim é que tanto se previne o risco futuro, ou indireto, quanto aquele em 
via de efetivação imediata, risco direto. (Comentário sobre o ECA. Sr. 
Francisco Xavier Medeiros Vieira – Tribunal de Justiça/Santa Catarina). 
Para os casos de ameaça e violação de direitos, o Estatuto da Criança e do Adolescente 
determina que seja ofertada uma política de atendimento aos direitos fundamentais da criança e 
do adolescente e que essa política deve ser implementada através da articulação de redes. 
Art. 86. A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á 
através de um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais da União, dos 
estados, do Distrito Federal e dos municípios. 
 
 
 
 
Os artigos subseqüentes (arts. 87 e 88 – Lei nº 8.069) tratam das linhas de ação e 
diretrizes dessa política de atendimento, que deve abranger a promoção, prevenção, proteção e 
defesa dos direitos da criança e do adolescente, pretendendo que ela seja implementada através de 
ações e programas governamentais federais, estaduais e municipais integrados aos órgãos de 
defesa dos direitos da criança e do adolescente, bem como de entidades da sociedade civil 
organizada. 
Em consonância com a legislação brasileira (ECA e CF/1988), as organizações 
governamentais e não governamentais são responsáveis por disponibilizar os serviços na área das 
políticas sociais básicas, serviços de prevenção, assistência supletiva, proteção jurídico-social e 
defesa de direitos. A articulação interinstitucional das iniciativas dessas organizações é 
fundamental para implementação desses serviços, respeitando-se a natureza e especificidades 
diferentes e complementares de cada organização. 
Importante – As redes de proteção à infância e juventude contam com um marco teórico 
e jurídico para a sua implementação. Entretanto, a operacionalização dessas redes é obstaculizada 
por nossa cultura política marcada pelas relações hierárquicas, clientelistas e personalistas. 
1.1. O Sistema Único de Assistência Social (SUAS) 
Para obter maior eficácia e atender as demandas sociais, as políticas sociais brasileiras 
foram recentemente descentralizadas e estruturadas por meio do Sistema Único de Assistência 
Social (SUAS), adotando um modelo de gestão participativa em respeito ao pacto federativo. O 
SUAS foi implementado a partir dos seguintes níveis de complexidade: 
- Proteção Social Básica (PSB); 
- Proteção Social Especial (PSE). 
No nível básico, a proteção social é destinada à população que vive em situação de 
vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação, acesso precário aos serviços públicos e/ou 
 
 
 
 
fragilização de vínculos afetivos/relacionais e de pertencimento social (discriminações etárias, 
étnicas, de gênero ou por deficiências). 
No que tange a proteção social básica à família preconizada pelo SUAS, a 
principal ação governamental consiste no Programa de Atenção Integral à 
Família (PAIF). O objetivo desse Programa é “desenvolver ações e 
serviços básicos continuados para famílias em situação de vulnerabilidade 
social na unidade do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), 
tendo por perspectivas o fortalecimento de vínculos familiares e 
comunitários, o direito à Proteção Social Básica e a ampliação da 
capacidade de proteção social e de prevenção de situações de risco no 
território de abrangência do CRAS”. (Ministério do Desenvolvimento 
Social e Combate a Fome – MDS). 
O objetivo da proteção social especial consiste em atender as famílias e indivíduos que 
se encontram em situação de risco pessoal e social em decorrência de abandono, maus-tratos 
físicos e/ou psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas 
socioeducativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre outras situações de violação 
dos direitos. 
Importante – Em cada um desses níveis de complexidade são oferecidas ações e 
programas governamentais com articulação interinstitucional e participação social, no âmbito 
municipal, estadual e federal. 
Os serviços de proteção social especial estão interligados com o sistema de garantia de 
direito, por meio de uma gestão mais complexa e compartilhada com o Poder Judiciário, o 
Ministério Público e com outros órgãos e ações do Executivo. 
 
 
 
 
 
 
1.2. O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) 
Em comemoração aos 16 anos da publicação do Estatuto da Criança e do Adolescente, a 
Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República e o Conselho Nacional 
dos Direitos da Criança e do Adolescente criaram, em 2006, o Sistema Nacional de Atendimento 
Socioeducativo (SINASE), fruto de uma construção coletiva que envolveu diversas áreas de 
governo, representantes de entidades e especialistas na área, além de uma série de debates 
protagonizados por operadores do sistema de garantia de direitos em encontros regionais que 
cobriram todo o País. 
O SINASE nasceu vinculado a um tema em especial que vinha mobilizando a opinião 
pública, a mídia e diversos segmentos da sociedade brasileira: o que deve ser feito no 
enfrentamento de situações de violência que envolvem adolescentes na condição de autores de 
ato infracional ou vítimas de violação de direitos no cumprimento de medidas socioeducativas. 
Por outro lado,

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