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Caso Clínico Análise do Comportamento

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Caso Juliana
Juliana, 33 anos, formada em Biologia e, atualmente, fazendo mestrado
na área. Casada com Márcio (38) e caçula de 4 filhos, Juliana veio de família
simples e ainda não têm filhos. Queixava-se de desânimo e desinteresse:
“parece que minha vida não anda”. Juliana apresentava um forte padrão de
fuga/esquiva e, comportava-se, prioritariamente, em função de contingências
que produziam reforçadores imediatos. Em vista disso, era comum procrastinar
tarefas que envolviam consequências reforçadoras não imediatas. Ao conhecer
sua história, é possível identificar fatores que contribuíram tanto para o
desenvolvimento quanto para a manutenção deste padrão.
Durante sua infância, Juliana ia bem na escola (enquanto as atividades
eram de baixo custo de resposta) e, seus pais não precisaram cobrar para que
ela estudasse. Apesar dos pais e professores exercerem controle sobre seus
filhos e alunos, pela possibilidade de reforçar ou punir comportamentos que
consideram adequados (Skinner, 2003/1953), no caso de Juliana, não se
tornaram estímulos relevantes o suficiente no controle de comportamentos que
fazem parte da classe de comportamentos “estudar” (ler, fazer tarefa, pesquisar
dúvidas, etc) da menina, pois, ainda que não tirasse notas altas, não tinha
prejuízos (variável que colaboraria para uma possível punição do
comportamento de não estudar), mantendo suas notas dentro da média.
Como os pais trabalhavam fora e, os irmãos mais velhos geralmente
estavam envolvidos em atividades extracurriculares, Juliana passava a maior
parte do tempo, em casa, sozinha ou na companhia de amigas. A ela eram
destinadas algumas atividades domésticas como lavar a louça, arrumar a cama
e varrer a sala, que deveria executar logo após o almoço e antes de brincar.
Após a saída dos pais, envolvia-se com desenhos na televisão até que suas
amigas chegassem. Com a chegada das mesmas, para que pudessem ter
mais tempo para brincar e para que pudessem fazê-lo o quanto antes,
ajudavam Juliana com as atividades domésticas de sua responsabilidade. Tal
condição, possivelmente favoreceu para que Juliana protelasse tarefas pois, ao
fazê-lo, recebia ajuda das amigas, que colaboravam para diminuir o custo de
resposta das atividades destinadas a Juliana
reforçando, assim, seu comportamento de procrastinar.
Juliana passava a tarde envolvida em atividades prazerosas com as
amigas e deixava o dever de casa para ser realizado a noite. Eventualmente,
seus pais a ajudavam ou, quando não conseguia terminar, permitiam que
Juliana faltasse a aula no dia seguinte
para que o fizesse. Algumas vezes, as amigas permitiam que Juliana copiasse
a tarefa antes do início da aula, para esquivar-se de punição vinda por parte do
professor. Juliana ingressou em uma faculdade particular de Biologia por
sugestão dos pais, ambos biólogos, mais uma situação na qual não precisou
comportar-se de forma mais custosa, visto que tanto os pais escolheram o
curso por ela quanto permitiram que ingressasse em uma faculdade cujo
vestibular exigiu pouco engajamento devido a baixa concorrência.
Durante a faculdade, as contingências colaboraram para manter o
padrão de Juliana. Além de ter cursado uma faculdade pela qual não tinha
interesse (de pouco valor reforçador – o que dificultou o engajamento de
Juliana nas atividades requeridas pelo curso) o grupo de amizades de Juliana
ajudavam-na nos trabalhos e a estudar para as provas. Juliana até tentava:
sentava-se para estudar mas, permanecia pouco tempo envolvida. Levantava
para comer, assistir televisão, ligar para a colega de sala para queixar-se de
sua dificuldade e/ou pedir dicas para desenvolver sua parte do trabalho, etc.
Quando não concluía sua parte nas tarefas grupais, uma amiga mais próxima
fazia a parte de Juliana alegando “ajudar a amiga” – que por vezes se queixava
de dificuldade de concentração – e para ‘não prejudicar o grupo’, incluindo ela
mesma’ (a amiga). Comportamentos de baixo custo de resposta e o padrão de
pouco engajamento em atividades que apresentassem consequências
reforçadoras remotas foram sendo fortalecidas. Não havia punição por parte de
professores, pais, amigos e/ou notas baixas – consequência que seria
naturalmente punitiva – que pudessem punir comportamentos de procrastinar.
A história de contingências de Juliana colaborou para que ela não
desenvolvesse autocontrole, ou seja, comportar-se diante de contingências que
produzem reforços remotos. “Um indivíduo vem a controlar parte do seu
comportamento quando uma resposta tem consequências que provoquem
conflitos – quando leva tanto ao reforço positivo quanto ao reforço negativo”
(Skinner, 2003, p. 252). Uma variável que também colaborou foi que Juliana
tinha suporte financeiro do marido, não passando por privações que pudessem
leva-la a emitir respostas de fuga/esquiva mais direcionadas a engajar-se no
trabalho, por exemplo.
Atualmente Juliana faz mestrado em sua área por incentivo de colegas e
familiares. já que Juliana não conseguia manter-se em trabalho algum: chegava
atrasada, não concluía as tarefas, estava sendo constantemente avaliada e
criticada pelos chefes e frequentemente era despedida. Relatava sentir-se
desanimada e frustrada. Porém, quando
desvinculada do emprego, apesar de sentir-se culpada por não estar
trabalhando (sentimento produto de contingências socialmente punitivas), não
relatou sentir frustração, mas alívio. Ficar em casa, mesmo que não produzisse
consequências de maior valor reforçador (e que pudessem produzir
sentimentos de ânimo, mesmo que no envolvimento de atividades não
relacionadas ao estudo ou trabalho, mas atividades sociais, por exemplo), não
era aversivo como envolver-se com um trabalho pelo qual não tinha interesse.
No mestrado, as contingências colaboram para manter o padrão de
Juliana que protela ou não conclui atividades. A princípio, não houveram
consequências mais drásticas, porém, o mestrado passou a exercer a função
de uma nova agência de controle que tem exigido de Juliana um repertório que
ela não possui: autocontrole e tolerância a frustração.
Com base no relato de caso acima:
1. Descreve as contingências (identificando os antecedentes, respostas e
consequentes) mantenedoras dos comportamentos de Juliana que
ocorriam quando ficava sozinha em casa, quando criança;
2. Descreva as contingências dos comportamentos envolvidos em fazer/não
fazer a lição de casa na infância;
3. Descreve as contingências dos comportamentos de estudas e fazer
trabalho durante a graduação de Juliana;
4. Descreva as contingências dos comportamentos que levaram à demissão
de seus empregos antes da entrada no mestrado.
1. Descreva as contingências (identificando os antecedentes,
respostas e consequentes) mantenedoras dos comportamentos de
Juliana que ocorriam quando ficava sozinha em casa, quando
criança;
A tríplice contingência que ocorria quando Juliana ficava sozinha quando
criança era a seguinte: ela teria que fazer suas atividades de casa quando
chegasse da escola, antes de brincar, entretanto, a mesma almoçava e ficava
assistindo desenhos na televisão aguardando a visita de suas amigas (Sd),
todavia, Juliana ainda não havia realizado as tarefas que seus pais haviam
solicitado, então, como resposta (R), temos as amigas dividindo os afazeres da
menina para ajudá-la, diminuindo o custo da resposta e assim, como
consequência, todas passavam a tarde inteira divertindo-se sem afazeres,
reforçando positivamente o comportamento de procrastinação de Juliana e o
protelar das tarefas (Sr+). Com tais contingências relatadas acima, a cliente não
tinha que fazer tudo sozinha e, ainda por cima, evitava a punição de seus pais
caso não realizasse tais (Sr-) aspecto tido como um comportamento de esquiva.
Esse esquema seguiu repetindo-se no ambiente (Sd : R -> consequência
de não arcar sozinha com suas responsabilidades), já que Juliana percebeu
que se não realizasse suas tarefas assim que chegasse da escola, suas amigasajudariam-na prontamente (CRF), tendo tal aspecto, então, como uma variável
importante a ser considerada na observação das demais contingências.
2. Descreva as contingências dos comportamentos envolvidos em
fazer/não fazer a lição de casa na infância;
Diante do contexto analisado da infância de Juliana, foi possível
identificar a presença de uma contingência que opera diretamente no
comportamento de não concluir tarefas, tal qual persiste em sua vida adulta,
sendo essa a principal queixa apresentada pela mesma no início do processo
terapêutico, visto que a falta de repertório resultou em uma estagnação em sua
vida, tanto no âmbito profissional quanto pessoal. Nesse sentido, observamos
que os estímulos que antecederam o comportamento de não fazer a lição de
casa quando criança, podem ser classificados como a ausência da ajuda dos
pais, que não cobram a conclusão da tarefa (SD) e o aspecto histórico que
envolve essa resposta, mantida em função das consequências reforçadoras e
produzindo, dessa forma, a manutenção desse padrão, uma vez que ao adiar a
realização da lição, a mesma entra em contato com atividades que promovem
prazer (SR+), recebe ajuda dos pais, que por vezes a deixavam faltar para
concluir a atividade ou ajudavam na realização (SR+). Além disso, copiava das
amigas no dia seguinte na escola, se esquivando dessa forma, de uma punição
vinda do professor (SR-) e livra-se dos estímulos aversivos relacionados a fazer
atividades sozinha (SR-).
Portanto, fica claro que em função das consequências reforçadoras
citadas anteriormente, Juliana tende a comportar-se, frequentemente, de modo
a visar reforços imediatos, evidenciando assim, a contribuição dos aspectos
históricos na instalação dos atuais padrões comportamentais da cliente.
3. Descreva as contingências dos comportamentos de estudar e fazer
trabalho durante a graduação de Juliana;
Durante a faculdade, o padrão estabelecido pelas contingências
mantiveram-se. Juliana não apresentava interesse no curso o qual cursava e,
quando havia trabalho ou provas a serem realizadas (Sd), Juliana não se
esforçava para estudar ou realizá-las, ela ligava para as amigas para relatar sua
dificuldade e pedir sua ajuda (R), seu pedido era atendido (Sc), sua amiga,
alegando estar “ajudando a amiga” e com medo de se prejudicar e prejudicar as
outras colegas, a ajudava, muitas vezes realizando a tarefa por ela. Portanto,
seus afazeres eram sempre realizadas e não havia comportamentos punitivos
por parte de seus professores, pais ou colegas, reforçando assim, o
comportamento de Juliana da procrastinação (Sr-).
4. Escreva as contingências dos comportamentos que levaram à
demissão de seus empregos antes da entrada no mestrado.
No caso das contingências que resultaram nas constantes demissões de
Juliana, foi possível observar a reprodução de um mesmo padrão de
comportamento que a acompanha em seu histórico de vida. Se já na idade
escolar foi encontrada uma maneira de se comportar que se baseava num forte
padrão de fuga/esquiva cujas consequências resultavam em reforçadores
imediatos, em outros períodos da vida, como a universidade e a carreira
profissional, a manutenção de tal padrão desenvolvido desde cedo. Isto pode
ser observado ao notarmos o suporte financeiro dado pelo marido e o apoio da
família e dos amigos (SR+) diante de revezes anteriores, podendo passar até
mesmo por períodos de algum apoio de colegas de trabalho e tolerância de
chefias (SR+), todos componentes de uma contingência reforçadora, podendo
ser assim, o ambiente propício para a manutenção daquela maneira de se
comportar. Esse estímulo, eliciou a resposta de procrastinação de tarefas e
falta de responsabilidade (R), que passou portanto, a acompanhá-la. De certo
modo, seus constantes atrasos, maneiras de protelar e procrastinar as tarefas e
os atrasos constantes (R), contribuíram para as sucessivas demissões e
tiveram como consequências tais como o poder ficar em casa e envolver-se em
atividades sociais (Sr+), que reforçou seu padrão de procrastinação, ou seja:
seu comportamento adaptativo mostra-se mais sob controle da consequência
imediata do que da consequência a longo prazo.

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