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RESUMO DIREITOS HUMANOS PARA CONCURSO DEFENSORIA PUBLICA

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1 
 
PONTOS – PROVA ORAL – DPE/SP – DIREITOS 
HUMANOS 
 
1 
Origem, sentido e evolução histórica dos Direitos Humanos. 
Estudo conjunto com: 
Os fundamentos filosóficos dos Direitos Humanos. Os direitos naturais do 
jusnaturalismo racional e do contratualismo moderno. Os direitos 
fundamentais do juspositivismo. 
Milenna 
2 
A sacralidade da pessoa e a dignidade humana. Gabriele 
Estábile 
3 
Teoria crítica dos Direitos Humanos. A denúncia da mistificação ideológica 
dos direitos humanos abstratos. A dificuldade de reconstrução dos direitos 
humanos na era da biopolítica: os limites da cidadania como direito a ter 
direitos, estado de exceção e campo de concentração como paradigmas 
políticos modernos. 
Fabrício dos 
Santos 
4 
Encantos e desencantos dos Direitos Humanos: entre dominação e 
emancipação. Perspectivas pós-violatórias, estatais e monistas X pré-
violatórias, existenciais e pluralistas para a proteção dos Direitos 
Humanos. 
Rebeca 
5 
Efeito encantatório e usos políticos dos Direitos Humanos: intervenções 
humanitárias e imperialismo dos Direitos Humanos (universalismo, 
relativismo e hermenêutica diatópica). 
Iuscia 
6 
5. As tensões da Modernidade ocidental e as tensões dos Direitos 
Humanos: da colonialidade à descolonialidade. Os Direitos Humanos na 
zona de contato entre globalizações rivais. Os Direitos Humanos como 
bandeiras de lutas dos movimentos sociais. 
Daniele 
7 
A reconstrução contra-hegemônica dos Direitos Humanos: Direitos 
Humanos interculturais, pós imperiais e descoloniais no horizonte pós-
capitalista. 
Luis Gustavo 
8 
Direito internacional dos Direitos Humanos: fontes, classificação, 
princípios, características e gerações de direitos humanos. Normas de 
interpretação dos tratados de Direitos Humanos. 
Leonardo de 
Paula 
9 
A responsabilidade internacional por violação dos direitos humanos: 
tratados internacionais de direitos humanos e as obrigações assumidas 
Letícia 
2 
 
pelo Brasil, formas de reparação e sanções coletivas e unilaterais. 
10 O controle de convencionalidade. Cristina 
11 
O direito da autodiscriminação: discriminação direta e indireta e ações 
afirmativas. 
Mariana 
12 
O sistema internacional de proteção e promoção dos Direitos Humanos: 
Organização das Nações Unidas (ONU). Declarações, tratados, 
resoluções, comentários gerais, relatórios e normas de organização e 
funcionamento dos órgãos de supervisão e controle. 
Roberto 
 Lucas 
13 
 
Órgãos convencionais e extraconvencionais. 
Mariela 
14 Declaração Universal dos Direitos Humanos. Ana Carolina 
15 
Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP) e Primeiro 
Protocolo (Criação do Comitê e International accountability). Segundo 
Protocolo (Abolição da pena de morte). 
Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) 
e Protocolo Facultativo. 
Bel 
16 
Convenção para a Prevenção e Punição ao crime de genocídio (junto com 
o TPI). Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados. Protocolo sobre o 
Estatuto dos Refugiados. Convenção contra a tortura e outros tratamentos 
ou penas cruéis, desumanos ou degradantes. Protocolo facultativo 
Danilo 
17 
Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial. 
Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação 
contra a Mulher (CEDAW). Protocolo Facultativo. Convenção sobre os 
direitos da Criança. Protocolos Opcionais. Convenção sobre os direitos da 
pessoa com deficiência. Protocolo Facultativo. 
Camila 
18 
Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os 
Trabalhadores Migrantes e dos membros de suas Famílias. Convenção 
Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o 
Desaparecimento Forçado. 
Gisela 
 
19 
Convenção Relativa à proteção do patrimônio mundial, cultural e natural – 
“Declaração de Estocolmo”. Convenção sobre a diversidade biológica 
(1992). 
Érica 
3 
 
20 
Carta Africana de Direitos Humanos e dos povos. Declaração das Nações 
Unidas sobre os direitos dos povos indígenas. 
Gabriel Kenji 
21 
Sistema Regional Interamericano de Proteção de Direitos Humanos. 
Organização dos Estados Americanos (OEA): declarações, tratados, 
resoluções, relatórios, informes, pareceres, jurisprudência (contenciosa e 
consultiva da Corte Interamericana de Direitos Humanos), normas de 
organização e funcionamento dos órgãos de supervisão, fiscalização e 
controle. 
Maria Camila 
22 
Comissão Interamericana de Direitos Humanos: relatórios de casos, 
medidas cautelares, relatórios anuais e relatoria para a liberdade de 
expressão. 
Bruno 
Zogaibe 
23 
Corte Interamericana de Direitos Humanos. Leonardo 
Lima 
24 
Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem. Convenção 
Americana de Direitos Humanos. Protocolo adicional à Convenção 
Americana sobre Direitos Humanos em matéria de direitos econômicos, 
sociais e culturais – “Protocolo de San Salvador”. 
Bruna 
25 
Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura. Protocolo à 
Convenção Americana sobre direitos humanos relativo à abolição da pena 
de morte. Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a 
violência contra mulher. Convenção Interamericana sobre o 
desaparecimento forçado de pessoas. Convenção Interamericana sobre a 
eliminação de todas as formas de discriminação contra pessoas 
portadoras de deficiência. 
Thomaz 
26 
Reflexos do Direito Internacional dos Direitos Humanos no direito 
brasileiro. Programa Nacional de Direitos Humanos I, II e III. Programa 
Estadual de Direitos Humanos do Estado de São Paulo. Comissão 
Nacional da Verdade: histórico, atribuições, legislação, audiências públicas 
e relatórios. 
Gabriela 
27 
Direitos Humanos em espécie e grupos vulneráveis. Direitos Humanos das 
minorias e de vítimas de injustiças históricas: Mulher, Negro, Criança e 
Adolescente, Idoso, Pessoa com Deficiência, Pessoas em situação de rua, 
Povos Indígenas, LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais 
Eduardo 
4 
 
e transgêneros), Quilombolas, Sem-teto, Sem-terra, Imigrantes e 
Refugiados. 
 
O que ficou de fora: 
i. Resolução de conflitos ante a colisão de direitos humanos (a ser visto 
em constitucional). 
ii. A vigência e eficácia das normas do direito internacional dos Direitos 
Humanos. As possibilidades de aposição de reservas e de oferecer 
denúncia relativas aos tratados internacionais de Direitos Humanos. A 
incorporação dos tratados internacionais de proteção de direitos 
humanos ao direito brasileiro. A posição hierárquica dos tratados 
internacionais de Direitos Humanos em face da Constituição da 
República do Brasil (estudado em constitucional). 
iii. Direitos Humanos e acesso à justiça: o dever dos Estados de promover 
o acesso à justiça, 100 Regras de Brasília e desenvolvimentos no 
âmbito da Organização dos Estados Americanos relacionados à 
Defensoria Pública. 
iv. Mecanismos de proteção aos direitos humanos na Constituição da 
República do Brasil. Federalização de crimes contra os Direitos 
Humanos. Remédios constitucionais. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
Sumário 
PONTO 1............................................................................................................ 6 
PONTO 2.......................................................................................................... 16 
PONTO 3.......................................................................................................... 21 
PONTO 4.......................................................................................................... 22 
PONTO 5.......................................................................................................... 25 
PONTO 6.......................................................................................................... 30 
PONTO 7..........................................................................................................37 
PONTO 8.......................................................................................................... 48 
PONTO 9.......................................................................................................... 56 
PONTO 10........................................................................................................ 65 
PONTO 11........................................................................................................ 75 
PONTO 12........................................................................................................ 83 
PONTO 13........................................................................................................ 92 
PONTO 14........................................................................................................ 99 
PONTO 15...................................................................................................... 109 
PONTO 16...................................................................................................... 121 
PONTO 17...................................................................................................... 128 
PONTO 18...................................................................................................... 136 
PONTO 19...................................................................................................... 140 
PONTO 20...................................................................................................... 150 
PONTO 21...................................................................................................... 154 
PONTO 22...................................................................................................... 161 
PONTO 23...................................................................................................... 167 
PONTO 24...................................................................................................... 175 
PONTO 25...................................................................................................... 184 
PONTO 26...................................................................................................... 190 
PONTO 27...................................................................................................... 203 
 
 
 
 
 
 
 
6 
 
PONTO 1 
Origem, sentido e evolução histórica dos Direitos Humanos. Estudo 
conjunto com: Os fundamentos filosóficos dos Direitos Humanos. Os 
direitos naturais do jusnaturalismo racional e do contratualismo moderno. 
Os direitos fundamentais do juspositivismo. 
 
1. O que se entende por fundamentação dos direitos humanos e qual é a 
importância desse estudo? 
Fundamentar os direitos humanos é buscar as razões que legitimam e 
motivam o reconhecimento dos direitos humanos, buscar essa genealogia, 
investigar o porquê dos direitos humanos. 
Através desse estudo temos maior possibilidade de garantir efetividade aos 
direitos humanos, de tirá-los do papel e fazer com que eles não sejam somente 
“direitos de cartas”. Para Caio Granduque, “a proteção dos direitos do homem 
depende dos fundamentos com que eles se justificam”. 
Assim, em que pese haver posição em sentido contrário, entendendo pela 
desnecessidade de buscar a fundamentação dos direitos humanos, Caio 
defende uma fundamentação existencialista e afirma que o baixo nível de tutela 
jurisdicional de direitos humanos está intimamente ligado à fundamentação 
tradicional e idealista desses direitos. 
 
2. Fale sobre a corrente negacionista a respeito da fundamentação dos 
direitos humanos. 
A corrente negacionista é defendida por Norberto Bobbio, o qual entende 
que a grande questão dos direitos humanos diz respeito à sua efetividade, e 
não à sua fundamentação. Para o autor não existe relação entre a proteção e a 
fundamentação dos direitos humanos. Nesse sentido, Bobbio afirma que “o 
problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o 
de justifica-los, mas o de protege-los. Trata-se de um problema não filosófico, 
mas político”. Dessa forma, a questão não é saber quais e quantos são esses 
direitos, qual é a sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou 
históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para 
garanti-los. 
Caio Granduque discorda desse entendimento e ressalta que a “resolução 
do urgentíssimo problema da proteção dos direitos humanos” não pode deixar 
de lado um regresso aos seus fundamentos. Isso porque a violação estrutural 
desses direitos passa pelos desdobramentos jurídicos que cada 
fundamentação enseja. Caio afirma, ainda, que a concepção que o jurista 
possui a respeito dos direitos humanos condiciona a sua prática, seja ela 
comprometida ou indiferente a esses direitos. Esse é também o pensamento do 
constitucionalista espanhol Antonio Enrique Pérez Luño. 
Nas palavras de Caio Granduque, “entende-se o certo exagero do notável 
pensador italiano, que, em razão do advento da Declaração Universal de 1948, 
deu por encerrada a discussão acerca dos fundamentos dos direitos humanos, 
talvez como estratégia para advertir sobre a necessidade de que os direitos 
humanos sejam ‘levados a sério’”. 
 
3. Fale sobre a fundamentação jusnaturalista dos direitos humanos. 
Como ensina André de Carvalho Ramos, o jusnaturalismo é uma corrente 
do pensamento jurídico que defende a existência de um conjunto de normas 
7 
 
vinculantes anterior e superior ao sistema de normas fixadas pelo Estado 
(direito posto). É a corrente mais antiga na história do pensamento, podendo 
ser identificada desde a Antiguidade, na peça de teatro “Antígona”, de 
Sófocles. Nessa peça a personagem principal, recusando-se a obedecer as 
ordens do rei em relação ao direito de enterrar os mortos, afirma que as leis 
dos homens não podem sobrepor-se às leis eternas dos deuses. 
Para a doutrina jusnaturalista, é direito o que é natural, isto é, a juridicidade 
é um dado eterno, imutável e universal, que provém e deve ser descoberto da 
“natureza”. Sendo assim, a depender da concepção que se tenha da 
“natureza”, teremos significados diversos a respeito do direito natural. 
 
4. Discorra sobre o jusnaturalismo cosmológico da Antiguidade. 
No jusnaturalismo cosmológico a natureza era vista como o cosmos, a 
physis, e dela decorreriam determinadas regras. Tais regras seriam eficazes 
em todos os lugares e válidas por todo o tempo, constituindo-se no direito 
natural. Símbolo dessa corrente é a postura de Antígona na tragédia grega de 
Sófocles, a qual desobedece o direito positivo com base nas leis não escritas e 
intangíveis dos deuses, que não são leis de hoje ou de ontem, são de sempre. 
Como destaca Caio Granduque, essa concepção jusnaturalista também 
pode ser vislumbrada no direito romano. Nesse sentido é a assertiva de Cícero, 
para o qual a lei natural não pode ser contestada, derrogada em parte ou 
anulada, devendo ser cumprida tanto pelo povo como pelo Senado. Não se 
trata de uma lei em Roma e outra em Atenas, uma lei antes e outra depois. Ao 
contrário, é uma lei sempiterna e imutável, entre todos os povos e em todos os 
tempos. 
 
5. Discorra sobre o jusnaturalismo teológico da Idade Média. 
O jusnaturalismo teológico é incentivado pela visão religiosa de São Tomás 
de Aquino, o qual entendia que a “lex humana” deve obedecer a “lex naturalis”, 
fruto da razão divina mas perceptível aos homens. O direito natural, portanto, 
seria o que está contido no Antigo e no Novo Testamento, e o cristianismo 
seria a comprovação da supremacia do direito natural sobre o direito positivo. 
Sendo assim, a natureza na Idade Média era considerada o produto da 
inteligência e da potência criadora de Deus. O jusnaturalismo assume, 
portanto, uma perspectiva teológica e o direito natural passa a ser visto como a 
lei inscrita por Deus no coração dos homens, ou a lei revelada pelos textos 
sagrados, os quais transmitem a palavra divina, ou, ainda, a lei comunicadapor 
Deus aos homens através da razão. 
 
6. Fale sobre o jusnaturalismo racional moderno. 
No jusracionalismo a natureza é percebida como a ordem racional do 
universo. Dessa forma, o direito natural é visto como o conjunto de leis sobre a 
conduta ou natureza humana, que podem ser captadas, apreendidas ou 
descobertas pela razão humana. 
Nesse sentido, Hugo Grócio, considerado o pai do direito natural e do 
direito internacional moderno, defendia no século XVI a existência de um 
conjunto de normas ideais, fruto da razão humana. Assim, afirmava que para 
captar racionalmente o direito não deveríamos recorrer à autoridade das 
Sagradas Escrituras ou aos antigos pensadores, mas sim observar a natureza 
8 
 
humana. Para Grócio, o direito dos legisladores humanos só seria válido se 
compatível com os mandamentos daquela lei imutável e eterna. 
Cabe destacar que Hugo Grócio contribuiu para o nascimento dos direitos 
humanos no século XVIII ao tratar do método dedutivo como o que permite à 
reta razão alcançar as regras invariáveis da natureza humana. Essa é a ideia 
que está na raiz das modernas Declarações de Direitos Humanos. Declara-se 
não aquilo que é oculto e imperceptível, mas sim o que é de fácil acesso à 
razão humana. 
As premissas de Grócio foram desenvolvidas pelo jurista alemão Samuel 
Pufendorf, que concebia o direito natural como um rígido e estruturado sistema 
racional. Seu maior legado foi a edificação de um sistema de direito natural 
deduzido de um único princípio imanente à natureza, a saber, o de 
“conservação do indivíduo”, do qual decorre a ideia de que os homens são 
naturalmente livres e iguais. Pufendorf destaca o que ele chama de “dignidade 
da natureza humana”, avançando no estabelecimento de condições para a 
insurgência dos direitos humanos. 
Em suma, através do método dedutivo-racional, esses pensadores 
libertaram o direito natural do conteúdo teológico que prevaleceu na doutrina 
jusnaturalista da Idade Média. Como explica Caio Granduque, o direito natural 
passou a ser considerado um conjunto de normas e princípios eternos, 
universais e imutáveis descobertos racionalmente da natureza do homem, o 
que foi fundamental para o posterior nascimento dos direitos humanos. Nas 
palavras de Caio, “a ideia de que o homem possui direitos inatos, decorrentes 
da sua própria natureza humana, pressupostos e antecedentes a qualquer 
organização política, foi elaborada pelo jusnaturalismo moderno. Foi o 
jusnaturalismo antropológico, portanto, quem deu à luz os direitos humanos, 
travestidos de direitos naturais”. 
 
7. Comente algumas características presentes em todas essas doutrinas 
do direito natural. 
Segundo Caio Granduque, podemos citar as seguintes características 
comuns a todas essas doutrinas: 
(i) admissão do direito natural como direito; 
(ii) afirmação do direito natural como superior ao direito positivo; 
(iii) concepção do direito natural como ordem objetiva, superior, dada, 
pronta e acabada; e 
(iv) identificação do direito natural com normas de condutas universais, 
eternas e imutáveis. 
Ademais, todas as vertentes do jusnaturalismo assumem a tríade 
“verdadeiro, justo, obrigatório”, isto é, a partir do verdadeiro (ser) se chega ao 
obrigatório (dever ser) por meio de um critério de justiça natural. 
Caio afirma, ainda, que o jusnaturalismo procura compreender o direito 
pela explicitação dos seus fundamentos ontológicos, seja por meio da ontologia 
metafísica dos gregos, seja com base na ontologia teológico-metafísica 
medieval, seja através da ontologia convertida em antropologia (investigação 
acerca da “natureza do homem”) no pensamento moderno e iluminista. 
No mesmo sentido, André de Carvalho Ramos esclarece que o traço 
marcante da corrente jusnaturalista de direitos humanos é seu cunho 
metafísico, tendo em vista que se funda na existência de um direito 
preexistente ao direito produzido pelo homem, seja oriundo de Deus (escola de 
9 
 
direito natural de razão divina), seja oriundo da natureza inerente do ser 
humano (escola de direito natural moderno). 
 
8. Discorra sobre o jusnaturalismo contratualista. 
Como ensina André de Carvalho Ramos, os iluministas, em especial Locke 
e Rousseau, fundaram a corrente do jusnaturalismo contratualista, a qual 
aprofunda o racionalismo e o individualismo. A razão é vista como a fonte de 
direitos inerentes ao ser humano e é defendida a prevalência dos direitos do 
indivíduo em face do Estado. Essa supremacia dos direitos humanos teria 
como base um contrato social firmado por todos na comunidade humana, que 
limita o arbítrio do Estado e impõe a proteção desses direitos. 
Os teóricos do contratualismo buscavam teorizar a limitação do poder 
político, tendo em vista que seu exercício era o grande responsável pela 
violação da dignidade e dos direitos das pessoas da época. Para tanto, 
recepcionaram a doutrina moderna do direito natural, instituída por Hugo 
Grócio (que inaugurou o processo de laicização do jusnaturalismo) e 
desenvolvida, entre outros, por Pufendorf. Os pensadores contratualistas 
perceberam a força dos direitos naturais diante do desafio de superar a ordem 
estamental em vigor e, assim, conferiram a esses direitos um espaço de 
destaque em suas doutrinas. 
Locke e Rousseau partem da dicotomia estado de natureza/estado civil, 
pois sabem que a única hipótese racional que poderia inverter a concepção 
secular de que o poder político procede de cima para baixo seria a de um 
estado de natureza no qual os indivíduos possuíssem direitos naturais. 
Thomas Hobbes construiu seu contratualismo em sentido oposto, 
buscando legitimar o poder soberano das monarquias absolutas. Assim, 
descreve o estado de natureza como aquele em que há a guerra de todos 
contra todos, onde o homem é o lobo do próprio homem. Dessa forma, os 
direitos naturais (exceto o direito natural à vida) deveriam ser contratualmente 
transferidos a um Estado artificialmente criado, o Leviatã, único capaz de 
assegurar a paz e a segurança. Por defender a transferência dos direitos 
naturais dos indivíduos ao Leviatã, Hobbes não contribuiu para o surgimento 
dos direitos humanos no século XVIII. Segundo Bobbio, Hobbes adota a teoria 
do direito natural para reforçar o poder, e não para limitá-lo, usa meios 
jusnaturalistas para alcançar objetivos positivistas. 
Locke, por outro lado, utiliza sua teoria a serviço da limitação do poder 
político, condicionando-o ao respeito das leis naturais. O estado de natureza 
para Locke é uma mistura de bem (representado pelos direitos naturais, como 
liberdade e igualdade) e mal (traduzido na falta de um juiz imparcial que 
canalizasse o exercício pacífico desses direitos). Assim, a função do estado 
civil, contratualmente constituído pelos indivíduos, seria a de conservar o bem 
e eliminar o mal. O Estado, portanto, surge com poderes limitados, 
configurando-se o modelo de Estado Liberal. Vale destacar que caberia ao 
Estado garantir o direito de propriedade, visto por Locke como um direito 
sagrado, natural e inviolável, como consta do artigo 17 da Declaração dos 
Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. 
Rousseau entendia o estado de natureza como um estado de plena 
liberdade e igualdade natural entre os homens. No estado de natureza temos o 
homem bom, em pleno gozo de sua liberdade, até que o advento da sociedade 
provoque sua corrupção. Com o objetivo de superar essa questão, Rousseau 
10 
 
propõe a celebração de um contrato social a ser estabelecido conforme os 
ditames da razão, restabelecendo-se as leis naturais por meio das leis civis. 
Aqui reside sua contribuição para a afirmação dos direitos humanos: sua 
filosofia política busca encontrar uma forma de associação política que proteja 
e potencialize os direitos naturais do homem. 
Diante do exposto, percebe-se que o jusnaturalismo moderno dos 
pensadores contratualistas lançou mão da lei (entendida como produto da 
vontade geral) para a tutela dos direitos naturais. O direito se converteu em 
legalidadee a lei que passou a dar validade aos direitos. Assim, o 
contratualismo moderno, que partiu das ideias jusnaturalistas para legitimar a 
inversão da titularidade do poder político, chega ao legalismo, com base no 
qual posteriormente se afirmaria o positivismo jurídico. 
 
9. Há menção ao direito natural na jurisprudência do Supremo Tribunal 
Federal? 
Sim. O direito natural já foi utilizado como fundamentação em diversos 
casos do STF, merecendo destaque os seguintes: 
(1) ADI 595/ES, Relator Ministro Celso de Mello, 2002 – nesse julgado o 
Ministro Celso de Mello reconheceu a existência de um bloco de 
constitucionalidade material, que seria o conjunto de normas de status 
constitucional composto pelas normas expressas da Constituição e normas 
implícitas e valores do direito natural; 
(2) Decisão monocrática da Presidência, SS 2061 AgR/DF, Relator Ministro 
Marco Aurélio, 2001 – foi reconhecido o caráter de direito natural do direito de 
greve (inerente a toda prestação de trabalho, público ou privado). Com base 
nisso, STF decidiu que não cabe o não pagamento dos salários e que eventual 
compensação pela ausência do trabalho deve ser feita somente após 
encerrada a greve; 
(3) RCH 84.851/BA, Relator Ministro Marco Aurélio, 2005 e RHC 
73.491/PR, Relator Ministro Marco Aurélio, 1996 – mesmo não estando 
positivado na Constituição ou nos tratados de direitos humanos, o direito à fuga 
foi reconhecido como direito natural. Nas palavras do Ministro Marco Aurélio no 
julgamento do RHC 73.491, “a fuga não pode ser considerada como fator 
negativo, tendo em vista consubstanciar direito natural”; 
(4) HC 83.943, Relator Ministro Marco Aurélio, 2004 – o direito do preso de 
permanecer calado foi transformado pela jurisprudência do STF, com base no 
direito natural, em um direito de não se autoincriminar e não colaborar com as 
investigações criminais; 
(5) HC 80.616, Relator Ministro Marco Aurélio, 2004 – também com base 
no direito natural o STF ampliou o conceito de autodefesa, impedindo que o 
acusado fosse prejudicado por não admitir a culpa ou por mentir (atribuindo a 
autoria a terceiro). 
 
10. Fale sobre a fundamentação juspositivista dos direitos humanos 
Com a consolidação do Estado constitucional, os direitos humanos tidos 
como naturais foram inseridos no corpo da Constituição e das leis, passando a 
ser considerados direitos positivados. 
A Escola positivista traduziu a ideia de um ordenamento jurídico produzido 
pelo homem de forma coerente e hierarquizada, que teria em seu topo a 
Constituição (pressuposto de validade de todas as demais normas). Os direitos 
11 
 
humanos foram inseridos na Constituição, obtendo, com isso, um estatuto 
normativo superior. Com o tempo, muitos autores passaram a reservar o termo 
“direitos humanos” para o plano internacional e a utilizar o termo “direitos 
fundamentais” para se referir aos direitos essenciais positivados no plano 
interno e, especialmente, na Constituição. 
Os positivistas também buscam as razões que legitimam os direitos 
humanos e entendem que essas razões estão na lei, na validade formal da 
norma. Assim, os direitos humanos justificam-se graças à sua validade formal e 
sua previsão no ordenamento posto. Dessa forma, a ideia de “direitos 
inerentes” da corrente jusnaturalista é substituída pela ideia dos “direitos 
reconhecidos e positivados pelo Estado”. 
Como explica Caio Granduque, se o jusnaturalismo é dualista na medida 
em que admite a convivência do direito natural com o direito positivo 
(defendendo a superioridade daquele), o positivismo jurídico é monista, tendo 
em vista que admite apenas o direito positivo. 
Vale ressaltar que os direitos do homem que nasceram como direitos 
naturais e, portanto, imutáveis, eternos, universais, titularizado pelo homem em 
geral, passaram, no século XIX, a ser entendidos como direitos fundamentais, 
isto é, direitos positivos particulares, cuja titularidade restringia-se aos cidadãos 
do respectivo Estado. Buscando combater o idealismo abstrato ou metafísico 
do jusnaturalismo racional, o positivismo jurídico não reconhece direitos para 
além do direito posto. Sendo assim, o direito passa a ser identificado com a lei, 
convertendo-se na legalidade. 
Em suma, pela concepção legada pelo positivismo jurídico, os direitos 
humanos nada mais são do que direitos fundamentais, cuja existência e 
validade dependem da lei, na forma da doutrina do século XIX, e, após um 
processo de adaptação teórica, encontram-se subordinadas à Constituição no 
século XX. 
 
11. Que frustração o positivismo pode causar no jurista? 
Segundo Caio Granduque, o positivismo pode causar uma dupla frustração 
no jurista, a saber: 
(i) frustração científica: nem todos os casos que precisam ser resolvidos 
estão previstos no sistema jurídico, tendo em vista a historicidade imanente à 
realidade humana, condenada à liberdade; 
(ii) frustração existencial: se o jurista não passa de um operador ou 
aplicador do direito, ou seja, se ele tem uma existência inautêntica, ele pode 
ser trocado a qualquer momento por uma máquina, a qual, com maior 
eficiência, pode deduzir do sistema a norma aplicável ao caso. 
 
12. Fale sobre a fundamentação moral ou pós-positivista dos direitos 
humanos 
A fundamentação dos direitos humanos como direitos morais vai buscar 
conciliar os direitos humanos entendidos como exigências éticas (seriam 
supralegais) e aqueles direitos humanos entendidos como direitos positivados. 
Por demandar o direito escrito, essa linha também pode ser entendida 
como positivista, tendo em vista que se resume, em alguma medida, à função 
de interpretação da norma. 
 
13. Discorra sobre a fundamentação existencialista dos direitos humanos 
12 
 
Ao trabalhar com a construção existencial dos direitos humanos, Caio 
Granduque parte da lógica de que estamos questionando a efetividade dos 
direitos humanos o tempo todo. Segundo Caio, a proteção dos direitos do 
homem depende diretamente dos fundamentos pelos quais esses mesmos 
direitos se justificam. Dessa forma, se não buscarmos a justificação não 
conseguiremos compreender e manejar os instrumentos de proteção desses 
direitos. 
O problema da não realização dos direitos humanos é um problema 
econômico, político, social e cultural, mas é também um problema jurídico. 
Consequentemente, será um problema jusfilosófico, na medida em que exige a 
busca dos fundamentos que os legitimam. 
Como ensina Caio Granduque, o baixo nível da proteção jurisdicional dos 
direitos humanos está intimamente relacionado com a fundamentação 
tradicional e idealista, seja jusnaturalista ou juspositivista, tendo em vista que 
se prestam a artifícios ideológicos funcionais para a indiferença dos juristas 
frente a esses direitos. 
Enquanto não buscamos a fundamentação (corrente negacionista), 
permitimos uma fundamentação tradicional, que coloca esses direitos apenas 
como direitos abstratos, direitos de cartas. As fundamentações jusnaturalista e 
juspositivista acabam sendo manejadas para funcionalizar uma posição do 
jurista que fecha os olhos, uma posição de indiferença, um suicídio intelectual, 
e por isso não podemos aceitá-las. 
Os direitos humanos têm uma relação direta com as revoltas, com as lutas 
de classe. O próprio nascimento dos direitos humanos no século XVIII como 
direitos naturais nas declarações de direitos se refere a uma luta da classe 
burguesa contra os privilégios da nobreza. No século XIX, esses direitos vão se 
transmudar das declarações para as Constituições, ou seja, vão deixar de ser 
direitos naturais e vão se tornar direitos fundamentais, porque positivados nas 
Constituições. Na fase de internacionalização dos direitos humanos (século 
XX), vão se positivar em um plano supranacional, nos tratados e convenções. 
Questão que se coloca, portanto, é: de que modo vamos buscar um 
fundamento para esses direitos humanos que os retirem do papel? 
Como afirma Caio Granduque, a gênese dos direitos humanos é (e está 
sendo!) um produtode revoltas de homens que, lançados nas mais diversas e 
absurdas situações históricas, não voltaram aos grilhões, e com coragem e 
lucidez souberam o que fazer com sua liberdade. Os direitos nasceram do agir 
e do fazer de homens que, alimentados pela solidariedade e tendo em mente a 
máxima fundamental “eu me revolto, logo existimos”, ousaram reinvidicar o fim 
do escândalo e da injustiça vivenciados. 
O existencialismo pode ser entendido, portanto, como o conjunto de 
filosofias que se valem da análise da existência, ou seja, que analisam a 
existência do homem, a vida. Para Caio Granduque o existencialismo se opõe 
a toda forma de explicação sistemática, universal, lógica e abstrata da 
realidade, preocupando-se com o existente homem concreto. 
Diferentemente do jusnaturalismo, para quem os direitos humanos são 
descobertos, e do positivismo, para quem os direitos são aplicados, a 
fundamentação existencialista defende que os direitos humanos são 
construídos, isto é, são aquilo que nós fizermos com que eles sejam. 
 
13 
 
14. Qual é a relação da evolução dos direitos humanos com o 
desenvolvimento do conceito de pessoa? 
Fábio Konder Comparato analisa o homem no mundo e as etapas de 
elaboração do conceito de pessoa. Os direitos humanos são a proteção da 
pessoa humana e essa proteção vai mudando ao longo da história, vai 
buscando uma afirmação histórica. Para fazer essa análise, Comparato 
seleciona diversos documentos e períodos importantes, a começar pelo 
período axial (século VIII a II a. C.). Essa é a primeira vez em que o ser 
humano é considerado em sua igualdade essencial e dotado de liberdade e 
razão. Cabe lembrar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que 
consubstancia essa noção, vai aparecer apenas 25 séculos depois, mas já é 
nesse momento que começa a surgir essa ideia. 
Na segunda fase da construção do conceito de pessoa identificada por 
Comparato (século VI, Boécio), percebemos que a igualdade de essência da 
pessoa forma o núcleo do conceito universal de direitos humanos, ou seja, os 
direitos humanos nascem a partir dessa noção de igualdade de essência. 
Na terceira fase temos como grande marco teórico Kant (século XVIII), 
para quem a pessoa deve ser compreendida como sujeito de direitos 
universais, anteriores e superiores a toda ordenação estatal. Para Kant todo 
homem tem dignidade, jamais preço, pois ele não pode ser confundido com as 
coisas. O homem é sujeito de sua própria história e titular de direitos universais 
anteriores e superiores à ordenação estatal. 
No século XIX, Karl Marx critica a noção de direitos humanos de forma 
abstrata e o capitalismo enquanto sistema de coisificação da pessoa humana, 
uma vez que dentro do sistema capitalista o homem é explorado e dominado 
pelo próprio homem que detém os meios de produção. 
No século XIX temos a quarta fase da construção do conceito de pessoa 
com a (re)descoberta do mundo dos valores, da ética. Comparato diz que o 
homem é o único ser vivo que dirige sua vida em função de preferências 
valorativas. A compreensão da realidade axiológica transforma no sec. XIX 
toda a teoria jurídica, porque os direitos humanos passam a ser identificados 
como os valores mais importantes da convivência humana. 
No século XX chegamos à quinta fase de construção do conceito de 
pessoa. Após os horrores das Grandes Guerras, temos a elaboração do 
conceito de pessoa dialogando com a construção concreta, existencial dos 
direitos humanos. Nesse sentido, o ser humano é um vir-a-ser, um contínuo 
devir, ele é sendo. Trabalhamos, portanto, com a filosofia da vida e com o 
pensamento existencialista e o homem passa a ser visto como o protagonista 
do seu próprio destino. 
Em suma, a partir da noção do que é pessoa se constrói a noção de direito 
dessa pessoa. E com a evolução a pessoa deixa de ser vista como o cidadão 
de um Estado, passa a ser vista como um indivíduo, um ser dotado de 
humanidade e chega, enfim, à noção de pessoa como um “vir-a-ser”. 
 
15. Comente sobre a noção de “fluxos e refluxos” no processo de 
evolução e afirmação histórica dos direitos humanos. 
Segundo Fabio Konder Comparato, a primeira chave para entendermos as 
grandes etapas históricas de afirmação dos direitos humanos é a ideia de 
fluxos e refluxos, tendo em vista que a história se escreve em avanços e 
14 
 
recuos. Nas palavras do autor, “a cada grande surto de violência, os homens 
recuam, horrorizados”. 
Comparato trabalha com a ideia de que todas as vezes na história do 
mundo em que homem se depara com a barbárie, ele busca como reação uma 
atitude mais preservacionista. 
Percebemos, portanto, dentro dessa ideia de avanços e retrocessos, que 
os direitos humanos nunca são “entregues de graça”, eles nascem das revoltas 
e lutas sociais. 
 
16. Fale sobre a noção de sincronismo entre as grandes declarações e as 
grandes descobertas científicas no processo de afirmação histórica dos 
direitos humanos. 
Fabio Konder Comparato afirma que há um sincronismo entre as grandes 
evoluções da técnica e as grandes regras que protegem direitos, considerando 
essa a segunda chave para a compreensão das grandes etapas históricas de 
evolução dos direitos humanos. Segundo Comparato, são dois grandes fatores 
de solidariedade humana, um de ordem técnica, que transforma os meios e 
instrumentos de convivência, mas é indiferente aos fins; e outro de ordem ética, 
que procura submeter a vida social ao valor supremo da justiça. 
 
17. Como podem ser definidos os direitos humanos? 
Segundo André de Carvalho Ramos, os direitos humanos são um conjunto 
de direitos considerado indispensável para uma vida pautada na liberdade, 
igualdade e dignidade. São, portanto, os direitos essenciais e indispensáveis à 
vida digna. Para o autor não há um rol predeterminado desse conjunto mínimo 
de direitos, tendo em vista que as necessidades humanas variam e, de acordo 
com o contexto histórico de uma época, novas demandas sociais são 
traduzidas juridicamente e incluídas na lista de direitos humanos. 
André de Carvalho Ramos explica que os direitos humanos podem ser 
divididos em quatro espécies, quais sejam, (i) direito-pretensão; (ii) direito-
liberdade; (iii) direito-poder; e (iv) direito-imunidade. 
(i) direito-pretensão: consiste na busca de algo e, consequentemente, no 
dever gerado a outrem de prestar. Como exemplo, temos o direito à educação 
fundamental, que gera para o Estado o dever de prestá-la gratuitamente; 
(ii) direito-liberdade: trata-se da faculdade de agir que gera a ausência de 
direito de qualquer outro ente ou pessoa. Cite-se, a título de exemplo, a 
liberdade de credo (o Estado não possui direito de exigir que a pessoa tenha 
determinada religião); 
(iii) direito-poder: implica uma relação de poder de uma pessoa de exigir 
uma sujeição do Estado ou de outra pessoa. Exemplo: uma pessoa ao ser 
presa tem o poder de requerer a assistência da família e do advogado, o que 
sujeita a autoridade pública a providenciar esse contato; 
(iv) direito-imunidade: consiste na autorização dada por uma norma a uma 
determinada pessoa que impede que outra interfira de qualquer modo. 
Exemplo: uma pessoa é imune à prisão, salvo nas hipóteses previstas em lei. 
Por fim, é importante lembrar que, como ensina Hannah Arendt, os direitos 
humanos não são um dado, mas um construído, uma invenção humana em 
constante construção e reconstrução. 
 
18. Fale sobre a internacionalização dos direitos humanos. 
15 
 
No século XIX temos a primeira fase de internacionalização dos direitos 
humanos, em que tais direitos começam a ser uma preocupação do direito 
internacional, e não mais do Estado. Surge uma preocupação com o homem no 
momento da guerra e nasce, com isso, o Direito Internacional Humanitário, 
considerado o primeiro antecedente histórico importante para o nascimento do 
Direito Internacional dos Direitos Humanos. Também podemos citar como 
antecedentes históricos a Liga das Nações, que nasce no pós 1ª Guerra 
Mundial, e a OIT.Na segunda metade do século XX, pós 2ª Guerra Mundial, temos a 
segunda fase de internacionalização dos direitos humanos. Nesse momento 
temos o surgimento das Declarações de Direitos (Declaração Universal de 
Direitos Humanos e Declaração Americana de Direitos Humanos), a extinção 
da Liga das Nações e o nascimento da ONU e da OEA. 
Nessa segunda fase temos também o surgimento do Direito Internacional 
dos Direitos Humanos como uma disciplina autônoma, trazendo uma 
preocupação com a pessoa humana enquanto sujeito de direito internacional. 
Cabe lembrar que o surgimento da pessoa como sujeito de direito internacional 
está vinculado ao direito a ter direitos e à releitura da noção clássica de 
soberania. 
 
19. Fale sobre as dimensões / gerações dos direitos humanos. 
Podemos identificar 3 dimensões relacionadas com o lema da Revolução 
Francesa, de acordo com a teoria das gerações de Karel Vasak: 
1ª geração/dimensão: direitos informados pelo valor da liberdade -> direitos 
individuais, civis e políticos. Trata-se de um direito vocacionado às prestações 
negativas, que exigem do Estado um “não fazer” (dever de proteger a 
autonomia do indivíduo). Como lembra André de Carvalho Ramos, é possível, 
no entanto, se exigir ações do Estado como, por exemplo, para a garantia da 
segurança pública e administração da justiça. 
2ª geração/dimensão: direitos informados pelo valor da igualdade -> 
direitos sociais, econômicos e culturais. Cabe lembrar que a Revolução 
Industrial e as Guerras Mundiais acabam acentuando a pobreza e a exclusão 
social, o que leva à necessidade de uma nova conformação do Estado: Estado 
Liberal -> Estado Social. Estado deve adotar prestações positivas com o intuito 
de alcançar uma igualdade. 
Segundo André de Carvalho Ramos, podemos identificar duas espécies de 
direitos aqui: (i) direitos sociais essencialmente prestacionais (exemplo: pedido 
de medicamento); e (ii) direitos sociais de abstenção ou de defesa (Estado 
deve se abster de interferir de modo indevido – exemplo: liberdade de 
associação sindical, direito de greve). 
3ª geração/dimensão: direitos informados pelo valor da fraternidade -> 
direitos difusos. Estados percebem que há necessidade de flexibilização do 
conceito de soberania e de uma concepção de cidadão que extrapola a égide 
cosmopolita, ou seja, que extrapola os limites territoriais. Temos o surgimento 
dos direitos metaindividuais. O vetor da solidariedade se espraia e faz com que 
os Estados entendam que há necessidade de proteção do indivíduo, ainda que 
não resida no seu território. 
Há posição na doutrina defendendo a existência de outras gerações de 
direitos humanos. José Alcebíades Oliveira Júnior, por exemplo, entende que 
teríamos uma 4ª geração incluindo o biodireito e, ainda, uma 5ª dimensão, 
16 
 
dizendo respeito à cibernética. Ricardo Lorenzetti, por sua vez, defende que a 
4ª dimensão dos direitos humanos envolveria o direito à diversidade. Bobbio 
afirma que a 4ª dimensão surge com a finalidade de proteção do patrimônio 
genético. Outra parte da doutrina, contudo, cita apenas as 3 dimensões. 
 
20. Por que alguns autores preferem falar em dimensões de direitos 
humanos, e não em gerações? 
Parte da doutrina critica o termo “dimensões” por entender que ele poderia 
levar a uma falsa impressão de encerramento de uma fase e surgimento de 
outra de maneira totalmente independente. Dessa forma, poderíamos ter uma 
ideia equivocada e que violaria a característica de indivisibilidade dos direitos 
humanos. 
 
21. Como nascem os direitos humanos no plano internacional? 
Segundo André de Carvalho Ramos, os direitos humanos nascem, 
inicialmente, de “parto natural” e depois de uma gestação de anos (que inclui 
exaustivas conferências internacionais e inúmeras modificações de textos e 
projetos de tratados internacionais, até que finalmente é alcançado o consenso 
e surge um novo tratado internacional de direitos humanos). 
Mas nascem também de “cesariana”, através de construções 
jurisprudenciais dos tribunais internacionais de direitos humanos. Por meio de 
uma interpretação evolutiva dos tratados, os tribunais ampliam o alcance de 
velhos direitos e criam novas esferas sociais protegidas. 
Dessa forma, os direitos humanos são uma parte do ordenamento que 
possui duas foram de elaboração jurídica: legislativa e jurisprudencial. As 
normas previstas em lei internas, Constituição e tratados são sempre um ponto 
de partida para o intérprete, nunca de chegada. Devemos sempre verificar a 
real interpretação e configuração normativa dada pelos Tribunais, sendo certo 
que o impacto da concretização jurisprudencial dos direitos humanos é imenso 
na esfera internacional. 
 
PONTO 2 
A sacralidade da pessoa e a dignidade humana. 
 
Obs.: As respostas foram elaboradas com base nos seguintes materiais: (i) “A 
sacralidade da pessoa: nova genealogia de direitos humanos” – Hans Joas, 
2012, Editora UNESP; (ii) “Sobre direitos humanos na era da bio-política” – 
Oswaldo Giacoia Junior; (iii) caderno FMB – 1ª fase. 
 
1. Qual a tese de Hans Joas sobre a fundamentação dos direitos 
humanos? 
O tema está no entrecruzamento da história dos DH e a questão de sua 
fundamentação. 
Hans Joas propõe uma tese inovadora nos estudos sobre fundamentação 
dos direitos humanos, tendo como cerne os conceitos de ‘sacralidade’ e 
‘santidade’. O autor sustenta que a crença nos direitos humanos e na 
dignidade humana universal seriam resultado de um processo específico de 
sacralização. 
O núcleo argumentativo de Joas tem como pressuposto um processo a 
partir do qual, gradativamente, com motivação e sensibilização cada vez mais 
17 
 
intensas, o ser humano individual passou a ser entendido como sagrado e essa 
compreensão foi institucionalizada no direito. Destaca-se, porém, que o termo 
sacralização não deve ser concebido como se tivesse um significado 
exclusivamente religioso. Os conteúdos seculares também podem assumir as 
qualidades características da sacralidade, ou seja, ‘evidência subjetiva’ e 
‘intensidade afetiva’. 
O pensamento central da obra passa pelo desafio de sustentar que a 
sacralização e a genealogia afirmativa ocorreram por meio de processos nos 
quais muitas vezes a adesão aos direitos humanos não surgiu de ponderações 
racionais. 
Joas se vale de sua definição da modernidade como uma “sacralização do 
indivíduo”. Porém, o binômio sagrado/profano não tem correspondência direta 
com a dualidade de religioso/secular. Sagrado, etimologicamente, quer 
dizer: separado. Algo da ordem secular, ou seja, fora da esfera religiosa, pode 
ser investido de um valor sagrado, à medida que for preservado pela 
comunidade. Em uma palavra: consagrado. Sagrado é tudo aquilo que, 
entendido como dom inalienável, consegue resistir à lógica instrumental das 
relações de troca. Não por acaso, Kant havia definido dignidade como um valor 
que não pode ser trocado. Portanto, não pode ser alienado. Esse bem humano 
salvaguardado dos demais bens cambiáveis constitui a pessoa. 
Assim, ao se tornarem sistemas complexos, as sociedades precisam criar 
valores cada vez mais abstratos que consigam mitigar os conflitos locais que 
surjam no seio de seus grupos. Para Joas, a categoria pessoa, sacralizada, ou 
seja, separada do âmbito geral das relações de troca, pode assumir o estatuto 
dessa universalidade genérica e, ao mesmo tempo, preservar as dinâmicas 
vitais particulares. 
A ideia-chave é, portanto, que a história dos DH constitui uma história da 
sacralização da pessoa - genealogia afirmativa de direitos - próxima da 
construção existencial de DH do Caio. 
Hans Joas discorda de Nietsche no que tange à tese de que a descoberta 
da gênese dos valores enfraqueceria a relação do homem com os valores (pois 
se descortinaria a crença em meros ídolos). Para Hans Joas, a história não 
enfraquece a ligação com a gênese/origem dos DH, ao contrário: “voltemos 
nosso olhar da genealogia afirmativa para o aspecto programático, do passado 
para o futuro. (...) No longoprazo, os DH, a sacralização da pessoa, só terão 
alguma chance se todos os três atuarem em conjunto: se os DH tiverem o 
suporte das instituições e da sociedade civil, forem defendidos 
argumentativamente e se encarnarem nas práticas da vida cotidiana”. 
Aproximando o processo de sacralização da visão existencial de Caio 
Granduque: A pessoa não é sagrada em um aspecto religioso, ela é sagrada 
porque, no curso da História, a dignidade humana, como um valor universal, se 
torna o epicentro ideológico dos ordenamentos jurídicos. A pessoa, assim, não 
pode ser profanada por leis ou atos. 
É aí que essa noção de sacralidade se aproxima da visão existencial dos 
direitos humanos. Os direitos são sendo, não são um todo acabado e dado, 
são construídos diariamente, com bases fincadas nessa ideia de que a pessoa 
é sagrada. 
 
2. Historicamente, aponte alguns passos para esta dita sacralização. 
18 
 
A primeira declaração de direitos humanos, no final do século XVIII 
(Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão), teria como base a tese de 
Weber de que os direitos humanos constituem uma carismatização da razão, 
colocando à prova a visão convencional das origens da declaração com 
resultado exclusivo das ideias iluministas. 
Também o processo de eliminação e marginalização da tortura na Europa 
do século XVIII desponta como fator de influência na sacralização da ideia de 
indivíduo humano. 
O autor estabelece uma relação entre a importância das experiências de 
violência para a difusão dos direitos humanos. O entusiasmo e a adesão das 
pessoas em relação a valores se dão por uma característica de ‘sensibilização 
afetiva’. O objeto de análise aqui é o movimento antiescravista como modelo de 
mobilização moral. Não há como não perceber o caráter religioso do 
movimento. Os movimentos abolicionistas da Grã-Bretanha e dos EUA foram 
carregados principalmente por atores que finalmente queriam levar a sério 
exigências morais que já estavam embutidas no cristianismo. 
 
3. O que seria a genealogia afirmativa? 
Parte-se da noção de elementos básicos da tradição cristã que estariam 
diretamente relacionados com a sustentação dos direitos humanos. O primeiro 
destes elementos seria a concepção de alma imortal de cada ser humano 
como núcleo sagrado desta pessoa. O segundo elemento seria a concepção de 
vida do indivíduo como dom, do qual resultam deveres que limitam o direito 
de autodeterminação de nossa vida. 
Assim como a história e afirmação dos valores cristãos está diretamente 
relacionada como a formação dos direitos humanos no ocidente e que 
representaram novas articulações e adaptações de fundamentos da teologia 
cristã – outras tradições religiosas que possuem elementos de sacralização do 
ser humano como base de suas crenças encontrariam, sob novas condições, 
um elo entre a afirmação dos direitos humanos e a visão religiosa com relação 
ao indivíduo. 
 
4. Relacione sacralidade e dignidade humana em uma perspectiva 
existencialista. 
A sacralidade da pessoa expressa a sua separação das relações de 
troca, separação que é garantida pelo Estado; sagrado = separado; a 
definição de Kant de dignidade a contrapõe justamente àquilo que pode 
ser trocado (o que tem valor, preço); a sacralidade da pessoa implica em sua 
dignidade e em sua universalidade. 
Mas, numa perspectiva existencialista, a dignidade humana decorre da 
própria condição humana, a qual não é fixa, nem universal, mas 
contextual; toda pessoa tem de ser, está condenada a existir e a ser livre, e 
daí decorre sua dignidade perante qualquer outro ser; “basta vir ao mundo 
para que a pessoa humana incorpore a sua dignidade”, a qual não é um dado, 
mas é determinado pelo contexto e história da própria pessoa. 
Numa perspectiva existencialista, “a dignidade humana está presente em 
todos aqueles que simplesmente existem”; mas há aqueles que não têm uma 
existência digna, uma existência autêntica; A autenticidade está relacionada 
ao alcance do ser-para-si, aquele que constrói seu ser e sua essência na sua 
história, por suas escolhas, em seu contexto, um ser que se torna algo diante 
19 
 
do outro; a inautenticidade está relacionada à limitação ao ser-em-si, um 
ser estático, sem história, já-dado, pleno. 
Cada homem é feito de outros homens e todos possuem o mesmo valor. 
Processos de despersonalização continuam ocorrendo no contexto capitalista 
atual; luta pela autodeterminação humana; luta contra as desigualdades de 
riqueza e poder. 
 
5. A partir do conceito de biopolítica, estabeleça uma relação entre vida 
nua e vida sacra. 
No debate atual sobre direitos fundamentais, faz-se antes de tudo 
necessário tomar consciência da função histórico-política do trinômio: 
nação/nacionalidade, soberania e poder jurídico sobre a vida. Quer dizer que, 
ao lado da função emancipatória das declarações de direitos 
fundamentais, seria também indispensável perceber que elas integram o 
dispositivo de abandono da vida nua à violência dos mecanismos de 
poder. Ora, é nesse sentido que a arqueologia das sociedades européias 
modernas, configuradas como sociedades bio-políticas ao longo do século 
XVIII e depois, fornece um instrumental teórico indispensável para as análises 
de Agamben. 
Como bio-poder, o Estado moderno inclui a vida biológica - tanto ao nível 
individual dos corpos adestrados pelas disciplinas, como no registro genérico 
das populações, cujos ciclos vitais de saúde e morbidez, natalidade e 
mortalidade, reprodução, produtividade e improdutividade, devem ser 
calculados em termos de previdência e assistência social. É desse modo que, 
com a bio-política, a antiga soberania régia (que se encarnava no poder do 
monarca de fazer morrer e deixar viver) se converte num poder de fazer viver e 
deixar morrer. 
Compreende-se a importância do racismo no exercício de um poder assim: 
é a condição para que se possa exercer o direito de matar. Se o poder de 
normalização quer exercer o velho direito soberano de matar, ele tem de 
passar pelo racismo. 
Empreende-se, no horizonte dessa crítica radical da teoria dos direitos 
humanos, uma aproximação - que não parece desautorizada pelo texto do 
próprio Agamben -, entre vida nua e vida sacra. E tal aproximação se deve 
tanto à ausência de uma definição explícita (e de um uso conceitualmente 
diferenciado) desse termo no Homo Sacer, como também na recusa, por parte 
de Agamben, de explicitar os termos e os traços distintos de uma forma política 
inteiramente emancipada do princípio jurídico da soberania. Para Giacoia, é a 
sacralidade - comum ao homo sacer e ao caráter sagrado dos direitos 
humanos fundamentais - que institui uma insidiosa cumplicidade entre a vida 
nua e o poder (bio-político) do direito. 
O termo latino sacer encerra a representação para nós mais precisa e 
específica do 'sagrado'. É em latim que melhor se manifesta a divisão entre o 
profano e o sagrado; é também em latim que se descobre o caráter ambíguo 
do 'sagrado'. 
Esse duplo valor é próprio de sacer; ele contribui para a diferenciação 
entre sacer e sanctus, pois não afeta de maneira alguma o adjetivo aparentado 
sanctus. 
Além disso, é a relação estabelecida entre sacer e sacrificare que melhor 
nos permite compreender o mecanismo do sagrado e a relação com o 
20 
 
sacrifício. O termo 'sacrifício', familiar a nós, associa uma concepção e uma 
operação que parecem nada ter em comum. Por que 'sacrificar' quer de fato 
dizer 'pôr à morte', se significa propriamente 'tornar-se sagrado'? 
Seria ilustrativo contrapor a isso a instrutiva definição, segundo a qual 
o homo sacer é o portador de uma mácula que o coloca fora do direito 
divino e do direito humano, ele é insacrificável e sua morte não constitui 
homicídio. 
Homem sacro é, portanto, aquele que o povo julgou por um delito; e não é 
lícito sacrificá-lo, mas quem o mata não será condenado por homicídio; na 
verdade, na primeira lei tribunícia se adverte que 'se alguém matar aquele que 
por plebiscito é sacro, não será considerado homicida'.Disso advém que um 
homem malvado ou impuro costuma ser chamado sacro. 
A instituição da sacratio, como princípio, de um caráter sagrado da vida, 
todavia, seria de datação recente, embora se nos tenha tornado tão familiar 
que nos faz esquecer do vínculo essencial entre sacralidade e sacrifício, entre 
o sacer e o impunemente matável - estranha figura jurídico-política do arcaico 
direito romano, a insinuar que a vida sacra é também aquela capturada sob 
o bando/proscrição soberana, portanto matável sem que sua eliminação 
constitua um homicídio, no sentido jurídico do termo. 
E, com base nessa evocação, procuram-se conectar os elementos que 
foram examinados até agora com a discussão atual a respeito dos direitos 
humanos - precisamente nos termos propostos por Giorgio Agamben. Pois é 
corrente o entendimento dos mesmos como direitos 'sagrados e inalienáveis' 
do homem, o que lhes confere o status de princípios asseguradores dos 
valores cardinais positivados nas declarações de direitos das constituições dos 
estados modernos. 
Evidentemente, não se trata, de modo algum, de questionar a importância 
fundamental das declarações de direitos como garantia das liberdades 
públicas; sua função histórica de emancipação e resistência ao arbítrio e à 
tirania, seu papel decisivo na história do constitucionalismo moderno não pode 
deixar de ser reconhecido, salvo por uma deficiência de lucidez analítica. A 
intenção consiste apenas em indicar o caráter bifronte que também quanto a 
eles se pode reconhecer, como em todo e qualquer acontecimento de efetiva 
relevância histórica e política. 
Tudo se passa, portanto, como se, "a partir de um certo ponto, todo evento 
político decisivo tivesse sempre uma dupla face: os espaços, as liberdades e 
os direitos que os indivíduos adquirem no seu conflito com os poderes centrais 
simultaneamente preparam, a cada vez, uma tácita porém crescente 
inscrição de suas vidas na ordem estatal, oferecendo assim uma nova e 
mais temível instância ao poder soberano, do qual desejariam liberar-se. 
 
Conceitos básicos: 
- Homo sacer – conceito que era usado no direito romano para 
caracterizar a pessoa legalmente excluída da proteção conferida pelo direito 
aos cidadãos; o próprio direito regula a exclusão; isto nos leva a 
compreender melhor o próprio direito como instrumento para criar a 
exclusão, a exceção é jurídica. 
- Vida nua – grosso modo, denominação de Walter Benjamin para a vida 
despida da proteção política e jurídica da comunidade. 
21 
 
- Soberano – está fora da ordem jurídica, acima dela, é quem pode dizer 
onde, quando e para quem será excluída a ordem jurídica e política. 
- Caráter dúbio do Estado: o corpo é capturado pelas instituições 
ocidentais da política e do direito – o corpo está tutelado pelo direito, é sacro 
diante do Estado e ao mesmo tempo está sempre sob a ameaça soberana de 
ser excepcionado; esta é a essência do Estado moderno, da política e do 
direito; o Estado protege e ameaça ao mesmo tempo. 
- Dificuldade de reconstrução dos direitos humanos se explicita com o 
desvelamento dos limites destes direitos e do papel da biopolítica para o 
domínio dos corpos. 
 
PONTO 3 
Teoria crítica dos Direitos Humanos. A denúncia da mistificação 
ideológica dos direitos humanos abstratos. A dificuldade de reconstrução 
dos direitos humanos na era da biopolítica: os limites da cidadania como 
direito a ter direitos, estado de exceção e campo de concentração como 
paradigmas políticos modernos. 
 
1. O que é a “denúncia da mistificação ideológica dos direitos humanos”? 
Segundo Oswaldo Giacoia Junior, é a crítica, anunciada por Marx, à 
concepção “jusnaturalista dos direitos humanos como prerrogativas 
inalienáveis, naturais e universais”, titularizadas pelo homem em razão de sua 
humanidade, versão que, em verdade, é a mera perspectiva dos direitos 
humanos formais como “expressão simbólica e jurídica do domínio econômico 
e da hegemonia política da burguesia”. 
Tal entendimento é uma mistificação ideológica da noção de direitos 
humanos, na medida em que toma por “homem natural” o “homem burguês”, 
o “indivíduo privado”, habitante típico da sociedade civil burguesa, em oposição 
ao “cidadão”, categoria do universal humano e antítese do “homem livre”, 
particular. 
Assim, a organização da moderna sociedade civil, com a positivação dos 
direitos humanos, encerra essa oposição, essa dialética, entre (i) “homem” 
(homem real, membro da sociedade burguesa, em sua existência individual, 
egoísta e imediata) e (ii) “cidadão” (homem verdadeiro, homem político, 
abstrato, artificial, alegórico e moral). 
[fonte: Oswaldo Giacoia Junior. Sobre direitos humanos na era da 
biopolítica.] 
 
2. Por que, na era da biopolítica, a cidadania funciona como um limite ao 
direito a ter direitos? 
Porque, na modernidade biopolítica na qual o direito e a política têm a vida 
como campo de incidência, a pessoa humana, para ser cidadã (e ter direito a 
ter direitos), passa a depender de um “ato de reconhecimento” pelo Estado, 
que se dá através do ato de nascimento dentro do território da uma “Nação”. 
Daí porque “refugiados” e “apátridas” seriam “homini sacri” modernos. 
[fonte: Oswaldo Giacoia Junior. Sobre direitos humanos na era da 
biopolítica.] 
 
3. Por que estado de exceção e campos de concentração podem ser 
vistos como paradigmas políticos modernos? 
22 
 
Porque, apesar do fim dos regimes formalmente totalitários, continua a 
viger, como matriz oculta da política em que vivemos na moderna democracia 
liberal-capitalista, um estado de exceção permanente, no qual direitos e 
garantias fundamentais – notadamente de certos grupos vulneráveis de 
excluídos (os “homini sacri”) – são sistematicamente violados, na forma de 
legalidade, por atos e decretos dos poderes constituídos, em plena 
normalidade institucional. 
Por sua vez, o campo de concentração “é a estrutura em que o estado de 
exceção é realizado normalmente, caracterizando-se por uma zona de 
indistinção entre regra e exceção, lícito e ilícito, confundindo-se fato e direito”. 
[fonte: Caio Jesus Granduque José. Espelho com critérios de correção para 
a terceira prova escrita do VII Concurso.] 
 
PONTO 4 
Encantos e desencantos dos Direitos Humanos: entre dominação e 
emancipação. Perspectivas pós-violatórias, estatais e monistas X pré-
violatórias, existenciais e pluralistas para a proteção dos Direitos 
Humanos. 
1. Discorra sobre o duplo efeito, encantador e de desencanto, dos Direitos 
Humanos: 
Como toda produção humana, deve-se partir da ideia de que Direitos 
Humanos podem ser uma instância de luta libertadora por uma dignidade que 
emancipa, como também pode ser um instrumento de dominação que legitima 
distintas formas de exclusão e inferiorização humanas, e aí está o seu duplo 
efeito, encantador e de desencanto. 
No processo relacional entre as pessoas, a forma de se definir e se 
comportar entre elas por meio de tramas sociais pode resumir-se através de 
duas dinâmicas: 
a) Relações ou tramas de dominação ou império, que 
consistem em formas de tratar os outros como objetos, classificando-os 
e hierarquizando-os a partir de significados de discriminação, 
marginalização, exploração, exclusão, desprezo e rechaço; e 
b) Tramas sociais de emancipação e libertação, com as quais 
uns e outros tratam-se como sujeitos, de maneira horizontal, solidária, 
de forma a articular reconhecimentos e acompanhamentos mútuos. 
A libertação e a emancipação se desenvolvem e se atingem quando se luta 
pela transformação e contra qualquer situação social, cultural, política, 
ideológica, étnica, racial, sexual e econômica que provoca exclusão, 
discriminação ou injustiça. Desta forma, os grupos afetados por essas 
exclusões conquistam espaços de reconhecimento, autoestima, autonomia e 
responsabilidade enquanto sujeitos. 
Direitos Humanos entendidos como processos de abertura e consolidação 
de espaços de luta pela dignidade humana fazem alusão a diversas 
expressões de reivindicaçõespolíticas, sociais, econômicas, sexuais, culturais 
etc, com o intuito de que os seres humanos sejam reconhecidos como sujeitos 
diferenciados. Expressam formas de humanidade múltiplas e plurais, 
individuais e coletivas, sempre em relação ao contexto em que cada indivíduo 
ou cada coletivo esteja situado. Por isso, são veículos de expressão e de 
produções representativas de dinâmicas emancipadoras e libertadoras. Mas 
também podem ser manifestações de tendências e lógicas que limitam e 
23 
 
aniquilam humanidades. Aí está o sentido dúbio de encanto e de desencanto 
dos Direitos Humanos. 
A dimensão que desencanta pode aparecer no instante em que os Direitos 
Humanos se fixam sobre discursos e teorias, instituições e sistemas estruturais 
que sociocultural e sociomaterialmente não permitem que estes sejam factíveis 
e nem possíveis, devido às assimetrias e hierarquias desiguais sobre as quais 
se mantêm. A dimensão que desencanta aparece quando se reduz os Direitos 
Humanos à sua dimensão jurídico-positiva, formal e procedimental, adotando-
se uma postura anestesiada, indolente e conformista sobre seus efeitos e 
resultados. 
 
2. Discorra sobre alguns limites que podem contribuir para a manutenção 
do conhecido abismo que existe entre o que se diz e o que se faz, ou 
entre a teoria e a prática dos Direitos Humanos: 
Um primeiro problema que se observa é o fato de que o imaginário jurídico 
se orienta, constantemente, pelo que Edgar Morin tem chamado de paradigma 
da simplicidade, que dualiza, hierarquiza, amputa e reduz a realidade em geral. 
Assim, da maneira como interpretamos o direito a partir do paradigma da 
simplicidade, temos a tendência de separar e segmentar as diversas partes 
que compõem o mundo jurídico e dividir sua complexa e plural realidade. 
Assim, por exemplo, é marcante a ausência de diálogo entre os especialistas 
em direitos humanos e os civilistas; ou entre o direito das universidades e o 
mundo social em que ele se constrói. 
Como consequência disso, reduzimos o direito ao “direito estatal” (cultura 
monista-estatal), ignorando outras expressões jurídicas não estatais (pluralismo 
jurídico). E reduzimos o direito à “norma”, herança do positivismo jurídico. O 
resultado é a absolutização da lei e do Estado, bem como a burocratização de 
sua estrutura, ignorando as conexões entre o jurídico e o ético, entre o direito e 
o político. Outra consequência dessa simplificação é a separação acrítica entre 
o público e o privado, e entre o mundo jurídico e o contexto sociocultural em 
que ele se encontra e que o condiciona. 
Tudo isso, enfim, contribui para a separação entre a teoria e a prática dos 
direitos humanos, de tal modo que esta se volte apenas para a dimensão pós-
violadora dos Direitos Humanos - pela qual estes se reivindicam apenas pela 
via judicial e quando violados. 
 
3. Apresente algumas propostas para o enfrentamento do conhecido 
abismo que existe entre o que se diz e o que se faz, ou entre a teoria e a 
prática dos Direitos Humanos: 
1) Assumir um pensamento complexo, relacional e interdisciplinar* 
2) Adotar uma racionalidade e uma ética da vida e do vivo** 
3) Incorporar o paradigma pluralista do direito*** 
*Frente a um pensamento simples e estreito, que reduz e abstrai a 
diversidade do real, há que se cultivar um pensamento que saiba distinguir – e 
não separar – os elementos que constituem a realidade jurídica. Atualmente 
vivemos processos sociopolíticos e socioeconômicos de transformação e de 
reestruturação do capitalismo dentro de um contexto de globalização do 
mundo. Essa realidade afeta o papel, a funcionalidade e o alcance do direito 
positivo, tanto em seu âmbito interno, quanto em seu âmbito externo (relação 
com outras manifestações de poder). Por causa disso, o paradigma da 
24 
 
simplicidade e sua consequência técnico-formal-estatal se mostram 
insuficientes. 
**Devemos incorporar uma racionalidade e uma ética da vida e do vivo, 
uma ética que saiba resistir de forma sensível e comprometida com o 
sofrimento humano. Todo ser humano deve viver sem ser sacrificado por um 
valor, um ideal, uma instituição, enfim, uma produção ou criação humana. 
***As normas tradicionais assentadas em pretensões de homogeneidade, 
promulgadas com base nos princípios da impessoalidade, generalidade e 
abstração, organizadas a partir de um sistema unitário, lógico, fechado e 
hierarquizado, coerente, sem lacunas e antinomias, são excessivamente 
simples para dar conta da pluralidade das situações sociais, econômicas e 
culturais cada vez mais diferenciadas. A complexidade socioeconômica e a 
crescente desigualdade dos conflitos mostram a perdida capacidade de regular 
e disciplinar nossas sociedades, e, assim, o surgimento de outras expressões 
de pluralidade jurídica rompem o monopólio estatal. A proposta de Antonio 
Carlos Wolkmer parte de uma noção de pluralismo jurídico capaz de 
reconhecer e legitimar normas extras e infraestatais, engendradas por 
carências e necessidades provenientes de novos atores sociais, e capaz de 
captar as representações legais de sociedades emergentes marcadas por 
estruturas de igualdades precárias e pulverizadas por espaços de conflito 
permanente. 
Assim, devemos assimilar e incorporar o paradigma pluralista de direito por 
duas razões fundamentais: a) porque permite uma melhor interpretação da 
complexidade dos atuais acontecimentos que o contexto da globalização está 
provocando sobre o mundo jurídico; e b) porque em sua versão emancipadora, 
o direito tanto estatal quanto não estatal pode ser instrumento a serviço dos 
coletivos mais desprotegidos e mais vulneráveis. Em outras palavras, existem 
mecanismos multiescalares de garantias de direitos humanos de caráter 
jurídico estatal, jurídico não-estatal e não jurídico (socioeconômico, cultural, 
sexual, político...) – direitos humanos são para todo momento e em todo lugar. 
 
4. Diferencie as perspectivas pós-violatórias e pré-violatórias para a 
proteção dos Direitos Humanos: 
Nossa cultura de direitos humanos é extremamente limitada porque se 
concentra na sua dimensão pós-violada, ignorando a dimensão preventiva e 
pré-violadora, ou seja, aquela que existe antes de ser violada. Reduzimos, 
assim, os direitos humanos a teorias filosóficas e a normas, instituições 
jurídicas e eficácia jurídica do Estado. 
Devemos apostar em uma noção de direitos humanos entendidos como 
processos de abertura e consolidação de espaços de luta por diversas formas 
de entender a dignidade humana, e como forma de acessar a bens que 
satisfazem necessidades humanas e que, em geral, são condicionadas por 
contextos materiais hegemônicos (antes da violação). 
 
5. Discorra sobre os encantos e desencantos dos Direitos Humanos com 
ênfase na mistificação ideológica dos direitos humanos abstratos 
(questão 2ª fase): 
O processo de reconstrução dos direitos humanos no pós-guerra a partir da 
metade do século XX levou Norberto Bobbio a designar nossos tempos de “a 
era dos direitos”. Com efeito, a profusão de tratados e convenções 
25 
 
internacionais de direitos humanos possui inegável caráter emancipatório e 
libertário, mas a síndrome de inefetividade que os acometem permite-se pensar 
que se vive na “era do desrespeito dos direitos”, eis que eles podem funcionar 
como artifícios ideológicos para manutenção do status quo, ou seja, o sistema-
mundo capitalista globalizado, legitimando relações de poder de opressão e 
dominação de pessoas nos diversos espaço-tempo sociais, daí o duplo efeito 
de encanto e desencanto. 
Nessa esteira, compreende-se o diagnóstico de Carlos Drummond de 
Andrade, eis que da Lua, ou seja, tomados em perspectiva a-histórica, os 
direitos humanos não merecem reparos, vale dizer, são encantadores, mas 
causam repentino desencanto quando examinados na realidade sócio-histórica, 
aquela a que José Saramago se refere, cujos sistemas político e econômico de 
organização social são incompatíveis com sua efetivação. 
O grande precursor dessa denúnciada mistificação ideológica dos direitos 
humanos abstratos foi Karl Marx, eis que, para o autor de A questão judaica, 
“os direitos humanos formais seriam a expressão simbólica e jurídica do 
domínio econômico da burguesia, de tal sorte que o reconhecimento da livre 
personalidade e de direitos subjetivos, permitindo-se a celebração de contrato 
sobre a sua própria força de trabalho, seriam as condições essenciais para a 
criação da mais valia e para a valorização do capital. 
 
PONTO 5 
Efeito encantatório e usos políticos dos Direitos Humanos: intervenções 
humanitárias e imperialismo dos Direitos Humanos (universalismo, 
relativismo e hermenêutica diatópica). 
 
1. Discorra sobre a relação entre intervenções humanitárias e o 
imperialismo dos Direitos Humanos1: 
Segundo Hobsbawm, mesmo com o retumbante fracasso da suposta 
intervenção humanitária no Iraque, subsiste “uma proposição genérica da 
legitimidade e até da eventual necessidade de intervenções armadas 
internacionais para preservar ou impor os direitos humanos em uma era de 
crescente barbárie, violência e desordem” (HOBSBAWM, 2007, p. 14-15). 
Complementa o autor que tal proposição implica, para alguns, “a desejabilidade 
de uma hegemonia imperial mundial especificamente exercida pela única 
potência capaz de estabelecê-la, os Estados Unidos”, o que pode ser chamado 
de imperialismo dos direitos humanos, ou seja, que intervenções armadas 
internacionais possuem legitimidade para preservar ou impor direitos humanos 
e, para isso, é necessário uma potência bélica. 
Umas das premissas subjacentes ao imperialismo dos direitos humanos é 
de que os regimes tiranos seriam imunes à mudança interna, de modo que 
apenas a força armada externa poderia conduzi-los a adotar os valores e 
instituições políticas ocidentais (HOBSBAWM, 2007, p. 18-19). Outra premissa 
equivocada é que tais instituições ocidentais podem ter êxito em qualquer lugar 
e, assim, cuidar eficazmente dos problemas transnacionais, trazendo a paz ao 
invés de instaurar a desordem (HOBSBAWM, 2007, p. 14-15). 
Ambas as premissas das intervenções humanitárias imperialistas “se 
fundamentam na crença de que atos de força podem produzir 
 
1Questão e resposta formulada com base no prefácio do livro “Globalização, Democracia e 
Terrorismo” de Eric Hobsbawn, publicado pela Companhia das Letras no ano de 2007. 
26 
 
instantaneamente grandes transformações culturais, o que não é verdade, pois 
a única possibilidade de sucesso de uma tentativa de difusão de valores e 
instituições através de uma força estranha é quando já se encontram presentes 
no local as condições que tornem tais valores e instituições adaptáveis e sua 
introdução, aceitável, ou seja, quando não seria mais necessário o uso da força 
ou a força seria utilizada realmente como ajuda a uma resistência interna. 
A impossibilidade de sucesso da difusão dos valores ocidentais, como 
democracia e direitos humanos, pelo uso da força reside no fato de tais valores 
não são como produtos tecnológicos de importação, cujos benefícios são 
óbvios desde o início e que são adotados de uma mesma maneira por todos os 
que têm condições de usá-los, como uma pacífica bicicleta ou um mortífero AK 
47, ou serviços técnicos, como os aeroportos. Se fossem, haveria maior 
similaridade política entre os numerosos Estados da Europa, da Ásia e da 
África, todos vivendo (teoricamente) sob a égide de constituições democráticas 
similares (HOBSBAWM, 2007, p. 18-19). Nas palavras do autor, “a história tem 
muito poucos atalhos”, ou seja, não se parte da ditadura para democracia ou 
da barbárie para a civilização pela força de quem em realidade não tem como 
maior interesse a realização de tais passagens. 
 
2. De acordo com a teoria crítica dos direitos humanos, a intervenção 
humanitária de caráter bélico é um instrumento apto a defesa dos direitos 
humanos? 
A resposta é negativa com base em um artigo de David Sanchez Rubio 
(20102), no qual este autor procura resumir uma pesquisa mais ampla sobre 
intervenção humanitária, cujo principal propósito foi “reafirmar o rechaço ao uso 
da força armada como instrumento de proteção dos direitos humanos, 
principalmente em sua versão mais cruel: a guerra” (RUBIO, 2010, p. 209). 
Inclusive, o autor afirma que a partir da pesquisa realizada chegou-se a 
conclusão que em nenhum momento na história da humanidade se realizou um 
ato de suposta intervenção humanitária com o único, o exclusivo ou mesmo 
com o principal propósito de evitar uma situação de violação massiva e 
sistemática dos direitos humanos, entendida intervenção humanitária como 
utilização da força armada para proteger as vítimas. Isto porque, segundo o 
autor, em nenhum momento as pessoas, os sujeitos concretos e corporais, 
foram/são consideradas como os principais destinatários desse tipo de 
atuação,. Ao contrário, se tem analisado e priorizado outros tipos de razões ou 
circunstâncias, tais como: interesses econômicos, questões de segurança 
internacional, a proteção a interesses geoestratégicos e geopolíticos, a 
preocupação seletiva com seus próprios nacionais ou por determinados 
coletivos com maior afinidade ideológica, motivos religiosos, etc. (RUBIO, 
2010, p. 227). 
Nesse sentido, assevera que, se nas situações do normal funcionamento 
do sistema socioeconômico global não se reconhecem os direitos humanos, 
nem se valoriza a vida de todos os sujeitos humanos como objetivo prioritário, 
a legitimidade para a intervenção em situações ditas de anormalidade, ou seja, 
a “salvação” pontual e ocasional de vidas que se alega em casos de 
 
2 Artigo denominado “Reflexiones e (im)precisiones em torno a la intervención humanitaria y 
los derechos humanos” publicado no livro “Direitos Humanos e Globalização: fundamentos 
e possibilidades desde teoria crítica. EDIPUCRS. 2010. 
27 
 
intervenção, possui todas as tintas de falsidade, hipocrisia e cinismo (RUBIO, 
2010, p. 223 – 224). 
O autor relaciona tais questões com o problema de responsabilidade e da 
legitimidade de quem atua a favor dos direitos humanos sistemática e 
massivamente violados, tendo em vista que aqueles que possuem maior 
capacidade de intervir são as grandes potências, os quais, além de contribuir 
para manutenção da exclusão cotidiana, também fecham as portas para o 
reconhecimento dos direitos humanos humanos com ações muito diretas: 
impedindo a imigração, não reconhecendo os direitos econômicos, sociais e 
culturais, mantendo a dívida externa, fornecendo armas para países em guerra 
civil, etc. 
Contudo, importante sublinhar a ressalva do autor no sentido que existem 
situações de fato nas quais a ação armada e violenta ocorre e tem que ser 
utilizada transitoriamente, mas se deve retirar qualquer roupagem ideológica 
que legitima o uso da força e que a batize ou a vista sob o manto de ação 
humanitária (RUBIO, 2010, p. 225). 
Para concluir, chama atenção para o fato de que há indícios muito claros 
para suspeitar e questionar, em situações reais, sobre as verdadeiras 
intenções de quem, em nome de direitos que no cotidiano não reconhecem a 
maioria da população do planeta, usam a força militar. Quando o ser humano 
não conta, estranha maneira de recuperá-lo a base de bombas e ou armas 
humanitárias (RUBIO, 2010, p. 226). 
 
3. Discorra sobre o tema “relativismo e universalismo dos direitos 
humanos”, abordando necessariamente os seguintes tópicos: a) 
multiculturalismo dos direitos humanos; b) hermenêutica diatópica; c) 
universalismo de confluência3. 
a) Multiculturalismo dos direitos humanos: Segundo Boaventura de Souza 
Santos, os ideais da corrente que defende o universalismo dos direitos 
humanos implicam uma imposição moral universal; isto é, eles não poderiam 
ser postos em prática no cenário mundial sem a imposição de uma cultura 
hegemônica às minorias, o que caracterizaria uma espécie de “canibalização 
cultural”. Em resposta a esse problema, Santos defende uma concepção 
multicultural dos direitos humanos, pautada

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