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Malária: Uma Doença Febril Aguda

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Malária – profa Francielle Vargas 
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Malária 
A malária pode ser definida como uma doença febril aguda pelo 
protozoário do gênero Plasmodium, sendo que, existem quatro espécies 
que parasitam o homem: P. falciparum (África), P. vivax (Brasil), P. 
malariae e P. ovale – ordem do mais para o menos frequente/grave. 
Apresentam um ciclo heteroxêmico, em que o mosquito é o hospedeiro 
definitivo e o homem é o hospedeiro intermediário. 
Cerca de 40% da população mundial está em áreas de risco, 
principalmente na África, América Central e nas regiões norte e centro-
oeste do Brasil, gerando cerca de 1 milhão de mortes no mundo. De modo 
geral, a malária resulta da interação de fatores biológicos, ambientais, 
culturais e socioeconômicos. 
Transmissão: ocorre pela picada da fêmea do mosquito Anopheles 
darlingi parasitado com esporozoítos do protozoário – horários 
crepusculares. Apenas a fêmea consegue inocular os esporozoítos, pois 
os machos não exercem a hematofagia. Como criadouros preferenciais 
tem-se coleções de água limpa e quente, sombra e de baixo fluxo. 
No momento da picada, a fêmea inocula os esporozoítos 
(forma infectante) introduzindo a probócite e injetando 
anestésicos locais e anticoagulantes, para conseguir sugar o 
sangue. Eles migram até o fígado e se transformam em 
esquizontes (8 a 15 dias), que se multiplicam e liberam os 
merozoítos – que são liberados na corrente sanguínea e 
entram nas hemácias iniciando a fase de esquizogonia 
sanguínea. 
Dentro da hemácia tem-se formação dos gametócitos, estes 
que serão ingeridos pela fêmea durante a hematofagia, 
formando o oocisto no estômago do mosquito, este que gera 
esporozoítos para perpetuar o ciclo de infecção. 
Nos P. vivax e ovale tem-se a opção de um ciclo 
exoeritrocítico. No momento de inoculação dos esporozoítos, 
ao infectar o hepatócito, uma parcela torna-o doente outra 
parcela infecta e se torna latente na forma de hipnozoítos, 
permitindo que o fígado seja um reservatório para uma 
possível recaída. 
O P. falciparum tem a capacidade de produzir um quadro de 
hiperparasitemia, com menor duração do ciclo tecidual, 
produção de esporozoítos e invasão de hemácias em 
qualquer idade. Além disso, o gênero falciparum produz 
alterações na microcirculação e, geralmente, promove 
manifestações mais graves. 
Após a invasão das hemácias pelo protozoário tem-se mudanças na membrana celular, com alteração das 
propriedades de transporte e presença de protrusões eletrodensas em sua superfície, o que facilita a 
aderência dessas ao endotélio de vênulas pós-capilares e capilares de diversos órgãos, como cérebro, 
pulmões e rins, além da presença de adesinas do Plasmodium - denominadas knobs -, propicia a maior 
gravidade da doença, através da citoaderência. 
• Espécie de Plasmodium;
• Virulência do parasito;
• Resistência ao 
tratamento;
• Crianças;
• Susceptibilidade. 
Biológicos
• Clima tropical;
• Tipo de moradias;
• Cobertura vegetal;
• Limitações para o 
controle vetorial.
Ambientais
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Somando-se, existe também o processo de produção de "rosetas", no qual as células infectadas aderem a 
células não-infectadas, havendo formação de agregados celulares que interferem na microcirculação. 
Ademais, na malária grave, as hemácias infectadas e as não-infectadas tornam-se rígidas, o que promove 
um impedimento adicional ao fluxo sanguíneo. 
Após a resposta imune à malária ser ativada, toxinas do parasita como a 
hemozoína irão adentrar nas células, ativar TLR9 de receptor dos 
endossomos dentro das células, que desencadeará uma resposta 
inflamatória. Tem-se destruição dos eritrócitos parasitados, lesão celular 
induzida por complexos imunes causando glomerulonefrite (principalmente 
nas infecções por P. malariae), febre, entre outros. A primo-infecção 
apresenta maior gravidade. 
Quadro clínico: quando as hemácias são rompidas, ocorre degradação do 
radical heme, que provoca o aumento da bilirrubina. Clinicamente se 
observa anemia, icterícia e diminuição de hemácias. As hemácias se 
rompem ao mesmo tempo, liberando suas substâncias intracelulares e 
liberando citocinas, provocando febre alta. 
Inicialmente tem-se febre alta (41ºC), calafrios, cefaleia, fadiga, fraqueza, mialgia, náuseas, urina escura, 
vômitos, diarreia, palidez cutânea, esplenomegalia, entre outros. A síndrome febril periódica ocorre de 
acordo com a duração do ciclo eritrocítico que gera lise das hemácias e pode se caracterizar como: 
→ Febre terçã: o ciclo eritrocítico demora dois dias para acontecer, em que a febre ocorre no terceiro dia 
após hemólise. 
→ Febre quartã: o ciclo eritrocítico dura três dias, sendo que após o terceiro dia tem-se hemólise e os 
episódios de febre e calafrios ocorrem por volta do quarto dia. No falciparum a malária é menos regular 
e mais severa, de modo que os episódios de febre e calafrio ocorrem no terceiro ou no quarto dia. 
O acesso palúdico é uma manifestação clínica de infecção 
aguda e ocorre de 15 a 60 minutos, 2-6h ou 2-4h, em que 
o paciente apresenta febre, calafrios, frio extremo e 
tremores generalizados, podendo ser mais graves em 
crianças com delírio e convulsões. Ao exame físico pode-
se ter hepatoesplenomegalia febril associada à síndrome 
ictérica. A evolução geralmente é benigna, tendo recaídas 
mais relacionadas com a infecção pelo P. vivax. 
Como complicações pode-se ter anemia grave, 
hemorragia, ruptura esplênica, malária cerebral, edema 
pulmonar, choque, hiperparasitemia, recaídas pela 
reativação de hipnozoítos, insuficiência renal, acidose 
metabólica, entre outras. 
Em crianças, as formas complicadas ocorrem geralmente 
em menores de 5 anos, com elevada mortalidade, acidose 
lática, febre, cefaleia, tosse, artralgia, diarreia, icterícia e 
convulsões. Os quadros de anemia grave são mais 
comuns em < 2 anos e a malária cerebral de 2 a 4 anos. 
Em gestantes a mortalidade pode chegar até a 50%, com 
30% de chance de aborto no 1º trimestre. Além disso, 
pode gerar baixo peso ao nascer, RCIU, edema pulmonar, 
prematuridade, hipoglicemia e óbito fetal. 
Período de incubação 
P. vivax: 10 a 14 dias 
P. falciparum: 7 a 11 dias 
P. malariae: 14 a 28 dias 
Congênita: 3 a 6 semanas 
Transfusão: 10 horas 
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As formas graves são, geralmente, causadas pelo P. falciparum, tendo como sinais de perigo para malária 
grave tem-se febre alta persistente, hiperparasitemia (> 200.000/mm3), oligúria (IRA), dispneia (edema 
pulmonar), anemia intensa, icterícia, hemorragias, alteração no nível de consciência (malária cerebral), 
convulsões, hipoglicemia (< 40 mg/dl), entre outros. A hospitalização deve ser realizadas para os pacientes 
com sinais de perigo, < 1 ano, > 70 anos, gestantes, esplenectomizados, transplantados e 
imunossuprimidos. 
Diagnóstico: a pesquisa direta pode 
ser feita pela identificação do 
protozoário através do exame de gota 
espessa (padrão-ouro), esse que 
permite diferenciação da espécie, 
mensuração da carga parasitária e 
visualização do estágio do 
Plasmodium. Como testes indiretos 
pode-se realizar sorologias ou PCR – 
mas não diferencia espécie e não 
mede parasitemia. O teste rápido pode 
ser feito em locais de difícil acesso. 
Além disso, pode-se utilizar o critério 
clínico epidemiológico com relato de 
febre, viagem à área de transmissão 
ou transfusão sanguínea prévia. 
Nesse caso, deve-se questionar sobre 
a realização de medidas de prevenção 
e profilaxia. 
Diagnóstico diferencial: leptospirose, febre amarela, hepatites, dengue, influenza, infecções das vias 
respiratórias, infecções do trato urinário ou febre tifoide. 
Tratamento: depende da gravidade da doença, da espécie de plasmódio, da idade do paciente, da história 
de exposição anterior à infecção, comorbidades associadas e à susceptibilidade dos parasitos aos 
antimaláricos convencionais. Com base nociclo, os fármacos podem atuar em quatro pontos diferentes: 
Alvo 1 – para tratar crises agudas: fármacos que conseguem matar esquizontes, evitando hemólise e, 
consequentemente as manifestações clínicas da infecção e a liberação de merozoítos que irão perpetuar o 
ciclo. Como exemplos tem-se cloroquina, quinina, derivados da artemisina, mefloquina, lumefantrina, 
sulfonamidas, halofantrina e tetraciclina. 
Alvo 2 – para cura radical: com fármacos que conseguem matar seletivamente os hipnozoítos no fígado, 
fazendo com que não tenha uma forma latente e as recaídas tardias sejam evitadas – eficazes apenas nas 
espécies vivax e ovale. Como exemplos tem-se primaquina. 
Alvo 3 – para quimioprofilaxia: fármaco que combate os merozoítos liberados no sangue, evitando o ciclo 
eritrocítico. Objetiva-se prevenir a doença ou prevenir sintomas causados pelos parasitos sanguíneos, 
sendo reservada para situações específicas como o risco de adoecer de malária grave. Utiliza-se cloroquina, 
mefloquina, primaquina, doxiciclina ou atovaquona com início de 1 a 2 semanas antes da viagem e término 
em 1 a 4 semanas após a viagem. 
Não se indica a quimioprofilaxia para viajantes em território nacional, mas pode ser recomendada, 
excepcionalmente para viajantes que visitarão regiões de alto risco para transmissão de falciparum – como 
Amazônia legal e África – ou em locais cujo acesso ao diagnóstico e tratamento de malária estejam a mais 
de 24 horas. 
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Alvo 4 – com ação gameticida: fármacos que impedem a formação ou matam os gametas antes da 
chegada maciça na circulação, impedindo a contaminação de outras pessoas. Como cloroquina, primaquina, 
quinina e derivados da artemisina. 
Na gestação pode-se utilizar quinina, cloroquina e derivados da artemisina, sendo contraindicados fármacos 
como primaquina e tetraciclina. No aleitamento não se deve usar tetraciclina e em crianças < 8 anos não se 
usa tetraciclina, doxiciclina e primaquina (< 6 meses). 
Em infecções por P. vivax não complicada utiliza-se um esquizonticida eritrocitário (cloroquina por 3 dias) e 
um esquizonticida tecidual e gametocitocida (primaquina por 7 a 14 dias). Em casos de malária por P. 
falciparum não grave utiliza-se um esquizonticida eritrocitário (arteméter + lumefantrina ou artesunato + 
mefloquina e primaquina em dose única). Em casos de malária grave por P. falciparum utiliza-se drogas 
endovenosas ou intramusculares (artesunato ou arteméter) e manutenção por 5 dias com clindamicina ou 
doxiciclina ou mefloquina. 
Na presença de recaídas (vivax ou ovale) utiliza-se cloroquina semanal por 12 semanas. Em casos de 
malária grave por P. falciparum ou vivax deve-se oferecer medidas de suporte em UTI com controle das 
convulsões, controle de temperatura e realização de hemotransfusão e/ou hemodiálise se necessário. 
Medidas de controle e prevenção: distribuição de 
mosquiteiros impregnados de longa duração (MILD), uso de 
roupas de mangas e calças compridas, uso de repelente nas 
áreas expostas, borrifação intradomiciliar de inseticidas de 
efeito residual, expansão do diagnóstico laboratorial e 
aumento do manejo clínico, quimioprofilaxia em situações 
especiais (viajantes), crescente investimento para o controle 
da doença, redução da transmissão e do número de casos 
nas áreas de risco. 
Não existe vacinação contra malária, mas tem-se algumas 
pesquisas desenvolvidas em decorrência do aumento da 
resistência dos mosquitos aos inseticidas e de cepas 
resistentes aos antimaláricos. Deve-se ter uma vacina que 
atinja os três ciclos do parasito: fase pré-eritrocítica 
(esporozoítos e hipnozoítos), fase eritrocitária (merozoítos) e 
fase transmissora (gametócitos).

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