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CIÊNCIAS POLÍTICAS Professora Me. Mariane Helena Lopes Professora Esp. Ana Caroline Rodrigues GRADUAÇÃO Unicesumar C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância; LOPES, Mariane Helena; RODRIGUES, Ana Caroline. Ciências Políticas. Mariane Helena Lopes; Ana Caroline Rodrigues. Maringá-Pr.: UniCesumar, 2018. 160 p. “Graduação - EaD”. 1. Política. 2. Administração. 3. EaD. I. Título. ISBN 978-85-459-1236-1 CDD - 22 ed. 320 CIP - NBR 12899 - AACR/2 Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828 Impresso por: Reitor Wilson de Matos Silva Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi NEAD - Núcleo de Educação a Distância Diretoria Executiva Chrystiano Minco� James Prestes Tiago Stachon Diretoria de Graduação e Pós-graduação Kátia Coelho Diretoria de Permanência Leonardo Spaine Diretoria de Design Educacional Débora Leite Head de Produção de Conteúdos Celso Luiz Braga de Souza Filho Head de Curadoria e Inovação Tania Cristiane Yoshie Fukushima Gerência de Produção de Conteúdo Diogo Ribeiro Garcia Gerência de Projetos Especiais Daniel Fuverki Hey Gerência de Processos Acadêmicos Taessa Penha Shiraishi Vieira Supervisão de Produção de Conteúdo Nádila Toledo Coordenador de Conteúdo Patricia Rodrigues da Silva Designer Educacional Nayara Valenciano Projeto Gráfico Jaime de Marchi Junior José Jhonny Coelho Arte Capa Arthur Cantareli Silva Ilustração Capa Bruno Pardinho Editoração Victor Augusto Thomazini Qualidade Textual Helen Braga do Prado Em um mundo global e dinâmico, nós trabalhamos com princípios éticos e profissionalismo, não so- mente para oferecer uma educação de qualidade, mas, acima de tudo, para gerar uma conversão in- tegral das pessoas ao conhecimento. Baseamo-nos em 4 pilares: intelectual, profissional, emocional e espiritual. Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos de graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de 100 mil estudantes espalhados em todo o Brasil: nos quatro campi presenciais (Maringá, Curitiba, Ponta Grossa e Londrina) e em mais de 300 polos EAD no país, com dezenas de cursos de graduação e pós-graduação. Produzimos e revisamos 500 livros e distribuímos mais de 500 mil exemplares por ano. Somos reconhecidos pelo MEC como uma instituição de excelência, com IGC 4 em 7 anos consecutivos. Estamos entre os 10 maiores grupos educacionais do Brasil. A rapidez do mundo moderno exige dos educa- dores soluções inteligentes para as necessidades de todos. Para continuar relevante, a instituição de educação precisa ter pelo menos três virtudes: inovação, coragem e compromisso com a quali- dade. Por isso, desenvolvemos, para os cursos de Engenharia, metodologias ativas, as quais visam reunir o melhor do ensino presencial e a distância. Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária. Vamos juntos! Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quando investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou profissional, nos transformamos e, consequentemente, transformamos também a sociedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportu- nidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de alcançar um nível de desenvolvimento compatível com os desafios que surgem no mundo contemporâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica e encontram-se integrados à proposta pedagógica, con- tribuindo no processo educacional, complementando sua formação profissional, desenvolvendo competên- cias e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproximação entre você e o conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhecimentos necessá- rios para a sua formação pessoal e profissional. Portanto, nossa distância nesse processo de cresci- mento e construção do conhecimento deve ser apenas geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. Ou seja, acesse regularmente o Studeo, que é o seu Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das dis- cussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranqui- lidade e segurança sua trajetória acadêmica. A U TO R A S Professora Me. Mariane Helena Lopes Mestre em Ciências Jurídicas com ênfase em Direitos da Personalidade pelo Centro Universitário de Maringá (UNICESUMAR), com pós-graduação em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná. Graduada em Direito pelo Centro Universitário de Maringá (UNICESUMAR). É docente no Ensino à Distância do Unicesumar no curso de Administração, Gestão de Cooperativas, Gestão Hospitalar, Gestão de Recursos Humanos, Processos Gerenciais, Secretariado, Serviço Social e Segurança do Trabalho. Ainda, é coordenadora e mediadora de curso de pós graduação em Direito no EAD do Unicesumar. Por fim, foi membro do Colegiado do Curso de Gestão de Recursos Humanos do Centro Universitário de Maringá. Foi docente no curso de Administração, Comércio Exterior, Direito, Gestão de Recursos Humanos, Jornalismo, Logística, Pilotagem de Aviões, Publicidade e Propaganda e Turismo do Centro Universitário de Maringá. Link: <http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4235119T1>. Professora Esp. Ana Caroline Rodrigues Especialista em História e Sociedade pela Universidade Estadual de Maringá (2010) e graduação em Filosofia pela mesma universidade (2008). Atualmente é professora de Filosofia na Secretaria de Educação do Estado do Paraná, atuando na área desde 2008. Link: <http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4260797E1>. SEJA BEM-VINDO(A)! Caro(a) acadêmico(a), é com grande satisfação que lhe apresento alguns apontamentos sobre este livro, que tem como objetivo aproximá-lo do conteúdo e motivar sua reflexão acerca dos temas propostos. Espero que esta leitura provoque novas perspectivas, diá- logos e considerações diante desta disciplina tão importante na nossa formação, não só profissional, mas também cidadã, as Ciências Políticas. Atualmente, passamos por um momento político conturbado e os inúmeros casos de denúncias, desvios de condutas e corrupção têm motivado crescente desesperança e desinteresse com as questões políticas. Você, certamente, já ouviu alguns comentários como “político é tudo ladrão”, “não me envolvo com política”, “política não se discute”, “os políticos só pensam neles”, “o poder estraga as pessoas”, “esse país não tem mais jeito”. Mas será que política se resume a isso? De acordo com a visão do senso comum, pode ser que sim. Contudo, estamos aqui para extrapolar essa fase primitiva de conhecimen- to, estamos aqui para ir além, buscando leituras e análises mais profundas para construir um conhecimento mais seguro. Muitos autores se dedicaram a ultrapassar este senso comum e pensar a política desde suas raízes até seus frutos. Muitos seriam os teóricos que mereceriam destaque nesse livro, como o tempo não nos permite, nos deteremos em alguns. Conheceremos então um pouco desta produção intelectual que nos ajudará a compreender melhor este as- suntoque diz respeito a todos nós. O fazer política é produção humana e, desta forma, em cada momento ela corresponde às características e necessidades daquele contexto. No entanto, o pensar político e as ciências políticas exigem, de nós, um olhar que se volta também para o passado, bus- cando a construção de um entendimento sobre o presente e criação de estratégias que melhorem o futuro. As mudanças ocorridas na sociedade no seu aspecto nominalmente político e, também, no social, econômico e ético foram transformando o jeito de fazer e pensar a política. Assim, procuramos oferecer a você, aluno(a), um material com informações que estimu- le novas reflexões e possibilite a construção pensamento político consciente. Para isso, organizamos em cinco unidades temas de grande relevância para as ciências políticas. Na primeira unidade, entenderemos melhor como tiveram início as primeiras reflexões políticas, como essas teorias foram se moldando ao longo da história de acordo com os contextos em questão, buscando assim a compreensão do conceito de “política” en- quanto necessidade humana. Na Unidade II, você encontrará informações valiosíssimas para o entendimento dos ob- jetivos e necessidades das organizações políticas, especialmente a partir da formação do pensamento político moderno, as teorias liberais e socialistas, as bases que estrutu- ram a democracia e os entraves que atrapalham sua efetividade plena. Na terceira unidade, trataremos dos conceitos de mundialização e globalização, buscan- do compreender seu contexto, bem como diferenciar a liberdade ideal da prevista pelo Estado Moderno. APRESENTAÇÃO CIÊNCIAS POLÍTICAS Na Unidade IV, trataremos das formas de governo e regimes políticos no mundo contemporâneo, a partir de duas vertentes, a democrática e a autocrática. Já, na quinta e última unidade, você conhecerá um pouco mais sobre a representa- ção política e sistemas eleitorais. Você aprenderá, por exemplo, como são feitos os cálculos de vagas de representação e coeficientes, informações que por não esta- rem claras no nosso cotidiano, muitas vezes nos deixam confusos quando vemos num resultado de eleição que um candidato com menos votos foi eleito enquanto um com menor número de votos não conseguiu a vaga pretendida. Aproveite sua leitura! Reflita e anote suas dúvidas. Realize os exercícios propostos e enriqueça sua formação com os materiais indicados. Quaisquer que sejam as reser- vas que possamos ter com relação à política atual, não é possível fugir dela. Escolher não se envolver, não refletir, não participar é deixar para outro a responsabilidade sobre nosso destino. Que as questões abordadas sejam proveitosas! Ótimos estudos pra você! APRESENTAÇÃO SUMÁRIO 09 UNIDADE I A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS 17 Introdução 18 A Pólis Grega Como Invenção da Política 20 Platão e o Início das Reflexões Políticas 24 Aristóteles e a Política Como Necessária Para a Realização Humana 26 Filosofia Política na Idade Média 28 A Revolução de Maquiavel 30 Os Contratualistas 34 Hannah Arendt 36 John Rawls 38 Considerações Finais 42 Referências 43 Gabarito SUMÁRIO 10 UNIDADE II POLÍTICA E DEMOCRACIA 47 Introdução 48 Qual a Finalidade da Política? 49 A Formação do Pensamento Político Moderno 51 O Pensamento Político Liberal 54 O Pensamento Político Socialista 56 As Grandes Revoluções e a Democracia Moderna 59 O que é Democracia – O Mundo Grego/Moderno 62 Considerações Finais 66 Referências 67 Gabarito SUMÁRIO 11 UNIDADE III MUNDIALIZAÇÃO E GLOBALIZAÇÃO 71 Introdução 72 Convergências, Divergências ou Paradoxos? 79 Os Grupos Sociais Excluídos 86 A Constituição do Estado Moderno: do Ideal de Liberdade Para o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana 87 A Relação Entre Produção e Liberdade na Civilização Clássica 89 O Estado Moderno e a Constituição: a Materialização do Homem 91 Considerações Finais 99 Referências 100 Gabarito SUMÁRIO 12 UNIDADE IV FORMAS DE GOVERNO E REGIMES POLÍTICOS NO MUNDO CONTEMPORÂNEO 103 Introdução 104 Autocracia 109 Democracias 116 Democracia Liberal: Parlamentarismo ou Presidencialismo 119 Democracia Não-Liberal 121 Considerações Finais 126 Referências 127 Gabarito SUMÁRIO 13 UNIDADE V A REPRESENTAÇÃO E O SISTEMA PARTIDÁRIO BRASILEIRO 131 Introdução 132 O Brasil: Representação e Sistema Partidário 132 A Representação Política 137 Sistemas Eleitorais 139 Cálculo do Número de Candidatos 147 Cálculo das Vagas Para Deputado (Federal e Estadual) e Vereador 152 Considerações Finais 156 Referências 158 Gabarito 160 CONCLUSÃO U N ID A D E I Professora Esp. Ana Caroline Rodrigues A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Objetivos de Aprendizagem ■ Conhecer como se deu o início das reflexões políticas. ■ Compreender como as teorias políticas foram se desenhando ao longo da história. ■ Contextualizar as teorias políticas em seus momentos históricos. ■ Conceituar a política enquanto organização necessária para o convívio humano. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ A pólis grega como invenção da política ■ Platão e o início das reflexões políticas ■ Aristóteles e a política como necessária para realização humana ■ Filosofia política na Idade Média ■ A revolução de Maquiavel ■ Os contratualistas ■ Hannah Arendt ■ John Rawls INTRODUÇÃO Olá, seja bem-vindo(a)! Na primeira unidade, estudaremos as bases filosóficas que fundamentam as teorias políticas. A política diz respeito ao modo como organizamos nossas relações coletivas e, há muito tempo, o ser humano busca compreender como se estruturam tais organizações. Em cada contexto histórico, vemos as teorias e práticas se afetando mutu- amente. Os gregos antigos deixaram um legado significativo para as teorias políticas, Platão e Aristóteles são representantes que se destacam. Com o advento do cristianismo, estabelece-se uma ligação entre ética, polí- tica e religião, que predomina na pós-Antiguidade e também na Renascença. Contudo, neste período as reflexões políticas não estão no centro dos grandes questionamentos humanos, as maiores questões são as metafísicas, aquelas que estão além da física, que dizem respeito à relação do ser humano com o que está além do natural, a concepção de Deus, sobretudo. A política volta a ser questão presente nas teorias a partir do século XIII e tem um marco significativo com Nicolau Maquiavel que reformula o problema político, rompendo com a antiga visão de mundo e mostra a necessidade da auto- nomia do Estado em relação à religião, à natureza ou à própria razão, colocando sua finalidade em si mesmo. No mesmo clima de libertação das questões religiosas, continuam a partir do século XVII ideias que criticam a teoria do direito divino, e mostram a neces- sidade da política contratual para regular as relações humanas. Surgem teorias liberais, socialistas, crises econômicas, guerras mundiais, e percebemos ainda hoje que o problema político nunca se mostra resolvido, as sociedades são dinâmicas, os problemas se transformam e a necessidade de ques- tionar, refletir e modificar a realidade são sempre urgentes. Nesta unidade, propomos uma viagem partindo do início das reflexões polí- ticas na Grécia Antiga e acompanhando seu desenvolvimento e transformações ao longo dos séculos de história. Estas bases teóricas são importantes para fun- damentarmos nossos conceitos sobre política, assunto fundamental na vida de todos nós. Vamos aos estudos! Boa leitura! Introdução Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 17 A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E18 A PÓLIS GREGA COMO INVENÇÃO DA POLÍTICA Etimologicamente, a palavrapolítica vem do grego pólis, que significa cidade. Existem muitas definições para política e teorias sobre a melhor forma de fazer política. Comecemos, então, pelo momento no qual a ideia de política nasceu. Precisamos considerar que o nascimento da política está diretamente ligado ao nascimento da filosofia e vice-versa. Afirma-se que a filosofia tenha se desenvolvido a partir de uma supera- ção do pensamento mitológico, por meio de um processo gradual, iniciado no século VII a.C. A preocupação dos primeiros pensadores foi explicar a própria natureza, pois este era um dos assuntos predominantes na mitologia. Contudo, rapidamente o direcionamento das questões abordadas muda de foco e surgem as primeiras e grandes questões relacionadas ao ser e agir humano. É o início da reflexão ética e política que permanecem entre as preocupações, discussões e ações humanas. É consensual afirmar que o nascimento da filosofia, enquanto pensamento racional, ajudou a configurar a pólis grega. Bem como a pólis grega interferiu nas configurações da filosofia nascente. É uma relação de influências mútuas. A democratização da escrita, o calendário, o comércio e as trocas culturais com outros povos foram fundamentais para o desenvolvimento da filosofia. Chineses, babilônios e egípcios, por exemplo, não viviam na ignorância, como se pode erroneamente supor, mas tinham muitos conhecimentos práticos, como de astrologia e agrimensura. A Pólis Grega Como Invenção da Política Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 19 Você pode estar se questionando sobre o motivo dos gregos terem sido con- siderados então os pais da filosofia. A resposta vem sustentada pela postura que eles tiveram ao colocar o saber em um lugar central, ao debater sobre os termos que os inquietam, dialogando francamente, compartilhando o saber, colocan- do-o num lugar comum e iniciando a comunidade do conhecimento. O conhecimento é uma construção e a filosofia se faz do diálogo (dia=dois; logos=razão). O diálogo é o embate entre dois ou mais logos que se colocam frente a frente, o melhor embate, no qual não há perdedores, apenas ganhado- res. No método dialético, temos uma tese que fica frente a frente com a antítese e, desse enfrentamento, surge a síntese, a conclusão, o saber constituído, a vitó- ria comum. O logos não é um conteúdo fechado, uma verdade absoluta, mas a capacidade humana, a predisposição para conhecer e exige humildade, a humil- dade socrática de reconhecer a própria ignorância para se abrir à busca pelo conhecimento verdadeiro. O espaço público passa a ser racional, uma nova imagem de mundo é cons- truída em substituição às genealogias míticas. As poleis, cidades, são centradas na ágora (praça pública) onde nasce a razão no coletivo e surgem as leis. Ora, a política, assim como a filosofia grega, se faz no diálogo, as decisões eram deli- beradas em assembleias na ágora. Então, se você estiver se perguntando, se antes dos gregos não havia rela- ções de poder ou política, se as pessoas não se organizavam politicamente, a resposta será sim e não. Sim, existiam relações de poder, existiram grandes impérios, mas o poder era personifi- cado, estava na esfera do privado. Não, as pessoas não se organizavam, elas eram organizadas por outro, havia o predomínio da heterono- mia, a norma era dada e as pessoas obedeciam ou eram punidas. Figura 1 - Acrópole em Atenas, Grécia. Templo do Parthenon A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E20 O âmbito do político inaugurado com os gregos é o exercício da racionali- dade, do diálogo público. Assim, fazer política é falar e um falar com exigências próprias, a saber, a isonomia (igualdade de direitos) e a isegoria (igualdade de direito à fala pública). Politizar é permitir, estimular e exercitar o debate, tem um caráter público e impessoal, assegurando a autonomia do sujeito racional que construirá em conjunto com seus pares as normas comuns. Esperamos que consiga perceber a relevância e a relação direta do nascimento da política com o exercício da racionalidade e do diálogo. A política nasce não como uma organização dada, mas como uma organização construída a partir dos iguais que pensam a realidade e dialogam sobre ela na busca de um consenso. PLATÃO E O INÍCIO DAS REFLEXÕES POLÍTICAS Após abordarmos de forma sintética os aspectos que norteiam o nascimento da reflexão política, vamos destacar alguns pontos relevantes na teoria de um dos mais importantes filósofos gregos, Platão. Para os gregos antigos, a cidadania tinha uma dimensão especial. Uma das piores desgraças que poderia acometer ao indivíduo era perder seus direi- tos de cidadão, estabelecidos nas leis de cidadania. Contudo, há que lembrar que, naquele contexto, as leis de cidadania eram restritas e excludentes. Em Atenas, por exemplo, depois da lei da cidadania promulgada por Péricles, só eram considerados cidadãos os homens que tivessem pai e mãe atenienses. Ficavam excluídos da vida pública estrangei- ros, escravos e mulheres. Ou seja, o número de cidadãos era muito inferior ao número de habitantes da polis. Figura 2 - Dois filósofos gregos (imagem referente à Sócrates segurando o cálice de cicuta, causa de sua morte, e Platão apontando para cima como se fosse o mundo das ideias) Platão e o Início das Reflexões Políticas Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 21 Atribui-se a Sócrates, o início das teorias sobre ética e política, sendo seu pensamento registrado por seu discípulo Platão em forma de diálogos. Cabe lembrar que o pró- prio Sócrates não deixou nenhuma obra autoral, mas seu pensamento aparece em obras de outros grandes pensadores de seu tempo, sendo Platão o mais recorrente como fonte. Platão foi um filósofo grego que viveu entre os anos de 428 e 347 a.C., seu verdadeiro nome era Arístocles. Sua teoria se mistura à de Sócrates nos primeiros escritos, mas ganha um caráter próprio nos escritos posteriores. Para compreender a teoria platônica, qualquer que seja o assunto, precisa- mos conhecer um pouco da estrutura que fundamenta todo o seu pensamento, o dualismo. A concepção de Platão sobre a realidade é baseada em duas dimen- sões distintas, a saber: um mundo concreto, sensível, imperfeito, onde nascemos, crescemos, envelhecemos e morremos; e um mundo separado, inteligível, ideal, perfeito. Os seres humanos, assim como tudo o que existe, são explicados a partir de um dualismo, no caso, corpo e alma, não uma alma no sentido religioso do termo, mas uma alma no sentido inteligível. Segundo o filósofo, o mundo sensível seria uma espécie de cópia imperfeita do mundo inteligível. Para tudo o que existe no mundo sensível, há um conceito perfeito, uma ideia perfeita, no mundo inteligível. A partir dessas duas dimen- sões e da relação entre elas, Platão desenvolve suas teorias sobre o conhecimento, a arte, a ética, a política etc. A teoria política de Platão está concentrada em três grandes obras “A República”, “A Política” e “As leis”. O filósofo desenvolve uma defesa de regime aristocrático de poder. Contudo, tal aristocracia não se fazia pela riqueza, e sim pela inteligência. A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E22 O poder, segundo ele, deveria estar nas mãos dos melhores, ou seja, dos sábios. Esse modelo recebe o nome de sofocracia, (sofo=sabedoria + cracia=poder), onde os homens comuns, de insuficiente conhecimento, deveriam ser governa- dos pelos que se sobressaem pelo saber. O governante seria o Rei Filósofo. Para justificar a organização social e política, o filósofo se utiliza do dualismo cor- po-alma e faz umaclassificação da população a partir das aptidões de sua alma. Segundo Platão, uma cidade perfeita seria aquela onde o governo estivesse sob a responsabilidade dos possuidores de almas de caráter racional, ou seja, os praticantes da filosofia, os mais sábios, classificados por ele, como “almas de ouro”; aos detentores de uma alma de caráter irascível, colérico, caberia a tarefa de proteção da cidade, por serem mais corajosos, são os classificados como “almas de prata”, os guerreiros; já aqueles que tivessem uma alma de caráter concupis- cível, ambicioso, caberia o sustento da cidade, a produção dos bens necessários à sobrevivência, são considerados, então, dotados de “alma de bronze”, os traba- lhadores braçais, seriam agricultores, artesãos, comerciantes, construtores etc. Cada um, de acordo com seu caráter de alma, executaria sua atividade e vive- ria feliz dentro da organização estabelecida segundo suas capacidades. Assim, as classes sociais são estabelecidas não por uma classificação financeira, mas, pelas características e aptidões dos indivíduos. A educação caberia à cidade, havendo uma espécie de dissolução da família. Ao falar do bom governo, sofocracia, Platão exemplifica também o que para ele seriam formas ruins de governo, viciadas, inaceitáveis, injustas: a timocracia, que é o governo dos ambiciosos; a oligarquia; que é o governo dos ricos; a demo- cracia, que é o governo de massas populares despreparadas; e a tirania, que é o governo de um déspota. Todas essas formas seriam contrárias ao governo ideal, o governo do magistrado-filósofo. A cidade só poderia ser boa se seguisse essa forma de organização na qual cada grupo executasse a tarefa correspondente às características de sua alma, de acordo com suas capacidades. O idealismo, muito preponderante na República, abre espaço para outro tipo de abordagem em “A Política” e “As Leis”, onde Platão considera os homens e os governos como eles efetivamente são, desprovidos de toda perfeição da república ide- alizada. Surge, então, a necessidade de uma legislação que sirva como instrumento Platão e o Início das Reflexões Políticas Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 23 educativo, cujo objetivo vai além de punir as transgressões, mas, sobretudo, de evi- tá-las. O objetivo da legislação deveria contemplar a virtude em sua totalidade. Entretanto, apesar olhar de forma mais realista o ser humano e a cidade, Platão não abandona a ideia da cidade ideal como aquela governada pelo sábio, filósofo, como se vê na passagem onde diz: valha, portanto, esta fórmula como a expressão justa de nossa maneira de pensar: que não devemos confiar a menor parcela de autoridade aos cidadãos atingidos, a esse ponto, de ignorância, e que esta lhes deve ser, até, lançada em rosto em que sejam todos eles raciocinadores habilido- sos e afeitos às sutilezas que adornam o espírito e lhe conferem viva- cidade; enquanto os que revelam disposições contrárias a esses deno- minaremos sábios, ainda mesmo, como se diz, que não saibam ler nem nadar, e lhes conferiremos, como a entendidos, os cargos da república. Pois onde não há harmonia, meus caros, como poderá haver prudên- cia, por mínima que seja? Não é possível. Com todo direito, pode-se afirmar que a mais bela e a maior harmonia é a sabedoria mais perfeita, que só ocorre em quem vive segundo a razão (PLATÃO, 689 d.C.). Nas Leis, Platão afirma que o legislador deve legislar a partir da virtude e visar a paz e a harmonia entre os homens, extinguindo ou reduzindo à uma quanti- dade insignificante os casos de injustiça. Segundo ele, o objetivo primacial de nossas leis consistia em deixar os cidadãos tão felizes quanto possível e amigos uns dos outros. Porém não pode ha- ver amizade entre os cidadãos onde pululam os processos e são fatos corriqueiros, as injustiças, mas apenas onde uns e outros são tão raros quanto possível e de quase nenhuma relevância (PLATÃO. 743 d.C.). Na teoria platônica, há uma base ide- alista, que parte de uma definição específica do que seja a realidade e, a partir disto, são colocados os mol- des da melhor forma de se fazer política, segundo Platão. Os pontos trazidos para a leitura têm a intenção de estimular sua reflexão, que poderá resultar na concordância ou discor- dância de alguns aspectos do filósofo. Figura 3 - Atenas Grécia, Platão e Sócrates em frente ao edifício neoclássico da universidade nacional A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E24 Até aqui, caro(a) aluno(a), você pôde perceber que a Grécia foi um lugar fértil para o início dos debates acerca da política. A polis grega tem papel fundamental neste contexto, a partir de Sócrates e Platão a preocupação deixa de ser principal- mente cosmológica e passa a ser antropológica. Dentro deste enfoque, as questões políticas ocupam lugar de destaque e continuarão a ser debatidas pelo suces- sor de Platão, Aristóteles, mas a partir de uma perspectiva totalmente diferente. ARISTÓTELES E A POLÍTICA COMO NECESSÁRIA PARA A REALIZAÇÃO HUMANA Embora tendo estudado na Academia de Platão, Aristóteles foi um daqueles alunos que supera o mestre, analisando e apresentando uma contrapartida para a teoria daquele que fora seu professor. Contrariamente ao idealismo platônico, Aristóteles situa sua teoria na realidade, tanto no que se relaciona ao conheci- mento, quanto às questões políticas. Em sua obra, “A Política”, Aristóteles critica a teoria de Platão por classificá-la impraticável e injusta, diz que a sofocra- cia (governo do sábio) limita o poder, hierarquiza, erradamente, a sociedade e também discorda da dissolução da famí- lia. O governo não caberia mais a um tipo específico de alma, mas a todos os seres humanos que por natureza são, segundo ele, zoon politikon, animal político. Figura 4 - Vista estátua do filósofo e cientista grego antigo de Aristóteles, na Praça Aristotelous, na cidade grega do norte de Tessalônica Aristóteles e a Política Como Necessária Para a Realização Humana Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 25 A razão pela qual o homem, mais do que uma abelha ou um animal gregário, é um ser vivo político em sentido pleno, é óbvia. A natureza, conforme dizemos, não faz nada ao desbarato, e só o homem, de entre todos os seres vivos, possui a palavra. Assim, enquanto a voz indica prazer ou sofrimento, e nesse sentido é também atributo de outros ani- mais (cuja natureza também atinge sensações de dor e de prazer e é capaz de as indicar) o discurso, por outro lado, serve para tornar claro e útil e o prejudicial, e por conseguinte, o justo e o injusto. É que, perante os outros seres vivos, o homem tem as suas peculiaridades: só ele sente o bem e o mal, o justo e o injusto; é a comunidade destes sentimentos que produz a família e a cidade (ARISTÓTELES, 1998, p. 55). O objetivo da vida humana é, para este filósofo, a felicidade e esta felicidade só pode se realizar na polis, não existe uma separação entre ética, enquanto teoria das ações humanas e política. A política faz parte da natureza humana. É evidente que a cidade é, por natureza, anterior ao indivíduo, porque se um indivíduo separado não é auto-suficiente, permanecerá em rela- ção à cidade como as partes em relação ao todo. Quem for incapaz de se associar ou que não sente essa necessidade por causa da sua auto-su- ficiência, não faz parte de qualquer cidade, e será um bicho ou um deus (ARISTÓTELES, 2001, p. 55). Apesar de não considerar a democracia a melhor forma de governo, não há critica com tanta ênfase como a de Platão. Para Aristóteles, o bom governo é aquele que busca o bem comum, a felicidade de todos. Em sua obra há uma ligação neces- sária entre ética e política,pois só é possível a construção de uma cidade feliz se o indivíduo também for feliz, essa é a natureza humana, buscar o bem maior, a felicidade e esta só é possível na relação com os outros. Aristóteles classifica, então, as formas de governo em puras e impuras, boas e más, justas e injustas, levando também em consideração o número como cri- tério de distinção. Cabe lembrar que a justiça só acontece quando prevalece a razão, não as pai- xões. Segundo ele, as constituições justas seriam aquelas que trabalham para o bem comum, entre elas está a monarquia, governo de um só cuidando pelo bem de todos; a aristocracia, governo de um grupo cuidando pelo bem todos e república ou politeia, governo da maioria, cuidando pelo bem de todos. Já, as formas injustas são as aquelas que visam o bem dos governantes em detrimento do bem coletivo, seriam elas, a tirania governo de um buscando o próprio interesse; a oligarquia, A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E26 governo de um grupo bus- cando o interesse próprio e a democracia, comando de uma massa que suprime as diferen- ças em nome da igualdade. A partir dessa classifica- ção, ele aceita a monarquia, a aristocracia e a república como formas boas, mas prefere a última, pois acredita que ela seja a que melhor concilia as diferenças e conflitos entre os grupos sociais. Para ele, a tirania seria a pior forma de governo, pois a polí- tica deve ser o convívio de iguais, mediados pela linguagem, o bem viver juntos. Precisamos, pois, junto com o amigo, perceber também que ele existe e isso acontece no viver junto e no ter comunhão de palavras e de pensa- mento. É nesse sentido que se diz que os seres humanos vivem juntos. Não é a mesma coisa que se declara a respeito dos animais, quando se afirma que eles pastam juntos no mesmo lugar (ARISTÓTELES, 2001, p. 813). A política faz parte da natureza humana, é uma necessidade humana, o homem só é feliz plenamente no convívio com os demais, dessa forma, é necessário que ele exerça seu papel político. FILOSOFIA POLÍTICA NA IDADE MÉDIA Na Antiguidade grega se iniciaram as reflexões sobre ética e política, houve uma grande e significativa produção teórica sobre estes temas. Contudo, nos sécu- los seguintes a reflexão filosófica do problema político pouco avançou. Durante a Idade Média, o pensamento político se ocupou de questões relacionadas ao poder temporal, aquele exercido por governos específicos, e poder espiritual, exercido pela Igreja, deixando de lado a essência do político. Figura 5 - A Escola de Atenas, de Raphael, localizada no Museu do Vaticano Filosofia Política na Idade Média Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 27 Neste período, temos nomes como Santo Agostinho, que na obra “A cidade de Deus”, descreve a cidade dos homens, com características negativas, como corrupção, ambição e orgulho humano e a cidade de deus, fruto do amor divino, que deveria servir de exemplo para as ações políticas; e São Tomás de Aquino que retoma e rea- firma aspectos da teoria aristotélica do Estado como a natureza social do ser humano e a união de muitos, buscando um interesse comum. O governante deveria ser vir- tuoso para seguir de modelo de virtude ao povo que se tornaria virtuoso também. Santo Agostinho nasceu no ano de 354 no norte da África, estudou em Cartago, foi durante muito tempo pagão como seu pai, Patrício, mas se converteu sob grande influência da mãe, Mônica, que mais tarde foi considerada santa. Santo Agostinho se dedicou à oração e ao estudo, escrevendo o número de 113 obras, sem contar as cartas e sermões. Contudo, seu pensamento é construído a partir da ideia de que a humanidade é decaída, deseja voltar para Deus e encontrar Deus seria encon- trar a verdade, veritas. Não havia, segundo ele, realização humana nas coisas terrenas, a verdadeira realização se faria nas coisas transcendentais e não nas coisas temporais. Assim, não havia sentido em viver um grande engajamento político, deixando em segundo plano as coisas espirituais, pois a política trata das organizações temporais. Em sua obra “Cidade de Deus”, “De civitate Dei”, faz a distinção entre a cidade de Deus, que deve ser buscada, e a cidade dos homens que deveria se espelhar na cidade de Deus. Durante a Idade Média, a Europa Ocidental foi marcada pelo poder da Igreja Católica. Nesse momento, destacava-se o conceito de Cristandade, que na falta de um poder político centralizador, determinava aos cristãos seguir as regras e aos princípios da Igreja de Roma. No século XV, alguns intelectuais, como Erasmo de Roterdã, criticaram as deturpações cometidas pela Igreja e apontaram que era preciso que ela te- nha se desvencilhado das questões materiais, como propunham os Evange- lhos. A unidade católica sofre profundas transformações a partir da Reforma Protestante iniciada por Martinho Lutero em 1517. Fonte: a autora. A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E28 A teoria agostiniana coloca as origens da política, não na natureza humana, como víamos na teoria aristotélica, mas na ideia de pecado. Tomás de Aquino, por outro lado, vem fazer uma releitura de Aristóteles reconhecendo a necessi- dade natural do ser humano em se organizar em sociedade. Tomás de Aquino viveu entre os anos de 1225 e 1274, foi um filósofo e frade italiano de grande destaque na Escolástica. Procurava responder suas questões recorrendo à Platão e Aristóteles, mas sempre partindo de uma perspectiva cristã. A teoria política de Tomás de Aquino, apesar de reconhecer Estado como detentor de meios para realizar seus objetivos, o coloca subordinado à Igreja, pois considera esta a mais perfeita por buscar não apenas o bem coletivo natu- ral, mas o bem sobrenatural, o sagrado. A política, da mesma forma que as demais ciências, deveria estar subor- dinada à Teologia. Segundo ele, é na cidade que o cristão vai desenvolver suas virtudes e tais virtudes se desenvolvem na relação com os outros. O exercício da virtude demanda uma vida social. A REVOLUÇÃO DE MAQUIAVEL Nicolau Maquiavel rompe com a visão de mundo sob um viés religioso predo- minante nos séculos anteriores e traz uma nova formulação sobre o problema do Estado. Ele representa uma mudança expressiva, um marco nas teorias políticas, atribuindo a finalidade do Estado a ele mesmo, desvinculando todo e qualquer fundamento exterior ao próprio Estado, como Deus ou a natureza, por exemplo. Maquiavel viveu entre 1468 e 1527, foi um diplomata e conselheiro do governo de Florença, Itália e sua grande obra “O Príncipe”, foi escrita para Lorenzo de Médici. O livro era uma espécie de manual do bom governo para ajudar o prín- cipe quanto à conquista e manutenção do poder. A intenção de Maquiavel era ver a unificação da Itália que estava fragmentada em diversos ducados em um contexto de profunda instabilidade política e ameaças de guerras. A Revolução de Maquiavel Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 29 Você pode imaginar que Maquiavel iria defender um modelo monárquico de poder, pois escreve ao príncipe, para lhe dar orienta- ções políticas. Entretanto, a figura do príncipe não é simplesmente o filho do rei, mas aquele que principia o primeiro cidadão. Maquiavel parte da ideia de uma sociedade corrompida e aposta na ação de um líder político e irá restau- rar a dinâmica da esfera pública. O principado seria, assim, um momento intermediário entre o caos político e a nova república. Já, na carta dedicatória, Maquiavel com- para seus escritos a um presente raro, destaca que o mesmo é fruto da experiência e de muito estudo e avisa que não usará orna-mentos ou floreios, irá direto ao que interessa sem se preocupar em ser agradável, senão por ele mesmo. Durante a obra, são citados vários exemplos, de bons e de maus governos. Maquiavel diz o que se deve e o que não se deve fazer para che- gar ao poder e para torná-lo estável. De maneira geral, as teorias políticas que antecedem Maquiavel tinham um cunho idealista, projetando a sociedade como ela deveria ser. Em sua teoria, contracorrente das filosofias políticas idealistas, o filósofo joga luz sobre as con- dições reais da sociedade, suas limitações, divergências e conflitos. A sociedade é mostrada como realidade dividida por desejos opostos, lutas internas. O Estado é visto como uma instância superior e forte que lhe dá iden- tidade, unidade, e gerenciará as vontades e desejos diversos. Para ele, o objetivo maior da política não é a felicidade comum, mas a tomada e manutenção do poder que permitirá, em certa medida, um bem comum. Segundo ele, os homens não são naturalmente bons, mas, ao contrário, em sua maioria seguem seus interesses próprios e paixões, sendo necessário assim que o Estado leve essa realidade em consideração e, se necessário, utilize de vio- lência para responder à violência, por exemplo. Diferente de Aristóteles, Maquiavel desvincula a ética e política, no sentido em que, segundo ele, a política tem uma moral própria a ela mesma. A virtú de Maquiavel, Figura 6 - Estátua de Nicolau Maquiavel fora da Galeria Uffizi em Florença, Itália A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E30 virtude política e cívica, não pode ser associada ao termo conhecido por todos como virtude. Há uma grande diferença entre esses termos. A virtú busca o êxito na vida política e não mede as consequências dos atos que podem levar a tal êxito. Já a vir- tude, por sua vez, almeja o bem para o homem, ou seja, a ajuda ao próximo. A boa política não deve ignorar os conflitos como se a vida social fosse har- moniosa, mas, preservar o bem comum enfrentando os conflitos existentes. Para tanto, a ação de governar não pode se limitar à ação moral, mas visar a resolução de conflitos. Os valores políticos não estariam preestabelecidos, mas dependeriam das cir- cunstâncias, tanto que a virtú - característica necessária ao governante - exige saber bem agir diante das adversidades da fortuna, usando, se necessário, a força - princi- pal elemento constitutivo do poder - que garante a unidade da sociedade. Assim, o governante, príncipe, para se manter, deve aprender a ser duro segundo a necessidade. Aquele que governa com virtú sabe que, mesmo em tempos de paz, é neces- sário que seu exército esteja formado, para que, se necessário, ele possa resistir. Para Maquiavel, o que importa ao governante não é ser amado pelo povo, mas evitar ser odiado. Maquiavel não admite a ideia de um Estado regulado por fundamentos, sejam racionais ou religiosos, que transcendam as necessidades sociais concretas. Sua defesa é, então, a autonomia da esfera política em relação à todas as outras, espe- cialmente em relação à uma moral constituída e à religião predominante até então. OS CONTRATUALISTAS Durante o Renascimento, séculos XV e XVI, intelectuais e artistas colocam o ser humano no centro de suas preocupações. No século seguinte, os pensadores reafirmam e ampliam essas questões. O contexto histórico do século XVII, na Europa, foi marcado por movimentos significativos que fizeram pensar e repen- sar as questões políticas. Os Contratualistas Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 31 Uma grande preocupação foi compreender a origem do Estado, sua razão de ser, sua validade e fundamento teórico. Destacam-se então nomes como Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau que analisam o caminho que parte do homem em estado de natureza, antes de qualquer sociabilidade e chega na sociedade civil, a partir de contratos estabelecidos. THOMAS HOBBES Thomas Hobbes foi um filósofo e matemá- tico inglês que viveu entre os anos de 1588 e 1679, mesmo sendo de família pobre, con- viveu com a nobreza e pode ter contato com grandes nomes como Descartes e Galileu, é um dos fundadores do empirismo e da teo- ria moderna sobre o Estado. Sua obra política mais célebre é o Leviatã, onde ele parte da ideia que: no estado de natureza, o ser humano é um perigo para ele mesmo, mas o que for para se preservar e se tornar inimigo dos demais, “o homem é lobo do homem” e nesse estado as disputas geram uma “guerra de todos contra todos”. Assim, neste estado, os seres humanos são largados a si próprios e vivem em um ambiente de insegurança e medo, por seguirem apenas sua constituição física e instintiva. Para ele, a solução necessária é o contrato para regulamentar essa con- dição instituindo a ordem. A sociabilidade seria uma condição pós-natureza necessária para a manutenção da própria vida. Os homens deveriam, então, abrir mão de sua liberdade total, transferindo poder a um soberano que por meio do pacto social, feito por todos, estaria legitimado para tomar decisões, evitando a guerra de todos contra todos, se necessário fazendo também uso da força para isso. Figura 7 - Thomas Hobbes (1588-1679) A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E32 Pois graças a essa autoridade que lhe é dada pelos indivíduos no Esta- do, é conferido a ele o uso de tamanho poder e força que o terror assim inspirado o torna capaz de conformar as vontades de todos eles, no sentido da paz em seu próprio país e da ajuda mútua contra os inimigos (HOBBES, 2005, p. 106). A representação do Estado é associada ao Leviatã (um monstro, uma figura que causa medo), na medida em que o Estado é visto como uma instância que pode usar da força para evitar a guerra de todos contra todos. A autoridade, soberania do Estado é legitimada pelo contrato acordado, onde os indivíduos abdicaram de sua liberdade total e transferiram seu poder a essa instância, responsável por garantir o bom funcionamento da vida social. JOHN LOCKE John Locke foi um filósofo inglês que viveu entre os anos de 1632 e 1704. Um dos principais repre- sentantes do empirismo, também se dedicou à reflexões políticas e suas concepções nessa área ajudaram a derrubar o Absolutismo na Inglaterra e a questionar o direito divino dos reis. Como Hobbes, John Locke parte da ideia do estado de natureza, mas discorda que, neste estado, o homem esteja em uma guerra de todos contra todos. Segundo ele, no estado de natu- reza, os homens não se matavam gratuitamente, mas para impor sua vontade, defender ou tomar a propriedade de alguém. De acordo com o filósofo, os seres humanos já nascem com a propriedade de seu corpo e capacidade de trabalho. Assim, tudo aquilo que ele pudesse reti- rar da natureza, por meio do seu trabalho, seria considerado propriedade sua. Porém, no estado de natureza, acabam surgindo disputas e a garantia de suas propriedades básicas não é efetiva, então, os indivíduos se reuniram com comu- nidade para preservar o direito de propriedade. Figura 8 - John Locke (1632-1704). Os Contratualistas Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 33 Assim, a necessidade da criação do contrato da sociedade civil é a instabili- dade pela qual o direito é exercido no estado de natureza, sendo, cada um, juíz de sua própria causa. O contrato social visaria, então, a garantia dos direitos naturais. Para Locke, a criação do contrato institui, a partir do consentimento dos indivíduos, uma autoridade responsável por garantir o direito de todos à vida, à liberdade, à propriedade. Após a instituição da sociedade, seriam definidas as formas degoverno, onde o povo escolheria aqueles que assumiriam as funções administrativas e de governo, mas não abdicariam de seu poder. Assim como a legitimidade do Estado é dada pelos homens e não por Deus, quando o Estado não cumpre suas funções, a sociedade tem o direito de se revoltar contra ele. JEAN-JACQUES ROUSSEAU Jean-Jacques Rousseau viveu entre os anos de 1712 e 1778, nascido em Genebra, viveu e passou parte da sua vida em Paris. Suas obras de maior expressão são Discurso sobre a ori- gem e os fundamentos da desigualdade entre os homens e Do Contrato Social. Ele parte da afirmação de que no estado de natureza os homens são bons, a ideia do bom selvagem, e que a sociedade trouxe escravidão e miséria, por meio de um falso contrato, sendo necessária, então, a criação de um contrato verdadeiro e legítimo, que garanta, sem reserva, todos os direitos. Sua teoria política não tem a pretensão de trazer um modelo ideal de polí- tica que deva ser seguido, mas destacar a necessidade que cada comunidade tem de discutir as questões políticas. Quando então se pergunta qual é o melhor governo, propõe-se uma questão insolúvel e indeterminada; ou ,se se quiser, que possui tantas boas soluções quantas combinações possíveis nas posições absolutas, e relativas dos povos (ROUSSEAU, 1999. p. 83). Figura 9 - Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E34 Segundo Rousseau (1999), o corpo político é comparável ao corpo do homem, estando os dois predestinados a morrer, mas podendo um e outro, pelas escolhas das ações humanas, serem conservados por um longo tempo. O corpo necessita de escolhas saudáveis de alimentação e atividades físicas, por exemplo; o Estado necessita da melhor constituição possível. O princípio da vida política está na autoridade soberana. O poder le- gislativo é o coração do Estado; o poder executivo é o cérebro que põe em movimento todas as partes. O cérebro pode ser atingido pela para- lisia e o indivíduo continuar vivo ainda. O homem torna-se imbecil e vive ainda; mas tão logo o coração deixe de funcionar, o animal perece (ROUSSEAU, 1999. p. 87). A soberania é legitimada pela vontade geral, pela vontade do povo. As leis devem ser garantia da vontade do povo que precisa se reunir regularmente para se fazer ouvir, exercendo, assim, sua virtude cívica. No instante em que o povo está legitimamente reunido em corpo so- berano, cessa toda e qualquer jurisdição do governo, o poder executivo fica suspenso, e a pessoa do último dos cidadãos é tão sagrada e in- violável quanto a do primeiro magistrado, porque onde se encontra o representado deixa de haver o representante (ROUSSEAU, 1999. p. 91). HANNAH ARENDT Hannah Arendt foi uma filósofa alemã, de família judaica, contemporânea de Heiddeger e Jaspers. Durante a segunda guerra mundial, refugiou-se nos Estados Unidos onde se dedicou aos estudos políticos, lecionou e produziu obras como: Entre o passado e o futuro; A condição humana; Sobre a revolução; As origens do totalitarismo; e O que é política? Sua produção teórica é de grande importância e uma questão focalizada por Hannah Arendt é a discrepância entre os preconceitos que temos acerca da polí- tica e a política de fato. Em sua obra O que é Política?, a filósofa escreve sobre a necessidade de avaliar os preconceitos que construímos em meio a partir de Hannah Arendt Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 35 uma perspectiva alienada tanto em caráter local, quanto em caráter mundial. Não devemos, segundo ela, reduzir a política à interesses particulares e à exem- plos de corrupção. O perigo é a coisa política desaparecer do mundo. Mas os preconceitos se antecipam; ‘jogam fora a criança junto com a água do banho’, confun- dem aquilo que seria o fim da política com a política em si, e apresentam aquilo que seria uma catástrofe como inerente à própria natureza da política e sendo, por conseguinte, inevitável (ARENDT, 2011, p. 25). Voltar à Hannah Arendt é sempre muito bom, especialmente nos dias que temos vivido como brasileiros, pois diante de tantos casos como dos nossos represen- tantes que têm feito política nesse país, não devemos abandonar a reflexão sobre o exercício da política. Ao contrário, é preciso enxergar além dos seus descaminhos, é preciso se informar e questionar as informações que nos chegam pela televisão, rádio ou pela internet, é preciso resgatar o caráter verdadeiro da política. Mas, se se entender por ‘político’ o âmbito mundial no qual os homens se apresentam sobretudo como atuantes, conferindo aos assuntos mun- danos uma durabilidade que em geral não lhes é característica, então essa esperança não nos se torna nem um pouco utópica. Na história, conseguiu-se frequentemente varrer do mapa o homem enquanto ser atuante, mas não em escala mundial(...) ( ARENDT, 2011, p. 26). A construção do preconceito contra a política é um projeto de grupos que dese- jam que a população abra mão se seu lugar de participação. É preciso olhar com rigor para os fatos que nos são apresentados, analisando a forma como nos são apresentados. Abandonar nosso lugar de protagonismo na coisa pública não nos inocenta de responsabilidade diante do caos estabelecido. É preciso assumir nos- sas responsabilidades e nosso papel enquanto cidadãos. O modo equivocado como se faz política, em muitas sociedades, tem levado os indivíduos modernos a um distanciamento da ação política. Contudo, ao se abster de seu papel político, o indivíduo permite que o outro faça a má- quina pública trabalhar em prol de interesses privados. A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E36 JOHN RAWLS John Rawls foi um renomado filósofo político estadunidense que viveu entre os anos de 1921 e 2002. Rawls trabalhou o conceito de justiça conectando-a com a moral, a política e a economia. Um dos pontos por ele tratado é a equidade, assunto tomado a partir de uma perspectiva contratualista contemporânea. A questão fundamental na obra de Rawls é responder o que seria uma socie- dade justa. Para tanto, Rawls considera que não podemos tentar responder tal questão a partir da perspectiva em que estamos, pois mesmo que busquemos, o ser humano sempre tem uma preferência para si. Um dos desafios colocados por ele é como gerenciar as múltiplas noções que temos sobre o que seja o bem ou o justo, por exemplo, procurando uma defini- ção que atenda a coletividade sem anular os indivíduos. Cada pessoa possui uma inviolabilidade fundada na justiça que nem o bem-estar de toda a sociedade pode desconsiderar. Por isso, a justi- ça nega que a perda da liberdade de alguns se justifique por um bem maior desfrutado por outros. Não permite que os sacrifícios impostos a poucos sejam contrabalançados pelo número maior de vantagens de que desfrutam muitos. Por conseguinte, na sociedade justa as liberda- des da cidadania igual são consideradas irrevogáveis; os direitos ga- rantidos pela justiça não estão sujeitos a negociações políticas nem ao cálculo de interesses sociais (RAWLS, 2008, p. 4). O trabalho de Rawls é feito sob influência dos contratualistas, mas, o que ele sugere é um contrato hipotético para a definição de quais seriam os valores coletivos que devem substanciar as relações humanas. Para tanto, como já foi dito, as condições pessoais não devem ser suprimidas, mas também não podem interferir na escolha dos valores, juízos e princípios que serão adotados pela coletividade como necessários. Desta forma, Rawls apresenta o conceito de posição originária, que seria compará- vel ao estado de natureza dos contratualistas, com diferenças expressivas, contudo. Na justiça como equidade a situação original de igualdade correspon- de aoestado de natureza da teoria tradicional do contrato social. Essa situação original não é naturalmente tida como situação histórica real, muito menos como situação primitiva da cultura. É entendida como situação puramente hipotética, assim caracterizada para levar a deter- minada concepção de justiça (RAWLS, 2008, p. 14). John Rawls Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 37 A posição originária, segundo ele, seria a libertação dos preconceitos e influências para uma escolha sincera e limpa dos princípios. Nessa posição, os indivíduos não saberiam que papel ou que lugar social ocupariam, na sociedade, o que dei- xaria sua escolha imparcial, uma vez que, se ele não soubesse se seria colocado na sociedade como homem ou mulher, pobre ou rico, por exemplo, não esco- lheria os valores buscando condições que o beneficiassem. Entre as características essenciais dessa situação está o fato de que ninguém conhece seu lugar na sociedade, sua classe ou seu status social; e ninguém conhece sua sorte na distribuição dos recursos e das habilidades naturais, sua inteligência, fora e coisas do gênero. Presumirei até mesmo que as partes não conhecem suas concepções do bem nem suas propensões psicológicas especiais os princípios de justiça são escolhidos por trás de um véu de ignorância. Isso garante que ninguém seja favorecido ou desfavorecido na escolha dos princí- pios pelo resultado do acaso ou pela contingência de circunstâncias sociais. Já que todos estão em situação semelhante e ninguém pode propor princípios que favoreçam sua própria situação, os princípios de justiça são resultantes de um acordo ou pacto justo (RAWLS, 2008 p. 15). A partir dessa condição, seriam então escolhidos, via racionalidade mutuamente desinteressada, os valores basilares da sociedade justa, garantindo igualdade de liberdades básicas para todos. Rawls consente, então, garantidas as condições básicas de igualdade de oportunidade a todos, que existam desigualdades eco- nômicas que recompensem habilidades e trabalhos pelo seu valor relativo. O que devem ser garantidos são os direitos fundamentais de dignidade humana para todas as pessoas, a partir disso, elas podem concorrer e ter suas diferenças. O que ele busca não é uma sociedade padronizada, mas que os homens tenham uma igual dignidade expressa na situação contratual inicial. “Sendo semelhan- tes nesse aspecto, devem ser tratados segundo as exigências dos princípios de justiça. Mas nada disso implica que suas atividades e realizações tenham igual excelência” (RAWLS, 2008, p. 409). Dessa forma, em sua teoria, John Rawls, filósofo liberal, se preocupa com as condições fundamentais da vida humana, defende que sejam garantidas as con- dições necessárias à dignidade humana, sendo a sociedade entendida como um empreendimento cooperativo para o benefício de todos. A POLÍTICA E OS PRINCIPAIS FILÓSOFOS Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E38 CONSIDERAÇÕES FINAIS Parabéns! Você finalizou a primeira Unidade! Vamos recapitular os conheci- mentos adquiridos? Primeiro começamos apresentando o contexto da criação das reflexões políticas relacionando-o à criação da filosofia como modo crítico de pensar e o desenvolvimento das poleis gregas. A abordagem específica de autores como Platão e Aristóteles pode nos dimensionar como a teoria política começou a ser desenhada e nos mostrou as divergências na forma de pensar já nos primeiros teóricos. Uma vez que, Aristóteles, mesmo tendo sido aluno de Platão, discordou do mestre e apresen- tou uma teoria bastante diversa. Pudemos perceber que, durante um longo período da história, as reflexões acerca da política ficaram fora das principais preocupações humanas, que sob a influência da Igreja Católica se direcionaram às questões metafísicas. Depois disso vimos que o contexto histórico do Renascimento e do Iluminismo trouxeram novas teorias políticas que contestaram duramente a atuação polí- tica a Igreja e o direito divino dos reis, devolvendo, ao ser humano, o poder de legitimar a soberania dos governos. Conhecemos, então, um pouco das teorias contratualistas de filósofos como Hobbes, Locke e Rousseau. Também conhecemos o posicionamento da filósofa Hannah Arendt e sua preocupação com o esvaziamento do campo do político. Sua preocupação com os perigos que podem vir com os preconceitos acerca da política e o esqueci- mento da essência do político. Para finalizar, concluímos a discussão trazendo o nome de um filósofo do nosso tempo, John Rawls, que propõe um modelo de política baseado em uma justiça equitativa. Esperamos que esses conhecimentos tenham despertado seu interesse pelas teorias políticas, tão importantes para compreender esse assunto que faz parte da vida de todos nós, uma vez que não vivemos isolados, estamos sempre cons- truindo nossas histórias nas relações. Até a próxima Unidade! 39 1. Depois de conhecer um pouco do pensamento político ao longo da história, diga qual a relação entre o surgimento da filosofia e da política. 2. Aponte a diferença entre o pensamento político de Aristóteles e de seu mestre Platão. 3. De que forma Maquiavel modificou o pensamento político? 4. Relacione algumas semelhanças e diferenças no pensamento político contra- tualista de Hobbes, Locke e Rousseau. 5. Em que medida a preocupação de Hannah Arendt a respeito do pensar a polí- tica pode ser relacionada ao contexto político brasileiro atual? 6. John Rawls apresenta uma teoria contratualista contemporânea. Qual o ponto de partida e intenção da organização política segundo ele? 40 As mulheres no âmbito político Ao falar sobre a questão política, é importante destacar que a maioria das sociedades é marcada pela desigualdade entre homens e mulheres. Tal desigualdade remonta aos tempos da Grécia Antiga e ao conceito de cidadão nas pólis gregas, muitas vezes justifi- cada pela falácia da diferença natural. Ora, se a política nasce como o debate público entre os indivíduos dotados de razão em prol da organização coletiva, não havia justificativa válida para a exclusão das mulheres deste espaço, mas elas foram, durante mais de dois mil anos, proibidas de participar legitimamente das decisões públicas e até hoje não ocuparam efetivamente seu lugar de direito. No mundo ocidental as diferenças entre mulheres e homens começaram a ser questio- nadas mais efetivamente no final do século XVIII e início do século XIX. Grandes nomes da filosofia política anterior, como Rousseau, excluía as mulheres do ideal de liberdade, censurando seu acesso ao espaço público, atribuindo a elas apenas a esfera privada. Mesmo marginalizado, o debate sobre o direito político das mulheres aos poucos foi ganhando força. Uma das primeiras obras sobre esse assunto foi Uma reivindicação dos direitos da mulher publicada em 1792, com autoria de Mary Wollstonecraft. As primeiras reivindicações tinham como centro a educação das mulheres, direito ao voto e igualdade de direitos no casamento. O movimento pelos direitos das mulheres avança pelos séculos seguintes. Sendo o direito ao voto conquistado apenas no século XX. Contudo, mesmo tendo conquistado o direito ao voto, a presença das mulheres nas esferas de poder político ainda hoje é muito pequena. Nas últimas décadas, o debate sobre as demandas feministas têm sido intensificado na busca por uma sociedade onde mulheres e homens tenham chances equivalentes em todos os setores sociais. No entanto, ainda assim, estamos longe deste ideal. O Brasil, especificamente, está ainda mais longe, sendo um dos últimos colocados no ranking internacional. Fonte: a autora. Material Complementar MATERIAL COMPLEMENTAR O ser humano é um ser social Marilena Chauí Editora: Martins Fontes Sinopse: neste volume, Marilena Chaui aborda fi losofi camente um tema que parece familiar e natural: a vida emsociedade. O ser humano é ou não um ser social, gregário? Poderia ele viver isoladamente, sem a interdependência de seus semelhantes? Este livro é mais do que uma tentativa de resposta; é também uma investigação dos pressupostos desse tipo de questão. Filosofi a Política José Antonio Martins Editora: Martins Fontes Sinopse: “Neste volume, José Antônio Martins apresenta momentos centrais da história da refl exão fi losófi ca sobre a Política, iniciando pelo surgimento conjunto da Filosofi a e da Política, na Grécia Antiga, passando pelas contribuições medievais e as transformações modernas, até chegar à contemporaneidade”. O exercício do pensamento é algo muito prazeroso, e é com essa convicção que o convidamos a viajar conosco pelas refl exões de cada um dos volumes da coleção Filosofi as: o prazer do pensar. Ela se destina tanto àqueles que desejam iniciar-se nos caminhos das diferentes fi losofi as, como àqueles que já estão habituados a eles e querem continuar o exercício da refl exão. Também se destina a professores e estudantes, pois está inteiramente de acordo com as orientações curriculares do Ministério da Educação para o Ensino Médio e com as expectativas dos cursos básicos das faculdades brasileiras. E falamos de “fi losofi as”, no plural, pois não há apenas uma forma de pensamento; há um caleidoscópio de cores fi losófi cas muito diferentes e intensas. Comentário: para que amplie a compreensão sobre as teorias políticas, recomendamos a leitura da obra Filosofi a Política que aborda as características fundamentais dessa construção ao longo da história. REFERÊNCIASREFERÊNCIAS ARENDT, H. O que é política? Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998. ARISTÓTELES. Política. [edição bilíngüe] Trad. Antônio C. Amaral e Carlos C. Gomes. Lisboa: Vega, 1998. ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. Brasília: Editora UNB, 2001. HOBBES, T. Leviatã, ou matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil. São Paulo: Martin Claret, 2005. LOCKE, J. Segundo tratado sobre o governo. São Paulo: Martin Claret, 2004. MAQUIAVEL, N. O príncipe. São Paulo: Nova Cultural, 1999. Coleção “Os Pensado- res”: Maquiavel. PLATÃO. A República. 3. ed. Belém do Pará: UFPA, 2000. PLATÃO. Leis e Epinômis. Belém do Pará: UFPA, 1980. RAWLS, J. Uma teoria da justiça. São Paulo: Martins Fontes, 2008. REALE, G. Aristóteles. História da filosofia grega e romana. São Paulo: Loyola, 2007. ROUSSEAU, J-J. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade en- tre os homens. São Paulo: Nova Cultural, 1999. ROUSSEAU, J-J. Do Contrato Social. São Paulo: Nova Cultural, 1987. GABARITO 43 GABARITO 1. A filosofia é uma análise crítica da realidade, o exercício do pensamento que pensa as coisas e pensa a si mesmo. Seu objetivo é reconhecer os limites e pos- sibilidades da faculdade humana de conhecer e explorá-la ao máximo para com- preender o ser humano, sua relação com ele mesmo, com os outros e com o mundo. Nessa perspectiva, ao pensar suas relações, o ser humano inicia a política enquanto teoria e ação crítica, buscando se perceber e se fazer como sujeito au- tônomo, capaz de pensar e determinar as regras necessárias para o bom convívio. 2. A teoria política de Platão partia de uma base idealista e dividia a sociedade por aptidões, deixando a responsabilidade política para um grupo específico, aque- les que se dedicavam ao exercício intelectual. Aristóteles, mesmo tendo sido alu- no de Platão, discorda do mestre e diz que a política está na natureza de todos os seres humanos e que seu exercício efetivo é necessário para que eles se realizem plenamente enquanto tal. 3. Enquanto o pensamento político antigo se preocupava em dizer como a política deveria ser, Maquiavel parte da realidade como ela é. Ele considera uma comuni- dade política corrompida e apresenta conselhos de como governar para restituir a dinâmica da esfera pública com vistas a um governo republicano. 4. Os teóricos Hobbes, Locke e Rousseau desenvolveram suas políticas partindo da ideia de um estado natural e estabeleceram o contrato social como a resolução para os problemas de convivência identificados. Entretanto, as características do estado de natureza e mesmo as finalidades específicas do contrato são di- ferentes nos três pensadores. Para Hobbes, no estado de natureza o homem é lobo do homem e vive em um estado de guerra de todos contra todos, sendo o contrato necessário para garantir a paz entre as pessoas. Locke, por sua vez, não vê no estado de natureza uma guerra de todos contra todos, mas uma situação de insegurança para os direitos fundamentais, o contrato seria necessário para garantir os direitos como vida, liberdade e propriedade privada. Já Rousseau, dizia que no estado de natureza o homem era bom, mas tendo a sociedade o corrompido, seria necessária a criação de um contrato legítimo que devolvesse a paz e garantisse um bom convívio entre as pessoas. GABARITO 5. A preocupação de Hannah Arendt estava no fato das pessoas deixarem de par- ticipar da política devido a um preconceito criado, desconsiderando a essência e a necessidade da mesma. Vemos, no Brasil, atualmente, um modo totalmente equivocado de fazer política, onde o público é colocado à serviço do privado. Tal contexto de crise política e institucional pode gerar duas situações, o descrédito e abandono dos cidadãos no que se refere a vida política ou a tomada de decisão e resgate do papel político para transformar o caos instaurado. 6. O ponto de partida de John Rawls é a hipotética posição originária onde os indi- víduos estariam sob o véu da ignorância e não sabendo que posição ocupariam posteriormente na sociedade, poderiam fazer uma escolha das normas sociais de forma mais justa. A intenção de John Rawls é que os princípios da justiça garantam uma base de direitos de igualdade, liberdade e dignidade para todos. U N ID A D E II Professora Esp. Ana Caroline Rodrigues POLÍTICA E DEMOCRACIA Objetivos de Aprendizagem ■ Compreender qual o objetivo e necessidade das organizações políticas. ■ Entender como se deu a formação do pensamento político moderno. ■ Conhecer qual a finalidade do Estado moderno a partir de concepções políticas liberais e socialistas. ■ Compreender qual a relação entre as revoluções e a construção da democracia moderna. ■ Identificar quais os obstáculos para a efetivação da democracia em nossos dias. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ Qual a finalidade da política? ■ A formação do pensamento político moderno ■ O pensamento político liberal ■ O pensamento político socialista ■ As grandes revoluções e a democracia moderna ■ O que é democracia – o mundo grego/mundo moderno Introdução Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 47 INTRODUÇÃO Olá, caro(a) aluno(a), vamos continuar os estudos! Você já deve ter presenciado conversas sobre política e muitas delas desacreditadas, devido ao contexto que vivemos, cercado de corrupção e impunidade. Contudo, é comum que nesses diálogos, desacreditados ou otimistas, que se julgue a democracia ainda como a melhor forma de governo, pois é a única forma que considera as divergências e os conflitos legítimos e legais, permitindo que sejam trabalhados politicamente para que as relações sociais sejam justas e igualitárias. Desde seu início, na Grécia Antiga, a democracia institui como direitos fundamentais: a igualdade, a liberdade e a participação política, que devem ser garantidos pela lei. Contudo, a regulamentação jurídica formal, por si só não garante a efetividade desses direitos civis. Se o Estado não trabalha para garanti- -los, é necessário que os cidadãos lutem por eles e exijam que sejam cumpridos. A história nos mostra as sociedades, sempre, divididas em grupos. Quem detém o poder quer se manter no poder, em seu lugar de privilégios, assim, os direitos são,sempre, frutos de lutas populares. Por meio dessas lutas, por exem- plo, é que se criou o sufrágio universal, ou seja, o direito de todos os indivíduos serem eleitores e eleitos, independente de serem homens ou mulheres, jovens, negros, trabalhadores, indígenas etc. A essência da democracia consiste não apenas na criação dos direitos, mas na sua garantia. Se esta não parte do Estado, cabe aos cidadãos pressioná-lo para que exerça seu papel. Em sociedades com estruturas não democráticas, é mais difícil a criação e efetivação de direitos universais, pois estes se opõem aos pri- vilégios possuídos por grupos específicos em detrimento de outros. Mesmo nas sociedades legalmente democráticas, a efetividade do exercício da democracia não acontece de forma plena, pois encontra como obstáculos o conflito de interesses característicos do capitalismo e suas consequências. Assim, as lutas populares, sejam em circunstâncias menores ou nas grandes revoluções, têm um papel fundamental para ampliar e efetivar tais direitos, para efetivar uma política democrática. POLÍTICA E DEMOCRACIA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E48 QUAL A FINALIDADE DA POLÍTICA? Você já deve, em algum momento, ter pensado nesta questão. Qual será a finali- dade da política? No contexto atual é preciso escapar do senso comum que afirma que política, assim como religião e futebol, não se discute. De forma geral, a insa- tisfação com o contexto político leva muitos indivíduos a classificarem a política como algo desinteressante, aquém de seu alcance e sempre imerso em corrupção. Entretanto, a política não pode ser vista por este viés reducionista, não podemos deixá-la nas mãos de terceiros, pois ela é parte fundamental da vida de todos. Em todas as sociedades há uma pluralidade de sujeitos e grupos sociais com anseios diferentes e até contraditórios. A política surge como tentativa de nego- ciar o que deve ou não prevalecer. Tal negociação deve ser feita pelo diálogo entre os sujeitos dotados de razão e linguagem. Por meio da política, as pessoas discutem ideias, expõem argumentos e decidem racionalmente o que colocar em prática para o bem geral da comunidade. Aristóteles dizia que faz parte da natureza humana a política e o ser humano só se realiza completamente, quando participa, ou exerce seu papel político, cidadão. Segundo Aristóteles, o homem é um animal político (ARISTÓTELES,1998). Durante os séculos, as teorias políticas se apresentaram como leitura e crí- tica da realidade em questão. Muito se foi pensado, dito e feito. Várias teorias interpretaram de maneira diferente à realidade e apostaram em formas diferen- tes de governo como a ideal. Contudo, quando pensamos em política, hoje, é consensual a busca por um modelo que, ao menos em tese, contemple todos os cidadãos. As teorias contemporâneas buscam pelo ideal democrático de parti- cipação e legitimam o poder pela vontade do povo. A Formação do Pensamento Político Moderno Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 49 Mesmo com suas raízes na Grécia Antiga, a democracia, ainda hoje, não é plena, embora seja considerada, pela maioria, como a melhor forma de governo. Em tese, a democracia é o poder nas mãos do povo, mas na prática ela tem colo- cado o poder nas mãos de quem se organiza. Desta forma, as pessoas precisam se ver como sujeitos políticos para buscarem conhecer e bem executar seu papel social. Abrindo mão de seu papel protagonista, as pessoas autorizam os outros a decidirem em seu lugar, correndo grande risco de não terem suas necessidades atendidas. A política diz respeito à todos os indivíduos e se eles não tomam pra si o seu papel protagonista enquanto cidadãos, não terão suas garantias indivi- duais asseguradas nas relações coletivas e diversas. A FORMAÇÃO DO PENSAMENTO POLÍTICO MODERNO O pensamento político moderno e a nova ideia de Estado surgem da desinte- gração do mundo feudal e da necessidade de reorganizar as relações políticas até então dominantes na Europa. O modelo de organização que prevalecia ante- riormente colocando o poder nas mãos dos senhores feudais, foi, pouco a pouco, sendo desmontado pelas revoltas sociais que começam aparecer e pelo cresci- mento das cidades e do comércio. O Estado Absolutista surge no contexto de expansão do mercantilismo e assume o controle num momento em que se chocavam os interesses dos senhores feudais e da burguesia que ascendia. Em oposição ao Estado Absolutista, surge, posteriormente, o Estado Liberal que o contrapõe, enfocando valores primor- diais, como individualismo, liberdade e propriedade privada. Durante o período chamado de Renascimento, percebemos um retorno ao ideal humano dos gregos, uma libertação do espírito crítico, a substituição da visão teocêntrica de mundo por uma visão antropocêntrica que recolocava o homem no centro das questões filosóficas e artísticas. Politicamente falando, o sistema feudal perde força e emergem movimentos que dão força aos monarcas. POLÍTICA E DEMOCRACIA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E50 Nesse contexto, temos nomes como Nicolau Maquiavel, que já estudamos na uni- dade anterior, Jean Bodin, Thomas Morus e Tomás Campanella. Jean Bodin é um jurista e cientista político, deste período, que se pergunta sobre a finalidade da República bem ordenada e acredita que os governos não devam se apoiar nas armas, mas na legitimidade do poder soberano. Em sua teo- ria, defende o conceito do soberano perpétuo e absoluto representante da imagem de Deus na Terra, a chamada teoria do direito divino dos reis. Ele acreditava ser a monarquia a melhor e mais adequada forma de governo, mas considerava pos- sível um bom governo democrático ou aristocrático. Thomas Morus e o Campanella são considerados utopistas, por criticarem a sociedade contemporânea e idealizarem um modelo que não existia concre- tamente em nenhum lugar. Thomas Morus faz uma grande crítica à monarquia e à sociedade privada e descreve um Estado imaginário, sem propriedade pri- vada, lançando as bases do socialismo econômico. Campanella, por sua vez, propõe, em sua obra “Cidade do Sol”, uma cidade ideal, sem hierarquias, onde cada um trabalharia a partir de uma divisão adequada das funções, sem as ins- tituições que, segundo ele, alimentariam o egoísmo. Muitos traços da teoria de Campanella lembram a cidade idealizada por Platão na República. Em um momento de várias lutas entre católicos e protestantes, o reflexo disto se dava também na política, pois ainda existia a ideia de que a religião do rei era a religião do Estado. Nesse contexto, autores como Hobbes, por exemplo, vão propor o abso- lutismo. A partir da ideia do estado de natureza e do contrato social, que vimos na unidade ante- rior, Hobbes apresenta um contratualismo em favor do poder absoluto do rei (HOBBES, 2005). Já, no Iluminismo, temos outros grandes nomes que trouxeram colaborações importantes para teoria política. Entre eles, Montesquieu, Rousseau, que já conhecemos na unidade anterior, e Immanuel Kant. Pensador de grande importância, Montesquieu, propõe a monarquia constitucional como melhor forma de governo, condenado a monarquia absoluta Figura 1 - Charles Montesquieu O Pensamento Político Liberal Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 51 e a democracia, considerando-as regimes despóticos. Além disso, dá ênfase e amplia a ideia da tripartição dos poderes, iniciada por John Locke, um século antes. Para ele, em todo Estado deve existir os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que trabalhem de forma articulada, equilibrando-se e limitando-se mutuamente, o que não corresponde à separação e independência de poderes que veremos
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