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106 ARTIGO DE REVISÃO Adolescência & SaúdeAdolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 106-113, setembro 2016 RESUMO Objetivo: Realizar um levantamento sobre a sexualidade na adolescência em suas diversas dimensões, relatando a importância da integração entre os serviços de saúde e escola, pais e adolescentes na construção de políticas públicas que assegurem os direitos de saúde sexual e reprodutiva, considerando a realidade de cada jovem. Fontes de Dados: Revisão crítica de literatura com busca nos bancos de dados LILACS e MEDLINE. Foram encontrados 1.972.368 artigos e 12 foram selecionados a partir dos seguintes critérios de inclusão: artigos com texto completo, nos idiomas português, inglês ou espanhol, publicado entre janeiro de 2008 e janeiro de 2014. Síntese dos Dados: Notou-se uma difi culdade dos pais, educadores e profi ssionais da saúde em dialogar sobre a sexualidade com os adolescentes sem tornar o assunto um tabu. A iniciação sexual precoce está associada a uma série de eventos não desejáveis, onde o défi cit no conhecimento de métodos preventivos contribuem para a alta transmissão de doenças sexualmente transmissíveis e para a gravidez. Conclusão: Esses eventos podem ser amenizados com a promoção da saúde, transmissão de conhecimentos sobre os direitos sexuais e reprodutivos e orientações pertinentes quanto ao uso correto dos métodos contraceptivos, tendo a realidade dos adolescentes como base das discussões. PALAVRAS-CHAVE Adolescente, sexualidade, anticoncepção, gravidez na adolescência, educação em saúde. Sexualidade na adolescência: uma revisão crítica da literatura Sexuality in adolescence: a critical literature review Marta Regina Kerntopf1 Josefa Fernanda Evangelista de Lacerda2 Natália Henrique Fonseca3 Emmily Petícia do Nascimento4 Izabel Cristina Santiago Lemos5 George Pimentel Fernandes6 Irwin Rose Alencar de Menezes7 Marta Regina Kerntopf (martareginakerntopfm@outlook.com) - Rua Cel. Antônio Luis, 1161, Pimenta. Crato, CE, Brasil. CEP: 63.100-000. Recebido em 05/12/2014 – Aprovado em 31/05/2015 1Pós-Doutora em Farmacologia. Professora Adjunto do curso de Enfermagem e de Ciências Biológicas da Universidade Regional do Cariri (URCA). Juazeiro do Norte, CE, Brasil. 2Graduanda de Enfermagem da Universidade Regional do Cariri (URCA). Juazeiro do Norte, CE, Brasil. Bolsista da Pró-Reitoria de Extensão (PROEX/URCA). 3Graduanda de Enfermagem da Universidade Regional do Cariri (URCA). Juazeiro do Norte, CE, Brasil. 4Mestre em Bioprospecção Molecular pelo Programa de Pós-Graduação em Bioprospecção Molecular (PPBM). Bacharel em Enfermagem pela da Universidade Regional do Cariri (URCA). Juazeiro do Norte, CE, Brasil. 5Doutoranda em Etnobiologia e Conservação da Natureza pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). Recife, PE, Brasil. Mestre em Bioprospecção Molecular pelo Programa de Pós-Graduação em Bioprospecção Molecular (PPBM). Bacharel em Enfermagem pela Universidade Regional do Cariri (URCA). Juazeiro do Norte, CE, Brasil. 6Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Caicó, RN, Brasil. Professor Adjunto da Universidade Regional do Cariri (URCA). Juazeiro do Norte, CE, Brasil. 7Pós-Doutorado em Bioquímica e Toxicologia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Santa Maria, RS, Brasil. Doutor em Química pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Belo Horizonte, MG, Brasil. Professor Adjunto da Universidade Regional do Cariri (URCA). Juazeiro do Norte, CE, Brasil. > > 107Kerntopf et al. SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA: UMA REVISÃO CRÍTICA DA LITERATURA Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 106-113, setembro 2016Adolescência & Saúde na adolescência. Esta fase da vida é vista como sendo complexa, onde vários fatores a tornam de difícil entendimento e cheia de confl itos5. A adolescência é um dos problemas que mais desafi a as políticas de desenvolvimen- to no Brasil e na América Latina, tornando-a alvo de estudos por diversos pesquisadores das áreas de saúde, cultura, cidadania e educação2. O Ministério da Saúde (MS), pautado no docu- mento de "Direitos Sexuais e Direitos Reproduti- vos: uma Prioridade do Governo” lançou o “Mar- co Teórico e Referencial: Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva de Adolescentes e Jovens”, docu- mento que agrega os marcos nacional e interna- cional acerca da saúde sexual e reprodutiva dos jovens, assim, como a garantia de seus direitos6. A garantia dos direitos à saúde sexual e re- produtiva dos adolescentes são parte integrante dos direitos humanos e envolvem o exercício da vivência da sexualidade sendo relevante na construção da igualdade de gênero e da auto- nomia, implicando nas práticas sexuais seguras e na contracepção de escolha7. O objetivo da saúde sexual não está limi- tado a aconselhar e dar assistência relativa à re- produção e às DSTs, mas também à melhoria das relações pessoais e à qualidade de vida, ou seja, preparar os adolescentes para a fase adulta e possibilitar as refl exões sobre determinadas si- tuações inseridas em seu contexto6,8. INTRODUÇÃO Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a adolescência compreende o período que abrange dos 10 aos 19 anos, sendo esta fase caracterizada pelas inúmeras transformações so- cioculturais, biológicas, emocionais e físicas1. A adolescência é considerada como uma fase de transição e de mudanças, principalmente emo- cionais, físicas e socioculturais. Diante disso, vê- -se a necessidade de políticas que assegurem os direitos sexuais e reprodutivos dos adolescentes, assim como a educação sexual. Dentre estas mudanças, destacam-se as questões relacionadas à sexualidade e suas transformações psicológicas e corporais relativas à puberdade2. A adolescência é encarada como uma fase marcada por excentricidades e difi cul- dades, também como fase de maturação, de in- teração e inserção social, onde há a aquisição de autonomia e tomada de decisões 3. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacio- nais (PCN), a sexualidade é defi nida como algo indispensável ao homem e à mulher, assim como à vida e à saúde. E se expressa de forma natu- ral no ser humano sendo marcada pela cultura, história, crença religiosa e ciência, além dos sen- timentos que singulariza cada indivíduo4. A se- xualidade é tida como um meio de comunicação entre as pessoas, onde sofre a infl uência de expe- riências e informações recebidas, principalmente > ABSTRACT Objective: Conduct a survey on adolescent sexuality in its various dimensions, reporting the importance of integration between health and school services, parents and adolescents for the construction of public policies that ensure the rights of sexual and reproductive health, considering the reality of each adolescent. Data Sources: Critical literature review with search on the LILACS and MEDLINE databases. Were found 1,972,368 articles and 12 were selected through the following inclusion criteria: full text articles, in languages Portuguese, English or Spanish, published between January 2008 and January 2014. Data Synthesis: But, it was noted the diffi culty of parents, educators and health professionals in talking about sexuality with adolescents without turning the issue into a taboo. Early sexual initiation is associated with a number of undesirable events, where the defi cit of knowledge about prevention methods contributes to a higher incidence of sexually transmitted diseases and pregnancy. Conclusion: These events can be mitigated with health promotion, transmission of knowledge about sexual and reproductive rights and relevant guidelines for the correct use of contraceptive methods, having the teenager’s reality as a central base for the discussion. KEY WORDS Adolescent, sexuality, contraception, pregnancy in adolescence, health education. > > 108 Kerntopf et al.SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA: UMA REVISÃO CRÍTICA DA LITERATURA Adolescência & SaúdeAdolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p.106-113, setembro 2016 A Educação Sexual é um processo que ocorre de modo amplo e pode ser informal e assistemático ou, ainda, formal e intencional9. Diante disso, deve ser baseada no contexto so- cial, econômico, cultural e religioso de cada ado- lescente, tendo como base a promoção à saúde e a prevenção de DSTs e gravidez indesejada4. Geralmente, é nessa fase que ocorre o iní- cio da vida sexual10 onde é crucial a conscien- tização e o esclarecimento de dúvidas acerca da sexualidade ou questões relacionadas a essa temática afi m de evitar as práticas sexuais des- protegidas e suas consequências. O desafi o na regulação da sexualidade está no aprendizado e na interiorização dos assuntos relacionados aos métodos contraceptivos8. A problematização referente a iniciação sexual precoce é recorrente na literatura da demografi a e da saúde coletiva, apoiando- -se ainda nos argumentos médicos relativos ao momento ideal para a primeira gravidez e à vulnerabilidade dos jovens às DST/HIV11. Estudos mostram que o inicio precoce das práticas sexuais entre os jovens e as mu- danças relacionadas ao aumento da ativida- de sexual estão associadas ao uso, ou mau uso, de métodos contraceptivos e às suas consequências, como vulnerabilidade à gra- videz e às DSTs, destacando a ligação com consumo de álcool e o uso do cigarro2, 12, 13. A utilização de métodos contraceptivos e de proteção são práticas sociais e assimétricas de gênero, bem como de classe e raça/etnia, as quais são modeladas por normas sexuais e con- traceptivas prescritas a partir de vários discur- sos da religião, da medicina e da educação11. As práticas contraceptivas na iniciação sexual são diversifi cadas entre os países, mas que não ex- cluem desigualdades entre os grupos sexuais11. Este trabalho objetiva contribuir com uma revisão narrativa crítica da literatura disponível acerca da sexualidade na adolescência em suas diversas dimensões, abordando-a no contexto biopsicossocial, econômico, cultural e religioso dos adolescentes. Este visa ainda, relatar a im- portância da agregação entre as áreas de saú- de, educação e social na construção de políticas públicas para assegurar os direitos de saúde se- xual e reprodutiva, considerando a realidade de cada jovem. METODOLOGIA A presente pesquisa é uma revisão crítica de literatura que apresenta caráter descritivo- -discursivo, dedicando-se à apresentação com- preensiva e à discussão de temas de interesse científi co no campo da Saúde Pública. Para dar início as buscas de artigos foram utilizados os seguintes bancos de dados: Biblio- teca Virtual de Saúde (BVS), Literatura Latino- -Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e a MEDLINE. Foram utilizados os Des- critores em Ciências da Saúde (Decs): adoles- cência, sexualidade, contracepção, gravidez na adolescência e educação em saúde. A partir dos referidos Decs, buscou-se por artigos que correspondessem aos objetivos pro- postos pelo estudo, aplicando os seguintes crité- rios de inclusão: artigos em texto completo, nos idiomas português, inglês ou espanhol, publica- do entre janeiro de 2008 e janeiro de 2014. Foram encontrados 1.972.368 artigos utili- zando o formulário de pesquisa avançada, asso- ciando as Categoria Decs com o idioma,o país, ano de publicação. Após a aplicação dos crité- rios de inclusão do total de artigos encontrados, 12 foram selecionados A partir de então os da- dos foram organizados, analisados e discutidos, levando à conclusão efetiva do trabalho. RESULTADOS E DISCUSSÃO Nas análises dos artigos pode-se observar que a adolescência é marcada pelas caracterís- ticas sexuais, às quais desenvolvem processos psicológicos, físicos e de identifi cação. É consi- derada como a fase crucial do desenvolvimento e maturação do homem e a transição da depen- dência dos pais à autonomia14, 15. > > 109Kerntopf et al. SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA: UMA REVISÃO CRÍTICA DA LITERATURA Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 106-113, setembro 2016Adolescência & Saúde Com isso, o risco de vulnerabilidade au- menta, carecendo de atitudes integradas de pais e setores da educação e saúde, sendo esta uma parceria oportuna para alcançar os jovens em maior proporção10. No entanto, apesar dos inúmeros investimentos em programas de saúde e educação, os indicadores de saúde mostram que ainda são grandes as lacunas entre os direi- tos, as condições de bem-estar dos adolescen- tes16 e o desenvolvimento de atividades educati- vas e preventivas na escola ainda17. Mesmo assim, as ações realizadas em con- junto são relevantes quando visam incentivar a troca de experiências, as tomadas de decisões em relação aos comportamentos de saúde e doença, e a orientação quanto aos métodos contraceptivos e de prevenção de gravidez e de DSTs que devem ser usados13. Educação em saúde É na adolescência que a sexualidade deve ser entendida e discutida como construção cul- tural, e o seu exercício implica em conhecimen- tos e aprendizados advindos de novas concep- ções, valores e atitudes, que variam de acordo com cada grupo2. Por isso, o seu exercício deve ser pautado em conhecimentos e diálogos entre jovens-pais-setores interdisciplinares, resultando em práticas sexuais responsáveis, e a utilização de anticoncepcionais refl ete positivamente na taxa de fecundidade e proteção às DSTs/HIV8. Ainda, a vivência da sexualidade envolve aspectos amorosos e de desejos relacionados à afetividade, à saúde, à satisfação e ao prazer, que estão inseridos na construção da identidade e na afi rmação dos valores religiosos, culturais e sociais6, 15. Instituições nacionais e internacionais têm reconhecido a importância da atenção e da educação preventiva e a orientação sexual para adolescentes2, tendo em vista a necessidade de educar para a saúde, considerando os aspectos envolvidos na construção de hábitos e atitudes no dia a dia4. Um dos desafi os das políticas nacionais de saúde e reprodutiva do adolescente é a construção e a im- plementação de ações que assegurem a ampliação do conhecimento sobre o corpo, sexualidade e saú- de por adolescentes e jovens, com vista a maior au- tonomia e vivência da sexualidade de forma segura, prazerosa e saudável, em todos os níveis de atenção, e com o envolvimento dos diversos sujeitos- gestores nacionais, estaduais, municipais e sociedade civil organizada (Ministério da Saúde, 2006)6. A saúde sexual permite aos indivíduos expe- rimentar uma vida sexual segura e informada que se baseia na autoestima, implicando numa abor- dagem da sexualidade de forma positiva6. Assim, a participação intersetorial é relevante para o monitoramento sobre a saúde dos adolescentes, contribuindo para a reformulação de currículos e programas voltados para esta população2. A educação em saúde apresenta-se como uma estratégia fundamentada no processo de transformação de comportamento, mediada por práticas educativas que exaltem a autono- mia os sujeitos na condução de sua vida18. Porém, pais, educadores e os serviços de saúde não estão preparados para lidar com a temática devido à falta de qualifi cação e trei- namento adequado5,15. Outra questão é o des- conforto dos educadores em trabalhar com a educação sexual, esbarrando nos tabus e mitos, nas questões religiosas, nos sentimentos e nos valores morais, que abrem espaço para a trans- missão de informações errôneas19. Os profi ssio- nais da saúde também não estão habilitados, na maioria das vezes, para atender as demandas desse público alvo, criando situações de distan- ciamento que difi culta a difusão do conheci- mento e a troca de experiências8. A escola representa um dos espaços de apoio, presença e socialização dos adolescen- tes envolvidos nessa abordagem temática19. As atividades elaboradas neste espaço, assim como em outros locais, devem considerar os contextos social, econômico, cultural e emocional dos jo- vens13, assim como sua interferência holística no desenvolvimento dosalunos5. Diante desses fatos, atribui-se importân- cia ao desenvolvimento de projetos educativo- -preventivos na escola que ofereçam subsídios à 110 Kerntopf et al.SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA: UMA REVISÃO CRÍTICA DA LITERATURA Adolescência & SaúdeAdolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 106-113, setembro 2016 formação de atitudes e valores que diminuam as situações de riscos e vulnerabilidade dos adoles- centes17. Assim, faz-se necessário uma interação mais profunda entre escola, família e comunida- de, além do respaldo de profi ssionais habilitados em saúde e assistência social, para atender às carências e necessidades da construção de um jovem cidadão18. Adolescência e contraceptivos É sabido que a iniciação sexual ocorre ge- ralmente na adolescência 5, 20 e a adoção de contraceptivos e práticas sexuais responsáveis não são notórias. Esse fato torna-se preocupante uma vez que a primeira relação sexual entre os jovens tem ocorrido cada vez mais cedo4 e as- pectos socioculturais têm contribuído para essas atividades acontecerem precocemente5, 21. O conhecimento dos métodos contracepti- vos pelos jovens não garante o seu uso nem indi- ca que haverá mudanças em seus comportamen- tos. No entanto, o maior entendimento sobre a importância de tais métodos predispõe uma con- duta auto protetora e minimizadora de riscos. A maioria dos métodos contraceptivos que estão no mercado pode ser utilizado pelos ado- lescentes, sendo os mais indicados a camisinha, anticoncepcionais oral ou injetável10. O preser- vativo masculino é usado como o método de primeira escolha por oferecer dupla proteção: evitar a gravidez e as DSTs6, e é quase universal entre meninos e meninas16. Incluindo os anti- concepcionais orais, estes métodos são os mais conhecidos e utilizados16, 17 e o não uso constitui um marcador da relação sexual de risco2. Dentre os meios de obteção de informação sobre sexualidade, DSTs e gravidez na adoles- cência ressalta-se a mídia 17 e as revistas femi- ninas. Muitas das lacunas que poderiam ser preenchidas pelos pais, normalmente são sana- das por relatos de vivência e troca de dúvidas com outros jovens11. A falta de conhecimento ou a inadequação do conhecimento sobre os con- traceptivos atuam como fator de resistência ao uso destes14. Mesmo com tantas informações disponí- veis sobre os métodos, alguns estudos apontam para adolescentes que ainda os desconhecem16, mostrando a difi culdade ou a falta de acesso de muitos jovens à informação e aos serviços que atendam às suas necessidades de saúde sexual e reprodutiva14. Uma pesquisa realizada no semi- -árido nordestino corrobora com a afi rmação aci- ma onde 18% dos adolescentes afi rmaram nun- ca ter visto ou mesmo nunca ter ouvido falar em preservativo masculino, evidenciando que uma parcela consideravel de adolescentes não tomam cuidados preventivos nas relações sexuais10. Contudo, deve-se discutir acerca da iniciação sexual entre os adolescentes considerando a se- xualidade desse grupo em um contexto socio- -histórico2 sabendo que o inicio precoce está ligada à tendência secular do início precoce da puberdade22, e "a iniciação sexual parece não se tratar de uma iniciativa individual e autônoma11". Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde dos Escolares (PeNSE)2 , em um estudo sobre a saú- de sexual de adolescentes , 30,5% dos adoles- centes já tiveram relação sexual alguma vez na vida, sendo a maioria meninos. Outra pesquisa realizada com 369 adolescentes de ambos sexos experientes sexualmente, mostrou que 84,8% utilizaram preservativo na primeira relação se- xual. Dentre estes jovens, 50,4% relataram o uso da anticoncepção de emergência, apontan- do como razões para seu uso o esquecimento, a insegurança e as falhas em relação aos métodos contraceptivos utilizados23. A frequência do uso de preservativos na última relação foi maior entre os meninos e o elevado uso de método para evitar gravidez foi maior entre o sexo feminino2. Ressaltando que a utilização do preservativo requer a cooperação e a concordância de ambos os parceiros e está associada a idade, à época da iniciação sexual e a conduta do parceiro11. No entanto, foi cons- tatado que o relacionamento afetivo é o princi- pal determinante quanto ao uso ou não uso dos contraceptivos, agravados pelas imposições que os papeis gêneros determinam em suas relações afetivos-sexuais8. Essa diferença de gênero pode 111Kerntopf et al. SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA: UMA REVISÃO CRÍTICA DA LITERATURA Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 106-113, setembro 2016Adolescência & Saúde ser estimulada pelos pais quando incentivam a sexualidade masculina como forma de afi rmar identidade de masculinidade, reprimindo a fe- minina, reforçando a importância da virgindade e do envolvimento emocional11. Pesquisas nas capitais brasileiras revelam que a idade da primeira relação sexual foi entre 13 e 14 anos, predominantemente2. Relacionan- do a precocidade das atividades sexuais24 com o grau de escolaridade, nota-se que que quanto maior a escolaridade, mais tardio será o início da atividade sexual e da vida conjugal16. "O grau de escolaridade é fator de proteção para questões relacionadas à sexualidade e à prática sexual10". Autores concordam que o baixo grau de escolaridade infl uencia na utilização de métodos contraceptivos ou diminuem as chances de um adolescente usar métodos na relação corrente8, 14. Portanto, na relação escolaridade-contracep- ção: "quanto maior o grau de escolaridade do jovem, maiores são as chances de utilização de algum método tanto na primeira relação sexual quanto nas subsequentes14". Os fatores sociais, culturais e emocionais infl uenciam a ocorrên- cia de gravidez não planejada e não desejada na adolescência, sendo considerada de risco, perigosa, inapropriada e inadequada para os in- teresses dos jovens, onde as jovens, na grande maioria, apresentam baixo nível socioeconômi- co e baixa escolaridade 12, 25. A gravidez é um problema de saúde pú- blica, passível de ocasionar alterações na vida social, econômica, afetiva e familiar, limitando o trabalho ou estudo da adolescente ou provo- cando alterações psicológicas, sobretudo quan- do falta apoio fi nanceiro e afetivo do parceiro e da família13. Essas alterações interferem na qua- lidade de vida e podem levar à interrupção de projetos e/ou da própria vida26. Para as adolescentes grávidas, a gravidez é tida como elemento de identifi cação social, que exige mudança de comportamento de forma radical e está mais frequente nas populações de baixa renda. Contraposta, a sociedade se mostra pseudopermissiva, permitindo e estimulando a ati- vidade sexual das adolescentes, proibindo porém, a gravidez precoce, como se a capacidade reproduti- va pudesse ser analisada de uma forma separada e independente da sexualidade14. Com o crescente número de gravidez e de DSTs é necessário a efetivação dos programas educacionais voltados aos jovens, de maneira que a educação em saúde não se torne um desa- fi o quando referida à aprendizagem efetiva dos adolescentes acerca de hábitos seguros de vida e atitudes corretas. Educar é analisar o contexto biopsicosociocultural que envolve o indivíduo, levando-o a formação de identidade, e de pre- paro para o convívio na cidadania4. CONCLUSÃO Dessa maneira, é possível notar o quão re- levante se faz as ações voltadas a esse grupo, de uma forma que pode associar as assistências ne- cessárias à qualidade de vida sexual segura, pro- tegida e saudável. Com tudo isso, os métodos contraceptivos mais utilizados por esse grupo e suas relações afetivas são de suma contribuintes para a formação da personalidade do adolescen- te responsável em que as práticas realizadas por ele serão de menor risco, não interferindo o seu projeto de vida. Nota-se ainda que as entidades governamentais ainda têm difi culdade para a implantação das ações voltadas à sexualidade na adolescência, justifi cada pelosprofi ssionais que alegam a falta de habilitação e preparo pe- los próprios serviços, seja de saúde ou educação. Contudo, pode-se observar que a sexuali- dade deve ser vivenciada por todos, já que que é algo que nasce com indivíduo e ocorre até o fi m da vida. Dessa maneira, as informações e o conhecimento pelos jovens acerca da temática deve ser trabalhada com intuito dessa fase ser vi- venciada de forma saudável e responsável, além de se redescobrir e experimentar o novo sem o medo de ser punido pela sociedade ou estar vul- nerável às DSTs e à gravidez. Visto que o início precoce da vida sexual apresenta vários riscos aos adolescentes, os programas educativos são indispensáveis, quer > 112 Kerntopf et al.SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA: UMA REVISÃO CRÍTICA DA LITERATURA Adolescência & SaúdeAdolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 106-113, setembro 2016 sejam em ambientes escolares ou nos serviços de saúde. Assim, a educação em saúde visa proporcionar aprendizagem dos conteúdos re- levantes da sexualidade, como também, des- pertar os questionamentos sobre as atitudes e tomadas das decisões que infl uenciam na redu- ção dos riscos. É relevante a transmissão de informações quanto ao uso dos métodos contraceptivos e é importante que estas alcancem todas as classes sociais e todas as regiões, sem desigualdades, visto que todos estão expostos à gravidez inde- sejada ou as DSTs, desde que mantenham práti- cas sexuais não saudáveis. É preciso investir na educação sexual, não somente para a orientação quanto as práticas sexuais, mas para incentivar à conscientização de manter uma vida com atitudes responsáveis, preparando os jovens para uma sociedade em que os julgamentos ainda serão preconceituosos. Contudo, o tema sexualidade na adoles- cência ainda é considerado como tabu, onde os mitos e as questões religiosas assumem um papel importante quanto a adoção e a utilização dos métodos anticoncepcionais pelos jovens. No entanto, o início da vida sexual, a falta de pro- teção e responsabilidade dos jovens e suas con- sequências, infl uenciam a nova conduta desse grupo, onde as adolescentes grávidas são as que mais sofrem nesse processo. A gravidez como problema de saúde públi- ca implica na vida da jovem, impossibilitando ou difi cultando a inserção no mercado de trabalho ou a continuação de seus estudos. Em vista, é preciso implantar ações que auxiliem as jovens grávidas a continuarem o seu projeto de vida, apesar com algumas mudanças, incentivando- -a a terminar os estudos ou desenvolver alguma prática laboral. Portanto, é responsabilidade dos pais, dos profi ssionais da saúde e da educação a orienta- ção sexual dos jovens, para que as ações reali- zadas tenham como perspectiva o desenvolvi- mento do indivíduo jovem, conscientizado das práticas seguras de sexo para que estes sejam responsáveis pela prevenção dos riscos. NOTA DE AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a Pró-Reitora de Extensão (Proex) da Universidade Regional do Cariri (URCA) pelo suporte fi nanceiro e a Fun- dação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científi co e Tecnológico (FUNCAP) pela conces- são de Bolsa. > REFERÊNCIAS 1. Portela NLC, Albuquerque LPA. Adolescência: fontes de informações sobre métodos contraceptivos. Rev Enferm UFPI. 2014;3(1):93-9. 2. Malta DC, Silva MAI, Mello FCM, Monteiro RA, Porto DL, Sardinha LMV, et al. Saúde sexual dos adolescentes segundo a pesquisa nacional de saúde dos escolares. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(Suppl 1):147-56. 3. Silva ACS, Moreira RM, Teixeira JRB, Sales ZN, Boery EN, Nery VAS. 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