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Os Estados Unidos, a China e a hegemonia global

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Os Estados Unidos, a China e a hegemonia global
Doutrina
Elaborado em 07/11/2020
Resumo: O presente artigo é fruto de uma pesquisa bibliográfica qualitativa que busca demonstrar como os Estados Unidos, por meio de seu povo, demonstra não mais ter interesse na hegemonia global alcançada no Século XX e como a China, apesar da coesão interna, não deve ter o sucesso que almeja. 
Palavras chaves: Direito Internacional, hegemonia global, Estados Unidos, China, geopolítica
1. Introdução 
Durante a história da humanidade, vários países estiveram no papel de maior potência econômica e militar. As potências, historicamente, buscam a hegemonia por meio da criação de impérios, subjugando povos mais fracos e estendendo seus territórios por meio da guerra e da conquista. Ademais, em geral, combinam as políticas citadas com a tática de, em relação há alguns países, não simplesmente conquistar militarmente, mas por meio de sua superioridade impor acordos assimétricos que garantem vantagens em relação ao país mais fraco, sem necessariamente precisar mobilizar uma campanha militar. Foi o que ocorreu, por exemplo, na relação do Império Romano com Israel, que de jure era considerada nação amiga, mas de facto era um povo subjugado.
	No século XX, a combinação de fatores como, duas guerras mundiais, esgotamento da capacidade financeira do Reino Unido e do esfacelamento de sua estrutura imperial, da sua localização geográfica privilegiada e de riquezas e dinamismo econômico acumulados desde sua fundação os Estados Unidos alcançaram, junto da antiga União Soviética, a hegemonia financeira e militar no mundo. Contudo, pela primeira vez os países que disputavam esse status estavam ancorados em modelos político-econômicos tão diversos. De um lado, os E.U.A, eram uma democracia liberal e economia de mercado e, de outro lado, A União Soviética era uma ditadura de partido único e economia planificada pelo Estado.
	Pela primeira vez, ao contrário do que ocorrerá entre Roma e Grécia, Reino Unido e França, Alemanha e França, Rússia e Japão, as potências em disputa não entraram numa guerra direta. Deu-se início à Guerra Fria, o mundo se tornou o campo de batalha entre comunismo e capitalismo, essa disputa tomava corpo nas lutas internas dentro dos países no qual cada lado era patrocinado, ou pelos E.U.A, ou pela U.R.S.S. 
	A disputa entre a União Soviética e os Estados Unidos, apesar de intensa, não durou nem meio século. O lado comunista acabou por cair devido ao esgotamento do seu modelo econômico, que não pôde sustentar os altos gastos do Estado na sua luta contra o capitalismo. Em 1991, o império vermelho se esfacelou, os países que o compunham se tornaram independentes e capitalistas, o poderio militar ficou, majoritariamente, com a nascente República Russa que embora, por isso, tenha nascido no posto de segunda maior potência militar do mundo, não podia se impor, uma vez que sua economia estava em ruinas. 
	No curso da Guerra Fria, no entanto, os norte-americanos criaram seu novo rival. A China, que após uma sangrenta guerra civil se tornou uma ditadura de partido único e economia planificada, tal como a União Soviética, após a morte de seu ditador personalista e fiel ao programa revolucionário marxista, Mao Tse-Tung, caiu nas mãos de um pragmático que revolucionou o país. Deng Xiaoping, viu na liderança de Lee Kuan Yew à frente de Singapura um modelo melhor a ser seguido. Sendo assim, Xiaoping abandonou a economia planificada e adotou a economia de mercado. Nesse diapasão, os E.U.A viram nisso uma oportunidade de democratizar a China, uma vez que Xiaoping abandonou o comunismo, mas não a ditadura do Partido Comunista Chinês. A ideia dos americanos era simples, investir o máximo possível na China crendo que a prosperidade trazida pelo capitalismo iria, mais cedo ou mais tarde, gerar uma abertura política. 
	A China, sob a liderança de Deng Xiaoping enriqueceu bastante, ao ponto de ser tornar a segunda maior potência econômica do Planeta. Entretanto, a liderança do PCC continuou firme. Por fim, no início do século XXI os países já estavam notando o que mais tarde o governo chinês tornou meta de governo nº 1, o desejo da China é desbancar os Estados Unidos e alcançar a hegemonia econômica e militar do mundo antes de 2050. É nesse contexto que se dá essa pesquisa, demonstrando que, de fato, a hegemonia americana está no fim, exceto se ocorrer uma mudança total no rumo das decisões do governo americano, e demonstrando também que embora esteja com o caminho pavimentado, a China não vai alcançar seu maior objetivo geopolítico, salvo se mudar os rumos das decisões de seu governo. 
2. Os Estados Unidos da América
	Quando Tocqueville (2004), se propôs viajar aos Estados Unidos para analisar de perto as estruturas sociais daquele país onde a liberdade, ao contrário do que ocorria na França, reinava relativamente suprema, seu veredicto foi no sentido de que a grande característica americana que garantia a prosperidade, segurança jurídica e estabilidade política era o fato de que o poder e as estruturas sociais e políticas da américa foram constituídas de baixo para cima. 
	Como saliente Scruton (2019), nos Estados Unidos sempre foi nítida a separação entre o Estado e a sociedade civil. Em decorrência disso, a sociedade americana sempre foi um exemplo vivo do que Burke (2014) acreditava ser a essência dos povos livres e estáveis, uma sociedade firmada na confiança e convivência local, onde os membros da comunidade estão unidos pelo respeito aos costumes. Segundo Neto e Tasinafo (2006), os colonos americanos chegaram no continente e se estabeleceram em comunidades autônomas firmadas no sangue e fé, essa foi a tônica da formação dos Estados Unidos. Católicos numa região, calvinistas em outras, anglicanos numa porção de terra e Metodistas em outras. A Lei é o costume, tal qual no Reino Unido, a coesão social vem de famílias com parentescos comungando da mesma fé. A ideia era simples, cada homem é responsável por seu sustento e pelo sustento de sua família, o indivíduo é responsável pelo seu sucesso ou fracasso. Nas comunidades calvinistas, a mentalidade puritana de muito trabalho e poucos gastos ajuda a prosperidade chegar.
	O Estado, estava longe demais e por demais desinteressado, a liberdade era grande, quer os colonos queiram ou não, o interesse do Estado Inglês só vem mais tarde, junto da ambição de parasitar o que os colonos construíram sozinhos. A segurança e jurisdição na américa colonial era predominantemente privada. A ordem legal na colônia era mantida por contratos e por cooperação e a ideia Lockeana de apropriação original garantiu também o respeito a um princípio nítido de verificação de quão legítima era uma propriedade privada da terra. A partir daí, vemos uma clara distinção da mentalidade americana e a mentalidade inglesa, sobretudo a mentalidade do governo inglês, o colono via seu território como a terra da liberdade e trabalho árduo, firmados na teoria dos direitos naturais e na legitimidade dos contratos, já o rei inglês via a terra em que ele jamais pisara como seu domínio legal, parte constituinte do seu reino na qual ele, embora não ajudou a prosperar, tinha direito aos impostos e a obediência dos súditos. Essa diferença de cosmovisão não deixava dúvidas que o confronto não tardaria acontecer, como está muito bem sintetizado na seguinte obra: 
Por outro lado, os colonos trouxeram da Europa uma outra coisa. Lá, a transição do feudalismo para o absolutismo real não apenas sofrera a oposição da aristocracia, mas também era confrontada, em termos teóricos, pela filosofia dos direitos naturais – a qual se originou da filosofia escolástica. Conforme essa doutrina, o governo era considerado um ente contratual, e todo agente governamental, inclusive o rei, estava sujeito, assim como todo mundo, aos mesmos direitos e leis universais. Mesmo que posse ter sido o caso em tempos anteriores, essa situação certamente não mais se encontrava entre os reis absolutos modernos. Os monarcas absolutos eram usurpadores dos direitosdo homem e, portanto, ilegítimos. Portanto, uma insurreição não só era permitida, como também se tornara um dever sancionado pelo direito natural. (...) Impregnados pela doutrina dos direitos naturais, incentivados e encorajados pela distância do rei inglês; e estimulados ainda mais pela censura puritana da ociosidade, do luxo e da pompa reais, os colonos americanos levantaram-se para libertar-se do domínio britânico. Como Thomas Jefferson escreveu na Declaração de Independência, o governo é instituído para proteger a vida, a liberdade e a busca da felicidade, baseando a sua legitimidade no consentimento dos governados. Em contraste, o governo real britânico alegou que podia tributar os colonos sem o consentimento deles. Se o governo não faz o que ele foi projetado para fazer, declarou Thomas Jefferson, “é o direito do povo modifica-lo ou suprimi-lo e instituir um novo governo, o qual será fundamentando e terá os seus poderes organizados nos princípios e nas formas quem sejam os mais prováveis de garantir a segurança e a felicidade das pessoas.” (Hoppe, 2014, p. 308/309) 
A ideia dos chamados “pais da pátria americana” era simples, constituir um governo civil que não estivesse disposto tão somente a parasitar a riqueza que, com muito esforço, constituíam. Para constituir um governo não parasitário, os fundadores dos E.U.A elaboraram uma constituição com o claro intuito de limitar o governo a, exclusivamente, segurança e justiça. Importante notar que, ao contrário de uma ideia muito comum na Europa, nunca se vislumbrou que o Estado americano tivesse o monopólio da segurança, pois os fundadores viam nisso uma grande ameaça, uma ameaça mais perigosa que o rei inglês, já que a partir do momento em que o Estado monopolizasse as armas, não haveria como se defender desse Estado caso ele se tornasse tirânico, essa é a razão principal da 2ª emenda da Constituição Americana garantir o livre porte de armas e o direito inalienável do povo constituir milícias privadas para não deixar que a estrutura governamental garantisse, sozinha, a segurança pública.
No início do século XX, pode-se afirmar com certeza que apenas dois países fora da Europa podiam ser denominados de potências militares e econômicas, estes eram os Estados Unidos e o Império do Japão. Ao se libertarem do julgo da Coroa Britânica os E.U.A, durante seu primeiro século e meio de existência pautaram-se, como aponta Hoppe (2014), pelo respeito à propriedade privada e liberdade econômica no campo da economia e no campo social pela descentralização política da crescente nação. O resultado desse tripé principiológico proporcionou um enorme período ininterrupto de prosperidade financeira que gerou também, de fato, uma aprofundada desigualdade social.
Kriwaczek (2018), descreve como a desigualdade é filha de um mercado livre e eficiente, em sua obra “Babilônia: A Mesopotâmia e o nascimento da civilização”, ele nos mostra que os primeiros impérios construídos pela humanidade passaram por um processo que se iniciava numa economia mais fechada e simples na qual a imensa maioria das pessoas eram iguais, mas igualmente pobres. Essa economia cresce na medida em que um poder político vai se sobrepondo a poderes locais, unificando povos e criando as primeiras cidades, esses primeiros centros urbanos impulsionam as pessoas, sobretudo aquelas que se cansaram da miséria camponesa, a tentar um padrão de vida melhor, essa tentativa é totalmente ancorada em suas habilidades, não há ajuda e muito menos garantias por parte do governo imperial que se limita a recolher impostos para proteger e expandir fronteiras. A própria jurisdição é exercida, num primeiro e longo momento, pelos religiosos. Nesse arranjo, o império expande e enriquece, tal enriquecimento e poder aumenta o apetite do soberano.
A prosperidade dos primeiros impérios aumentou o desejo dos soberanos de centralizar o máximo de poder possível. Ao constituir um império, a força militar centralizadora precisa de aliados, para tal o primeiro grupo que eles seduziram nos primeiros impérios mundiais foram os sacerdotes. Além do grande poder que a religião tinha na antiga Babilônia e Assíria, havia também muito poder concentrado nos chefes das cidades, no início do império babilônico, por exemplo, o rei não podia ir à guerra sem o apoio dos anciãos. Ao comentar um trecho da Epopeia de Gilgamesh, Paul Kriwaczek salienta que:
Isso é uma epopeia literária, não história, embora possa refletir um conflito real entre Uruk e Kish, uma cidade situada uns 150 quilômetros a noroeste. O texto foi escrito tanto tempo depois dos acontecimentos que pretende descrever quanto o intervalo decorrido entre os dias do rei Arthur e sua Távola Redonda e os nossos. E, tal como os romances arturianos, ele diz bem mais sobre a época em que foi escrito do que sobre a era que descreve. Ainda assim, fornece um vislumbre distante de um momento na história de Uruk, quando ela se deslocou aos palcos da Idade da Pedra para a Idade dos Metais (a “forja dos deuses”), quando passou do que Thorkild Jacobsen chamou de democracia primitiva, na qual o governante ainda tinha que consultar o povo ( a “assembleia reunida dos anciãos de sua cidade), para a monarquia e autocracia, quando o governante fazia o que bem entendia, sem referência à opinião de mais ninguém, e da coexistência pacífica para um estado constante de belicosidade agressiva (“vamos à guerra”). (KRIWACZEK, 2018, p. 70/71)
Desde a Antiguidade vemos que os impérios começam com Estados contidos, economias livres e, na medida em que prosperam, o Estado se estende, cria burocracias e regulações, assume um caráter econômico cada vez mais intervencionista e daí vem a estagnação e, posteriormente, a queda do referido império. Babilônia, Assíria, Egito, Grécia, Roma e o Império Britânico são exemplos do até aqui explicado, a única exceção é a antiga União Soviética, da qual falaremos mais adiante. 
Os Estados Unidos, nos mostram cada vez mais que estão fadados ao mesmo caminho de fracasso dos impérios que o antecedeu. O primeiro século e meio da história americana nos mostra um Estado contido, uma economia livre e pujante e uma sociedade desigual, porém próspera. Tal fato suscita a questão, qual problema em haver desigualdade social se os mais pobres vivem uma trajetória de constante aumento de sua prosperidade? Os políticos do fim do segundo século da existência americana já começaram a enxergar a desigualdade como um problema, ou talvez vissem apenas uma maneira de angariar votos e poder político. Já no fim do século XIX percebia-se que o Governo Central dos Estados Unidos estava insatisfeito com o tamanho de seu poder. Uma amostra da vontade do governo da União expandir seu poder foi a criação do Banco Central Americano, o FED, em 1913, algo inimaginável para os “Pais Fundadores”.
A partir do fim do século XIX o governo americano vai paulatinamente expandindo seu poder de intervenção na economia, também no ano de 1913, o Congresso Americano aprova a instauração de um imposto de renda a ser cobrado pela União. Nesse período, o governo inicia legislações regulatórias sobre vários mercados, como o das ferrovias e telecomunicações. Contudo, foi por intermédio do New Deal que o governo americano abandona totalmente as premissas do Estado Liberal e dá início a um governo que cada vez mais expande a dívida pública, aumenta impostos e expande regulações. Importante notar, que essa virada da perspectiva governamental de seu papel na vida social e econômica da América contraria totalmente o texto e espírito da Lei Maior dos E.U.A, sobre isso escreve o historiador e economista Murray Rothbard:
 
Certamente, a tentativa mais ambiciosa de impor limites ao Estado foi a Carta dos Direitos e outras partes restritivas da Constituição dos Estados Unidos, na qual limites escritos ao governo se tornara a lei fundamental a ser interpretada por um judiciário supostamente independente dos outros ramos do governo. Todos os americanos são familiares ao processo pelo qual a construção dos limites na Constituição temsido inexoravelmente relaxada durante o século passado. Mas poucos foram tão precisos como o prof. Charles Black em notar que, nesse processo, o Estado transformou largamente o próprio recurso judicial, de um dispositivo limitador a outro instrumento que concede legitimidade às ações governamentais. Pois, se um decreto judicial de “inconstitucionalidade” é um poderoso limitador ao poder do governo, um veredito implícito ou explícito de “constitucionalidade” é uma arma poderosa para promover a aceitação pública de um crescente poder governamental. (ROTHBARD, 2019, p. 44/45)
Rothbard (2019), explica como o New Deal feriu frontalmente a Constituição dos Estados Unidos e como o processo que o declarou o programa legal revelou a falha na ideia de dar a uma Corte Constitucional a palavra final em relação a constitucionalidade dos atos do governo. Sendo a Lei Maior incompatível com o programa intervencionista e assistencialista do presidente Roosevelt, a Lei Maior deveria mudar ou o programa ser vetado pela Suprema Corte. Entretanto, o que se viu foi o então presidente ameaçar aumentar o número de juízes da referida corte, caso ela não “estuprasse” a Carta Magna para declarar legitima uma ideia ilegítima. Depois de uma intensa batalha, o governo conseguiu o que queria e sem nenhuma mudança no corpo da Constituição foi declarada a constitucionalidade do New Deal. Sobre o problema da interpretação final da Lei Maior ser monopólio de uma corte constitucional, cabe salientar:
Pois, sendo a Constituição Brasileira um documento escrito, formulado em determinado período temporal por uma Assembleia imbuída por meio do voto democrático de registrar o que o povo, soberanamente, quer que sejam as características básicas de seu Estado Democrático, cabe ao guardião da Lei Maior aplicar o que ela determina. Mas tendo seu guardião a palavra final, o que ocorre se uma corte constitucional como o STF determinar que a Constituição diz o completo oposto do que está devidamente registrado? Nesse caso, a Constituição deixaria de ser um documento escrito por representantes eleitos para se tornar a vontade política de uma maioria de ministros da corte constitucional. Se a Constituição deixar de ser um documento escrito por representantes eleitos, num determinado momento histórico, para se tornar a vontade política de uma maioria de ministros de uma corte constitucional, essa corte deixaria de ser um ente técnico do Poder Judiciário para se tornar um ente político usurpador do Poder Executivo e do Poder Legislativo. As decisões dessa corte certamente fariam tombar a independência dos demais poderes e não se poderia falar em democracia com um poder quase absoluto em mãos não eleitas. Em termos comparativos, numa realidade como essa o que se chamaria de corte constitucional seria, na verdade, uma estrutura similar ao Politburo do Partido Comunista Chinês. Na China, país governado por uma oligarquia comunista, existe o Partido Comunista Chinês, esse não é o único partido permitido, mas os outros existem por permissão deste que detêm o monopólio da máquina pública. Contudo, não é o partido que governa, quem governa é a cúpula desse partido, um órgão com cerca de 11 membros (mesmo número de membros que o Supremo Tribunal Federal do Brasil) chamado Comitê Permanente do Politburo, esse órgão concentra o poder Executivo, Legislativo e Judiciário na China e embora tecnicamente exista uma Constituição Chinesa, o poder, de facto, se encontra nas mãos desse órgão que faz com que a Lei Maior seja o que ele quer que ela seja. (FERNANDES, 2020) 
Ademais, o que se vê é que a Revolução Americana seguiu o destino de todas até o momento na história da humanidade. Nas palavras de Jouvenel (2010, p. 295), “Não é para o homem, é para o poder que são feitas, em última análise, as revoluções”. O filósofo afirma ainda:
Vimos ao longo de toda história criar-se uma concentração de poderes em benefício de um personagem, o Estado, que dispõe de meios cada vez mais amplos, que reivindica da comunidade direitos cada vez mais extensos, que tolera cada vez menos poderes existentes fora dele. Ele é comando e quer ser o principio organizador da Sociedade, monopolizar sempre mais completamente esse papel. (JOUVENEL, 2010, p. 297) 
Hoje, segundo Hoppe (2014), o Estado americano expropria todos os anos, em impostos, de 35% a 40% dos bens dos seus cidadãos, o governo tem o direito, caso queira, de criar regulamentações para qualquer setor e, por meio de sansões, impedir qualquer empresa americana de fazer negócios com outros países. Hoje, já se fala em criar um sistema de saúde estatal nos Estados Unidos e, além disso, a América tem a maior dívida externa do planeta. Embora, tenha um déficit público gigantesco, os E.U.A gastam todos os anos mais de 600 bilhões de dólares em defesa e todos esses dados nos revelam o porque aumenta cada vez mais o número de jovens que deixam o ensino superior e não conseguem um emprego, ou conseguem um emprego para o qual não seria necessário cursar uma faculdade.
Os Estados Unidos seguem o caminho dos impérios apontados por Jouvenel (2010), os impérios começam com Estados contidos e que vai se expandindo, ao longo do tempo, em forma de tributação, regulações e tamanho da burocracia. Para que os E.U.A interrompam sua derrocada como maior potência mundial, eles precisam retomar suas origens libertárias. 
3. A China
Enquanto a história americana pode ser resumida como uma incessante busca pela liberdade, que está sendo sabotada pelo Estado. A história da China pode ser resumida como a de um povo que nunca, de fato, conheceu a liberdade. Com tal afirmação não quero dizer que as coisas na China sempre foram como se encontram hoje. Certamente, apesar de tudo, os chineses da era imperial viviam com mais liberdade que seus descendentes, embora em meio a mais pobreza. Mas é preciso dizer que toda humanidade, no passado, se encontrava numa situação de miserabilidade incomparável com a prosperidade dos dias atuais, só que enquanto o resto do mundo evoluiu em liberdade no tocante a muitas áreas da vida, os chineses viram sua prosperidade material aumentar enquanto sua liberdade diminui.
A História convencional, bem como todo o restante das Ciências Sociais mainstream, costumam afirmar que a história do homem segue uma linha constante de aumento da liberdade individual. Eles afirmam sem titubear que o ser humano é hoje incomparavelmente mais livre que o humano de outras eras. Nada poderia ser mais falso, como salienta Jouvenel (2010), podemos afirmar com certeza que do ponto de vista legal o homem alcançou liberdade plena, mas que na prática essa afirmação não é tão verdadeira. 
Muitos se perguntam o que possibilitou fenômenos como Hitler, Stalin, Mao, Mussolini e outros tiranos que conseguiram controle quase absoluto sobre seus povos. A verdade é que nenhum rei absolutista chegou perto do controle exercido pelos tiranos que surgiram no século XX, antes do absolutismo então, inimaginável que um homem tivesse tanto poder sobre outros. No feudalismo os impostos eram contidos e ancorados no costume, impostos novos só poderiam surgir por tempo determinado e após a concordância dos homens livres, serviço militar obrigatório era um devaneio, bem como a existência de exércitos regulares. O rei não podia legislar, não havia leis novas, a lei era imutável e alcançava a todos, incluindo o próprio monarca.
As presas e as garras que ele faz então sentir desenvolveram-se durante a estação democrática. Ele mobiliza a população, mas foi em período democrático que se impôs o princípio da obrigação militar. Ele capta riquezas, mas deve a democracia o aparelho fiscal e inquisitorial que utiliza. O plebiscito não daria nenhuma legitimidade ao tirano se a vontade geral não tivesse sido proclamada fonte suficiente da autoridade. O instrumento da consolidação, que é o partido, originou-se da competição pelo Poder. A disciplina dos espíritos desde a infância foi preparada pelo monopólio, mais ou menos completo, do ensino. A apropriação pelo Estado dos meios deprodução é preparada na opinião pública. O próprio poder policial, que é o atributo mais insuportável da tirania, cresceu a sombra da democracia. O Antigo Regime mal o conheceu. A democracia, tal como a praticamos, centralizadora, regulamentadora e absolutista, mostra-se, portanto, como o período de incubação da tirania. Foi graças à inocência aparente, a qual ele atribuiu ao Poder, que este ganhou a amplitude cuja medida nos foi dada por um despotismo e uma guerra sem precedentes na Europa. Supondo que Hitler sucedesse imediatamente à imperatriz Maria Teresa (1717-1780), teria ele podido forjar tantos instrumentos modernos de tirania? Não era preciso que os encontrasse preparados? (JOUVENEL, 2010, p. 34/35)
Quando a China resolveu fechar-se para o mundo, não tinham ideia de como isso terminaria mal. Segundo Neto e Tasinafo (2006), a China se tornará um país dividido para atender a interesses de potências externas. O que país, graças a anterior política isolacionista, não dispunha de meios militares para resistir ao Reino Unido e outras potências, à monarquia restou o papel de colaboracionista, fechar os olhos para a predação e parasitagem para manter-se no poder. Dizia Sun Yat-Sem: “de que país a China é colônia? É colônia de cada país com quem firmou um tratado, e todos os países que têm um tratado com a China são seus donos. Assim, a China não é somente escrava de uma nação e sim escrava e colônia de todas as nações.” 
Os nacionalistas, sob a liderança de Sun Yat-Sem, depuseram a monarquia colaboracionista firmes na visão de um China unida, republicana e com um renovado orgulho nacional. Não podemos deixar de citar o período no qual a forte oposição dos senhores da guerra locais à ideia do governo nacionalista aproximou nacionalistas e comunistas pela unificação e, não podemos também, esquecer da disputa pelo poder entre os dois grupos que, interrompida pela Segunda Guerra e invasão do Japão, voltou após a derrota do inimigo comum e durou até os nacionalistas serem expulsos da China continental para a Ilha Formosa. 
 O governo de Mao Tse-Tung foi um dos mais tirânicos possíveis e marcado por fracassos econômicos. Contudo, como explicar sua morte natural no poder? O bom e velho populismo aliado ao mais implacável estilo “dividir e conquistar”. Marxista convicto e fiel, tratou de afastar do governo qualquer mente sensata que enxergava que a fidelidade de Mao ao comunismo estava matando as pessoas de fome. Mao rompeu com a U.R.S.S quando viu que seus novos líderes denunciaram a tirania de Stalin, Mao tinha medo que o mesmo destino esperasse sua imagem após sua morte, hoje vemos que seus temores eram perfeitamente fundados. 
Não há como deixar de registrar o que salta os olhos, ao falarmos dos E.U.A percebemos que o protagonismo do Estado foi crescendo e que no início não havia outro protagonista que não a sociedade civil. Na China, o Estado sempre foi protagonista e não há muito o que se falar a respeito da, sempre tutelada, sociedade chinesa. Mao morreu e chegou ao poder Deng Xiaoping, junto dele a liberdade econômica para que os indivíduos enriquecessem a si mesmos e ao país, mas nem assim a liberdade plena chegou, a tutela estatal não cessou e o maior exemplo disso certamente foi o “Massacre da Praça da Paz Celestial”. 
Não se pode negar, o que fez a China prosperar foi sua política de liberalismo econômico na década de 80 e 90. Outra aliada do crescimento econômico chinês foi a determinação do Partido Comunista Chinês em não permitir que ocorra novamente uma ditatura personalista, isso é, centrada na figura de uma pessoa, a ideia era de constituir uma ditadura puramente institucional, na qual o Partido detêm o poder e o governo é limitado a um período. Porém, com a chegada no poder de Xi Jinping as coisas mudaram completamente. 
Segundo Gil (2017) e Jabbour (2018), Xi Jinping, atual presidente da China, está demolindo aquilo que Deng Xiaoping construiu a duras penas. Xi, tem trocado a descentralização pela centralização politica e o liberalismo pelo intervencionismo econômico. E aqui não podemos deixar de notar o ponto que une Estados Unidos e China, ambas, nesse momento, assistem o agigantamento do Estado, seja no campo social como no canto econômico. E o que vimos a respeito de impérios e agigantamento estatal? O segundo é o prelúdio do fim do primeiro.
4. CONCLUSÃO
Os cidadãos americanos parecem não ter mais interesse na hegemonia global, a América está mais desunida do que nunca, os últimos anos e a eleição de Joe Biden deixam essa realidade bem clara aos olhos do mundo. Ao darem a vitória a Biden os americanos escolheram mais impostos, mais regulações, sistema público de saúde, contínuo aumento dos gastos militares e públicos em geral. A não ser que mudem sua trajetória para que voltem a perseguir a liberdade que as primeiras gerações de norte-americanos tanto amavam e almejavam, os Estados Unidos estão fadados a terminar este século como uma potência decadente, tal qual ocorreu com o Reino Unido no início do século XX. 
A China moderna é fruto da guerra, do nacionalismo e centralização enquanto Estado, por outro lado, no que tange a prosperidade econômica a China é fruto da liberdade para o individuo crescer e enriquecer por conta própria e conectado ao resto do Planeta Terra. Contudo, em pouquíssimo tempo a oligarquia chinesa já abandona sua fé naquilo que os transformaram na segunda potência militar e econômica em tão pouco tempo. Se o PCC prosseguir trilhando o caminho de Xi Jinping, vão assistir atônitos o agigantamento estatal desmantelar tudo o que construíram em tempo menor do que levaram para construir a obra magnifica, em termos econômicos, que construíram no século passado. 
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BURKE, Edmund. Reflexões sobre a Revolução na França; tradução, apresentação e notas de José Miguel Nanni Soares – São Paulo: Edipro ,2014.
GIL, Tamara. Os princípios políticos de Xi Jinping para transformar a China em uma superpotência global. In: BBC.com, São Paulo, outubro de 2017. Disponível em: < https://www.bbc.com/portuguese/internacional-41689224 > Acesso em 07/11/2020
HOPPE, Hans-Hermann. Democracia: o deus que falhou. Tradução de Marcelo Werlang de Assis. – São Paulo: Instituto Ludwig Von Mises, 2014.
JABBOUR, Elias. Xi Jinping, a "China recentralizada" e a "nova formação econômico-social". In Brasil de Fato, Brasília, março de 2018. Disponível em: < https://www.brasildefato.com.br/2018/03/12/xi-jinping-a-china-recentralizada-e-a-nova-formacao-economico-social> Acesso em 07/11/2020
JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural do seu crescimento; tradução Paulo Neves – 1 ed. – São Paulo: Peixoto Neto, 2010. 
KRIWACZEK, Paul. Babilônia: a Mesopotâmia e o nascimento da civilização; tradução Vera Ribeiro. – 1 ed. – Rio de Janeiro: Zahar, 2018.
NETO, José Alves de; TASINAFO, Célio Ricardo. História Geral e do Brasil – São Paulo: HABRA, 2006.
SCRUTON, Roger. Conservadorismo: um Convite à Grande Tradição; tradução de Alessandra Bonrruquer. – 1ª ed. – Rio de Janeiro: Record, 2019.
TOCQUEVILLE, Alexis de. A democracia na América: leis e costumes. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

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