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Bioética APRESENTAÇÃO Seja bem-vindo! O estudo da bioética propõe um intercâmbio disciplinar entre diversos ramos do conhecimento, por exemplo, Direito, Filosofia, Ciências Biológicas, Ciências da Saúde, etc. A bioética estuda as relações de administração do avanço das ciências e as implicâncias morais que o progresso da ciência pode trazer. Dentro dessa investigação encontra-se a legitimidade moral de experimentos com células-tronco, do aborto, da eutanásia, da fertilização in vitro, da clonagem, entre outros. Não é somente dentro da relação entre os humanos que a bioética é evidente, é possível citar como exemplo os alimentos transgênicos e quanto eles impactam na biodiversidade. Nesta Unidade de Aprendizagem, você irá estudar o conceito de bioética e sua questão principiológica. Verá também como é estabelecida a questão do progresso da ciência e de implicações morais dentro da abordagem da clonagem humana e das células-tronco. Você vai conhecer ainda a Lei de Biossegurança. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Explicar o que é bioética e seus princípios. • Demonstrar as discussões acerca da clonagem humana e das células-tronco.• Identificar a Lei de Biossegurança.• DESAFIO A bioética tem como objetivo o enfrentamento de questões éticas/bioéticas que surgem no cotidiano das sociedades. Sem a análise desses conceitos, dificilmente alguém conseguirá enfrentar algum dilema, um conflito e se posicionar diante deles de forma ética. Por exemplo, a descriminalização da cannabis sativa (maconha), tanto para o uso medicinal quanto para a recreação, podendo ser encontrada em farmácias e em pequenos cultivos domésticos. Se a análise for a partir do prisma que o malefício que a droga traz é exclusivo ao seu usuário, por que motivos ela deve ser criminalizada? Não seria antiética a sua criminalização? A partir dessa situação hipotética responda: Quais os benefícios e malefícios que uma eventual descriminalização das drogas, especificamente a cannabis sativa (maconha neste caso), traria para a sociedade? Justifique sua resposta. INFOGRÁFICO A clonagem é um dos assuntos mais sensíveis na sociedade. Muitas das questões que envolvem o tema estão atreladas a valores morais, influenciados por valores religiosos, sem, contudo, enfrentar o verdadeiro debate que é sobre melhorar a vida das pessoas. Veja mas sobre este asunto no Infográfico a seguir. CONTEÚDO DO LIVRO O estudo da bioética contempla um intercâmbio interdisciplinar entre vários ramos do conhecimento: Direito, Medicina, Filosofia, Psicologia, etc. A bioética busca racionalizar o avanço da ciência com as questões morais em uma sociedade em determinado tempo. Desse modo, depara-se com a clonagem e os estudos com células-tronco embrionárias, por exemplo, o que implica o choque com diversos valores morais com alta carga de religiosidade. Esse conflito acaba por esbarrar no Estado, resultando em medidas, como a Lei de Biossegurança do Brasil. Para saber um pouco mais, leia o capítulo Bioética, do livro Ética geral e jurídica. Boa leitura. ÉTICA GERAL E JURÍDICA Willian Gustavo Rodrigues Revisão técnica: Gustavo da Silva Santanna Bacharel em Direito Especialista em Direito Ambiental Nacional e Internacional e em Direito Público Mestre em Direito Professor em cursos de graduação e pós-graduação em Direito Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin CRB -10/2147 E83 Ética geral e jurídica [recurso eletrônico ] / Willian Gustavo Rodrigues... et al.; [revisão técnica: Gustavo da Silva Santanna]. – Porto Alegre: SAGAH, 2018. ISBN 978-85-9502-456-4 1. Direito. 2. Ética. I. Rodrigues, Willian Gustavo. CDU 17:34 Bioética Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar o que é bioética e os seus princípios. Discutir a respeito da clonagem humana e das células-tronco. Explicar a Lei de Biossegurança. Introdução O estudo da bioética propõe um intercâmbio disciplinar entre diversos ramos do conhecimento, como, por exemplo, Direito, filosofia, ciências biológicas, ciências da saúde, entre outros. A bioética estuda as relações de administração do avanço das ciências e as implicâncias morais que o progresso da ciência pode proporcionar. Dentro dessa investigação, encontramos a legitimidade moral de experimentos com células-troncos, do aborto, da eutanásia, da fertilização in vitro, da clonagem, entre outros. A bioética é evidente não apenas na relação entre os seres humanos, a exemplos dos alimentos transgênicos e do seu impacto na biodiversidade. Neste capítulo, você vai ler sobre o conceito de bioética e a sua questão principiológica. Vai ler, também, sobre o progresso da ciência e as implicações morais dentro da abordagem da clonagem humana e das células-tronco. Além disso, vai conhecer a Lei da Biossegurança em detalhes. O que é bioética? A discussão acerca da bioética está em voga em nossa sociedade desde a década de 1970, devido ao avanço das ciências, que se choca com os valores morais estabelecidos em determinadas sociedades. Mas, de fato, o que é bioética? Para entendermos o seu conceito, devemos analisar, em primeiro lugar, a sua origem epistemológica. A bioética deriva de duas palavras gregas: bios, que signifi ca “vida”, e ethos, relativo à ética. A Ecyclopedia of Bioethics defi ne C07_Bioetica.indd 1 24/05/2018 17:09:34 bioética como um estudo sistemático da conduta humana dentro das ciências biológicas e ciências da saúde, sendo essa conduta examinada à luz de princí- pios morais, em uma relação de interdisciplinaridade entre os ramos do saber. As pesquisas biomédicas têm evoluído cada vez mais e buscado avanços na qualidade de vida dos indivíduos. Contudo, esses avanços, em muitos casos, entram em conflito com os valores morais estabelecidos, causando, ainda que por um preconceito enraizado na sociedade, espanto em muitas pessoas, como no caso de clonagens, eutanásia, aborto, experimentos em seres humanos, e até mesmo em questões de gênero, como a transexualidade. A centralidade dessas discussões encontra fundamento principalmente den- tro dos estudiosos do Direito. O Direito, enquanto mecanismo para harmonizar as relações sociais e para a busca do justo, procura refletir o seu papel dentro dos avanços da ciência. Será que o Direito possuiria o direito de intervir nos estudos e avanços das ciências, determinando o seu limite? A dificuldade em responder à questão está na velocidade com que a ciência avança, a qual não é compatível com a velocidade necessária para que ocorra uma reflexão ética por parte da sociedade. Algumas vozes questionam que deve haver uma legislação regulamentar para a bioética, visando à sua legitimação, ou que devem ser proibidas experiências julgadas abusivas. A grande questão é que, devido à lentidão do processo legiferante, quando se promulgar determinada lei específica regulamentando algum estudo científico, esse estudo já pode estar defasado, havendo outros estudos e, consequentemente, um novo processo legiferante, causando um ciclo vicioso sem que seja enfrentado o cerne da questão. Ocorre que o Direito deve ser pautado pelo princípio da primazia da pessoa, ou seja, a existência do progresso da ciência é legítima e deve estar atrelada à proteção da saúde pública. Dessa forma, cabe ao aplicador do Direito, na ausência de norma específica, valer-se dos princípios gerais para saber qual é o limite daquele progresso. Para o desenvolvimento dessa questão, é necessária a aproximação entre as ciências e os indivíduos, buscando um diálogo que demonstre que o avanço da ciência está atrelado ao desenvolvimento da coletividade. E, para ocorrer esse desenvolvimento, devemos nos basear em princípios éticos, não apenas em um plano ideológico, mas em princípios que se tornem hábitos dentro da experiência prática de determinada sociedade.Assim, a ética se torna instrumento essencial nesse debate, uma vez que ela deve sempre visar à proteção humana e ao desenvolvimento das suas tecno- logias na construção de uma melhor qualidade de vida aos indivíduos. Dessa Bioética2 C07_Bioetica.indd 2 24/05/2018 17:09:34 forma, ela jamais deve se pautar pelo interesse das corporações biomédicas, visto que a ciência biomédica deve sempre representar uma esperança, não uma ameaça à vida humana. Ainda que os preceitos morais estejam presentes nos juízos de valor sobre qualquer temática, principalmente os de caráter religioso, eles não podem impor regras sobre o que a ciência pode ou não estudar de acordo com os preceitos dessa religião. Uma vez que a ciência avance, ela não pode retroceder, pois esse avanço se incorpora na sociedade. Dessa forma, não se pode coibir a ciência de avançar em suas pesquisas, nem mesmo determinar previamente, de forma afirmativa, os limites que ela deve observar. É complicado impor limites a investigações científicas ou mesmo codificar essas relações bioéticas de forma positivada, uma vez que as pesquisas nem sempre obterão um resultado satisfatório. Algumas descobertas, inclusive, ocorrem por acaso, dentro de uma pesquisa principal. Como pode o Direito prever e dar uma resposta satisfatória se tantas muitas variáveis? Devemos usar a ética, valendo-nos do exercício da razão para questionar a validade ou não das normas morais existentes em determinado tempo histórico. Essa é uma questão principal a se pensar, pois o que é uma imoralidade hoje pode não o ser amanhã. Utilizemos como exemplo as questões de gênero e transexualidade: mesmo com o preconceito ainda existente, a questão vem sendo debatida e começa a ser aceita como natural. A bioética trabalha todas essas questões, buscando avançar e resolver as fragilidades da vida humana, por meio de descobertas e investigações que me- lhorem a qualidade de vida. O que não pode ocorrer é a ciência impor conceitos sem análise de um juízo de valor — papel esse desempenhado pela bioética —, considerando o que é moralmente aceito e eticamente possível, ainda que não contrarie as normas jurídicas e os princípios existentes dentro do ordenamento jurídico. Em uma análise crítica, devemos permitir que a ciência avance e investigue dentro de determinada área de conhecimento, mas o que entrará em vigor e será incorporado na vida orgânica da sociedade deve ser limitado a tudo que oferece mais riscos do que soluções nesse momento específico. 3Bioética C07_Bioetica.indd 3 24/05/2018 17:09:34 Acesse o link ou o código a seguir e assista ao vídeo “O que é bioética?”. Você aprofundará os seus conhecimentos sobre bioética e a relação entre a ética e o avanço das ciências. https://goo.gl/fJRF3E Clonagem humana e células-tronco Apesar de muito se discutir sobre clonagem, tanto reprodutiva quanto tera- pêutica, e células-tronco, embrionárias e não embrionárias, ainda há muita confusão sobre como elas podem afetar as nossas vidas. Nesse sentido, vamos defi nir os seus conceitos e verifi car como estão presentes sociedade, além de analisar como a ética auxilia no desenvolvimento tanto da clonagem quanto das células-tronco. A clonagem é uma forma comum de propagação de espécies em plantas ou bactérias. O processo de clonagem se dá a partir de uma população de moléculas, células ou organismos que se originam de uma única célula original, sendo idênticos a ela. Nos seres humanos, a forma de clonagem natural são os gêmeos univitelinos, que se originam da divisão de um óvulo fertilizado. A ovelha Dolly, clonada em 1997, foi o marco da revolução da clonagem, abrindo caminho para a possibilidade de clonagem humana. Pela primeira vez na história, clonou-se um mamífero, uma cópia geneticamente exata a partir de uma célula somática diferenciada. Cabe mencionarmos que a Dolly foi originada a partir de uma célula mamária, não de uma célula embrionária, como normalmente acontece. Esse conceito foi apresentado pelo embriologista Hans Spermann, em 1938, quando ele apresentou a ideia de clonagem, propondo a experiência em que o núcleo de uma célula, em estado avançado de desenvolvimento, Bioética4 C07_Bioetica.indd 4 24/05/2018 17:09:35 seria transferido ao óvulo. A partir dessa concepção, vários experimentos de clonagem foram feitos e diversos clones criados. Em 1952, foi feita a primeira experiência com clonagem de seres vertebrados. A clonagem é dividida em dois tipos: clonagem reprodutiva e clonagem terapêutica. A clonagem reprodutiva consiste na preocupação somente em gerar um indivíduo novo idêntico ao já existente. Ela retira o núcleo de um óvulo visando substitui-lo pelo núcleo de outra célula não reprodutiva (célula somática, ou seja, com 46 cromossomos). A fase de desenvolvimento do em- brião, quando ele atingir cerca de 100 células, ocorrerá após 72 horas, sendo chamada de blastócito. Nessa fase, ele é introduzido na cavidade uterina. Ao final da gestação, obtém-se um indivíduo possuidor das mesmas características do doador da célula somática. A clonagem terapêutica ocorre quando se tem a formação do blastócito, mas ele não é introduzido na cavidade uterina. A sua finalidade é a produção de células-tronco com o objetivo de realizar transplantes. Essa técnica permite a criação de tecidos, visando sua utilização no tratamento de várias doenças. Nessa forma de clonagem, não é gerado um novo indivíduo. A clonagem terapêutica tem como objetivo produzir uma cópia saudável do tecido ou órgão para transplante em um paciente doente, o que poderia salvar sua vida. Mecanismos da clonagem terapêutica: o uso de células-tronco As células-tronco podem ser classifi cadas em dois tipos: as células-tronco embrionárias e células-tronco não embrionárias ou adultas. As células-tronco embrionárias são células multifuncionais, ou seja, podem ser diferenciadas em vários tipos de células. Elas podem ser utilizadas visando: restaurar tecidos celulares danificados; restaurar a função de órgãos; substituir células perdidas por doenças; substituir células que não possuem total desempenho devido a uma falha genética (por exemplo, doenças neurológicas). As células-tronco não embrionárias ou adultas não possuem a capacidade de se transformarem em qualquer tecido celular. Como se trata de uma célula adulta, cada célula só se origina se for pertencente à célula originária: células musculares originarão células musculares, por exemplo. 5Bioética C07_Bioetica.indd 5 24/05/2018 17:09:35 A clonagem terapêutica possuiria a vantagem de evitar a rejeição quando o doador celular for o próprio paciente. Podemos usar como exemplos a re- construção da medula em um paciente paraplégico ou a substituição do tecido cardíaco de um paciente que sofreu um infarto. A clonagem terapêutica é a forma como a ciência busca melhorar a qua- lidade de vida dos indivíduos que apresentam algum tipo de doença, assim, os embriões utilizados são simples fornecedores de material biológico. Cabe mencionar que os embriões não usados em clínicas de fertilização são utilizados como fornecedores de células-tronco. As vozes contrárias à utilização de células embrionárias na clonagem terapêutica argumentam no sentido de que tal procedimento poderia gerar um comércio de óvulos ou que haveria destruição de embrião humano, e, em tese, não seria ético/justo destruir uma vida para salvar outra. Esse argumento, muitas vezes, vem carregado de uma moral religiosa, que não observa a injustiça de deixar morrer uma criança, afetada com uma doença neuromotora letal, para preservar um embrião, que, muitas vezes, será descartado. É de suma importância destacar que a clonagem para fins terapêuticos gera somente tecidos em laboratórios, sem introdução no útero. Há uma diferença elementar entre a clonagem terapêutica e a clonagem reprodutiva: a introdu- ção ou não no útero. Dessa forma, não há como a clonagem terapêutica abrir margem paraa clonagem reprodutiva. Nesse sentido, há diversas doenças que poderiam ser curadas com a clonagem terapêutica. Além disso, há diversas instituições acadêmicas no mundo que defendem os estudos com células-tronco embrionárias, mesmo sendo contra a clonagem reprodutiva. Dessa forma, antes de argumentar contra o uso de células-tronco, deve- mos entender a sua finalidade e o que ela busca, uma vez que a clonagem terapêutica pode salvar diversas vidas e, em muitos casos, proporcionar uma vida saudável para pacientes com doenças que podem ser curadas com a clonagem terapêutica. Lei de Biossegurança No Brasil, a Lei de Biossegurança (Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005), aprovada pelo Congresso Nacional, substituiu a Lei nº. 8.974, de 5 de janeiro de 1995, buscando regulamentar duas matérias polêmicas: a produção e comercialização de organismos geneticamente modifi cados (OGMs) e a pesquisa com células-tronco. Bioética6 C07_Bioetica.indd 6 24/05/2018 17:09:35 Além de regulamentar todas as atividades relacionadas à biotecnologia, a Lei de Biossegurança visa proteger o meio ambiente de forma ampla, a vida e a saúde dos seres vivos (humanos, animais e plantas). A Lei de Biossegurança ainda criou o Conselho Nacional de Biossegurança, formado por Ministros de Estados da Justiça, da Saúde e do Meio Ambiente. Criou, ainda, uma Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, composta por cientistas, estabelecendo ainda algumas diretrizes sobre a Política Nacional de Biossegurança. Para estudarmos a lei, primeiro precisamos entender o que é biossegurança. A biossegurança, apesar de ter um significado bastante amplo, pode ser entendida como um conjunto de ações voltadas à prevenção e/ou proteção do paciente e do trabalhador, buscando minimizar riscos às atividades de pesquisas e desenvolvimento tecnológico e ampliar a proteção ambiental. Já, para a Comissão de Biossegurança em Saúde (CBS) do Ministério da Saúde (MS), a biossegurança é: [...] um conjunto de medidas e procedimentos técnicos necessários para a manipulação de agentes e materiais biológicos capazes de prevenir, reduzir, controlar ou eliminar riscos inerentes às atividades que possam comprometer a saúde humana, animal, vegetal e o meio ambiente (BRASIL, 2010a, p. 9). Um dos pontos mais críticos da Lei de Biossegurança diz respeito aos OGMs, conhecidos também como transgênicos, que são, principalmente, produtos alimentícios manipulados geneticamente para se tornarem mais resistentes a pragas e/ou mudanças climáticas (como, por exemplo, a soja). Consequentemente, há uma perda menor da plantação e um maior lucro aos produtores. O grande debate em torno dos transgênicos é se a manipulação genética produz ou não efeitos indesejados e nocivos a quem os consumir. Nesse debate, de um lado, está grande parte dos cientistas, que garantem que os alimentos transgênicos são seguros para o consumo humano e animal; de outro, estão os ambientalistas, que questionam a veracidade desses estudos, uma vez que os prazos para a sua realização são curtos. Cabe ressaltar que, ao lado dos transgênicos, está o poder econômico dos grandes produtores, além das multinacionais detentoras das patentes. Eles acabam por pressionar o poder político para que haja flexibilização das restrições visando facilitar a sua comercialização. Nesse sentido, houve uma flexibilização da Lei nº. 8.974/1995 para a Lei de Biossegurança. Segundo a Organização Não Governamental (ONG) Terra de Direitos, até 2015, nenhum produto transgênico teve a sua liberação negada no Brasil (LIMA, 2015). 7Bioética C07_Bioetica.indd 7 24/05/2018 17:09:35 Acerca da Lei de Biossegurança e dos alimentos transgênicos, a ONG Terra de Direitos aponta que todos os pedidos de liberação de alimentos transgênicos foram aceitos pelo governo nos 10 anos da Lei de Biossegurança. Acesse o link abaixo para ler o artigo “10 anos da Lei de Biossegurança: poucos motivos para comemorar”. https://goo.gl/1V5V6D Outro tema polêmico existente na Lei de Biossegurança diz respeito às pes- quisas de células-tronco. Há dois tipos de células-tronco, como já abordamos: as células-tronco embrionárias, extraídas dos embriões, organismos imaturos não fecundados, que nas pesquisas se mostram mais eficazes, uma vez que se mostram capazes de reconstruir ou formar qualquer tecido celular; e as células-não embrionárias ou adultas, extraídas de tecidos maduros de adultos e crianças, como, por exemplo, medula óssea e cordão umbilical. O debate existe justamente na utilização de células-tronco embrionárias, uma vez que o embrião deve ser destruído para obtenção das células-tronco, o que esbarra na oposição de setores religiosos e grupos contrários ao aborto, que compreendem que a vida começa no momento da fecundação do óvulo, o que contrariaria o direito à vida. Tentando harmonizar o debate entre religião e ciência, a Lei de Biossegu- rança, art. 5º, acabou por permitir a utilização de células-tronco embrionárias, mas desde que produzidas pelos métodos de fertilização in vitro, popularmente conhecidos como bebê de proveta. Os embriões também devem ser inviáveis, ou seja, não devem ser capazes de se desenvolver de forma efetiva e devem estar congelados há mais de 3 anos, bem como deve haver autorização expressa dos pais para realização de pesquisas/estudos. Além disso, as instituições que desenvolvem pesquisas com células-tronco embrionárias devem submeter seus projetos ao crivo e à aprovação dos comitês de ética em pesquisa. O art. 5º da Lei de Biossegurança foi objeto de debate no Supremo Tribunal Federal (STF), com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº. 3.510, na qual procurou-se discutir se as pesquisas relacionadas com células-tronco embrionárias não violavam o direito à vida e à dignidade da pessoa humana, bem como impedir os estudos científicos com elas (BRASIL, 2010b). O Relator da ADI 3.510 foi o ex-Ministro Ayres Brito, que votou pela im- procedência da ação, argumentando que, para existir vida humana, o embrião Bioética8 C07_Bioetica.indd 8 24/05/2018 17:09:35 precisa ser implantado no útero humano. Cabe destacar que o zigoto (embrião em estágio inicial) é a primeira fase do embrião humano, a célula-mãe, mas ele possui uma realidade distinta da pessoa natural, uma vez que ainda não há formação do cérebro (BRASIL, 2010b). Nesse sentido, em 2008, o STF, por seis votos — maioria da Corte —, votou pela legalidade do art. 5º da Lei de Biossegurança, estando plenamente de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, portanto, não sendo inconstitucional. Para analisar as questões que envolvem a bioética no geral, mas especifica- mente a Lei de Biossegurança, devemos estar desprendidos de valores religiosos. Principalmente em relação aos estudos com células-tronco embrionárias, é impor- tante percebermos que são um grande avanço da ciência na busca pela dignidade da pessoa humana, uma vez que buscam melhorar a qualidade de vida. Se alguns analisam essas questões atrelados a preceitos religiosos, devemos pensar: qual é a destinação das células embrionárias congeladas se não forem utilizadas para melhorar a vida das pessoas? Provavelmente a destinação seria o lixo. BRASIL. Ministério da Saúde. Classificação de riscos dos agentes biológicos. Brasília: MS, 2010a. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/classifica- cao_risco_agentes_biologicos_2ed.pdf>. Acesso em: 3 maio 2018. BRASIL. Superior Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.510 Distrito Federal. Relator: Ministro Ayres Britto. DJe, 25 maio 2010b. Disponível em: <http:// redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=611723>. Acesso em: 3 maio 2018. LIMA, R. P. 10 anos da Lei da Biossegurança: poucos motivos para comemorar. 2015. Disponível em: <http://terradedireitos.org.br/acervo/artigos/10-anos-da-lei-da- -biosseguranca-poucos-motivos-para-comemorar/17568>. Acesso em: 3 maio 2018. Leituras recomendadas BORBA, M. N; HOSSNE,W. S. Bioética e Direito: biodireito? Implicações epistemoló- gicas da Bioética no Direito. Revista Centro Universitário São Camilo, v. 4, n. 3, 2010. Disponível em: <https://www.saocamilo-sp.br/pdf/bioethikos/78/Art04.pdf>. Acesso em: 3 maio 2018. 9Bioética C07_Bioetica.indd 9 24/05/2018 17:09:35 CENTRO de Terapia Celular promove o avanço na produção de células-tronco “in vitro”. Jornal da USP, 2016. Disponível em: <https://jornal.usp.br/ciencias/centro-de- -terapia-celular-da-usp-promove-o-avanco-na-producao-de-celulas-tronco-in-vitro/>. Acesso em: 3 maio 2018. FREITAS, R. T. et al. Aspectos científicos e sociais da clonagem reprodutiva e terapêutica. Revista Eletrônica F@pciência, v.1, n.1, 2007. Disponível em: <http://www.fap.com.br/ fapciencia/001/edicao_2007/003.pdf>. Acesso em: 3 maio 2018. PEREIRA, A. K. N. Bioética, biodireito e o princípio da dignidade da pessoa humana. [200-?]. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_ artigos_leitura&artigo_id=6210>. Acesso em: 3 maio 2018. VIEIRA, T. R. Bioética e Direito. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999. ZATZ, M. Clonagem e células-tronco. Estudos Avançados, v.18, n. 51, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142004000200016>. Acesso em: 3 maio 2018. Bioética10 C07_Bioetica.indd 10 24/05/2018 17:09:35 Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Conteúdo: DICA DO PROFESSOR Por se tratar de tema sensível na sociedade, o avanço da ciência sempre se defronta com valores morais, e essas questões muitas vezes vão parar na esfera do Direito. É o caso da Lei de Biossegurança que, mesmo estabelecendo a forma como o Estado enfrentaria essas questões, ainda assim gerou discussão de constitucionalidade, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3510. A ADI questionava se as pesquisas com células-tronco embrionárias estariam em concordância com o Ordenamento Jurídico Brasileiro. Mas como efetivamente se dá essa relação? Confira na Dica do Professor. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! EXERCÍCIOS 1) Entre as opções a seguir, qual melhor se encaixa na definição de bioética? A) A forma de investigação da bioética é derivada dos valores morais estabelecidos, os quais são determinantes para indicar qual investigação científica as ciências biomédicas irão abordar. B) Bioética é o estudo sistemático da conduta humana dentro das pesquisas das ciências biomédicas, estando a análise da conduta desse ramo do saber, à luz de princípios morais, em uma relação de interdisciplinaridade. C) Bioética é o estudo sistemático da conduta humana dentro das pesquisas das ciências biomédicas, desprezando a interdisciplinaridade como elemento estruturante da sua investigação, atuando apenas de forma paralela, buscando completar as lacunas existentes. Os valores morais são indispensáveis para iniciar a investigação das ciências biomédicas, D) pois, se o rumo da investigação vai contra qualquer norma moral estabelecida, a investigação se torna impossível. E) O Direito é elemento estruturante da investigação das ciências biomédicas. Para se iniciar uma investigação, ela deve previamente passar por um processo legiferante para que possa estar em harmonia com o ordenamento jurídico vigente. 2) A clonagem humana é um dos assuntos com mais visibilidade dentro do campo de reflexão da bioética. Todavia, o campo da Bioética é bastante amplo, abordando também: A) a reflexão das relações entre o conhecimento da vida, no campo da investigação científica, e os valores éticos de determinada sociedade. B) a fundamentar técnica e economicamente as pesquisas com células-tronco para uso em seres humanos. C) a relativizar, no caso da clonagem de seres humanos, o uso de valores morais: certo/errado, bem/mal. D) a legitimar o predomínio da espécie humana sobre as demais espécies do planeta. E) a legalizar, por meio das técnicas de clonagem, os processos de reprodução tanto. 3) À luz da Lei de Biossegurança (Lei n.º 11.105/05), além da clonagem humana, também é tipificado como crime a seguinte conduta: A) a clonagem em qualquer animal vivo. B) praticar engenharia genética em célula germinal humana. C) utilizar embriões humanos em quaisquer hipóteses. D) praticar engenharia genética reversa em zigotos humanos. E) praticar qualquer forma de descarte de OGM. 4) A bioética surgiu buscando atender questões éticas para as quais o estado de conhecimento atual não tem respostas concisas. Sobre este campo e sua abrangência podemos afirmar que: A) ética e bioética são sinônimos. B) a bioética surgiu em meio às pesquisas cientificas, quando os cientistas passaram a se questionar sobre a ética envolvida em determinadas pesquisas cientificas de diversas áreas do conhecimento, como Direito, Filosofia, Psicologia, Antropologia, etc. C) a bioética busca, ao confrontar preceitos morais e avanço das ciências, a melhor saída para que o progresso da ciência não seja interrompido, uma vez que está ligada diretamente à emancipação do indivíduo. D) a velocidade com que a ciência avança não é compatível com a velocidade das reflexões éticas; é dessa forma que a ciência deve sempre progredir, uma vez que ela sempre se preocupa em beneficiar a humanidade, ainda que viole normas de conteúdo moral. E) a ética é um campo de atuação e reflexão,com relação a várias áreas da Saúde e do Direito que debatem, exclusivamente, questões ligadas à vida e à morte. 5) Com base na Lei da Biossegurança (Lei n.º 11.105/05), assinale a alternativa que indique uma competência do Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS). Estabelecer requisitos à biossegurança para autorização de funcionamento de laboratório, A) instituição ou empresa que desenvolverá atividades relacionadas a Organismos Geneticamente Modificados (OGM) e seus derivados. B) Estabelecer os mecanismos de funcionamento das Comissões Internas de Biossegurança (CIBio), no âmbito de cada instituição que se dedique ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento da tecnologia e produção industrial que envolvam OGM e seus derivados. C) Proceder à análise da avaliação de risco, caso a caso, relativamente à atividade e projetos que envolvam OGM e seus derivados. D) Estabelecer normas para as pesquisas e atividades com OGM e seus derivados. E) Fixar princípios e diretrizes para a ação administrativa dos órgãos e entidades federais com competências sobre a matéria. NA PRÁTICA Um dos pontos polêmicos da Lei de Biossegurança diz respeito às pesquisas com células-tronco. Há dois tipos de células tronco: as embrionárias, extraídas dos embriões, organismos imaturos não fecundados; e as não embrionárias ou adultas, extraídas de tecidos maduros de adultos e crianças, como, por exemplo, medula óssea e cordão umbilical. O debate existe na utilização de células-tronco embrionárias, uma vez que o embrião deve ser destruído para obtenção das células-tronco e isso esbarra justamente na oposição de setores religiosos e grupos contrários ao aborto, que compreendem que a vida começa no momento da fecundação do óvulo, o que contraria o direito à vida. Veja na ilustração a seguir: as pesquisas relacionadas com células-tronco embrionárias não violavam o direito à vida e a dignidade da pessoa humana, e consequentemente impedir os estudos científicos com elas. Por seis votos – maioria da Corte – o artigo 5.º da Lei de Biossegurança não merece qualquer tipo de reparo. Estando plenamente de acordo com o Ordenamento Jurídico Brasileiro, portanto, não sendo inconstitucional. SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Fertilização in vitro O vídeo retrata a experiência da gestação pelo método de FiV (Fertilização in vitro). Conteúdo interativodisponível na plataforma de ensino! Clonagem O vídeo explica sobre os conceitos da clonagem, apresentando avanços e sanando dúvidas. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
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