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PAGAMENTO DE DÉBITO DE ÁGUA TRATADA, COLETA E REMOÇÃO DE ESGOTO E ENERGIA ELÉTRICA: ANÁLISE SOBRE A NATUREZA DA OBRIGAÇÃO

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA 
SETOR DE CIÊNCIAS JURÍDICAS 
DEPARTAMENTO DE DIREITO DAS RELAÇÕES SOCIAIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
JOSÉ EDINALDO DE ANDRADE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PAGAMENTO DE DÉBITO DE ÁGUA TRATADA, COLETA E REMOÇÃO DE 
ESGOTO E ENERGIA ELÉTRICA: ANÁLISE SOBRE A NATUREZA DA 
OBRIGAÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PONTA GROSSA 
2021 
1 
 
JOSÉ EDINALDO DE ANDRADE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PAGAMENTO DE DÉBITO DE ÁGUA TRATADA, COLETA E REMOÇÃO DE 
ESGOTO E ENERGIA ELÉTRICA: ANÁLISE SOBRE A NATUREZA DA 
OBRIGAÇÃO 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado para 
a obtenção do título de Bacharel em Direito na 
Universidade Estadual de Ponta Grossa. 
 
 
Orientador: Profª. Ms. Paola Damo Comel Gormanns 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PONTA GROSSA 
2021 
2 
 
 
 
JOSÉ EDINALDO DE ANDRADE 
 
 
 
 
 
 
PAGAMENTO DE DÉBITO DE ÁGUA TRATADA, COLETA E REMOÇÃO DE 
ESGOTO E ENERGIA ELÉTRICA: ANÁLISE SOBRE A NATUREZA DA 
OBRIGAÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado para obtenção de título de Bacharel 
em Direito na Universidade Estadual de Ponta Grossa. 
 
 
 
 
 
 
Ponta Grossa, 16 de março de 2021. 
 
 
 
 
Profª. Paola Damo Comel Gormanns 
Mestre em Ciência Jurídica 
Universidade Estadual de Ponta Grossa 
 
 
 
 
 
Profª. Flávia Oliveira Alves da Silva 
Mestre em Ciências Sociais Aplicadas 
Universidade Estadual de Ponta Grossa 
 
 
 
 
 
Adv. Izabeli Dombroski 
Especialista em Direito Público 
Companhia de Saneamento do Paraná – SANEPAR 
 
3 
 
RESUMO 
 
Este trabalho tem por objetivo analisar os aspectos e entendimentos sobre a 
classificação da obrigação pelo pagamento dos débitos oriundos de consumo de 
água, coleta e remoção de esgoto e de consumo de energia elétrica no âmbito 
nacional, do ponto de vista dos conceitos doutrinários sobre as espécies de 
obrigações, buscando entender os fundamentos das decisões judiciais que 
envolvem o tema, bem como o posicionamento dos Tribunais Superiores. Para tanto, 
foram estudados e analisados os entendimentos doutrinários que versam sobre o 
assunto, decisões judiciais de diferentes Estados, bem como dos Tribunais 
Superiores, além de aspectos legais presentes no Código Civil e no Código de 
Defesa do Consumidor. Além disso, apresenta-se a implantação de um novo 
dispositivo legal que veio a regular a matéria, especificamente em relação às 
concessionárias de abastecimento de água no âmbito do Estado do Paraná. Como 
resultado do trabalho de pesquisa, restou claro que estão em jogo diversos 
interesses, seja de ordem patrimonial, de interesse particular e de interesse coletivo, 
restando evidenciada a conflitualidade que persiste em torno da definição da origem 
da obrigação em questão, sobretudo em razão da hibridade conceitual das 
obrigações do tipo propter rem. 
 
Palavras-chave: Obrigações. Direito obrigacional. Obrigação pessoal. Obrigação 
propter rem. Débito de consumo de fornecimento de água, coleta e remoção de 
esgoto e energia elétrica. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 5 
 
 
2 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES 
2.1 Conceito ...................................................................................................... 8 
2.2 Fontes ......................................................................................................... 11 
2.3 Elementos constitutivos .............................................................................. 12 
2.4 Espécies ..................................................................................................... 14 
 
 
3 DIREITO OBRIGACIONAL, DIREITO REAL E OBRIGAÇÕES MISTAS 
3.1 Conceito ...................................................................................................... 17 
3.2 Análise sob a ótica dos direitos do consumidor .......................................... 18 
 
 
4 DÉBITOS DE CONSUMO DE SANEAMENTO E ELETRICIDADE 
4.1 Considerações ............................................................................................. 21 
4.2 A prestação do serviço ................................................................................. 21 
4.3 Legalidade da cobrança de débito ............................................................... 25 
4.4 Conflito de interesses – uma análise sob a ótima do interesse público .….. 27 
4.5 Ausência de legislação específica ............................................................... 30 
 
 
5 POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS ...................................................... 33 
 
 
6 CONCLUSÃO .............................................................................................. 39 
 
 
REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 42 
 
 
ANEXO A – Decreto Distrital nº. 26.590/2006 ..................................................... 46 
 
ANEXO B – Lei Estadual nº. 20.259/2020 ............................................................ 47 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
1 INTRODUÇÃO 
 Há muito tempo trava-se uma discussão acerca da conceituação 
do tipo de obrigação que recai sobre o dever pelo pagamento de débitos oriundos do 
consumo de água tratada, coleta e remoção de esgoto e de consumo de energia 
elétrica. Tal discussão tem reflexos em toda a sociedade, tendo em vista que 
eventuais perdas de receitas pelas prestadoras do serviço incidem sobre a tarifa 
aplicada para todos os consumidores. 
A problemática está em caracterizar o tipo de obrigação e defini-la 
dentro do campo do Direito (obrigacional ou real), vez em que, apesar de tratar-se 
de uma relação de consumo, existem peculiaridades envolvidas que devem ser 
analisadas para bem classificar a obrigação pelo pagamento dos débitos oriundos 
do consumo de água tratada, coleta e remoção de esgoto e de consumo de energia 
elétrica. 
Diante da inexistência de uma regulação federal uniforme sobre o 
tema, a jurisprudência chamou para si a responsabilidade por classificar tal 
obrigação dentro do Direito Obrigacional. Contudo, até se chegar a uma decisão 
“pacificada” nos Tribunais, viveu-se momentos de divergências de entendimento em 
diferentes níveis judiciais. Somente com a uniformização do entendimento pelo 
Superior Tribunal de Justiça (STJ) é que os Tribunais de Justiça locais passaram a 
adotar o entendimento fixado em superior instância e passaram a acordar pela 
classificação pelo pagamento de tais débitos como obrigação de cunho pessoal, 
denominado pela doutrina como propter personam, rechaçando a hipótese de 
classificação como obrigação de natureza propter rem. 
Porém, ao que tudo indica, as prestadoras de serviço não se 
convenceram sobre tal entendimento fixado, insistindo na prática da vinculação dos 
débitos aos imóveis onde estão situadas as ligações prediais, baseando o 
procedimento em normativas internas das empresas e na ausência de Legislação 
especifica. Isso faz com que o tema reiteradamente faça parte das pautas de 
julgamento dos Tribunais, demonstrando que, além de a solução proposta pelo STJ 
não ter sido bem aceita, o critério adotado possa não ter sido o mais vantajoso do 
ponto de vista econômico para as prestadoras do serviço e que, possivelmente, 
ainda persistam fatos e argumentos a serem apreciados em última instância. 
O que efetivamente se questiona é a possibilidade de se vincular a 
obrigação pelo pagamento de débitos de consumo de água, coleta e remoção de 
6 
 
 
 
esgoto e de consumo de energia elétrica ao local da prestação do serviço, o que lhe 
atribuí caráter de obrigação do tipo propter rem. Outra questão a ser analisada é 
sobre a ótica do interesse público, ante a essencialidade do serviço em comento. 
Não se presta o presente estudo a negar a essencialidade da 
prestação dos serviços de fornecimento de água tratada, coleta e remoção de 
esgotoe de fornecimento de energia elétrica, eis que indispensável para a vida 
moderna e para o convívio social. Não se dúvida ainda que tais serviços elenquem o 
rol dos direitos fundamentais consagrados pela Constituição da República 
Federativa do Brasil, os quais, nas palavras de Cunha Júnior (2008, p. 573): 
 
são todas aquelas posições jurídicas favoráveis às pessoas que 
explicitam, direta ou indiretamente, o princípio da dignidade humana, 
que se encontram reconhecidas no teto da Constituição formal 
(fundamentalidade formal) ou que, por seu conteúdo e importância, 
são admitidas e equiparadas, pela própria Constituição, aos direitos 
que esta formalmente reconhece, embora dela não façam parte 
(fundamentalidade material). 
 
Assim, faz-se necessário, a partir disso, analisar a legislação 
aplicável ao tema, observando a competência constitucional para legislar sobre o 
assunto, incluindo-se as questões de Direito do Consumidor, Direito Privado, 
interesse público, competência local dos municípios, dentre outros, considerando 
ainda os interesses legais e econômicos das prestadoras do serviço, além do 
cumprimento da função social envolvida. 
Não há de se olvidar que se trate de pura relação de consumo, eis 
que diante do tripé de que trata o Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 1990), 
composto pelos elementos: consumidor, fornecedor e produto ou serviço. Contudo, 
este fato não é suficiente para determinar o tipo de obrigação oriunda desta relação, 
eis que não analisa de forma exaustiva outros elementos e situações imbricadas. 
A discórdia em volta da caracterização de tal obrigação entre as de 
natureza propter rem e propter personam se prende ao fato de que, diferentemente 
de outras relações de consumo cotidianas, as relações em tela somente são 
possíveis a partir de um local de prestação específico, imóvel, entranhado, 
perdurável, contínuo e constante. Isto torna a prestação do serviço e o consumo do 
produto em algo vinculado, que não ocorre fora daquele local da prestação. 
Logo, ganha espaço no campo jurídico a livre interpretação, ainda 
mais somada ao fato da ausência de uma regulação eficaz sobre o tema que 
7 
 
abarque todas as nuances envolvidas. A propósito, não se deixa passar a novíssima 
Lei editada em território paranaense acerca do tema, ainda que trate 
especificamente das questões atinentes às concessionárias de serviço de 
abastecimento de água tratada, porém sem ser possível uma análise sobre os 
efeitos práticos de tal novo dispositivo legal. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
 
 
 
2 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES 
2.1 Conceito 
Antes de adentrar no tema proposto, necessário se fazer uma breve 
análise sobre o campo das obrigações tratado pelo Direito Civil brasileiro. 
O Código Civil (BRASIL, 2002) evidencia a importância deste tema, 
tanto que a teoria geral das obrigações é o primeiro a ser tratado pela parte especial 
do Código, entre os artigos 233 a 420, descrevendo as modalidades, as formas de 
transmissão, formas de adimplemento e extinção e do inadimplemento das 
obrigações. O Código Civil descreve os direitos pessoais, ditando um conjunto de 
regras que visam reger as relações jurídicas patrimoniais entre os sujeitos. Contudo, 
no que toca a exata definição de obrigação, o Código silencia-se, deixando tal 
atribuição à doutrina, como muito se verá. 
A origem da palavra obrigação vem do vocábulo latino obrigare, 
resultado da união dos termos “ob” e “ligatio”, que, conforme Farias e Rosenvald 
(2015, p. 13), “significa atar, unir, impor um determinado compromisso”. 
Conforme explica Bartolomeo (2020), “no direito romano, a obligatio 
era considerada um vínculo jurídico, um elo ao qual as pessoas escolhiam se 
submeter e se mantinham obrigadas a cumprir uma prestação”. 
Nas palavras de Farias e Rosenvald (2015, p. 13), “a obrigação 
confere a ideia de comprometimento de uma pessoa a uma situação moral, religiosa, 
social, etc”, mas também afirmam que, no campo jurídico, assume o sentido restrito 
de um “vínculo existente entre pessoas, pela qual uma assume uma prestação em 
favor de outra, vinculando o seu patrimônio”. 
O direito das obrigações tem grande repercussão na vida e no dia-a-
dia de todas as pessoas que vivem e que convivem em sociedade, pois é 
responsável por dar conta dos vínculos jurídicos criados entre pessoas e em que o 
patrimônio do devedor pode responder por eventual inadimplemento. 
Obrigação, segundo Silva (2014, p. 1464), quer exprimir: 
 
a ação de se mostrar atado, ligado ou vinculado a alguma coisa [...] 
Restritamente, como já a compreendiam os romanos, a obrigação revela-se 
como um vínculo que se estabelece entre duas pessoas determinadas em 
virtude do que uma delas deve uma prestação a outra, prestação que tanto 
pode constar de uma ação de uma abstenção. 
 
Em semelhante sentido, Diniz (2007, p. 3) conceitua que “o direito 
das obrigações consiste num complexo de normas que regem relações jurídicas de 
9 
 
ordem patrimonial, que têm por objeto prestações de um sujeito em proveito de 
outro”. 
Semelhante a definição de Farias e Rosenvald (2015, p. 14), que 
afirmam que: 
 
é possível, então, conceituar a obrigação como a relação jurídica transitória, 
estabelecendo vínculos jurídicos entre duas diferentes partes (denominadas 
credor e devedor, respectivamente), cujo objeto é uma prestação pessoal, 
positiva ou negativa, garantido o cumprimento, sob pena de coerção judicial. 
 
Compartilha deste entendimento Pereira (2017, p. 25), o qual define 
que “obrigação é o vínculo jurídico em virtude do qual uma pessoa pode exigir de 
outra prestação economicamente apreciável”. Tartuce também assim define a 
obrigação, descrevendo como sendo: 
 
a relação jurídica transitória, existente entre um sujeito ativo, denominado 
credor, e outro sujeito passivo, o devedor, e cujo objeto consiste em uma 
prestação situada no âmbito dos direitos pessoais, positiva ou negativa. 
Havendo o descumprimento ou inadimplemento obrigacional, poderá o 
credor satisfazer-se no patrimônio do devedor. (TARTUCE, 2011, p. 265). 
 
As partes dessa relação obrigacional recebem o nome de sujeito 
ativo, que vem a ser o credor da obrigação, e o sujeito passivo, que por sua vez vem 
a ser o devedor de certa obrigação. Para Pereira (2017, p. 34), estes sujeitos das 
obrigações podem ser pessoas naturais ou jurídicas, importando que tenham 
“capacidade para se obrigar”. Já o objeto dessa obrigação, ou elemento objetivo da 
obrigação, é uma prestação econômica, e deve ser lícita, possível e 
economicamente apreciável. 
Conforme discorrem Farias e Rosenvald (2015, p. 13), o “núcleo 
essencial da obrigação” não era tornar alguém dono de alguma coisa, mas sim 
obrigar uma pessoa “a dar, fazer ou não fazer” a prestação assumida. 
Acrescenta Diniz (2007, p 3) que: 
 
O direito obrigacional ou de crédito contempla as relações jurídicas de 
natureza pessoal, visto que seu conteúdo é a prestação patrimonial, ou seja, 
a ação ou omissão da parte vinculada (devedor) tendo em vista o interesse 
do credor, que por sua vez tem o direito de exigir aquela ação ou omissão, 
de tal modo que, se ela não for cumprida espontaneamente, poderá 
movimentar a máquina judiciária para obter do patrimônio do devedor a 
quantia necessária à composição do dano. 
 
Visando regular essas relações humanas que, como já dito, geram 
grandes repercussões na vida das pessoas, é preciso compor diversas normas 
10 
 
 
 
jurídicas que dão conta de controlar e regulamentar tais relações, o que vem a ser o 
direito das obrigações propriamente dito, conforme afirma Diniz (2007, p. 4). 
Em suma, conforme o conceito doutrinário recorrente, uma 
obrigação, no sentido jurídico do termo, representa uma ligação entre dois sujeitos, 
ativo e passivo, em torno de uma prestação economicamente apreciável (objeto). 
Acrescenta Pereira (2017, p. 36-38) que o objetoda obrigação deve ser possível, 
lícito, determinável e ter caráter patrimonial. 
Porém, para Farias e Rosenvald (2015, p. 15), esse é um “conceito 
técnico em sentido estrito” e “insuficiente”. Para os autores, para além do conceito 
de credor e devedor, em “cada relação obrigacional há uma série de direitos 
recíprocos entre as partes, tornando a obrigação muito mais dinâmica e funcional”. 
E continuam, ao discorrer que: 
 
em uma única relação jurídica (imagine-se um contrato qualquer, 
exemplificativamente) localizam-se inúmeras obrigações recíprocas, 
assumindo ambas as partes, em diferentes momentos, o papel de credor e 
devedor de diferentes obrigações, denotando um verdadeiro caráter 
dinâmico na relação obrigacional. (FARIAS e ROSENVALD, 2015, p. 15). 
 
Sobre a aventada divergência, Pereira (2017, p. 43) aponta que “a 
teoria dualista, apesar de rigor de sua lógica e da clareza de sua exposição, não tem 
logrado êxito, havendo escritores que lhe votam silencioso desprezo e outros que a 
combatem”, e continua ao nomear diversos teóricos e os seus pensamentos ao 
redor da divergência acerca da teoria dualista dominante. 
E nesta senda, Viana (2007 apud FARIAS e ROSENVALD, 2015, 
p.16) concluem que quando desta relação obrigacional reciproca lhe falta 
cooperação de uma ou de ambas as partes, sobrevém o dever de reparar à parte 
cuja prestação deixou de se cumprir, “pela presença da responsabilidade civil”. 
Complementam Farias e Rosevald (2015, p. 16) que “esse aspecto dinâmico das 
obrigações [...] em muito decorre da boa-fé objetiva”. 
De acordo com Tartuce (2011, p. 265), embutido no conceito das 
obrigações está a própria questão do descumprimento ou inadimplemento, eis que, 
conforme afirma, “para o Direito interessa mais o descumprimento do que o 
cumprimento da obrigação, já que se trata de uma ciência que lida com o conflito”. 
Logo, pode-se concluir que, para adiante daquele conceito dualista 
de credor e devedor, a obrigação consiste em uma pluralidade de prestações 
reciprocas dentro de uma mesma relação, seja entre um ou mais sujeitos capazes, 
11 
 
podendo haver múltiplos objetos. Uma vez descumprida a obrigação por uma das 
partes, a parte contrária poderá buscar a guarida judicial para tentar a satisfação da 
obrigação ou compensação de eventual dano. 
 
2.2 Fontes 
Conforme Diniz (2007, p. 40), as fontes dos direitos obrigacionais 
diferem daquelas fontes do direito, eis que a fonte do direito é aquela que gera, que 
dá origem ao próprio direito, enquanto a fonte da obrigação dá origem às normas 
reguladoras da relação entre particulares, podendo se dar entre dois ou mais 
indivíduos ao entorno de uma prestação. 
A autora continua, ao conceituar as fontes das obrigações como “os 
fatos jurídicos que dão origem aos vínculos obrigacionais, em conformidade com as 
normas jurídicas” (DINIZ, 2007, p. 40). 
 De acordo com o Código Civil, são 3 (três) as fontes das obrigações, 
sendo elas o contrato, o ato ilícito e as declarações unilaterais de vontade (BOCCHI, 
2001, p. 1). Porém a doutrina diverge bastante sobre o tema, não havendo um 
consenso entre diferentes correntes de pensamentos. Para Diniz (2007, p. 40-41), a 
fonte primária ou imediata das obrigações é a lei, afirmando que “os vínculos 
obrigacionais são relações jurídicas” e a fonte mediata é a própria vontade humana. 
Afirma Diniz (2007, p. 43) que “de nada valeira a vontade sem a lei, 
e a lei sem um ato volitivo, para a criação do vínculo obrigacional”. Mas admite que 
em certos casos a lei seja fonte mediata das obrigações, que são as hipóteses em 
que a “obrigação advém diretamente da lei e não de um fato humano”. 
Breccia (1991 apud SILVA, 2019, p. 137) afirma que “a indicação 
autônoma da lei queria, portanto, significar [...] que existem casos nos quais a lei [...] 
produz o dever, na presença da figura prevista, ‘por sua simples autoridade’, sem a 
mediação de um fato pessoal do obrigado”, concluindo que há hipóteses em que a 
lei sozinha seja fonte das obrigações. 
Pereira (2017, p. 50) admite apenas dois aspectos como fontes 
obrigacionais, sendo a declaração de vontade e a lei, havendo preponderância vez 
de uma e vez de outra. Porém não admite que as obrigações se originem somente 
de uma ou de outra, afirmando que: 
 
Em ambas trabalha o fato humano, em ambas atua o ordenamento jurídico, 
e, se de nada valeria a emissão volitiva sem a lei, também de nada 
12 
 
 
 
importaria esta sem uma participação humana, para a criação do vínculo 
obrigacional. (PEREIRA, 2017, p. 50-51). 
 
Noronha (2013, p. 365) posiciona-se no sentido que: 
 
Atualmente, com a superação das teses individualístico-liberais que 
sacralizam a vontade, o papel desta na constituição de obrigações vem 
sendo reduzido às devidas proporções, ao mesmo tempo que se reconhece 
que a lei apenas pode permitir a criação de direitos de crédito, mas nunca 
criá-los diretamente. Neste sentido, pode-se afirmar que a vontade sozinha 
não cria nenhuma obrigação e que a lei sozinha também não é fonte de 
qualquer obrigação. 
 
Já Beviláqua (1896, p. 9-11) admite a existência de quatro 
categorias de fontes geradoras das obrigações, sendo o contrato, o quase contrato, 
o delito, o quase delito, a vontade unilateral e a lei, ressaltando que as duas últimas 
não devem ser desassociadas por completo, eis que “o acto humano desprovido da 
sancção legal é juridicamente improfícuo e, por outro lado, a lei exige a insufflação 
vital da actividade humana para descer do mundo abstracto onde paira e rutila, sem 
o que não conseguirá realisar o fim a que se destina”1. 
Além destes, alguns teóricos classificam a sentença como fonte das 
obrigações, por entenderem que a sentença institui uma obrigação. Porém, para 
Pereira (2017, p. 51), uma sentença declara ou reconhece uma situação jurídica que 
lhe precede, não servindo para criar uma nova obrigação. 
Como se vê, são sortidos os entendimentos doutrinários sobre o 
tema, contudo nota-se uma predominância sobre o papel da declaração da vontade 
e da lei como fontes obrigacionais. 
 
2.3 Elementos constitutivos 
Figueiredo e Figueiredo (2018, p. 49) classificam em 3 (três) grupos 
os elementos constitutivos das obrigações, sendo o elemento subjetivo, o elemento 
objetivo ou material e o vínculo jurídico ou elemento virtual. Posicionamento 
semelhante tem Tartuce (2011, p. 265), o qual afirma que são os elementos 
constitutivos da obrigação: “a) Elementos subjetivos: o credor (sujeito ativo) e o 
devedor (sujeito passivo). b) Elemento objetivo imediato: a prestação. c) Elemento 
imaterial, virtual ou espiritual: o vínculo existente entre as partes”. 
 
1 O ato humano desprovido da sanção legal é juridicamente improfícuo e, por outro lado, a lei exige a 
insuflação vital da atividade humana para descer do mundo abstrato onde paira e rutila, sem o que 
não conseguirá realizar o fim a que se destina. (BEVILÁQUA, 1896, atualização textual nossa). 
13 
 
Segundo Tartuce (2011, p. 267) a definição detalhada dos 
elementos subjetivos da obrigação assim se apresenta: 
 
a) Sujeito ativo - é o beneficiário da obrigação, podendo ser uma pessoa 
natural ou jurídica ou, ainda, um ente despersonalizado a quem a prestação 
é devida. É denominado credor, sendo aquele que tem o direito de exigir o 
cumprimento da obrigação. 
b) Sujeito passivo - é aquele que assume um dever, na ótica Civil, de 
cumprir o conteúdo da obrigação, sob pena de responder com seu 
patrimônio. E denominado devedor. 
 
O autor ainda faz uma observação sobre tal definição, 
acrescentando que dificilmente uma parte ou outra assumirá isoladamente a posição 
de credor ou de devedor, eis que geralmente as partes ocuparão ambos os papeis 
ao mesmo tempo na relação entre si (TARTUCE, 2011, p. 267). 
Pereira (2017, p. 32), que decompõe os elementos constitutivos das 
obrigações em “sujeito, objeto e vínculo jurídico”,compartilha do mesmo 
entendimento de que o sujeito ativo ou credor é o indivíduo “que tem o direito de 
exigir a prestação” e o sujeito passivo ou devedor é o indivíduo “que tem o dever de 
prestar” a obrigação. 
Farias e Rosenvald (2015, p. 50-51) classifica os elementos 
constitutivos da obrigação em “sujeitos ativo e passivo (credor e devedor), prestação 
e vínculo jurídico”, e define o elemento subjetivo (credor e devedor) como um 
elemento: 
 
dúplice, encontrando-se, em posições contrapostas, credor e devedor (que 
representam o sujeito ativo e o passivo, respectivamente). O credor é 
aquele que pode exigir de outrem um determinado comportamento, 
enquanto o devedor é quem deve cumpri-lo. Evidente que será rara a 
hipótese em que um indivíduo será apenas credor ou devedor, eis que 
habitualmente as partes são credoras e devedoras reciprocamente. 
 
Todos os citados autores admitem, também, a possibilidade de 
haver uma pluralidade de sujeitos em qualquer um dos lados do elemento subjetivo, 
sem que tal fato descaracterize a dualidade obrigacional conforme conceitos 
expostos. 
Sobre o elemento objetivo da obrigação, conforme definição de Diniz 
(2007, p. 33), consiste em uma: 
 
prestação positiva ou negativa do devedor, ou melhor, a atuação do sujeito 
passivo, que consiste em dar, fazer ou não fazer algo. A prestação sempre 
se constitui na prática de um ato humano positivo, como, p. ex., o transporte 
de uma mercadoria, a realização de um trabalho, a entrega de uma coisa ou 
14 
 
 
 
de seu preço, ou negativo, como, p. ex., a não-construção de uma obra. O 
objeto da obrigação, para a maior parte dos autores, consiste na prestação, 
isto é, na prática do ato que o credor pode exigir do devedor 
 
Farias e Rosenvald (2015, p. 53) compartilham do mesmo 
entendimento de Diniz e acrescentam que “o objeto se apresenta, consubstancia-se, 
na prestação devida, tendo, sempre, conteúdo econômico ou conversibilidade 
patrimonial”. 
Pereira (2017, p. 35) afirma que o objeto pode ser uma obrigação 
positiva ou negativa, asseverando que: 
 
o objeto da obrigação é uma prestação, e esta sempre constitui um fato 
humano, uma atividade do homem, uma atuação do sujeito passivo. Às 
vezes este fato do homem se concretiza ou se materializa numa coisa. Mas, 
ainda assim, não é de confundir-se o objeto da obrigação com a coisa sobre 
a qual incide. 
 
Além disso, como já exposto em tópico anterior, o objeto da 
obrigação deve ser possível, lícito, determinável e ter caráter patrimonial (DINIZ, 
2007, p. 34-35). 
Já em relação ao vínculo jurídico, ou elemento imaterial, virtual ou 
espiritual, Diniz (2007, p. 36) classifica como sendo o “que sujeita o devedor à 
realização de um ato positivo ou negativo no interesse do credor”. Acrescenta 
Tartuce (2011, p. 269) que o “elemento em questão” constitui “o liame legal que une 
as partes envolvidas” e que, conforme previsão do artigo 391 do Código Civil, “todos 
os bens do devedor respondem no caso de inadimplemento da obrigação”. Tartuce 
destaca, ainda, a impossibilidade de prisão civil no caso de inadimplemento da 
obrigação (TARTUCE, 2011, p. 270). 
 
2.4 Espécies 
Grande parte dos doutrinadores classificam as obrigações em três 
grandes grupos; classificação esta que, conforme Rizzardo (2004, p. 45), mostra-se 
necessária para “uma melhor compreensão das mesmas, distinguindo-as e 
valorando-as segundo a importância dos fatores que as geram”. 
Conforme Gonçalves (2004, p. 37), as obrigações, em regra, são 
classificadas “em categorias, reguladas por normas específicas, segundo diferentes 
critérios”. E ainda acrescenta que “essa classificação se mostra necessária, para 
enquadrá-las na categoria adequada”. 
15 
 
E saber classificar as obrigações é questão de suma importância, 
pois, segundo Pereira (2017, p. 62), “quem tem de enfrentar um problema no arraial 
da obrigação deverá logo distinguir o tipo a que esta pertence, enquadrá-la em uma 
categoria conhecida, e aí encontrará os preceitos aplicáveis à espécie”. 
Diniz (2007, p. 45) ainda complementa sobre a relevância de 
enquadrar “a relação creditória” em uma categoria, eis que “não há uniformidade no 
regime jurídico da obrigação, mas diferenças típicas em cada relação obrigacional 
em atenção aos seus elementos estruturais”. 
O próprio Código Civil brasileiro classifica as espécies de obrigações, 
sendo que, segundo Farias e Rosenvald (2015, p. 140), “seja de qual for o ângulo 
pelo qual desejemos examinar as obrigações, toda classificação ou modalidade 
prevista no Código Civil é inevitavelmente uma derivação destas três espécies – dar, 
fazer ou não fazer”. 
A obrigação de dar, nas palavras de Tartuce, é “aquela em que o 
sujeito passivo compromete-se a entregar alguma coisa, certa ou incerta”, havendo a 
intenção de transmissão da propriedade da coisa, seja móvel ou imóvel. O mesmo 
autor ainda subdivide esta obrigação em obrigação de dar coisa certa ou obrigação 
específica e obrigação de dar coisa incerta ou obrigação genérica (TARTUCE, 2011, 
p. 285). 
Sobre a obrigação de fazer, Farias e Rosenvald explicam que se 
tratam de situações em que “pretende o credor a prestação de um fato, consistente 
na realização de uma atividade pessoal ou serviço pelo devedor ou por um terceiro, 
de que não resulta imediatamente a transferência de direitos subjetivos”. Enfatizam 
que para tal classificação é a conduta do devedor especificamente, como conduta 
humana, o que interessa, sendo que a ação de entregar a coisa está compreendida 
na obrigação de fazer. Necessário, pois “uma atividade humana consistente em 
fazer” (FARIAS e ROSENVALD, 2015, p. 179-180). 
Quanto à obrigação de não fazer, ensina Pereira que trata-se de 
uma “negativa típica”, traduzindo-se em uma abstenção que conserva uma omissão 
da parte. Ou seja, conforme o autor, o objeto desta obrigação é a ação humana 
revelada em uma omissão, sendo que, neste caso, o fazer consiste em uma 
contravenção do obrigado (PEREIRA, 2017, p. 77). 
Mas independente da espécie de obrigação, esta vem a fazer parte 
do conjunto de direitos patrimoniais de uma pessoa natural ou jurídica, “sendo 
16 
 
 
 
suscetíveis de estimação pecuniária, dividindo-se em pessoais e reais” (DINIZ, 2007, 
p. 6). 
Conforme leciona Diniz (2007, p. 7), “a determinação dos direitos 
obrigacionais traz um grande número de controvérsias atinentes às suas relações 
com os direitos reais, no sentido de se saber se constituem dois institutos idênticos 
ou de natureza diversa”. 
E é justamente o enfrentamento de tal controvérsia que será 
abordado nos tópicos posteriores. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
17 
 
3 DIREITO OBRIGACIONAL, DIREITO REAL E OBRIGAÇÕES MISTAS 
3.1 Conceito 
De modo geral, a doutrina subdivide as obrigações em três espécies: 
as obrigações propriamente ditas, as obrigações reais e as obrigações propter rem. 
De início, cumpre discorrer sobre o conceito doutrinário de direito obrigacional e de 
direito real, suas subclassificações e aplicações ao caso concreto. 
Como já exposto, para este estudo, o que importa é tratar da 
natureza das obrigações, em especial as obrigações propter personam e as 
obrigações propter rem, com foco no estudo sobre a classificação da obrigação pelo 
pagamento dos débitos oriundos do consumo de água tratada, coleta e remoção de 
esgoto e de consumo de energia elétrica. 
O direito obrigacional, segundo Diniz (2007, p. 3), “consiste num 
complexo de normas que regem relações jurídicas de ordem patrimonial, que têm 
por objeto prestações de um sujeito em proveito de outro”. Já o direito real, nas 
palavras de Pereira (2017, p. 53), é uma relação composta por “um sujeito ativo 
determinado, tem por sujeito passivo a generalidade anônima dos indivíduos”, e tem 
como objeto uma coisa. Por sua vez, as obrigações mistas, ou também chamadas 
de obrigações híbridas ou ainda ambíguas, sãoas obrigações em que, conforme 
Diniz (2007, p. 10), “certas situações especiais e de ordem prática podem exigir a 
reunião dos direitos obrigacionais aos direitos reais [...] constituindo, na aparência, 
um misto de obrigação e de direito real”. 
No campo dos direitos obrigacionais, situam-se as obrigações 
propter personam, que, como já exposto em tópicos anteriores, cuidam das relações 
entre sujeitos entre si e em torno de um objeto. Já as obrigações propter rem são 
obrigações que, segundo Tartuce (2011, p. 757), são obrigações híbridas, situando-
se entre os direitos patrimoniais e os direitos reais. 
E é nestes dois campos do Direito (obrigacionais e reais) em que o 
tema da presente pesquisa procura encontrar a adequada resposta para a questão: 
As obrigações pelo pagamento de débitos oriundos de consumo de água tratada, 
coleta e remoção de esgoto e de consumo energia elétrica perfaz obrigação de 
natureza propter personam ou propter rem? 
Percebe-se que o grande dilema é conceitual, uma vez em que, 
segundo Pereira (2017, p. 54): 
 
18 
 
 
 
A obligatio propter rem somente encorpa-se quando é acessória a uma 
relação jurídico-real ou se objetiva numa prestação devida ao titular do 
direito real, nesta qualidade (ambulat cum domino). E o equívoco dos que 
pretendem definir a obrigação propter rem como pessoal é o mesmo dos 
que lhe negam a existência, absorvendo-a na real. Ela é uma obrigação de 
caráter misto, pelo fato de ter como a obligatio in personam objeto 
consistente em uma prestação específica; e como a obligatio in re estar 
sempre incrustada no direito real. 
 
Para Gonçalves (2017, p. 36): 
 
São obrigações que surgem ex vi legis, atreladas a direitos reais, mas com 
eles não se confundem, em sua estruturação. Enquanto estes representam 
ius in re (direito sobre a coisa, ou na coisa), essas obrigações são 
concebidas como ius ad rem (direitos por causa da coisa, ou advindos da 
coisa). 
 
Diniz (2007, p. 13), ao explicar a natureza jurídica das obrigações, 
afirma que a obrigação do tipo propter rem: 
 
É uma figura transacional entre o direito real e o pessoal, consistindo num 
artifício técnico que qualifica uma categoria jurídica que tenha atributos 
tanto de um como de outro. Configura um direito misto, de fisionomia 
autônoma, constituindo um tertium genus, por revelar a existência de 
direitos que não são puramente reais nem essencialmente obrigacionais. 
 
Em resumo, o direito obrigacional regula as relações patrimoniais 
entre sujeitos tendo como objeto a prestação. O direito real, regula as relações de 
um sujeito em face da generalidade de sujeitos e tem como objeto uma coisa. Já a 
obrigação mista situa-se entre o direito obrigacional e o direito real, com a ocorrência 
de direitos obrigacionais com eficácia real. 
 
3.2 Análise sob a ótica dos direitos do consumidor 
Em uma análise sob o ponto de vista dos direitos do consumidor, 
como adiante se verá, não há como afastar que, de fato, incidem as normas 
protetivas embarcadas no Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 1990). 
Verifica-se que desta relação, as partes adequam-se aos conceitos de consumidor, 
disposto no artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor, e de fornecedor, previsto 
no artigo 3º do mesmo Código. 
Inegavelmente, nesta relação entre as prestadoras de serviços de 
fornecimento de água tratada, coleta e remoção de esgoto e de fornecimento de 
energia elétrica, o consumidor é a parte mais vulnerável, merecendo maior atenção 
dentro desta relação. De acordo com Nunes (2018, p. 122), reconhecer a 
19 
 
vulnerabilidade do consumidor, prevista no inciso I do artigo 4º. Do Código de 
Defesa do Consumidor é: 
 
uma primeira medida de realização da isonomia garantida na Constituição 
Federal154.Significa ele que o consumidor é a parte fraca da relação 
jurídica de consumo. Essa fraqueza, essa fragilidade, é real, concreta, e 
decorre de dois aspectos: um de ordem técnica e outro de cunho 
econômico. 
 
Na relação em tela, a proteção aos direitos do consumidor 
estabelecida pelo Código de Defesa do Consumidor visa o cumprimento pelas 
prestadoras de serviço de fornecimento de água tratada, coleta e remoção de esgoto 
e fornecimento de energia elétrica das garantias contratuais e inerentes à 
vulnerabilidade do consumidor. 
Não suficiente, além das regras estampadas no Código de Defesa 
do Consumidor e sem prejuízo destas, as garantias contratuais também se 
encontram acobertadas pela proteção dada pela Lei Federal nº. 8.987, de 13 de 
fevereiro do ano de 1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da 
prestação de serviços públicos. Exemplo de proteção, encontra-se prevista no artigo 
7º do referido dispositivo legal, o qual dispõe sobre os direitos e obrigações dos 
usuários em: 
 
I - receber serviço adequado; 
II - receber do poder concedente e da concessionária informações para a 
defesa de interesses individuais ou coletivos; 
III - obter e utilizar o serviço, com liberdade de escolha entre vários 
prestadores de serviços, quando for o caso, observadas as normas do 
poder concedente; 
IV - levar ao conhecimento do poder público e da concessionária as 
irregularidades de que tenham conhecimento, referentes ao serviço 
prestado; 
V - comunicar às autoridades competentes os atos ilícitos praticados pela 
concessionária na prestação do serviço; 
VI - contribuir para a permanência das boas condições dos bens públicos 
através dos quais lhes são prestados os serviços. 
 
Doutro lado, ao consumidor cabe a contraprestação pelo serviço 
prestado, visando a retribuição dos custos de operação e manutenção dos serviços 
e afim de garantir o equilíbrio econômico-financeiro das prestadoras de serviços, 
como será exposto de forma mais aprofundada no tópico que trata sobre a 
legalidade da cobrança pela prestação do serviço. 
Em vista da reciprocidade de obrigações entre o consumidor e o 
prestador de serviços, surge uma linha tênue para a aplicação da exceção do 
20 
 
 
 
contrato não cumprido. Dispõe o Código Civil, em seu artigo 476, que “nos contratos 
bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir 
o implemento da do outro”. Logo, acaso uma das partes desta relação (consumidor x 
prestador de serviços) deixe de cumprir com sua obrigação, não poderá exigir o 
cumprimento da obrigação pela outra parte. 
Isso quer dizer que para que o prestador do serviço possa exigir do 
consumidor a contraprestação pelo serviço, deverá prestar o serviço de forma 
satisfatoriamente adequada. Por sua vez, o consumidor, para poder exigir a 
continuidade da prestação do serviço pelo prestador, deverá cumprir com a sua 
obrigação com a contraprestação pecuniária. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
21 
 
4 DÉBITOS DE CONSUMO DE SANEAMENTO E ELETRICIDADE 
4.1 Considerações 
 
Uma questão recorrente nos diversos níveis de jurisdição em âmbito 
nacional, o presente trabalho busca, através de uma análise qualitativa, identificar 
qual a possível resposta para o entendimento jurisprudencial sobre a natureza da 
obrigação relativa aos débitos oriundos do consumo de água e de coleta de esgoto e 
de energia elétrica, o qual é unanime em classifica-los como obrigação de natureza 
pessoal. 
Diariamente, em todo o país, discussões judiciais são travadas em 
diversos níveis de jurisdição, sobre a quem recai a obrigação pelo pagamento de 
débitos oriundos de consumo de água tratada, coleta de esgoto e de energia 
elétrica. 
Ainda preso ao conceito de direito obrigacional: 
 
“o débito traduz a prestação a ser espontaneamente cumprida pelo devedor, 
em decorrência da relação de direito material originária. Seria o bem da vida 
solicitado pelo credor, consistente em um comportamento traduzido por um 
dar, fazer ou não fazer. Em suma, cuida-se do direito subjetivo do credor à 
prestação, como um poder jurídico de satisfação de seu interesse” (FARIAS 
e ROSENVALD,2015, p. 17). 
 
Daí, para a necessidade de delimitar a obrigação pelo pagamento 
dos débitos oriundos de consumo de água tratada, coleta de esgoto e de energia 
elétrica, é necessário tecer algumas considerações, inclusive com a interpretação 
sistemática, teleológica-axiológica e sociológica2 dessa relação. 
 
4.2 A prestação do serviço 
Um dos pontos-chave para elucidar a problemática apresentada, é 
entender como ocorre a prestação do serviço de fornecimento de água tratada, 
coleta e remoção de esgoto e de fornecimento de energia elétrica. 
Indiscutivelmente, a relação entre as partes – 
empresas/concessionárias e usuários – é uma relação de consumo, bastante 
regulada pelo Código Civil, pelo Código de Defesa do Consumidor e por outras 
 
2 Para Maximiliano (2011, p. 100), a interpretação sistemática consiste “em comparar o dispositivo 
sujeito a exegese com outros do mesmo repositório ou de leis diversas, mas referentes ao mesmo 
objeto”. Por sua vez, a interpretação teleológica-axiológica postula fins e valoriza as situações 
(FERRAZ JR, 2003, p. 293). Já a interpretação sociológica, é um processo que “conduz à 
investigação dos motivos e dos efeitos sociais da lei” (HERKNHOFF, 1986, p. 28). 
22 
 
 
 
legislações esparsas, como anteriormente apresentado. O entendimento de que se 
trata de uma pura relação de consumo é unanime nos tribunais, conforme o 
entendimento do Superior Tribunal de Justiça, por exemplo: 
 
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO 
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO 
DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. FALTA DE ENERGIA ELÉTRICA 
POR LONGO LAPSO TEMPORAL. PRESCRIÇÃO TRIENAL. 
INAPLICABILIDADE. DANOS ORIUNDOS DE FALHA NO 
FORNECIMENTO. SOLUÇÃO DADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM COM 
BASE NO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. ALTERAÇÃO 
DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. NECESSÁRIO REEXAME DE 
PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DA 
EMPRESA DESPROVIDO. 1. O Tribunal de Apelação, de forma acertada, 
adotou o prazo quinquenal, estabelecido no art. 27 da Lei 8.078/1990. De 
fato, a relação entre a Concessionária de serviço público e o usuário final 
para o fornecimento de serviços essenciais, como a energia, é 
consumerista, sendo cabível o prazo prescricional de 5 anos previsto no 
Diploma Consumerista, em detrimento da prescrição trienal do Código Civil. 
2. Reconhecer a ocorrência do caso fortuito, conforme pretendido pela 
agravante, implicaria o reexame do contexto fático-probatório dos autos, 
circunstância que redundaria na formação de novo juízo acerca de fatos e 
provas, e não de valoração dos critérios jurídicos concernentes à utilização 
da prova e à formação da convicção, o que impede o seguimento do 
Recurso Especial. 3. Agravo Interno da Empresa desprovido. (AgInt no 
AREsp 1443135/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 
PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/11/2020, DJe 17/11/2020). (destacado). 
 
Independentemente se o serviço é prestado através de uma 
autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa privada, os 
procedimentos adotados para a prestação do serviço pouco divergem. Basicamente, 
a relação entre usuário e o prestador de serviços3 inicia-se com a contratação da 
prestação do serviço pelo usuário, sendo firmado contrato de adesão, cabendo à 
contratada prestar os serviços dentro das expectativas contratadas e mediante a 
contraprestação pecuniária. 
Invariavelmente, para início da relação contratual, a prestadora de 
serviços exige do contratante a apresentação de documentos pessoais e de 
documentos do imóvel para onde se dará a prestação do(s) serviço(s). 
A título exemplificativo, a documentação exigida pela Companhia de 
Saneamento Básico do Estado de São Paulo - SABESP (2003): 
 
Pessoa física: RG ou documento equivalente com foto e CPF 
Pessoa jurídica: Entidade Pública: Ofício em papel timbrado do Órgão 
contendo: endereço da ligação, nome e CNPJ da Entidade, telefone para 
 
3 Optou-se pelo termo prestador de serviço para se referir a qualquer modalidade de prestação do 
serviço de fornecimento de água tratada, coleta e remoção de esgoto e de fornecimento de energia 
elétrica, seja por meio de concessão ou pelo próprio Estado. 
23 
 
contato, endereço para entrega das contas , RG ou documento equivalente 
com foto do responsável legal e Cartão do CNPJ. , data de 
propriedade/posse/uso do imóvel, data de vencimento das contas nos casos 
de atendimento a portarias ou regras de exceção ao padrão da esfera que a 
Entidade pertence , secretaria, se possível , Representante Legal: 
Procuração com firma reconhecida e período de vigência expresso , e o 
código de lote da secretaria, se possível. 
Proprietário ou inquilino deve entrar em contato com os dados pessoais 
(Nome completo e CPF ou Razão Social e CNPJ) 
Condomínios: RG ou documento equivalente com foto do Síndico; Cartão do 
CNPJ e Ata de Eleição do Síndico. 
Lanchonetes, barracas, quiosques, trailers, banca de jornal, flores, frutas: 
Alvará de funcionamento da Prefeitura ou Licença de localização expedida 
pelo municipal competente 
Documentos do Imóvel - Original ou cópia autenticada de: Comprovante de 
Propriedade: Carnê do IPTU, ou Contrato de Compra e Venda (registrado 
ou com firma reconhecida) ou Escritura Pública. 
Inquilino: Contrato de locação registrado em Cartório Entidade Pública: 
Contrato de locação, ou Decreto ou Convênios firmados 
 
Igualmente, a documentação exigida pela Empresa Baiana de Águas 
e Saneamento - EMBASA (2020): 
 
Ligação Nova de Água 
Para solicitar este serviço será necessário anexar documento(s) oficial(is) 
com foto que contenha(m) os números de RG e CPF, bem como 
documento(s) que comprove(m) o vínculo do solicitante com o imóvel 
(Escritura, Contrato Particular de Compra e Venda ou Locação, Carnê de 
IPTU) ou outro comprovante de endereço (conta de energia ou telefone ou 
gás) e os formulários abaixo devidamente preenchidos e assinados. 
Caso a documentação de vínculo com o imóvel seja o comprovante de 
endereço, será necessário também anexar a declaração de 
responsabilidade do imóvel abaixo, preenchida e assinada. 
Se for inquilino, será necessário também anexar o formulário de autorização 
abaixo, preenchido e assinado pelo proprietário, juntamente com o 
documento de identificação oficial com foto e CPF do proprietário. 
 
Percebe-se que a simples apresentação de documentos pessoais e 
de um comprovante de endereço, na maioria das vezes, não é suficiente para a 
contratação dos serviços em análise, o que não ocorreria com outros tipos de 
contratação de serviços de bens de consumo. 
Já no caso de fornecimento de energia elétrica, como exemplo, a 
documentação exigida pela empresa Centrais Elétricas de Santa Catarina – 
CELESC (2020): 
 
Por força da Lei Estadual nº 17.492/2018, que dentre outras premissas 
tratou dos critérios para efetuar ligações de energia elétrica em Santa 
Catarina, bem como a documentação necessária para a devida inserção 
dos pedidos no sistema, informamos que a partir do dia 28/09/2020, todas 
as ligações novas onde não exista ainda um número de UNIDADE 
CONSUMIDORA somente poderão ser atendidas mediante apresentação 
do documento de posse do imóvel. Ressaltamos que nos locais apontados 
24 
 
 
 
na ferramenta APP como área legalmente protegida, bem como, nos 
municípios que editaram leis municipais, continua a obrigatoriedade da 
apresentação do alvará de construção ou habite-se acrescido, do 
documento de posse do imóvel. Relacionamos a seguir os principais 
documentos que caracterizam a posse do imóvel: a) escritura, registro do 
imóvel ou certidão de inteiro teor do registro de imóvel (dentro do prazo de 
validade) contendo o endereço de forma clara e completa (logradouro, 
número predial e cidade); b) contrato de compra e venda emitido por 
instituição bancária, contendo o endereço do imóvel de forma clarae 
completa (logradouro, número predial e cidade); c) contrato particular de 
compra e venda, ou de promessa ou compromisso de compra e venda; d) 
contrato de locação; e) escritura, registro do imóvel ou certidão de inteiro 
teor de registro de imóvel (dentro do prazo de validade) com a doação 
formalizada no próprio documento; f) documento de doação; g) contrato de 
arrendamento/comodato; h) formal de partilha. 
 
Especificamente, em se tratando de prestadoras de serviço de 
fornecimento de energia elétrica, tendo em vista que a competência pela prestação 
do serviço (titularidade) é da União, cabe acrescentar que há regulamentação sobre 
o tema, porém o regramento faculta a exigência de documentação do imóvel pelas 
prestadoras. 
Assim dispõe a Resolução Normativa nº. 414 da Agência Nacional 
de Energia Elétrica – ANEEL (BRASIL, 2010): 
 
Art. 27. Efetivada a solicitação do interessado de fornecimento inicial, 
aumento ou redução de carga, alteração do nível de tensão, entre outras, a 
distribuidora deve cientificá-lo quanto à: [...] II – necessidade eventual de: 
[...] h) apresentação de documento, com data, que comprove a propriedade 
ou posse do imóvel; 
 
Já sobre os serviços de abastecimento de água tratada e de coleta e 
remoção de esgotos, a competência é comum entre União, Estados e municípios, 
nos termos do artigo 23, inciso IX da Constituição da República Federativa do Brasil 
(BRASIL, 1988), mas não obstante, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 
de número 1.842 – RJ, o Supremo Tribunal Federal tratou de definir a competência 
municipal pelos serviços de saneamento básico, com a condição de poder 
concedente, nas situações em que a função pública desta prestação de serviços não 
extrapole o interesse local. Uma vez em que a prestação do serviço extrapolado o 
interesse local, no entendimento do Supremo Tribunal Federal, passará a ser 
questão de “natureza de interesse comum no caso de instituição de regiões 
metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, nos termos do art. 25, § 3º, 
da Constituição Federal”. 
Vencida a fase da contratação pelo usuário, ocorre a 
disponibilização do serviço pela prestadora, com a instalação da estrutura 
25 
 
necessária no local pretendido pelo contratante. Uma vez disponibilizado o serviço 
no local apontado pelo contratante, inicia-se a relação de consumo. 
Ocorre que, diferente de outras modalidades de consumo, no caso 
em tela inexiste, em tese, a possibilidade de o contratante usufruir daquele serviço 
em outro local que não onde o serviço está sendo disponibilizado. Não há como o 
usuário/consumidor levar consigo o serviço contratado naquele determinado local 
onde foi disponibilizado por total impossibilidade prática. Imagine-se, neste ponto, 
que se o consumidor quisesse carregar consigo a prestação do serviço de 
fornecimento de energia elétrica, por exemplo, deveria valer-se de uma extensão 
elétrica infinitamente extensa. O serviço contratado (ligação predial), então, passa a 
ser como uma parte integrante do local onde foi disponibilizado pela prestadora do 
serviço, como se fosse uma benfeitoria vinculada ou um assessório do imóvel. 
E uma vez iniciada a prestação do serviço ao contratante, exigível a 
contraprestação pecuniária por parte da contratada. O cerne da presente análise se 
dá justamente quando o contratante deixa de cumprir com a prestação da obrigação 
de pagar à contratante pelo serviço consumido. E a consequência desse 
inadimplemento é o tema de divergência e embate a ser tratado, eis que busca 
responder se os débitos oriundos dessa relação são dotados de natureza pessoal ou 
propter rem. 
 
4.3 Legalidade da cobrança do débito 
Além da análise da natureza da obrigação pelo pagamento dos 
débitos oriundos de consumo de água tratada, coleta e remoção de esgoto e de 
energia elétrica, importante o estudo sobre o amparo legal para tais cobranças. 
Com relação à cobrança pelo consumo de água tratada e coleta e 
remoção de esgoto, a legalidade encontra-se respaldada no texto da Lei Federal nº. 
11.445 de 05 de janeiro de 2007 (BRASIL, 2007), com base na garantia da 
universalização do saneamento e eficiência e sustentabilidade econômica do 
prestador do serviço, conforme artigos a seguir: 
 
Art. 2o Os serviços públicos de saneamento básico serão prestados com 
base nos seguintes princípios fundamentais: 
I - universalização do acesso e efetiva prestação do serviço; 
[...] 
VII - eficiência e sustentabilidade econômica; 
[...] 
26 
 
 
 
XIV - prestação regionalizada dos serviços, com vistas à geração de ganhos 
de escala e à garantia da universalização e da viabilidade técnica e 
econômico-financeira dos serviços; 
[...] 
Art. 29. Os serviços públicos de saneamento básico terão a sustentabilidade 
econômico-financeira assegurada por meio de remuneração pela cobrança 
dos serviços, e, quando necessário, por outras formas adicionais, como 
subsídios ou subvenções, vedada a cobrança em duplicidade de custos 
administrativos ou gerenciais a serem pagos pelo usuário; 
Art. 30. Observado o disposto no art. 29 desta Lei, a estrutura de 
remuneração e de cobrança dos serviços públicos de saneamento básico 
considerará os seguintes fatores: 
[...] 
III - quantidade mínima de consumo ou de utilização do serviço, visando à 
garantia de objetivos sociais, como a preservação da saúde pública, o 
adequado atendimento dos usuários de menor renda e a proteção do meio 
ambiente; 
IV - custo mínimo necessário para disponibilidade do serviço em quantidade 
e qualidade adequadas; 
 
Da mesma forma regula o Decreto Federal nº. 7.217 de 21 de junho 
de 2010 (BRASIL, 2010), o qual regulamentou a Lei Federal nº 11.445/2007, ao 
estabelecer que: 
 
Art. 3o Os serviços públicos de saneamento básico possuem natureza 
essencial e serão prestados com base nos seguintes princípios: 
I - universalização do acesso; 
[...] 
VII - eficiência e sustentabilidade econômica; 
[...] 
Art. 45. Os serviços públicos de saneamento básico terão sustentabilidade 
econômico-financeira assegurada, sempre que possível, mediante 
remuneração que permita recuperação dos custos dos serviços prestados 
em regime de eficiência: 
I - de abastecimento de água e de esgotamento sanitário: preferencialmente 
na forma de tarifas e outros preços públicos, que poderão ser estabelecidos 
para cada um dos serviços ou para ambos conjuntamente; 
II - de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos urbanos: taxas ou 
tarifas e outros preços públicos, em conformidade com o regime de 
prestação do serviço ou de suas atividades; e 
III - de manejo de águas pluviais urbanas: na forma de tributos, inclusive 
taxas, em conformidade com o regime de prestação do serviço ou de suas 
atividades. 
 
Já em relação à cobrança pelo consumo de energia elétrica, esta 
encontra-se regulada através de resoluções da Agência Nacional de Energia Elétrica 
(ANEEL), que é uma entidade autárquica federal que atua sob regime especial e foi 
instituída pela Lei Federal nº. 9427 de 26 de dezembro de 1996 (BRASIL, 1996). A 
Resolução nº. 414 de 09 de setembro de 2010 da ANEEL (BRASIL, 2010) 
estabelece que: 
 
27 
 
Art. 53-A. Pela prestação do serviço público de distribuição de energia 
elétrica a distribuidora deve cobrar as tarifas homologadas pela ANEEL nos 
processos tarifários. 
 
Não diferente, a Lei Federal nº. 8.987, de 13 de fevereiro do ano de 
1995 (BRASIL, 1995), dispõe, no § 2º. do artigo 9º., que “os contratos poderão 
prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio 
econômico-financeiro”. 
Além disso, a legalidade da cobrança também pode ser observada a 
partir dos seguintes julgados: 
 
ADMINISTRATIVO - ENERGIA ELÉTRICA - CORTE – FALTA DE 
PAGAMENTO - É lícito à concessionária interromper o fornecimento de 
energia elétrica, se, após aviso prévio, o consumidor de energia elétrica 
permanecer inadimplente no pagamento da respectiva conta (L. 8.987/95, 
Art. 6º, § 3º,II). (REsp 363.943/MG. Ministro Humberto Gomes de Barros, 
Julgado em 10/03/2003, DJ 01/03/2004) 
 
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL. CONDOMÍNIO. HIDRÔMETRO 
ÚNICO. MULTIPLICAÇÃO DO CONSUMO MÍNIMO PELO NÚMERO DE 
ECONOMIAS. ILEGALIDADE. 1. O STJ reconhece a legalidade da 
cobrança de consumo de água pelo valor correspondente à tarifa mínima, 
ainda que haja hidrômetro a registrar consumo inferior àquele. 2. Contudo, 
nos casos em que o condomínio dispõe de um único hidrômetro, a 
concessionária não pode multiplicar o consumo mínimo pelo número de 
unidades autônomas, desprezando o consumo efetivo. Precedentes do STJ. 
3. Orientação reafirmada no julgamento do REsp 1.166.561/RJ, sob o rito 
dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC). 4. Agravo Regimental não 
provido. (AgRg no AREsp 124.466/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, 
SEGUNDA TURMA, julgado em 20/09/2012, DJe 10/10/2012). 
 
Logo, evidente que existente o respaldo legal para a cobrança pela 
prestação de tais serviços, assim como também declina o entendimento 
jurisprudencial. 
 
4.4 Conflito de interesses - uma análise sob a ótica do interesse público 
Fugindo um tanto da análise sob a ótica da natureza da obrigação, 
há de ser considerada, além do ponto de vista dos direitos do consumidor, a questão 
sob a ótica do interesse público. 
Mello (2015, p. 62) conceitua o interesse público como “interesse 
resultante do conjunto dos interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando 
considerados em sua qualidade de membros da Sociedade e pelo simples fato de o 
serem”. Para Di Pietro (2012, p. 66), a supremacia do interesse público é o “princípio 
que hoje serve de fundamento para todo o direito público e que vincula a 
28 
 
 
 
Administração em todas as suas decisões: o de que os interesses públicos têm 
supremacia sobre os individuais”. 
Notável que a prestação de serviços abordada, além de 
essencialidade, reveste-se de interesse público, uma vez em que se traduz no 
interesse da coletividade. Não se pode afastar, também, o interesse público em 
relação à defesa dos direitos do consumidor. Logo, existe um ponto que há de ser 
equilibrado na questão: tratar do interesse público com que a prestação dos serviços 
abordados se reveste, mas sem despir os interesses privados e a essencialidade por 
natureza de sua prestação. 
No caso em análise, o interesse público transparece tanto na 
essencialidade da prestação do serviço, como na sua continuidade, além do viés 
social presente na necessidade de universalização do saneamento ambiental e de 
acesso e uso da energia elétrica e como forma de redução da desigualdade. Já o 
interesse privado, se apresenta de maneira mais específica, no atendimento 
individual do usuário do serviço, que pode ser representado também no interesse 
pela continuidade da prestação do serviço, na modicidade da tarifa, na eficácia do 
prestador do serviço e na sua legítima expectativa com relação ao serviço prestado. 
Sobre a essencialidade da prestação do serviço, a Lei Federal nº. 
7.783, de 28 de junho de 1989 (BRASIL, 1989), ainda que trate sobre o exercício de 
greve, tratou por definir os serviços ou atividades tidas como essenciais, dispondo 
que, dentre outros, o tratamento e abastecimento de água, produção de energia 
elétrica, captação e tratamento de esgoto fazem parte desse rol (artigo 10, incisos I e 
VI). Assim tidos como serviços essenciais, não admitem a sua paralisação, 
pressupondo o dever de sua continuidade na prestação. 
E sobre a questão da universalização do saneamento, o inciso III do 
artigo 3º da Lei Federal nº. 11.445, de 5 de janeiro de 2007, conceitua que 
universalização é: “ampliação progressiva do acesso de todos os domicílios 
ocupados ao saneamento básico, [...], incluídos o tratamento e a disposição final 
adequados dos esgotos sanitários”. Em sentido semelhante, o conceito para acesso 
e uso da energia elétrica, de acordo com os termos e critérios estabelecidos pela Lei 
Federal nº. 10.438, de 26 de abril de 2002. 
A desigualdade, de acordo com algumas das definições dadas pelo 
dicionário Michaelis, significa “atributo de pessoa ou coisas distintas; dessemelhança, 
diferença” ou ainda “falta de equilíbrio; disparidade, distância” (MICHAELIS, 2021). 
29 
 
Pela análise dos conceitos, evidente que existem convergências em 
relação aos interesses públicos e privados, contudo, como já expressado, pela 
natureza dos serviços prestados, o caráter social é muito mais relevante quando em 
oposição aos direitos individuais. 
Ocorre que a imposição de classificar os débitos oriundos de 
consumo de água potável, coleta e remoção de esgoto e de consumo de energia 
elétrica como de natureza propter personam ao invés de propter rem aparenta 
expressar uma conotação que privilegia o interesse coletivo, eis que impede a 
cobrança de tais débitos de pessoas que, em teoria, não tenham tido relação com o 
consumo que originou tais débitos. Contudo, em uma segunda análise, tal 
classificação pode causar impactos que podem causar reflexos na sociedade como 
um todo. 
Explica-se que há o risco de os índices de inadimplência 
apresentarem crescimento com a manutenção do posicionamento em relação à 
natureza da obrigação pelo pagamento dos débitos, ao vincular o débito ao usuário. 
Isso porque ao permitir a cobrança do débito somente em relação ao consumidor, 
restringe-se as possibilidades de recuperação do débito. No caso fosse possível a 
vinculação do débito ao imóvel, admitindo-se a classificação como de natureza 
propter rem, imperioso seria a necessidade do adimplemento do débito para haver a 
continuidade da prestação do serviço. 
A relevância de tal análise explica-se pelo fato de que, conforme 
Santos (2003 apud SATO, 2013, p. 30): 
 
o controle da evasão de receitas e da inadimplência é um fator determinante 
para o equilíbrio econômico-financeiro de qualquer organização. Diante 
desta perda de receita, há uma necessidade premente na quitação destes 
débitos pelos clientes para melhorar a saúde financeira desta organização. 
 
Apesar da possibilidade dos prestadores de serviços se valerem das 
formas de cobrança contra o usuário inadimplente, como o envio de avisos, 
negativação financeira, cobrança extrajudicial, cobrança judicial etc, conforme Sato 
(2013, p. 61), não há garantias de que o prestador de serviços receba o valor devido, 
sendo que em muitos casos o usuário não dispõe nem mesmo de bens para 
penhora. 
Isso sem mencionar a possibilidade de o usuário se utilizar de meios 
até fraudulentos para se esquivar do pagamento do débito, podendo transferir a 
30 
 
 
 
titularidade da unidade consumidora para terceiro e continuar usufruindo do serviço. 
Não há como o prestador de serviços garantir que a pessoa que titulariza o serviço e 
conste na fatura emitida seja a mesma que usufruiu do serviço que originou o débito. 
Inexistem mecanismos que obriguem os usuários a manterem os cadastros das 
unidades consumidoras devidamente atualizados e também não há como o 
prestador de serviços certificar-se de que a pessoa que titulariza a unidade 
consumidora de fato é a que consome o serviço no local da prestação. 
Como consequência da impossibilidade de outros meios de 
cobrança do débito e diante do aumento da inadimplência, pode ocorrer o 
encarecimento dos serviços. Também restaria prejudicada a adoção da política de 
universalização do saneamento e de acesso à energia elétrica, indo na contramão 
da necessidade e realidade brasileira, sobretudo em prejuízo para a população de 
menor poder aquisitivo, o que pode ser entendido como o fator do conflito de 
interesses no caso. 
 
4.5 Ausência de legislação específica 
Como anteriormente abordado, ficou à critério da doutrina e da 
jurisprudência delimitar a questão referente a natureza da obrigação em relação aos 
débitos oriundos do consumo de água tratada, coleta e remoção de esgoto e de 
consumo de energia elétrica. Ainda que em alguns estadoshaja algum tipo de 
regulamento ou até mesmo decreto sobre o tema, ainda assim, a jurisprudência tem 
se posicionado no sentido de que tais dispositivos não têm força normativa, como é 
o caso do Distrito Federal. 
Por exemplo, no Distrito Federal, vigora o Decreto Distrital nº. 26.590, 
de 23 de fevereiro de 2006 (BRASÍLIA, 2006), o qual dispõe expressamente em seu 
artigo 59 que: 
 
Art. 59. O proprietário do imóvel responde solidariamente pelos débitos 
devidos à CAESB, que deixarem de ser pagos pelo inquilino. 
Parágrafo único. O imóvel responderá como garantia por quaisquer débitos 
devidos à CAESB. 
 
Porém, mesmo havendo tal previsão, o Tribunal de Justiça do 
Distrito Federal e Territórios tem entendimento de que tal dispositivo não tem o 
condão de gerar direitos e obrigações, como no julgamento do recurso de embargos 
infringentes nº. 735.748: 
31 
 
 
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO DE 
COBRANÇA. DÉBITO REFERENTE A SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE 
ÁGUA E COLETA DE ESGOTO. RELAÇÃO CONTRATUAL DE DIREITO 
PRIVADO ENTRE O USUÁRIO E A CONCESSIONÁRIA. DEMANDA 
PROPOSTA CONTRA O PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. OBRIGAÇÃO DE 
NATUREZA PESSOAL. INEXISTÊNCIA DE SOLIDARIEDADE. 
1.Nos termos do artigo 265 do Código Civil, "A solidariedade não se 
presume; resulta da lei ou da vontade das partes". 
2.Muito embora o artigo 59 do Decreto nº 26.590/2006, estabeleça que "O 
proprietário do imóvel responde solidariamente pelos débitos devidos à 
CAESB, que deixarem de ser pagos pelo inquilino", o dispositivo em 
questão não tem força normativa para estabelecer a solidariedade, 
porquanto não se trata de lei em sentido estrito, apta a criar direitos e 
obrigações, eis que se destina apenas a regulamentar norma legal 
preexistente. 3. A celebração de contrato de prestação de serviços de 
fornecimento de água e captação de esgoto é de natureza facultativa, o que 
conduz à conclusão de que o proprietário do imóvel não pode ser compelido 
a saldar débitos relativos a faturas emitidas em nome do ocupante do bem, 
sem que tenha expressamente manifestado anuência neste sentido, 
devendo a obrigação ser imputada exclusivamente ao beneficiário do 
serviço. 4.Recurso conhecido e provido. 
 
O Estado do Paraná muito recentemente aprovou a Lei nº. 
20.259/2020, de 15 de julho de 2020 (PARANÁ, 2020), que obriga a transferência da 
titularidade dos serviços de abastecimento de água e de coleta de esgoto para o 
consumidor final, desde que haja expressa solicitação. Mas além de tal obrigação, a 
nova lei também abarca um artigo tratando especificamente sobre situações em que 
existam débitos pendentes sobre a unidade consumidora: 
 
Art. 2º Em caso de existência de débitos na unidade consumidora, 
condiciona a transferência da titularidade da conta de água e de esgoto do 
consumidor final, para um novo possuidor ou o retorno para o proprietário 
do imóvel, à formalização do parcelamento e regular adimplemento com a 
respectiva concessionária de serviço. 
 
Contudo, no caso da legislação do Estado do Paraná, ainda não é 
possível verificar qual será a interpretação dada pelo judiciário, eis que não é 
possível, até o momento, localizar nenhum julgamento do tema sobre a égide da 
nova lei. 
A ausência de uma legislação sólida que abarque o assunto e que 
defina com clareza a classificação da natureza da obrigação relativa ao pagamento 
de débitos oriundos de consumo de água tratada, coleta e remoção de esgoto e de 
consumo de energia elétrica, somada às normas locais e até mesmo aos interesses 
das prestadoras de serviço, empurram a discussão para um caminho sem luz, o que 
causa uma consequente insegurança jurídica. 
Segurança jurídica, que nas palavras de Silva (2006, p. 133): 
32 
 
 
 
 
“consiste no conjunto de condições que tornam possível às pessoas o 
conhecimento antecipado e reflexivo das consequências diretas de seus 
atos e de seus fatos à luz da liberdade reconhecida. Uma importante 
condição da segurança jurídica está na relativa certeza que os indivíduos 
têm de que as relações realizadas sob o império de uma norma devem 
perdurar ainda quando tal norma seja substituída" 
 
Ainda que a jurisprudência se encarregue de dar uma solução ao 
seu jeito ao problema, este instituto não pode substituir o papel do legislador, pois, 
como afirma Diniz (2009, p. 299), “é certo que, tanto na França como no Brasil, o juiz 
não tem o poder de legislar” e o papel da jurisprudência, conforme a mesma autora, 
é o de resumir “uma tendência sobre determinada matéria, decidida contínua e 
reiteradamente pelo tribunal, constitui uma forma de expressão jurídica, por dar 
certeza a certa maneira de decidir” (DINIZ, 2009, p. 301). 
Logo, o papel do juiz é o de dar solução ao litígio de acordo com o 
teor do texto legal e nada mais, devendo se ater ao caso concreto, não cabendo a 
ele fazer a lei, sob pena de usurpação de poder, além de correr o risco de decidir 
fora dos limites da lide. Já à doutrina, cabe o papel de estudar e de interpretar as leis, 
se revelando em “esquemas teóricos indispensáveis para que a lei e as demais 
normas jurídicas possam alcançar seu fim, sempre representado por um valor” 
(ENGE, 2001, p. 88). 
No caso, evidente a necessidade de uma lei abarcar o tema de 
maneira definitiva, pois “a lei sempre visa aos fins sociais do direito e às exigências 
do bem comum, ainda que, de fato, possa parecer que eles não estejam sendo 
atendidos” (FERRAZ JR, 2003, p. 294), visando pôr fim ao que parece ser uma 
batalha jurídica às cegas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
33 
 
5 POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS 
Nem sempre o posicionamento dos tribunais foi unânime. Durante 
muito tempo, antes de o Superior Tribunal de Justiça “pacificar” o tema, havia muita 
divergência com relação a classificação da natureza da obrigação em relação ao 
pagamento do débito oriundo da prestação de serviço de fornecimento de água 
tratada, coleta e remoção de esgoto e de fornecimento de energia elétrica. 
No ano de 2005, o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio 
Grande do Sul, ao julgar o recurso de Apelação Cível nº. 70012757647, de relatoria 
do Desembargador Roque Joaquim Volkweiss, foi no sentido de que a 
responsabilidade pelo pagamento do débito oriundo de consumo de água tratada e 
de coleta de esgoto tem natureza propter rem: 
 
DIREITO ADMINISTRATIVO. 1. CONTRAPRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE 
FORNECIMENTO DE ÁGUA E DE SANEAMENTO (ESGOTO) PELA 
CORSAN: Contribuinte de preço d’água e de esgoto é sempre o titular do 
imóvel utente ou beneficiário do serviço. Com a transcrição do título 
aquisitivo no Registro de Imóveis (arts. 530, I e 860, parágrafo único, do 
Código Civil) se opera, automaticamente, perante o sujeito ativo respectivo, 
a transferência da sujeição passiva das obrigações que tenham por fato 
gerador a propriedade ou domínio útil do imóvel, seja ao novo “contribuinte” 
(em relação aos débitos futuros), ou ao “responsável” (em relação a 
eventuais débitos anteriores), daí se concluindo que o débito relativo a 
consumo de água situa-se entre as obrigações reais (propter rem), ou seja, 
acompanha o imóvel [...]. (Segunda Câmara Civil do TJRS, Apelação Cível 
n° 70012757647, Relator Des. Roque Joaquim Volkweiss, 16 de novembro 
de 2005). 
 
Outra decisão do mesmo órgão, no julgamento do recurso de 
Apelação Cível nº. 70012374559, de relatoria do Desembargador Francisco José 
Moesch, o mesmo entendimento foi aplicado: 
 
APELAÇÃO CÍVEL. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. 
CORSAN. INADIMPLEMENTO DO ANTIGO PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. 
OBRIGAÇÃO PROPTER REM. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA 
ATUAL PROPRIETÁRIA PELO DÉBITO. NEGATIVA DO FORNECIMENTO 
DE ÁGUA POR INADIMPLÊNCIA DO CONSUMIDOR. ILEGALIDADE. 
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCABIMENTO NO CASO 
CONCRETO. PRELIMINAR REJEITADA. APELO PARCIALMENTE 
PROVIDO. (TJ/RS - APELAÇÃO CÍVEL N° 70012374559 DE 14 DE 
DEZEMBRO DE 2005). 
 
Já no ano de 2009, o Tribunal de Justiça de São Paulo, no 
julgamentodo recurso de Apelação Cível nº. 963460006, de relatoria da 
Desembargadora Cristina Zucchi, aplicou o mesmo entendimento em relação à 
natureza da obrigação pela responsabilidade do pagamento do débito de consumo 
34 
 
 
 
de água: 
 
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - COBRANÇA - FORNECIMENTO DE ÁGUA 
E ESGOTO - LOCATÁRIO QUE DEIXA DE PAGAR AS CONTAS DE 
CONSUMO - RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL - 
OBRIGAÇÃO "PROPTER REM" - CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE 
MORA INCIDENTES A PARTIR DO VENCIMENTO - DÍVIDA LÍQUIDA - 
SENTENÇA MANTIDA. Apelação improvida. (TJ-SP - CR: 963460006 SP, 
Relator: Cristina Zucchi, Data de Julgamento: 02/02/2009, 34ª Câmara de 
Direito Privado, Data de Publicação: 17/02/2009). 
 
Há não muito tempo, a questão era simplesmente julgada pelo 
Superior Tribunal de Justiça no sentido de afastar a responsabilidade do novo 
proprietário em relação à dívida preterida do proprietário anterior, sem discutir o 
mérito sobre a natureza da obrigação. Neste sentido, o julgamento do recurso de 
Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº. 1.107.257/RJ no ano de 
2009, de relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques: 
 
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SUSPENSÃO DO 
FORNECIMENTO DE ÁGUA. DÉBITOS DE CONSUMO DO ANTIGO 
PROPRIETÁRIO. DÍVIDA CONSOLIDADA. IMPOSSIBILIDADE. DISSÍDIO 
JURISPRUDENCIAL NÃO-CARACTERIZADO.1. A questão resume-se à 
possibilidade ou não da suspensão do fornecimento de água em razão de 
débito de consumo gerado pelo antigo proprietário do imóvel.2. No caso, 
independentemente da natureza da obrigação (se pessoal ou propter rem), 
não cabe a suspensão do fornecimento de água por se tratar de débito 
consolidado. Ou seja, o novo proprietário do imóvel está sendo privado do 
fornecimento em razão de dívida pretérita do antigo morador, hipótese que 
não encontra albergue na jurisprudência do STJ.3. A Primeira Turma 
concluiu que o art. 6º, § 3º, II, da Lei n.8.987/95 refere-se ao 
inadimplemento do usuário, ou seja, do efetivo consumidor do serviço. 
Inviável, portanto, responsabilizar o atual usuário por débito pretérito relativo 
ao consumo de água do anterior.4. Recurso especial não-provido. 
 
A partir deste entendimento reiterado em diversas decisões da Corte 
Superior, foi firmado o entendimento que predomina até os dias atuais, entendendo-
se pela impossibilidade de vinculação dos débitos ao imóvel, mas sim ao sujeito que 
solicitou a prestação do serviço. Neste sentido, decidiu o Superior Tribunal de 
Justiça no ano de 2012, ao julgar o recurso de Agravo Regimental no Agravo em 
Recurso Especial nº. 162.967/SP, de relatoria do Ministro Herman Benjamin: 
 
PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE ÁGUA. INADIMPLEMENTO. 
OBRIGAÇÃO PESSOAL. SÚMULA 83/STJ. DECRETO ESTADUAL 
41.446/1996. LEI LOCAL. SÚMULA 280/STF. 1. Inviável analisar suposto 
direito amparado em legislação estadual, notadamente o Decreto 
41.446/1996, porquanto defeso ao STJ reexaminar Direito local. Aplica-se, 
por analogia, a Súmula 280/STF: "Por ofensa a direito local não cabe 
Recurso Extraordinário". 2. A jurisprudência do STJ é no sentido de que a 
exigência de pagar à agravante pelo fornecimento de água é destituída da 
35 
 
natureza jurídica de obrigação propter rem, pois não se vincula à titularidade 
do bem, mas ao sujeito que manifesta vontade de receber os serviços. 
Incidência da Súmula 83/STJ.3. Agravo Regimental não provido. 
 
Porém, ainda que a Corte se firme no entendimento pela 
classificação como natureza propter personan, ainda no ano de 2019 foi possível 
constatar decisão em que tal entendimento foi aplicado de forma mitigada, 
admitindo-se que o débito seja cobrado do proprietário do imóvel em caso de não 
atualização da titularidade contratual. No julgamento do recurso de Agravo em 
Recurso Especial nº. 1.557.116, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, 
reconheceu-se a legitimidade passiva do proprietário do imóvel em ação de 
cobrança de débito de consumo de água tratada, mesmo com a comprovação nos 
autos de que o imóvel havia sido locado para terceiro: 
 
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO EM RECURSO 
ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE FORNECIMENTO DE ÁGUA 
E ESGOTO. PAGAMENTO DO DÉBITO DE CONSUMO. OBRIGAÇÃO 
PESSOAL. EXISTÊNCIA DE CONTRATO DE LOCAÇÃO NÃO 
INFORMADO À CONCESSIONÁRIA. RESPONSABILIDADE DO 
PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. [...] no caso dos autos, não 
obstante tenha havido contrato de locação do imóvel, não houve a 
alteração da titularidade contratual perante a concessionária do 
serviço. Assim, considerando que o proprietário do bem permaneceu 
inscrito como titular do serviço nos cadastros da concessionária, 
que não foi informada da existência do contrato de locação, não há 
como imputar a ela a obrigação de cobrar os custos de terceiro 
(locatário), que com ela sequer manteve relação contratual. 3. Por 
conseguinte, não há falar em ilegitimidade da recorrente, 
proprietária do imóvel, para figurar na presente execução fiscal, 
não podendo se eximir de sua obrigação contratual perante a 
concessionária de pagamento dos pelos serviços prestados, cujas 
faturas de consumo estão regularmente em seu nome, sem prejuízo de 
eventual direito de regresso em face do inquilino. 
 
A mesma sorte segue a discussão em relação aos débitos oriundos 
do consumo de energia elétrica, sendo que o entendimento pacífico é no sentido de 
que a obrigação possui natureza pessoal. Mas não é por isso que não ocorre certa 
divergência com relação também a esta discussão. No julgamento do recurso de 
Agravo Interno em Recurso Especial nº. 1.105.681/SP, de relatoria do Ministro 
Gurgel de Faria, o Superior Tribunal de Justiça entendeu no ano de 2018 que, ainda 
que comprovado que o usuário era inquilino do imóvel e que é o responsável pelo 
pagamento das faturas de energia elétrica, não tendo sido providenciada a alteração 
de titularidade do contrato com a prestadora do serviço, o inquilino não tem 
legitimidade para discutir a relação contratual: 
36 
 
 
 
 
[...] a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça já entendeu que a 
responsabilidade do locatário pelo pagamento da tarifa de energia não o 
legitima a discutir perante a concessionária a fruição do contrato respectivo 
(de fornecimento de energia). [...] No caso dos autos, os agravantes, na 
condição de locatários, deixaram de providenciar a mudança da titularidade 
do contrato do serviço em comento (de fornecimento de energia elétrica) e a 
pendência de pagamento da(s) conta(s), ocorrida na fluência da locação, 
ensejou o corte (de energia) da unidade. 
 
O que chama a atenção é que o entendimento acima vai em 
contradição com os próprios fundamentos do mesmo acórdão e com o entendimento 
da Corte: 
 
Desse modo, a dívida oriunda de eventual inadimplemento das faturas não 
se vincula à "titularidade do bem, mas ao sujeito que manifesta vontade de 
receber os serviços" (AgRg no REsp 1320974/SP , Rel. Ministro 
BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/08/2014, DJe 
18/08/2014). 
 
O questionamento que fica é que se o simples fato de o inquilino ter 
se utilizado da prestação do serviço de fornecimento de energia elétrica já não 
manifestava a sua vontade de receber tal serviço? 
Muito próximo deste entendimento, o Tribunal de Justiça do Paraná, 
ao decidir o recurso inominado nº. 0008287-42.2017.8.16.0031, de relatoria do Juiz 
Marco Vinicius Schiebel decidiu que é legítima a recusa da prestadora de serviço no 
caso de ausência da comprovação da posse do imóvel para onde solicitou-se a 
instalação da ligação predial: 
 
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER EM FACE DA COMPANHIA DE 
SANEAMENTO DO PARANÁ E ENERGISA SUL SUDESTE 
DISTRIBUIDORA DE ENERGIA ELÉTRICA S.A. – RECUSA DAS 
RECLAMADAS NO FORNECIMENTO DE ÁGUA E ENERGIA ELÉTRICA – 
IMÓVEL DESPROVIDO DE COMPROVAÇÃO DE LEGITIMIDADE DA 
POSSE – INEXISTE DOLO OU OMISSÃO DAS RECLAMADAS QUE SE 
NEGARAM EM FORNECER OS SERVIÇOS – RECUSA LEGÍTIMA – 
PREVALECE

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