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Linguagem Fotográfica Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Me. Rita Garcia Jimenez Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin Linguagem Fotográfica • Pintura x Fotografia; • Nascimento de uma Nova Linguagem; • Da Experimentação à Consolidação de uma Linguagem; • O Fotógrafo; • Fotógrafos e Linguagem Pessoal; • Por Que Fotografar? · Apreender o conceito de Linguagem Fotográfica por meio de aspec- tos conceituais, históricos e estéticos; · Apreciar, analisar significativamente, ler e criticar trabalhos de profissio- nais representantes de movimentos artísticos no mundo da Fotografia; · Valorizar a pesquisa sobre os aspectos conceituais, históricos, estéti- cos e operacionais da Linguagem Fotográfica. OBJETIVO DE APRENDIZADO Linguagem Fotográfi ca Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você também encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Linguagem Fotográfica Pintura x Fotografia “Essa indústria, ao invadir os territórios da arte, tornou-se sua inimiga mortal”. Charles Baudelaire (COSTA, 2006, p. 52). Charles-Pierre Baudelaire (1821-1867), o poeta e teórico da Arte francesa do início do século XIX, sabia que a chegada da fotografia impactaria e transformaria completamente o ambiente da Arte. Muitos artistas se perguntaram: E, agora? Para eles, estava surgindo uma ferramenta mais eficiente na Arte do retrato e do registro: era rápida e eficiente. Já outros se sentiram aliviados de não mais precisarem se ocupar em retratar paisagens e pessoas de forma fidedigna, ficando livres para criar. Figura 1 – Louis-Jacques-Mandé Da guerre. Boulevard Du temple, Paris, 1838. Daguerreótipo Fonte: HACKING, 2012 O novo causa grande estranhamento – é o diferente e o desconhecido chegando – e também insegurança naqueles que tinham uma posição privilegiada dentro daquele contexto. De fato, a invenção da Fotografia foi uma revolução: fragmentos do mundo podiam ser captados e aprisionados em uma superfície. No início, de tão surpreendente que era, as pessoas se submetiam a ficar paradas por muitos minutos na frente de uma Câmera Fotográfica, para passar pela experiência de terem sua imagem congelada e impressa: Os retratos dessa época (...) insinuam, de fato, uma austeridade vitoriana. Mostram pessoas compenetradas, com fisionomias rígidas, em atitudes de profunda meditação ou com ares de graves preocupações (...) Para tentar 8 9 um resultado mais ameno era preciso sorrir e continuar “sorrindo”, durante uns cinco ou dez minutos, deixando patentes na rigidez dos músculos que sustentam o sorriso as limitações da técnica (KUBRUSLY, p. 40). A Pintura sentiu profundamente que uma grande parte da sua clientela se deslumbraria com a nova técnica, mas, ainda que isso fosse verdade, logo se percebeu que se tratavam de Linguagens diferentes. A novidade no campo da representação fez com que a Pintura fosse obrigada a buscar a sua essência, enquanto Linguagem Pictórica, levando-a a encontrar sua verdadeira alma. Seus elementos – como cor, materialidade, luz, pincelada – começaram a ser explorados por meio das vanguardas, grupos de artistas que exploravam as diversas potencialidades da Linguagem. Nascimento de uma Nova Linguagem O homem sempre sentiu necessidade de se expressar, de se comunicar com as outras pessoas e também com o universo, por meio de seus rituais. A comunicação, seja ela verbal ou não verbal, dá-se por meio de uma determinada Linguagem, que tem características específicas e elementos próprios que se combinam para criar sentido e forma. Produzir linguagem é um ato criador! Criar é, basicamente, formar. É poder dar uma forma a algo novo. Em qualquer que seja o campo de atividade, trata-se, nesse “novo”, de novas coerências que se estabelecem para a mente humana, fenômenos relacionados de modo novo e compreendidos em termos novos. O ato criador abrange, portanto, a capacidade de compreender; e esta, por sua vez, a de relacionar, ordenar, configurar, significar (OSTROWER, 1986, p. 9). Assim é com a Música, a Literatura, as Artes... o poeta, por exemplo, cria suas poesias selecionando palavras e as organizando de tal forma a criar um determinado sentido para o todo. Seu elemento principal é a palavra e o que faz de seu trabalho significativo é a forma como as organiza. A Fotografia, capaz de captar as imagens a que se propunha, surgiu como um novo produto, a partir de muita pesquisa, estudo e experimentações. Sua invenção foi fruto do trabalho incansável de vários homens, encantados pelas imagens formadas pela Camera obscura (Figura 2), usada por Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.), apaixonados pelo desafio de capturar imagens e deslumbrados pela máquina, que surgiu naquele momento, com o processo de industrialização. 9 UNIDADE Linguagem Fotográfica Figura 2 – Câmera escura de Joseph Nicéphore Niépce, c.1820-30. Museu Nicéphore Niépce. Fonte: Wikimedia Commons A Câmera escura foi a grande inspiração para os inventores da Fotografia. É uma caixa com paredes opacas e com um orifício em um de seus lados, por onde entra um feixe de luz, que reproduz em seu interior, na superfície da parede paralela ao orifício, uma imagem invertida de um objeto. Na Antiguidade, era usada por Aristóteles para fazer observações astronômicas e sabe-se que o famoso pintor renascentista Leonardo Da Vinci a utilizava como instrumento para auxiliar o desenho. Ele a chamava de Olho Artificial. Ex pl or O surgimento da Fotografia fez nascer uma nova Linguagem com elementos específicos que se relacionam a outros, próprios da Linguagem Visual, como ponto, linha, forma, cor e textura. O termo Fotografia, originário do grego, significa escrever com luz. Esse é o elemento essencial dessa nova forma de comunicação. No lugar da tinta, é a luz que registra a imagem de um objeto, com o auxílio da Câmera Fotográfica, a nova Câmera Escura. O fazer artístico se dá por meio do olhar do fotógrafo, que seleciona a parte do mundo que lhe interessa, através do visor da máquina, que delimita o campo a ser trabalhado. Assim, um fragmento do mundo é captado pela luz, depois de ser escolhido por um olhar, muitas vezes atento e curioso,com o auxílio de um equipamento fotográfico. Além da luz, o espaço e otempo são fundamentais na criação de uma fotografia. Ao enquadrar um determinado assunto dentro do visor da máquina, o fotógrafo delimita um espaço, onde se dará a imagem, ao mesmo tempo em que apresenta ou sugere um lugar físico ou poético. O tempo está presente na Fotografia; faz parte dela. A ação do dedo sobre o botão registra algo em um determinado tempo, congelando-o para sempre naquele instante. Torna-se uma ferramenta capaz de guardar a memória de uma pessoa, um lugar, um fato histórico que, seguramente, iria se perder na memória humana. 10 11 Torna-se um documento histórico. Hoje, sabemos muito de nossa História graças aos fotógrafos que registraram os mais diversos temas do passado. Ela também registra o tempo com a ajuda da abertura do obturador, um recurso que deixa visível uma ação ocorrendo no tempo: De todos os meios de expressão, a fotografia é o único que fixa para sempre o instante preciso e transitório. Nós, fotógrafos, lidamos com coisas que estão continuamente desaparecendo e, uma vez desaparecidas, não há mecanismo no mundo capaz de fazê-las voltar. Não podemos revelar ou copiar a memória (ZUANETTI, 2002, p. 17). Eadweard Muybridge. Man/horse (vehicle), 1872-81: https://goo.gl/LSmEqQ Ex pl or Da Experimentação à Consolidação de uma Linguagem Pensadores, cientistas e curiosos, desde muito tempo, começaram a pensar como captar uma imagem. Precisaram se dedicar muito ao estudo e à pesquisa para que começassem a ser possíveis as primeiras experimentações. Como já dissemos, a Câmera Escura foi o primeiro instrumento capaz de captar uma imagem. E como a mente humana não se satisfaz com pequenas descobertas, ao contrário, fica ainda mais estimulada a seguir adiante, isso foi só o começo. O pequeno orifício ganhou uma lente, a caixa ficou maior, procurou-se uma substância que fosse sensível à luz, até que o Joseph Nicéphore Niépce (1765- 1833) conseguisse fixar a imagem da fachada externa de sua casa sobre uma placa de estanho (Figura 3). Figura 3 – Joseph Nicéphore Niépce. Vista da janela em Le Gras, 1826-27. Heliografi a. Fonte: environmentalhistory.org 11 UNIDADE Linguagem Fotográfica O pontapé inicial rumo à forma como fixar as imagens havia sido dado. A invenção gerou muita curiosidade e mostrou a muita gente um novo caminho a ser desbravado. Pintores viram a possibilidade de um registro mais rápido e eficiente; empresários perceberam que surgia um novo Mercado, cheio de oportunidades e muitas possibilidades de ganhos, e o público logo se interessou pelo novo produto que surgia. À medida que o equipamento foi se desenvolvendo, a qualidade da Fotografia foi melhorando, o processo foi se tornando mais rápido e ficando cada vez mais acessível às pessoas. Era caro, demorado e dependia de terceiros; hoje é de graça, instantâneo e qualquer um pode fazer. Figura 4 – Fotografia com celular Fonte:iStock/Getty Images Ao passo que os fotógrafos foram dominando as questões técnicas, começaram a perceber que, usando a criatividade, podiam criar fotos mais interessantes, surpreendentes, intrigantes e cheias de significados. Foi dessa forma que a Linguagem Fotográfica começou a se desenvolver. Seus elementos começaram a ser explorados com profundidade e a se inter-relacionarem de forma criativa para construir novos tipos de imagens. Cores, tons, luz, exposição e abertura eram as novas matérias-primas para os novos criativos. Muitos fotógrafos se destacaram trazendo para o universo da Fotografia novas possibilidades de trabalhar com essa linguagem, tão rica e poderosa na sua rapidez e potência simbólica. Assim como as vanguardas artísticas europeias tiveram de se aprofundar na essência da pintura, os fotógrafos foram em busca de explorar o grande potencial da Linguagem Fotográfica. 12 13 O Fotógrafo É o equipamento fotográfico que registra um determinado tema ou assunto, mas a produção fotográfica só é possível com a atuação do fotógrafo. Ele é o agente responsável pela ação que dará origem à fotografia. Ainda que a fotografia seja o resultado da ação da luz sobre um material/ equipamento fotossensível, ela nasce de um desejo, uma curiosidade e uma intenção de uma pessoa: o fotógrafo. A formulação criada por Bóris Kossoy(1941-) (KOSSOY, 2003, p. 37) demonstra a importância do indivíduo nesse processo: Assunto/Fotógrafo/Tecnologia (elementos constitutivos) = Fotografia (produto final) Coordenação: Espaço/Tempo É o seu querer conjugado à sua maneira de ver e compreender o mundo, conteúdos e referências pessoais e artísticas que compõe que dão forma e conteúdo para as imagens. Esse conjunto de elementos, diferentes em cada indivíduo, é a combustão para a originalidade e a inventividade presente nas incontáveis e distintas produções fotográficas e o modo como esses elementos se inter-relacionam e se tornam visíveis nas composições é o que lhes confere personalidade. A alta Tecnologia e o baixo custo tornaram extremamente acessíveis os equipa- mentos fotográficos. O aparelho de celular, que carregamos conosco, praticamen- te, 24 horas por dia, é também uma máquina de fotografar. Fotografamos todos os dias, ainda que para registro de coisas e momentos banais. De qualquer forma, o exercício de seleção e registro de imagens se popularizou e a linguagem é usada por todos. Somos todos fotógrafos... Mas temos de levar em consideração a qualidade dessas imagens. Mas o que pode ser entendido como uma boa fotografia? Poderia ser uma nova formulação: Conhecimento técnico + conhecimento específico da linguagem visual e fotográfica + criatividade = boa fotografia Conhecimento técnico diz respeito à compreensão, com profundidade, de como usar um determinado equipamento, programas e aplicativos para captação, registro e edição de uma imagem. 13 UNIDADE Linguagem Fotográfica Conhecer a Linguagem Visual é saber como se estrutura uma composição, com todos os elementos que a compõem, como ponto, forma, textura, volume, cor, tom, escala, profundidade e planos entre outros e a Linguagem Fotográfica é conhecer seus elementos específicos como enquadramento, nitidez, luz, tempo e espaço. Tanto o primeiro elemento como o segundo dependem apenas de tempo e de dedicação para poder resolvê-los com perfeição. Ainda que dominemos essas questões técnicas e de Linguagem Visual, e a criatividade? Criatividade pode ser definida de diversas formas. O importante é perceber que todas dizem respeito à capacidade de o ser humano criar o novo, de reinventar coisas, de quebrar paradigmas, buscar novas soluções para novos e velhos problemas. O criativo, em geral, possui alto grau sensibilidade, inconformismo, facilidade na elaboração de hipóteses e muita coragem para empreender novos caminhos. Figura 5 – Jeff Wall. A sudden gust of wind (after Hokusai), 1993 Fonte: tate.org.uk O homem é um ser criativo e o exercício da criatividade é necessário porque o impul- siona para o novo e para a solução de seus problemas, sejam eles simples ou complexos. Se não fosse dessa maneira, não teria sobrevivido, no início de sua existência, nos ambientes inóspitos e cheios de perigos, como a fúria da natureza e as grandes feras, com os quais se deparou na Pré-história. Assim, entendemos que todos somos criativos e que o que precisamos é desenvolver a criatividade. Para isso, temos de acreditar que somos capazes de criar coisas novas e melhorar aquelas que já existem. Nas áreas criativas como a Fotografia, é essencial, se pensarmos que milhares de imagens são feitas a cada segundo. Não devemos encarar esse fato como um problema, ao contrário. A criatividade é uma atividade ligada ao divertimento e à brincadeira e é por isso que os profissionais criativos encaram o trabalho como uma atividade prazerosa. Com o tempo, esses profissionais desenvolvem qualidades importantes que o diferenciam de todos os outros. São pessoas competitivas, querem sempre crescer e mostrar seu melhor; não descartam possibilidades – experimentam, testame pro- 14 15 põem novas formas de fazer as coisas; fogem das categorias estabelecidas e gostam de quebrar regras e testar novas receitas; produzem novidades com frequência; percebem formas diferentes de aplicar suas ideias; desenvolvem técnicas para so- lucionar problemas; tem uma postura mais produtiva diante da vida; conseguem romper com os padrões estereotipados e rígidos e possuem muita facilidade para interagir com o entorno. Logo, é muito bom ser criativo! Já sabemos que temos importante potencial criativo e queremos desenvolvê-lo! Talvez, a principal dica seja: estude muito, conheça bem as regras e pense em como melhorá-las e em possibilidades totalmente novas para realizar as mesmas tarefas. Entre o grande número de produções fotográficas, com as quais nos deparamos todos os dias, podemos encontrar inúmeras que contemplam o que entendemos como uma boa fotografia. Mais que isso, elas nos mostram estilo e personalidade, elementos fundamentais para criar uma linguagem pessoal. Cada fotografia ou conjunto delas é um reflexo da maneira como o fotógrafo enxerga o mundo. O tema que escolhe, a forma como o enquadra, a quantidade de elementos que utiliza dentro de suas composições, as cores e as texturas que privilegia dão caráter único para aquela produção e imprimem a marca de seu autor. Podemos chegar à conclusão que o exercício da criatividade leva à criação de uma linguagem pessoal. Eureka! John Heartfi eld. Adolf the Superman: swallows gold and spits tin, c.1932: https://goo.gl/FcvHnM Ex pl or Cabe ao fotógrafo conhecer profundamente seu equipamento fotográfico, ter uma intenção ao fotografar, compreender todos os elementos que compõem uma foto e uma forma de relacioná-los de maneira diferente. Vamos ver alguns fotógrafos que se destacaram no seu tempo, com produções que trouxeram inovações e foram e são até hoje surpreendentes. Fotógrafos e Linguagem Pessoal Vamos começar por Charles Lutwidge Dodgson (1832-1898), um professor de Matemática da Universidade de Oxford, que começou a fotografar aos 26 anos. Seu tema principal era as crianças. Alice Liddell, irmã de um de seus amigos, era uma de suas modelos preferidas, com quem realizou vários estudos fotográficos (Figura 8). Inspirado pelo poema The brigar maid, de Alfred Tennyson, Dodgson fez a foto Alice Liddell como a “pequena mendiga” (Figura 6). 15 UNIDADE Linguagem Fotográfica Figura 6 – Charles Lutwidge Dodgson. Alice Liddell como a “pequena mendiga”, c.1859 Fonte: Wikimedia Commons As fotografias que fazia tinham ar fantasioso. As meninas pareciam personagens de histórias, como Alice Liddell na foto. Ao longo dos anos, exercitou muito sua criatividade, trabalhando com diversas linguagens artísticas. Escreveu contos, po- esias, romances, era desenhista e fotógrafo. Seu trabalho criativo se expandia de tal forma que uma linguagem alimentava a outra, como o poema que inspirou sua foto e também suas fotos que serviram como inspiração para outros de seus trabalhos. Charles Lutwidge Dodgson criou o pseudônimo Lewis Carroll. Ele foi o autor do livro Alice nos país das maravilhas e Alice Liddell a inspiração para a famosa personagem da garota que cai den- tro de uma toca de coelho e vai parar em um mun- do cheio de fantasias. Mais tarde, a história se tornou um dos longa metra- gens mais famosos de Walt Disney, em 1951 (Figura 7). Figura 7 – Disney, Cena do filme Alice no país das maravilhas, ilustração Fonte: Wikimedia Commons 16 17 Man Ray (1890-1976) também trabalhou com diversas linguagens artísticas – Pintura, Cinema, Desenho, Artesanato, Escultura – mas foi com Fotografia que obteve real destaque. Ao fotografar suas telas percebeu que a Fotografia tinha sua própria força e personalidade. Gostou tanto da experiência, que se dedicou a estudar com profundidade a técnica e em pouco tempo se tornou um excelente fotógrafo. Fotografava objetos comuns, mas sua visão criativa fazia com ele imprimisse novas maneiras de enxergá-los, utilizando diferentes ângulos de visão, efeitos de luz e sombra. Suas fotografias representam muito bem a inventi- vidade e a espontaneidade do Dadaísmo, movimento do qual fazia parte. Dadaísmo é o nome de um movimento artístico, criado por poetas, escritores e ar- tistas plásticos, na Suíça, em 1916. Entre eles, além de Man Ray, estavam Hugo Ball, Tris- tamTzara e Marcel Duchamp. Tinham como meta quebrar as regras acadêmicas, a lógi- ca e a razão, representando o mundo sem sentido, reflexo dos efeitos terríveis da Primei- ra Guerra Mundial. Man Ray experimentou e trabalhou com muitas técnicas e seu espírito inventivo ainda o levou às Raiografias, um tipo de fotografia sem câmera, na qual ele pousava objetos sobre superfícies sensíveis. Dessa série, surgiram as abstrações. Figura 8 – Man Ray. Raiografi a, c.1923. Fonte: Floresta, 2011 Criou um estilo pessoal nos retratos também. Fotografava seus modelos a certa distância e depois os ampliava, o que lhes conferia certa suavidade. Retratou grandes personalidades como Gertrude Stein, Ernest Hemingway, Picasso, Jean Cocteau e Constantin Brancusi, entre muitos outros. 17 UNIDADE Linguagem Fotográfica Figura 9 – Man Ray. Constantin Brancusi, c.1930. Fotografia Fonte: Floresta, 2011 Henri Cartier-Bresson (1908-2004) era um pintor formado em Paris, que descobriu a Fotografia ao viajar em uma expedição etnográfica pelo México, em 1931. Sua produção fotográfica se destaca por captar o instante perfeito ou o momento decisivo, como o menino que sorri ao carregar duas garrafas de vinho, na fotografia intitulada Rue Mouffetard (Figura 10). Figura 10 – Henri Cartier-Bresson. Rue Mouffetard, c.1958. Fotografia Fonte: cameralabs.org [...] Cartier-Bresson era um observador astuto, o homem do olho, que sabia o que ele queria e o que interessava a ele. Um certa vez, ele se comparou com um pescador que tinha um peixe na ponta da sua linha. O mais importante era se aproximar cautelosamente e apertar o botão no momento certo (MIELBECK, 1996, p. 101). 18 19 Foi um dos mais importantes representantes da Fotografia Humanista, que retratava temas humanos. Durante o tempo em que trabalhou para jornais e revistas populares, fez grande quantidade de fotografias que diziam respeito à condição humana em cenas cotidianas. Muitas ficaram conhecidas nos livros que publicou. Já demonstrara interesse pelas questões sociais e políticas quando esteve no México e realizou uma série de fotos, as quais apresentou em uma exposição, ao lado do fotógrafo Alvares Bravo (1902-2002), como em Nacho Aguirre, Santa Clara, México (Figura 13). Figura 11 – Henri Cartier-Bresson. Natcho Aguirre, Santa Clara, México, 1934-1935. Fotografi a Fonte: metmuseum.org Suas cenas apresentam certa tensão. Na fotografia Natcho Aguirre, Santa Clara, México (Figura 13), por exemplo, Bresson retrata um homem com o tórax despido, os braços cruzados e as mãos cerradas. O fato de seu rosto não aparecer confere a esse personagem a representação de uma categoria, já que sua identidade não é revelada. Ao seu lado, numa espécie de prateleira, há sapatos femininos de salto, representando uma outra classe social. Aqui podemos ver que o fotógrafo, a partir da escolha dos elementos e da organização, comenta uma questão social, que parece ser bem importante naquele lugar e tempo. Em Venda de ouro nos últimos dias de Kuomintang (Figura 12), de 1948, podemos ver a questão do momento decisivo combinada com o retrato social de Xangai, na China, antes de a cidade ser tomada pelos comunistas. Na foto, vemos pessoas que se amontoam em frente a um Banco Estatal, que distribuía 40 gramas de ouro por pessoa, a mando do Kuomintang, o Partido Nacionalista chinês, diante da desvalorização da moeda. Na sua composição, Bresson revela o caos causado pela ação do Governo. O efeito tremido da foto é resultado do acotovelamento da multidão nervosa e desesperada reagindo à nova situação política. 19 UNIDADE LinguagemFotográfica Os corpos estão entrelaçados e, de tão juntos, seus braços e mãos parecem formar uma onda e as cabeças parecem procurar ar entre tantas pessoas. Segundo fontes, 10 pessoas morreram esmagadas na multidão. Figura 12 – Henri Cartier-Bresson. Venda de ouro nos últimos dias de Kuomintang, 1948. Fotografia Fonte: cameralabs.org A norte-americana Cindy Sherman (1954-) fez uma série de fotos, entre 1977 e 1980, intitulada Untitled film stills, nas quais se retrata como uma personagem inspirada em filmes do fim da década de 1950 e início da de 1960. Foram cerca de 69 fotos, em preto e branco, nas quais aparece dentro de uma visível narrativa, cujos elementos tentamos buscar para reconstruí-la. O trabalho encomendado pela revista Art fórum ganhou elementos especiais da artista. Para a série, ela fez composições que lembravam fotos de revistas pornográficas e escolheu o formato widescreen, usado no Cinema. Na obra Sem título nº 92 (Figura 13), vemos claramente um momento congelado de algo que está acontecendo. Ela está sentada no chão e olhando para fora do enquadramento, como se estivesse com medo de algo ou assustada. A câmera é posicionada de forma a dar maior dramaticidade à cena, elemento típico em suas fotografias. Figura 13 – Cindy Sherman. Sem título nº 92, 1948. Fotografia Fonte: broadfoundation.org 20 21 Suas fotografias não são autorretratos. Sua escolha de se fotografar é por acredi- tar que pode dar o máximo na interpretação dos personagens, apresentando-os com muita profundidade. A produção das fotos é rica em detalhes, levando-nos a enxergar uma cena, por meio dos elementos que empresta da Linguagem Cinematográfica. A maquiagem e o figurino trazem uma série de detalhes sobre as personagens que Sherman interpreta, tornando difícil até encontrar a artista por traz da produção. As cenas são construídas a partir das imagens dos filmes que a inspiraram. Os cenários para suas fotos são meticulosamente pensados, podendo se apropriar de um lugar externo ou, ainda, a produção de um lugar interno, como uma sala ou um quarto. A designer gráfica Barbara Kruger (1945-) começa a se apropriar de elemen- tos da Linguagem Gráfica e da Propaganda para sua produção fotográfica. Ao vermos uma de suas fotografias, rapidamente sabemos a sua autoria, pois reco- nhecemos sua linguagem pessoal. As fotos de Kruger tem sua marca própria e é facilmente reconhecível. Kruger cria frases e textos e os sobrepõem à fotografias em preto e branco de Revistas e outras fontes dos Meios de Comunicação dos quais se apropria. O conjunto de elementos é forte e direto, quase um slogan de propaganda. É interessante que ela se utiliza da Linguagem Publicitária para fazer denúncias e críticas sobre a própria publicidade. Elementos gráficos como uma borda na imagem e frases em vermelho sobre fundos preto ou branco nos remetem à estética de anúncios de Revistas. A maioria de seus trabalhos traz uma crítica e uma discussão sobre a sexualidade e o consumismo, como na obra I shop therefore I AM (Eu compro, portanto eu sou) (Figura 14), fazendo referência à famosa frase Penso, logo existo, do filósofo francês René Descartes. Figura 14 – Barbara Kruger. I shop therefore I am, 1987. Fotografi a Fonte: Wikimedia Commons 21 UNIDADE Linguagem Fotográfica Todos os fotógrafos que vimos aqui desenvolveram produções fotográficas cheias de estilo, pois combinaram suas preferências, seu olhar e sua técnica, que os diferen- cia de todos os outros. Mas isso só é possível depois de muita dedicação. Como dizia Picasso: “Criar é uma combinação de 99% de transpiração e 1% de inspiração”. É necessário começar, testar, experimentar, estudar e insistir na Linguagem escolhida para que, então, seja possível criar algo realmente inovador e criativo, com boa qualidade: Não importa a intensidade do esforço: parece que é necessário pelo menos 10 anos de trabalho constante em um tema ao linguagem artística para chegar a dominar uma especialidade (...) Inclusive Mozart, que se poderia considerar a exceção que confirma a regra, esteve compondo pelo menos por uma década antes de poder produzir com regularidade obras que se consideram dignas de serem incluídas no seu repertório (GARDNER, 1995, p. 50). Importante! Experimente sair com sua Máquina Fotográfica ou mesmo seu celular e tire fotos de tudo o que lhe interessar, sem se preocupar em fazer uma grande Obra de Arte. Pode ser em apenas um quarteirão de sua cidade. Vamos começar devagar... Quando achar que tem uma boa quantidade de fotos, volte para casa e as analise com calma. Olhe cada uma das fotos, observe detalhes, pense nas composições que você fez e os elementos presentes em cada uma delas. Depois, separe aquelas que você mais gostou. Guarde em uma pasta de arquivo no seu computador com o nome Saída fotográfica nº 1. Algumas semanas depois, já com maior experiência em fotografia, retorne ao mesmo quarteirão e fotografe. Agora, sim, está na hora de você comparar seus trabalhos e observar sua evolução. Ah! Salve em Saída fotográfica nº 2. Bom trabalho. Trocando ideias... Por Que Fotografar? A resposta mais precisa que posso dar do por que eu tiro fotos é uma metáfora. Para mim, tirar uma foto é como o ponto de ignição em um motor em combustão; ingredientes (vapores de gasolina, ar) são articulados em uma forma de engenharia magistral, compactados em um momento primorosamente cronometrado e sacudidos para produzir força e centelhas brilhantes. Na gênese de uma fotografia bem-sucedida, todos os esforços anteriores se congregam em um momento decisivo: o tempo de pesquisa para aprender aquela especialidade acadêmica, a longa ladeira íngreme para chegar ao local antes que a luz mude, o truque inteligente imaginado para que a própria história seja contada de um modo novo e intrigante, a metáfora 22 23 prateada que envolve toda a ideia, a busca das condições climáticas favoráveis – e ainda se você não se esqueceu de carregar a bateria, montar o tripé, levar a objetiva certa etc. E quando tudo isso é congregado na mesma fração de segundo e alcança o ponto de ignição... bem, a sensação de satisfação é extasiante. É algo arrebatador (LOWE, 2017, p. 6). Dicas: • Busque assuntos do seu interesse, que agradam você, que mexam com suas emoções e que provoque sua curiosidade; • Saiba o que você quer dizer com sua fotografi a. Tenha um objetivo; • Tente imprimir uma marca pessoal em suas fotos; • Seja criativo, tente fazer diferente e fuja das receitas; • Dedique-se ao assunto. Pense, refl ita e gaste tempo com ele; • Aprenda profundamente as técnicas de fotografar. Experimente ao máximo!; • Conheça a História da Fotografi a; • Discuta com amigos e professores sua produção fotográfi ca. 23 UNIDADE Linguagem Fotográfica Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites Instituto Moreira Salles Organização sem fins lucrativos criada pelo diplomata e banqueiro Walter Moreira Salles, em 1992, que se dedica à divulgar fotógrafos e suas produções fotográficas. https://ims.com.br/ Livros Caderno de artes visuais SESI-SP. Caderno de artes visuais. v. I. São Paulo: SESI/SP, 2016. Filmes Nascidos em bordéis Direção: Ross Kauffman e Zana Briski. Documentário, EUA/Índia, 2006, 85min. Sinopse: A fotógrafa. Leitura Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação MORAES, Adriano Cunha; AHLERT, Jacqueline. Barbara Kruger: os limites entre linguagem da publicidade e propaganda e da linguagem artística. Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XVII CONGRESSO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO NA REGIÃO SUL – Curitiba – PR – 26 a 28 maio 2016. 24 25 Referências COSTA, Cacilda Teixeira da. Arte no Brasil 1950-2000: movimentos e meios. São Paulo: Alameda, 2006. FLORESTA, Merry. Man Ray. São Paulo: Cosac Naify, 2011. GARDNER, Howard. Mentes criativas. Barcelona: EdicionesPaidós Ibérica, 1995. HACKING, Juliet (ed.).Tudo sobre fotografia. Rio de Janeiro: Sextante, 2012. KOSSOY, Boris. Fotografia & história. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. LOWE, Paul. Mestres da fotografia. São Paulo: Gustavo Gili, 2017. MIβELBECK, Reinhold. 20th century photography: Museum Ludwig Cologne. Colgne: Taschen, 1996. OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. Petrópolis: Vozes, 1986. SALLES, Cecília Almeida. Gesto inacabado: processo de criação artística. São Paulo: Intermeios, 2011. ZUANETTI, Rose et al. Fotógrafo: o olhar, a técnica e o trabalho. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2002. 25
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