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Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Tireóide e seus hormônios A glândula tireoide produz o pró-hormônio tetraiodotironina (T4 - tiroxina) e o hormônio ativo triiodotironina (T3). A sua produção depende da presença de iodo. O T4 é convertido em T3 perifericamente. O hormônio tireoidiano atua principalmente por meio de um receptor nuclear que regula a transcrição gênica, o T3 é crítico para o desenvolvimento normal do encéfalo e dos ossos e tem amplos efeitos sobre o metabolismo celular e a função cardiovascular em adultos. Anatomia e Histologia da Glândula Tireóide É composta pelos lobos direito e esquerdo, situados anterolateralmente à traquéia, conectados por um istmo. É bastante irrigada e é drenada por três conjuntos de veias (superior, média e inferior). Recebe inervação simpática, que é vasomotora, mas não secretora. Sua unidade funcional é folículo tireoidiano, uma estrutura esférica cercada por uma camada única de células epiteliais da tireóide, cercado por um rico suprimento vascular. A luz do folículo é preenchida com colóide composto de tireoglobulina. A tireoglobulina é o arcabouço para a produção dos hormônios tireoidianos. O tamanho das células e a quantidade de colóide variam de acordo com a atividade da glândula. Dentro da glândula, existem as células parafoliculares ou células C, fonte do hormônio polipeptídico calcitonina. 1 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Eixo hipotálamo-hipófise-tireóide A regulação da secreção de hormônios tireoidianos por TSH é controlada por uma retroalimentação negativa elaborada: ● T4 e T3 circulantes diminuem a secreção de TSH, principalmente pela repressão da expressão gênica da subunidade TSH-β. A hipófise expressa D2 de alta afinidade, convertendo T4 em T3. Portanto, a retroalimentação nos tireotrofos, mediada por T3 intracelular, representa a medida de T4 e T3 circulantes. A variação diurna de TSH é pequena, o que garante uma secreção de hormônios tireoidianos relativamente constante. Ocorrem pequenos aumentos noturnos na liberação de TSH e liberação de T4. ● T4 e T3 retroalimentam os neurônios hipotalâmicos que secretam o hormônio liberador de tireotrofina (TRH). Neles, T3 inibe a expressão do gene de pré-pró-TRH. ● Na glândula tireoide, a regulação é promovida pelo iodeto, tendo uma ação bifásica: ○ quando a ingestão de iodeto é baixa a síntese de hormônios diminui; ○ quando a ingestão ultrapassa 2 mg/dia, a concentração de iodeto atinge um nível que suprime a atividade de TPO (tireoperoxidase), bloqueando a síntese hormonal. Isso é conhecido como Efeito Wolff-Chaikoff. A adaptação a ingestão elevada de iodeto normalmente ocorre pela redução na expressão de NIS, diminuindo os níveis intracelulares. Assim, a atividade de TPO volta ao normal e a síntese hormonal é reiniciada dentro de dias a semanas. Em casos incomuns, a falha na diminuição de NIS provoca inibição de síntese prolongada e um quadro de hipotireoidismo. 2 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Produção dos hormônios tireoidianos O produto de secreção da glândula são as iodotironinas, formadas pelo acoplamento de duas moléculas de tirosina iodada. 90% da produção é o pró-hormônio T4; e 10% da produção é o hormônio T3. Menos de 1% da produção consiste em rT3 (T3 reversa), uma forma inativa de T3. Normalmente, esses 3 produtos são secretados nas mesmas proporções que são armazenados na glândula. Equilíbrio do iodeto A média de ingestão diária de iodeto é cerca de 400 µg, versus a necessidade de 150 µg para adultos, 90 a 120 µg para crianças e 200 µg para gestantes. Em equilíbrio, a mesma quantidade é excretada na urina. Ele é concentrado ativamente na glândula tireóide, glândulas salivares, glândulas gástricas, glândulas lacrimais, glândulas mamárias e plexo coróide. De 70 a 80 µg de iodeto são absorvidos diariamente pela glândula tireóide. O total de iodeto na glândula tireóide corresponde, em média, a 7500 µg, quase que na totalidade na forma de iodotironina armazenada na tiroglobulina do colóide. No equilíbrio, de 70 a 80 µg de iodeto são secretados diariamente; 75% como hormônios (60 µg) e o restante livre. Essa 3 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI grande proporção armazenada, protege contra a deficiência de iodeto por aproximadamente 2 meses. O iodeto também é conservado por uma redução acentuada da excreção renal quando sua concentração no soro diminui. Regulação da função da tireóide O regulador mais importante da função e do crescimento da tireóide é o TSH (hormônio tireoestimulante), que estimula todos os aspectos da função tireoidiana. Possui ações imediatas, intermediárias e de longo prazo. Rápidas: ● estimula a pinocitose de gotículas de colóide; ● estimula a proteólise da tireoglobulina e a liberação de T4 e T3 da glândula; ● aumenta a captação de iodo e a atividade de TPO (tireoperoxidase); ● estimula a entrada de glicose na via de shunt da hexose monofosfato, gerando NADPH necessário para a reação de peroxidase. Intermediárias: ● ocorrem após horas ou dias e envolvem a síntese e a expressão de proteínas de numerosos genes, incluindo os que codificam NIS, tireoglobulina e TPO. Longo prazo: ● provoca hipertrofia e hiperplasia das células foliculares. Esses efeitos são favorecidos pela produção local de fatores de crescimento. O aumento perceptível da glândula é chamado de bócio. Síntese dos hormônios tireoidianos O iodeto entra na célula através de um simporter de sódio-iodeto (NIS) localizado na membrana basolateral das células epiteliais da tireóide. O NIS é altamente expresso na glândula tireóide e em níveis baixos na placenta, glândulas salivares e mamas em lactação ativa. O iodo é transportado contra um gradiente eletroquímico, enquanto dois íons sódio são transportados a favor do seu gradiente. Essa força eletroquímica é fornecida pela Na+ K+‑ATPase na membrana plasmática. A expressão de NIS é inibida pelo iodeto e estimulada pelo TSH. Baixas concentrações de iodeto circulante aumenta muito a atividade do transportador. Quando a ingestão de iodeto é baixa, a porcentagem de captação de iodeto na tireoide pode chegar a 80-90%. 4 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI 1) Após entrar na célula, o iodeto move-se para a membrana plasmática apical das células epiteliais. 2) O iodeto é transportado para a luz dos folículos por um transportador de iodo/cloreto chamado pendrina (independente de Na). 3) O iodeto é oxidado (dependendo da presença de H2O2) e incorporado em resíduos de tirosina da tireoglobulina - IODAÇÃO. a) Uma iodação resulta em uma monoiodotirosina (MIT); b) Uma segunda iodação no mesmo resíduo produz diiodotirosina (DIT) 4) Duas moléculas de DIT são acopladas, formando T4; uma MIT e uma DIT são acopladas para formar T3. Esse acoplamento ocorre entre tirosinas iodadas, que continuam fazendo parte da estrutura primária da tiroglobulina. ● Toda a reação é catalisada pela tireoide peroxidade (TPO) - complexo enzimático espalhado pela membrana plasmática apical. ● O oxidante (captador de elétrons) é o H2O2. ● H2O2 é gerado na luz por oxidases duais - DUOX1 e DUOX2, também localizadas na membrana plasmática apical. A produção de T3 aumenta quando a disponibilidade de iodeto é restrita e também quando a glândula tireóide é hiperestimulada por TSH ou outros ativadores. A tireoglobulina iodada é armazenada na luz como colóide. ● A liberação de T4 e T3 é iniciada pela pinocitose do colóide. ● Lisossomos fundem-se com as vesículas endocíticas e a tireoglobulina é degradada. ● São liberados T4, T3 e moléculas de MIT e DIT, estes sendo rapidamente desiodadas no interior da célula pela iodotirosina desiodase. Ela é específica e não consegue atuar no T4 e T3. ○ O iodeto proveniente é reciclado na síntese de T4 e T3. ● Os aminoácidos produzidos pela degradação da tireoglobulina ficam na célulae podem ser reutilizados para síntese proteica. ● T4 e T3 são lipossolúveis, portanto atravessam as membranas celulares por difusão simples ou são transportadas pelo transportador MCT8, pelo lado basal da célula e entram no sangue. 5 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Transporte de hormônios tireoidianos e Desiodses A maioria de T4 e T3 são transportados na corrente sanguínea acoplados a proteínas. Normalmente, somente 0,03% de T4 e 0,3% de T3 existem na forma livre. O T3 livre é biologicamente ativa e é responsável pelos efeitos sobre tecidos periféricos, além de exercer uma retroalimentação negativa sobre a hipófise e o hipotálamo. A principal proteína ligadora é a TBG (Globulina Ligadora de Tiroxina), sintetizada no fígado. ● TBG: 70%; ● TTR (Transtirretina): 10 a 15%; ● Albumina: 15 a 20%; ● Lipoproteínas: 3%. Apenas alterações da concentração de TBG afetam significativamente os níveis plasmáticos de T4 e T3. Possui duas funções biológicas: 1. Reserva grande quantidade de T4, sendo capaz de tamponar qualquer alteração aguda da função da tireóide; 2. Previne a perna de T4 e T3 na urina e, consequentemente, previne a perda de iodeto. TTR transporta T4 no líquor e fornece os hormônios tireoidianos ao SNC. 6 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Desiodases Como a maior parte secretada é o T4, o eixo da tireóide depende da conversão periférica pela ação de desioidades específicas. 7 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI D1 é mais ativa em tecidos com alto fluxo sanguíneo e rápida troca com o plasma, suprindo T3 circulante para a captação por outros tecidos onde a geração de T3 seja baixa ou ausente. Os níveis de D1 aumentam no hipertireoidismo e contribuem para a elevação dos níveis circulantes de T3. D2 mantém níveis adequados de T3 no espaço intracelular em tecidos onde a sua manutenção seja necessária. Sua expressão é aumentada no hipotireoidismo, ajudando a manter níveis constantes de T3 no encéfalo. Também é presente nos tireotrofos hipofisários, atuando como um “sensor do eixo tireoidiano” que medeia a capacidade de retroalimentação de T4 circulante sobre a secreção de TSH. D3 inativa T4, convertendo-o em rT3. Sua expressão aumenta no hipertireoidismo, ajudando a amortecer a produção excessiva de T4. Todas as formas de iodotironinas eventualmente são desiodadas em tironina não iodada. Mecanismo de ação dos hormônios tireoidianos São transportados para o interior da célula por transportadores MCT8 e MCT10, ambos capazes de transportar T4 e T3. O transportador OATP1C1, parece transportar T4 pela barreira hematoencefálica. Muitas, mas não todas as ações de T3 são mediadas pela sua ligação com receptores de hormônio tireoidiano (TR). TR são fatores de transcrição de receptores hormonais nucleares. Em humanos, existem dois genes para TR, o THRA e o TRHB. THRA codifica TRα, que é dividido em duas isoformas: TRα1 que é um TR genuíno, e a outra isoforma não se liga ao T3. O THRB codifica TRβ1 e TRβ2, ambos com alta afinidade por T3. A distribuição tissular de TRα1 e de TRβ1 é difusa. ● TRα1 é muito expresso no músculo cardíaco e esquelético; ● TRβ1 é muito expresso no encéfalo, fígado e rins; ● TRβ2 é o principal mediador dos efeitos de retroalimentação negativa. O TR forma um heterodímero com RXR. TR-RXR sem ligante liga-se ao elemento de resposta tireoidiana nos genes alvo e recruta correpressores que inibem a transcrição gênica. Com a ligação do T3, os correpressores são liberados e coativadores são recrutados para o complexo hormônio-receptor, induzindo a transcrição gênica. Mutações nos TR podem causar síndromes de resistência ao hormônio tireoidiano. As mais comuns acontecem no subtipo TRβ2, produzindo uma retroalimentação negativa incompleta no nível hipotalâmico-hipofisário. Mesmo com níveis altos de T4, o TSH não é suprimido. Existem evidências de ações não genômicas de T3 e T4 mediadas por receptores de membrana plasmática, mitocôndrias ou citoplasma. Podem atuar na organização dos microfilamentos e atuar na proliferação celular e na angiogênese por um mecanismo não-genômico. 8 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Efeitos fisiológicos dos hormônios tireoidianos Cardiovasculares Talvez os mais importantes. ● T3 aumenta o débito cardíaco, garantindo O2 aos tecidos; ● Aumenta a FC e o volume sistólico em repouso; ● Aumenta a velocidade e a força das contrações miocárdicas; ● Encurta o tempo de relaxamento diastólico; ● Aumenta modestamente a PA sistólica e diminui a PA diastólica; ● Aumenta a pressão de pulso, como resultado do aumento do volume sistólico e da redução da resistência vascular sistêmica pela dilatação dos vasos sanguíneos da pele, músculos e coração; esses efeitos são resultado do aumento da produção de calor tissular e do CO2. ● Diminui a resistência sistêmica por dilatar as arteríolas da circulação periférica. ● Ativa o eixo renina-angiotensina-aldosterona, aumentando a reabsorção de sódio nos túbulos renais e consequentemente o volume sanguíneo total aumenta. 9 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Os efeitos cardíacos inotrópicos (na força de contração do coração) de T3 são diretos e indiretos. Os efeitos indiretos decorrem da maior sensibilidade a catecolaminas (estimulam o miocárdio). Os efeitos diretos envolvem a regulação de muitas proteínas que aumentam a contratilidade: ● aumenta a expressão da cadeia pesada de α-miosina; ● inibe o trocador de Na+/Ca++ na membrana plasmática; ● a Ca++-ATPase do retículo sarcoplasmático é aumentada, enquanto a fosfolambam é diminuída. Como resultado, o sequestro de cálcio durante a diástole aumenta e o tempo de relaxamento é encurtado; ● a um aumento dos canais de rianodina Ca++ do retículo sarcoplasmático promovendo a liberação de Ca++ durante a sístole. Taxa metabólica basal e Termogênese ● T3 aumenta a absorção de glicose do TGI e o metabolismo de glicose - captação, oxidação e síntese de glicose. ● No tecido adiposo, induz enzimas para a síntese de ácidos graxos (incluindo a carboxilase de acetil-CoA e sintase de ácido graxo) e 10 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI aumenta a lipólise (por meio de uma aumento do número de receptores β-adrenérgicos. ● Aumenta a liberação de quilomícrons, liberando ácidos graxos livres do tecido adiposo. ● Aumenta o metabolismo proteico - liberação de aminoácidos musculares, degradação de proteínas e, em menor grau, a síntese proteica e a formação de uréia. ● Potencializa os efeitos estimulantes da adrenalina, da noradrenalina, do glucagon, do cortisol e do GH sobre a gliconeogênese, e lipólise, e cetogênese e a proteólise de proteínas lábeis. ● Estimula a síntese de ácidos biliares a partir do colesterol e promove a secreção biliar. Isso resulta na diminuição dos níveis plasmáticos de colesterol total e LDL. ● Aumenta o clearance metabólico de hormônios esteróides da adrenal e gônadas, de algumas vitaminas B e de alguns medicamentos. Os hormônios tireoidianos estimulam a termogênese afetando a utilização e a eficiência da síntese de ATP. A utilização de ATP é aumentada pela suprarregulação de vários processos dependentes de energia, particularmente no músculo esquelético, onde o uso cíclico de cálcio entre o citoplasma e o retículo sarcoplasmático utiliza ATP e gera calor. A gordura marrom pode ter uma papel facultativo na termogênese em seres humanos. Estudos demonstraram sua presença no mediastino em indivíduos magros e sua atividade é ampliada na exposição ao frio. A gordura marrom expressa a proteína desacopladora 1 (UCP1) - termogenina, que faz o gradiente de prótons na membrana mitocondrial interna ser dissipado como calor, disseminado posteriormente pela circulação. UCP1 é regulada pelo T3 e a gordura marrom expressa D2. A termogênese na gordura marrom depende dainteração entre os hormônios tireoidianos e o SNS. As catecolaminas promovem lipólise e estimulam a expressão de D2. T3 estimula os receptores adrenérgicos e potencializa a resposta a catecolaminas. O hipertireoidismo é acompanhado por intolerância ao calor, e o hipotireoidismo é acompanhado por intolerância ao frio. Respiratórios T3 aumenta a FR em repouso, o volume-minuto e a resposta ventilatória à hipercapnia (alta concentração de CO2 no sangue) e hipóxia. Isso garante um PO2 arterial normal quando a utilização de O2 é elevada e uma PCO2 normal quando a produção de CO2 está aumentada. 11 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Estimula a produção de eritropoietina (regula a eritropoiese, atuando nas células progenitoras eritróides da medula óssea) nos rins, aumentando discretamente o hematócrito. Músculos esqueléticos A função normal desses tecidos depende da presença ideal de T3, essa necessidade pode estar ligada à regulação da produção e armazenamento de energia. A glicólise e glicogenólise aumentam, enquanto o glicogênio e a creatina fosfato são reduzidos pelo excesso de T3. A incapacidade de captação e de fosforilação de creatina nos músculos provoca sua mais excreção na urina. SN autônomo e a ação das Catecolaminas São sinérgicos com as catecolaminas para aumentar a taxa metabólica, a produção de calor, a FC, a atividade motora e a ativação do SNC. T3 pode potencializar a atividade do SNS por aumentar o número de receptores β-adrenérgicos nos músculos cardíacos e pela geração de segundos mensageiros intracelulares como o AMPc. Crescimento e a Maturação Uma quantidade pequena, mas crucial, de hormônio tireoidiano atravessa a placenta e o eixo fetal da tireóide torna-se funcional na metade da gestação. O hormônio da tireoide é extremamente importante para o desenvolvimento neurológico normal e formação óssea adequada no feto. Em lactentes, a insuficiência fetal do hormônio tireoidiano provoca hipotireoidismo congênito, caracterizado por déficit intelectual irreversível e baixa estatura. Ossos, Tecidos duros e Derme T3 promove a ossificação endocondral, crescimento ósseo linear e maturação dos centros ósseos epifisários. Aumenta a maturação e a atividade dos condrócitos na placa de crescimento cartilaginosa, em parte pelo aumento da produção local de fator de crescimento. Durante o crescimento pós-natal linear, o T3 favorece a ação de GH, IGF-1 e outros fatores de crescimento. Também favorece a remodelagem óssea em adultos normais. T3 é fundamental para a progressão e erupção dos dentes e pelo ciclo normal de crescimento e a maturação da epiderme, seus folículos pilosos e as unhas. Além disso, estimula a degradação normal desses tecidos. Assim, um excesso ou uma deficiência de T3 pode provocar queda de cabelo e formação anormal de unhas. Também regula a estrutura do tecido subcutâneo, 12 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI inibindo a síntese e aumentando a degradação de glicosaminoglicanos e fibronectina no tecido conjuntivo extracelular. Sistema Nervoso T3 regula o momento e o ritmo do desenvolvimento do SNC. Deficiência no útero e no início da infância inibe o crescimento do córtex cerebral e cerebelar, a proliferação de axônios e a ramificação de dendritos, a sinaptogênese, a mielinização e a migração celular. Pode acontecer comprometimento irreversível do SNC devido a uma deficiência neonatal de T3 não reconhecida e tratada imediatamente. Os defeitos morfológicos cursam com anormalidades bioquímicas. Diminuição nas taxas de T3 reduz o tamanho das células, o conteúdo de RNA e de proteínas, de tubulina e proteínas relacionadas aos microtúbulos, o teor protéico e lipídico da mielina, a produção local de fatores de crescimento críticos e as taxas de síntese proteica. T3 aumenta a vigília, o nível de alerta, a sensibilidade a múltiplos estímulos, o sentido da audição, percepção de fome, memória e capacidade de aprendizado. Além disso, o tônus emocional normal depende da disponibilidade adequada do hormônio tireoidiano. Mais ainda, a velocidade e a amplitude dos reflexos nervosos periféricos são aumentadas pelo hormônio tireoidiano, assim como a motilidade do trato gastrintestinal. Órgãos reprodutores e Glândulas Endócrinas T3 têm um papel permissivo importante na regulação da função reprodutora. Desvios importantes dos níveis de T3 impactam no ciclo ovariano normal de desenvolvimento folicular, na maturação e ovulação, no processo de espermatogênese e na manutenção do estado gestacional saudável. Em parte, esses efeitos podem ser causados por alterações no metabolismo ou na disponibilidade de hormônios esteróides. Por exemplo, o T3 estimula a síntese hepática e a liberação da globulina de ligação a esteróides sexuais. 13 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Hipotireoidismo É caracterizado por uma deficiência de produção do hormônio pela glândula tiroide, que pode ser severa ou moderada. Uma deficiência grave de hormônios da tiroide se manifesta como hipotiroidismo declarado (H). A forma moderada denominada hipotiroidismo subclínico (SH) raramente apresenta sinais e sintomas e é definida pela concentração de TSH bioquimicamente acima do limite superior do intervalo de referência, com os níveis de hormônio tireoidiano que permanecem dentro dos limites de referência. O HS deve ser definido na ausência de doença hipotalâmica ou pituitária e de doença não tireoidiana. O hipotiroidismo (H) se refere a uma diminuição da produção do hormônio da tireoide o que provoca um aumento nos níveis de TSH. A secreção diminuída de hormônios tireoidianos também pode ser o resultado de estimulação reduzida da glândula tiroide, devido à diminuição do hormônio liberador de tirotropina (TRH) ou da diminuição da ação de TSH. O hipotiroidismo pode também ser causado pela ação reduzida dos hormônios tireoidianos nos órgãos-alvo, como nos casos raros de resistência aos hormônios tireoidianos A causa mais frequente do hipotiroidismo é a tireoidite autoimune crônica (tireoidite de Hashimoto). No entanto, ele também pode resultar do tratamento do hipertireoidismo com cirurgia, radiação com 131-I ou após o uso de drogas antitireoidianas. Várias formas de tiroidite, tais como pós-parto, subaguda, silenciosa ou tireoidite induzida por citocinas, também podem causar hipotiroidismo permanente ou transitório. Menos frequentemente, pode ser uma consequência de doenças infiltrativas ou infecciosas, radioterapia externa, disgenesias da tiroide, defeitos funcionais na biossíntese e liberação dos hormônios tireoidianos ou defeitos congênitos na biossíntese dos hormônios da tiroide. Tanto a deficiência como o excesso de iodo são causas bem conhecidas de hipotiroidismo primário, como também são o uso de certos fármacos, que incluem agentes antitireoidianos: lítio, químicos bociogênicos naturais e sintéticos, inibidores da tirosina-quinase, a interleucina-2 ou interferon-α (IFN-α) etc. O hipotiroidismo subclínico (SH) compartilha a mesma etiologia que o hipotiroidismo primário. O hipotiroidismo central tem múltiplas causas (tumores, traumas, infecções vasculares, infiltrativas, inflamatórias ou congênitas). Além da perda de tecido funcional, o hipotiroidismo central também pode resultar de defeitos funcionais na biossíntese ou liberação do TSH devido tanto a mutações genéticas como a drogas como a dopamina e glicocorticóides. Hipotiroidismo periférico pode ser uma consequência de mutações em genes importantes na resposta dos hormônios tireoidianos em tecidos-alvo (resistência ao hormônio da tiroide), ou até mesmo devido ao consumo de hormônio tireoidiano em grandes hemangiomas em recém-natos, uma forma rara de hipotiroidismo. 14 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Causas importantes 1. Hipotireoidismo congênito: são causados por diversos fatores e é extremamente importante que o diagnóstico e o tratamento seja o maisbreve possível, pois está diretamente relacionado com o desenvolvimento e a maturação dos diversos sistemas orgânicos. Os indivíduos afetados apresentam incapacidade intelectual grave, baixa estatura com desenvolvimento esquelético incompleto, alterações faciais grosseiras e protrusão da língua. Se o hipotireoidismo ao nascimento permanecer sem tratamento por apenas duas a quatro semanas, o SNC não amadurecerá normalmente no primeiro ano de vida. Marcos do desenvolvimento como sentar, ficar em pé e andar ocorrerão tardiamente e déficits cognitivos graves e irreversíveis podem ocorrer. Bebês com hipotireoidismo geralmente parecem normais ao nascimento devido à proteção dos hormônios tireoidianos maternos. Portanto, a triagem neonatal (níveis de T4 e TSH) tem um papel crítico no diagnóstico e na prevenção do hipotireoidismo congênito. 2. Tireoidite, mais comum sendo a Doença de Hashimoto: caracterizada pela destruição dos folículos por anticorpos contra tireoide que fixam o complemento e promovem a lise das células. A glândula torna-se infiltrada por linfócitos B e T, podendo causar aumento temporário da glândula. Com o tempo, o tecido normal é substituído por tecido fibroso, instalando-se uma hipotireoidismo permanente. Geralmente, em metade dos pacientes, os níveis séricos de TSH estão elevados e os de T4 estão normais, os outros apresentam falência evidente da tireoide. 3. Neoplasia: é a neoplasia maligna endócrina mais comum e é responsável por mais mortes do que todos os outros tumores endócrinos juntos. 4. Deficiência de iodo: é a causa mais comum de hipotireoidismo em crianças no mundo. Essa forma trágica de hipotireoidismo endêmico pode ser prevenida por programas de saúde pública que adicionem iodo ao sal de mesa ou forneçam injeções anuais de uma preparação de iodeto absorvida lentamente. 15 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Diagnóstico Para determinar se o hipotiroidismo está presente, os médicos devem estar alerta para detectar os sinais e sintomas mais frequentes de hipotiroidismo, como: Muitas dessas características clínicas são inespecíficas, especialmente em pacientes idosos, e não são frequentes no HS. Portanto, alguns fatores de risco podem levantar suspeitas e indicar uma avaliação para o hipotiroidismo. Sendo: 16 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI O diagnóstico laboratorial do hipotireoidismo é feito através da dosagem sérica de TSH e T4 livre (T4L). O TSH é padrão-ouro para avaliação da função tireoidiana, com sensibilidade de 98% e especificidade de 92% para definição do diagnóstico. No hipotireoidismo primário (95% dos casos) há inicialmente a elevação de TSH e, na evolução, redução dos níveis de T4 e, posteriormente, de T3. No caso de ser improvável a presença do hipotireoidismo, mas devendo esta possibilidade ser descartada, há necessidade apenas da dosagem de TSH. Na suspeita de hipotireoidismo, devem ser dosados TSH e T4L (este não sofre interferências pelos fatores que afetam as proteínas ligadoras). TSH elevado com T4L baixo define a presença de hipotireoidismo primário. No hipotireoidismo central observa-se TSH baixo ou normal e T4L baixo. A dosagem de anticorpos antitireoidianos, mais especificamente antitireoperoxidase (ATPO) auxilia na definição da etiologia autoimune (tireoidite de Hashimoto). Outras possíveis alterações laboratoriais (quadro 2) são anemia leve a moderada, podendo ser normocítica, macrocítica (associada ou não à anemia perniciosa) e microcítica e hipocrômica (por deficiência de ferro, secundária à menorragia), aumento do colesterol total (por aumento do LDL), alterações enzimáticas (aumento das transaminases e creatinofosfoquinase), bem como hiperprolactinemia (com ou sem galactorreia) nos casos de hipotireoidismo primário. O hipotireoidismo central pode estar associado à deficiência de outros hormônios hipofisários – neste caso, deve ser solicitada ressonância magnética da hipófise para definição da etiologia. Cintilografia de tireoide com 131I não está indicada na investigação do hipotireoidismo – a captação será baixa ou ausente, independentemente da etiologia, tanto nos casos de origem primária como central. A ultrassonografia de rotina da tireoide não é recomendada, exceção em casos de pacientes com anticorpos antitireoidianos negativos para identificar pacientes com tireoidite autoimune ou com palpação tireoidiana anormal e também pode ser considerada para pacientes com hipotireoidismo subclínico para ajudar na avaliação do risco de progressão para hipotireoidismo. Deve haver grande cuidado na interpretação de testes de função tireoidiana em pacientes com doenças sistêmicas graves. Estas condições comumente levam a alterações nestes testes, sem que haja doença tireoidiana de fato. Em geral há inicialmente redução de T3, com ou sem elevação do T4, e, posteriormente, redução do T4 com TSH normal. Na fase de recuperação, o T3 e o T4 normalizam-se, e o TSH transitoriamente se eleva. Esse quadro, chamado de síndrome da doença não tireoidiana (SDNT), pode confundir o clínico e não há evidências de que os pacientes se beneficiem da intervenção. 17 Universidade Federal de Rondonópolis - Avelino Nunes Natis - Medicina - Turma VI Levotiroxina A terapia tem por objetivo repor a falta de hormônio tireoidiano endógeno com administração regular de hormônio tireoidiano exógeno. O hormônio tireoidiano exógeno, que é produzido por síntese química, é estruturalmente idêntico ao hormônio tireoidiano endógeno. É preferível o tratamento com reposição de T4 pois este encontra-se em maior concentração no plasma e possui um meia-vida de 6 dias, possibilitando o paciente tomar apenas uma pílula/dia. O fármaco de escolha é a levotiroxina, L-isômero de T4. A eficácia da reposição de hormônio tireoidiano é monitorada através de ensaios dos níveis plasmáticos de TSH e de hormônio tireoidiano. Se o paciente está tomando uma dose estável de levotiroxina, a monitoração dos níveis de TSH pode ser feita a cada 6 meses ou 1 ano. Súbitas alterações nos níveis de TSH podem ocorrer devido a interações medicamentosas. Por exemplo, certas resinas, como o polistireno sulfonato de sódio (Kayexelate®) e a colestiramina, podem diminuir a absorção de T4. Os fármacos que aumentam a atividade de certas enzimas P450 hepáticas, incluindo rifampicina e fenitoína, aumentam a excreção hepática de T4. Nesses casos, pode ser necessário aumentar a dose suplementar de T4 para manter um estado eutireóideo. A dose recomendada é de 1,6 μg/kg por dia, o que equivale a 100-125 μg diariamente. Pode-se iniciar o tratamento com dose de reposição completa, exceto em idosos e pacientes com problemas cardíacos. Em idosos recomenda-se começar com uma dose de 25 μg/dia, aumentando 25 μg a cada 4-6 semanas. Os níveis de TSH e T4 devem ser checados a cada 6 a 8 semanas, para o ajuste de dose necessário para restaurar os níveis de TSH. O objetivo do tratamento consiste em alcançar o bem-estar clínico e restaurar o eutireoidismo bioquímico, ou seja, o TSH sérico dentro do intervalo de referência de laboratório, em pacientes com hipotireoidismo primário. A resposta ao tratamento em pacientes com hipotireoidismo secundário deve basear-se nas avaliações de FT4 uma vez que a secreção de TSH é deficiente em doenças da hipófise. O objetivo terapêutico em tais casos seria o T4 no terço superior do intervalo de referência. Recomendações para o uso Grande parte dos alimentos (como a cafeína) e dos medicamentos podem diminuir a absorção do fármaco. É recomendado que ela deve ser ingerida em jejum, com água, pelo menos de 30 a 60 minutos antes do café da manhã, e com quatro horas de intervalo com medicamentos que interfiram na sua absorção. Também pode ser ingerida ao deitar, sendo importante essa forma de utilização em pacientes que tomam outras medicações. 18
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