Buscar

aula do gramsci

Prévia do material em texto

Gramsci começa indagando:‘os intelectuais constitui um grupo autônomo e independente ou cada grupo social possui sua própria categoria especializada de intelectuais?’ (p. 03) e a essa questão responde dizendo que existem várias formas no processo histórico real das categorias intelectuais, destacando em seguida duas mais importantes: 01 - o grupo social que nasce de uma função essencial no mundo da produção econômica, representado pelo empresário, mas também o senhores feudais que eram detentores de uma particular capacidade técnica, a militar, e apenas quando ele perde o monopólio dessa capacidade é que o mundo feudal entra em crise’ (p. 04) e 02 – o grupo social surgido a partir da estrutura econômica anterior e que não muda com a continuidade histórica, claramente expresso nos eclesiásticos. Nesse trecho o autor fala ainda da relação Igreja e poder e que, com o absolutismo, também cientistas, filósofos e teóricos não eclesiásticos compunham uma categoria intelectual relevante. Tudo isso para montar um quadro geral histórico temporal de quem são os detentores da intelectualidade em cada época. E assim, no mais puro modelo marxista, Gramsci traz à tona que cada período histórico contém em si as bases para o período posterior, o qual caracteriza-se também, embora minimamente, pelo período precedente.
Em seguida é colocada a seguinte questão: ‘ quais os limites ‘máximos’ da acepção ‘intelectual’? o que enseja o comentário que o erro metodológico é buscar um critério de distinção intrínseco às atividades intelectuais ao invés de buscá-lo no conjunto de sistemas de relações. (p. 06) e acaba por explicar que todos os homens são intelectuais, pois não se pode separar o homo faber do homo sapiens.
Nesse sentido, o autor revela-se mais um vez não apenas socialista, mas também em confronto com o modelo capitalista já que esse tem como modelo econômico a existência das relações entre taylorismo, novo escravismo e alienação, como fica claramente expresso no dizer de Kuenzer: ‘Taylor acresce à fragmentação do trabalho a divisão de funções entre gerência e trabalhador e que o conceito de controle do taylorismo assume uma conotação totalmente nova: a necessidade absoluta de a gerência impor ao trabalhador a maneira rigorosa pela qual o trabalho deve ser executado, tirando do trabalhador a possibilidade de pensá-lo, criá-lo, controlá-lo.’ (KUENZER, 1989, p. 29-30) 
Vale também mencionar que “já Aristóteles distinguia o que se faz para a utilização(chrêsis) e o que se faz para o conhecimento (gnôsis), ou seja, razão prática (frónesis) de razão teórica (sofia)” (MANACORDA, 1996, p.57 )
Ao dizer o que é a escola (instrumento para elaborar os intelectuais de diversos níveis) e o como foi enorme o desenvolvimento alcançado nela no que tange suas atividades e organização desde a Idade Média (p.09), nos é posta a relação entre quantidade e qualidade do conhecimento intelectual(p.10). Aqui apenas uma ressalva: o autor ao invés de tratar a crise do desemprego como uma dimensão importantíssima da crise estrutural do capitalismo, assim como relata Ricardo Antunes em seu livro “O caracol e sua Concha: ensaios sobre a nova morfologia do trabalho”, trata-a como algo simplesmente ‘inconveniente’(p.10), cremos que ele poderia ter sido mais incisivo nessa questão. 
Continuando, há ainda exposições sobre: 1 – Como os intelectuais são os ‘comissários’ do grupo dominante para o exercício das funções subalternas da hegemonia social e do governo político através do consenso ‘espontâneo’ das massas ou da coerção estatal.(p. 11); 2 – A posição diversa dos intelectuais de tipo urbano e de tipo rural, momento em que A. Gramsci sintetiza que ‘o ponto central da questão continua a ser a distinção entre intelectuais como categoria orgânica de cada grupo social fundamental e intelectuais como categoria tradicional’(pp. 12-3); 3 - intelectualidade e o partido político moderno, dividindo também em essa relação com duas distinções : a) partido político como modo próprio de elaborar a sua categoria de intelectuais orgânicos e b) partido político como mecanismo que proporciona a fusão entre os intelectuais orgânicos e os intelectuais tradicionais (pp. 14-5). Uma vez que Gramsci (na página 06) indica que deve haver pesquisas e estudos concretos sobre as formas como nasceu o monopólio da superestrutura por parte dos eclesiásticos, sem, contudo, aprofundar o tema, também nós nos arriscamos a dizer que é necessário haver estudos e pesquisas para contextualizar esse último ponto sobre a intelectualidade e os partidos políticos, pois estamos convencidos que seja oportuno uma análise mais detalhada dessa relação, se é que ela existe, para conscientização dos cidadãos e desalienação das massas.
Para se entender a ação dos intelectuais em uma determinada sociedade é preciso
percebê‐los em movimento relacional com a organização do trabalho, e como esse foi sendo
construído e distribuído no contexto em questão. A partir de então, apresentam‐se as categorias
explicativas de intelectual orgânico e intelectual tradicional. Para Gramsci (1982), ambas as
categorias revelam um fazer intelectual dicotômico, sendo tipologizado a partir das diversas
gradações escolares e dasfunções que essessujeitos desenvolvem em cada agrupamento social.
O intelectual orgânico emerge das condições concretas de um determinado grupo social e desenvolve o papel de representar suas condições de classe. O partido político moderno seria o lugar de experiência dos intelectuais orgânicos. 
Ao reconhecer as finalidades sociais do tipo tradicional, os pensou enquanto frutos de
aspirações e necessidades de uma classe:
No mundo moderno, a categoria dosintelectuais, assim entendida, ampliou‐se de modo inaudito. Foram elaboradas, pelo sistema social democrático‐burguês, imponentes massas de intelectuais, nem todas justificadas pelas necessidades sociais da produção, ainda que justificadas pelas necessidades políticas do grupo fundamental dominante. Daí a concepção loriana do ‘trabalho improdutivo’ ( mas improdutivo em relação a quem e a que modo de produção?), que poderia ser parcialmente justificada se levasse em conta que essas massas exploram sua posição a fim de obter grandes somas retiradas à renda nacional(GRAMSCI, 1982, p.12).
Sendo assim, essa categoria também é parte integrante das aspirações de uma classe  ‐ a
dominante ‐ na medida em que representa suas aspiraçõessociais, estabelecendo continuidades históricas. 
. Gramsci (1982) aponta
de maneira extensiva como os tipos de intelectual são parte visceral dos processos históricos na
formação das sociedades modernas.
Essa tipologia, orgânico e tradicional, assume caráter
protagonista no interior da teoria gramsciana,sendo cada um dessestipos, recortado por outro
tipo que se organiza a partir do seu maior ou menos grau de atuação na sociedade. Por exemplo,
osintelectuais do “tipo urbano” surgiram justamente com a proliferação da indústria e a partir da
organização do trabalho derivado dessemodo de produção. Suasfunções,
[...] não possuem nenhuma iniciativa autônoma na elaboração dos planos de
construção; colocam em relação, articulado‐as, a massa instrumental com o
empresário, elaboram a execução imediata do plano da produção estabelecidapelo estado‐maior da indústria, controlando suas fases executivas elementares.
Na média geral, os intelectuais urbanos são bastante estandartizados; os altos
intelectuais urbanos confundem‐se cada vez mais com o autêntico estado‐maior
industrial (GRAMSCI, 1982, p.12)
Osintelectuais urbanos não exercem função política sobre as massasinstrumentais, o que
pode acontecer é que as massas através dos seus próprios intelectuais orgânicos venham a
exercer uma influência política sobre os técnicos. Os intelectuais do “tipo rural” são marcados
pelasseguintes características:
[...] são, em sua maior parte, ‘tradicional’, isto é, ligados à massa social
camponesa e pequeno‐burguesa das cidades. [...] este tipo de intelectuais põe
em contato a massa camponesa com a administração estatal ou local(advogados,tabelião, etc.) e, por essa mesma função possuem uma grande função político‐
social, já que a mediação profissional dificilmente se separa da mediação política.
[...] todo desenvolvimento orgânico das massas camponesas, até certo ponto,
está ligado aos movimentos dos intelectuais e dele depende (GRAMSCI, 1982, p.
13).
Sendo assim, a explanação dos tipos intelectuais proposta por Gramsci (1982), nos levam
ao entendimento de como essa categoria social pode ser elucidativa para entendermos como a
vida social, seja no campo ou no espaço urbano, é permeada pelas funções que esses sujeitos
desempenham. Nesse sentido, Gramsci (1982) explora algumas características centrais na
composição dos Estados nacionais a partir das características propostas sobre esses sujeitos. Na
Itália, por exemplo, os intelectuais exerceram função internacional e cosmopolita, isso de certa
forma desagregou as energias nacionais. Na França, a situação foi diferente, pois o seu
desenvolvimento social forneceu um tipo completo e harmônico de todas as energias nacionais e,
particularmente, das categoriasintelectuaisque,
[...] sem efetivar compromissos essenciais com as velhas classes, mas pelo
contrário subordinando‐os as próprias finalidades. As primeiras células
intelectuais do novo tipo nascem com as primeiras células econômicas [...]. Esta
maciça construção intelectual explica a função da cultura francesa nos séculos
XVIII e XIX, função de irradiação internacional e cosmopolita e de expansão do
caráterimperialista ehegemônico demodo orgânico [...] (GRAMSCI, 1982, p.17).
No caso da América do Sul e Central, o autorobservou uma composição ampla da categoria
de intelectuaistradicionais,
[...] na base do desenvolvimento desses países os quadros da civilização
espanhola e portuguesa dosséculos XVI e XVII, caracterizada pela Contra‐Reforma
e pelo militarismo parasitário. [...] A base industrial é quase inexistente, por
predominar as propriedades latifundiárias, os intelectuais que ali se encontram
são na sua maioria do tipo rural, que são ligados ao clero e os proprietários. A
composição racial nacional é diversificada. [...] existe ainda nessas regiões
americanas uma situação tipo Kulturkampf e tipo processo Dreyfus, isto é, uma
situação na qual o elemento laico burguês ainda não alcançou o estágio da
subordinação, à política laica do Estado moderno, dos interesses e da influência
clerical e militarista. Assim, ocorre que, na oposição ao jesuitismo, possui ainda
grande influência a Maçonaria e o tipo de organização cultural como a ‘Igreja
Positivista’. Os eventos políticos dos últimos tempos ( novembro de 1930)  ‐  
Kulturkampf de Calles, no México, às insurreição militarista‐populares na
Argentina, no Brasil, no Peru, no Chile, na Bolívia – demonstram precisamente a
exatidão destas observações(GRAMSCI, 1982, p.21‐22).
Nesse sentido, suas formulações em torno desses sujeitos levaram em consideração as
especificidades históricas de cada sociedade em construção. Para finalidade desse estudo, o
tomaremos como ponto partida. No entanto, nossasreflexões não pretendem a partir do modelo
proposto, arrumar osintelectuais de forma polarizada. O que se pretende explorar na teoria é a
utilização de uma ferramenta que nos conduza ao movimento de levarmos tanto a explicações
mais gerais sobre as atividades dos intelectuais na sociedade, contudo, sem perder de vista as
particularidadesquemarcamessa atuação emcontextos específicos3
Renascimento italiano tenha encontrado estudiosos e divulgadoresbastante numerosos no exterior e que não exista um livrode conjunto escrito por um italiano? Ao que me parece, oRenascimento é a fase culminante moderna da "função in-ternacional dos intelectuais italianos"; por isso, ele não teveressonância na consciência nacional, que foi e continua a serdominada pela Contra-Reforma. O Renascimento é vivo nasconsciências nos locais em que criou novas correntes de cul-tura e de vida, nos locais em que operou em profundidade,não nos locais em que foi sufocado sem que restasse outroresíduo além do retórico e verbal e onde se tomou, portanto,objeto de "mera erudição",
Aobservação do cosmopolitismo do Século XVIII, que é exata,éaprofundadae especificada:o cosmopolitismo dosinte-lectuais italianos é exatamente similar ao cosmopolitismo dosoutros intelectuais nacionais? Este é o problema: para os ita-lianos, o cosmopolitismo está em função de uma 'posiçãopar-ticular que é atribuida à Itália, à diferença dos outros paises;isto é, a Itália é concebida como complementar de todos osoutros países, como produtora de beleza e de cultura paratoda a Europa.
A questãodos jovens.Existem muitas "questões" dosjovens.Duas delas me parecem particularmenteimportan-tes:1)A geração "antiga" realizasempre aeducação dos"jovens"; haverá conflito, discórdia, mas se trata de fenô-menos superficiais, inerentes a toda obra educativa e de re-freamento, a menos que estejam em jogo interferências declasse, isto é, os "jovens" (ou uma pequena parcela deles)da classe dirigente (entendida no mais amplo sentido, nãosó econômico como também politico-moral) se rebelam epassam para a classe progressista, que se tornou historica-mente capaz de tomar o poder:
Nesse sentido Gramsci propõe a integração do mundo da cultura com o mundo do trabalho, unificando os vários tipos de organização cultural existentes integrando o trabalho acadêmico tradicional às atividades ligadas à vida coletiva, ao mundo da produção e do trabalh
Gramsci defende que na escola unitária devem-se criar condições para que os indivíduos tenham acesso a esse repertório de informações que facilitam o processo de ensino-aprendizagem. Essa abordagem permite uma maior aproximação da escola com a vida que, por outro lado, ocasiona uma participação mais ativa dos indivíduos na sociedade.
A escola unitária
A educação para Gramsci desempenha um papel fundamental tanto na consolidação da hegemonia como na formulação da contra-hegemonia. 1 Para o autor a hegemonia é assegurada pelos organismos privados e não inteiramente pelo Estado. A organização escolar, ao lado de outras instituições da sociedade civil, auxiliam na consolidação da hegemonia que é exercida essencialmente em nível da cultura e da ideologia. O sistema educacional se constitui num dos canais onde se dá a produção e a difusão da ideologia. Nesse sentido, "a escola é o instrumento para formar intelectuais de vários níveis". 2 No sistema educacional burguês tradicional são formados os intelectuais orgânicos da classe burguesa que contribuem para a manutenção da hegemonia. Existem nesse grupo de intelectuais indivíduos que têm uma concepção de mundo que transcende os seus interesses de classe e auxiliam na formulação da contra-hegemonia. Esses dois tipos de intelectuais são formados na escola mas, no que se refere a esse último grupo, a sua consciência é formada fora da escola, isto é, no partido político. O mesmo acontece com os intelec-tuais orgânicos não profissionais. 
Gramsci 3, ao analisar o sistema de ensino italiano, critica a sua dualidade, isto é, a existência de dois tipos de ensino: a escola humanista e as escolas particulares de diferentes níveis. A primeira destinada a desenvolver a cultura geral dos indivíduos da classe dominante enquanto a outra prepara os alunos oriundos das classes dominadas para o exercício de profissões. Com o desenvolvimento da base industrial houve o surgimento do intelectual urbano e a necessidade de profissionalização desses indivíduos nas escolas técnicas.
No que se refere à escola clássica Gramsci afirma que:
A tendência hoje é a de abolir qualquer tipo de escola desinteressada (não imediatamente interessada) e formativa, ou conservar delas tão-somente um reduzido exemplar destinado a uma pequena elite de senhores e mulheres que não devem pensar em se preparar para um futuro profissional. 4
Para Gramsci, 5 a solução da crise do sistema de ensino italiano se daria a partir da implantação da escola única de cultura geral, formativa, que equilibrasse o desenvolvimento tanto da capacidadeintelectual como da manual. Essa escola forneceria orientação profissional e prepararia os indivíduos fosse para o ingresso em escolas especializadas, fosse para o trabalho produtivo.
Gramsci 6 está atento para o fato de que a criação intelectual e prática, assim como o desenvolvimento de autonomia e iniciativa dos indivíduos, requerem uma certa maturidade. Nesse sentido ele alerta que a fixação da idade escolar depende de o Estado assumir certos encargos que ficam por conta das famílias, afirmando o caráter público da escola unitária. Pois somente desta forma a educação pode atingir todos os indivíduos sem distinção de classe.
A operacionalização da escola única requer mudanças na organização escolar que dizem respeito aos prédios, material científico e corpo docente. É enfatizada a necessidade de um maior número de docentes "pois a eficiência da escola é muito maior e intensa quando a relação entre professor e aluno é menor." 7 As instalações devem ter dormitórios, refeitórios, bibliotecas especializadas, salas para trabalhos de seminário, etc. O autor 8 defende que, na etapa inicial de implantação da escola unitária, apenas um grupo reduzido de alunos tenha acesso a ela. A seleção para o ingresso seria efetuada por concurso ou a partir de indicações por instituições idôneas. 
No que se refere à organização da escola unitária o autor assinala que esta deveria englobar as escolas primárias e médias mas com uma reformulação de seus conteúdos, métodos e disposição dos graus:
O primeiro grau elementar não deveria ultrapassar três-quatro anos e, ao lado do ensino das primeiras noções de instrumentais de instrução (ler, escrever, fazer contas, geografia e história), deveria desenvolver notadamente a parte relativa aos direitos e deveres /.../ as primeiras noções de Estado e de Sociedade /.../ O resto do curso não deveria durar mais de seis anos de modo que, aos quinze-dezesseis anos, dever-se-ia concluir todos os graus da escola unitária.9
O autor 10 chama a atenção para o fato de que os jovens das classes mais favorecidas têm em sua vida familiar um ambiente que lhes facilita a carreira escolar. Os alunos urbanos, pelo fato de viverem nas cidades, também dominam noções e aptidões importantes para a aprendizagem. Gramsci 11 defende que na escola unitária devem-se criar condições para que os indivíduos tenham acesso a esse repertório de informações que facilitam o processo de ensino-aprendizagem. A criação de uma rede de auxílios à infância, que atuem paralelamente à escola unitária, também é prevista e tem como objetivo desenvolver nas crianças noções e aptidões pré-escolares assim como "uma certa disciplina coletiva." 12 
O autor 13 relativiza o papel da disciplina na escola única na medida em que critica a disciplina existente por esta ser mecânica e hipócrita. Outra crítica ao sistema de ensino vigente diz respeito à distância existente entre os liceus e a universidade, assinalada da seguinte forma:
Do ensino quase puramente dogmático, no qual a memória desempenha um grande papel, passamos à fase criadora ou de trabalho autônomo e independente; da escola com disciplina de estudo imposta e controlada autoritariamente passa-se a uma fase de estudo ou de trabalho profissional na qual a autodisciplina intelectual e autonomia moral são teoricamente ilimitadas. 14
É privilegiado na escola unitária o incentivo de métodos de estudo e aprendizagem que estimulem a criatividade não devendo estes ser monopólios da universidade.
Na escola unitária, a última fase deve ser concebida e organizada como a fase decisiva, na qual se tende a criar os valores fundamentais do humanismo, a autodisciplina intelectual e a autonomia moral necessárias a uma posterior especialização, seja de caráter científico (estudos universitários), seja de caráter imediatamente prático (indústria, burocracia, organização de trocas, etc). 15
A criatividade deve ser estimulada na escola e não deixada ao acaso da vida prática. Gramsci esclarece que:
A escola criadora não significa escola de inventores e descobridores; ela indica uma fase e um método de investigação e conhecimento, e não um programa predeterminado que obrigue à inovação e à originalidade a todo custo. 16
Nesse tipo de escola o professor desempenha um papel fundamental tendo a função de guia amigável tal como acontece de uma maneira geral na universidade. Os docentes devem ter "consciência de seu dever e do conteúdo filosófico desse dever." 17 O docente não deve ser passivo e sim engajado na proposta da escola unitária.
Para o autor a descoberta faz parte do processo criativo e caracteriza que o indivíduo possui método e por isso atingiu a maturidade intelectual. Mas, para se chegar a esse estágio, "a atividade escolar se desenvolverá nos seminários, nas bibliotecas e nos laboratórios experimentais. É [na atividade escolar] que serão recolhidas as indicações orgânicas para a orientação profissional." 18 Na escola unitária devem ser iniciadas as novas relações entre trabalho intelectual e trabalho manual que se estenderão a toda a vida social.
As universidades e as academias também devem assumir novas funções. Para o autor:
Estas duas instituições são, atualmente, independentes uma da outra; as academias são o símbolo, ridicularizado freqüentemente com razão, da separação existente entre a alta cultura e a vida, entre os intelectuais e o povo. 19
A sua proposta consiste em que a academia deve manter um intercâmbio com a universidade e deve possibilitar aos egressos da escola única, que ingressaram no trabalho, acesso ao conhecimento e subsídios para o desenvolvimento de atividades culturais. A sua preocupação é de que os trabalhadores não devem ser passivos intelectualmente. Nesse sentido Gramsci propõe a integração do mundo da cultura com o mundo do trabalho:
Unificar os vários tipos de organização cultural existentes: academias, institutos de cultura, círculos filológicos, etc., integrando o trabalho acadêmico tradicional /.../ a atividades ligadas à vida coletiva, ao mundo da produção e do trabalho. 20
Esses organismos também manteriam um intercâmbio com as universidades. A finalidade dessa iniciativa é centralizar e dar impulso à cultura nacional.
A aproximação entre educação e trabalho se inicia na escola elementar com o objetivo de despertar uma nova concepção de mundo nos jovens.
O conceito e o fato do trabalho (da atividade teórico-prática ) é o princípio educativo imanente à escola elementar, já que a ordem social e estatal (direitos e deveres) é introduzida e identificada na ordem natural pelo trabalho; a atividade teórico-prática do homem, cria os primeiros elementos de uma intuição, liberta o homem de toda magia ou bruxaria, e fornece o ponto de partida para posterior desenvolvimento de uma concepção histórico-dialética do mundo. 21
Essa abordagem permite uma maior aproximação da escola com a vida que, por outro lado, ocasiona uma participação mais ativa dos indivíduos na sociedade.
O autor relata a tendência das escolas em fornecer uma formação com objetivos imediatistas. Esse fato está relacionado à crise da tradição cultural e da concepção de vida e de homem. Ressalta, entretanto, que a escola pode ser formativa e instrutiva, ou seja, rica em noções concretas. Recomenda que:
Deve-se evitar a multiplicação e graduação dos tipos de escola profissional, criando-se, ao contrário, um tipo de escola preparatória (elementar e média) que conduza o jovem até os umbrais da escolha profissional, formando-o entrementes como pessoa capaz de pensar, de estudar, de dirigir ou de controlar quem dirige. 22
À primeira vista a criação de escolas profissionalizantes pode parecer democrático mas, para o autor, esse tipo de escola acirra as diferenças sociais. Ao invés da qualificação para um determinado posto de trabalho, Gramsci defende que a escola capacite todo o indivíduo, mesmo que abstratamente, a ser dirigente, pois:
A democracia política tende a fazer coincidir governantes e governados (no sentido de governo com o consentimento dos governados), assegurandoa cada governado a aprendizagem gratuita de capacidades e de preparação técnica geral necessárias ao fim de governar. 23
Gramsci nos alerta que as crianças oriundas de classes sociais diferentes possuem hábitos distintos e a escola deve criar mecanismos para transpor essas barreiras:
Deve-se convencer a muita gente que o estudo é também um trabalho, e muito fatigante, com um tirocínio particular próprio, não só muscular-nervoso mas intelectual; é um processo de adaptação, é um hábito adquirido com esforço, aborrecimento e mesmo sofrimento. 24
Mas, para as crianças criadas em familiaridade com o ambiente intelectual, existe uma maior facilidade de concentração. Gramsci 25 defende que a escola deva contribuir para superar as diferenças no que diz respeito ao regime alimentar na medida em que carências nesse sentido ocasionam dificuldades no estudo. Enfim, as diferenças de classe dificultam o êxito dos filhos da classe trabalhadora e medidas devem ser tomadas para suprir essas carências.
O advento da escola unitária significa o inicio de novasrelações entre trabalho intelectual e trabalho industrial nãoapenas na escola, mas em toda a vida social. O princípiounitário,por isso, refletir-se-á em todos os organismos decultura, transformando-os e emprestando-lhes um novo con-teúdo.

Continue navegando