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ESTUDO APROFUNDADO DA DOUTRINA ESPÍRITA Livro III Ensinos e parábolas de Jesus Parte II ESTUDO APROFUNDADO DA DOUTRINA ESPÍRITA Orientações espíritas e sugestões didático-pedagógicas direcionadas ao estudo do aspecto religioso do Espiritismo organizadora Marta Antunes de Oliveira de Moura Copyright © 2013 by FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA – FEB 1a edição – 7a impressão – 1,1 mil exemplares – 11/2019 ISBN 978-85-7328-772-1 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode ser reprodu- zida, armazenada ou transmitida, total ou parcialmente, por quaisquer métodos ou processos, sem autorização do detentor do copyright. FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA – FEB SGAN 603 - Conjunto F - Avenida L2 Norte 70830-106 – Brasília (DF) – Brasil www.febeditora.com.br editorial@febnet.org.br +55 61 2101 6198 Pedidos de livros à FEB Comercial Tel.: (61) 2101 6155/6177 – comercial@febnet.org.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Federação Espírita Brasileira – Biblioteca de Obras Raras) M929e Moura, Marta Antunes de Oliveira (Org.), 1946– Estudo aprofundado da doutrina espírita: Ensinos e parábolas de Jesus – Parte II. Orientações espíritas e sugestões didático-pedagógicas di- recionadas ao estudo do aspecto religioso do espiritismo / Marta Antunes de Oliveira Moura (organizadora). – 1. ed. – 7. imp. – Brasília: FEB, 2019. V. 3; pt. 2; 335 p.; 25 cm Inclui referências ISBN 978-85-7328-772-1 1. Espiritismo. 2. Estudo e ensino. 3. Educação. I. Federação Espírita Brasileira. II. Título. CDD 133.9 CDU 133.7 CDE 60.00.00 SUMÁRIO Apresentação ........................................................................................................... 7 Agradecimentos ...................................................................................................... 9 Esclarecimentos.....................................................................................................11 Módulo I – Aprendendo com as profecias .......................................................15 Roteiro 1 – O consolador ........................................................................17 Roteiro 2 – Ninguém é profeta em sua terra ........................................27 Roteiro 3 – A pedra angular ....................................................................37 Roteiro 4 – Sinais dos tempos .................................................................47 Roteiro 5 – Um rebanho e um pastor ....................................................57 Módulo II – Ensinos diretos de Jesus ...............................................................65 Roteiro 1 – O jugo de Jesus .....................................................................67 Roteiro 2 – A autoridade de Jesus ..........................................................77 Roteiro 3 – A casa edificada sobre a rocha............................................85 Roteiro 4 – As moradas na casa do pai ..................................................93 Roteiro 5 – Impositivo da renovação ...................................................103 Roteiro 6 – Palavras de vida eterna ......................................................111 Roteiro 7 – O mandamento maior .......................................................119 Módulo III – Ensinos por parábolas ...............................................................125 Roteiro 1 – O filho pródigo ...................................................................127 Roteiro 2 – Os trabalhadores da vinha ................................................139 Roteiro 3 – Os talentos ..........................................................................147 Roteiro 4 – As parábolas da figueira ....................................................161 Roteiro 5 – O credor incompassivo ...................................................169 Roteiro 6 – A festa das bodas..............................................................177 Roteiro 7 – O tesouro e a pérola .........................................................185 Roteiro 8 – A parábola do rico e de Lázaro ......................................191 Roteiro 9 – O amigo importuno ........................................................199 Roteiro 10 – O poder da fé ....................................................................207 Módulo IV – Aprendendo com as curas ........................................................219 Roteiro 1 – A cura da mulher que sangrava .......................................221 Roteiro 2 – Ressurreição da filha de Jairo ...........................................229 Roteiro 3 – Obsessões espirituais .........................................................239 Roteiro 4 – Cura de cegueira ................................................................249 Roteiro 5 – Cura de hanseníase ............................................................259 Módulo V – Aprendendo com fatos cotidianos ............................................267 Roteiro 1 – Marta, Maria e Maria de Magdala ...................................269 Roteiro 2 – A mulher sirofenícia ..........................................................279 Roteiro 3 – A vinda do reino ................................................................287 Módulo VI – Aprendendo com fatos extraordinários ..................................295 Roteiro 1 – A ressurreição de Lázaro ...................................................297 Roteiro 2 – A multiplicação de pães e peixes ......................................309 Roteiro 3 – Jesus caminha sobre as águas ...........................................319 Roteiro 4 – A transfiguração de Jesus ..................................................327 APRESENTAÇÃO Em sequência ao estudo EADE, colocamos à disposição do Movimento Espírita, o terceiro livro do Curso: Ensinos e Parábolas de Jesus – Parte 2. O assunto não se esgota na publicação deste material, uma vez que o Evangelho nos oferece uma riqueza inesgotável de aprendizados: cada versículo, cada expressão, cada frase proferida pelo Cristo é motivo para reflexão e análise aprofundada. Uma só existência reencarnatória se revela insuficiente para apreender as sublimes lições que Jesus nos legou. Outras tantas são necessárias para colocá-las em prática. Contudo, o estudo dos ensinamentos evangélicos, à luz da Doutrina Espírita, é uma feliz oportunidade que devemos aproveitar, tendo em vista a urgente necessidade da nossa transformação moral. Brasília (DF), janeiro de 2013. AGRADECIMENTOS Gostaríamos de expressar nossa sincera gratidão a Honório Onofre Abreu (1930– 2007), valoroso trabalhador espírita e amigo querido que, no Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita, elaborou o programa e os textos dos livros II e III – Ensinos e Parábolas de Jesus, partes 1 e 2, analisados à luz da Doutrina Espírita. Somos tomados por profundas e felizes emoções quando, voltando ao passado, recordarmos os primeiros contatos com Honório e a sua imediata aceitação em realizar o trabalho. Por dois anos consecutivos, de 2003 a 2005, estabeleceu-se entre nós fraterna convivência, período em que tivemos a oportunidade de aprender estudar o Evangelho de Jesus, ampliando o entendimento do assunto que extrapola interpretações literais ainda comuns, inclusive no meio espírita. Conviver com Honório foi, efetivamente, uma jornada de luz. Ele não foi apenas um simples interpretador do Evangelho, causa a que se dedicou ao longo da última existência. Realizava a tarefa com simplicidade, conhecimento e sabedoria que encantavam os ou- vintes, independentemente do nível sociocultural que apresentassem. Contudo, importa destacar, efetivamente Honório soube vivenciar os ensinamentos de Jesus junto a todos os que foram convocados a compartilhar, direta ou indiretamente, a sua última reencarnação. Dirigimos também o nosso agradecimento a outro amigo, Haroldo Dutra Dias, de- dicado estudioso espírita do Evangelho, que transcreveu os textos gravados por Honório,adequando-os à linguagem escrita. Brasília (DF), 29 de janeiro de 2013. Marta Antunes Moura ESCLARECIMENTOS Organização e Objetivos do Curso O Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita (EADE) é um curso que tem como proposta enfatizar o tríplice aspecto da Doutrina Espírita, estudado de forma geral nos cursos de formação básica, usuais na Casa Espírita. O estudo teórico da Doutrina Espírita desenvolvido no EADE está fundamentado nas obras da Codificação e nas complementares a estas, cujas ideias guardam fidelidade com as diretrizes morais e doutrinárias definidas, respectivamente por Jesus e por Allan Kardec. Os conteúdos do EADE priorizam o conhecimento espírita e destaca a relevância da formação moral do ser humano. Contudo, sempre que necessário, tais as orientações são comparadas a conhecimentos universais, filosóficos, científicos e tecnológicos, presentes na cultura e na civilização da Humanidade, com o intuito de demonstrar a relevância e a atualidade da Doutrina Espírita. Os objetivos do Curso podem ser resumidos em dois, assim especificados: » Propiciar o conhecimento aprofundado da Doutrina Espírita no seu tríplice aspecto: religioso, filosófico e científico. » Favorecer o desenvolvimento da consciência espírita, necessário ao aprimoramento moral do ser humano. O Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita tem como público-alvo todos os espíri- tas que gostem de estudar, que desejam prosseguir nos seus estudos doutrinários básicos, realizando aprofundamentos de temas que conduzam à reflexão, moral e intelectual. Neste sentido, o Curso é constituido por uma série de cinco tipos de conteúdos, assim especificados: » Livro I: Cristianismo e Espiritismo » Livro II: Ensinos e Parábolas de Jesus – Parte 1 » Livro III: Ensinos e Parábolas de Jesus – Parte 2 EADE • Livro III • Esclarecimentos 12 » Livro IV: O Consolador prometido por Jesus » Livro V: Filosofia e Ciência Espíritas Fundamentos espíritas do curso » A moral que os Espíritos ensinam é a do Cristo, pela razão de que não há outra melhor. [...] » O que o ensino dos Espíritos acrescenta à moral do Cristo é o conheci- mento dos princípios que regem as relações entre os mortos e os vivos, princípios que completam as noções vagas que se tinham da alma, do seu passado e do seu futuro [...]. Allan Kardec: A gênese. Cap. I, item 56. » O Espiritismo é forte porque assenta sobre as próprias bases da religião: Deus, a alma, as penas e as recompensas futuras [...]. Allan Kardec: O livro dos espíritos. Conclusão V. » [...] O mais belo lado do Espiritismo é o lado moral. É por suas con- sequências morais que triunfará, pois aí está a sua força, pois aí é in- vulnerável. [...] Allan Kardec: Revista Espírita, 1861, novembro, p. 495. » [...] Ainda uma vez [o Espiritismo], é uma filosofia que repousa sobre as bases fundamentais de toda religião e na moral do Cristo [...]. Allan Kardec: Revista Espírita, 1862, maio, p. 174-175. » Não, o Espiritismo não traz moral diferente da de Jesus. [...] Os Espíri- tos vêm não só confirmá-la, mas também mostrar-nos a sua utilidade prática. Tornam inteligíveis e patentes verdades que haviam sido ensi- nadas sob forma alegórica. E, justamente com a moral, trazem-nos a definição dos mais abstratos problemas da Psicologia. Allan Kardec: O livro dos espíritos. Conclusão VIII. » Podemos tomar o Espiritismo, simbolizado desse modo, como um triângulo de forças espirituais. » A Ciência e a Filosofia vinculam à Terra essa figura simbólica, porém, a Religião é o ângulo divino que a liga ao céu. No seu aspecto científico e filosófico, a Doutrina será sempre um campo de nobres investigações humanas, como outros movimentos coletivos, de natureza intelectual, que visam ao aperfeiçoamento da Humanidade. No aspecto religioso, todavia, repousa a sua grandeza divina, por constituir a restauração do Evangelho de Jesus Cristo, estabelecendo a renovação definitiva do EADE • Livro III • Esclarecimentos 13 homem, para a grandeza do seu imenso futuro espiritual. Emmanuel: O consolador. Definição, p. 13-14. » A ciência espírita compreende duas partes: experimental uma, relativa às manifestações em geral; filosófica, outra, relativa às manifestações inteligentes. Allan Kardec: O livro dos espíritos. Introdução, item 17. » Falsíssima ideia formaria do Espiritismo quem julgasse que a sua for- ça lhe vem da prática das manifestações materiais [...]. Sua força está na sua filosofia, no apelo que dirige à razão, ao bom senso. [...] Fala uma linguagem clara, sem ambiguidades. Nada há nele de místico, nada de alegorias suscetíveis de falsas interpretações. Quer ser por todos compreendido, porque chegados são os tempos de fazer-se que os homens conheçam a verdade [...]. Não reclama crença cega; quer que o homem saiba por que crê. Apoiando-se na razão, será sempre mais forte do que os que se apoiam no nada. Allan Kardec: O livro dos espíritos. Conclusão VI. » [...] o Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Como ciência prática ele consiste nas relações que se estabelecem entre nós e os Espíritos; como filosofia, compreende todas as consequências morais que dimanam dessas mesmas relações. Allan Kardec: O que é o espiritismo. Preâmbulo. » [...] o Espiritismo não traz moral diferente da de Jesus. [...] Os Espíri- tos vêm não só confirmá-la, mas também mostrar-nos a sua utilidade prática. Tornam inteligíveis e patentes verdades que haviam sido ensi- nadas sob a forma alegórica. E, justamente com a moral, trazem-nos a definição dos mais abstratos problemas da Psicologia. Allan Kardec: O livro dos espíritos. Conclusão VIII. » O Espiritismo se apresenta sob três aspectos diferentes: o das ma- nifestações, dos princípios e da filosofia que delas decorrem e o da aplicação desses princípios. Allan Kardec: O livro dos espíritos. Conclusão, VII. Sugestão de Funcionamento do Curso a) Requisitos de admissão: os participantes inscritos devem ter con- cluído cursos básicos e regulares da Doutrina Espírita, como o Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita, ou ter conhecimento das obras codificadas por Allan Kardec. EADE • Livro III • Esclarecimentos 14 b) Duração das reuniões de estudo: sugere-se o desenvolvimento de uma reunião semanal, de 1 hora e 30 minutos a 2 horas. c) Atividade extraclasse: é de fundamental importância que os parti- cipantes façam leitura prévia dos temas que serão estudados em cada reunião e, também, realizem pesquisas bibliográficas a fim de que o estudo, as análises, as correlações e reflexões, desenvolvidas no Curso, propiciem melhor entendimento dos conteúdos. EADE LIVRO III | MÓDULO I APRENDENDO COM AS PROFECIAS EADE – LIVRO III | MÓDULO I APRENDENDO COM AS PROFECIAS Roteiro 1 O CONSOLADOR Objetivos » Explicar as características de o Consolador Prometido por Jesus, à luz do entendimento espírita. » Esclarecer porque a Doutrina Espírita é entendida como o Consolador. Ideias principais » Assim como o Cristo disse: “Não vim destruir a lei, porém cumpri-la”, também o Espiritismo diz: “Não venho destruir a lei cristã, mas dar- -lhe execução.” Nada ensina em contrário ao que ensinou o Cristo; mas, desenvolve, completa e explica, em termos claros e para toda a gente, o que foi dito apenas sob forma alegórica. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. I, item 7. » O Espiritismo realiza [...] todas as condições do Consolador que Jesus prometeu. Não é uma doutrina individual, nem de concepção huma- na; ninguém pode dizer-se seu criador. É fruto do ensino coletivo dos Espíritos, ensino a que preside o Espírito de Verdade. Nada suprime do Evangelho: antes o completa e o elucida. Allan Kardec: A gênese. Cap. XVII, item 40. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 1 18 Subsídios 1. Texto evangélico Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenhodito. (João, 14:26.) Ainda tenho muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora. Mas, quando vier aquele Espírito da verdade, ele vos guiará em toda a Verdade, porque não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará o que há de vir. (João, 16:12-13.) Vários textos do Evangelho de Jesus, como esses, registrados por João, apresentam acentuado sentido profético. As profecias asse- melham-se a um homem situado no cume de uma montanha e que observa, lá de cima, a paisagem que se desdobra à sua volta, até onde os seus olhos podem alcançar. Vê, inclusive, um viajor que percorre o caminho localizado abaixo, sob seus pés. O viajor que pela primeira vez percorra essa estrada, sabe que, ca- minhando chegará ao fim dela. Constitui isso uma simples previsão da consequência que terá a sua marcha. Entretanto, os acidentes do terreno, as subidas e descidas, os cursos da água que terá de transpor, os bosques que haja de atravessar, os precipícios em que poderá cair, as casas hospitaleiras onde lhe será possível repousar, os ladrões que o espreitem para roubá-lo, tudo isso independe da sua pessoa: é para ele o desconhecido, o futuro, porque a sua vista não vai além da pequena área que o cerca. Quanto à duração, mede-a pelo tempo que gasta em perlustrar o caminho. Tirai-lhe os pontos de referência e a duração desaparecerá. Para o homem que está em cima da montanha e que o acompanha com o olhar, tudo aquilo está presente. Suponhamos que esse homem desce do seu ponto de observação e, indo ao encontro do viajante, lhe diz: “Em tal momento, encontrarás tal coisa, serás atacado e socorrido.” Estará predizendo o futuro, mas, futuro para o viajante, não para ele, autor da previsão, pois que, para ele, esse futuro é presente.8 As previsões e avisos proféticos são comuns no Evangelho de Jesus. Significa dizer que o Mestre lançou ao futuro o entendimento espiritual, e definitivo, de sua mensagem. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 1 19 Esta predição, não há contestar, é uma das mais importantes, do ponto de vista religioso, porquanto comprova, sem a possibilidade do menor equívoco, que Jesus não disse tudo o que tinha a dizer, pela razão de que não o teriam compreendido nem mesmo seus apóstolos, visto que a eles é que o Mestre se dirigia. Se lhes houvesse dado instruções secretas, os Evangelhos fariam referência a tais instruções. Ora, desde que Ele não disse tudo a seus apóstolos, os sucessores destes não terão podido saber mais do que eles, com relação ao que foi dito; ter-se-ão possivelmente enganado, quanto ao sentido das palavras do Senhor, ou dado interpretação falsa aos seus pensamentos, muitas vezes velados sob a forma parabólica.7 Emergem dos dois textos de João, além do sentido premonitório, outros elementos importantes para nós espíritas, os quais nos fazem acreditar ser o Espiritismo o Consolador anunciado por Jesus. O Espiritismo realiza [...] todas as condições do Consolador que Jesus prometeu. Não é uma doutrina individual, nem de concepção humana; ninguém pode dizer-se seu criador. É fruto do ensino coletivo dos Espíritos, ensino a que preside o Espírito de Verdade. Nada suprime do Evangelho: antes o completa e o elucida. Com o auxílio das novas leis que revela, conjugadas essas leis às que a Ciência já descobrira, faz se compreenda o que era ininteligível e se admita a possibilidade da- quilo que a incredulidade considerava inadmissível. Teve precursores e profetas, que lhe pressentiram a vinda. Pela sua força moralizadora, ele prepara o reinado do bem na Terra.9 2. Interpretação do texto evangélico » Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito (Jo 14:26). A promessa do Cristo de enviar outro Consolador prende-se ao fato de que a Humanidade não estava madura, à época, para entender a essência e a verdade contidas nos seus ensinamentos. O advento do Consolador, também denominado Espírito Santo ou Espírito de Verdade, tem dupla finalidade: explicar e recordar os ensinamentos do Cristo, não de forma literal como aconteceu ao longo dos séculos, mas em espírito e verdade. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 1 20 A expressão “Espírito Santo”, citada no primeiro texto de João, tem significado espírita específico que nada tem a ver com a teologia de outras interpretações cristãs: indica fonte sábia e inesgotável de bens espirituais, recursos que dimanam do Alto, da fonte da vida, no trabalho justo e incansável que se estende pelo Universo. A outra expressão, “Espírito de Verdade”, encontrada na segunda citação do evangelista, indica que o Consolador interpreta corretamente os en- sinos do Cristo, conforme o entendimento espiritual. Kardec explica, assim, o Consolador na sua feição de Verdade: Então, quando o campo estiver preparado, eu vos enviarei o Consolador, o Espírito de Verdade, que virá restabelecer todas as coisas, isto é, que, dando a conhecer o sentido verdadeiro das minhas palavras, que os homens mais esclarecidos poderão enfim compreender, porá termo à luta fratricida que desune os filhos do mesmo Deus. Cansados, afinal, de um combate sem resultado, que consigo traz unicamente a desolação e a perturbação até ao seio das famílias, reconhecerão os homens onde estão seus verdadeiros interesses, com relação a este mundo e ao outro. Verão de que lado estão os amigos e os inimigos da tranquilidade deles. Todos então se porão sob a mesma bandeira: a da caridade, e as coisas serão restabele- cidas na Terra, de acordo com a verdade e os princípios que vos tenho ensinado.4 A vinda do Consolador tem, pois, o poder de ampliar os hori- zontes do entendimento humano, favorecendo a busca pelos legítimos valores de libertação do Espírito. Para o espírita, o Espiritismo representa a consubstanciação da mensagem cristã porque explica e revive os ensinamentos do Evangelho. A Doutrina Espírita levantou o véu que encobria o entendimento das parábolas e dos demais ensinamentos de Jesus. O Espiritismo vem, na época predita, cumprir a promessa do Cristo: preside ao seu advento o Espírito de Verdade. Ele chama os homens à observância da lei; ensina todas as coisas fazendo compreender o que Jesus só disse por parábolas. [...] O Espiritismo vem abrir os olhos e os ouvidos, porquanto fala sem figuras, nem alegorias [...].2 A Doutrina Espírita faz ressurgir a mensagem cristã em bases claras e lúcidas, orientando como aplicá-la no dia a dia, sem a utiliza- ção de simbolismos ou de metáforas. O Espiritismo é considerado o EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 1 21 Consolador Prometido porque a sua mensagem, sendo de fácil enten- dimento, está destinada a todas as pessoas, sem exceção e, ao mesmo tempo, consola, agasalha, auxilia e esclarece as pessoas que passam por aflições ou que buscam esclarecimento espiritual. Mostra [...] a causa dos sofrimentos nas existências anteriores e na destinação da Terra, onde o homem expia o seu passado. Mostra o objetivo dos sofrimentos, apontando-os como crises salutares que produzem a cura e como meio de depuração que garante a felicidade nas existências futuras. O homem compreende que mereceu sofrer e acha justo o sofrimento. [...] Assim, o Espiritismo realiza o que Jesus disse do Consolador prometido: conhecimento das coisas, fazendo que o homem saiba donde vem, para onde vai e por que está na Terra; atrai para os verdadeiros princípios da Lei de Deus e consola pela fé e pela esperança.3 As orientações espíritas ensinam que a pessoa que erra não deve ser julgada, mas amparada. Precisa receber o conforto necessário para saber superar as provações da vida. Este nome [Consolador], significativo e sem ambiguidade, encerra toda uma revelação. Assim, ele previa que os homens teriam necessi- dade de consolações, o que implica a insuficiência daquelas que eles achariam na crença que iam fundar. Talvez nunca o Cristo fosse tão claro, tão explícito,como nestas últimas palavras, às quais poucas pessoas deram atenção bastante, provavelmente porque evitaram esclarecê-las e aprofundar-lhes o sentido profético.5 No final do versículo 26, consta a seguinte anotação do apóstolo: “Que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito” (Jo 14:26). Este registro faz referência quanto à chegada do Consolador, mas não explicita a época certa, pois tal acontecimento dependeria do grau de maturidade espiritual existente na humanidade terrestre. Na segunda metade do século XIX, o Consolador Prometido chegou ao plano físico, na França, por meio do trabalho incansável de inúmeros médiuns. Sob a coordenação de Allan Kardec, cognome do professor Hippolyte Léon Denizard Rivail, ensinos ditados pelos Espíritos superiores foram organizados na forma de uma doutrina, a Doutrina Espírita, codificada na obra O livro dos espíritos, publicada em 18 de abril de 1857. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 1 22 Assim como o Cristo disse: “Não vim destruir a lei, porém cumpri-la”, também o Espiritismo diz: “Não venho destruir a lei cristã, mas dar-lhe execução.” Nada ensina em contrário ao que ensinou o Cristo; mas, de- senvolve, completa e explica, em termos claros e para toda gente, o que foi dito apenas sob forma alegórica. Vem cumprir, nos tempos preditos, o que o Cristo anunciou e preparar a realização das coisas futuras. Ele é, pois, obra do Cristo, que preside, conforme igualmente o anunciou, à regeneração que se opera e prepara o reino de Deus na Terra.1 Erguida no alicerce das leis universais, o Espiritismo, chegou no momento em que o avanço das conquistas humanas revelava maior discernimento para implementação da fé raciocinada. Os seus abençoados ensinos foram sustentados e transmitidos pela abnegada ação dos mensageiros do Cristo. O Espiritismo pode, pois, ser compreendido como a manifestação da misericórdia divina, iluminando os passos dos que se encontram cansados, desiludidos e oprimidos, os quais, sustentados pelo Amor divino, cooperam para a edificação de uma Humanidade regenerada. A frase “Vos ensinará todas coisas”, indica o caráter dinâmico e atual das orientações espíritas, uma vez que os médiuns em processo de sintonia com os orientadores da Vida Maior, deles receberão con- tínuos e renovados esclarecimentos. A última frase do versículo — “E vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito” — é uma referência, explícita, à necessidade de estudar o Evangelho à luz do Consolador Prometido. O conhecimento dos postulados espíritas oferece subsídios para o entendimento completo da mensagem do Cristo. É tarefa sem êxito querer compreender o Evangelho somente pelo sentido literal. É preciso captar-lhe a essência, o seu significado espiritual e atemporal, tal como propõe a Doutrina Espírita. A palavra de Jesus submetida às lentes espíritas se desdobra em cada lance, de modo simples e natural, favorecendo melhor e mais amplo entendimento. » Ainda tenho muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora. Mas, quando vier aquele Espírito de Verdade, ele vos guiará em toda a verdade; porque não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que há de vir (Jo 16:12-13). O versículo 12 informa: “Ainda tenho muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora”. Por esta afirmativa, o Cristo nos EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 1 23 projeta para o grande futuro, conscientizando-nos que o aprendiza- do espiritual prossegue sempre, de forma infinita, porque nunca está completo. À medida que evoluímos, percebemos uma nova verdade que, como uma reação em cadeia, nos conduz a outra, sucessivamente, ao longo dos tempos. Se o Cristo não disse tudo quanto poderia dizer, é que julgou conve- niente deixar certas verdades na sombra, até que os homens chegassem ao estado de compreendê-las. Como Ele próprio confessou, seu ensino era incompleto, pois anunciava a vinda daquele que o completaria; previra, pois, que suas palavras não seriam bem interpretadas, e que os homens se desviariam do seu ensino; em suma, que desfariam o que Ele fez, uma vez que todas as coisas hão de ser restabelecidas: ora, só se restabelece aquilo que foi desfeito.6 A Teologia tradicional ensina que o Consolador teria vindo no dia de Pentecostes. Acreditamos que é um equívoco de interpretação, pois não seria em apenas 50 dias — contados da Ressurreição ao dia de Pentecostes que os discípulos estariam suficientemente preparados para apreender todo ensinamento do Mestre. Na verdade, Pentecostes marca, de forma indelével, o início do trabalho apostolar, as lutas e os teste- munhos que eles teriam de submeter por amor ao Senhor. Sobretudo se considerarmos que os praticantes da lei de Moisés, daquela época, ainda se encontravam na adolescência espiritual, por se manterem presos aos ritualismos dos cultos. Ora, se o Cristo não dissera tudo quanto tinha a dizer, porque nem mesmo seus discípulos podiam, ainda, entender certas verdades, será que, algumas semanas depois, já haviam esses mesmos homens alcan- çado as luzes necessárias à compreensão do que Ele deixara de dizer? Só mesmo quem desconhecesse por completo a natureza humana poderia admitir tal hipótese.10 No período do surgimento da Doutrina Espírita, a Humanidade estava espiritualmente mais adiantada. Daí a pujança que aportou ao mundo, elegendo o Amor, na forma de caridade, e a Fé raciocinada como princípios fundamentais. Os cinquenta dias que decorreram da ressurreição ao Pentecostes, assim como não seriam suficientes para dar aos homens os conheci- mentos que só podem ser adquiridos a longo prazo, seriam poucos, EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 1 24 igualmente, para que houvessem esquecido as palavras do Mestre e se fizesse preciso “recordá-las”, tanto mais que, durante quarenta dias, permaneceu ele [Jesus] cá na Terra, manifestando-se aos discípulos, antes de ascender aos céus.11 No versículo 13 está escrito: “Mas, quando vier aquele Espírito de Verdade, ele vos guiará em toda a verdade; porque não falará de si mes- mo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que há de vir”. As palavras de Jesus revelam que o Consolador tem como ca- racterística básica guiar os aprendizes no caminho da verdade. Não existirão mais simbolismos, nem rituais, nem interpretações pessoais, apenas o ensinamento puro da mensagem cristã. Devemos considerar, entretanto, que a Doutrina Espírita não detém a pretensão do tudo saber, de ser dona da verdade, e nem veio ao mundo para substituir as outras crenças. O Espiritismo não pode guardar a pretensão de exterminar as outras crenças, parcelas da verdade que a sua doutrina representa, mas, sim, trabalhar por transformá-las, elevando-lhes as concepções antigas para o clarão da verdade imortalista. A missão do Consolador tem que se verificar junto das almas e não ao lado das gloríolas efêmeras dos triunfos materiais. Esclarecendo o erro religioso, onde quer que se encontre, e revelando a verdadeira luz, pelos atos e pelos ensina- mentos, o espiritista sincero, enriquecendo os valores da fé, representa o operário da regeneração do Templo do Senhor, onde os homens se agrupam em vários departamentos ante altares diversos, mas onde existe um só Mestre, que é Jesus Cristo.13 O Espírito de Verdade é, pois, concessão divina que representa a soma de valores espirituais que alcança o campo operacional da existência humana, auxiliando a redenção de cada Espírito. É a verdade essencial que liberta e promove o crescimento do Espírito, demonstrada pela natureza dos seus pensamentos, pelas ideias que expressa e pelas ações que realiza. Essa verdade corresponde à verdade individual de cada pessoa, definindo-lhe o seu piso evolutivo. Daí a importância da afirmativa de Jesus: “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (João, 8:32). A Verdade suprema, contudo, está em Deus. Jesus reflete-a com autoridade, esabedoria, enquanto os seres humanos a manifestam segundo o nível de evolução espiritual que possuem. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 1 25 O Espírito de Verdade, portanto, não falará de si mesmo, mas revelará, sempre, a obra divina, intermediada pelos instrumentos mediúnicos, de todos os tempos, que estejam sintonizados com os valores sublimados da vida. Em síntese, esclarece Emmanuel: O Espiritismo evangélico é o Consolador prometido por Jesus, que, pela voz dos seres redimidos, espalham as luzes divinas por toda a Terra, res- tabelecendo a verdade e levantando o véu que cobre os ensinamentos na sua feição de Cristianismo redivivo, a fim de que os homens despertem para a era grandiosa da compreensão espiritual com o Cristo.12 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 126 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 1, item 7, p. 60. 2. _____._____. Cap. 6, item 4, p. 140. 3. _____._____. p.141. 4. _____._____. Cap. 23, item 16, p. 390. 5. _____. A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 50 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006 Cap. 1, item 27, p. 35. 6. _____._____. Item 26, p. 35. 7. _____._____. Cap. 17, item 37, p. 440. 8. _____._____. Cap. 16, item 2, p. 408. 9. _____._____. Item 40, p. 441. 10. CALLIGARIS, Rodolfo. As leis morais. 14 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 3 (A pro- gressividade da revelação divina), p. 27. 11. _____._____. p. 28. 12. XAVIER, Francisco Cândido. O consolador. Pelo Espírito Emmanuel. 26 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006, questão 352, p. 199. 13. _____._____. Questão 353, p. 200. Orientações ao monitor É importante que o estudo apresente um roteiro básico em que fique estabelecido, claramente: » O que é o Consolador, também chamado de o Espírito Santo ou de Espírito de Verdade. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 1 26 » As características de o Consolador Prometido por Jesus. » Porque o Espiritismo é considerado o Consolador Prometido. EADE – LIVRO III | MÓDULO I APRENDENDO COM AS PROFECIAS Roteiro 2 NINGUÉM É PROFETA EM SUA TERRA Objetivos » Explicar, à luz do entendimento espírita, a afirmativa de Jesus de que ninguém é profeta em sua terra. Ideias principais » O preconceito social, motivado pelo orgulho e vaidade, assim como a inveja e o ciúme são imperfeições espirituais que refletem o caráter de alguns indivíduos que não conseguem reconhecer o valor moral ou intelectual das pessoas que lhes são próximas. Por este motivo, afirmou Jesus, com sabedoria: Não há profeta sem honra, a não ser na sua pátria e na sua casa. (Mateus, 13:57.) Subsídios 1. Texto evangélico E, chegando à sua pátria, ensinava-os na sinagoga deles, de sorte que se maravilhavam e diziam: Donde veio a este a sabedoria e estas EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 2 28 maravilhas? Não é este o filho do carpinteiro? E não se chama sua mãe Maria, e seus irmãos, Tiago, e José, e Simão, e Judas? E não estão entre nós todas as suas irmãs? Donde lhe veio, pois, tudo isso? E escandalizavam- -se nele. Jesus, porém, lhes disse: Não há profeta sem honra, a não ser na sua pátria e na sua casa. E não fez ali muitas maravilhas, por causa da incredulidade deles. (Mateus, 13:54-58.) O poder dessa afirmativa de Jesus, de que ninguém é profeta em sua terra atravessou os séculos e continua a ser utilizada como verdade inconteste. O hábito de se verem desde a infância, em todas as circunstâncias ordinárias da vida, estabelece entre os homens uma espécie de igual- dade material que, muitas vezes, faz que a maioria deles se negue a reconhecer superioridade moral num de quem foram companheiros ou comensais, que saiu do mesmo meio que eles e cujas primeiras fraquezas todos testemunharam. Sofre-lhes o orgulho com o terem de reconhecer o ascendente do outro. Quem quer que se eleve acima do nível comum está sempre em luta com o ciúme e a inveja. Os que se sentem incapazes de chegar à altura em que aquele se encontra esforçam-se para rebaixá-lo, por meio da difamação, da maledicência e da calúnia; tanto mais forte gritam, quanto menores se acham, crendo que se engrandecem e o eclipsam pelo arruído que promovem. Tal foi e será a História da Humanidade, enquanto os homens não houverem compreendido a sua natureza espiritual e alargado seu horizonte mo- ral. Por aí se vê que semelhante preconceito é próprio dos Espíritos acanhados e vulgares, que tomam suas personalidades por ponto de aferição de tudo.3 2. Interpretação do texto evangélico » E, chegando à sua pátria, ensinava-os na sinagoga deles, de sorte que se maravilhavam e diziam: Donde veio a este a sabedoria e estas maravi- lhas? Não é este o filho do carpinteiro? E não se chama sua mãe Maria, e seus irmãos, Tiago, e José, e Simão, e Judas? E não estão entre nós todas as suas irmãs? Donde lhe veio, pois, tudo isso? (Mateus 13:54-56). A natureza humana revela-se controvertida em muitas ocasiões, sobretudo quando se trata das relações pessoais. No texto em análise percebemos que, da mesma forma que os ensinos de Jesus produziam admiração, as pessoas não conseguiam ignorar o fato de ser Ele o filho de um simples carpinteiro. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 2 29 Tal situação nos faz deduzir que ninguém se revelaria surpreso se a origem de Jesus fosse outra, se viesse de uma classe intelecto-social mais elevada, conhecida como a dos “bem-nascidos”. As indagações e murmurações proferidas na sinagoga durante a preleção do Mestre, saturadas de desdém e descrença, indicam, de um lado, preconceito social contra alguém pertencente a uma família desprovida de bens materiais ou de destaque social, ainda que essa fa- mília fosse conhecida pela sua notória respeitabilidade. Por outro lado revelam, igualmente, o estado de indigência espiritual dos circunstantes. O preconceito e o estado de pouca evolução espiritual estão subentendidos nas seguintes perguntas proferidas: “Não é este o filho do carpinteiro?” “E não se chama sua mãe Maria, e seus irmãos, Tiago, e José, e Simão, e Judas?” “E não estão entre nós todas as suas irmãs?” “Donde lhe veio, pois, tudo isso?” De acordo com as definições existentes no dicionário, preconcei- to é opinião ou sentimento, quer favorável quer desfavorável, concebido sem exame crítico; é ideia, opinião ou sentimento desfavorável forma- do a priori, sem maior conhecimento, ponderação ou sentimento; é atitude, sentimento ou parecer insensato, especialmente de natureza hostil, assumido em consequência da generalização apressada de uma experiência pessoal ou imposta pelo meio.8 Tanto menos podia Jesus escapar às consequências deste princípio, inerente à natureza humana, quanto pouco esclarecido era o meio em que Ele vivia, meio esse constituído de criaturas votadas inteiramente à vida material. Nele, seus compatriotas apenas viam o filho do carpin- teiro, o irmão de homens tão ignorantes quanto Ele e, assim sendo, não percebiam o que lhe dava superioridade e o investia do direito de os censurar. Verificando então que a sua palavra tinha menos autoridade sobre os seus, que o desprezavam, do que sobre os estranhos, preferiu ir pregar para os que o escutavam e aos quais inspirava simpatia.4 Nos dias atuais o preconceito ainda fala muito alto, causando imenso sofrimento às suas vítimas. Quem possui certa maturidade espiritual resiste à tendência de se julgar pessoa especial, portadora de privilégios, em decorrência da posição social que ocupe na sociedade. Reconhece que perante as leis divinas nenhum ser humano é melhor do que o outro. “Todos os homens estão submetidos às mesmas leis da Natureza. Todos nascem igualmente fracos, acham-se sujeitos às mesmas dores e o corpo do rico se destrói como o do pobre. Deus a EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 2 30 nenhum homem concedeu superioridade natural, nem pelo nascimen- to, nem pela morte: todos, aos seus olhos, são iguais.”5 O ser humano, na verdade, se distingue dos demais pelo esforço de iluminação espiritual que realiza.Esse esforço individual deve começar com o autodomínio, com a disci- plina dos sentimentos egoísticos e inferiores, com o trabalho silencioso da criatura por exterminar as próprias paixões. Nesse particular, não podemos prescindir do conhecimento adquirido por outras almas que nos precederam nas lutas da Terra, com as suas experiências santi- ficantes — água pura de consolação e de esperança, que poderemos beber nas páginas de suas memórias ou nos testemunhos de sacrifício que deixaram no mundo.12 Revela imperfeição moral quem se julga superior aos demais irmãos em humanidade, apenas porque possui maior soma de bens materiais ou porque ocupa posição de destaque na sociedade. O es- pírita, sobretudo, que está informado a respeito das consequências do uso do livre-arbítrio, da realidade da vida no além-túmulo, dos processos de reencarnação do Espírito, entre outros, deve vigiar mais os pensamentos, as palavras e os atos. Jamais esquecer que a regra de conduta se resume nesta orientação dos Espíritos superiores: “Benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros, perdão das ofensas.”6 Importa considerar também que é faltar com a caridade agir com discriminação, uma vez que “[...] amor e caridade são o complemento da lei de justiça, pois amar o próximo é fazer-lhe todo o bem que nos seja possível e que desejáramos nos fosse feito.”6 A caridade, segundo Jesus, não se restringe à esmola, abrange todas as relações em que nos achamos com os nossos semelhantes, sejam eles nossos inferiores, nossos iguais, ou nossos superiores [socialmente falando]. Ela nos prescreve a indulgência, porque de indulgência preci- samos nós mesmos, e nos proíbe que humilhemos os desafortunados, contrariamente ao que se costuma fazer. [...] O homem verdadeira- mente bom procura elevar, aos seus próprios olhos, aquele que lhe é inferior, diminuindo a distância que os separa.6 O texto de Mateus, em estudo, faz também referência explícita aos irmãos e irmãs de Jesus. Em termos históricos, desconhece-se a EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 2 31 existência de documentos ou evidências de que Maria de Nazaré e José tiveram outros filhos, além de Jesus. A teologia católica romana defende a ideia de que os irmãos de Jesus eram, na verdade, seus primos ou irmãos no sentido espiritual. Esta ideia ganhou força com Jerônimo, a partir do século IV d.C., tendo como base informações de Orígenes — um dos pais da Igreja Católica — que, no século II da nossa Era, se fundamentou em duas obras apócrifas: o Proto-evangelho de Tiago e o Evangelho de Pedro. A tradição católica grega, também chamada oriental ou ortodoxa, ensina, porém, que os irmãos de Jesus citados no Novo Testamento eram meio-irmãos, uma vez que José sendo viúvo quando casou com Maria, tivera filhos do casamento anterior. Esse ponto de vista foi promulgado no século III e defendido por Epifânio (outro pai da Igreja) no século seguinte.7 A teologia protestante discorda do posicionamento das igrejas romana e ortodoxa, defendendo a ideia de que Maria teve outros filhos após Jesus. Para a Doutrina Espírita esse fato é secundário, uma vez que considera efetivamente importante os ensinamentos de Jesus. Se Ele teve irmãos ou meio-irmãos pela consanguinidade, primos-irmãos ou irmãos pela união espiritual não é relevante e em nada altera o valor e a grandiosidade da missão do Mestre. A frase que faz o fechamento do versículo 56 do texto de Mateus citado, traz uma interrogação relacionada à sabedoria da pregação de Jesus: “Donde lhe veio, pois, tudo isso?” Essa pergunta revela perplexidade por parte de quem a proferiu, a despeito dos ouvintes se mostrarem maravilhados pelos esclareci- mentos do Mestre. Revela, igualmente, que eles não souberam ou não quiseram identificar Jesus como o Messias aguardado, em razão de se manterem arraigados às tradições do culto religioso e à interpretação literal da Torá. Nos dias atuais a situação não difere muito. A ignorância espi- ritual e a rigidez dos chamados “pontos de vista”, muito têm contri- buído para o retardamento do nosso processo evolutivo. Daí Jesus ter dito, em outra ocasião: “Por que não entendeis a minha linguagem? Por não poderdes ouvir a minha palavra.” (João, 8:43.) A propósito, esclarece Emmanuel: EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 2 32 A linguagem do Cristo sempre se afigurou a muitos aprendizes inde- cifrável e estranha. [...] Muita gente escuta a Boa-Nova, mas não lhe penetra os ensinamentos. Isso ocorre a muitos seguidores do Evangelho, porque se utilizam da força mental em outros setores. Creem vaga- mente no socorro celeste, nas horas de amargura, mostrando, porém, absoluto desinteresse ante o estudo e ante a aplicação das leis divinas. A preocupação da posse lhes absorve a existência. [...] Registram os chamamentos do Cristo, todavia, algemam furiosamente a atenção aos apelos da vida primária. Percebem, mas não ouvem. Informam- -se, mas não entendem. Nesse campo de contradições, temos sempre respeitáveis personalidades humanas e, por vezes, admiráveis amigos. Conservam no coração enormes potenciais de bondade, contudo, a mente deles vive empenhada no jogo das formas perecíveis. [...] Não nos esqueçamos, pois, de que é sempre fácil assinalar a linguagem do Senhor, mas é preciso apresentar-lhe o coração vazio de resíduos da Terra, para receber-lhe, em espírito e verdade, a palavra divina.9 » E escandalizavam-se nele (Mt 13:57). A palavra “escandalizavam”, citada no texto, tem o significado de indignação. A pregação de Jesus que no início causou admiração e perplexidade, foi considerada ofensiva, após a racionalização. Eis, aí outro ponto controverso da natureza humana, totalmente compatível com o seu nível de imperfeição espiritual. No primeiro momento, por se encontra- rem mentalmente desarmados, os ouvintes ficaram maravilhados com a fala do Mestre. Contudo, logo que reconheceram Jesus — identificado como um conterrâneo, filho de humilde carpinteiro —, despencaram abruptamente do plano de vibrações superiores para onde o Mestre os conduzira e proferiram indagações, compatíveis com o patamar evolutivo em que se encontravam. Na verdade, a reação indignada demonstrada por aquelas pessoas foi direcionada a elas próprias (“escandalizavam-se”), não ao Cristo. Mesmo sendo envolvidas pelo elevado magnetismo da perso- nalidade de Jesus, pela sua sabedoria e pelas harmonias superiores do seu Espírito, não conseguiram entender o que estava acontecendo, não compreenderam, sequer, as elucidações prestadas por Jesus. “Escandalizavam-se” demonstra existência de orgulho e vaidade, de forma inequívoca. Naquele fugaz espaço de tempo, eles se viram sem máscaras, como criaturas imperfeitas. Daí a indignação. Daí ba- nalizarem a valiosa pregação do Cristo porque, segundo a distorcida EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 2 33 percepção demonstrada, tratava-se apenas de um nazareno comum, filho de pessoas comuns. Diante dessa atitude, o Mestre amado reconheceu, com humil- dade, que ninguém é profeta em sua terra e seguiu adiante, em busca de corações receptivos aos seus ensinamentos sublimes. Com Jesus, percebemos que a humildade nem sempre surge da pobreza ou da enfermidade que tanta vez somente significam lições regeneradoras, e sim que o talento celeste é atitude da alma que olvida a própria luz para levantar os que se arrastam nas trevas e que procura sacrificar a si própria, nos carreiros empedrados do Mundo, para que os outros aprendam, sem constrangimento ou barulho, a encontrar o caminho para as bênçãos do Céu.13 » Jesus, porém, lhes disse: Não há profeta sem honra, a não ser na sua pátria e na sua casa. E não fez ali muitas maravilhas, por causa da incredulidade deles (Mt 13:57-58). A reação dos praticantes da lei de Moisés foi de certa forma esperada, uma vez que sempre há resistência a uma nova ideia. Tratando-se da mensagem cristã, sobretudo, a oposição foi ferrenha, pois esta contrariavamúltiplos interesses. É comum encontrarmos oposição nas pessoas que convivem próximas a nós, quando oferece- mos proposta de mudança. A oposição “[...] é sempre proporcional à importância dos resultados previstos, porque, quanto maior ela é, tanto mais numerosos são os interesses que fere”.1 Jesus vinha proclamar uma doutrina que solaparia pela base os abusos de que viviam os fariseus, os escribas e os sacerdotes do seu tempo. Imolaram-no, portanto, certos de que, matando o homem, matariam a ideia. Esta, porém, sobreviveu, porque era verdadeira; engrandeceu-se, porque correspondia aos desígnios de Deus e, nascida num pequeno e obscuro burgo da Judeia, foi plantar o seu estandarte na capital mesma do mundo pagão, à face dos seus mais encarniçados inimigos, daqueles que mais porfiavam em combatê-la, porque subvertia crenças seculares a que eles se apegavam muito mais por interesse do que por convicção. Lutas das mais terríveis esperavam aí pelos seus apóstolos; foram inumeráveis as vítimas; a ideia, no entanto, avolumou-se sempre e triunfou, porque, como verdade, sobrelevava as que a precederam.2 Irmão X relata que, após a entrada gloriosa de Jesus em Jerusalém, “[...] O povo judeu suspirava por alguém, com bastante EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 2 34 autoridade, que o libertasse dos opressores. Não seria tempo da re- denção de Israel? [...] O romano orgulhoso apertava a Palestina nos braços tirânicos. Por isso, Jesus simbolizava a renovação, a promessa. Quem operara prodígios iguais aos dele?[...]”10 Mesmo entre os sacer- dotes e os membros do Sinédrio, a expectativa era grande quanto ao advento do Messias. Percebendo a intenção e os desejos do povo e de alguns dos seus representantes religiosos, Jesus reuniu-se com os doze apóstolos, esclarecendo-os a respeito da situação. Concluída a conversa reservada, seis dos apóstolos se dirigiram cautelosos, à via pública, onde se encontrava um patriarca que se posicionava à frente da multidão. O diálogo que se segue sintetiza a assertiva de Jesus de que “não há profeta sem honra, a não ser na sua pátria e na sua casa”. — Que disse o profeta? — perguntou o patriarca, chefe daquele mo- vimento de curiosidade. — Explicou-se, afinal? — Sim — esclareceu Filipe com benevolência. — E a base do programa de nossa restauração política e social? — Recomendou o Senhor para que o maior seja servo do menor, que todos deveremos amar-nos uns aos outros. — O sinal do movimento? — indagou o ancião de olhos lúcidos. — Estará justamente no amor e no sacrifício de cada um de nós — replicou o apóstolo, humilde. — Dirigir-se-á imediatamente a César, fundamentando o necessário protesto? — Disse-nos para confiarmos no Pai e crermos também nele, nosso Mestre e Senhor. — Não se fará, então, exigência alguma?— exclamou o patriarca, irritado. — Aconselhou-nos a pedir ao Céu o que for necessário e afirmou que seremos atendidos em seu nome — explicou Filipe, sem se perturbar. Entreolharam-se, admirados, os circunstantes. — E a nossa posição? — resmungou o velho — não somos o povo escolhido na Terra? EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 2 35 Muito calmo, o apóstolo esclareceu: — Disse o Mestre que não somos do mundo e por isso o mundo nos aborrecerá, até que o seu Reino seja estabelecido. [...] — Não te disse, Jafet? — falou um antigo fariseu ao patriarca. — Tudo isso é uma farsa. [...] Desde essa hora, compreendendo que Jesus cumpria, acima de tudo, a vontade de Deus, longe de qualquer disputa com os homens, a multidão abandonou-o. [...] E, desde esse instante, a perseguição do Sinédrio tomou vulto e o Messias, sozinho com a sua dor e com a sua lealdade, experimentou a prisão, o abandono, a injustiça, o açoite, a ironia e a crucificação. Essa, foi uma das últimas lições dele, entre as criaturas, dando-nos a conhecer que é muito fácil cantar hosanas a Deus, mas muito difícil cumprir-lhe a divina Vontade, com o sacrifício de nós mesmos.11 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 126. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 23, item 12, p. 386. 2. _____._____. Item 13, p. 387. 3. _____. A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 50. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 17, item 2, p. 422. 4. _____._____. p. 423-424. 5. _____. O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 89. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007, questão 803, p. 421. 6. _____._____. Questão 886, p. 457. 7. DOUGLAS, J. D. O novo dicionário da Bíblia.Tradução de João Bentes. 3. ed. São Paulo: Vida Nova, 2006, p. 624. 8. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 2282. 9. XAVIER, Francisco Cândido. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 34. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 48 (Diante do Senhor), p. 117-118. 10. _____. Lázaro redivivo. Pelo Espírito Irmão X. 11. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. Cap. 17 (Lição em Jerusalém), p. 85. 11. _____._____. p. 87-89. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 2 36 12. _____. O consolador. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Questão 230, p. 138. 13. _____. Religião dos espíritos. Pelo Espírito Emmanuel. 19. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. Jesus e humildade, p. 48. Orientações ao monitor É importante que se analise as razões comportamentais, cultu- rais, históricas etc., relativas à afirmação de Jesus de que ninguém é profeta na sua terra. EADE – LIVRO III | MÓDULO I APRENDENDO COM AS PROFECIAS Roteiro 3 A PEDRA ANGULAR Objetivos » Esclarecer, à luz do Espiritismo, por que o Cristianismo é considerado pedra angular. » Realizar análise espírita destas palavras do Cristo: “O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não hão de passar” (Mt 24:35). Ideias principais » O objetivo da religião é conduzir a Deus o homem. [...] Logo, toda reli- gião que não torna melhor o homem, não alcança o seu objetivo. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. VIII, item 10. » A palavra de Jesus se tornou a pedra angular, isto é, a pedra de conso- lidação do novo edifício da fé, erguido sobre as ruínas do antigo. Allan Kardec: A gênese. Cap. XVII, item 28. » As palavras de Jesus não passarão, porque serão verdadeiras em todos os tempos. [...] Será eterno o seu código de moral, porque consagra as condições do bem que conduz o homem ao seu destino eterno. Allan Kardec: A gênese. Cap. XVII, item 26. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 3 38 Subsídios 1. Texto evangélico Diz-lhes Jesus: Nunca lestes nas Escrituras: A pedra que os edifi- cadores rejeitaram, essa foi posta por cabeça do ângulo; pelo Senhor foi feito isso e é maravilhoso aos nossos olhos? Portanto, eu vos digo que o Reino de Deus vos será tirado e será dado a uma nação que dê os seus frutos. E quem cair sobre esta pedra despedaçar-se-á; e aquele sobre quem ela cair ficará reduzido a pó. (Mateus, 21:42-44.) O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não hão de passar. (Mateus, 24:35.) Os dois textos nos informam sobre a perenidade da mensagem cristã, que é a pedra angular, o marco estruturador da religião e da moralidade humanas. Todavia, algumas reflexões se impõem à altura do nosso processo evolutivo, uma vez que o Cristianismo se encontra entre nós há mais de dois mil anos. Mas[...] terão as suas palavras chegado até nós puras de toda ganga e de falsas interpretações? Apreenderam-lhes o espírito todas as seitas cristãs? Nenhuma as terá desviado do verdadeiro sentido, em consequência dos preconceitos e da ignorância das leis da Natureza? Nenhuma as transformou em instrumento de dominação, para servir às suas ambições e aos seus interesses materiais, em degrau, não para se elevar ao céu, mas para elevar-se na Terra? Terão todas adotado como regra de proceder a prática das virtudes, prática da qual fez Jesus condição expressa de salvação? Estarão todas isentas das apóstrofes que Ele dirigiu aos fariseus de seu tempo? Todas, finalmente,serão, assim em teoria, como na prática, expressão pura da sua doutrina?4 Lançando um olhar ao passado, ainda que breve, veremos que foram poucos os Espíritos que souberam colocar em prática, efeti- vamente, os ensinamentos de Jesus. Percebe-se, dessa forma que, se ainda não conseguimos vivenciar a mensagem cristã é porque somos Espíritos moralmente retardatários, a despeito de toda ciência e tec- nologia existentes no mundo atual. Para que a Humanidade se trans- forme para melhor, faz-se necessário que os desafios da vida moderna sejam submetidos a um perseverante plano de transformação moral, distanciado das falsas expectativas de mudança. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 3 39 2. Interpretação do texto evangélico » Diz-lhes Jesus: Nunca lestes nas Escrituras: A pedra que os edificadores rejeitaram, essa foi posta por cabeça do ângulo; pelo Senhor foi feito isso e é maravilhoso aos nossos olhos? (Mt 21:42). A palavra “pedra” citada no texto evangélico traz o significado de verdade essencial que foi anunciada por meio de uma revelação. Ainda que a Filosofia e a Ciência não utilizem como referência metodológica o aprendizado espiritual e o religioso — por considerá-los conhecimentos do senso comum, obtidos pela intuição ou pela ação mediúnica —, não podem, contudo, ignorá-los ou rejeitá-los como incorretos. A revelação religiosa e moral (espiritual) é o esclarecimento “[...] que se presta com o intuito de fazer outrem conhecer alguma coisa ainda desconhecida, ignorada.”9 Revelação vem de revelo, substantivo latino derivado do verbo revelare, expressão empregada comumente nos textos religiosos, a partir da tradução do termo hebraico galah ou do grego apokalypto, cuja ideia é a mesma em ambos: desvendar alguma coisa oculta com a intenção de fazê-la conhecida.6 Em termos religiosos, sobretudo no sentido expresso no Velho Testamento, revelação é literalmente entendida como a “Palavra ou Pensamento de Deus”.6 Em consequência, algumas doutrinas teológicas cristãs apresentam um discurso inflexível relativo ao conceito de fé. A [...] revelação é ao mesmo tempo indicativa e imperativa, e sempre normativa. As manifestações de Deus sempre são feitas no contexto de uma exigência que pede confiança e obediência àquilo que é reve- lado — uma resposta, que é inteiramente determinada e controlada pelo conteúdo da própria revelação. Em outras palavras, a revelação de Deus chega ao homem não como uma informação sem qualquer obrigação, mas antes, como uma regra mandatória de fé e de con- duta. A vida do homem precisa ser governada, não pelos caprichos particulares e fantasias humanas, nem por adivinhações acerca das coisas divinas não reveladas, mas antes, pela crença reverente em tudo quanto Deus lhe revela, o que conduz a uma aceitação consciente de todos os imperativos que a revelação porventura contenha (Dt 29,29).6 Esses esclarecimentos, se levados aos extremos de interpretação, geram atos arbitrários no campo da fé. Representam também o pomo da discórdia entre as concepções científicas e as religiosas, uma vez que, nas primeiras, faz-se necessário a apresentação de evidências ou EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 3 40 de provas comprobatórias para legitimá-las. A Doutrina Espírita, por outro lado, não rejeita as orientações espirituais superiores advindas da revelação, até porque o Espiritismo é doutrina revelada. Ensina, porém, que a fé deve ser analisada, examinada, traçando diferença entre a fé cega e a raciocinada. Nada examinando, a fé cega aceita, sem verificação, assim o verdadeiro como o falso, e a cada passo se choca com a evidência e a razão. Levada ao excesso, produz o fanatismo. Em assentando no erro, cedo ou tarde desmorona; somente a fé que se baseia na verdade garante o futuro, porque nada tem a temer do progresso das luzes, dado que o que é verdadeiro na obscuridade, também o é à luz meridiana. Cada religião pretende ter a posse exclusiva da verdade; preconizar alguém a fé cega sobre um ponto de crença é confessar-se impotente para demonstrar que está com a razão.3 São considerações importantes, a fim de que não se perca de vista o sentido espiritual do registro de Mateus: “A pedra que os edificadores rejeitaram, essa foi posta por cabeça do ângulo; pelo Senhor foi feito isso e é maravilhoso aos nossos olhos?” Numa construção, “pedra angular” é “cada uma das pedras que forma o cunhal de um edifício.” 8 Cunhal é cada canto externo (ou quina), de uma edificação formado por duas paredes. Este canto é mantido firme e com abertura angular precisa por meio de uma pilastra ou pilar de pedras lavradas (trabalhadas ou esculpidas) na junção das paredes convergentes. A pedra colocada como “cabeça de ângulo” é a mais importante porque sustenta e serve de base às demais. O Evangelho é a pedra angular, o sustentáculo para que se compreenda Deus e a criação divina. Entretanto, o Evangelho foi e ainda é desprezado por muitos. O Cristo foi rejeitado, inclusive, pelos edificadores do monoteísmo no caso, o povo judeu. Com o progresso moral percebemos que o ensino de Jesus “[...] se tornou a pedra angular, isto é, a pedra da consolidação do novo edifício da fé, erguido sobre as ruínas do antigo. Havendo os judeus, os príncipes dos sacerdotes e os fariseus rejeitado essa pedra, ela os esmagou, do mesmo modo que esmagará os que, depois, a desco- nheceram, ou lhe desfiguraram o sentido em prol de suas ambições”.5 Importa considerar que a palavra “esmagar”, empregada por Kardec no texto, não tem o sentido atual de destruir ou de aniquilar. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 3 41 Traduz-se como “afligir, fatigar-se, perder as forças”, significados en- contrados nos escritos da Língua Portuguesa do passado.7 Com a evolução espiritual do ser humano, o Evangelho de Jesus será reconhecido como o mais perfeito código de moralidade existente na Humanidade. O único capaz de erguer o verdadeiro edifício da fé, tão necessário à melhoria moral da Humanidade. Os sacerdotes e os seguidores do Cristianismo que não lhe captam a essência moralizadora, deturpando-a e adequando-a aos seus interesses mesquinhos e imediatos, responderão por seus atos, segundo os ditames da lei de causa e efeito. Entretanto, os cristãos que se esforçam por compreendê-la e colocá-la em prática, usufruirão de felizes reencarnações no porvir. » Portanto, eu vos digo que o Reino de Deus vos será tirado e será dado a uma nação que dê os seus frutos. E quem cair sobre esta pedra despeda- çar-se-á; e aquele sobre quem ela cair ficará reduzido a pó (Mt 21:43-44). A história relata que os judeus além de não aceitarem Jesus como o Messias aguardado, desprezaram-no, perseguiram-no e o crucifica- ram. Mesmo no seio da igreja cristã os ensinamentos do Mestre foram deturpados, situação causadora de terríveis desatinos, crimes contra a Humanidade. “Verificou-se o mesmo com a doutrina moral do Cristo, que acabou por ser atirada para segundo plano, donde resulta que mui- tos cristãos, a exemplo dos antigos judeus, consideram mais garantida a salvação por meio das práticas exteriores, do que pelas da moral.”1 O objetivo da religião é conduzir a Deus o homem. Ora, este não chega a Deus senão quando se torna perfeito. Logo, toda religião que não torna melhor o homem, não alcança o seu objetivo. Toda aquela em que o homem julgue poder apoiar-se para fazer o mal, ou é falsa, ou está falseada em seu princípio. Tal o resultado que dão as em que a forma sobreleva ao fundo. Nula é a crença na eficácia dos sinais exteriores, se não obsta a que se cometam assassínios, adultérios, espoliações, que se levantem calúnias, que se causem danos ao próximo, seja no que for. Semelhantes religiões fazem supersticiosos, hipócritas, fanáticos; não, porém, homens de bem. Não basta se tenham as aparências da pureza; acima de tudo, é preciso ter a do coração.2 Perante essas considerações, compreende-se porque o Cristo anunciou: “Portanto, eu vos digo que o Reino deDeus vos será tirado e será dado a uma nação que dê os seus frutos” (Mt 21:43). EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 3 42 Que nação teria condições de fazer cumprir essa profecia de Jesus? O Espírito Humberto de Campos informa que é o Brasil: Jesus transplantou da Palestina para a região do Cruzeiro a árvore magnânima do seu Evangelho, a fim de que os seus rebentos delicados florescessem de novo, frutificando em obras de amor para todas as criaturas. Ao ceticismo da época soará estranhamente uma afirmativa desta natureza. O Evangelho? Não seria mera ficção de pensadores do Cristianismo o repositório de suas lições? Não foi apenas um cântico de esperança do povo hebreu, que a Igreja Católica adaptou para garantir a coroa na cabeça dos príncipes terrestres? Não será uma palavra vazia, sem significação objetiva na atualidade do globo, quando todos os va- lores espirituais parecem descer ao “sepulcro caiado” da transição e da decadência? Mas a realidade é que, não obstante todas as surpresas das ideologias modernas, a lição do Cristo aí está no planeta, aguardando a compreensão geral do seu sentido profundo.[...]13 As inúmeras dificuldades vivenciadas pelos brasileiros, sobre- tudo nos dias atuais, levantam algumas dúvidas a respeito de ser o Brasil a Pátria do Evangelho, mesmo que se considere a seriedade e a integridade do Espírito e do médium envolvidos na transmissão da mensagem. Entretanto, se não nos detivermos no peso das provações atuais, se estendermos a nossa visão para o futuro, veremos que a informação não está desprovida de lógica. As provas e expiações que acontecem aos brasileiros, desde os tempos coloniais, moldaram-lhes o caráter, imprimindo-lhes uma ín- dole mais pacífica, marcada por acentuada religiosidade, nem sempre encontrada nos demais povos. Outro ponto favorável é a intensa mis- cigenação racial e cultural presentes no Brasil, fatores representativos da integração social e da nacionalidade brasileira. De uma maneira geral, não há separatividade étnica no país. Os povos que imigraram para o Brasil não são discriminados e nem se sentem estrangeiros, mas “em casa”. De qualquer forma, não devemos nos preocupar muito com a questão. Caso o povo brasileiro se transvie, optando por seguir cami- nhos que o afaste dos padrões de integridade e de moralidade, caberá a outra nação o cumprimento da profecia. A respeito do assunto, Emmanuel endossa as palavras de Humberto de Campos e acrescenta: EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 3 43 [...] O Brasil não está somente destinado a suprir as necessidades ma- teriais dos povos mais pobres do planeta, mas, também, a facultar ao mundo inteiro uma expressão consoladora de crença e de fé raciocina- da e a ser o maior celeiro de claridades espirituais do orbe inteiro.[...] Se outros povos atestaram o progresso, pelas expressões materializadas e transitórias, o Brasil terá a sua expressão imortal na vida do Espírito, representando a fonte de um pensamento novo, sem as ideologias de separatividade, e inundando todos os campos das atividades humanas com uma nova luz.[...]12 Somente o futuro, porém, comprovará, ou não, a posição do Brasil como Pátria do Evangelho. A questão deve ser conduzida, porém, com responsabilidade, sem manifestações de “patriotada” ou de ufanismo “verde-amarelo”, pois o processo de evangelização é desafiante, em qualquer situação ou lugar, exigindo contínuas mani- festações de humildade, de renúncia e de dedicação ao bem. É preciso guardar serenidade quanto ao assunto, pois se não for o Brasil será outra nação, conforme garante esta outra afirmativa de Jesus: “Toda planta que meu Pai celestial não plantou será arrancada” (Mt 15:13). O que efetivamente interessa, e que deve ser considerado re- levante, é a vitória do Evangelho, o triunfo do Cristo na mente e no coração dos homens que, cedo ou tarde, acontecerá. Neste sentido, podemos e devemos fazer o melhor: “Trabalhemos por Jesus, ainda que a nossa oficina esteja localizada no deserto das consciências. To- dos somos chamados ao grande labor e o nosso mais sublime dever é responder ao apelo do Escolhido.”14 » O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não hão de passar (Mt 24:35). Esta outra profecia de Jesus complementa as ideias anteriores. Ora, se o Evangelho é a pedra angular, necessária à construção do novo edifício da fé, deverá ser aceito, estudado e compreendido por todos os povos do Planeta. Com o triunfo do Evangelho, a Humanidade regenerada do futuro será governada pela prática da lei de amor, ainda que se mantenham as características individuais e coletivas de manifestação da fé. Ocorrerá, inclusive, a esperada aliança entre a Ciência e a Religião. As palavras de Jesus não passarão, porque serão verdadeiras em todos os tempos. Será eterno o seu código de moral, porque consagra as condições EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 3 44 do bem que conduz o homem ao seu destino eterno. [...] Sendo uma só, e única, a verdade não pode achar-se contida em afirmações contrárias e Jesus não pretendeu imprimir duplo sentido às suas palavras. Se, pois, as diferentes seitas se contradizem; se umas consideram verdadeiro o que outras condenam como heresias, impossível é que todas estejam com a verdade. Se todas houvessem apreendido o sentido verdadeiro do ensino evangélico, todas se teriam encontrado no mesmo terreno e não existiriam seitas. O que não passará é o verdadeiro sentido das palavras de Jesus; o que passará é o que os homens construíram sobre o sentido falso que deram a essas mesmas palavras. Tendo por missão transmitir aos homens o pensamento de Deus, somente a sua doutrina, em toda a pureza, pode exprimir esse pensamento.4 A vivência da mensagem cristã em toda a sua pureza definirá o perfil do religioso que habitará a Terra, então transformada em mundo de regeneração. Este religioso não será “[...] o escravo do culto que repete maquinalmente as orações do breviário, mas, sim, o que estuda e compreende as revelações que lhes são transmitidas.”10 A Doutrina Espírita, na sua feição de Cristianismo redivivo, de- sempenhará papel de agente transformador do processo de mudanças previstas para a melhoria espiritual do ser humano. À luz do entendi- mento espírita, o Cristianismo será vivenciado em toda a sua plenitude. O Cristianismo é uma doutrina que precisa de ser apreendida e de ser sentida. Estuda-se a sua ética mais com o coração que com a in- teligência. Aquele que não sente em si mesmo a influência da moral cristã, desconhece o que ela é, embora tenha perfeito conhecimento teórico de todos os seus preceitos e postulados. O coração registra emoções: nossos atos, nossa conduta gera as emoções. O Cristianismo é a verdadeira doutrina positiva, visto como é a doutrina da prova e da experiência pessoal.11 Emmanuel elucida que a cristianização da Humanidade ocorrerá após dolorosos processos de renovação social e moral. Sim, porque depois da treva surgirá uma nova aurora. Luzes conso- ladoras envolverão todo orbe regenerado no batismo do sofrimento. O homem espiritual estará unido ao homem físico para a sua marcha gloriosa no Ilimitado, e o Espiritismo terá retirado dos seus escombros materiais a alma divina das religiões, que os homens perverteram, ligando-as no abraço acolhedor do Cristianismo restaurado. 14 EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 3 45 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 50. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 8, item 10, p. 167. 2. _____._____. p. 167-168. 3. _____._____. Cap. 19, item 6, p. 341-342. 4. _____. A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 50. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 17, item 26, p. 432. 5. _____._____. Item 28, p. 433. 6. DOUGLAS, J. D. O novo dicionário da Bíblia.Tradução de João Bentes. 3. ed. São Paulo: Vida Nova, 2006, p. 1162. 7. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001,p. 1218. 8. _____._____. p. 2165. 9. _____._____. p. 2451. 10. SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e ensinos de Jesus. 20. ed. Matão: O Clarim, 2004. Item: Exame das religiões, p.215. 11. VINÍCIUS (Pedro de Camargo). Nas pegadas do mestre. 11. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. Os verdadeiros cristãos, p. 41. 12. XAVIER, Francisco Cândido. Brasil, coração do mundo, pátria do evangelho. Pelo Es- pírito Humberto de Campos. 32. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Prefácio (pelo Espírito Emmanuel), p. 10-11. 13. _____._____. Esclarecendo, p. 14-15. 14. _____. A caminho da luz. Pelo Espírito Emmanuel. 34. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 25 (O Evangelho e o futuro), p. 215. Orientações ao monitor Independentemente das técnicas e recursos utilizados no de- senvolvimento da aula, o estudo deve, prioritariamente, explicar à luz do entendimento espírita: a) por que o Cristianismo é considerado pedra angular do edifício da religião e da fé; b) qual o significado desta assertiva de Jesus: “o céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não hão de passar” (Mt 24:35). EADE – LIVRO III | MÓDULO I APRENDENDO COM AS PROFECIAS Roteiro 4 SINAIS DOS TEMPOS Objetivos » Interpretar, à luz da Doutrina Espírita, a profecia do Cristo que anuncia a era da regeneração da Humanidade. » Identificar as características do período que antecede a era da regeneração. Ideias principais » São chegados os tempos, dizem-nos de toda as partes, marcados por Deus, em que grandes acontecimentos se vão dar para a regeneração da Humanidade.[...] Allan Kardec: A gênese. Cap. XVIII, item 1. » No período de mudanças, o que antecede a regeneração humana, “[...] surgirão muitos falsos profetas e enganarão a muitos. E, por se multiplicar a iniquidade, o amor de muitos se esfriará.” (Mateus, 24:11-12.) » Nestes tempos, porém, não se trata de uma mudança parcial, de uma renovação limitada a certa região, ou a um povo, a uma raça. Trata-se de um movimento universal, a operar-se no sentido do progresso moral. [...]. Allan Kardec: A gênese. Cap. XVIII, item 6. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 4 48 Subsídios 1. Texto evangélico E ouvireis de guerras e de rumores de guerras; olhai, não vos assusteis, porque é mister que isso tudo aconteça, mas ainda não é o fim. Porquanto se levantará nação contra nação, e reino contra reino, e haverá fomes, e pestes, e terremotos, em vários lugares. Mas todas essas coisas são o princípio das dores. (Mateus, 24:6-8.) Então, se alguém vos disser: Eis que o Cristo está aqui ou ali, não lhe deis crédito, porque surgirão falsos cristos e falsos profetas e farão tão grandes sinais e prodígios, que, se possível fora, enganariam até os escolhidos. (Mateus, 24:23-24.) E, logo depois da aflição daqueles dias, o sol escurecerá, e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do céu, e as potências dos céus serão abaladas. Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem; e todas as tribos da Terra se lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória. (Mateus, 24:29-30.) Na verdade, na verdade vos digo que vós chorastes e vos lamen- tareis, e o mundo se alegrará, e vós estareis tristes; mas a vossa tristeza se converterá em alegria. [...] Assim também vós, agora, na verdade, tendes tristeza; mas outra vez vos verei, e o vosso coração se alegrará, e a vossa alegria, ninguém vo-la tirará. (João, 16:20 e 22.) Registradas sob a forma alegórica, essas profecias de Jesus referem-se às provações reservadas à Humanidade, consoantes os ditames da lei de progresso. Entretanto, sob essas alegorias, grandes verdades se ocultam. Há, primeiramente, a predição das calamidades de todo o gênero que assolarão e dizimarão a Humanidade, calamidades decorrentes da luta suprema entre o bem e o mal, entre a fé e a incredulidade, entre as ideias progressistas e as ideias retrógradas. Há, em segundo lugar, a da difusão, por toda a Terra, do Evangelho restaurado na sua pureza primitiva; depois, a do reinado do bem, que será o da paz e da frater- nidade universais, a derivar do código de moral evangélica, posto em prática por todos os povos. Será, verdadeiramente, o reino de Jesus, pois que Ele presidirá à sua implantação, passando os homens a viver EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 4 49 sob a égide da sua lei. Será o reinado da felicidade, porquanto diz Ele que — “depois dos dias de aflição, virão os de alegria”.3 2. Interpretação do texto evangélico » E ouvireis de guerras e de rumores de guerras; olhai, não vos assusteis, porque é mister que isso tudo aconteça, mas ainda não é o fim. Porquanto se levantará nação contra nação, e reino contra reino, e haverá fomes, e pestes, e terremotos, em vários lugares. Mas todas essas coisas são o princípio das dores (Mt 24:6-8). São profecias que produzem reações antagônicas nos indivíduos. Os incrédulos conservam-se indiferentes, concedendo-lhes pouca ou nenhuma importância. Os crentes, que tudo aceitam sem análise, conferem-lhes um caráter místico ou sobrenatural. “São igualmente errôneas ambas essas interpretações; a primeira, porque envolve uma negação da Providência; a segunda, porque tais palavras não anunciam a perturbação das leis da Natureza, mas o cumprimento dessas leis.”5 Em geral, as pessoas se agarram ao sofrimento, atrelando-se às suas consequências, sem se preocuparem em conhecer-lhes as causas. Contudo, é sinal de sabedoria identificar a origem das dores, desco- brir por que elas acontecem. Somente assim é possível amenizá-las, neutralizá-las ou mesmo impedi-las. De uma maneira geral, podermos afirmar que a principal causa do sofrimento é o atraso moral, a igno- rância das leis de Deus. As guerras e outras calamidades existentes no mundo, por exemplo, são lutas fratricidas originárias da imperfeição moral e intelectual. Confirma, igualmente, esta outra assertiva do Cristo: “É preciso que haja escândalo no mundo, [...] porque, imperfeitos como são na Terra, os homens se mostram propensos a praticar o mal, e porque, árvores más, só maus frutos dão.”1 Ocorrem duas formas de destruição na Natureza: a natural e a abusiva. A primeira garante a diversidade biológica e a manutenção da vida no Planeta. Faz parte do processo de “[...] transformação, que tem por fim a renovação e a melhoria dos seres vivos”.9 A segunda, a exemplo das guerras e outros flagelos destruidores provocados pelo homem, acontece porque a espécie humana ainda se deixa governar pela “[...] natureza animal sobre a natureza espiritual e [pelo] trans- bordamento das paixões”.11 Toda destruição que excede os limites da necessidade é uma viola- ção da lei de Deus. Os animais só destroem para satisfação de suas EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 4 50 necessidades; enquanto que o homem, dotado de livre-arbítrio, destrói sem necessidade. Terá que prestar contas do abuso da liberdade que lhe foi concedida, pois isso significa que cede aos maus instintos.10 Justamente por conhecer profundamente a natureza humana é que Jesus afirmou: “E ouvireis de guerras e de rumores de guerras; olhai, não vos assusteis, porque é mister que isso tudo aconteça, mas ainda não é o fim. Porquanto se levantará nação contra nação, e reino contra reino, e haverá fomes, e pestes, e terremotos, em vários lugares” (Mt 24:6-7). O texto põe em evidência os dois tipos de flagelos destruidores que atingirão a Humanidade, citados anteriormente: os provocados pela ação irresponsável do homem (guerras e fomes) ou relacionados à sua incapacidade de controlar as doenças (pestes), assim como os flagelos naturais (terremotos), que ocorrem à revelia da ação humana. Jesus aconselha não temer tais calamidades: “não vos assusteis, porque é mister que isso tudo aconteça”. É importante compreender que o sofrimento é um dos mecanismos educativos, permitido por Deus quando o homem se revela rebelde à sua Lei. O ser moralizado, entretanto compreende o valor das provações, vendo nelas o remédio amargo,mas útil à sua melhoria espiritual. É sempre medida inteligen- te, e de coragem, não temer ou fugir do sofrimento, mas enfrentá-lo com bom ânimo e fé, extraindo de suas lições o devido aprendizado. Isto posto, diremos que o nosso globo, como tudo o que existe, está submetido à lei do progresso. Ele progride, fisicamente, pela transfor- mação dos elementos que o compõem e, moralmente, pela depuração dos Espíritos encarnados e desencarnados que o povoam. Ambos esses progressos se realizam paralelamente, porquanto o melhoramento da habitação guarda relação com o do habitante. Fisicamente, o globo terráqueo há experimentado transformações que a Ciência tem com- provado e que o tornaram sucessivamente habitável por seres cada vez mais aperfeiçoados. Moralmente, a Humanidade progride pelo desenvolvimento da inteligência, do senso moral e do abrandamento dos costumes.6 Jesus também anuncia que “todas essas coisas são o princípio das dores”. Trata-se, portanto, de movimentos que marcam o atual período de transição, no qual estamos mergulhados, porém fundamentais para que se estabeleça, no futuro, a era da regeneração humana. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 4 51 A Humanidade tem realizado, até ao presente, incontestáveis pro- gressos. Os homens, com a sua inteligência, chegaram a resultados que jamais haviam alcançado, sob o ponto de vista das ciências, das artes e do bem-estar material. Resta-lhes ainda um imenso progresso a realizar: o de fazerem que entre si reinem a caridade, a fraternidade, a solidariedade, que lhes assegurem o bem-estar moral. Não poderiam consegui-lo nem com as suas crenças, nem com as suas instituições antiquadas, restos de outra idade, boas para certa época, suficientes para um estado transitório, mas que, havendo dado tudo o que com- portavam, seriam hoje um entrave. Já não é somente de desenvolver a inteligência o de que os homens necessitam, mas de elevar o senti- mento e, para isso, faz-se preciso destruir tudo o que superexcite neles o egoísmo e o orgulho.7 » Então, se alguém vos disser: Eis que o Cristo está aqui ou ali, não lhe deis crédito, porque surgirão falsos cristos e falsos profetas e farão tão grandes sinais e prodígios, que, se possível fora, enganariam até os escolhidos. (Mt, 24:23-24.) As principais características que assinalam o período de transi- ção são ocorrências de flagelos destruidores, naturais ou provocados pelo homem, como terremotos, maremotos, erupções vulcânicas, acidentes de graves proporções, guerras e demais conflitos bélicos, epidemias ou pandemias etc. Essas calamidades estão acompanhadas, em geral, pela degradação moral e dissolução dos bons costumes, situação típica dos conflitos de moralidade existentes nos momentos de transformação social. Almas generosas e caridosas estarão presentes no momento de transição, empenhadas em minorar o sofrimento dos seus irmãos em humanidade. Por outro lado, surgirão aproveitadores de todo tipo que, à semelhança das aves de rapina, se alimentarão do sofrimento presente no Planeta. São Espíritos inescrupulosos e mentirosos que nos fazem recordar, também, outro ensinamento de Jesus: “pois onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão as águias” (Mt 24:28). É preciso agir com muito cuidado para não sermos por eles envolvidos e enganados, sobretudo porque, submetidos ao peso das provações, estaremos mais expostos e mais fragilizados. Apresentando a imagem do cadáver e das águias, referia-se o Mestre à necessidade dos homens penitentes, que precisam recursos de combate EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 4 52 à extinção das sombras em que se mergulham. Não se elimina o pân- tano, atirando-lhe flores. Os corpos apodrecidos no campo atraem corvos que os devoram. Essa figura, de alta significação simbológica, é um dos mais fortes apelos do Senhor, conclamando os servidores do Evangelho aos movimentos do trabalho santificante. [...] É im- prescindível lembrar sempre que as aves impiedosas se ajuntarão em torno de cadáveres ao abandono. Os corvos se aninham noutras regiões, quando se alimpa o campo em que permaneciam. [...] Luta contra os cadáveres de qualquer natureza que se abriguem em teu mundo interior. Deixa que o divino sol da espiritualidade te penetre, pois, enquanto fores ataúde de coisas mortas, serás seguido, de perto, pelas águias da destruição.13 A despeito do sofrimento presente no período de transição, é também momento propício para aferição de valores morais. Os falsos profetas e os falsos cristos provocam, é verdade, muitas desordens e desarmonias. Suas ações, entretanto, fornecem condições para testar o caráter dos verdadeiramente bons (“os escolhidos”, da citação de Mateus). Diante dos falsos profetas devemos agir com prudência e vigilância dobradas, pois segundo o Evangelho, eles “farão tão grandes sinais e prodígios, que, se possível fora, enganariam até os escolhidos”. Em todos os tempos, homens houve que exploraram, em proveito de suas ambições, de seus interesses e do seu anseio de dominação, certos conhecimentos que possuíam, a fim de alcançarem o prestígio de um pseudopoder sobre-humano, ou de uma pretendida missão divina. São esses os falsos Cristos e falsos profetas. A difusão das luzes lhes aniquila o crédito, donde resulta que o número deles diminui à proporção que os homens se esclarecem. [...] O verdadeiro profeta se reconhece por mais sérios caracteres e exclusivamente morais.2 Assim, desenvolvendo o discernimento, enxergaremos além das aparências; e, sobretudo, agiremos da forma como ensina o valoroso Paulo de Tarso em sua primeira epístola aos Tessalonicenses: “Examinai tudo. Retende o bem” (1Ts 5:21). » E, logo depois da aflição daqueles dias, o sol escurecerá, e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do céu, e as potências dos céus serão abaladas. Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem; e todas as tribos da Terra se lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória (Mt, 24:29-30). EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 4 53 Este registro de Mateus destaca de maneira inequívoca a vitória do Cristo. Passado o período de transição, os Espíritos que perma- neceram fiéis ao bem receberão, em contrapartida, uma habitação planetária habitada por uma Humanidade desejosa de progredir, que foi transformada pela força do amor. “Devendo a prática geral do Evangelho determinar grande melhora no estado moral dos homens, ela, por isso mesmo, trará o reinado do bem e acarretará a queda do mal.”4 Fazendo reviver os ensinamentos do Cristo, o Espiritismo ocupará papel relevante na construção da Era Nova. “É no período que ora se inicia que o Espiritismo florescerá e dará frutos. Trabalhais, portanto, mais para o futuro, do que para o presente. Era, porém, necessário que esses trabalhos se preparassem antecipadamente, porque eles traçam as sendas da regeneração, pela unificação e racio- nalidade das crenças. Ditosos os que deles aproveitam desde já. Tantas penas se pouparão esses, quantos forem os proveitos que deles aufiram.” 8 » Na verdade, na verdade vos digo que vós chorastes e vos lamentareis, e o mundo se alegrará, e vós estareis tristes; mas a vossa tristeza se converterá em alegria. [...] Assim também vós, agora, na verdade, tendes tristeza; mas outra vez vos verei, e o vosso coração se alegrará, e a vossa alegria, ninguém vo-la tirará (Jo 16:20 e 22). As palavras de Jesus, anotadas por João, indicam a paz conquis- tada, resultante do sofrimento; a alegria consequente à tristeza; a bo- nança após a tempestade. No clarão do dia que marcará novo impulso evolutivo da humanidade terrestre, o Cristo permanece firme e forte no coração e na mente dos bem-aventurados habitantes do Planeta, os quais, ao tomarem posse da herança que lhes foi prometida pelo Senhor, recordarão esta sua promessa: “Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a Terra” (Mt 5:5). Na época da regeneração, a Humanidade se encontrará mais permanentementefeliz. É óbvio que o progresso espiritual não estará completo, pois a caminhada evolutiva é longa. Os terráqueos ainda enfrentarão provas, porém, sem as agruras das expiações, individuais ou coletivas. É, pois, o fim do mundo velho, do mundo governado pelos preconcei- tos, pelo orgulho, pelo egoísmo, pelo fanatismo, pela incredulidade, EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 4 54 pela cupidez, por todas as paixões pecaminosas, que o Cristo aludia, ao dizer: “Quando o Evangelho for pregado por toda a Terra, então é que virá o fim.” Esse fim, porém, para chegar, ocasionaria uma luta e é dessa luta que advirão os males por Ele previstos.4 Ao término do estudo desenvolvido neste Roteiro, esforcemos para jamais esquecer as últimas palavras dos versículos 20 e 22 do texto evangélico citado: “mas a vossa tristeza se converterá em alegria”; “mas outra vez vos verei, e o vosso coração se alegrará, e a vossa alegria, ninguém vo-la tirará”. São palavras que traduzem a promessa do Cristo a respeito dos dias futuros que nos aguardam, depois de concluído o pro- cesso de transição. Ainda que as nossas provações pesem e nos causem profundos sofrimentos, não nos deixemos conduzir pela dor, porque “a nossa tristeza se converterá em alegria”. Confiemos, então, no Cristo! Nas horas que precederam a agonia da cruz, os discípulos não con- seguiam disfarçar a dor, o desapontamento. Estavam tristes. Como pessoas humanas, não entendiam outras vitórias que não fossem as da Terra. Mas Jesus, com vigorosa serenidade, exortava-os: “Na verdade, na verdade, vos digo que vós chorareis e vos lamentareis; o mundo se alegrará e vós estareis tristes, mas a vossa tristeza se converterá em alegria.” [...] No entanto, essa pesada bagagem de sofrimentos constitui os alicerces de uma vida superior, repleta de paz e alegria. Essas dores representam auxílio de Deus à terra estéril dos corações humanos. Chegam como adubo divino aos sentimentos das criaturas terrestres, para que de pântanos desprezados nasçam lírios de esperança. [...]Cristo, porém, evidenciando suprema sabedoria, ensinou a ordem natural para a aquisição das alegrias eternas, demonstrando que for- necer caprichos satisfeitos, sem advertência e medida, às criaturas do mundo, no presente estado evolutivo, é depor substâncias perigosas em mãos infantis. Por esse motivo, reservou trabalhos e sacrifícios aos companheiros amados, para que se não perdessem na ilusão e chegassem à vida real com valioso patrimônio de estáveis edificações. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 4 55 Eis por que a alegria cristã não consta de prazeres da inconsciência, mas da sublime certeza de que todas as dores são caminhos para júbilos imortais.12 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 50 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 8, item 13, p. 169. 2. _____._____. Cap. 21, item 5, p. 362. 3. _____. A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 51 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 17, item 56, p. 449. 4. _____._____. Item 58, p. 450. 5. _____._____. Cap. 18, item 1, p. 457. 6. _____._____. Item 2, p. 458. 7. _____._____. Item 5, p. 460. 8. _____._____. Item 9 (Mensagem do Doutor Barry), p. 465. 9. _____. O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 89. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Questão 728, p.389. 10. _____._____. Questão 735, p.391. 11. _____._____. Questão 742, p.395. 12. XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, verdade e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 93 (Alegria cristã), p. 201-202. 13. _____. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 32 (Cadáveres), p. 79-80. Orientações ao monitor Dividir a turma em pequenos grupos para leitura e interpreta- ção dos quatro textos evangélicos, objeto de estudo deste Roteiro. Em seguida, pedir-lhes que relatem, em plenária, as conclusões. Finali- zados os relatos, realizar uma atividade exploratória e interpretativa das ideias desenvolvidas no texto, viabilizada por meio de perguntas inteligentes, que conduzam à reflexão, que façam os participantes raciocinar a respeito do período de transição, vivenciado atualmente, e o de regeneração que nos aguarda. EADE – LIVRO III | MÓDULO I APRENDENDO COM AS PROFECIAS Roteiro 5 UM REBANHO E UM PASTOR Objetivos » Explicar a sentença do Cristo de que “haverá um rebanho e um pastor” (Jo10:16). » Identificar condições favoráveis para o cumprimento desta profecia. » Destacar a contribuição do Espiritismo no contexto da previsão. Ideias principais » Com a profecia de que na Terra haverá “um rebanho e um pastor”, [...] Jesus claramente anuncia que os homens um dia se unirão por uma crença única [...]. Allan Kardec: A gênese. Cap. XVII, item 32. » A fim de que os homens se unam por meio de uma única crença é necessário que [...] as religiões se encontrem num terreno neutro, se bem que comum a todas; para isso todas terão que fazer concessões e sacrifícios mais ou menos importantes, conformemente à multi- plicidade dos seus dogmas particulares. Allan Kardec: A gênese. Cap. XVII, item 32. » Por meio do Espiritismo, a Humanidade tem que entrar numa nova fase, a do progresso moral que lhe é consequência inevitável. [...] Allan Kardec: O livro dos espíritos. Conclusão V. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 5 58 Subsídios 1. Texto evangélico Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das minhas sou conhecido. Assim como o Pai me conhece a mim, também eu conheço o Pai e dou a minha vida pelas ovelhas. Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor. (João, 10:14-16.) Em algumas regiões do Planeta existem, atualmente, acordos comerciais, econômicos, políticos e sociais coordenados, na sua maio- ria, por respeitáveis organizações internacionais, públicas ou privadas. São iniciativas que visam à aproximação e a integração de diferentes nacionalidades. A Comunidade Econômica Europeia (CEE) é um exemplo desse tipo de união. As palavras do Cristo, contudo, extrapolam essas ligações sociopolítico-econômicas. Indicam que acontecerá também uma integração religiosa entre os diferentes povos que compõem a humanidade planetária. É uma profecia que não deixa de repre- sentar um grande desafio, sobretudo se analisarmos a situação atual, em que predominam o separatismo, o fundamentalismo e os extremismos religiosos. Entretanto, se foi profetizado por Jesus, tal acontecimento ocorrerá, cedo ou tarde. Mas, como será possível efetuar essa união? [...] Difícil parecerá isso, tendo-se em vista as diferenças que existem entre as religiões, o antagonismo que elas alimentam entre os seus adeptos, a obstinação que manifestam em se acreditarem na posse exclusiva da verdade. Todas querem a unidade, mas cada uma se lisonjeia de que essa unidade se fará em seu proveito e nenhuma admite a possibilidade de fazer qualquer concessão, no que respeita às suas crenças. [...] Ela se fará pela força das coisas, porque há de tornar-se uma neces- sidade, para que se estreitem os laços da fraternidade entre as nações; far-se-á pelo desenvolvimento da razão humana, que se tornará apta a compreender a puerilidade de todas as dissidências; pelo progresso EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 5 59 das ciências, a demonstrar cada dia mais os erros materiais sobre que tais dissidências assentam [...].1 2. Interpretação do texto evangélico » Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das minhas sou conhecido (Jo, 10:14). A palavra pastor (do hebraico ro’eh e do grego poimen) apresenta diferentes significados nos textos bíblicos. Pastor ou guardador de gado é o mais conhecido: identifica as pessoas que cuidam de um rebanho, especialmente o de ovelhas. Exemplo: “E todas as nações serão reunidas diante dele e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas” (Mt 25:32). Pode referir-sea ministro de uma igreja. Exemplo: “Obedecei a vossos pastores e sujeitai-vos a eles; porque velam por vossa alma, como aqueles que hão de dar conta delas” (Hb 13:17). Indica tam- bém governante espiritual ou guia de um povo, nação ou Humanidade. Ismael é considerado pelos espíritas como o guia espiritual do Brasil. Jesus é o governante ou governador da humanidade terrestre. Exemplo: “Ora, o Deus de paz, que pelo sangue do concerto eterno tornou a trazer dos mortos a nosso Senhor Jesus Cristo, grande Pastor das ovelhas”. (Hb 13:20) Encontramos, ainda, o significado de pastor como indicativo de Deus, o Criador supremo, sobretudo nos textos do Velho Testamento: “ O Senhor é o meu Pastor; nada me faltará”. (Sl 23:1.) Jesus aplica a si mesmo o cognitivo “pastor” ou “porta”, no sentido de governador ou dirigente da humanidade terrestre. “[...] O Cristo, porém, é a porta da Vida abundante. Com Ele, submetemo-nos aos desígnios do Pai celestial e, nessa diretriz, aceitamos a existência como aprendizado e serviço, em favor de nosso próprio crescimento para a imortalidade.”11 Fora dos textos bíblicos, “[...] Homero e outros escritores secu- lares frequentemente chamavam os reis e governadores de pastores (Ilíada, I, 263)”.8 No contexto da citação de João, a afirmativa do Cristo “Eu sou o bom Pastor”, tem como significado expresso o de ser Ele, Jesus, o Governador espiritual do Orbe, o condutor dos nossos destinos, o guia e modelo da Humanidade. Nenhum dos demais significados estudados anteriormente se aplicam ao Mestre: Jesus não deve ser confundido EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 5 60 com guardador de ovelhas, com ministro ou chefe de igreja cristã, com governantes de províncias da Terra, e, especialmente, com Deus. Cristo é a linha central de nossas cogitações. Ele é o Senhor único, depois de Deus, para os filhos da Terra, com direitos inalienáveis, porquanto é a nossa luz do primeiro dia evolutivo e adquiriu-nos para a redenção com sacrifícios de seu amor. Somos servos dele. Precisamos atender-lhe aos interesses sublimes, com humildade.10 Emmanuel esclarece no seu livro A caminho da luz, a posição de Jesus como dirigente planetário: Rezam as tradições do mundo espiritual que na direção de todos os fenômenos, do nosso sistema, existe uma Comunidade de Espíritos puros e eleitos pelo Senhor supremo do Universo, em cujas mãos se conservam as rédeas diretoras da vida de todas as coletividades planetárias. Essa Comunidade de seres angélicos e perfeitos, da qual é Jesus um dos membros divinos, ao que nos foi dado saber, apenas já se reuniu, nas proximidades da Terra, para a solução de problemas decisivos da organização e da direção do nosso planeta, por duas vezes no curso dos milênios conhecidos.9 Neste sentido, Jesus não é apenas “o pastor”, mas “o bom pastor” porque conhece verdadeiramente as suas ovelhas, guiando-as com segurança e amor ao longo do processo ascensional. Compadecendo-se de nossa ignorância, a divina Providência deliberou enviar alguém que nos instruísse nos caminhos da elevação, e Jesus, o sublime governador do planeta terrestre, veio em pessoa explicar-nos que Deus não nos pede nem adulações e nem pompas, nem vítimas e nem holocaustos, e sim o coração inflamado de fraternidade, a ser- viço do bem, para que a Terra se abra, enfim, à glória e à felicidade do seu Reino.12 O vocábulo ovelha, usualmente empregado nos textos religio- sos, testamentais e não testamentais, apresenta três interpretações: a) a forma literal conhecida, de animal, fêmea do carneiro. Exemplo: “Que vos parece? Se algum homem tiver cem ovelhas, e uma delas se desgarrar, não irá pelos montes, deixando as noventa e nove, em busca da que se desgarrou?” (Mt 18:12.) b) a que faz referência aos crentes, religiosos, adeptos ou seguidores de uma religião. Exemplo: “[...] EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 5 61 mas ide, antes, às ovelhas perdidas da casa de Israel [...]” (Mt 10:6). Neste aspecto, as ovelhas perdidas representam os judeus afastados da sinagoga ou desiludidos com o Judaísmo; c) a que indica todos os Espíritos bons, justos ou benevolentes. Exemplo: “E, quando o Filho do Homem vier em sua glória [...]; e todas as nações serão reunidas diante dele, e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas. E porá as ovelhas à sua direita, mas os bodes à esquerda. Então, dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos do meu Pai, possuí por herança o Reino que vos está preparado desde a fundação do mundo; porque tive fome, e deste-me de comer [...]. Então, os justos lhes responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome e te demos de comer? [...]”(Mt 25:31-37). Fica claro que Jesus considera como “ovelhas” o sentido expresso nos itens “ b” e “c”. » Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me con- vém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor (Jo, 10:16). Jesus anuncia, com essas palavras, a diversidade religiosa que existia na sua época, em todas as partes do mundo, cuja maioria abra- çava a crença em vários deuses. Mesmo entre os judeus, monoteístas por natureza, existiam divisões quanto à interpretação da revelação de Moisés. Em Jerusalém, a sede do monoteísmo hebreu, conviviam diversas seitas do Judaísmo: dos fariseus e saduceus; dos nazarenos e essênios; dos samaritanos e terapeutas etc. Os judeus que nasceram e viveram fora de Jerusalém sofreram, especialmente, forte influência dos povos gentílicos. Um exemplo que se destaca diz respeito aos chamados “judeus helênicos” envolvidos, em geral, com as ideias dos filósofos gregos, sobretudo os da famosa Escola de Alexandria. Nos dias atuais, percebemos que o politeísmo não é tão ex- pressivo como era na Antiguidade, em razão da existência das três grandes revelações monoteístas, firmemente estabelecidas: Judaísmo, Cristianismo e Islamismo. Contudo, a mensagem cristã não é crença universal. Daí Jesus anunciar a conveniência de agregar ao seu aprisco outras ovelhas, as que ainda não aceitam ou desconhecem a sua men- sagem de amor. A profecia do Cristo se aplica tanto à Humanidade daquela época quanto a da atualidade. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 5 62 Trata-se de uma profecia que será cumprida, possivelmente, du- rante o período de regeneração, quando a humanidade terrestre estará mais unida em torno de ideias comuns, sobretudo no campo da fé: A fraternidade será a pedra angular da nova ordem social; mas, não há fraternidade real, sólida, efetiva, senão assente em base inabalável e essa base é a fé, não a fé em tais ou tais dogmas particulares, que mudam com os tempos e os povos e que mutuamente se apedrejam, porquanto, anatematizando-se uns aos outros, alimentam o anta- gonismo, mas a fé nos princípios fundamentais que toda a gente pode aceitar e aceitará: Deus, a alma, o futuro, o progresso individual indefinito, a perpetuidade das relações entre os seres. Quando todos os homens estiverem convencidos de que Deus é o mesmo para to- dos; de que esse Deus, soberanamente justo e bom, nada de injusto pode querer; que não dele, porém dos homens vem o mal, todos se considerarão filhos do mesmo Pai e se estenderão as mãos uns aos outros. Essa a fé que o Espiritismo faculta e que doravante será o eixo em torno do qual girará o gênero humano, quaisquer que sejam os cultos e as crenças particulares.2 É equívoco supor que a união dos homens em torno de uma única crença eliminará a diversidade religiosa existente no Planeta. As pessoas se manterão unidas pela crença em princípios espirituais universais e por um laço de fraternidade. Compreenderão, às duras penas, que so- mente “[...]o progresso moral pode assegurar aos homens a felicidade na Terra, refreando as paixões más; somente esse progresso pode fazer que entre os homens reinem a concórdia, a paz, a fraternidade”.3 Será ele [o progresso moral] que deitará por terra as barreiras que separam os povos, que farácaiam os preconceitos de casta e se calem os antagonismos de seitas, ensinando os homens a se considerarem irmãos que têm por dever auxiliarem-se mutuamente e não destina- dos a viver à custa uns dos outros. Será ainda o progresso moral que, secundado então pelo da inteligência, confundirá os homens numa mesma crença fundada nas verdades eternas, não sujeitas a contro- vérsias e, em consequência, aceitáveis por todos.3 Os livros sagrados das religiões e as características culturais de cada movimento religioso serão mantidos, pois representam o patrimô- nio cultural da Humanidade. Ocorrerá, porém, uma espécie de diversi- dade religiosa que se apoiará na unidade de certas ideias fundamentais. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 5 63 Quer isto dizer que continuarão existindo judeus, católicos, islâmicos, protestantes, espíritas etc. Somente assim podemos compreender a afirmativa de Jesus de que “haverá um rebanho e um Pastor”. A unidade de crença será o laço mais forte, o fundamento mais sólido da fraternidade universal, obstada, desde todos os tempos pelos antago- nismos religiosos que dividem os povos e as famílias, que fazem sejam uns, os dissidentes, vistos, pelos outros, como inimigos a serem evita- dos, combatidos, exterminados, em vez de irmãos a serem amados.4 O Espiritismo, na sua missão de Cristianismo redivivo, mostra que durante o período de transição moral, a “[...] geração que desapa- rece levará consigo seus erros e prejuízos; a geração que surge, retem- perada em fonte mais pura, imbuída de ideias mais sãs, imprimirá ao mundo ascensional movimento, no sentido de progresso moral que assinalará a nova fase da evolução humana”.5 “Um rebanho e um Pastor” representa a idade de maturidade espiritual da Humanidade. Indica o surgimento de uma geração nova, so- lidária e fraterna, que caminhará unida em busca da felicidade espiritual. A nova geração marchará, pois, para a realização de todas as ideias humanitárias compatíveis com o grau de adiantamento a que houver chegado. Avançando para o mesmo alvo e realizando seus objetivos, o Espiritismo se encontrará com ela no mesmo terreno. Aos homens progressistas se deparará nas ideias espíritas poderosa alavanca e o Espiritismo achará, nos novos homens, espíritos inteiramente dispos- tos a acolhê-lo. Dado esse estado de coisas, que poderão fazer os que entendam de opor-se-lhe?6 Referências 1. KARDEC, Allan. A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 51. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 17, item 32, p. 436-437. 2. _____._____. Cap. 18, item 17, p. 470-471. 3. _____._____. Item 19, p. 471. 4. _____._____. p. 471-472. 5. _____._____. Item 20, p. 472. 6. _____._____. Item 24, p. 474. 7. _____. O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 89. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Questão 625, p. 346. EADE • Livro III• Módulo I • Roteiro 5 64 8. DOUGLAS, J. D. BRUCE, F. F [et cols]. O novo dicionário da bíblia. Tradução de João Bentes. 3. ed. rev. São Paulo: Vida Nova, 2006. p.1004. 9. XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. Pelo Espírito Emmanuel. 34. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 1 (A gênese planetária), item: A comunidade dos espíritos puros, p. 17-18. 10. _____. Caminho, verdade e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 142 (Um só senhor), p. 299-300. 11. _____. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 35. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 172 (Ante o Cristo libertador), p. 416. 12. XAVIER, Francisco Cândido; VIEIRA, Waldo. Estude e viva. Pelos Espíritos Emmanuel e André Luiz. 12. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 24, item: Deus e caridade (mensagem de Emmanuel), p. 141. Orientações ao monitor Sugerimos que o estudo siga, criteriosamente, os objetivos defi- nidos na página inicial deste Roteiro, independentemente dos recursos audiovisuais e técnicas didáticas selecionados. OBSERVAÇÃO: Ao término da aula, o monitor solicita aos participantes a realização de uma pesquisa sobre as expressões “jugo” e “autoridade”, tanto no sentido indicado por Jesus quanto no que é, usualmente, utilizado nas relações sociais e profissionais (sentidos filo- sófico, científico, político, religioso e espiritual). Esta pesquisa servirá de base para o estudo previsto para as próximas reuniões (módulo II). EADE LIVRO III | MÓDULO II ENSINOS DIRETOS DE JESUS EADE – LIVRO III | MÓDULO II ENSINOS DIRETOS DE JESUS Roteiro 1 O JUGO DE JESUS Objetivos » Explicar, à luz da Doutrina Espírita, o significado do jugo do Cristo. » Refletir sobre a necessidade de nos submetermos ao amparo de Jesus. Ideias principais » O jugo a que Jesus se reporta é justamente a sua Doutrina, o conhecimen- to e a prática das regras de bem-viver, expostos no Sermão da Montanha e na Revelação espírita; é a prática do Amor, os deveres da Caridade, a consciência dos princípios das leis eternas e sua observância possível, divulgadas no alto do Sinai. Yvonne A. Pereira: À luz do consolador. Cap. Convite ao estudo. » Todos os sofrimentos [...] encontram consolação em a fé no futuro, em a confiança na justiça de Deus, que o Cristo veio ensinar aos homens. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. 6, item 2. Subsídios 1. Texto evangélico Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da Terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 1 68 e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim te aprouve. [...] Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos alivia- rei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve. (Mateus,11:25-26; 28-30.) Por esse ensino direto, Jesus nos faz ver a importância do seu Evangelho como rota segura da conquista da felicidade verdadeira. Esclarece Emmanuel: Apresentar-nos com volumosa bagagem de débitos do passado es- curo, ante a verdade; mas desde o instante em que nos rendemos aos desígnios do Senhor, aceitando sinceramente o dever da própria regeneração, avançamos para região espiritual diferente, onde todo jugo é suave e todo fardo é leve.12 Sob seu amparo e orientação adquirimos fortaleza moral que nos liberta dos velhos hábitos que nos mantêm presos ao solo das imperfeições. Neste propósito, a orientação espírita nos fornece a chave para a compreensão da mensagem do Cristo, necessária à nossa felicidade verdadeira. Todos os sofrimentos: misérias, decepções, dores físicas, perda de seres amados, encontram consolação em a fé no futuro, em a confiança na justiça de Deus, que o Cristo veio ensinar aos homens. Sobre aquele que, ao contrário, nada espera após esta vida, ou que simplesmente duvida, as aflições caem com todo o seu peso e nenhuma esperança lhe mitiga o amargor. Foi isso que levou Jesus a dizer: “Vinde a mim todos vós que estais fatigados [cansados e oprimidos], que eu vos ali- viarei.’’ Entretanto, faz depender de uma condição a sua assistência e a felicidade que promete aos aflitos. Essa condição está na lei por Ele ensinada. Seu jugo é a observância dessa lei; mas, esse jugo é leve e a lei é suave, pois que apenas impõe, como dever, o amor e a caridade.1 2. Interpretação do texto evangélico » Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da Terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as reve- laste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim te aprouve (Mt 11:25-26). As lições do Evangelho têm caráter atemporal: orientaram o discípulo à época em que o Cristo esteve no plano físico (“naquele EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 1 69 tempo”), orientam no presente e orientação nos dias futuros. Inde- pendentemente do nosso estágio evolutivo, importa considerar que Jesus continua conosco, sempre solícito, disposto a nos ensinar como edificar o reino dos céus, em nós mesmos. As palavras: “Graças te dou, ó Pai, Senhordo céu e da Terra” indicam, além de louvor, reverência e submissão ao jugo, ou vontade, de Deus (o “Pai”), Criador supremo (“Senhor do céu e da Terra”). Os vocábulos “céu” e “Terra” revelam, respectivamente, e sob forma simbólica, os valores imortais que transmitem felicidade eterna (“céu”) ao Espírito e o campo ou laboratório das experiências necessárias ao aprendizado humano (“Terra”). Jesus louva o Criador supremo porque certas verdades são reve- ladas aos pequeninos e ocultas aos sábios e instruídos. Na linguagem do Evangelho, “pequeninos” faz referência aos humildes, às almas pacíficas e boas, que se encontram abertas aos ensinamentos morais do Cristo. Os “sábios e instruídos” representam o grupo de intelectuais ciosos do saber que possuem. Por se julgarem “donos da verdade” são incapazes de perceber que revelam o estado de ignorância moral em que se encontram, por ora. São os intelectuais de todas as épocas, que enxergam através de lentes míopes, mas se avaliarem como superio- res aos semelhantes, porque possuem alguma cultura fornecida pelo mundo, ou em razão da posição social ou econômica que ocupam. Na verdade, quem se julga sábio entroniza a própria ignorância, pois a verdadeira sabedoria consiste em aplicar o conhecimento na cons- trução do bem, por meio de exemplificações moralmente elevadas. Os “sábios e instruídos” a que Jesus faz alusão, se revelam, paradoxalmente, incapazes de entender orientações espirituais básicas, uma vez que trazem o espírito saturado de arrogância e de vaidade. Deus não esconde as coisas aos sábios e aos entendidos; é o orgulho que não os deixa vê-las. Ao passo que os pequeninos, isto é, os despidos de orgulho e de presunção, iluminados pela fé pura que lhes concede segura intuição, assimilam facilmente as lições divinas e fazem delas caminho para a felicidade espiritual.8 Os humildes, ao contrário, por se curvarem aos desígnios divi- nos, não se julgam superiores. Sendo Espíritos mansos e benevolentes captam a essência das verdades imortais, por inspiração superior, ainda que na reencarnação se apresentem desprovidos de maiores conhecimentos intelectuais. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 1 70 O poder de Deus se manifesta nas mais pequeninas coisas, como nas maiores. Ele não põe a luz debaixo do alqueire, por isso que a derrama em ondas por toda a parte, de tal sorte que só cegos não a veem. A esses não quer Deus abrir à força os olhos, dado que lhes apraz tê-los fechados. [...] Para vencer a incredulidade, Deus emprega os meios mais conve- nientes, conforme os indivíduos. Não é à incredulidade que compete prescrever-lhe o que deva fazer, nem lhe cabe dizer: “Se me queres convencer, tens de proceder dessa ou daquela maneira, em tal ocasião e não em tal outra, porque essa ocasião é a que mais me convém.” Não se espantem, pois, os incrédulos de que nem Deus, nem os Espíritos, que são os executores da sua vontade, se lhes submetam às exigências. Inquiram de si mesmos o que diriam, se o último de seus servidores se lembrasse de lhes prescrever fosse o que fosse. Deus impõe condições e não aceita as que lhe queiram impor. Escuta, bondoso, os que a Ele se dirigem humildemente e não os que se julgam mais do que Ele.2 Jesus exemplifica sujeição à vontade de Deus quando afirma: “Sim, ó Pai, porque assim te aprouve.” Ele “[...] tinha certeza de que seus ensinamentos jamais se perderiam. No caminho do progresso, o que a alma não aceita hoje, aceitará no futuro”.8 Entretanto, Jesus respeita o livre-arbítrio dos seus interlocutores, de aceitar ou rejeitar as suas sábias orientações. “Não nos esqueçamos de que o Evangelho é para ser semeado, e a partir daí, germinar, crescer e frutificar no coração.”4 O exemplo do Cristo ilustra o tipo de comportamento que deve- mos adotar perante pessoas que rejeitam ou desconhecem os ensinos espíritas. Precisamos respeitar, com serenidade, a indiferença ou as opi- niões contrárias emitidas sobre a Doutrina Espírita. Com o tempo, todas as criaturas humanas absorverão seus princípios. “Atrás do ‘aprouve’ do Pai, pode estar presente o recurso menos agradável, mas imprescindível ao ressarcimento de débitos pretéritos, ou outros, destinados à aferição das conquistas já operadas, com vistas ao futuro [...].”5 O Mestre demonstra que os Espíritos que rejeitam as verdades do Evangelho o fazem porque estão transitoriamente incapacitados de enxergar mais além. “O orgulho é a catarata que lhes tolda a visão. De que vale apresentar a luz a um cego? Necessário é que, antes se lhe destrua a causa do mal.”3 Essa condição nos faz lembrar a seguinte afirmativa de Paulo: “E, se alguém cuida saber alguma coisa, ainda não sabe como convém sa- ber” (1Co 8:2), cuja interpretação de Emmanuel não deve ser ignorada: EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 1 71 A civilização sempre cuida saber excessivamente, mas, em tempo algum, soube como convém saber. É por isto que, ainda agora, o avião bombardeia, o rádio transmite a mentira e a morte, e o combustível alimenta maquinaria de agressão. Assim também, na esfera individual, o homem apenas cogita saber, esquecendo que é indispensável saber como convém. Em nossas atividades evangélicas, toda a atenção é necessária ao êxito na tarefa que nos foi cometida. Aprendizes do Evangelho existem que pretendem guardar toda a re- velação do Céu, para impô-la aos vizinhos; que se presumem de posse da humildade para tiranizarem os outros; que se declaram pacientes, irritando a quem os ouve; que se afirmam crentes, confundindo a fé alheia; que exibem títulos de benemerência, olvidando comezinhas obrigações domésticas. Esses amigos, principalmente, são daqueles que cuidam saber sem saberem de fato. Os que conhecem espiritualmente as situações ajudam sem ofender, melhoram sem ferir, esclarecem sem perturbar. Sabem como convém saber e aprenderam a ser úteis. Usam o silêncio e a palavra, localizam o bem e o mal, identificam a sombra e a luz e distribuem com todos os dons do Cristo. Informam-se quanto à Fonte da eterna Sabedoria e ligam-se a ela como lâmpadas perfeitas ao centro da força. Fracassos e triunfos, no plano das formas temporárias, não lhes modificam as ener- gias. Esses sabem porque sabem e utilizam os próprios conhecimentos como convém saber.14 » Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos alivia- rei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve (Mt 11:28-30). Este texto revela uma das mais belas e consoladoras manifesta- ções de Jesus. Demonstra a sensibilidade do educador cônscio de seu ministério e do que efetivamente necessita ser repassado ao aprendiz. Ninguém como Cristo espalhou na Terra tanta alegria e fortaleza de ânimo. Reconhecendo isso, muitos discípulos amontoam argumentos contra a lágrima e abominam as expressões de sofrimento. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 1 72 O Paraíso já estaria na Terra se ninguém tivesse razões para chorar. Considerando assim, Jesus, que era o Mestre da confiança e do otimismo, chamava ao seu coração todos os que estivessem cansados e oprimidos sob o peso de desenganos terrestres. Não amaldiçoou os tristes: convocou-os à consolação. [...] Caracterizam-se as lágrimas através de origens específicas. Quando nascem da dor sincera e construtiva, são filtros de redenção e vida; no entanto, se procedem do desespero, são venenos mortais.10 A expressão “Vinde a mim” está saturada de vibrações amorosas. Convidando-nos, Jesus espera que nos movimentemos para Ele. Apesar de nos aguardar no decorrer dos milênios, essas suas palavras ainda soam nas consciências, trabalhando nossas reservas, até que o livre- -arbítrio, imprescindível em tal decisão, possa ser acionado na direção dele que se constitui na porta de solução de todas as dores e apreensões.6 Sabemos, como cristãos e espíritas, que Jesus possui a supremagraça divina. Dele frui o bem superior, em razão de sua íntima e per- feita união com o Pai celestial.9 “Em tais condições, um desejo ardente domina o seu amorável coração: tornar os homens tais como ele é, fazê-los co-herdeiros com Ele, da paterna herança.”9 A ternura expressa no “Vinde a mim”, indica a possibilidade de nos libertarmos do peso das provações. É um apelo sincero que se assemelha às mãos estendidas; ao abraço fraterno; ao secar de lágri- mas; à oferta de ombro amigo; é também manifestação de socorro, consolo e proteção. Criados simples e ignorantes, optamos, contudo, em perambular pelos desvios que nos afastam do caminho do bem, a despeito das inúmeras oportunidades de elevação que nos são oferecidas. Todos os males que nos afetam têm origem na falta de comunhão com Deus. Consequentemente, tudo que nos causa aflições, mágoas e sofrimentos, resolver-se-á como que por encanto, mediante o esta- belecimento de nossas relações com a Divindade.9 O ser humano, para ser feliz, necessita desprender-se da opressão que a vida material proporciona. A questão que se coloca, EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 1 73 naturalmente, não é a do Cristo vir até nós, mas decidirmos, efetiva- mente, ir ao encontro do Cristo. Todos ouvem as palavras do Cristo, as quais insistem para que a mente inquieta e o coração atormentado lhe procurem o regaço refrigerante... [...] Aqui, as palavras do Mestre se derramam por vitalizante bálsamo, entretanto, os laços da conveniência imediatista são demasiado fortes; além, assinala-se o convite divino, entre promessas de renovação para a jornada redentora, todavia, o cárcere do desânimo isola o espírito, por meio de grades resistentes; acolá, o chamamento do Alto ameniza as penas da alma desiludida, mas é quase impraticável a libertação dos impedimentos constituídos por pessoas e coisas, situações e interesses individuais, aparentemente inadiáveis. Jesus, o nosso Salvador, estende-nos os braços amoráveis e compas- sivos. Com Ele, a vida enriquecer-se-á de valores imperecíveis e à sombra dos seus ensinamentos celestes seguiremos, pelo trabalho santificante, na direção da Pátria Universal ...11 Faz-se necessário, pois, que o ser humano priorize a sua felici- dade, orientando-se pelo poder do amor. Assim, quando Jesus afirma “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos e eu vos aliviarei”, destaca que a força do amor é a única capaz de produzir paz e alegria duradouras. O jugo do Cristo é o jugo do amor, que educa e promove o ser humano. Sob sua tutela, conhecemos e colocamos em prática a sua Doutrina, que se resume na prática da caridade. Entretanto, agindo como Espíritos rebeldes e imaturos, fugimos de sua assistência, através de ações infelizes, contra nós próprios e contra o próximo. Por não buscá-lo pela via do Amor, Ele nos aguarda após as muitas lutas e desarmonias experimentadas nas veredas do sofrimento e da desilusão. Oprimidos, porque as coisas da Terra não apenas cansam, oprimem também. As desilusões aniquilam. As derrotas afligem. Depois de tanta luta, tudo passa deixando cicatrizes a nos induzirem à reflexão, para tomada de uma nova posição com Ele nas trilhas do progresso.7 É importante não nos submetermos às pseudonecessidades alimentadas pelo ego que, por serem fictícias e transitórias, atordoam os sentidos, envenenam os sentimentos, obliteram o raciocínio, in- terpondo obstáculos à melhoria espiritual. O atraso moral torna o Espírito escravo de paixões inferiores, em que o orgulho e o egoísmo EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 1 74 estabelecem reinado desolador. Libertos, porém, dos seus apelos in- feriores, fazendo opção pelo amor do Cristo, constata-se e que o seu jugo liberta e ampara por estar fundamentado no amor. Os versículos 29 e 30, do registro de Mateus, trazem uma pro- messa de Jesus que deve ser considerada com muita seriedade: “Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve.” Importa destacar que se o Cristo fala do seu jugo é porque existem outros jugos, como o das paixões inferiores, anteriormente assinaladas. Nessas condições, a pessoa corre o risco de ficar indiferente ao bem. Preferindo manter-se à margem da vida, indolente, é então subjugada pelas oscilações dos interesses egoísticos que lhe alimentam a existência. Presa às manifestações do egocentrismo, passa a ignorar o valor do sacrifício em benefício do próximo, incapaz que se encontra de renunciar às atrações impostas por posições e cargos existentes na vida em sociedade. É necessário ficarmos atentos ao real sentido destas palavras de Jesus, evitando-se qualquer tipo de equívoco: “Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve.” Não existe, na transcrição, estímulo à falta de compromisso moral quando Jesus anuncia: “aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração”; nem à ociosidade quando afirma: “encontrareis descanso para a vossa alma”; ou, ainda, desprezo pelo esforço e pelo trabalho, quando alega que o seu jugo é suave e que o seu fardo é leve. Recordemos que o processo de renovação no bem exige dedicação e persistência, obtido, em geral, à custa de suor e de lágrimas. Neste contexto, orienta o benfeitor Emmanuel com propriedade: Dirigiu-se Jesus à multidão dos aflitos e desalentados proclamando o divino propósito de aliviá-los. — “Vinde a mim! — clamou o Mestre —, tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei comigo, que sou manso e humilde de coração!” Seu apelo amoroso vibra no mundo, através de todos os séculos do Cristianismo. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 1 75 Compacta é a turba de desesperados e oprimidos da Terra, não obs- tante o amorável convite. É que o Mestre no “Vinde a mim!” espera naturalmente que as almas inquietas e tristes o procurem para a aquisição do ensinamento divi- no. Mas nem todos os aflitos pretendem renunciar ao objeto de suas desesperações e nem todos os tristes querem fugir à sombra para o encontro com a luz. A maioria dos desalentados chega a tentar a satisfação de caprichos criminosos com a proteção de Jesus, emitindo rogativas estranhas. Entretanto, quando os sofredores se dirigirem sinceramente ao Cristo, hão de ouvi-lo, no silêncio do santuário interior, concitando-lhes o espírito a desprezar as disputas reprováveis do campo inferior. Onde estão os aflitos da Terra que pretendem trocar o cativeiro das próprias paixões pelo jugo suave de Jesus Cristo? Para esses foram pronunciadas as santas palavras “Vinde a mim!”, reservando-lhes o Evangelho poderosa luz para a renovação indis- pensável.13 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 126. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 6, item 2, p. 139-140. 2. _____._____. Cap. 7, item 9, p. 151. 3. _____._____. Item 10, p. 151-152. 4. GRUPO ESPÍRITA EMMANUEL. Luz imperecível. Coordenação de Honório Onofre de Abreu. 2. ed. Belo Horizonte: União Espírita Mineira, 1997. Cap. 57 (Proposta divina), p. 171. 5. _____._____. p. 172. 6. _____._____. Cap. 59 (Cansados e oprimidos), p. 176-177. 7. _____._____. p. 176-177. 8. RIGONATTI, Eliseu. O evangelho dos humildes. 16. ed. São Paulo: Pensamento, 2004. Cap. 11, item: O jugo de Jesus, p. 108. 9. VINÍCIUS (Pedro de Camargo). Nas pegadas do mestre. 10. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. Cap. Vinde a mim, p. 119. 10. XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, verdade e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 172 (Lágrimas), p. 359-360. 11. _____. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 35. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 5 (Consegues ir?), p. 25-26. 12. _____. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 81 (No paraíso), p. 178. 13. _____._____. Cap. 130 (Ondeestão?), p. 275-276. 14. _____. Vinha de luz. Pelo Espírito Emmanuel. 25. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 44 (Saber como convém), p. 107-108. Orientações ao monitor Pedir aos participantes que apresentem os resultados da pesquisa solicitada na reunião anterior, a que trata das diferentes utilizações da palavra “jugo”. Em seguida, trabalhar os objetivos especificados no Roteiro, tendo como base as referências citadas. OBSERVAÇÃO: esclarecer que a pesquisa sobre o significado de “autoridade” será utilizada na próxima reunião. EADE – LIVRO III | MÓDULO II ENSINOS DIRETOS DE JESUS Roteiro 2 A AUTORIDADE DE JESUS Objetivos » Analisar em que se resume a autoridade do Cristo. » Esclarecer como Espiritismo explica essa autoridade. Ideias principais » Sob a autoridade moral do Cristo, o ser humano é guiado na sua busca pela conquista da felicidade plena. Um dia, Deus, em sua inesgotável caridade, permitiu que o homem visse a verdade varar as trevas. Esse dia foi o do advento do Cristo.[...] Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. I, item 10. » O Cristo foi o iniciador da mais pura, da mais sublime moral, da moral evangélico-cristã, que há de renovar o mundo, aproximar os homens e torná-los irmãos; que há de fazer brotar de todos os cora- ções a caridade e o amor do próximo e estabelecer ente os humanos uma solidariedade comum; de uma moral, enfim, que há de trans- formar a Terra, tornando-a morada de Espíritos superiores aos que hoje a habitam. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. I, item 9. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 2 78 Subsídios 1. Texto evangélico Eu sou o pão da vida. (João, 6:48.) Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida. (João, 8:12.) Eu sou a porta; se alguém entrar por mim, salvar-se-á, e entrará, e sairá, e achará pastagens. (João, 10:9-10.) Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida. Ninguém vem ao Pai senão por mim. (João, 14:6.) Como Governador do planeta, Jesus detém a plena autoridade para suprir a Humanidade de recursos favoráveis à sua redenção espiri- tual. É uma autoridade que se manifesta de forma branda e pacífica, sem violência de qualquer espécie. Fundamenta-se na lei de amor que, por sua vez, reflete as leis sábias do Criador. A autoridade e a sabedoria de Jesus são legítimas, oriundas de Deus. Seu Evangelho é o maior código de moralidade existente, ensinando como colocar em prática a Lei de Deus, Lei que Jesus “[....] veio cumpri-la, isto é, desenvolvê-la, dar-lhe o verdadeiro sentido e adaptá-la ao grau de adiantamento dos homens. Por isso é que se nos depara, nessa Lei, o princípio dos deveres para com Deus e para com o próximo, base de sua doutrina”.1 Em cada ensinamento do Evangelho identificamos o Mestre na sua divina missão de educador de almas que imprime o selo do amor e da sabedoria nas suas orientações superiores. É por este motivo que, em outra oportunidade, afirma o Cristo: “Vós me chamais Mestre e Senhor e dizeis bem, porque eu o sou” (Jo 13:13). Mas o papel de Jesus não foi o de um simples legislador moralista, tendo por exclusiva autoridade a sua palavra. Cabia-lhe dar cumpri- mento às profecias que lhe anunciaram o advento; a autoridade lhe vinha da natureza excepcional do seu Espírito e de sua missão divina.2 Ele viera ensinar aos homens que a verdadeira vida não é a que trans- corre na Terra e sim a que é vivida no reino dos céus; viera ensinar-lhes o caminho que a esse reino conduz, os meios de eles se reconciliarem com Deus e de pressentirem esses meios na marcha das coisas por vir, EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 2 79 para a realização dos destinos humanos. Entretanto, não disse tudo, limitando-se, respeito a muitos pontos, a lançar o gérmen de verdades que, segundo Ele próprio o declarou, ainda não podiam ser compreen- didas. Falou de tudo, mas em termos mais ou menos implícitos. Para ser apreendido o sentido oculto de algumas palavras suas, mister se fazia que novas ideias e novos conhecimentos lhes trouxessem a chave indispensável, ideias que, porém, não podiam surgir antes que o espírito humano houvesse alcançado um certo grau de madureza.3 Os ensinamentos espíritas nos orientam como interpretar com segurança a mensagem de Jesus, inclusive pontos que permaneceram obscuros ou foram interpretados equivocadamente. “O Espiritismo é a chave com auxílio da qual tudo se explica de modo fácil.”4 A Boa-Nova apresenta sublimadas orientações que definem com clareza inequívoca a autoridade de Jesus e a sua condição de dirigente maior dos destinos da Humanidade. Neste contexto, a fórmula da nossa definitiva libertação espiritual encontra-se neste conselho de Jesus: “Se vós permanecerdes na minha palavra, verdadeiramente, sereis meus discípulos e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (Jo 8:31-32). 2. Interpretação do texto evangélico » Eu sou o pão da vida (Jo 6:48). No sentido elementar, “pão” significa alimento básico, o que nutre as células e mantém a vida humana. Afirmando-se, porém, como “o pão da vida”, Jesus nos apresenta o sentido espiritual do seu ensinamento: o de alimento essencial, que garante os nutrientes ne- cessários para o sustento moral do Espírito. Jesus é o pão que fornece, cotidianamente, conforto espiritual. Este conforto não “[...] é como o pão do mundo, que passa, mecanicamente, de mão em mão, para saciar a fome do corpo, mas sim como o Sol, que é o mesmo para to- dos, penetrando, porém, somente nos lugares onde não se haja feito um reduto fechado para as sombras”.9 Através dos tempos, Jesus vem, saciando a fome espiritual de quan- tos dele se aproximam, suprindo-os fartamente em termos de harmonia, equilíbrio, bom ânimo e força moral. Acrescenta, ainda, Emmanuel: Dentro de nossa pequenez, sucumbiríamos de fome espiritual, esta- cionados na sombra da ignorância, não fosse essa videira da verdade EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 2 80 e do amor que o supremo Senhor nos concedeu em Jesus Cristo. De sua seiva divina procedem todas as nossas realizações elevadas, nos serviços da Terra. Alimentados por essa fonte sublime, compete-nos reconhecer que, sem o Cristo, as organizações do mundo se perderiam por falta de base. Nele encontramos o pão vivo das almas e, desde o princípio, o seu amor infinito no orbe terrestre é o fundamento divino de todas as verdades da vida.10 Conclui-se, dessa forma, que precisamos trazer o Cristo no coração e na mente. As lições do seu Evangelho nos convidam ao grande esforço de cooperação e de doação no bem, que devemos aderir voluntariamente, sem falsas expectativas, mas conscientes do trabalho que nos cabe realizar. » Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida (Jo 8:12). Por essa afirmativa compreendemos a missão de Jesus como iluminador de consciências, num trabalho incessante que se desenrola ao longo das eras, nas vias do progresso humano. Sob a projeção da sua magnífica luz espiritual somos esclarecidos, porém, sem deixar de reconhecer o estado de escuridão que ainda trazemos no íntimo do ser. Nossos pobres olhos não podem divisar particularidades nesse des- lumbramento, mas sabemos que o fio da luz e da vida está nas suas mãos. É Ele quem sustenta todos os elementos ativos e passivos da existência planetária. No seu coração augusto e misericordioso está o Verbo do princípio. Um sopro de sua vontade pode renovar todas as coisas, e um gesto seu pode transformar a fisionomia de todos os horizontes terrestres.11 Como Governador espiritual da Terra, Jesus fornece os meios e os recursos necessários ao aprendizado humano e, sob o seu jugo amorável, a Humanidade adquire a tão esperada iluminação espiritual. Ele é a Luz do princípio e nas suas mãos misericordiosas repousam os destinos do mundo. Seu coração magnânimo é a fonte da vida para toda a humanidade terrestre. Sua mensagem de amor, no Evangelho, é a eterna palavra da ressurreição e dajustiça da fraternidade e da misericórdia. Todas as coisas humanas passarão, todas as coisas hu- manas se modificarão. Ele, porém, é a Luz de todas as vidas terrestres, inacessível ao tempo e à destruição.12 EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 2 81 Identificando e aceitando a luz do Mestre, as criaturas humanas transformam-se, pouco a pouco, em instrumentos de auxílio, em au- tênticos discípulos, que sabem refletir a luz do Evangelho nas inúmeras atividades de amor e caridade. Tais discípulos são assim denominados pelo Mestre: “Vós sois a luz do mundo” (Mt 5:14). » Eu sou a porta; se alguém entrar por mim, salvar-se-á, e entrará, e sairá, e achará pastagens. [...] Eu sou o bom Pastor; o bom Pastor dá a sua vida pelas ovelhas (Jo 10:9 e11). A porta é uma passagem situada entre dois ambientes que, no sentido do Evangelho, expressa níveis de entendimento ou de planos evolutivos. A passagem de um lado para o outro está intermediada pela porta, aqui claramente representada pelo Cristo. Quer isso dizer que as oportunidades de progresso, advindas das provações ou em razão de escolhas sensatas, são concessões que Jesus faz aos seres humanos, em nome de Deus. Há também outro sentido para “porta”. Pode indicar sinal de renovação mental, ou mudanças de atitudes e de comportamentos. Devemos considerar, porém, que nem sempre o desejo de melhoria corresponde a ações efetivas. Quando notarmos a presença de um crente de boa palavra, mas sem o íntimo renovado, dirigindo-se ao Mestre como um prisioneiro carre- gado de cadeias, estejamos certos de que esse irmão pode estar à porta do Cristo, pela sinceridade das intenções; no entanto, não conseguiu, ainda, a penetração no santuário de seu amor.8 Encontramos muitas portas na vida: as “portas largas” que con- duzem às perturbações e às desarmonias espirituais. Da mesma forma, existem “portas estreitas”, caracterizadas pela renúncia aos valores transitórios e às ilusões da matéria. (Mt 7:13-14.) Com o Cristo, porém, a palavra “porta” apresenta grande significância, porque quando Ele afirma “Eu sou a porta”, acrescenta, em seguida: “se alguém entrar por mim, salvar-se-á”. Jesus é, assim, meio de progresso moral-intelectual e salvação. É o Guia e Modelo da Humanidade.6 Jesus é a referência legítima do bem e da felicidade. Simbolizando- -se como porta, demonstra que a sua mensagem conduz a um patamar mais amplo, mais elevado, fértil de valores edificantes para o Espírito. O Cristo foi o iniciador da mais pura, da mais sublime moral, da moral evangélico-cristã, que há de renovar o mundo, aproximar os homens EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 2 82 e torná-los irmãos; que há de fazer brotar de todos os corações a caridade e o amor do próximo e estabelecer entre os humanos uma solidariedade comum; de uma moral, enfim, que há de transformar a Terra, tornando-a morada de Espíritos superiores aos que hoje a habitam. É a lei do progresso, a que a Natureza está submetida, que se cumpre, e o Espiritismo é a alavanca de que Deus se utiliza para fazer que a Humanidade avance.5 No final do versículo nove, da citação de João, o Mestre afirma: “Salvar-se-á, e entrará, e sairá, e achará pastagens”. Percebe-se, aqui, que a ideia de “salvar-se” não é algo estático ou passivo. Envolve movimentação de um nível evolutivo para outro, determinada por ações precisas. “Salvar-se” significa integrar-se ao serviço do Cristo, colocar-se à sua disposição, onde o indivíduo encontrará sempre oportunidades de realizações nobres (“achará pastagens”). Fica claro também que a pessoa é salva porque se libertou ou encontrase em processo de libertação das próprias imperfeições. O Espírito é livre a partir do momento que aceita e vivência ensina- mentos do Cristo (“a porta”). Sendo livre, “entrará, e sairá, e achará pastagens”, ou seja, é capaz de vencer as tentações do caminho porque a sua alimentação mental, “a pastagem”, agora, é farta, decorrente da sua nova atuação no cenário da vida: a vitória sobre si mesmo, sobre as próprias imperfeições. » Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida. Ninguém vem ao Pai senão por mim (Jo14:6). A autoridade de Jesus é de cunho moral. A que se impõe, natu- ralmente, sem ofensas e violências. É a autoridade do amor. O dia em que a Humanidade tiver conhecimento da mensagem do Cristo, uma nova ordem se estabelecerá no planeta, que de mundo de expiação e provas se elevará à categoria de regeneração. Os seres humanos, mais fraternos e solidários, entenderão e aceitarão a liderança real, legítima e verdadeira: a de Jesus. A liderança real, no caminho da vida, não tem alicerces em recursos amoedados. Não se encastela simplesmente em notoriedade de qual- quer natureza. Não depende unicamente da argúcia ou sagacidade. Nem é fruto da erudição pretensiosa. A chefia durável pertencem aos que se ausentam de si mesmos, buscando os semelhantes para servi- -los... Esquecendo as luzes transitórias da ribalta do mundo... renun- ciando à concretização de sonhos pessoais em favor das realizações EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 2 83 coletivas.... Obedecendo aos estímulos e avisos da consciência... E por amar a todos sem reclamar amor para si, embora na condição de servo de todos, faz-se amado da vida, que nele concentra seus interesses fundamentais.13 Existindo uma sociedade mais pacífica na Terra, unida por um laço de sincera fraternidade, a Humanidade compreenderá, finalmente, o significado de o Cristo ser o Caminho, a Verdade e a Vida. Jesus é o Caminho, a Verdade e a Vida. Sua luz imperecível brilha sobre os milênios terrestres, como o Verbo do princípio, penetrando [...]. Lutas sanguinárias, guerras de extermínio, calamidades sociais não lhe modificaram um til nas palavras que se atualizam, cada vez mais, com a evolução multiforme da Terra. Tempestades de sangue e lágrimas nada mais fizeram que avivar-lhes a grandeza. Entretanto, sempre tardios no aproveitamento das oportunidades preciosas, muitas vezes, no curso das existências renovadas, temos desprezado o Caminho, indiferentes ante os patrimônios da Verdade e da Vida. O Senhor, contudo, nunca nos deixou desamparados. Cada dia, reforma os títulos de tolerância para com as nossas dívidas; todavia, é de nosso próprio interesse levantar o padrão da vontade, estabelecer disciplinas para uso pessoal e reeducar a nós mesmos, ao contato do Mestre divino. Ele é o Amigo generoso, mas tantas vezes lhe olvidamos o conselho que somos suscetíveis de atingir obscuras zonas de adiamento indefinível de nossa iluminação interior para a vida eterna.7 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 126. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 1, item 3, p. 58. 2. _____._____. Item 4, p. 58-59. 3. _____._____. p. 59. 4. _____._____. Item 5, p.59. 5. _____._____. Item 9, p. 62-63. 6. _____. O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 89. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Questão 625, p. 346. 7. XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, verdade e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Introdução: Interpretação dos textos sagrados, p. 13-14. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 2 84 8. _____._____. Cap. 7 (Tudo novo), p. 30. 9. _____._____. Cap. 11 (Conforto), p. 38. 10. _____._____. Cap. 54 (A videira), p. 124. 11. _____. A caminho da luz. Pelo Espírito Emmanuel. 32. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. Introdução, p.15. 12. _____._____. p. 16. 13. XAVIER, Francisco Cândido; VIEIRA, Waldo. O espírito da verdade. Por diversos Es- píritos. 16. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 64 (O primeiro: mensagem do Espírito Emmanuel), p. 152. Orientações ao monitor Como motivação inicial, pedir aos participantes que informem os diferentes significados da palavra autoridade. Dividir, em seguida, a turma em pequenos grupos para o estudo dos textos evangélicos, citados neste Roteiro. Promover, em seguida, ampla análise do assunto, mantendo-se atento às orientaçõesespíritas correspondentes. EADE – LIVRO III | MÓDULO II ENSINOS DIRETOS DE JESUS Roteiro 3 A CASA EDIFICADA SOBRE A ROCHA Objetivos » Analisar, à luz da Doutrina Espírita, o simbolismo da “casa construída sobre a rocha”, constante em Mateus, 7:24-27 e em Lucas, 6:46-49. » Esclarecer por que todas as pessoas podem e devem colocar em prática os ensinamentos de Jesus. Ideias principais » Todos os que reconhecem a missão de Jesus dizem: Senhor! Senhor! — De que serve, porém, lhe chamarem Mestre ou Senhor, se não lhe seguem os preceitos? [...] Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. XVIII, item 9. » São eternas as palavras de Jesus, porque são a verdade. [...] Eis por que todas as instituições humanas, políticas, sociais e religiosas, que se apoiarem nessas palavras, serão estáveis como a casa construída sobre a rocha. [...] Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. XVIII, item 9. » Na qualidade de político ou de varredor, num palácio ou numa choupa- na, o homem da Terra pode fazer o que lhe ensinou Jesus. Emmanuel: Caminho, verdade e vida. Cap. 47. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 3 86 Subsídios 1. Texto evangélico E por que me chamais Senhor, Senhor, e não fazeis o que eu digo? Qualquer que vem a mim, e ouve as minhas palavras, e as observa, eu vos mostrarei a quem é semelhante. É semelhante ao homem que edificou uma casa, e cavou, e abriu bem fundo, e pôs os alicerces sobre rocha; e, vindo a enchente, bateu com ímpeto a corrente naquela casa e não a pôde abalar, porque estava fundada sobre rocha. Mas o que ouve e não pratica é semelhante ao homem que edificou uma casa sobre terra, sem alicerces, na qual bateu com ímpeto a corrente, e logo caiu; e foi grande a ruína daquela casa. (Lucas, 6:46-49.) Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras e as pratica, assemelhá-lo-ei ao homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha. E desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e comba- teram aquela casa, e não caiu, porque estava edificada sobre a rocha. E aquele que ouve estas minhas palavras e as não cumpre, compará-lo-ei ao homem insensato, que edificou a sua casa sobre a areia. E desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa, e caiu, e foi grande a sua queda. (Mateus, 7:24-27.) Por esse ensinamento de Jesus, registrado por Lucas e por Mateus, identificamos duas questões fundamentais, dirigidas a todo cristão, independentemente da interpretação religiosa que segue: 1) a importância de colocar em prática os ensinamentos de Jesus; 2) a sabedoria, ou prudência, em edificar o próprio caráter em bases sólidas. A propósito, esclarece Kardec: Todos os que reconhecem a missão de Jesus dizem: Senhor! Senhor! – De que serve, porém, lhe chamarem Mestre ou Senhor, se não lhe seguem os preceitos? Serão cristãos os que o honram com exteriores atos de devoção e, ao mesmo tempo, sacrificam ao orgulho, ao egoís- mo, à cupidez e a todas as suas paixões? Serão seus discípulos os que passam os dias em oração e não se mostram nem melhores, nem mais caridosos, nem mais indulgentes para com seus semelhantes? Não, porquanto, do mesmo modo que os fariseus, eles têm a prece nos lábios e não no coração. [...] Não espereis dobrar a Justiça do Senhor pela multiplicidade das vossas palavras e das vossas genuflexões. O caminho único que vos está aberto, para achardes graça perante Ele, é o da prática sincera da lei de amor e de caridade. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 3 87 [...] Eis por que todas as instituições humanas, políticas, sociais e re- ligiosas, que se apoiarem nessas palavras, serão estáveis como a casa construída sobre a rocha.[...]1 2. Interpretação do texto evangélico » E por que me chamais Senhor, Senhor, e não fazeis o que eu digo? (Lc 6:46). No Velho Testamento, a palavra “Senhor” faz referência exclusiva a Deus (do hebraico Yhvh, transliterado para Yahweh, Javé ou Jeová),3 Criador supremo, também chamado de “O Eterno”. Nessa escritura bíblica existe também a palavra Adonay indicativa de “Senhor”. [Adonay] é [...] uma forma plural que designa Deus como ser pleno de vida e poder. Significa “Senhor”, ou em sua forma extensiva, “Senhor de senhores”, e “Senhor de toda a Terra”, apontando Deus como governante a quem tudo está sujeito e com quem o homem está relacionado como servo (Gn 18:27). Era a forma favorita do nome divino pelo escritores judeus posteriores, os quais usavam-na para substituir o nome sagrado YHVH.2 Importa considerar, porém, que seguindo a tradição definida pelos escritores da Septuaginta (tradução grega das escrituras hebrai- cas), as modernas traduções do Velho Testamento usam a palavra “Senhor” como equivalente de YHVH (Javé), “[...] A forma JAVÉ é a mais aceita entre os eruditos. A forma JEOVÁ (JEHOAH), que só aparece a partir de 1518, não é recomendável por ser híbrida, isto é, consta da mistura das consoantes de YHVH (o Eterno) com as vogais de ADONAY (Senhor).7 No Novo Testamento, o vocábulo “Senhor” é usado tanto para Deus, o Pai, como para Jesus, o Filho — também confundido, equivo- cadamente, com Deus por algumas religiões cristãs —, “[...] sendo às vezes impossível afirmar com certeza de qual dos dois se está falando”.7 Referências históricas à parte, o que realmente é essencial diz respeito à vivência da mensagem do Cristo. Trata-se de questão que todo cristão, todo espírita, deve analisar com seriedade. São eternas as palavras de Jesus, porque são a verdade. Constituem não só a salvaguarda da vida celeste, mas também o penhor da paz, da tranquilidade e da estabilidade nas coisas da vida terrestre. [...] Os homens as conservarão porque se sentirão felizes nelas. As que, porém, forem uma violação daquelas palavras, serão como a casa edificada na areia: o vento das renovações e o rio do progresso as arrastarão.1 EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 3 88 Considerando o período de tempo que a mensagem cristã se encontra entre nós, entende-se que um esforço maior deva ser levado avante pelos cristãos — notadamente o espírita que detém maiores esclarecimentos sobre as consequências dos seus atos —, no sentido de vivenciá-la, tendo em vista esta orientação do apóstolo Tiago: “E sede cumpridores da palavra e não somente ouvintes, enganando-vos com falsos discursos” (Tg 1:22). Falsos discursos enganaram indivíduos, famílias e nações. Acreditaram alguns em promessas vãs, outros em teorias falaciosas, outros, ainda, em perspectivas de liberdade sem obrigações. E raças, agrupamentos e criaturas, identificando a ilusão, atritam-se, mutuamente, procurando a paternidade das culpas. [...] No turbilhão de lutas, todavia, o amigo do Cristo pode valer-se do tesouro evangélico, em proveito de sua esfera individual. Cumprir a palavra do Mestre em nós é o programa divino. Sem a execução desse plano de salvação, os demais serviços sob nossa res- ponsabilidade constituirão sublimada teologia, raciocínios brilhantes, magnífica literatura, muita admiração e respeito do campo inferior do mundo, mas nunca a realização necessária. Eis o motivo pelo qual é sempre perigoso estacionar, no caminho, a ouvir quem foge à realidade de nossos deveres.12 Fazendo uma reflexão mais apurada, percebemos que não con- seguimos nos furtar de certo constrangimento, de vergonha mesmo, quando deparamos com a interrogação do Mestre: “E por que me chamais Senhor, Senhor, e não fazeis o que eu digo?” Em lamentável indiferença, muitas pessoas esperam pela morte do corpo, a fim de ouvirem as sublimes palavras do Cristo. Não se compreende, porém, o motivo de semelhante propósito. O Mestre permanece vivo em seu Evangelho de amor e luz. É desnecessário aguardar ocasiões solenes para que lhe ouçamos os ensinamentos sublimes e claros. [...] Tais companheiros não sabem ouvir o Mestre divino em seu verbo imortal. Ignoram que o serviço deles é aquele a que foram chamados, por mais humildes lhes pareçam as atividadesa que se ajustam. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 3 89 Na qualidade de político ou de varredor, num palácio ou numa chou- pana, o homem da Terra pode fazer o que lhe ensinou Jesus. É por isso que a oportuna pergunta do Senhor deveria gravar-se de maneira indelével em todos os templos, para que os discípulos, em lhe pronunciando o nome, nunca se esqueçam de atender, sinceramente, às recomendações do seu verbo sublime.9 » Qualquer que vem a mim, e ouve as minhas palavras, e as observa, eu vos mostrarei a quem é semelhante. É semelhante ao homem que edificou uma casa, e cavou, e abriu bem fundo, e pôs os alicerces sobre rocha; e, vindo a enchente, bateu com ímpeto a corrente naquela casa e não a pôde abalar, porque estava fundada sobre rocha. Mas o que ouve e não pratica é semelhante ao homem que edificou uma casa sobre terra, sem alicerces, na qual bateu com ímpeto a corrente, e logo caiu; e foi grande a ruína daquela casa (Lc 6:47-49). Observar os ensinamentos de Jesus (“as palavras”) significa ad- quirir força moral necessária, a que impulsiona a evolução espiritual do ser, que o protege quando se encontra sob o peso das provações. “Com o espírito fortificado pelo conhecimento que possuímos das leis divinas, facilmente triunfaremos das vicissitudes terrenas e edifi- caremos nossas vidas em bases sólidas, que não poderão ser abaladas pelas ilusões da Terra.”5 É interessante verificar que o Mestre destaca, entre todos os discípu- los, aquele que lhe ouve os ensinamentos e os pratica. Daí se conclui que os homens de fé não são aqueles apenas palavrosos e entusiastas, mas os que são portadores igualmente da atenção e da boa vontade, perante as lições de Jesus, examinando-lhes o conteúdo espiritual para o trabalho de aplicação no esforço diário.11 A pessoa que ouve e coloca em prática a mensagem cristã revela- -se como sábia, prudente. Orientando-se pelo Evangelho, o Espírito se coloca acima das coisas transitórias, comuns da vida no plano físico, porque segue o roteiro moral seguro de combate às imperfeições que ainda possui. Nisso se resume a “edificação da casa sobre a rocha”. Um dos principais pontos onde poderemos fracassar é a não observân- cia das lições do Evangelho, com conhecimento de causa. Uma vez que estudamos as leis divinas, temos obrigação de viver de acordo com elas. O Evangelho não é um repositório de máximas para o uso dos outros apenas, mas, principalmente, para nosso próprio uso. Os que pregam e ensinam e, todavia, não vivem em harmonia com o que ensinam e pregam, estão construindo a casa sobre a areia [ou terra].[...] Outros que também fracassam são aqueles que não possuem a força moral suficiente EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 3 90 para seguirem a orientação espiritual que pediram e receberam, mas que não veio consoante seus desejos. [...] Finalizando, podemos dizer que também constroem sobre a areia aqueles que não aceitam resignadamen- te as provas e as expiações que lhes couberam; e os que usam dos bens que o Senhor lhes confiou, unicamente para a satisfação do seu egoísmo.6 Cristo simbolizou a edificação do caráter humano por meio de uma casa assentada sobre a rocha, uma casa de base sólida, contra a qual as tormentas e as tempestades da vida são incapazes de destruir ou abalar. Essa lição é muito atual, pois vivemos uma época difícil, em que os valores morais são questionados. Nesse sentido, toda prudência é pouca, a fim de que, inadvertidamente, venhamos a construir nossa casa sobre a areia, fácil de ruir e, em consequência, provocar grandes sofrimentos ou ruínas a nós próprios e ao próximo. Não se pode esquecer, também, que toda edificação de valores espirituais eternos deve erguer-se, no dia a dia, pedra a pedra, tijolo a tijolo, unidos com o cimento da atenção, da vigilância e da perseverança. A contrução do caráter, ou a sua melhoria, não deve restringir-se às boas intenções, mas ao esforço disciplinado de combate às imper- feições e às más inclinações. A frase evangélica: “Qualquer um que vem a mim, e ouve as minhas palavras, e as observa [...]’’ está dirigida a quem ouve com aten- ção, que se esforça em entender ou assimilar a lição para, em seguida, colocá-la em prática. A vontade de se transformar em pessoa de bem é o primeiro passo, em continuidade, é necessário vivenciar esse propósito. Os que vivem na certeza das promessas divinas são os que guardam a fé no poder relativo que lhes foi confiado e, aumentando-o pelo próprio esforço, prosseguem nas edificações definitivas, com vistas à eternidade. Os que, no entanto, permanecem desalentados quanto às suas possibi- lidades, esperando em promessas humanas, dão a ideia de fragmentos de cortiça, sem finalidade própria, ao sabor das águas, sem roteiro e sem ancoradouro. [...] Na esfera de cada criatura, Deus pode tudo; não dispensa, porém, a cooperação, a vontade e a confiança do filho para realizar.[...]10 Sem dúvida, a exemplificação dos ensinos do Mestre tem sido o maior desafio enfrentado pelo cristão. “Edificar a casa de modo seguro e adequado é a meta do progresso espiritual. Para que tal solidez seja EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 3 91 alcançada, necessitamos de componentes selecionados, de disposição para o trabalho, perseverança e projeto bem definido.”4 As chuvas, ventos, enchentes e correntes de água, citados no tex- to de Mateus e no de Lucas, representam as dificuldades, as intempéries que assolam a existência humana, sobretudo quando o indivíduo se dispõe a melhorar. São as provações e os desafios da vida. Devemos considerar, porém, que há Espíritos que diante do ensino de Jesus deixam-se conduzir por uma torrente de entusiasmo contraproducente. São criaturas boas, mas precipitadas. Querem trans- formar-se de um dia para o outro, sem dispensar os devidos cuidados exigidos no processo de edificação moral: estudo, exemplos, esforço, experiência. Sabemos que são poucas as pessoas que conseguem, por esforço hercúleo, mudarem rapidamente de posição evolutiva, num reduzido espaço de tempo. Na verdade, não devemos ser excessivamente morosos nas nossas conquistas espirituais, nem imprudentes. Tal situação nos faz lembrar esta outra citação do Evangelho: “Pois qual de vós, querendo edificar uma torre, não se assenta primeiro a fazer as contas dos gastos, para ver se tem com que a acabar? Para que não aconteça que, depois de haver posto os alicerces e não a podendo acabar, todos os que a virem comecem a escarnecer dele, dizendo: Este homem começou a edificar e não pôde acabar” (Lc 14:28-30). O Espírito Emmanuel se pronuncia a respeito do assunto. Constitui objeto de observação singular as circunstâncias do Mestre se referir, à essa altura dos ensinamentos evangélicos, à uma torre, quando deseja simbolizar o esforço de elevação espiritual por parte da criatura. A torre e a casa são construções muito diversas entre si. A primeira é fortaleza, a segunda é habitação. A casa proporciona aconchego, a torre dilata a visão. Um homem de bem, integrado no conhecimento espiritual e praticando-lhe os princípios sagrados está em sua casa, edificando a torre divina da iluminação, ao mesmo tempo. Em regra vulgar, porém, o que se observa no mundo é o número espontâneo de pessoas que nem cuidaram ainda da construção da casa interior e já falam calorosamente sobre a torre, de que se acham tão distantes. Não é fácil o serviço profundo da elevação espiritual, nem é justo apenas pintar projetos sem intenção séria de edificação própria. É indispensável refletir nas contas, nos dias ásperos de trabalho, de autodisciplina. Para atingir o sublime desiderato, o homem precisará gastar o patrimônio das velhas arbitrariedades e só realizará esses gastos com o despren- dimento sincero da vaidade humana e com excelente disposição para EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 3 92 o trabalho da elevação de si mesmo, a fim de chegar ao término, dig- namente. Queres construir uma torre de luz divina? Éjusto. Mas não comeces o esforço, antes de haver edificado a própria casa íntima.8 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 126. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 18, item 9, p. 330-331. 2. DOUGLAS, J. D. BRUCE, F. F. [et cols]. O novo dicionário da Bíblia. Tradução de João Bentes. 3. ed. rev. São Paulo: Vida Nova, 2006. Item: Palavras hebraicas para Deus: c) ‘adonay, p. 332. 3. _____._____. Item: Nomes básicos: e) Yahweh, p.335. 4. GRUPO ESPÍRITA EMMANUEL. Luz imperecível. Coordenação de Honório Onofre de Abreu. 2. ed. Belo Horizonte: União Espírita Mineira, 1997. Cap. 44 (Edificação), p.138. 5. RIGONATTI, Eliseu. O evangelho dos humildes. 15. ed. São Paulo: Pensamento, 2003. Cap. 7 (Continuação do sermão da montanha), p. 61. 6. _____._____. p. 63. 7. SOCIEDADE BÍBLICA DO BRASIL. Bíblia on-line. Módulo básico expandido. Item: Dicionários bíblicos. Verbete Senhor, encontrado em Mateus, 7:21 e 22. 8. XAVIER, Francisco Cândido. Alma e luz. Pelo Espírito Emmanuel. 3. ed. Araras: IDE, 2000. Cap. 15 (A torre), p.71-73. 9. _____. Caminho, verdade e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 47 (A grande pergunta), p. 109-110. 10. _____._____. Cap. 14 (Em ti mesmo), p. 43-44. 11. _____. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 9 (Homens de fé), p. 33. 12. _____._____. Cap. 165 (Falsos discursos), p. 345-346 Orientações ao monitor Elaborar, previamente, cerca de doze questões relacionadas às principais ideias desenvolvidas neste Roteiro. Em seguida, pedir aos participantes que formem um círculo para a realização de uma discus- são em torno das questões elaboradas. Concluída a discussão, fazer o fechamento do estudo, tendo como referência o que está especificado nos objetivos citados na primeira página. OBSERVAÇÃO: É importante que o tempo seja controlado har- monicamente, de forma que cada participante possa ter oportunidade de emitir a sua opinião do assunto. EADE – LIVRO III | MÓDULO II ENSINOS DIRETOS DE JESUS Roteiro 4 AS MORADAS NA CASA DO PAI Objetivos » Explicar o significado destas palavras de Jesus: “Na casa de meu Pai há muitas moradas.” (João, 14:2.) Ideias principais » A casa do Pai é o universo. As diferentes moradas são os mundos que circulam no espaço infinito.... Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. III, item 2. » Independentemente da diversidade dos mundos essas palavras de Jesus podem referir-se ao estado venturoso ou desgraçado do Espírito na erraticidade [...] Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. III, item 2. » Ao longo do processo evolutivo, o Espírito [...] cresce no conhecimen- to e aprimora-se na virtude, estruturando, pacientemente, no seio do espaço e do tempo, o veículo glorioso com que escalaremos, um dia, os impérios deslumbrantes da beleza imortal. Emmanuel: Roteiro. Cap. 4. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 4 94 Subsídios 1. Texto evangélico Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito, pois vou preparar-vos lugar. E, se eu for e vos preparar lugar, virei outra vez e vos levarei para mim mesmo, para que, onde eu estiver, estejais vós também. Mesmo vós sabeis para onde vou e conheceis o caminho. (João, 14:1-4.) “As moradas da casa do Pai”, expressão cunhada por Jesus, é muito conhecida dos espíritas por representar um dos princípios da Doutrina Espírita. Tal ensinamento evangélico abrange, a rigor, três ordens de ideias. A primeira refere-se à pluralidade dos mundos habitados no Universo. A casa do Pai é o Universo. As diferentes moradas são os mundos que circulam no espaço infinito e oferecem, aos Espíritos que neles encarnam, moradas correspondentes ao adiantamento dos mesmos Espíritos.1 A segunda indica as regiões ou esferas vibracionais existentes no mundo espiritual para onde iremos após a desencarnação. Independente da diversidade dos mundos, essas palavras de Jesus tam- bém podem referirse ao estado venturoso ou desgraçado do Espírito na erraticidade. Conforme se ache este mais ou menos depurado e desprendido dos laços materiais, variarão ao infinito o meio em que ele se encontre, o aspecto das coisas, as sensações que experimente, as percepções que tenha.1 A terceira tem relação com os níveis ou graus evolutivos (“moradas”) de cada Espírito, independentemente do plano de vida em que se situe. Esta é a razão de ser a Humanidade constituída por Espíritos de “[...] diferentes ordens, conforme o grau de perfeição que tenham alcançado”.5 EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 4 95 2. Interpretação do texto evangélico » Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim (Jo 14:1). Tais palavras foram proferidas durante a última ceia de Jesus, antes do seu martírio e crucificação. Fazem parte do conjunto das derradeiras instruções que o Mestre prestou aos discípulos, cuja tônica é despedir-se dos irmãos e irmãs que lhe compartilharam a existência durante os três anos em que pregou o seu Evangelho, e também firmar, mais uma vez, seu amor e compaixão por toda a Humanidade. No discurso de despedida, suas palavras estão saturadas de compaixão por todos os discípulos, do presente e do futuro, que em seu nome deveriam submeter-se aos mais ásperos testemunhos. O inequívoco sentimento de esperança, presente na exortação de Jesus, segundo o registro de João, manifesta-se na forma de um apelo que solicita aos seus seguidores manterem a fé na assistência do Criador supremo e, também, nele, o Messias celestial. A confiança em Deus se torna dinâmica, atuante, renovadora, no momento em que depositamos fé no Cristo, pela aplicação em nossa vida prática dos postulados que nos legou, capazes de nos aproximar da Divindade; consoante a sua afirmativa: “Ninguém vem ao Pai, senão por mim.” (João, 14:6.)8 Os verbos turbar — que significa “causar ou sofrer perturba- ção, desequilíbrio, alteração da ordem”11 — e crer são empregados de forma incisiva, no texto, porque há intenção de atingir diretamente os sentimentos dos ouvintes, não apenas o raciocínio, tendo em vista a necessidade de levantar-lhes o bom ânimo. Refletindo sobre esse ensinamento de Jesus (“Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim”) e trazendo-o para os dias atuais, fazemos nossas as seguintes palavras do Espírito André Luiz: A tempestade espanta. Entretanto, acentuar-nos-á a resistência, se sou- bermos recebê-la. A dor dilacera. Mas aperfeiçoar-nos-á o coração, se buscarmos aproveitá-la. A incompreensão dói. Contudo, oferece-nos excelente oportunidade de compreender. A luta perturba. Todavia, será portadora de incalculáveis benefícios, se lhe aceitarmos o concurso. O desespero destrói. Diante dele, porém, encontramos ensejo de cul- tivar a serenidade. O ódio enegrece. No entanto, descortina bendito horizonte à revelação do amor. A aflição esmaga. Abre-nos, todavia, EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 4 96 as portas da ação consoladora. O choque assombra. Nele, contudo, encontraremos abençoada renovação. A prova tortura. Sem ela, en- tretanto, é impossível a aprendizagem. O obstáculo aborrece. Temos nele, porém, legítimo produtor de elevação e capacidade.13 » Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito, pois vou preparar-vos lugar (Jo 14:2). Do ensino dado pelos Espíritos, resulta que muito diferentes umas das outras são as condições dos mundos, quanto ao grau de adiantamento ou de inferioridade dos seus habitantes. Entre eles há os em que estes últimos são ainda inferiores aos da Terra, física e moralmente; outros, da mesma categoria que o nosso; e outros que lhe são mais ou menos superiores a todos os respeitos. Nos mundos inferiores, a existência é toda material, reinam soberanas as paixões, sendo quase nula a vida moral. À medida que esta se desenvolve, diminuia influência da ma- téria, de tal maneira que, nos mundos mais adiantados, a vida é, por assim dizer, toda espiritual.2 Por força da lei do progresso, à medida que o Espírito completa seu aprendizado num mundo, passa a habitar outro, e assim sucessi- vamente, evoluindo sem cessar. Quando, em um mundo, eles alcançam o grau de adiantamento que esse mundo comporta, passam para outro mais adiantado, e assim por diante, até que cheguem ao estado de puros Espíritos. São outras tantas estações, em cada uma das quais se lhes deparam elementos de progresso apropriados ao adiantamento que já conquistaram.3 Os Espíritos superiores relatam, por meio de médiuns confiáveis, que inúmeros são os mundos habitados no Universo, criados por Deus para atender a diferentes finalidades. Sabemos hoje que moramos na Via Láctea — a galáxia comparável a imensa cidade nos domínios universais. Essa cidade possui mais de duzentos milhões de sóis, transportando consigo planetas, asteróides, cometas, meteoros, aluviões de poeira e toda uma infinidade de tur- bilhões energéticos. Entre esses sóis está o nosso, modestíssimo foco de luz, considerando-se que Sirius, um de seus vizinhos, apresenta brilho quarenta vezes maior. E, acompanhando-o, a nossa Terra, com todo o cortejo de suas orgulhosas nações, tem a importância de uma “casa nos fundos”, visto que, se a Lua é satélite nosso, o Globo que nos EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 4 97 asila é satélite pequenino desse mesmo Sol que nos sustenta.[...] Nesse critério, vamos facilmente encontrar, em todos os círculos cósmicos, os seres vivos da asserção de Kardec, embora a instrumentação do homem não os divise a todos. Eles se desenvolvem através de inima- gináveis graus evolutivos, cabendo-nos reconhecer que, em aludindo à pluralidade dos mundos habitados, não se deverá olvidar a gama infinita das vibrações e os estados múltiplos da matéria. Temos, assim, no Espaço incomensurável, mundos-berços e mundos-experiências, mundos-universidades e mundos-templos, mundos-oficinas e mun- dos-reformatórios, mundos-hospitais e mundos-prisões. 17 A propósito, é oportuno informar sobre um planeta recém-desco- berto, com características semelhantes à Terra. “O achado resultou em algo significativo para o astrônomo francês Xavier Bonfils, da Universidade de Lisboa, e para os seus colegas de estudo que, junto com ele esperam descobrir outros.”12 O planeta recebeu o nome de Gliese 581 c. “As moradas na casa do meu Pai” também se aplica às diferentes dimensões espirituais existentes no além-túmulo, nitidamente carac- terizadas na Série André Luiz. Sabemos que após a desencarnação o Espírito passa pela fase de reintegração no outro plano vibratório, onde dá continuidade a sua existência. Liberto do corpo físico, o seu perispírito revela propriedades e funções próprias que, sob o comando da mente, oferecem condições de adaptação na nova moradia. Na moradia de continuidade para a qual se transfere, encontra, pois, o homem as mesmas leis de gravitação que controlam a Terra, com os dias e as noites marcando a conta do tempo, embora os rigores das estações estejam suprimidos pelos fatores de ambiente que assegu- ram a harmonia da Natureza, estabelecendo clima quase constante e quase uniforme. [...] Plantas e animais domesticados pela inteligência humana, durante milênios, podem ser aí aclimatados e aprimorados, por determinados períodos de existência, ao fim dos quais regressam aos seus núcleos de origem no solo terrestre. [...] Ao longo dessas vas- tíssimas regiões de matéria sutil que circundam o corpo ciclópico do Planeta, com extensas zonas cavitárias, sob linhas que lhes demarcam o início de aproveitamento, qual se observa na crosta da própria Terra, a estender-se da superfície continental até o leito dos oceanos, começam as povoações felizes e menos felizes, tanto quanto as aglomerações infernais de criaturas desencarnadas que, por temerem as formações dos próprios pensamentos, se refugiam nas sombras, receando ou detestando a presença da luz.18 EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 4 98 No mundo espiritual, os Espíritos formam grupos ou famílias de acordo com as mútuas manifestações de simpatia, afeição ou afinidade. 4 Esses grupos se organizam em comunidades, mais ou menos extensas, genericamente denominadas colônias espirituais, que apresentam todas as características de uma sociedade organizada, de acordo com a mo- ralidade e conhecimento dos seus habitantes. Há nessas comunidades níveis ou regiões de sombra e de dor, de ventura e alegria, cuja gradação evolutiva forma uma escala que se desdobra ao infinito, conforme o progresso alcançado pelos Espíritos que aí vivem. Antes mesmo da Codificação do Espiritismo, o vidente sueco Emmanuel Swedenborg nos informava que “[...] o outro mundo, para onde vamos após a morte, consiste de várias esferas, representando outros tantos graus de luminosidade e de felicidade; cada um de nós irá para aquela a que se adapta a nossa condição espiritual”.7 As “muitas moradas da casa do Pai” estão relacionadas, igualmente, aos degraus evolutivos que caracterizam a longa caminhada ascensional do Espírito, iniciada quando ele foi criado por Deus, ainda no estágio de “simples e ignorante” até o nível de Espírito puro, ou angélico. Recebemos, assim, inúmeras concessões do Criador, em razão da sua misericórdia, necessárias ao nosso aprimoramento espiritual. Tudo isso indica que o “[...] Pai forneceu ao filho homem a casa planetária, onde cada objeto se encontra em lugar próprio, aguardando somente o esforço digno e a palavra de ordem, para ensinar à criatura a arte de servir”.16 As moradas podem também ser representadas por planos, que se expressam por vibrações e não propriamente por lugar. Assim sendo, consoante o estado ou a província mental em que situamos as ações e as aspirações interiores, é que moldaremos o ambiente ou a “morada” evolutiva a que nos ligaremos no plano exterior. Sob este prisma a “Casa do Pai” é o íntimo de cada qual, e as “moradas”, os estados de alma que alimentamos consoante os nossos desejos e aspirações pessoais.9 De posse dessas informações, compreendemos a extensão que o símbolo “Casa do Pai” representa: os diferentes mundos do Universo, as moradias do plano espiritual ou níveis de progresso moral-intelectual. Dessa forma, entendemos que tudo “[...] é belo, tudo é grande, tudo é santo na casa de Deus”.3 » E, se eu for e vos preparar lugar, virei outra vez e vos levarei para mim mesmo, para que, onde eu estiver, estejais vós também. Mesmo vós sabeis para onde vou e conheceis o caminho (Jo 14:3-4). EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 4 99 Identificamos nesse texto mais uma promessa do Cristo, entre tantas com que nos abençoou a existência. “Preparar o lugar” revela a diligência do seu amor, a assistência contínua, manifestada diretamente por Ele ou pelos seus mensageiros celestiais. De acordo com o inte- resse, disposição e esforço dos aprendizes são organizados caminhos e planos de trabalho. Na categoria de nosso Guia e Orientador maior, Jesus segue à frente, oferecendo meios e recursos para que se concretize a nossa melhoria espiritual, de sorte que, quando estivermos livres das imper- feições, estaremos definitivamente unidos ao seu coração. Assim, as frases: “se eu for e vos preparar o lugar”; “virei outra vez”; “vos levarei para mim mesmo” e “onde eu estiver, estejais vós também” indicam as felizes possibilidades que nos reservam o futuro, junto ao Cristo, na situação de Espíritos redimidos. “Então, nossos sentimentos, pensamentos, palavras e ações serão semelhantes aos dele, na consolidação da sábia afirmativa contida no Evangelho: “Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós...” (Jo 17:21).”10 A afirmativa: “Para onde eu estiver estejais vós também” indica perfeita sintonia do discípulo com o Mestre. Trata-se do cumprimento do ideal de ser feliz, nossa herançaancestral, a qual deve ser perseguida intensamente ao longo dos tempos. Destacamos, ainda, os dois mo- dos de conjugação do verbo estar (“estiver” e “estejais”), presentes na frase ora citada. Refletem, na verdade, o instante em que o discípulo se integra, definitivamente, ao Evangelho de Jesus. Nesse momento, acontece entre Jesus e o seu fiel servidor um nível de compreensão mútua, indicativa de que a criatura alcançou o estágio de Espírito puro. Toda essa caminhada, contudo, só acontece após um árduo trabalho de ascensão. Sabia o Mestre que, até à construção do Reino divino na Terra, quantos o acompanhassem viveriam na condição de desajustados, trabalhando no progresso de todas as criaturas, todavia, “sem lugar” adequado aos sublimes ideais que entesouram. Efetivamente, o cristão leal, em toda parte, raramente recebe o respeito que lhe é devido: Por destoar, quase sempre, da coletividade, ainda não completamente cristianizada, sofre a descaridosa opinião de muitos. [...] Reconhecendo que o domicílio de seus seguidores não se ergue sobre o chão do mundo, prometeu Jesus que lhes prepararia lugar na vida mais alta.15 EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 4 100 O versículo 4 do registro de João contém essa afirmativa: “Mesmo vós sabeis para onde vou e conhecereis o caminho”. A palavra “caminho” é de ocorrência comum nos registros do Evangelho, cuja ideia tem origem no fato de alguém seguir uma estrada pública onde se tornava conhecido pelos desejos e alvo que pretendia alcançar. Como metáfora religiosa, expressa a vontade e os propósitos de Deus para cada pessoa. No Novo Testamento, porém, há três significados específicos:6 “Caminho” como sinônimo de igreja cristã primitiva: Mas, como alguns deles se endurecessem e não obedecessem, falando mal do Caminho perante a multidão, retirou-se deles e separou os discípulos [...]. Naquele mesmo tempo, houve um não pequeno alvoroço acerca do Caminho. (Atos dos Apóstolos, 19:9 e 23.) “Caminho” no sentido de rota, meio ou via da salvação: E porque estreita é a porta, e apertado, o caminho que leva à vida, e poucos há que a encontrem. (Mateus, 7:14.) “Caminho” aplicado ao Cristo, referido a si mesmo, como meio de o Espírito chegar a Deus: Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida. Ninguém vem ao Pai senão por mim. (João, 14:6.) Obviamente, a orientação de Jesus, sob análise (“mesmo vós sabeis para onde vou e conhecereis o caminho”), abrange os dois últimos conceitos: Jesus é o caminho da salvação, e, por Ele, iremos ao Pai e Criador. Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 126. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 3, item 2, p. 76. 2. _____._____. Item 3, p. 76-77. 3. _____._____. Item 5, p. 77. 4. _____._____. Cap. 4, item 18, p. 98. 5. _____. O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 89. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Questão 96, p.105. 6. DOUGLAS, J. D. BRUCE, F. F [et cols]. O novo dicionário da Bíblia. Tradução de João Bentes. 3.ed. rev. São Paulo: Vida Nova, 2006. Item: caminho, p. 189. 7. DOYLE, Arthur Conan. História do espiritismo. A História de Swedenborg. Tradução de Júlio Abreu Filho. São Paulo: Pensamento, 1960, p. 38. 8. GRUPO ESPÍRITA EMMANUEL. Luz imperecível. Coordenação de Honório Onofre de Abreu. 2. ed. Belo Horizonte: União Espírita Mineira, 1997. Cap. 206 (Crescimento da fé), p. 553. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 4 101 9. _____._____. Cap. 207 (Moradas), p. 555. 10. _____._____. Cap. 208 (Transformação), p. 558. 11. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 2787. 12. SILVA, Davilson. Planeta parecido com a Terra é descoberto. In: Reformador. Rio de Janeiro, FEB, setembro de 2007. Ano 25, no. 2141, p. 345. 13. XAVIER, Francisco Cândido. Agenda cristã. Pelo Espírito André Luiz. 43. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. Cap. 13 (Realmente), p. 49-51. 14. _____. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 35. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 11, (Glorifiquemos), p. 38. 15. _____._____. Cap. 44, (Tenhamos fé), p.107-108. 16. _____. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 4 (Antes de servir), p. 23-24. 17. _____. Religião dos espíritos. Pelo Espírito Emmanuel. 19. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. Pluralidade dos mundos habitados, p. 219-220. 18. XAVIER, Francisco Cândido; VIEIRA, Waldo. Evolução em dois mundos. Pelo Espírito André Luiz. 24. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 13 (Alma e fluidos), item: Vida na espiritualidade, p.120-122. Orientações ao monitor Fazer explanação do assunto por meio de uma exposição dialo- gada, mas que permita a efetiva participação da turma, dirigindo aos participantes, sempre que possível, questões instigantes, pertinentes ao tema. Utilizar imagens como forma de ilustrar e dinamizar o estudo. EADE – LIVRO III | MÓDULO II ENSINOS DIRETOS DE JESUS Roteiro 5 IMPOSITIVO DA RENOVAÇÃO Objetivos » Explicar, à luz da Doutrina Espírita, o significado deste ensinamento de Jesus: “Ninguém deita remendo de pano novo em veste velha. [...] Nem se deita vinho novo em odres velhos”. (Mateus, 9:16-17.) Ideias principais » As ideias materialistas assim como a interpretação literal do Evangelho, representam o remendo novo em veste velha ou o vinho novo em odres velhos, que podem conduzir o ser humano a uma existência desoladora, sem expectativa de mudanças para melhor. Neste aspecto, a Humanidade se defronta com uma ciência arrogante, uma [...] filo- sofia e religião nebulosa, impalpáveis, dubitativas quando não ferozes e dogmáticas; o resultado aí temos nesta ebulição de ódios, de lutas e reivindicações, que dão ao nosso mundo na hora atual o aspecto de campo de batalhas sem prólogos nem epílogos. Editorial de Reformador, setembro de 1927. » Há indivíduos que se aferram à rotina, aos preconceitos sociais, às conveniências mundanas, ou por comodismo ou por orgulho. Quais odres velhos que não suportam vinho novo, tais pessoas são inacessíveis às ideias novas. Eliseu Rigonatti: O evangelho dos humildes. Cap. IX. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 5 104 Subsídios 1. Texto evangélico Ninguém deita remendo de pano novo em veste velha, porque semelhante remendo rompe a veste, e faz-se maior a rotura. Nem se deita vinho novo em odres velhos; aliás, rompem-se os odres, e entorna-se o vinho, e os odres estragam-se; mas deita-se vinho novo em odres novos, e assim ambos se conservam. (Mateus, 9:16-17.) Está implicita nessa mensagem de Jesus uma proposta de reno- vação espiritual, relativa à aquisição de virtudes, base do processo de melhoria do ser humano. “A virtude, no mais alto grau, é o conjunto de todas as qualidades essenciais que constituem o homem de bem. Ser bom, caritativo, laborioso, sóbrio, modesto, são qualidades do homem virtuoso.”2 A superioridade moral caracteriza o homem de bem, elemento da sociedade justa e pacífica do futuro. As principais qualidades do homem de bem são as seguintes: O verdadeiro homem de bem é o que cumpre a lei de justiça, de amor e de caridade, na sua maior pureza. Se ele interroga a consciência sobre seus próprios atos, a si mesmo perguntará se violou essa lei, se não praticou o mal, se fez todo o bem que podia, se desprezou vo- luntariamente alguma ocasião de ser útil, se ninguém tem qualquer queixa dele; enfim, se fez a outrem tudo o que desejara lhe fizessem. Deposita fé em Deus, na sua bondade, na sua justiça e na sua sabe- doria. [...] Tem fé no futuro, razão por que coloca os bens espirituais acima dos bens temporais. [...]Possuído do sentimento de caridade e de amor ao próximo, faz o bem pelo bem, sem esperar paga alguma [...]. Encontra satisfação nos benefícios que espalha, nos serviços que presta, no fazer ditosos os outros, nas lágrimas que enxuga, nas consolações que prodigaliza aos aflitos. [...] O homem de bem é bom, humano e benevolente para com todos, sem distinçãode raças, nem de crenças, porque em todos os homens vê irmãos seus. [...] Em todas as circunstâncias, toma por guia a caridade [...]. Não alimenta ódio, nem rancor, nem desejo de vingança; a exemplo de Jesus, perdoa e esquece as ofensas [...]. É indulgente para as fraquezas alheias [...]. Nunca se compraz em rebuscar os defeitos alheios, nem, ainda, em evidenciá-los. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 5 105 [...] Estuda suas próprias imperfeições e trabalha incessantemente em combatê-las. [...] Não procura dar valor ao seu espírito, nem aos seus talentos, a expensas de outrem [...]. Não se envaidece da sua riqueza, nem de suas vantagens pessoais [...]. Se a ordem social colocou sob o seu mando outros homens, trata-os com bondade e benevolência, porque são seus iguais perante Deus [...]. Finalmente, o homem de bem respeita todos os direitos que aos seus semelhantes dão as leis da Natureza, como quer que sejam respeitados os seus.1 2. Interpretação do texto evangélico » Ninguém deita remendo de pano novo em veste velha, porque semelhante remendo rompe a veste, e faz-se maior a rotura (Mt 9:16). O significado literal desta imagem elaborada por Jesus é de fácil compreensão: é trabalho inglório remendar roupa velha, desgastada pelo tempo de uso, com remendo novo. Tal tentativa ampliará a rotura, isto é, o rasgão ou ruptura. Essa mensagem evangélica reflete profundas advertências para todos que querem afastar-se dos comportamentos infelizes e pre- tendem operar no bem, seguindo os ensinamentos do Cristo. Neste sentido, o Evangelho, para ser integralmente entendido e vivenciado, requer rompimento com os antigos padrões comportamentais, assi- milados ao longo das experiências reencarnatórias, aqui representados pelos símbolos “veste velha” e “odres velhos”, (pronuncia-se “ôdres”). Quem deseja implementar mudanças de comportamento, priorizando a própria melhoria espiritual, deve estar consciente que a transformação precisa ocorrer sob novas bases. É ilusão querer colocar remendo nas imperfeições, maquiando-as, ainda que existam predis- posições favoráveis. Quem age assim, falseia a verdade e se colocará, cedo ou tarde, numa posição constrangedora, quando num momento de descontrole os maus comportamentos assomarem à superfície da personalidade. Faz-se, pois, necessário que se associe à vontade de mudança, uma ação persistente. Há indivíduos que se aferram à rotina, aos preconceitos sociais, às conveniências mundanas, ou por comodismo ou por orgulho. Quais odres velhos que não suportam vinho novo, tais pessoas são inaces- síveis às ideias novas. Com pessoas dessa categoria, o trabalhador de boa vontade do Evangelho e do Espiritismo nada tem a fazer. É deixá-la entregues aos cuidados do Pai Celestial, que por meio das EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 5 106 reencarnações em ambientes diversos, lhes modificará a atitude men- tal, transformando-as em odres novos, aptos a receberem o generoso vinho novo das ideias novas e progressista.5 Providências parciais, ou remendos na própria personalidade, sempre resultam frustrações, desilusões, que acabarão por trair e fazer sofrer o indivíduo quando este se vê frente a frente com a própria rea- lidade. Assim, é importante fazer análise mais apurada destas incisivas exortações de Jesus: “ninguém deita remendo de pano novo em vestido velho”. “Nem se deita vinho novo em odres velhos”. Esta recomendação não se aplica à simples costura de roupas ou à produção de vinhos, menos ainda aos processos de renovação espiritual. Um bom exemplo de transformação definitiva no bem, livre de autopiedade ou autocondescendência, encontra-se em (Marcos, 10:42), que registra a seguinte cura de um cego: Depois, foram para Jericó. E, saindo ele de Jericó com seus discípulos e uma grande multidão, Bartimeu, o cego, filho de Timeu, estava assentado junto ao caminho, mendigando. E, ouvindo que era Jesus de Nazaré, começou a clamar e a dizer: Jesus, Filho de Davi, tem misericórdia de mim! E muitos o repreendiam, para que se calasse; mas ele clamava cada vez mais: Filho de Davi, tem misericórdia de mim! E Jesus, parando, disse que o chamassem; e chamaram o cego, dizendo-lhe: Tem bom ânimo; levanta-te, que ele te chama. E ele, lançando de si a sua capa, levantou-se e foi ter com Jesus. E Jesus, falando, disse-lhe: Que queres que te faça? E o cego lhe disse: Mestre, que eu tenha vista. E Jesus lhe disse: Vai, a tua fé te salvou. E logo viu, e seguiu a Jesus pelo caminho. A citação demonstra, em linhas gerais, o seguinte: Bartimeu não se limitou apenas ao desejo da própria cura, mas fez alarde de forma enfática, no momento em que identificou aquele que o curaria (“E, ouvindo que era Jesus de Nazaré”). Encontrando Jesus, ouviu o que Ele pregava e partiu para a ação: foi em busca da cura (“E ele, lançando de si a sua capa, levantou-se e foi ter com Jesus”). Ao suplicar auxílio de forma insistente foi notado tanto pelos que se sentiram constrangidos com a mudança revelada pelo mendigo, daí repreendê-lo, quanto pelo próprio Cristo que, acalmando-o, fez o cego testemunhar a vontade de curar-se. Por este motivo pergunta ao mendigo: “Que queres que te faça?”. » Nem se deita vinho novo em odres velhos; aliás, rompem-se os odres, e entorna-se o vinho, e os odres estragam-se; mas deita-se vinho novo em odres novos, e assim ambos se conservam (Mt, 9:17). EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 5 107 A análise espírita dos dois versículos, tanto o 16, estudado no item anterior, quanto este, o 17, extrapola o sentido simbólico cla- ramente expresso, pois, obviamente, Jesus estava dando muito mais do que lições de costura ou indicação sobre preferíveis processos de preparação de vinho. O vinho foi amplamente trabalhado por Jesus em suas mensa- gens. Assim, importa considerar que o vinho novo indica fermenta- ção recente da uva, devendo ser colocado em recipientes adequados porque, durante o processo, há produção e expansão de gases que multiplicam o volume do líquido fermentado. Antigamente a fermen- tação e o transporte de vinho eram feitos em recipientes denominados odres, espécie de saco feito de pele de animais. A expansão dos gases, decorrentes da fermentação, exigia que os odres fossem novos para não se romperem. Por outro lado, a fabricação cuidadosa do vinho evita a deterioração provocada por certos micróbios, em geral presentes nos vinhos velhos, quando muito manuseados. Tais vinhos, assim como as vestes velhas, indicam que a Humanidade se defronta com uma ciência materialista, uma filoso- fia obscura que discute os efeitos não as causas dos atos humanos, e, também, uma religião distanciada da vida, dogmática e inacessível.3 O resultado aí temos nesta ebulição de ódios, de lutas e reivindicações, que dão ao nosso mundo na hora atual o aspecto de campo de batalhas sem prólogos nem epílogos. Os sistemas políticos, impotentes para sin- tonizar aspirações e anseios coletivos, oscilam entre anarquia e despotis- mo; as legislações se ressentem do exclusivismo de interesses emergentes e flutuantes, sem balisas de equidade e justiça na consciência das massas. Todas as medidas e alvitres postos em equação, reduntam improfícuos e ruem fragorosamente na prática, porque de fato não têm a vivê-los e justificá-los mais que uma finalidade unilateral, por só decalcadas nas conveniências fortuitas de uma existência falaz e transitória.3 A produção de vinho, de forma correta, indica na mensagem um simbolismo que pode ser assim esclarecido: a maceração da uva é necessária para que surja o substrato ou essência do vinho. Da mesma forma, é preciso que o Espírito se entregue à “maceração” das provas existenciais através dos inevitáveis sacrifícios, afim de que surja a essência do homem de bem, liberto das imperfeições. É necessário que se dê o renascimento do Espírito pela modificação das ideias, e do corpo, sem o que não se verá o Reino de Deus. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 5 108 A estaoperação Paulo chamou “a substituição do homem novo pelo despojamento do homem velho”; e acrescentou: “os que são de Cristo se tornam novas criaturas.”6 Os ensinamentos espíritas além de oferecerem a chave para o entendimento da mensagem cristã, em sua pureza e sentido originais, esclarecem a criatura humana a respeito das consequências dos seus atos impensados e, também, como corrigi-los. O espírita deve estar consciente de que não é suficiente aceitar a doutrina que lhe ensina de onde vem, o que faz aqui e para onde vai. A essa noção precisa ele acrescentar a de uma ética superior, a de uma lei moral absoluta — divina diremos — que legitime as vicissitudes e incertezas da própria vida, de modo a poder harmonizá-la com a dos semelhantes em justificados lances de justiça e liberdade. Assim e só assim ele compreenderá que o benefício próprio está no alheio bene- fício; que a postergação dos direitos de outrem vale pela postergação dos seus direitos e que, se na luta pela vida corpórea e no ambiente psíquico, em suma, a reação é sempre igual à ação, o mesmo se dá para o ambiente espiritual, no plano universal.3 A aceitação do Evangelho de Jesus sem dogmas, sem interpreta- ção literal, representa o vinho novo, livre de impurezas, que é colocado em odres novos, não contaminados, é proposta do Espiritismo, na sua feição de Cristianismo redivivo. Essa mentalidade assim formada poderá, então e só então resistir aos embates e seduções do mundo e, onde quer que no mundo lhe seja dado irradiar influências estas serão benéficas por colimarem prin- cípios e não pessoas, ideias e não interesses efêmeros, visando não já uma família restrita, uma classe, uma sociedade, um povo, mas a Humanidade no que esta tem de mais grandioso e se não afere não por um ciclo de gerações, mas de Eternidade.4 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 126. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 17, item 3, p. 307-309. 2. _____._____. Item 8, p.315. 3. FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA. Reformador. Ano 45, n.° 17, setembro de 1927. Editorial, p. 382. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 5 109 4. _____._____. p. 382-383. 5. RIGONATTI, Eliseu. O evangelho dos humildes. 15. ed. São Paulo: Pensamento, 2003. Cap. IX, item: O jejum, p.77. 6. SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e ensinos de Jesus. 20. ed. Matão: O Clarim, 2000. Item: Odres novos — vinho novo. Odres velhos — panos novos e vestidos velhos, p. 238-239. Orientações ao monitor Dividir a turma em pequenos grupos para o estudo do texto evangélico. Realizar, em seguida, um debate em que se analise os equí- vocos das ideias materialistas e da interpretação literal do Evangelho, tendo como base os ensinamentos espíritas desenvolvidos neste Roteiro. Como atividade extraclasse (veja anexo), escalar três participan- tes para que façam a leitura dos temas a seguir indicados, cuja síntese será apresentada na próxima aula. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 5 110 Anexo ATIVIDADE EXTRACLASSE » Resumo de tema indicado » Apresentação do resumo, em plenário AUTOR OBRA ESPÍRITA E TEMA RESPONSÁVEL XAVIER, Francisco C., pelo Espírito Emmanuel Seara dos médiuns, edi- tora FEB. Cap. 27, Pala- vra, p. 89-91. XAVIER, Francisco C., pelo Espírito Humberto de Campos Reportagens de além-tú- mulo, editora FEB. Cap. 34 (A conselheira invigilante), p. 239-244. VINÍCIUS (Pedro Camargo) Nas pegadas do mestre, editora FEB. Cap. A pala- vra da vida, p. 84-85. EADE – LIVRO III | MÓDULO II ENSINOS DIRETOS DE JESUS Roteiro 6 PALAVRAS DE VIDA ETERNA Objetivos » Esclarecer por que os ensinamentos de Jesus são “palavras de vida eterna”. » Refletir sobre o efeito da palavra nos relacionamentos sociais. Ideias principais » As palavras do Cristo são de vida eterna porque consagram [...] a verdade. Constituem não só a salvaguarda da vida celeste, mas também o penhor da paz, da tranquilidade e da estabilidade nas coisas da vida terrestre. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. XVIII, item 9. » A palavra vibra no alicerce de todos os males e de todos os bens do mundo. Falando, o professor alça a mente dos aprendizes às culminâncias da educação, e, falando, o malfeitor arroja os companheiros para o fojo do crime. Sócrates falou e a visão filosófica foi alterada. Jesus falou e o Evangelho surgiu. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 6 112 O verbo é plasma da inteligência, fio da inspiração, óleo do trabalho e base da escritura. Emmanuel: Seara dos médiuns. Cap. 27, Palavra. Subsídios 1. Texto evangélico Desde então, muitos dos seus discípulos tornaram para trás e já não andavam com Ele. Então, disse Jesus aos doze: Quereis vós também retirar-vos? Respondeu-lhe, pois, Simão Pedro: Senhor, para quem iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna, e nós temos crido e conhecido que tu és o Cristo, o Filho de Deus. (João, 6:66-69.) As palavras do Cristo são de vida eterna porque são verdadeiras. Atendem às necessidades e aos anseios de todos, os felizes e os infelizes, que viveram, vivem e viverão ao longo das eras. “Será eterno o seu código de moral, porque consagra as condições do bem que conduz o homem ao seu destino eterno.”2 É importante ficarmos atentos às palavras da vida eterna, tão úteis quanto necessárias ao nosso aprimoramento moral. Neste aspecto, aconselha Emmanuel: Rodeiam-te as palavras, em todas as fases da luta e em todos os ângulos do caminho. Frases respeitáveis que se referem aos teus deveres. Verbo amigo trazido por dedicações que te reanimam e consolam. Opiniões acerca de assuntos que te não dizem respeito. Sugestões de variadas origens. Preleções valiosas. Discursos vazios que os teus ouvidos lançam ao vento. Palavras faladas... palavras escritas... [...] “Palavras, palavras, palavras...” Esquece aquelas que te incitam à inutilidade, aproveita quantas te mostram as obrigações justas e te ensinam a engrandecer a existência, mas não olvides as frases que te acordam para a luz e para o bem; elas podem penetrar o nosso coração, através de um amigo, de uma carta, de uma página ou de um livro, mas, no fundo, procedem sempre de Jesus, o divino Amigo das criaturas. Re- tém contigo as palavras da vida eterna, porque são as santificadoras do espírito, na experiência de cada dia, e, sobretudo, o nosso seguro apoio mental nas horas difíceis das grandes renovações.5 EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 6 113 2. Interpretação do texto evangélico » Desde então, muitos dos seus discípulos tornaram para trás e já não andavam com Ele (Jo 6:66). Durante a sua missão, o Cristo enfrentou muitos obstáculos, sendo duramente criticado e perseguido, sobretudo por representan- tes do clero. Nunca se abateu ou se revelou desiludido. Entretanto, abençoou e perdoou a todos, sem restrições. A linguagem do Cristo sempre se afigurou a muitos aprendizes indecifrável e estranha. [...] Muita gente escuta a Boa-Nova, mas não lhe penetra os ensinamentos. Isso ocorre a muitos seguidores do Evangelho, porque se utilizam da força mental em outros setores. Creem vagamente no socorro celeste, nas horas de amargura, mos- trando, porém, absoluto desinteresse ante o estudo e ante a aplicação das leis divinas. A preocupação da posse lhes absorve a existência.4 Como acontecia a alguns discípulos, à época do Cristo, nem sempre revelamos disposição para renunciar às infindáveis requisições do mundo e seguir Jesus. O apego a bens e a posições ainda exerce poderoso efeito sobre o nosso Espírito. A propósito, elucida o Espírito Lacordaire: “O amor aos bens terrenos constitui um dos mais fortes óbices ao vosso adiantamento moral e espiritual. Pelo apego à posse de tais bens, destruís as vossas faculdades de amar, com as aplicardes todas às coisas materiais”.1 A natureza humana se revela contraditória quando, frente a frente com o conhecimento verdadeiro, o qual eleva e engrandece o Espírito, deixa-se consumir por dúvidas, enredando-se nasmalhas de conflitos existenciais. De um lado fica evidente o desejo de seguir o bem, de envolver-se com ele, mas, em razão da escassez de fortaleza moral, a pessoa não consegue pôr em prática os ditames da vontade. Esta é causa da maioria dos processos de fuga, os que pro- duzem recuos perante os desafios da vida. As pessoas ficam, então, desorientadas e se deixam levar por temores infrutíferos, agindo da forma assinalada pelo registro do apóstolo João: “e tornam para trás”. Outros indivíduos são até corajosos, mas preferem manter-se no nível do conhecimento teórico, sem maiores implicações ou compromissos com a mudança de comportamento. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 6 114 Faz-se necessário perseverar no desenvolvimento do senso moral a fim de que o desejo de melhoria espiritual se transforme em ações efe- tivas, porque, neste contexto, o conhecimento nem sempre é suficiente. “Já não andavam com Ele” retrata, em alguns Espíritos, o efeito do entusiasmo passageiro, das decisões apressadas, não filtradas pelo bom senso, e que é o oposto da fé raciocinada. Não andar com Jesus significa também abandonar o trabalho digno, forjado na luta redentora. Vemos, assim, que no cotidiano somos sempre defrontados com desafios que nos apontam para o valor de aprimorar a capacidade de andar com o Cristo, até para demonstrar a nossa fidelidade ao Pai celestial. Na causa de Deus, a fidelidade deve ser uma das primeiras virtudes. Onde o filho e o pai que não desejam estabelecer, como ideal de união, a confiança integral e recíproca? Nós não podemos duvidar da fidelidade do nosso Pai para conosco. Sua dedicação nos cerca os Espíritos, desde o primeiro dia. Ainda não o conhecíamos e já Ele nos amava. E, acaso, poderemos desdenhar a possibilidade da retribuição? Não seria repudiarmos o título de filhos amorosos, o fato de nos dei- xarmos absorver no afastamento, favorecendo a negação? [...] Tudo na vida tem o preço que lhe corresponde. Se vacilais receosos ante as bênçãos do sacrifício e as alegrias do trabalho, meditai nos tributos que a fidelidade ao mundo exige. O prazer não costuma cobrar do homem um imposto alto e doloroso? Quanto pagarão, em flagelações íntimas, o vaidoso e o avarento? Qual o preço que o mundo reclama ao gozador e ao mentiroso?3 “Andar com Jesus” é, portanto, decisão séria, pessoal, intrans- ferível. Se erguida sobre o alicerce do discernimento, aprendemos a conciliar as expectativas da vida no plano físico com as necessidades de melhoria espiritual. » Quereis vós também retirar-vos? Respondeu-lhe, pois, Simão Pedro: Senhor, para quem iremos nós? (Jo, 6:67-68). Estas palavras de Jesus: “Quereis vós também retirar-vos?” devem ser meditadas com mais profundidade. Elas nos fazem ver que perante as grandes decisões que repercutem em nossa existência, somos convocados a agir como espíritas. A despeito da pergunta ser dirigida aos apóstolos, que possuíam melhor entendimento e maior capacidade de servir, aplica-se a nós, também, já esclarecidos à luz dos princípios espíritas. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 6 115 Independentemente dos desafios que iremos deparar, dos testemunhos ou renúncias que exemplificaremos, não devemos sucumbir ao desespero e fugir aos deveres. Não é por acaso que o Espiritismo está presente na nossa vida. É por esta razão que Jesus afirmou, em outra oportunidade: “E a qualquer que muito for dado, muito se lhe pedirá, e ao que muito se lhe confiou, muito mais se lhe pedirá” (Lc 12:48). Diante do sofrimento, sobretudo, jamais devemos nos afastar do Cristo, mas estreitar mais os laços afetivos com Ele. À medida que o Mestre revelava novas características de sua dou- trina de amor, os seguidores, então numerosos, penetravam mais vastos círculos no domínio da responsabilidade. Muitos deles, em razão disso, receosos do dever que lhes caberia, afastaram-se, discretos, do cenáculo acolhedor de Cafarnaum. O Cristo, entre- tanto, consciente das obrigações de ordem divina, longe de violar os princípios da liberdade, reuniu a pequena assembleia que restava e interrogou aos discípulos: Também vós quereis retirar-vos? Foi nessa circunstância que Pedro emitiu a resposta sábia, para sempre gravada no edifício cristão. Realmente, quem começa o serviço de espiritualidade superior com Jesus jamais sentirá emoções idênticas, a distância dele. [...] Quem comunga efetivamente no banquete da revelação cristã, em tempo algum olvidará o Mestre amoroso que lhe endereçou o convite. Por este motivo, Simão Pedro perguntou com muita propriedade: Senhor, para quem iremos nós?8 Partindo do princípio de que a Doutrina Espírita é o Consolador prometido, o Cristianismo redivivo, não podemos alegar ignorância a respeito dos seus princípios quando as dificuldades da caminhada evolutiva se revelam mais ásperas. Ao contrário, esse é o momento exato para revelarmos a firmeza da nossa fé, sem temer os obstáculos que atracam no porto da nossa existência sob a forma de provações. Armados do escudo da coragem, da perseverança e da confiança ir- restrita no Cristo, sairemos vitoriosos. » Tu tens as palavras da vida eterna, e nós temos crido e conhecido que tu és o Cristo, o Filho de Deus (Jo, 6:68-69). Não podemos esquecer do valor da palavra no processo da comunicação e do relacionamento humano. Ainda que o exemplo EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 6 116 arrasta, a palavra, em si, é neutra. Está sempre sujeita à intenção de quem a pronuncia: harmonizar ou degradar. É força poderosa porque plasma as ideias transmitidas pelo pensamento. A palavra é vigoroso fio da sugestão. É por ela que recolhemos ensi- namento dos grandes orientadores da Humanidade, na tradição oral, mas igualmente com ela recebemos toda espécie de informações no plano evolutivo em que se nos apresenta a luta diária. Por isso mes- mo, se é importante saber como falas, é mais importante saber como ouves, porquanto, segundo ouvimos, nossa frase semeará bálsamo ou veneno, paz ou discórdia, treva ou luz.7 É, pois, medida de prudência jamais descuidar da palavra na nossa conduta, mesmo posicionados como aprendizes do Evangelho. “Se buscamos o Cristo, decerto é necessário refleti-lo. É imprescindí- vel, assim, saibamos agir como se lhe fossemos representantes fiéis, no caminho em que estagiamos.”6 Mais uma vez o venerável apóstolo revela a sua superioridade espiritual, e, igualmente, fé incomparável no Senhor, o Messias, quan- do expressa de forma singela, mas verdadeira: “Tu tens as palavras da vida eterna e nós temos crido e conhecido que tu és o Cristo, o filho de Deus.” Dentre as expressões verbalistas articuladas ou silenciosas, junto das quais a tua mente se desenvolve, encontrarás, porém, as palavras da vida eterna. Guarda teu coração à escuta. Nascem do amor insondável do Cristo, como a água pura do seio imenso da Terra. Muitas vezes te manténs despercebido e não lhes assinalas o aviso, o cântico, a lição e a beleza. Vigia no mundo, isolado de ti mesmo, para que lhes não percas o sabor e a claridade. Exortam-te a considerar a grandeza de Deus e a viver de conformidade com as suas Leis. Referem-se ao Planeta como nosso lar e à Humanidade como a nossa família. Revelam no amor o laço que nos une a todos. Indicam no trabalho o nosso roteiro de evolução e aperfeiçoamento. Descerram os horizontes divinos da vida e ensinam-nos a levantar os olhos para o mais alto e para o mais além.5 As palavras da vida eterna simbolizam o Evangelho de Jesus, legado abençoado que aponta diretrizes seguras que devem nortear o nosso aprendizado na escalada evolutiva. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 6 117 Jesus indicou a estrada e seguiu-a; pregou a fé e viveu-a; induziu discípulos e companheiros à coragem e demonstrou-a em si mesmo; difundiu a lição do amor, entregando-se amorosamente a cada um, expôs a necessidade do sacrifício pessoal e sacrificou-se; exaltou a beleza do verbo dar e deu sem recompensa; engrandeceu a confiançano Pai e foi fiel até o fim.9 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 126. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 16, item 14, p. 299. 2. _____. A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 50. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 17, item 26, p. 432. 3. XAVIER, Francisco Cândido. Boa nova. Pelo Espírito Humberto de Campos (Irmão X). 35. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 6 (Fidelidade a Deus), p. 44-45. 4. _____. Fonte viva. Cap. 48 (Diante do Senhor), p.117. 5. _____._____. Cap. 59 (Palavras da vida eterna), p.147-149. 6. _____. Palavras de vida eterna. Pelo Espírito Emmanuel. 33. ed. Uberaba: Comunhão Espírita Cristã, 2005. Cap. 22 (Na palavra e na ação), p. 57. 7. _____._____. Cap. 52 (Palavra falada), p. 121. 8. _____. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 151 (Ninguém se retira), p.317-318. 9. _____. Reportagens de além-túmulo. Pelo Espírito Humberto de Campos. 10. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004. Cap. 34 (A conselheira invigilante), p. 244. Orientações ao monitor Pedir aos participantes escalados para realizar a atividade extraclasse (veja anexo), solicitada na reunião anterior, que apresentem a síntese da página estudada. Em sequência, fazer breve exposição sobre o texto de João, objeto de estudo deste Roteiro. Após a explana- ção, debater o tema em plenária, fazendo correlações com o resumo apresentado no início da reunião. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 6 118 Anexo ATIVIDADE EXTRACLASSE » Resumo de tema indicado » Apresentação do resumo, em plenário AUTOR OBRA ESPÍRITA E TEMA RESPONSÁVEL XAVIER, Francisco C., pelo Espírito Emmanuel Seara dos médiuns, edi- tora FEB. Cap. 27, Pala- vra, p. 89-91. XAVIER, Francisco C., pelo Espírito Humberto de Campos Reportagens de além- túmulo, editora FEB. Cap. 34 (A conselheira invigi- lante), p. 239-244. VINÍCIUS (Pedro Camargo) Nas pegadas do mestre, editora FEB. Cap. A pala- vra da vida, p. 84-85. EADE – LIVRO III | MÓDULO II ENSINOS DIRETOS DE JESUS Roteiro 7 O MANDAMENTO MAIOR Objetivos » Interpretar, à luz da Doutrina Espírita, O mandamento maior, ensi- nado por Jesus. Ideias principais » Ensinou-nos Jesus: Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu pensamento. Este é o primeiro e grande mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. (Mateus, 22:37-39.) » [...] não se pode verdadeiramente amar a Deus sem amar o próximo, nem amar o próximo sem amar a Deus. Logo, tudo o que se faça contra o próximo o mesmo é que fazê-lo contra Deus. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. XV, item 5. Subsídios 1. Texto evangélico E eis que se levantou um certo doutor da lei, tentando-o e dizendo: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? E ele lhe disse: Que está escrito EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 7 120 na lei? Como lês? E, respondendo ele, disse: Amarás ao Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento e ao teu próximo como a ti mesmo. E disse-lhe: Respondeste bem; faze isso e viverás. Ele, porém, querendo justificar-se a si mesmo, disse a Jesus: E quem é o meu próximo? (Lucas, 10:25-29.) O Cristianismo é uma doutrina que se assenta em dois funda- mentos: amor a Deus e ao próximo. Com um Deus imparcial, soberanamente justo, bom e misericordioso, Ele fez do amor de Deus e da caridade para com o próximo a con- dição indeclinável da salvação, dizendo: Amai a Deus sobre todas as coisas e o vosso próximo como a vós mesmos; nisto estão toda a lei e os profetas; não existe outra lei. Sobre esta crença, assentou o princípio da igualdade dos homens perante Deus e o da fraternidade universal.3 Esses dois mandamentos retratam uma síntese dos Dez Mandamentos, recebidos por Moisés. Amar a Deus sobre todas as coisas é reconhecer que, Ele, é o Pai e Criador de todos os seres e de todas as coisas existentes no Universo. Que devemos adorá-lo em espírito e verdade, não por manifestações de culto externo. Amar o próximo como a si mesmo define as normas de relações humanas, cujo fundamento é a lei de amor. 2. Interpretação do texto evangélico » E eis que se levantou um certo doutor da lei, tentando-o e dizendo: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? (Lc 10:25). Vemos aqui um conhecedor da lei de Moisés procurando o Cristo para testá-lo. Não foram poucos os momentos em que o Mestre foi assediado pelas forças contrárias à sua mensagem, sobretudo porque o Evangelho renovava e ampliava os ensinos da Torá. Jesus, porém, não se afasta e estabelece significativo diálogo com o religioso, apro- veitando a feliz oportunidade de esclarecê-lo. Este versículo registra o encontro da lei antiga com o amor. Vemos, ainda hoje, que as pessoas que mais resistem aos pro- pósitos do bem são os letrados, as autoridades ou sábios do mundo, altamente intelectualizados, mas, quase sempre, são baldos de enten- dimento espiritual. Grande número revela interesse pelo processo de renovação espiritual, mas exigem “sinais do céu” na forma de aconte- cimentos extraordinários. EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 7 121 A pergunta do doutor da lei (“Mestre, que farei para herdar a vida eterna?”) se enquadra nesse contexto, mas também revela intenção de testificar possível contradição doutrinária entre a lei de Moisés e o Cristianismo. Sob certo aspecto, não deixa de ser uma atitude pue- ril, comum nos que se julgam superiores porque possuem titulações acadêmicas ou religiosas. » E ele lhe disse: Que está escrito na lei? Como lês? (Lc 10:26). A sabedoria se revela inequívoca nesta pergunta. Ignorando a armadilha do doutor da lei, inicia o trabalho de atendimento espiritual, pelo diálogo, fazendo o religioso recordar e expressar o que já possuía de bom e verdadeiro. É a habilidade ou a psicologia do amor, que jamais fere nem agride, mas educa. Com a primeira pergunta (“Que está escrito na Lei?”) Jesus faz o interlocutor recordar o ensinamento aprendido. Na outra indagação (“Como lês?”), porém, o Mestre identifica a interpre- tação pessoal do religioso, o nível de entendimento que ele tem sobre o assunto. Agindo dessa forma percebe as carências e necessidades daquele que o interroga, e, a partir deste piso, auxilia-o com proveito. O diálogo que se segue fez o religioso esquecer o teste, inicial- mente proposto, deixando-se mergulhar nas águas profundas das verdades superiores, para onde o Mestre habilmente o conduziu. » E, respondendo ele, disse: Amarás ao Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento e ao teu próximo como a ti mesmo (Lc 10:27). O mandamento maior ensinado por Jesus é constituído de dois preceitos: Amar a Deus e amar ao próximo. Significa dizer “[...] que não se pode verdadeiramente amar a Deus sem amar o próximo, nem amar o próximo sem amar a Deus. Logo, tudo o que se faça contra o próximo o mesmo é que fazê-lo contra Deus”.2 O entendimento espírita de Deus — “[...] a inteligência suprema, causa primária [primeira] de todas as coisas” —,4 dos seus atributos e da Providência divina segue a orientação de Jesus que, ao apresentá-lo como Pai, justo e misericordioso, ensina que não se deve temê-lo, tal como acontecia na orientação moisaica. Entretanto, perguntarás, como amarei a Deus que se encontra longe de mim? Cala, porém, as tuas indagações e recorda que, se os pais e as mães do mundo vibram na experiência dos filhos, se o artista está invisível em suas obras, também Deus permanece em suas criaturas. Lembra que, se deves esperar por Deus onde te encontras, Deus EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 7 122 igualmente espera por ti em todos os ângulos do caminho. Ele é o Todo em que nos movemos e existimos.6 Por este motivo é que a assertiva “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma,e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento” tem caráter direto e incisivo. Reflete, porém, o sentido verdadeiro da lei de adoração, realizada em espírito e verdade, não mais por simples manifestações de culto externo, idólatra e ritualista. Implica, igualmente, profundo entendimento da solicitude do Pai para com todas as criaturas criadas. Esse entendimento abrange o conhecimento de si mesmo. Conhecer implica a pesquisa das causas. A causa primária de tudo o que existe é Deus, o Criador. Conhecer-nos significa a busca de todos os potenciais de nosso ser, compreendendo o uso da razão e a conquista das virtudes, realizando o destino na luta permanente pelo autoaperfeiçoamento. Para bem dirigir esse esforço incessante de cada criatura, o Pai celestial enviou à Humanidade seu Filho, o Mestre por excelência de cada um, o Cristo de Deus, que nos mostra como encontrar “o caminho, a verdade e a vida”.5 Amar a Deus revela, pois, compreensão de que o “[...] amor puro é o reflexo do Criador em todas as criaturas. Brilha em tudo e em tudo palpita na mesma vibração de sabedoria e beleza. É fundamento da vida e justiça de toda a Lei”.9 O segundo preceito, “amar ao próximo como a si mesmo” re- sume a lei de amor, fundamentada na prática da caridade. É a regra áurea da vida. Incontestavelmente, muitos séculos antes da vinda do Cristo já era ensinada no mundo a Regra Áurea, trazida por embaixadores de sua sabedoria e misericórdia. Importa esclarecer, todavia, que semelhante princípio era transmitido com maior ou menor exemplificação de seus expositores. Diziam os gregos: “Não façais ao próximo o que não de- sejais receber dele.” Afirmavam os persas: “Fazei como quereis que se vos faça.” Declaravam os chineses: “O que não desejais para vós, não façais a outrem.” Recomendavam os egípcios: “Deixai passar aquele que fez aos outros o que desejava para si.” Doutrinavam os hebreus: “O que não quiserdes para vós, não desejeis para o próximo.” Insistiam os romanos: “A lei gravada nos corações humanos é amar os membros da sociedade como a si mesmo.”[...] Com o Mestre, todavia, a Regra Áurea é a novidade divina, porque Jesus a ensinou e exemplificou, EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 7 123 não com virtudes parciais, mas em plenitude de trabalho, abnegação e amor, à claridade das praças públicas, revelando-se aos olhos da Humanidade inteira.7 Mas, o que significa amar ao próximo como a si mesmo? “Amar o próximo como a si mesmo: fazer pelos outros o que quere- ríamos que os outros fizessem por nós”, é a expressão mais completa da caridade, porque resume todos os deveres do homem para com o próximo. [...] A prática dessas máximas tende à destruição do egoísmo. Quando as adotarem para regra de conduta e para base de suas insti- tuições, os homens compreenderão a verdadeira fraternidade e farão que entre eles reinem a paz e a justiça. Não mais haverá ódios, nem dissensões, mas, tão somente, união, concórdia e benevolência mútua.1 » E disse-lhe: Respondeste bem; faze isso e viverás (Lc 10:28). Jesus elogia o doutor da lei, o conhecimento que Ele tinha da Torá, mas exorta-o a vivenciá-lo quando afirma: “faze isso, e viverás.” O Mestre demonstra de maneira fraterna que ter conhecimento dos preceitos di- vinos não é suficiente para ganhar a vida eterna. É preciso vivenciá-los. Este deve ser também o nosso esforço cotidiano. “O discípulo de Jesus, porém — aquele homem que já se entediou das substâncias deterioradas da experiência transitória —, pede a luz da sabedoria, a fim de aprender a semear o amor em companhia do Mestre...”10 » Ele, porém, querendo justificar-se a si mesmo, disse a Jesus: E quem é o meu próximo? (Lc 10:29). Esta é, em geral, a posição mental do religioso que desperta do sono das práticas ritualísticas, por julgá-las estéreis e sem sentido, e que se abre para as verdades espirituais. Assim, se nos depararmos com tais companheiros em nosso caminho, devemos exercitar a tole- rância, uma vez que o despertamento espiritual nem sempre se realiza abrupto, mas aos poucos. Vive a tolerância na base de todo o progresso efetivo. As peças de qualquer máquina suportam-se umas às outras para que surja essa ou aquela produção de benefícios determinados.Todas as bênçãos da Natureza constituem larga sequência de manifestações da abençoada virtude que inspira a verdadeira fraternidade. Tolerância, porém, não é conceito de superfície. É reflexo vivo da compreensão que nasce, límpida, na fonte da alma, plasmando a esperança, a paciência e o perdão com esquecimento de todo o mal. Pedir que os outros pensem EADE • Livro III• Módulo II • Roteiro 7 124 com a nossa cabeça seria exigir que o mundo se adaptasse aos nossos caprichos, quando é nossa obrigação adaptar-nos, com dignidade, ao mundo, dentro da firme disposição de ajudá-lo. A Providência divina reflete, em toda parte, a tolerância sábia e ativa. Deus não reclama da semente a produção imediata da espécie a que corresponde. Dá-lhe tempo para germinar, crescer, florir e frutificar. Não solicita do regato improvisada integração com o mar que o espera. Dá-lhe caminhos no solo, ofertando-lhe o tempo necessário à superação da marcha. Assim também, de alma para alma, é imperioso não tenhamos qualquer ati- tude de violência.8 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 126. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 11, item 4, p. 203. 2. _____._____. Cap. 15, item 5, p. 278. 3. _____. A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 51. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 1, item 25, p. 34. 4. _____. O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 89. ed. Rio de Janeiro, 2007. Questão 1, p. 65. 5. SOUZA, Juvanir Borges. Tempo de transição. 3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002. Cap. 7 (O mandamento maior), p. 66. 6. XAVIER, Francisco Cândido. Alma e luz. Pelo Espírito Emmanuel. 3. ed. Araras: IDE, 2000. Cap. 5 (O maior mandamento), p. 33-34. 7. _____. Caminho, verdade e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 41 (A regra áurea), p. 97-98. 8. _____. Pensamento e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 17. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 25 (Tolerância), p. 115-116. 9. _____._____. Cap. 30 (Amor), p. 136. 10. _____. Vinha de luz. Pelo Espírito Emmanuel. 25. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Brilhe vossa luz, p. 14. Orientações ao monitor Interpretar, à luz da Doutrina Espírita, O mandamento maior, ensinado por Jesus. Para tanto, utilizar a técnica da exposição dialo- gada, correlacionando o estudo a situações cotidianas. EADE LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 1 O FILHO PRÓDIGO Objetivos » Explicar a parábola do filho pródigo, à luz do entendimento espírita. Ideias principais » A parábola do filho pródigo, interpretada à luz do entendimento es- pírita, encerra os seguintes ensinamentos básicos: 1.º Imutabilidade de Deus — princípio sustentado, não teoricamente apenas, mas de modo positivo, condizente com os fatos e testemunhos da vida humana. 2.º Unidade do destino, isto é, a redenção completa pelo Amor e pela Dor, abrangendo todos os pecadores. 3.º A lei da causalidade, ou seja, de ação e reação, causas e efeitos, de- terminando, em dado tempo, o despertar das consciências adormecidas. 4.º A relatividade do livre arbítrio, o qual não pode ser absoluto, a ponto de ser dado ao homem alterar os desígnios de Deus. 5.º Finalmente, a evolução individual dos seres racionais e conscientes, de cujo número o homem faz parte, processada no recesso íntimo das almas, livre e espontaneamente, como lei natural e irrevogável. Vinícius (Pedro de Camargo): Na seara do mestre, Cap. Parábola do filho pródigo. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 128 Subsídios 1. Texto evangélico E disse: Um certo homem tinha dois filhos. E o mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a parte da fazenda que me pertence. E ele repartiu poreles a fazenda. E, poucos dias depois, o filho mais novo, ajuntando tudo, partiu para uma terra longínqua e ali desperdiçou a sua fazenda, vivendo dissolutamente. E, havendo ele gastado tudo, houve naquela terra uma grande fome, e começou a padecer necessidades. E foi e chegou-se a um dos cidadãos daquela terra, o qual o mandou para os seus campos a apascentar porcos. E desejava encher o seu estômago com as bolotas [ou alfarrobas] que os porcos comiam, e ninguém lhe dava nada. E, caindo em si, disse: Quantos trabalhadores de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui pereço de fome! Levantar-me-ei, e irei ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e perante ti. Já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus trabalhadores. E, levantandose, foi para seu pai; e, quando ain- da estava longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão, e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço, e o beijou. E o filho lhe disse: Pai, pequei contra o céu e perante ti e já não sou digno de ser chamado teu filho. Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa, e vesti-lho, e ponde-lhe um anel na mão e sandálias nos pés, e trazei o bezerro cevado, e matai-o; e comamos e alegremo-nos, porque este meu filho estava morto e reviveu; tinha-se perdido e foi achado. E começa- ram a alegrar-se. E o seu filho mais velho estava no campo; e, quando veio e chegou perto de casa, ouviu a música e as danças. E, chamando um dos servos, perguntou-lhe que era aquilo. E ele lhe disse: Veio teu irmão; e teu pai matou o bezerro cevado, porque o recebeu são e salvo. Mas ele se indignou e não queria entrar. E, saindo o pai, instava com ele. Mas, respondendo ele, disse ao pai: Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com os meus amigos. Vindo, porém, este teu filho, que desperdiçou a tua fazenda com as meretrizes, mataste-lhe o bezerro cevado. E ele lhe disse: Filho, tu sempre estás comigo, e todas as minhas coisas são tuas. Mas era justo alegrarmo-nos e regozijarmo-nos, porque este teu irmão estava morto e reviveu; tinha-se perdido e foi achado. (Lucas, 15:11-32.) EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 129 O texto destaca a figura de um pai que atende com amor e misericórdia as diferentes necessidades evolutivas dos seus filhos, representados por dois irmãos, um pródigo, outro egoísta. A parábola reflete, igualmente, a utilização do livre-arbítrio, a manifestação da lei de causa e efeito e os fundamentos do processo de evolução do Espírito. “À simples leitura da parábola, percebemos que aquele pai é Deus. Seus dois filhos representam os homens, nós, os pecadores de todos os matizes.”6 Os dois irmãos representam a Humanidade. O Pródigo é a fiel imagem dos pecadores cujas faltas transparecem, ressaltam logo à primeira vista. Semelhantes transviados deixam-se arrastar ao sabor das voluptuosidades, como barcos que vogam à mercê das ondas, sem leme e sem bússola. Sabem que são pecadores, estão cônscios das imperfeições próprias e, comumente, ostentam para os que têm olhos de ver, de permeio com as graves falhas de seus caracteres, apreciáveis virtudes. E assim permanecem, até que o aguilhão da dor os desperte. O filho mais velho, o Egoísta é a perfeita encarnação dos pecadores que se julgam isentos de culpa, protótipos de virtudes, únicos herdeiros das bem-aventuranças eternas, pelo fato de se haverem abstido do mal. São os orgulhosos, os exclusivistas, os sectários que se apartam dos demais para não se contaminarem, como faziam os fariseus. A soberba não lhes permite conceber a unidade do destino.[...] Descreem da rea- bilitação dos culpados. Só podem ver a sociedade sob seus aspectos de camadas diversas, camadas inconfundíveis. Imaginam-se no alto, e os demais em baixo.2 2. Interpretação do texto evangélico » E disse: Um certo homem tinha dois filhos. E o mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a parte da fazenda que me pertence. E ele repartiu por eles a fazenda. E, poucos dias depois, o filho mais novo, ajuntando tudo, partiu para uma terra longínqua e ali desperdiçou a sua fazenda, vivendo dissolutamente. E, havendo ele gastado tudo, houve naquela terra uma grande fome, e começou a padecer necessidades. E foi e chegou-se a um dos cidadãos daquela terra, o qual o mandou para os seus campos a apascentar porcos. E desejava encher o seu estômago com EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 130 as bolotas [ou alfarrobas] que os porcos comiam, e ninguém lhe dava nada (Lc 15:11-16). O filho mais moço, identificado “pródigo”, tinha uma per- sonalidade ativa, mais determinada, enquanto seu irmão revela-se acomodado no contexto em que vivia. Sentindo, porém, necessidade de vivenciar outras experiências, à distância do lar, o caçula da família comunica ao pai este desejo e solicitalhe a parte da herança que lhe cabia. O pai não só lhe atende o pedido, como demonstra compreender ser um acontecimento natural. Divide a herança entre os filhos, de forma justa, não interpondo obstáculo à manifestação do livre-arbítrio dos seus herdeiros. O texto evangélico informa que “o filho mais novo, ajuntando tudo, partiu para uma terra longínqua”, isto é, manteve-se distante da proteção paterna, conduzindo a existência na forma que lhe aprazia, segundo os critérios estabelecidos pela vida material. É por esse motivo que o filho pródigo “[...] é a personificação daquele que se entrega des- vairadamente aos prazeres sensuais, concentrando na gratificação dos sentidos todas as suas aspirações e ideias, consumindo em bastardos apetites as riquezas herdadas do divino progenitor”.6 O desregramento da conduta produziu-lhe grande sofrimento. “[...] Empobrecido e arruinado, faminto e roto, espiritual e material- mente, acaba reconhecendo-se o único culpado de tamanha desven- tura, o único responsável pela crítica situação em que se vê.”6 Arrependendo-se dos erros cometidos, o jovem toma, então, a decisão de retornar à casa paterna. A disposição para se reajustar perante a lei divina é o primeiro sinal de transformação moral que, em geral, atinge os que se transviaram ao longo da caminhada evolutiva. A história desse moço desassisado é a da grande maioria dos homens. Verificamos no transcurso dos acontecimentos passados com ele a manifestação das leis naturais que regem o destino das almas na sua caminhada pela senda intérmina da vida, sob o influxo incoercível da evolução. [...] O desfecho de toda a odisseia dos pecadores que passam pela Terra, é o retorno ao lar paterno. [...] Outro ensinamento de relevância que da mesma ressalta é o que respeita à doutrina da causalidade [lei de causa e efeito], propagada pela Terceira Revelação. A redenção do Pródigo deu-se mediante a influência dessa lei. Ele criou uma série de causas que determinaram uma série de efeitos análogos. Como as causas eram más, os efeitos foram dolorosos. Suportando-os, EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 131 como era natural, e não como castigo ou pena imposta por agente estranho, o moço acabou compreendendo a insensatez que praticara, considerando-se, outrossim, o próprio causador dos sofrimentos e da humilhação que suportava.7 Percorrendo as estradas largas dos interesses humanos, o filho pródigo conheceu a realidade da vida material, subjugando-se aos seus mecanismos e leis, razão pela qual foi colhido pelas frustrações e desilusões, que lhe forneceram lições retificadoras, capazes de reajustá- -lo perante as leis divinas. Nesta situação, esclarece o texto evangélico que o jovem viven- ciou graves problemas, assim especificados: após ter “gastado tudo, houve naquela terra uma grande fome, e começou a padecer neces- sidades. E foi e chegou-se a um dos cidadãos daquela terra, o qual o mandou para os seus campos a apascentar porcos”. Uma análise superficial do texto sugere que o jovem enfrentou sérias privações, todas de ordem material: aniquilou os bens herdados(“ele desperdiçou a sua fazenda”); para sobreviver, precisou trabalhar para um dos cidadãos da terra, como guardador de porcos; passou tanta fome que até desejou ingerir o alimento destinado aos porcos. É óbvio que a parábola oculta ensinamentos transcendentais, sob o véu do símbolo. A herança desperdiçada representa o desprezo pelos valores espirituais que lhes foram concedidos pelo Criador supremo: [...] “a retidão do juízo, a candura do sentimento, a sensi- bilidade da consciência e o discernimento justo do bem e do mal”.1 A “grande fome” que se abateu sobre aquela terra indica o cansaço, a insatisfação, o fastio que os prazeres materiais, cedo ou tarde, produzem no ser. Chega, então, o momento em que a pessoa se revela faminta de bens espirituais, arde-lhe o desejo de ser bom, de melhorar-se. Entretanto, nem sempre o Espírito mostra-se suficientemen- te forte para mudanças extremas. Faz-se necessário passar por um período de ajuste, que lhe conceda as condições apropriadas à verda- deira transformação espiritual. No texto em estudo, esse período está simbolizado no imenso sofrimento que vivenciou como apascentador de porcos. Importa considerar que não foi o trabalho, em si, que lhe causou sofrimento, pois nada há de indigno em cuidar de animais, mas as condições precárias em que se encontrava o Espírito daquele jovem. Sua queda moral foi profunda, destruindo-lhe qualquer vestígio EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 132 de alegria ou prazer de viver, uma vez que, agindo para satisfazer os sentidos, sua existência assemelhava-se à dos animais, que são gover- nados pelo instinto. Subjugado à lei de causa e efeito, colheu o que semeou, guiando-se apenas pelo uso do seu livre-arbítrio. Precisou, todavia, chegar a um doloroso estado de carência espiritual para lembrar-se do Pai, da vida abençoada que tivera, um dia, no lar paterno. Esta foi, porém, a brecha espiritual que lhe per- mitiu reconhecer os erros cometidos, admitir a situação de indigência espiritual em que se encontrava e, arrependido, impor nova diretriz à sua existência. Reconhecemos, neste sentido, que há filhos pródigos de diferentes tipos na Humanidade. Examinando-se a figura do filho pródigo, toda gente idealiza um ho- mem rico, dissipando possibilidades materiais nos festins do mundo. O quadro, todavia, deve ser ampliado, abrangendo as modalidades diferentes. Os filhos pródigos não respiram somente onde se encontra o dinheiro em abundância. Acomodam-se em todos os campos da ati- vidade humana, resvalando de posições diversas. Grandes cientistas da Terra são perdulários da inteligência, destilando venenos intelectuais, indignos das concessões de que foram aquinhoados. Artistas preciosos gastam, por vezes, inutilmente, a imaginação e a sensibilidade, através de aventuras mesquinhas, caindo, afinal, nos desvãos do relaxamento e do crime. Em toda parte, vemos os dissipadores de bens, de saber, de tempo, de saúde, de oportunidades...12 » E, caindo em si, disse: Quantos trabalhadores de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui pereço de fome! Levantar-me-ei, e irei ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e perante ti. Já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus trabalhadores. E, levantando-se, foi para seu pai; e, quando ainda estava longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão, e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço, e o beijou. E o filho lhe disse: Pai, pequei contra o céu e perante ti e já não sou digno de ser chamado teu filho. Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa, e vesti-lho, e pondelhe um anel na mão e sandálias nos pés, e trazei o bezerro cevado, e matai-o; e co- mamos e alegremo-nos, porque este meu filho estava morto e reviveu; tinha-se perdido e foi achado. E começaram a alegrar-se (Lc 15:17-24). O conhecimento espírita nos faz ver, neste texto do Evangelho, o momento preciso em que o Espírito, cansado de sofrer, busca o amor celestial, reconhecendo-lhe a excelsitude. Este momento está EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 133 representado na expressão “cair em si.” É instante de grande valor, pois indica que a criatura humana toma consciência do efetivo estado de evolução espiritual em que se encontra. Este pequeno trecho da parábola do filho pródigo desperta valiosas considerações em torno da vida. Judas sonhou com o domínio po- lítico do Evangelho, interessado na transformação compulsória das criaturas; contudo, quando caiu em si, era demasiado tarde, porque o divino Amigo fora entregue a juizes cruéis.[...] Maria de Magdala pusera a vida íntima nas mãos de gênios perversos, todavia, caindo em si, sob a influência do Cristo, observa o tempo perdido e conquista a mais elevada dignidade espiritual, por intermédio da humildade e da renunciação. Pedro, intimidado ante as ameaças de perseguição e sofrimento, nega o Mestre divino; entretanto, caindo em si, ao se lhe deparar o olhar compassivo de Jesus, chora amargamente e avança, resoluto, para a sua reabilitação no apostolado. Paulo confia-se a desvairada paixão contra o Cristianismo e persegue, furioso, todas as manifestações do Evangelho nascente; no entanto, caindo em si, perante o chamado sublime do Senhor, penitencia-se dos seus erros e converte-se num dos mais brilhantes colaboradores do triunfo cristão. [...] Cai, contudo, em ti mesmo, sob a bênção de Jesus e, transferindo- -te, então, da inércia para o trabalho incessante pela tua redenção, observarás, surpreendido, como a vida é diferente.9 É admirável observar que, a partir do instante em que teve consciência dos seus méritos e deméritos, o filho pródigo aliou o desejo de melhoria à ação, facilmente percebidos neste trecho do Evangelho: “Levantar-me-ei, e irei ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e perante ti. Já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus trabalhadores. E, levantando-se, foi para seu pai”. Quando o filho pródigo deliberou tornar aos braços paternos, resolveu intimamente levantar-se. Sair da cova escura da ociosidade para o campo da ação regeneradora. Erguer-se do chão frio da inércia para o calor do movimento reconstrutivo. Elevar-se do vale da indecisão para a montanha do serviço edificante. Fugir à treva e penetrar a luz. Ausentar-se da posição negativa e absorver-se na reestruturação dos próprios ideais. Levantou-se e partiu no rumo do lar paterno.8 A atitude do pai ao reencontrar o filho não deve passar desper- cebida: “viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão, e, correndo, EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 134 lançou-se-lhe ao pescoço, e o beijou.” A compaixão é o atributo divino que mais nos atinge, em qualquer estágio evolutivo. Reflete a misericór- dia divina. A compaixão demonstra que o Criador supremo não “[...] esperou que o filho se penitenciasse de rojo, não exigiu escusas, não solicitou justificativas e nem impôs condições de qualquer natureza para estender-lhe os braços; apenas aguardou que o filho se levantasse e lhe desejasse o calor do coração”.10 » E o seu filho mais velho estava no campo; e, quando veio e chegou per- to de casa, ouviu a música e as danças. E, chamando um dos servos, perguntou-lhe que era aquilo. E ele lhe disse: Veio teu irmão; e teu pai matou o bezerro cevado, porque o recebeu são e salvo. Mas ele se indignou e não queria entrar. E, saindo o pai, instava com ele. Mas, respondendo ele, disse ao pai: Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com os meus amigos. Vindo, porém, este teu filho, que desperdiçou a tua fazenda com as meretrizes, mataste-lhe o bezerro cevado. E ele lhe disse: Filho, tu sempre estás comigo, e todas as minhas coisas são tuas. Mas era justo alegrarmo-nos e regozijarmo-nos, porque este teu irmão estava morto e reviveu; tinha-se perdido e foi achado (Lc 15:25-32). O filho mais velho ilustra, na história contada por Jesus,o exemplo do egoísmo. A parábola não apresenta somente o filho pródigo. Mais aguçada atenção e encontraremos o filho egoísta. O ensinamento velado do Mestre demonstra dois extremos da ingra- tidão filial. Um reside no esbanjamento; o outro, na avareza. São as duas extremidades que fecham o círculo da incompreensão humana. De maneira geral, os crentes apenas enxergaram o filho que abandonou o lar paterno, a fim de viver nas estroinices do escândalo, tornando-se credor de todas as punições; e raros aprendizes conseguiram fixar o pensamento na conduta condenável do irmão que permanecia sob o teto familiar, não menos passível de repreensão. Observando a generosidade paterna, os sentimentos inferiores que o animam sobem à tona e ei-lo na demonstração de sovinice. Contraria-o a vibração de amor reinante no ambiente doméstico; ale- ga, como autêntico preguiçoso, os anos de serviço em família; invoca, na posição de crente vaidoso, a suposta observância da Lei divina e desrespeita o genitor, incapaz de partilhar-lhe o justo contentamento. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 135 Esse tipo de homem egoísta é muito vulgar nos quadros da vida. Ante o bem-estar e a alegria dos outros, revolta-se e sofre, por meio da secura que o aniquila e do ciúme que o envenena.13 Ora, o amor verdadeiro não se ajusta aos padrões da contabi- lidade tradicional: é espontâneo, natural, não cobra, não exige. No entanto, aquele servidor, aparentemente correto, por estar presente de modo ostensivo na casa do Pai realizando as suas obrigações, revelou- -se egocêntrico e intransigente, mesmo que as explicações concedidas pelo Pai fossem lógicas e ponderadas: “Filho, tu sempre estás comigo, e todas as minhas coisas são tuas. Mas era justo alegrarmo-nos e regozijarmo-nos, porque este teu irmão estava morto e reviveu; tinha- -se perdido e foi achado.” Verificamos, assim, que nem sempre o que permanece na “Casa do Pai”, cumprindo deveres e obrigações está, efetivamente, transfor- mado no bem. Pode revelar-se mesquinho e egoísta, julgando-se único merecedor das atenções e cuidados do Pai. Da mesma forma, nem todo dissoluto — o que prioriza as sensações materiais em detrimento das conquistas espirituais —, é criatura má. Ele pode, inclusive, revelar virtudes que estão abafadas pelo gênero de vida que leva. Essas virtudes irão manifestar-se, no momento apropriado, servindo de recursos para admitir erros cometidos e reajustar condutas. Devemos reconhecer, em suma, que o filho pródigo é sempre alguém que “pecou, sofreu, amou. A dor despertou-lhe os sentimentos, iluminou-lhe a consciên- cia, converteu-o. A humildade, essa virtude que levanta os decaídos e engrandece os pequeninos, exaltou-o, apagando todas as máculas do seu Espírito, então redimido”.4 O mesmo não aconteceu com o outro irmão. Isso nos faz recordar que Jesus, antes mesmo de contar esta parábola, afiançou: “Digo-vos que assim haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento”. (Lucas, 15:7) Dessa forma, a recepção que o pai deu ao filho pródigo traduz-se em lição inesquecível: a alegria do acolhimento ao filho mais jovem, o melhor vestido, o anel e as alparcatas, assim como o banquete, a festa e a música foram concessões que expressam a misericórdia divina, perante as propostas de mudança dos que, sob os fundamentos da humildade, se arrependem. Por outro lado, essa boa receptividade provoca ciúme e inveja no filho mais velho, que ainda não se encontrava livre do ciúme, EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 136 da inveja e do egoísmo, julgando-se o único merecedor dos cuidados e atenção do genitor. Trata-se de uma atitude mesquinha e rancorosa do primogênito, que busca justificá-la por meio da alegação pueril de jamais ter se afastado do lar. O Pródigo, a seu ver, deve ser excluído do lar. [...] O mal do Egoísta é muito mais profundo, está muito mais radicado que o do Pródigo. Este tem qualidades ao lado dos defeitos. Aquele não tem vícios, mas igual- mente não tem virtudes. [...] O Egoísta não esbanja os dons: esconde-os, como o avarento esconde as moedas. Não mata, porém é incapaz de arriscar um fio de cabelo para salvar alguém. Não rouba, mas também não dá. Não jura falso, mas não se abalança ao mais ligeiro incômodo na defesa dum inocente. Seus atos e atitudes são invariavelmente ne- gativos. Tais pecadores acham-se, por isso, mais longe de Deus que os demais, apesar das aparências denunciarem o contrário.3 O egoísta encontra muitas dificuldades para levar avante os propósitos da própria melhoria espiritual, uma vez que raramente considera as necessidades e as virtudes do próximo. O egoísta insula-se de todos pela influência de seus próprios pensa- mentos. É orgulhoso, é sectário. Separa-se dos demais porque se julga perfeito. Jacta-se intimamente em não alimentar vícios, mas nenhuma virtude, além da abstenção do mal, nele se descobre. É um cristalizado: não suporta as consequências dos desvarios, mas não goza dos prazeres da virtude. Sua conversão é mais difícil que a de qualquer outra espécie de pecadores. A presunção oblitera-lhe o entendimento, ofusca-lhe as ideias. Imaginando-se às portas do céu, dista ainda dele um abismo. Supõe-se um iluminado, e não passa de um cego.5 Sendo assim, guardemos este sábio conselho do benfeitor espi- ritual Emmanuel: “Se te sentes ligado à Esfera superior por teus atos e diretrizes, palavras e pensamentos, não te encarceres na vaidade de ser bom. Não te esqueças, em circunstância alguma, de que Deus é Pai de todos, e, se te ajudou para estares com Ele, é para que estejas com Ele, ajudando aos outros.”11 Referências 1. CALLIGARIS, Rodolfo. Parábolas evangélicas. 9. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. A ovelha, a dracma e o filho pródigo, p. 96. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 1 137 2. VINÍCIUS (Pedro de Camargo). Nas pegadas do mestre. 11. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. O pródigo e o egoísta, p. 22-23. 3. _____._____. p. 23. 4. _____._____. Cap. Por que será? p. 24. 5. _____._____. p. 24-25. 6. _____. Na seara do mestre. 9. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2000. Cap. Parábola do filho pró- digo, p. 41. 7. _____._____. p. 41-43. 8. XAVIER, Francisco Cândido. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 35. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 13 (Ergamo-nos), p. 41. 9. _____._____. Cap. 88 (Caindo em si), p. 229-230. 10. _____. Palavras de vida eterna. Pelo Espírito Emmanuel. 33. ed. Uberaba: Comunhão Espírita Cristã, 2005. Cap. 97 (Pai e amigo), p. 211. 11. _____._____. Cap. 98 (Filho e censor), p. 213. 12. _____. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 24 (Filhos pródigos), p. 63-64. 13. _____._____. Cap. 157 (O filho egoísta), p. 329-330. Orientações ao monitor Dividir a turma em grupos para leitura, troca de ideias e elabo- ração de um resumo a respeito dos assuntos desenvolvidos na inter- pretação do texto evangélico. Pedir-lhes, em seguida, que apresentem as conclusões do resumo, em plenário. Citar exemplos — e solicitar outros aos participantes — que ilustrem as características dos dois filhos citados na parábola. EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 2 OS TRABALHADORES DA VINHA Objetivos » Explicar, sob a ótica espírita, a parábola dos trabalhadores da vinha. Ideias principais » [...] os obreiros que chegaram na primeira hora são os profetas, Moisés e todos os iniciadores que marcaram as etapas do progresso, as quais continuaram a ser assinaladas através dos séculos pelos apóstolos, pelos mártires, pelos Pais da Igreja, pelos sábios, pelos filósofos e, finalmente, pelos espíritas. [...] Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. XX, item 3. » A formosa parábola dos servidores envolve conceitos profundos. Em essência, designa o local dos serviços humanos e refere-se ao volume de obrigações que os aprendizes receberam do Mestre divino. » Porenquanto, os homens guardam a ilusão de que o orbe pode ser o tablado de hegemonias raciais ou políticas, mas perceberão em tempo o clamoroso engano, porque todos os filhos da razão, corporificados na crosta da Terra, trazem consigo a tarefa de contribuir para que se efetue um padrão de vida mais elevado no recanto em que agem transitoria- mente. Emmanuel: Pão nosso. Cap. 29. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 2 140 Subsídios 1. Texto evangélico Porque o Reino dos céus é semelhante a um homem, pai de família, que saiu de madrugada a assalariar trabalhadores para a sua vinha. E, ajustando com os trabalhadores a um dinheiro por dia, mandou-os para a sua vinha. E, saindo perto da hora terceira, viu outros que estavam ociosos na praça. E disse lhes: Ide vós também para a vinha, e dar-vos- -ei o que for justo. E eles foram. Saindo outra vez, perto da hora sexta e nona, fez o mesmo. E, saindo perto da hora undécima, encontrou outros que estavam ociosos e perguntou-lhes: Por que estais ociosos todo o dia? Disseram-lhe eles: Porque ninguém nos assalariou. Diz-lhes ele: Ide vós também para a vinha e recebereis o que for justo. E, aproximando-se a noite, diz o senhor da vinha ao seu mordomo: Chama os trabalhadores, e paga-lhes o salário, começando pelos derradeiros até aos primeiros. E, chegando os que tinham ido perto da hora undécima, receberam um dinheiro cada um; vindo, porém, os primeiros, cuidaram que haviam de receber mais; mas, do mesmo modo, receberam um dinheiro cada um. E, recebendo-o, murmuravam contra o pai de família, dizendo: Estes derradeiros trabalharam só uma hora, e tu os igualaste conosco, que suportamos a fadiga e a calma do dia. Mas ele, respondendo, disse a um deles: Amigo, não te faço injustiça; não ajustaste tu comigo um dinheiro? Toma o que é teu e retira-te; eu quero dar a este derradeiro tanto como a ti. Ou não me é lícito fazer o que quiser do que é meu? Ou é mau o teu olho porque eu sou bom? Assim, os derradeiros serão primeiros, e os primeiros, derradeiros, porque muitos são chamados, mas poucos, escolhidos. (Mateus, 20:1-16.) Três ideias básicas são identificadas nessa parábola: o valor do trabalho para o progresso humano, o significado de trabalhador da vinha e o princípio da reencarnação. De maneira geral, tais temas estão desenvolvidos na seguinte mensagem de Henri Heine, ditada em Paris, em 1863: [...] os obreiros que chegaram na primeira hora são os profetas, Moisés e todos os iniciadores que marcaram as etapas do progresso, as quais continuaram a ser assinaladas através dos séculos pelos apóstolos, pelos mártires, pelos Pais da Igreja, pelos sábios, pelos filósofos e, finalmente, EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 2 141 pelos espíritas. Estes, que por último vieram, foram anunciados e predi- tos desde a aurora do advento do Messias e receberão a mesma recom- pensa. [...] Últimos chegados, eles aproveitam dos labores intelectuais dos seus predecessores, porque o homem tem de herdar do homem e porque coletivos são os trabalhos humanos [...]. Aliás, muitos dentre aqueles revivem hoje, ou reviverão amanhã, para terminarem a obra que começaram outrora. Mais de um patriarca, mais de um profeta, mais de um discípulo do Cristo, mais de um propagador da fé cristã se encontram no meio deles, porém, mais esclarecidos, mais adiantados, trabalhando, não já na base, e sim na cumeeira do edifício. Receberão, pois, o salário proporcionado ao valor da obra.2 2. Interpretação do texto evangélico » Porque o Reino dos céus é semelhante a um homem, pai de família, que saiu de madrugada a assalariar trabalhadores para a sua vinha. E, ajustando com os trabalhadores a um dinheiro por dia, mandou-os para a sua vinha (Mt 20:1-2). A expressão “Reino dos céus” é comum no Evangelho, referindo- -se ao estado de plenitude espiritual, que será alcançado de forma ativa, perseverante e corajosa, jamais como concessão ou graça divi- na. Segundo a Doutrina Espírita, o ser humano atingirá esse estado de perfeição por meio do conhecimento e da transformação moral, obtidos nas inúmeras reencarnações e no plano espiritual. O pai de família é Deus; a vinha somos nós, a Humanidade; e o tra- balho, a aquisição das virtudes que devem enobrecer nossas almas. Para realizar esse desiderato, uns precisam de menos tempo, outros de mais, conforme cumpram, bem ou mal, os seus deveres. O premio, entretanto, é um só: a alegria, o gozo espiritual decorrente da própria evolução alcançada.5 A afirmativa, “sair de madrugada a assalariar trabalhadores para a sua vinha”, indica o supremo dinamismo do trabalho no bem, caracterizado por ser diligente e produtivo, não perde tempo e que começa cedo. Como é prioritário o progresso humano, o Senhor tem enviado ao Planeta Espíritos missionários, desde as eras mais remotas. A evolução espiritual é uma meta divina definida desde que ocorreu EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 2 142 o processo de humanização do princípio inteligente, isto é, na “ma- drugada” da vida humana, quando o Espírito era simples e ignorante. A vinha é a própria Humanidade, o grande campo de aprendi- zado que precisa evolver, pelo trabalho-subsistência e pelo trabalho espiritual, firmado nos testemunhos, sacrifícios e doações incessantes que assinalam a via de progresso dos povos e de cada indivíduo. Em outras palavras, “[...] designa o local dos serviços humanos e refere-se ao volume de obrigações que os aprendizes receberam do Mestre divino”.8 O texto evangélico esclarece que o pagamento ajustado dos trabalhadores foi de “um dinheiro por dia”. A gerência divina, sempre atenta e atuante, sabe ajustar o trabalho em nível da conscientização e do entendimento do obreiro. Neste contexto, é possível definir o tipo de compromisso que cada um pode oferecer à vinha, identificado na equação produção versus benefício. Sendo assim, o Pai celestial, o dono da vinha, disponibiliza o serviço ao trabalhador, o local onde este deva atuar e, também, a forma e valor da remuneração. O filho ou trabalha- dor, por outro lado, recebe a oportunidade de progredir, no campo que lhe foi destinado, selecionado em função da experiência que possui. A parábola nos mostra que há um plano diretor, sábio e inteli- gente, que define o processo evolutivo da Humanidade. Nada é feito de improviso ou de forma eventual. Implica estudo, planejamento e estra- tégias seriamente estipulados, a fim de que o sucesso esteja assegurado. O planeta não é um barco desgovernado. As coletividades humanas costumam cair em desordem, mas as leis que presidem aos destinos da Casa Terrestre se expressam com absoluta harmonia. Essa verificação nos ajuda a compreender que a Terra é a vinha de Jesus. Aí, vemo-lo trabalhando desde a aurora dos séculos e aí assistimos à transformação das criaturas, que, de experiência a experiência, se lhe integram no divino amor.8 » E, saindo perto da hora terceira, viu outros que estavam ociosos na praça. E disse-lhes: Ide vós também para a vinha, e dar-vos-ei o que for justo. E eles foram. Saindo outra vez, perto da hora sexta e nona, fez o mesmo. E, saindo perto da hora undécima, encontrou outros que estavam ociosos e perguntou-lhes: Por que estais ociosos todo o dia? Disseram-lhe eles: Porque ninguém nos assalariou. Diz-lhes ele: Ide vós também para a vinha e recebereis o que for justo. E, aproximando-se a noite, diz o EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 2 143 senhor da vinha ao seu mordomo: Chama os trabalhadores, e paga lhes o salário, começando pelos derradeiros até aos primeiros (Mt 20:3-8). As horas de contratação dos trabalhadores equivalem às dife- rentes convocações de Deus, aos seus filhos, para o cultivo de virtudes. “Uns começam mais cedo a cuidar dos seus espíritos para o bem; ou- tros começam mais tarde. E no entanto, para os bons trabalhadores o salário é o mesmo, não importa a hora em que iniciaram o trabalho de se regenerarem.”6 Os trabalhadores da primeira hora são os Espíritosque contam com maior número de encarnações, mas que não souberam aproveitá-las, perdendo oportunidades que lhes foram concedidas para se regene- rarem e progredirem. Os trabalhadores contratados posteriormente simbolizam os Espíritos que foram gerados há menos tempo, mas que, fazendo melhor uso do livre-arbítrio, [...] lograram em apenas algumas existências o progresso que outros tardaram a realizar.5 As oportunidades de melhoria espiritual são diuturnamente oferecidas pelo Criador supremo, através de Jesus. Existe trabalho para todos porque o progresso é Lei divina ou Natural. Entretanto, é importante considerar outras características que fazem parte do processo evolutivo humano, claramente identificadas nesta parábola do trabalhador da vinha. As condições essenciais para os trabalhadores são: a constância, o desinteresse, a boa vontade e o esforço que fazem no trabalho que assumiram. Os bons trabalhadores se distinguem por estes caracterís- ticos. O mercenário trabalha pelo dinheiro; seu único fito, sua única aspiração é receber o salário. [...] Assim é em todas as ramificações dos conhecimentos humanos: há os escravos do dinheiro e há o operário do progresso. Na lavoura, na indústria, como nas Artes e Ciências, destacam-se sempre o operário e o mercenário. O materialismo, a materialidade, a ganância do ouro arranjaram, na época em que nos achamos, mais escravos do que a vinha arranjou mais obreiros. Por isso, grande é a seara e poucos são os trabalhadores!7 Merece destaque o conteúdo do versículo oito, assim especi- ficado: “E, aproximando-se a noite, diz o senhor da Vinha ao seu mordomo: Chama os trabalhadores, e paga-lhes o salário, começando pelos derradeiros até aos primeiros”. Trata-se de uma ordenação divina EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 2 144 referente ao acerto de contas, à aferição de resultados. É momento em que se verifica se ocorreu efetivo progresso ou melhoria espiritual do trabalhador. Essa aferição é de grande valor, tendo em vista os inves- timentos posteriores, os próximos planejamentos reencarnatórios. A expressão, “aproximando-se a noite”, não está relacionada ao término de um dia, que acontece após o declínio do sol. Pode indicar tanto o fi- nal de uma existência física quanto o fechamento de um ciclo evolutivo. » E, chegando os que tinham ido perto da hora undécima, receberam um dinheiro cada um; vindo, porém, os primeiros, cuidaram que haviam de receber mais; mas, do mesmo modo, receberam um dinheiro cada um. E, recebendo-o, murmuravam contra o pai de família, dizendo: Estes derradeiros trabalharam só uma hora, e tu os igualas-te conosco, que suportamos a fadiga e a calma do dia. Mas ele, respondendo, disse a um deles: Amigo, não te faço injustiça; não ajustaste tu comigo um dinheiro? Toma o que é teu e retira-te; eu quero dar a este derradeiro tanto como a ti. Ou não me é lícito fazer o que quiser do que é meu? Ou é mau o teu olho porque eu sou bom? (Mt 20:9-15). Percebe-se que na Vinha, o Senhor não faz “[...] questão da quan- tidade do trabalho, mas sim da qualidade, e ainda mais, da permanência do obreiro até o fim. Os que trabalharam na vinha, desde a manhã até à noite, não mereceram maior salário que os que trabalharam uma única hora, dada a qualidade do trabalho”.7 O pagamento que os trabalhadores recebem é o mesmo para todos os obreiros, independentemente do número de horas que te- nham trabalhado. Cada hora de labor representa uma encarnação ou período de aprendizado. Há Espíritos que consomem muitas reencar- nações para se tornarem criaturas melhores, outros realizam o mesmo processo em poucas existências corporais. Da mesma forma, existem obreiros que despendem muitas horas para realizar uma tarefa que, sendo feita por outros, é executada em breve espaço de tempo. Há operários diligentes, de boa vontade, que, devotando-se de corpo e alma às tarefas que lhe são confiadas, produzem mais e melhor, em menos tempo que o comum, assim como há os mercenários, os que não têm amor ao trabalho, os que se mexem somente quando são vi- giados, os que estão de olhos pegados no relógio, pressurosos de que passe o dia, cuja produção, evidentemente, é muito menor que a dos primeiros. Uma vez, pois que o mérito de cada obreiro seja aferido, não pelas horas de serviço, mas pela produção, que interessa ao dono EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 2 145 do negócio saber se, para dar o mesmo rendimento, um precisa de doze horas, outro de nove, outro de seis, outro de três e outro de uma?4 A reencarnação deve ser vista como a manifestação da justiça divina. É significativa oportunidade para o Espírito reparar o pas- sado de erros, reajustando-se perante a Lei de Deus, e, ao mesmo tempo, ensejo de progresso pelo desenvolvimento dos valores morais e intelectuais. » Assim, os derradeiros serão primeiros, e os primeiros, derradeiros, porque muitos são chamados, mas poucos, escolhidos (Mt 20:16). Os indivíduos escolhidos serão os primeiros no Reino dos céus porque souberam aproveitar, integralmente, os trabalhos na Vinha do Senhor, ao longo das sucessivas reencarnações. Não temeram as lutas nem os desafios impostos pelas provações, sempre agindo como alunos aplicados. Estes são os trabalhadores de última hora. O obreiro da última hora tem direito ao salário, mas é preciso que a sua boa vontade o haja conservado à disposição daquele que o tinha de empregar e que o seu retardamento não seja fruto da preguiça ou da má vontade. Tem ele direito ao salário, porque desde a alvorada esperava com impaciência aquele que por fim o chamaria para o trabalho. Laborioso, apenas lhe faltava o labor.1 A parábola dos trabalhadores da vinha deve calar fundo aos espíritas, em razão do conhecimento que possuem a respeito da realidade espiritual e da necessidade da prática da caridade, base da transformação moral. Neste sentido, é sempre útil lembrar estas re- comendações de o Espírito de Verdade: Aproxima-se o tempo em que se cumprirão as coisas anun- ciadas para a transformação da Humanidade. Ditosos serão os que houverem trabalhado no campo do Senhor, com desinteresse e sem outro móvel, senão a caridade! [...] Ditosos os que hajam dito a seus irmãos: “Trabalhemos juntos e unamos os nossos esforços, a fim de que o Senhor, ao chegar, encontre acabada a obra”, porquanto o Se- nhor lhes dirá: “Vinde a mim, vós que sois bons servidores, vós que soubestes impor silêncio aos vossos ciúmes e às vossas discórdias, a fim de que daí não viesse dano para a obra!” [...] Deus procede, neste momento, ao censo dos seus servidores fiéis e já marcou com o dedo aqueles cujo devotamento é apenas EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 2 146 aparente, a fim de que não usurpem o salário dos servidores animo- sos, pois aos que não recuarem diante de suas tarefas é que ele vai confiar os postos mais difíceis na grande obra da regeneração pelo Espiritismo. Cumprir-se-ão estas palavras: “Os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros no reino dos céus.”3 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 20, item 2, p. 350-351. 2. _____._____. Item 3, p. 352. 3. _____._____. Item 5, p. 356-357. 4. CALLIGARIS, Rodolfo. Parábolas evangélicas. 9. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. Parábola dos trabalhadores e da diversas horas do dia, p. 34. 5. _____._____. p. 35. 6. RIGONATTI, Eliseu. O evangelho dos humildes. 15. ed. São Paulo: Pensamento, 2003. Cap. XX (A parábola dos trabalhadores e das diversas horas do trabalho), p. 181. 7. SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e ensinos de Jesus. 20. ed. Matão: O Clarim, 2004. Item: Parábola dos trabalhadores da vinha, p. 54. 8. XAVIER, Francisco Cândido. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 29. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 29 (A vinha), p. 73. Orientações ao monitor Pedir à turma que faça leitura silenciosa do texto evangélico (Mateus, 20:1-16), assinalando os pontosque considerem mais sig- nificativos. Realizar, em seguida, breve explanação sobre as principais ideias desenvolvidas neste Roteiro, debatendo-as com os integrantes da reunião. Ao final, entregar aos participantes uma cópia da men- sagem “Os obreiros do Senhor”, de autoria de o Espírito de Verdade, constante em O evangelho segundo o espiritismo, capítulo XX, para leitura e correlação com a parábola estudada. EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 3 OS TALENTOS Objetivos » Explicar, à luz da Doutrina Espírita, a parábola dos talentos. Ideias principais » Os talentos são benefícios concedidos por Deus à Humanidade com a finalidade de fazê-la progredir material, intelectual e moralmente. Devem ser utilizados sob a forma de diferentes tipos de trabalhos e esforços que cabe ao homem desenvolver. A atividade que esses mesmos trabalhos impõem lhe amplia e desenvolve a inteligência, e essa inteligên- cia que ele concentra, primeiro, na satisfação das necessidades materiais, o ajudará mais tarde a compreender as grandes verdades morais. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. XVI, item 7. » A parábola trata da distribuição, feita por Deus, de oito talentos entre três servidores. O primeiro servo recebeu cinco concessões divinas, assim representadas: a saúde, a riqueza, a habilidade, o discernimento e a autoridade. O segundo recebeu os talentos da inteligência e do poder. O terceiro servo recebeu um único talento: a dor. Irmão X: Luz acima. Cap. 33. » Os oito talentos podem significar, também, outras manifestações do Pai celestial, concedidas aos três servidores. Ao primeiro transmitiu EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 148 o dinheiro, o poder, o conforto, a habilidade e o prestígio; ao segundo concedeu a inteligência e a autoridade, e ao terceiro entregou o conhe- cimento espírita. Irmão X: Estante da vida. Cap. 4. Subsídios 1. Texto evangélico Porque isto é também como um homem que, partindo para fora da terra, chamou os seus servos, e entregou-lhes os seus bens, e a um deu cinco talentos, e a outro, dois, e a outro, um, a cada um segundo a sua capacidade, e ausentou-se logo para longe. E, tendo ele partido, o que recebera cinco talentos negociou com eles e granjeou outros cinco talentos. Da mesma sorte, o que recebera dois granjeou também outros dois. Mas o que recebera um foi, e cavou na terra, e escondeu o dinheiro do seu senhor. E, muito tempo depois, veio o senhor daqueles servos e ajustou contas com eles. Então, aproximou-se o que recebera cinco talentos e trouxe-lhe outros cinco talentos, dizendo: Senhor, entregaste-me cinco talentos; eis aqui outros cinco talentos que ganhei com eles. E o seu senhor lhe disse: Bem está, servo bom e fiel. Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor. E, chegando também o que tinha recebido dois talentos, disse: Senhor, entregaste-me dois talentos; eis que com eles ganhei outros dois talentos. Disse-lhe o seu senhor: Bem está, bom e fiel servo. Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor. Mas, chegando também o que recebera um talento disse: Senhor, eu conhecia-te, que és um homem duro, que ceifas onde não semeaste e ajuntas onde não espalhaste; e, atemorizado, escondi na terra o teu talento; aqui tens o que é teu. Respondendo, porém, o seu senhor, disse-lhe: Mau e negligente servo; sabes que ceifo onde não semeei e ajunto onde não espalhei; devias, então, ter dado o meu dinheiro aos banqueiros, e, quando eu viesse, receberia o que é meu com os juros. Tirai-lhe, pois, o talento e dai-o ao que tem os dez talentos. Porque a qualquer que tiver será dado, e terá em abundância; mas ao que não tiver, até o que tem ser-lhe-á tirado. Lançai, pois, o servo inútil nas trevas exteriores; ali, haverá pranto e ranger de dentes. (Mateus, 25:14-30.) As principais ideias da parábola podem ser assim resumidas: Está visto que o senhor, aí, é Deus; os servos somos nós, é a Humanidade; os talentos são os bens e recursos que a Providência nos autorga para EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 149 serem empregados em benefício próprio e de nosssos semelhantes; o tempo concedido para a sua movimentação é a existência terrena. A distribuição de talentos em quantidades desiguais, ao contrário do que possa parecer, nada tem de arbitrária nem de injusta: baseia-se na capa- cidade de cada um, adquirida antes da presente encarnação, em outras jornadas evolutivas.1 2. Interpretação do texto evangélico » Porque isto é também como um homem que, partindo para fora da terra, chamou os seus servos, e entregou-lhes os seus bens, e a um deu cinco talentos, e a outro, dois, e a outro, um, a cada um segundo a sua capacidade, e ausentou-se logo para longe. E, tendo ele partido, o que recebera cinco talentos negociou com eles e granjeou outros cinco talen- tos. Da mesma sorte, o que recebera dois granjeou também outros dois. Mas o que recebera um foi, e cavou na terra, e escondeu o dinheiro do seu senhor. (Mt 25:14-18). Por estas palavras, ensina Jesus sobre a confiança depositada por Deus a seus filhos, concedendo-lhes o gerenciamento de bens, de acordo com as possibilidades de cada um. Se te afeiçoas, assim, aos ideais de aprimoramento e progresso, não te afastes do trabalho que renova, do estudo que aperfeiçoa, do perdão que ilumina, do sacrifício que enobrece e da bondade que santifica... Lembra-te que o Senhor nos concede tudo aquilo de que necessitamos para comungar-lhe a glória divina, entretanto, não te esqueças de que as dádivas do Criador se fixam, nos seres da Criação, conforme a capacidade de cada um.10 O texto revela também a bondade divina, sempre plena de mise- ricórdia, que fornece, em cada experiência reencarnatória, as bênçãos necessárias ao reajuste espiritual. Neste sentido, aconselha Emmanuel: “Melhorar para progredir — eis a senha da evolução. [...] Não olvides que os talentos de Deus são iguais para todos, competindo a nós outros a solução do problema alusivo à capacidade de recebê-los.”9 Os servidores que receberam os talentos representam três dife- rentes categorias evolutivas de Espíritos. Os que recebem cinco talentos são Espíritos já mais experimentados, mais vividos, que aqui reencarnam para missões de repercussão social; EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 150 os que recebem dois, são destinados a tarefas mais restritas, de âmbito familiar; os que recebem um, não têm outra responsabilidade senão a de promoverem o progresso espiritual de si mesmos, mediante a aquisição de virtudes que lhes faltam.1 Os servidores incluídos nos dois primeiros grupos corres- ponderam à confiança do Senhor. Demonstraram responsabilidade perante as dádivas recebidas, agindo com diligência, bom senso, trabalho e dedicação, de sorte que conseguiram duplicar os benefícios que lhes foram confiados. O terceiro depositário, entretanto, não seguiu o exemplo dos demais. Portador de personalidade inibida e temerosa, imatura e descompromissada, não soube utilizar, como deveria, a concessão celeste. Representa os homens que usam mal os dons recebidos do Pai Celestial. A maioria das pessoas, no estágio atual de evolução, procede de forma similar, daí a necessidade das inumeráveis reencarnações como processo reeducador. Há milhares de pessoas que efetuam a romagem carnal, amontoando posses exteriores, à gana de ilusória evidência. [...] E imobilizam-se do medo ou do tédio [...], até que a morte lhes reclama a devolução do próprio corpo. Não olvides, assim, a tua condição de usufrutuário do mundo e aprende a conservar no próprio íntimo os valores da Grande Vida. [...] Lembra-te de que amanhã restituirás à vida o que a vida te emprestou, em nome de Deus, e que os tesouros do teu Espírito será apenas aqueles que houveres amealhado em ti próprio, no campo da educação e das boas obras.11 Os talentos simbolizam os infinitos recursos divinos, disponibi- lizados peloCriador supremo em prol do nosso progresso espiritual. O Espírito Irmão X nos apresenta, de forma criativa e inteligente, duas versões da parábola, nos livros Luz acima e Estante da vida, respec- tivamente. Apresentamos, em seguida, as ideias gerais existentes no primeiro livro. Relata o Espírito amigo que os talentos recebidos pelo primeiro servo foram: saúde, riqueza, habilidade, discernimento e autoridade. O Senhor prestou-lhe, também, as seguintes recomendações: “[...] Multiplica-os, aonde fores, em benefício dos meus filhos e teus irmãos que, em situação inferior à tua, avergados ao solo do planeta a que levarás minhas bênçãos, se esforçam mais intensamente”.5 EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 151 Dirigindo-se ao segundo servidor, o Senhor orientou-o, assim: — Transporta contigo estas duas preciosidades, que se destinam ao esclarecimento e auxílio do mundo a que te diriges. São ambas, a in- teligência e o poder. Estende estes patrimônios respeitáveis às minhas construções eternas.5 Ao terceiro, confiou apenas um “talento”, aclarando, cuidadoso: — Apossa-te desta lâmpada sublime e segue. É a dor, o dom celeste da iluminação espiritual. Acende-a em teu campo de trabalho, em favor de ti mesmo e dos semelhantes. Seus raios abrem acesso aos tabernáculos divinos.6 » E, muito tempo depois, veio o senhor daqueles servos e ajustou contas com eles. Então, aproximou-se o que recebera cinco talentos e trouxe- -lhe outros cinco talentos, dizendo: Senhor, entregaste-me cinco talentos; eis aqui outros cinco talentos que ganhei com eles. E o seu senhor lhe disse: Bem está, servo bom e fiel. Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor. E, chegando também o que tinha recebido dois talentos, disse: Senhor, entregaste-me dois talentos; eis que com eles ganhei outros dois talentos. Disse-lhe o seu senhor: Bem está, bom e fiel servo. Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor. Mas, chegando também o que recebera um talento disse: Senhor, eu conhecia-te, que és um homem duro, que ceifas onde não semeaste e ajuntas onde não espalhaste; e, atemoriza- do, escondi na terra o teu talento; aqui tens o que é teu. Respondendo, porém, o seu senhor, disse-lhe: Mau e negligente servo; sabes que ceifo onde não semeei e ajunto onde não espalhei; devias, então, ter dado o meu dinheiro aos banqueiros, e, quando eu viesse, receberia o que é meu com os juros (Mt 25:19-27). “E muito tempo depois”, assinala o período posterior ao aprendizado desenvolvido pelo Espírito. Indica a avaliação do estágio probatório, quando o Pai afere o resultado das provas ou testes que serviram de lições à criatura, no seu processo de ascensão espiritual. O “ajuste de contas” é, pois, uma aferição de valores que cedo ou tarde nos alcança. Não há como fugir dessa avaliação divina. Neste sentido, os planejamentos reencarnatórios têm como base essa aferi- EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 152 ção, ou seja, a análise dos resultados dos trabalhos desenvolvidos pelo Espírito em cada etapa de aprendizado. Segundo a parábola e a interpretação do Espírito Irmão X, o servo que recebera cinco talentos, duplicou-os esclarecendo, feliz, ao Senhor: — Senhor, eis tuas dádivas multiplicadas. Deste-me cinco e restituo- -as em dobro. Respeitando a saúde, adquiri o tempo; espalhando a riqueza, aliciei a gratidão; usando a habilidade, recebi a estima; mo- vimentando o discernimento, conquistei o equilíbrio, e distribuindo a autoridade em teu nome, ganhei a ordem. O teu plano de júbilo e evolução foi executado.7 O que recebera dois talentos também se posiciona jubiloso perante o Pai e explica como se conduziu: —Senhor, recebe teus haveres multiplicados. Elevando a inteligência obtive o trabalho e, submetendo o poder à tua vontade sábia, atraí o progresso. A tua expectativa de instrução e ajuda no meu setor de atividade foi atendida.7 Logo após, acercou-se o terceiro e último servo da expedição e, de- volvendo, intacto, o patrimônio que recebera, notificou: — Senhor, recolhe de volta a indesejável herança que me deste... Sei que és austero e exigente, que colhes o que não semeias e que ordenas por toda parte... Experimentando enorme dificuldade para aguentar a carga que me puseste nos ombros e temendo-te o juízo, escondi-a na terra e reponho-a, agora, em tuas mãos... Esta dádiva é um fardo difícil de carregar... Constituiu-se desagradável recordação por onde passei, estorvou-me os desejos e, de modo algum, desejaria possuí-la, outra vez. É impossível obter lucros ou vantagens com semelhante obstáculo. Retoma, pois, teu estranho e insuportável depósito!...8 Duas atitudes se destacam, de imediato, no comportamento desse servo: a) não assume a responsabilidade pelo próprio fracas- so; b) culpa o Senhor pelos seus insucessos. Em consequência, foi denominado “mau e inconsequente” (Mt 25:26) ou “servo mau e infiel” (Irmão X). O Poderoso contemplou-o, triste, e falou, enérgico: — Servo mau e infiel, como poderias multiplicar minha bênção se nem ao menos te deste ao esforço de examiná-la? Como iluminar o cami- EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 153 nho se mantiveste a lâmpada apagada? Tua ociosidade transformou alguns gramas de serviço benéfico em várias toneladas de angústia que doravante pesarão sobre ti. Criaste fantasmas que nunca existiram, multiplicaste preocupações e receios que te levaram a gritar e esper- near como simples tolo, no avançado círculo de minhas obras... Por fim, atiraste-me o tesouro ao pântano do desespero e da revolta e vens comentar o temor e o zelo que minha presença te infunde, quando foste tão somente preguiçoso e insensato! A dor era a tua oportunidade sagrada e única de iluminação ao próprio caminho, para que a tua claridade amparasse os companheiros de luta regenerativa e salutar. Repeliste o dom que te confiei [...]9 O servidor que enterrou o talento tenta justificar o seu mau procedimento, dizendo-se “atemorizado” (versículo 25). É oportuno refletir sobre esse estado de ânimo, procurando, com paciência e de- terminação, identificar a natureza do sentimento alegado. Emmanuel esclarece com sabedoria, no texto que se segue. Na parábola dos talentos, o servo negligente atribui ao medo a causa do insucesso em que se infelicita. Recebera mais reduzidas possibilidades de ganho. Contara apenas com um talento e temera lutar para valorizá-lo. Quanto aconteceu ao servidor invigilante da narrativa evangélica, há muitas pessoas que se acusam pobres de recursos para transitar no mundo como desejariam. E recolhem-se à ociosidade, alegando o medo da ação. Medo de trabalhar. Medo de servir. Medo de fazer amigos. Medo de desapontar. Medo de sofrer. Medo da incompreensão. Medo da alegria. Medo da dor. E alcançam o fim do corpo, como sensitivas humanas, sem o mínimo esforço para enriquecer a existência. Na vida, agarram-se ao medo da morte. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 154 Na morte, confessam o medo da vida. E, a pretexto de serem menos favorecidos pelo destino, transfor- mam-se, gradativamente, em campeões da inutilidade e da preguiça. Se recebeste, pois, mais rude tarefa no mundo, não te atemorizes à frente dos outros e faze dela o teu caminho de progresso e renovação. Por mais sombria seja a estrada a que foste conduzido pelas circuns- tâncias, enriquece-a com a luz do teu esforço no bem, porque o medo não serviu como justificativa aceitável no acerto de contas entre o servo e o Senhor.4 » Tirai-lhe, pois, o talento e dai-o ao que tem os dez talentos. Porque a qualquer que tiver será dado, e terá em abundância; mas ao que não tiver, até o que tem ser-lhe-á tirado. Lançai, pois, o servo inútil nas trevas exteriores; ali, haverá pranto e ranger de dentes (Mt 25:28-30). “Tirai-lhe, pois, o talento e dai-o ao que tem os dez talentos. Porque a qualquer que tiver será dado, e terá em abundância; mas ao que não tiver, até oque tem ser-lhe-á tirado” “[...] significa que todo aquele que diligencia por corresponder à confiança do Senhor, receberá auxílio e proteção para que possa aumentar as virtudes que possui”.2 O esforço desenvolvido lhe proporciona existências futuras mais tranquilas, livres de expiações. Há, entretanto, outro significado para estas ordenações do Pai: “mas ao que não tiver, até o que tem ser-lhe-á tirado.” “Lançai, pois, o servo inútil nas trevas exteriores; ali, haverá pranto e ranger de dentes.” Quer [...] dizer que, aquele que não se esforçar para acrescentar alguma coisa àquilo que recebe da misericórdia divina, expiará, em futuras reencarnações de sofrimentos, a incúria, a preguiça, a má vontade de que deu provas, quando se verá privado até do pouco que teve, por empréstimo.2 Serão existências marcadas por provas e expiação, em que o indivíduo estará submetido ao jugo da lei de causa e efeito. A outra interpretação da parábola, anteriormente citada, também elaborada pelo Irmão X, encontra-se no livro Estante da vida. Nessa interpretação, os talentos destinados aos três servidores são os seguintes: “Ao primeiro transmitiu o dinheiro, o poder, o conforto a habilidade e o prestígio; ao segundo concedeu a inteligência e a autoridade, e ao terceiro entregou o conhecimento Eespírita.”3 Sugerimos que esta versão da Parábola dos Talentos, inserida em anexo, seja estudada em sala de aula. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 155 Referências 1. CALLIGARIS, Rodolfo. Parábolas evangélicas. 9. ed. Rio de Janeiro:FEB, 2006. Cap. Parábola dos talentos, p. 55. 2. _____._____. p. 57. 3. XAVIER, Francisco Cândido. Estante da vida. Pelo Espírito Irmão X. 9. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 4 (Estudo na parábola), p. 29-30. 4. _____. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 36. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 132 (Tendo medo), p. 327-328. 5. _____. Luz acima. Pelo Espírito Irmão X. 10. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 33 (Lembrando a parábola), p. 143. 6. _____._____. p. 143-144. 7. _____._____. p. 144. 8. _____._____. p. 144-145. 9. _____._____. p. 145. 10. _____ Palavras de vida eterna. Pelo Espírito Emmanuel. 33. ed. Uberaba: Comunhão Espírita Cristã, 2005. Cap. 7 (Melhorar para progredir), p. 28. 11. _____._____. Cap. 8 (Vida e posse), p. 29-30. Orientações ao monitor Pedir à turma que faça leitura silenciosa do texto evangélico (Mateus, 25:14-30), assinalando os pontos que julguem mais signi- ficativos. Em seguida, organizar dois grupos de estudo e solicitar-lhes a realização das seguintes tarefas: Grupo 1: leitura do texto “Estudo da parábola”, do Espírito Irmão X — veja anexo —, seguida de troca de ideias e elaboração de resumo que expresse o pensamento do autor. Um ou mais relatores apresen- tarão, em plenária, um resumo da história e o resumo elaborado. Grupo 2: os participantes realizam as mesmas atividades do outro grupo, só que estudarão o texto intitulado “Lembrando a pará- bola” — veja anexo —, também de autoria do Espírito Irmão X. Após os relatos do grupo, analisar em conjunto com a turma, outras ideias que não foram consideradas, correlacionando-as à exis- tência cotidiana. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 156 Anexo Estudo na parábola* Irmão X Comentávamos a necessidade da divulgação da Doutrina Espírita, quando o rabi Zoar ben Ozias, distinto orientador israelita, hoje consagrado às verdades do Evangelho no mundo espiritual, pediu licença a fim de parafrasear a parábola dos talentos, contada por Jesus, e falou, simples: — Meus amigos, o Senhor da Terra, partindo, em caráter tempo- rário, para fora do mundo, chamou três dos seus servos e, considerando a capacidade de cada um, confiou-lhes alguns dos seus próprios bens, a título de empréstimo, participando-lhes que os reencontraria, mais tarde, na vida superior... Ao primeiro transmitiu o dinheiro, o poder, o conforto, a habili- dade e o prestígio; ao segundo concedeu a inteligência e a autoridade, e ao terceiro entregou o conhecimento espírita. Depois de longo tempo, os três servidores, assustados e vaci- lantes, compareceram diante do Senhor para as contas necessárias. O primeiro avançou e disse: — Senhor, cometi muitos disparates e não consegui realizar-te a vontade, que determina o bem para todos os teus súditos, mas, com os cinco talentos que me puseste nas mãos, comecei a cultivar, pelo menos com pequeninos resultados, outros cinco, que são o trabalho, o progresso, a amizade, a esperança e a gratidão, em alguns dos com- panheiros que ficaram no mundo... Perdoa-me, ó divino Amigo, se não pude fazer mais!... O Senhor respondeu tranquilo: — Bem está, servo fiel, pois não erraste por intenção... Volta ao campo terrestre e reinicia a obra interrompida, renascendo sob o amparo das afeições que ajudaste. * XAVIER, Francisco Cândido. Estante da vida. Pelo Espírito Irmão X. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 4 (Estudo na parábola), p.29-32. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 157 Veio o segundo e alegou: — Senhor, digna-te desculpar-me a incapacidade... Não te pude compreender claramente os desígnios que preceituam a felicidade igual para todas as criaturas e perpetrei lastimáveis enganos... Ainda assim, mobilizei os dois valores que me deste e, com eles, angariei outros dois que são a cultura e a experiência para muitos dos irmãos que permanecem na retarguada... O Excelso benfeitor replicou, satisfeito: Bem está, servo fiel, pois não erraste por intenção... Volta ao campo terrestre e reinicia a obra interrompida, renascendo sob o amparo das afeições que ajuntaste. O terceiro adiantou-se e explicou: — Senhor, devolvo-te o conhecimento espírita, intocado e puro, qual o recebi de tua munificência... O conhecimento espírita é Luz, Senhor, e, com ele, aprendi que a tua Lei é dura demais, atribuindo a cada um conforme as próprias obras. De que modo usar uma lâmpada assim, brilhante e viva, se os homens na Terra estão divididos por pe- sadelos de inveja e ciúme, crueldade e ilusão? Como empregar o clarão de tua verdade sem ferir ou incomodar? E como incomodar ou ferir, sem trazer deploráveis consequências para mim próprio? Sabes que a Verdade, entre os homens, cria problemas onde aparece... Em vista disso, tive medo de tua Lei e julguei como a medida mais razoável para mim o acomodar-me com o sossego de minha casa... Assim pensando, ocultei o dom que me recomendaste aplicar e restituo-te semelhante riqueza, sem o mínimo toque de minha parte!... O Sublime credor, porém, entre austero e triste, ordenou que o tesouro do conhecimento espírita lhe fosse arrancado e entregue, de imediato, aos dois colaboradores diligentes que se encaminhariam para a Terra, de novo, declarando, incisivo: — Servo infiel, não existe para a tua negligência outra alternativa senão a de recomeçares toda a tua obra pelos mais obscuros entraves do princípio... Senhor!... Senhor!... — chorou o servo displicente. — Onde a tua equidade? Deste aos meus companheiros o dinheiro, o poder, o conforto, a habilidade, o prestígio, a inteligência e a autoridade, e a mim concedeste tão só o conhecimento espirita... Como fazes cair sobre mim todo o peso de tua severidade? EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 158 — O Senhor, entretanto, explicou, brandamente: — Não desconheces que te atribuí a luz da Verdade como o bem maior de todos. Se a ambos os teus companheiros não acertaram em tudo, é que lhes faltava o dissernimento que lhes podias ter ministrado, através do exemplo, de que fugiste por medo da responsabilidade de corrigir amando e trabalhar instruindo... Escondendo a riqueza que te emprestei, não só te perdeste pelo temor de sofrer e auxiliar, como também prejudicaste a obra deficitária de teus irmãos, cujos dias no mundo teriam alcançado maior rendimento no Bem eterno, se hou- vessem recebido o quinhão de amor e serviço, humildade e paciência que lhes negaste!... — Senhor!... Senhor!... por quê? — soluçou o infeliz — por quetamanho rigor, se a tua Lei é de misericórdia e justiça. Então, os assessores do Senhor conduziam o servo desleal para as sombras do recomeço, esclarecendo a ele que a Lei, realmente, é disciplina de misericórdia e justiça, mas com uma diferença: para os ignorantes do dever, a justiça chega pelo alvará da misericórdia; mas, para as criaturas conscientes das próprias obrigações, a misericórdia chega pelo cárcere da justiça. Anexo Lembrando a parábola* Irmão X Ao enviar três servos de confiança para servi-lo em propriedade distante, onde outros milhares de trabalhadores, em diversos degraus da virtude e da sabedoria, lavravam a terra em louvor de tua grandeza divina, o supremo Senhor chamou-os à sua presença e distribuiu com eles preciosos dons. Afagado o primeiro, entregou-lhe cinco “talentos”, notificando: — Conduze contigo estes tesouros da alegria e da prosperida- de. São eles a saúde, a riqueza, a habilidade, o Ddiscernimento e a * XAVIER, Francisco Cândido. Luz acima. Pelo Espírito Irmão X. 10. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 33 (Lembrando a parábola), p. 143-145. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 159 autoridade. Multiplicaos, aonde fores, em benefício dos meus filhos e teus irmãos que, em situação inferior à tua, avergados ao solo do pla- neta a quem levarás minhas bênçãos, se esforçam mais intensamente. Ao segundo servidor passou dois “talentos”, acentuando: — Transporta contigo esta duas preciosidades, que se destinam ao esclarecimento e auxílio do mundo a que te diriges. São ambas, a inteligência e o poder. Estende estes patrimônios respeitáveis às minhas construções eternas. Ao terceiro, confiou apenas um “talento”, aclarando, cuidadoso: Apossa-te desta lâmpada sublime e segue. É a dor, o dom ce- leste da iluminação espiritual. Acende-a em teu campo de trabalho, em favor de ti mesmo e dos semelhantes. Seus raios abrem acesso aos tabernáculos divinos. Em seguida, fixou os três colaboradores que partiam e explicou: — Aguardá-los-ei de regresso, para as contas. O tempo correu, célere, e veio o dia em que os mensageiros voltaram ao pátrio lar. O Soberano esperava-os no pórtico, esperançoso e feliz. Findas as saudações usuais, o primeiro enviado adiantou-se e entregoulhe dez “talentos”, relacionando: — Senhor, eis tuas dádivas multiplicadas. Deste-me cinco e restituo-as em dobro. Respeitando a saúde, adquiri o tempo; espalhan- do a riqueza, aliciei a gratidão; usando a habilidade, recebi a estima; movimentando o discernimento, conquistei o equilíbrio, e distribuindo a autoridade em teu nome, ganhei a ordem. O teu plano de júbilo e evolução foi executado. O Justo abençoou-o e explicou: Já que foste fiel nestes negócios de pouca monta, conceder-te-ei a intendência de importantes interesses de minha casa. Aproximou-se o segundo e depositou-lhe nas mãos quatro “talentos”, informando: Senhor, recebe teus haveres multiplicados. Elevando a inteli- gência obtive o trabalho e, submetendo o poder à tua vontade sábia, atraí o progresso. A tua expectativa de instrução e ajuda no meu setor de atividade foi atendida. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 3 160 O Pai louvou-lhe a conduta e falou, contente: — Já que revelaste lealdade no “pouco”, ser-te-á conferido o “muito” das grandes tarefas. Logo após, acercou-se o terceiro e último servo da expedição e, devolvendo, intacto, o patrimônio que recebera, notificou: — Senhor, recolhe de volta a indesejável herança que me des- te... Sei que és austero e exigente, que colhes o que não semeias e que ordenas por toda parte... Experimentando enorme dificuldade para aguentar a carga que me puseste nos ombros e temendo-te o juízo, escondi-a na terra e reponho-a, agora, em tuas mãos... Esta dádiva é um fardo difícil de carregar... Constituiu-se desagradável recordação por onde passei, estorvou-me os desejos e, de modo algum, desejaria possuí-la, outra vez. É impossível obter lucros ou vantagens com seme- lhante obstáculo. Retoma, pois, teu estranho e insuportável depósito!... O Poderoso contemplou-o, triste, e falou, enérgico: — Servo mau e infiel, como poderias multiplicar minha bênção se nem ao menos te deste ao esforço de examiná-la? Como iluminar o caminho se mantiveste a lâmpada apagada? Tua ociosidade trans- formou alguns gramas de serviço benéfico em várias toneladas de angústia que doravante pesarão sobre ti. Criaste fantasmas que nunca existiram, multiplicaste preocupações e receios que te levaram a gritar e espernear como simples tolo, no avançado círculo de minhas obras... Por fim, atiraste-me o tesouro ao pântano do desespero e da revolta e vens comentar o temor e o zelo que minha presença te infunde, quando foste tão somente preguiçoso e insensato! A dor era a tua oportunidade sagrada e única de iluminação ao próprio caminho, para que a tua claridade amparasse os companheiros de luta regenerativa e salutar. Repeliste o dom que te confiei... Volta, portanto, à sombra e à desesperação que abraçaste!... E o servo, que se perdera pela imprevidência e pela inconfor- mação, somente entendeu o sublime valor da lâmpada do sofrimento quando se viu sozinho e desamparado, nas trevas exteriores. EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 4 AS PARÁBOLAS DA FIGUEIRA Objetivos » Explicar, sob a ótica espírita, os ensinamentos morais existentes nas duas parábolas da figueira. Ideias principais » Em diferentes oportunidades, Jesus utiliza o recurso das alegorias para transmitir um ensinamento moral. É o que faz quando identifica os sinais de transformação ocorridos na figueira, em razão da mudança climática, com o processo de renovação espiritual que, cedo ou tarde, alcança o Espírito. No caso desta parábola, [...] grandes verdades se ocul- tam. Há, primeiramente, a predição das calamidades de todo o gênero que assolarão e dizimarão a Humanidade, calamidades decorrentes da luta suprema entre o bem e o mal, entre a fé e a incredulidade, entre as ideias progressistas e as ideias retrógradas. Há, em segundo lugar, a da difusão, por toda a Terra, do Evangelho [...]. Allan Kardec: A gênese. Cap. XVII, item 56. » A figueira que secou é o símbolo dos que apenas aparentam propensão para o bem, mas que, em realidade, nada de bom produzem [...]. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. XIX, item 9. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 4 162 Subsídios 1. Texto evangélico E haverá sinais no sol, e na lua, e nas estrelas, e, na terra, angústia das nações, em perplexidade pelo bramido do mar e das ondas; homens desmaiando de terror, na expectação das coisas que sobrevirão ao mundo, porquanto os poderes do céu serão abalados. E, então, verão vir o Filho do Homem numa nuvem, com poder e grande glória. Ora, quando essas coisas começarem a acontecer, olhai para cima e levantai a vossa cabeça, porque a vossa redenção está próxima. E disse-lhes uma parábola: Olhai para a figueira e para todas as árvores. Quando já começam a brotar, vós sabeis por vós mesmos, vendo-as, que perto está já o verão. Assim também vós, quando virdes acontecer essas coisas, sabei que o Reino de Deus está perto. (Lucas, 21:25-31.) E, no dia seguinte, quando saíram de Betânia, teve fome. Vendo de longe uma figueira que tinha folhas, foi ver se nela acharia alguma coisa; e, chegando a ela, não achou senão folhas, porque não era tempo de figos. E Jesus, falando, disse à figueira: Nunca mais coma alguém fruto de ti. E os seus discípulos ouviram isso. (Marcos, 11:12-14.) Essas duas parábolas da figueira tratam de assuntos distintos, mas há uma relação de causa e efeito entre ambas. A primeira figueira está na fase de surgimento de novos brotos quando o verão se aproxima. Simboliza os indivíduos que iniciaram o despertamento de valores espirituais. Na segunda parábola a figueira encontra-se noutro período, já coberta de folhagem vistosa, porém destituída de frutos. Trata-se de uma alegoria referente às pessoas que possuem algum entendimentoespiritual, explanam sobre eles, mas são incapazes de produzir frutos, isto é, de exemplificarem o que pregam. A primeira árvore é apenas uma promessa, que pode ou não se concretizar em determinado período de tempo. A segunda é um projeto que se encontra em fase de execução, mas que fracassa em razão de deficiências intrínsicas. Da mesma forma, o Espírito só produzirá no momento certo, depois de, ter incorporados valores intelectuais e morais. São con- quistas que irão produzir frutos do bem, os quais capacita a criatura EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 4 163 a transformar-se em auxiliar do Pai, como anuncia Paulo, o apóstolo dos gentios, em sua primeira carta aos coríntios: “Porque nós somos cooperadores de Deus; vós sois lavoura de Deus e edifício de Deus” (1Co 3:9). Asseverando Paulo a sua condição de cooperador de Deus e desig- nando a lavoura e o edifício do Senhor nos seguidores e beneficiários do Evangelho que o cercavam, traçou o quadro espiritual que sempre existirá na Terra em aperfeiçoamento, entre os que conhecem e os que ignoram a verdade divina. [...] O serviço é de plantação e edificação, reclamando esforço pessoal e boa vontade para com todos, porquanto, de conformidade com a própria simbologia do apóstolo, o vegetal pede tempo e carinho para desenvolverse e a casa sólida não se ergue num dia.11 2. Interpretação do texto evangélico » E haverá sinais no sol, e na lua, e nas estrelas, e, na terra, angústia das nações, em perplexidade pelo bramido do mar e das ondas; homens des- maiando de terror, na expectação das coisas que sobrevirão ao mundo, porquanto os poderes do céu serão abalados. E, então, verão vir o Filho do Homem numa nuvem, com poder e grande glória. Ora, quando essas coisas começarem a acontecer, olhai para cima e levantai a vossa cabeça, porque a vossa redenção está próxima. E disse-lhes uma parábola: Olhai para a figueira e para todas as árvores. Quando já começam a brotar, vós sabeis por vós mesmos, vendo-as, que perto está já o verão. Assim também vós, quando virdes acontecer essas coisas, sabei que o Reino de Deus está perto (Lc 21:25-31). O registro de Lucas refere-se às provações que a Humanidade está destinada a passar, durante a transição que antecede a era da regeneração (veja Módulo I, roteiro 4). Há, primeiramente, a predição das calamidades [...], decorrentes da luta suprema entre o bem e o mal, entre a fé e a incredulidade, entre as ideias progressistas e as ideias retrógradas. Há, em segundo lugar, a difusão, por toda a Terra, do Evangelho restaurado na sua pureza primitiva; depois, ao reinado do bem, que será o da paz e da fraterni- dade universais, a derivar do código de moral evangélica, posto em pratica por todos os povos.3 EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 4 164 Catástrofes e destruições assinalarão o período de transição. Os Espíritos orientadores assim se expressam: “[...] Preciso é que tudo se destrua para renascer e se regenerar. Porque, o que chamais destruição não passa de uma transformação, que tem por fim a renovação e a melhoria dos seres vivos.”7 Os sinais que definem a era de transição e a de regeneração estão simbolizados nestes versículos: “Olhai para a figueira e para todas as árvores. Quando já começam a brotar, vós sabeis por vós mesmos, vendo-as, que perto está já o verão. Assim também vós, quando virdes acontecer essas coisas, sabei que o Reino de Deus está perto.” Na época de transição, a destruição abusiva que o homem per- petuou ao longo dos tempos chegará ao ápice. As forças da Natureza reagirão, visto que, ao lado dos agentes de destruição encontram-se também os meios de conservação, concedidos pela sabedoria divina, os quais delimitam os limites do livre arbítrio humano. “É o remédio ao lado mal.”8 Isto posto, diremos que o nosso globo, como tudo o que existe, esta submetido à lei do progresso. Ele progride, fisicamente, pela transfor- mação dos elementos que o compõem e, moralmente, pela depuração dos Espíritos encarnados e desencarnados que o povoam. Ambos esses progressos se realizam paralelamente, porquanto o melhoramento da habitação guarda relação com o do habitante. Fisicamente, o globo terrá- queo há experimentado transformações que a Ciência tem comprovado e que o tornaram sucessivamente habitável por seres cada vez mais aper- feiçoados. Moralmente, a Humanidade progride pelo desenvolvimento da inteligência, do senso moral e do abrandamento dos costumes.4 No período de transição, vivido atualmente pela Humanidade, surgirão não apenas os falsos profetas, mas também pessoas cujas ideias mais perturbam do que auxiliam. São “[...] as utopias, todos os sistemas ocos, todas as doutrinas carente de base sólida”.1 São pessoas que [...] aparentam propensão para o bem, mas que, em realidade, nada de bom produzem; dos oradores que mais brilho têm do que solidez, cujas palavras trazem superficial verniz, de sorte que agradam aos ouvidos, sem que, entretanto, revelem, quando perscru- tadas, algo de substancial para os corações.2 As expiações coletivas, relativamente comuns durante a transi- ção, representam recurso divino de reajuste espiritual. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 4 165 A noção de pessoa, reconhecida pela ordem jurídica, facilita-nos o entendimento das responsabilidades individuais e coletivas. [...] Assim, não se torna difícil entender que as expiações coletivas são os resgates de ações anteriores praticadas em conjunto pelo grupo envolvido. [...] Ainda se pode acrescentar [...] que os grupos se reúnem na Terra para tarefas ou missões comuns, assim como são reunidos, em outras épocas e circunstâncias, para purgar faltas cometidas em conjunto, solidariamente. [...] A Providência divina tem meios e formas para determinar os reencontros, o reinício de tarefas, os resgates, tanto no plano individual quanto no coletivo [...].10 É importante permanecer atentos aos sinais que assinalam os momentos de mudança, da mesma forma que os brotos surgidos na figueira anunciam outra estação do ano, o verão. Na transição, “[...] os períodos de renovação moral da Humanidade coincidem, como tudo leva a crer, com as revoluções físicas do globo [...]”.5 Os benfeitores espirituais orientam que é importante não per- der a oportunidade de melhoria, concedido por Jesus, nessa ocasião: “Retire-se cada um dos excessos na satisfação egoística, fuja ao relaxa- mento do dever, alije as inquietações mesquinhas — e estará preparado à sublime transformação.”12 A regeneração, por outro lado, será marcada pela transformação moral, situação em que o Evangelho estabelecerá seu reinado definitivo. “A fraternidade será a pedra angular da nova ordem social; mas, não há fraternidade real, sólida, efetiva, senão assente em base inabalável e essa base é a fé [...].”6 » E, no dia seguinte, quando saíram de Betânia, teve fome. Vendo de longe uma figueira que tinha folhas, foi ver se nela acharia alguma coisa; e, chegando a ela, não achou senão folhas, porque não era tempo de figos. E Jesus, falando, disse à figueira: Nunca mais coma alguém fruto de ti. E os seus discípulos ouviram isso (Mc 11:12-14). Estas anotações do evangelista indicam que a figueira estéril é o símbolo das pessoas inclinadas ao bem, à aquisição de valores espi- rituais, mas ainda incapaz de praticá-los. “Simboliza também todos aqueles que, tendo meios de ser úteis, não o são [...].”1 O que as mais das vezes falta é a verdadeira fé, a fé produtiva, a fé que abala as fibras do coração, a fé, numa palavra, que transporta mon- tanhas. São árvores cobertas de folhas, porém, baldas de frutos. Por isso é que Jesus as condena à esterilidade, porquanto dia virá em que EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 4 166 se acharão secas até à raiz. Quer dizer que todos os sistemas, todas as doutrinas que nenhum bem para a Humanidade houverem produzido, cairão reduzidas a nada; que todos os homens deliberadamente inúteis, por não terem posto em ação os recursos quetraziam consigo, serão tratados como a figueira que secou.1 É necessário, contudo, fazer reflexão sobre o conteúdo do versí- culo treze, do texto de Marcos: “Vendo de longe uma figueira que tinha folhas, foi ver se nela acharia alguma coisa; e, chegando a ela, não achou senão folhas, porque não era tempo de figos.” No primeiro momento, parece existir contradição nas ideias expressas, uma vez que, se não “era tempo de figos”, Jesus só poderia encontrar na figueira apenas as folhas. Faz-se necessário explicar o significado do simbolismo para que não se julgue, equivocadamente, a ação seguinte, assim expressa pelo Cristo: “Nunca mais coma alguém fruto de ti”(versículo 14). A figueira cheia de folhas assemelha-se aos indivíduos que re- ceberam oportunidades de se transformar para melhor; conseguem discernir entre o falso e verdadeiro e são portadores de razoável co- nhecimento. Falam bem, atraindo pessoas, até multidões, em razão das habilidades pessoais que possuem. São, porém, incapazes de praticar o que recomenda porque não possuem, ainda, moralidade elevada nem domínio dos assuntos que ensina. Em geral, são pessoas portadoras de algumas virtudes, mas que gostam de impor a própria opinião. São personalistas e não se animam a considerar outras opiniões, por se julgarem “donos da verdade”. Os que se aproximam deles afastam, em seguida, decepcionados, por não encontra- rem nem a fé pregada nem a consistência dos ensinamentos divulgados. A figueira não dava fruto porque sua organização celular era insufi- ciente ou deficiente, e Jesus, conhecendo esse mal, quis dar uma lição aos seus discípulos, não só para lhes ensinarem a terem fé, mas tam- bém para lhes fazer ver que os homens e as instituições infrutíferas, como aquela árvore, sofreriam as mesmas consequências. Pelo lado filosófico, realça da parábola a necessidade indispensável da prática das boas obras, não só pelas instituições, como pelos homens. Um indivíduo, por mais bem vestido e mais rico que seja, encaramujado no seu egoísmo, é semelhante a uma figueira, da qual, em nos aproxi- mando, não vemos mais do que folhas.[...] O que precisamos da árvore são os frutos. O que precisamos da religião são as boas obras. [...] A religião do Cristo não é religião das “folhas”, mas, sim, a dos frutos!9 EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 4 167 O Espiritismo nos orienta como proceder nestes tempos de transformação, em que o homem se revela demasiadamente preocupa- do com as dificuldades da vida material, em detrimento da aquisição de valores espirituais. Apóia-nos na fase de transição, em curso no Planeta, concedendo-nos os recursos necessários para que possamos integrar a Humanidade regenerada do futuro. Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 19, item 9, p. 345. 2. _____._____. p. 344-345. 3. _____. A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 52 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 17, item 56, p. 449. 4. _____._____. Cap. 18, item 2, p. 458. 5. _____._____. Item 10, p. 466. 6. _____._____. Item 17, p.470. 7. _____. O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 91. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007, questão 728, p. 389. 8. _____._____. Questão 731, p. 390. 9. SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e ensinos de Jesus. 20. ed. Matão: O Clarim, 2004. Item: Parábola da figueira estéril, p.57. 10. SOUZA. Juvanir Borges. Tempo de transição. 3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002. Cap. 14 (Expiações coletivas), p.122-123. 11. XAVIER, Francisco Cândido. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 36. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 68 (Sementeira e construção), p. 177-178. 12. _____. Vinha de luz. Pelo Espírito Emmanuel. 26. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 23 (E olhai por vós), p. 66. Orientações ao monitor Fazer uma breve explanação no início da aula, destacando os pontos principais que são desenvolvidos neste Roteiro. Em seguida, dividir a turma em dois grupos, cabendo, a cada um, o estudo de uma das parábolas da figueira; elaboração de uma síntese das ideias expressas por Jesus no texto evangélico e apresentação das conclusões do trabalho em grupo, em plenária. Ouvir os relatos, contextualizando os assuntos estudados no cotidiano da vida atual. EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 5 O CREDOR INCOMPASSIVO Objetivos » Interpretar a parábola do credor incompassivo, à luz do entendimento espírita. Ideias principais » A parábola do credor incompassivo refere-se a alguém que teve vultosa dívida perdoada, mas que não soube perdoar quem lhe devia pouca coisa. Recebeu misericórdia e perdão em abundância, mas não se fez merecedor desses benefícios quando colocado em situação similar. Perdeu, desta forma, a oportunidade de quitar suas dívidas de acordo com os preceitos indicados pela lei de amor e foi constrangido pagá-las segundo as determinações da lei de causa e efeito, em reencarnações provacionais. » A misericórdia é o complemento da brandura, porquanto aquele que não for misericordioso não poderá ser brando e pacífico. Ela consiste no esquecimento e no perdão as ofensas. [...] O esquecimento das ofensas é próprio da alma elevada, que paira acima dos golpes que lhe possam desferir. [...] » Ai daquele que diz: nunca perdoarei. Esse, se não for condenado pelos homens, sê-lo-á por Deus. Com que direito reclamaria ele o perdão de EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 5 170 suas próprias faltas, se não perdoa as dos outros? Jesus nos ensina que a misericórdia não deve ter limites, quando diz que cada um perdoe ao seu irmão, não sete vezes, mas setenta vezes sete vezes. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. X, item 4. Subsídios 1. Texto evangélico Por isso, o Reino dos céus pode comparar-se a um certo rei que quis fazer contas com os seus servos; e, começando a fazer contas, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos. E, não tendo ele com que pagar, o seu senhor mandou que ele, e sua mulher, e seus filhos fossem vendidos, com tudo quanto tinha, para que a dívida se lhe pagasse. Então, aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: Senhor, sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. Então, o senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida. Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos que lhe devia cem dinheiros e, lançando mão dele, sufocava-o, dizendo: Paga-me o que me deves. Então, o seu companheiro, prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: Sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. Ele, porém, não quis; antes, foi encerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida. Vendo, pois, os seus conservos o que acontecia, contristaram-se muito e foram declarar ao seu senhor tudo o que se passara. Então, o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: Servo malvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste. Não devias tu, igualmente, ter compaixão do teu companheiro, como eu também tive misericórdia de ti? E, indignado, o seu senhor o entregou aos atormentadores, até que pagasse tudo o que devia. Assim vos fará também meu Pai celestial, se do coração não perdoardes, cada um a seu irmão, as suas ofensas. (Mateus, 18:23-35.) Em linhas gerais, esta parábola analisa o perdão e a compaixão. Todos [...] estamos sobrecarregados de imensos débitos para com a Providência divina; todos, continuamente, lhe suplicamos o perdão. Todavia, somos incapazes de perdoar do fundo do coração a menor falta que alguém cometer contra nós. Queremos que Deus nos perdoe e nos tolere, mas não queremos perdoar, nem tolerar nossos semelhan- EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 5 171 tes. Por meio desta tão singela quanto expressiva parábola o Mestre nos ensina que devemos cobrir com o manto do perdão e do amor os erros, que são cometidos contra nós, porque se assim não o fizermos, compareceremos com nossos erros descobertos na presença de Deus, o qual nos trataráexatamente como tivermos tratado os nossos irmãos. 7 2. Interpretação do texto evangélico » Por isso, o Reino dos céus pode comparar-se a um certo rei que quis fazer contas com os seus servos; e, começando a fazer contas, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos. E, não tendo ele com que pagar, o seu senhor mandou que ele, e sua mulher, e seus filhos fossem vendidos, com tudo quanto tinha, para que a dívida se lhe pagasse.Então, aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: Senhor, sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. Então, o senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida (Mt 18:23-27). A parábola faz referência a uma prática que existia na Antiguidade: as pessoas que não podiam pagar as suas dívidas transformavam-se em escravos, podendo ser vendidos, eles e seus familiares. Os bens materiais que possuíam como casa, terras, moedas, animais etc., eram transferidos para o novo proprietário. O devedor citado na parábola devia uma quantia fabulosa. Vendo-se, porém, “[...] ameaçado de ser vendido, e mais a mulher, os filhos, e tudo quanto possuía, para resgate da dívida, pediu moratória, isto é, um prazo para que pudesse satisfa- zer a tão vultoso compromisso, e o rei [ou senhor], compadecendo-se dele, deferiu-lhe o pedido”.2 Inúmeras vezes fez o Mestre referência ao perdão, destacando-o por valioso e indispensável imperativo à evolução humana. Interpelado por Pedro se devia perdoar “sete vezes”, respondeu-lhe que devia per- doar “setenta vezes sete” [Mt 18:21-22], que equivale a dizer: perdoar indefinitivamente, tantas vezes quantas forem necessárias.5 Realizando uma análise mais apurada da história, verificamos que o perdão, concedido porque aquele senhor, provinha de uma alma elevada, portadora de sentimentos nobres como misericórdia, tolerância, generosidade, capacidade para ouvir e para perceber as dificuldades do endividado. São atributos comuns aos Espíritos supe- riores, cuja benevolência é incomparável, uma vez que têm por norma de conduta seguir este procedimento: “[...] tudo o que vós quereis que EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 5 172 os homens vos façam, fazei-lho também vós, porque esta é a lei e os profetas”(Mt 7:12). Esta [...] é a expressão mais completa da caridade, porque resume todos os deveres do homem para com o próximo. Não podemos encontrar guia mais seguro, a tal respeito, que tomar para padrão, do que devemos fazer aos outros, aquilo que para nós desejamos. Com que direito exigiríamos dos nossos semelhantes melhor proceder, mais indulgência, mais benevolência e devotamento para conosco, do que os temos para com eles? A prática dessas máximas tende à destruição do egoísmo. Quando as adotarem para regra de conduta e para base de suas instituições, os homens compreenderão a verdadeira fraternidade e farão que entre eles reinem a paz e a justiça. Não mais haverá ódios, nem dissensões, mas, tão somente, união, concórdia e benevolência mútua.1 » Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos que lhe devia cem dinheiros e, lançando mão dele, sufocava-o, dizendo: Paga- -me o que me deves. Então, o seu companheiro, prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: Sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. Ele, porém, não quis; antes, foi encerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida (Mt 18:28-30). A situação, aqui, é outra. O mesmo devedor que teve a dívida perdoada, revela-se como pessoa mesquinha e implacável: “Pois bem, mal havia obtido tão generoso atendimento, eis que encontrou um companheiro que lhe devia uma bagatela, ou sejam, cem denários [ou cem dinheiros] [...] e, para reaver o seu dinheiro, não titubeou em usar de recursos violentos.”3 Infelizmente, esta tem sido a regra geral da conduta humana. Há pessoas que estão sempre prontas para receber benefícios e defender os próprios interesses. Não procedem, porém, da mesma forma para com o próximo. Trata-se de um comportamento contraditório, con- siderando que somos carentes do perdão e da misericórdia de Deus, e das pessoas que ofendemos. Não foi por acaso que Jesus incluiu na oração “Pai-nosso” a sentença: “Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores” (Mt 6:12). O conceito de perdão, segundo o Espiritismo, é idêntico ao do Evangelho, que lhe é fundamento: concessão, indefinida, de oportu- nidades para que o ofensor se arrependa, o pecador se recomponha, EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 5 173 o criminoso se libere do mal e se erga, redimido, para a ascensão lu- minosa. Quem perdoa, segundo a concepção espírita-cristã, esquece a ofensa. Não conserva ressentimentos. Ajuda o ofensor, muita vez sem que este o saiba. Não convém ao aprendiz sincero, sob pena de ultraje à própria consciência, adotar um perdão formal, aparente, socialmente hipócrita. Perdão formal é o que não tem feição evangélica. Guarda rancor. Alegra-se com os insucessos do adversário. Nega-lhe amparo moral e material.6 Faltou ao personagem que possuia uma grande dívida agir com misericódia, mesmo recebendo-a em abundância. É regra da vida que, quem age com misericódia, perdoa. Quem perdoa, é perdoado. “Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará a vós. Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai vos não perdoará as vossas ofensas” (Mt 6:14-15). O perdão se reveste de grande poder moral porque se funda- menta na lei do amor e da caridade. Assim, se “[...] pretendemos banir os males do mundo, cultivemos o amor que se compadece no serviço que constrói para a felicidade de todos. Ninguém se engane. As horas são inflexíveis instrumentos da Lei que distribui a cada um, segundo as suas obras”.9 » Vendo, pois, os seus conservos o que acontecia, contristaram-se muito e foram declarar ao seu senhor tudo o que se passara. Então, o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: Servo malvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste. Não devias tu, igualmente, ter com- paixão do teu companheiro, como eu também tive misericórdia de ti? E, indignado, o seu senhor o entregou aos atormentadores, até que pagasse tudo o que devia. Assim vos fará também meu Pai celestial, se do coração não perdoardes, cada um a seu irmão, as suas ofensas (Mt18:31-35). Este trecho, do registro de Mateus, nos reporta à manifestação da lei de causa e efeito. Percebemos, em primeiro, lugar que a criatura endividada recebeu a indulgência e o perdão, mas, malbaratando-os, adquiriu novas dívidas. Em segundo lugar o pagamento que, no início, seria governado pela lei de amor passou para a custódia e rigor da lei de ação e reação, simbolizada na expressão “atormentadores”, existente no seguinte período gramatical: “indignado, o seu senhor o entregou aos atormentadores, até que pagasse tudo o que devia”. Este tópico da narrativa evangélica é de suma importância. Revela, claramente, que há sempre um limite no pagamento das dívidas. Estas EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 5 174 podem, algumas vezes, ser realmente muito vultosas, como no caso prefigurado — dez mil talentos! — mas, uma vez pago esse montante, o devedor fica com direito à quitação. Semelhantemente, o pagamento dos dez mil talentos pode determinar longos períodos de sofrimento, muitas existências expiatórias [...].4 A primeira alternativa, relacionada ao pagamento de uma dívida, está sempre vinculada à misericórdia divina, pois é o resgate pelo amor, que é simbolizado na prática da caridade, como ensina o apóstolo Pedro: “Mas, sobretudo, tende ardente caridade uns para com os outros, porque a caridade cobrirá a multidão de pecados” (1Pe 4:8). A segunda possibilidade só é estabelecida quando o amor é ignorado. Assim, a dívida passa a ser administrada pela lei da causa- lidade, cujo pagamento ocorre não sem a manifesta misericórdia de Deus, sempre presente, mas vinculada aos ditames da Justiça divina. Fica evidenteque os reajustes espirituais, quando governados pela lei de amor, são os preferidos, ainda que sob o peso das renúncias. Neste propósito esclarece o benfeitor Emmanuel: Em qualquer parte, não pode o homem agir, isoladamente, tratando-se da obra de Deus, que se aperfeiçoa em todos os lugares. O Pai estabeleceu a cooperação como princípio dos mais nobres, no centro das leis que regem a vida. No recanto mais humilde, encontrarás um companheiro de esforço. Em casa, ele pode chamar-se “pai” ou “filho”; no caminho, pode denominar-se “amigo” ou “camarada de ideal”. No fundo, há um só Pai que é Deus e uma grande família que se compõe de irmãos. [...] Santifica os laços que Jesus promoveu a bem de tua alma e de todos os que te cercam. [...]Observa em cada companheiro de luta ou do dia uma bênção e uma oportunidade de atender ao programa divino, acerca de tua existência. Há dificuldades e percalços, incompreensões e desentendimentos? Usa a misericórdia que Jesus já usou contigo, dando-te nova ocasião de santificar e de aprender.8 EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 5 175 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 11, item 4, p. 203. 2. CALLIGARIS, Rodolfo. Parábolas evangélicas. 9. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. Parábola do credor incompassivo, p. 29. 3. _____._____. p. 29-30. 4. _____._____. p. 30-31. 5. PERALVA, Martins. Estudando o evangelho. 9. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 20 (Perdão), p. 100-101. 6. _____._____. p. 102. 7. RIGONATTI, Eliseu. O evangelho dos humildes. 15. ed. São Paulo: Pensamento, 2003. Cap. XVIII, item: A parábola do credor incompassivo, p. 172. 8. XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, verdade e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 20 (O companheiro), p. 55-56. 9. _____. Jesus no lar. Pelo Espírito Neio Lúcio. 35 ed. 2006. Cap. 42 (A mensagem de compaixão), p. 247. Orientações ao monitor Realizar um amplo debate a respeito do assunto desenvolvido no Roteiro, procurando destacar o valor do perdão e da misericórdia como mecanismos de reajustes espirituais. ATIVIDADE EXTRACLASSE: pedir aos participantes que façam leitura e elaborem uma síntese interpretativa das alegorias constantes dos dois textos evangélicos, objeto de estudo da próxima reunião: (Lucas, 14:16-24.) e (Mateus, 22:1-14.) EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 6 A FESTA DAS BODAS Objetivos » Realizar interpretação espírita da parábola das bodas. Ideias principais » A parábola das bodas ensina que, partindo do princípio de [...] que todos os recursos da vida são pertences de Deus, anotaremos o divino convite à lavoura do bem, em cada lance de nossa marcha. Os apelos do Céu, em forma de concessões, para que os homens se ergam à lei de amor, voam na Terra em todas as latitudes. Todavia, raros registram-lhes a presença. Emmanuel: Religião dos espíritos. Cap. Versão prática. » — Jesus compara o Reino dos Céus, onde tudo é alegria e ventura, a um festim. Falando dos primeiros convidados, alude aos hebreus, que foram os primeiros chamados por Deus ao conhecimento da sua Lei.[...] Os convidados que se escusam, pretextando terem de ir cuidar de seus campos e de seus negócios, simbolizam as pessoas mundanas que, absor- vidas pelas coisas terrenas, se conservam indiferentes às coisas celestes. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. XVIII, item 2. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 6 178 Subsídios 1. Texto evangélico Então, Jesus, tomando a palavra, tornou a falar-lhes em parábolas, dizendo: O Reino dos céus é semelhante a um certo rei que celebrou as bodas de seu filho. E enviou os seus servos a chamar os convidados para as bodas; e estes não quiseram vir. Depois, enviou outros servos, dizendo: Dizei aos convidados: Eis que tenho o meu jantar preparado, os meus bois e cevados já mortos, e tudo já pronto; vinde às bodas. Porém eles, não fazendo caso, foram, um para o seu campo, e outro para o seu negócio; e, os outros, apoderando-se dos servos, os ultrajaram e mataram. E o rei, tendo notícias disso, encolerizou-se, e, enviando os seus exércitos, destruiu aqueles homicidas, e incendiou a sua cidade. Então, disse aos servos: As bodas, na verdade, estão preparadas, mas os convidados não eram dignos. Ide, pois, às saídas dos caminhos e convidai para as bodas a todos os que encontrardes. E os servos, saindo pelos caminhos, ajuntaram todos quantos encontraram, tanto maus como bons; e a festa nupcial ficou cheia de convidados. E o rei, entrando para ver os convidados, viu ali um homem que não estava trajado com veste nupcial. E disse-lhe: Amigo, como entraste aqui, não tendo veste nupcial? E ele emudeceu. Disse, então, o rei aos servos: Amarrai-o de pés e mãos, levai-o e lançai-o nas trevas exteriores; ali, haverá pranto e ranger de dentes. Porque muitos são chamados, mas poucos, escolhidos. (Mateus, 22:1-14.) Sob a forma de alegorias, esta parábola transmite lições que nos ajudam compreender a vida atual. É evidente que o “Reino dos céus” representa o estado de plenitude espiritual, o ápice do processo evo- lutivo. O “rei” é Deus, o Pai celestial, o Criador dos seres e de todas as coisa do Universo. O “filho” para o qual as bodas foi preparada é Jesus. Os “servos” são os seus enviados, Espíritos guardiões da Humanidade. As “iguarias” (“bois e cevados”) simbolizam as lições do Evangelho. O incrédulo sorri a esta parábola, que lhe parece de pueril ingenuidade, por não compreender que se possa opor tanta dificuldade para assistir a um festim e, ainda menos, que convidados levem a resistência a ponto de massacrarem os enviados do dono da casa.1 A narrativa revela duas ordens de ideias: primeira é que o estado de plenitude espiritual (“Reino dos céus”) é convite destinado a todos EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 6 179 os seres humanos, indistintamente. A segunda diz respeito à forma como atingir a perfeição espiritual: por meio de uma festa de casa- mento, ou união com Jesus, guia e modelo da humanidade terrestre. Nesta festa, os discípulos do Mestre encontrarão uma farta provisão de bens para suprir todas as suas necessidades de fome e sede espirituais. Jesus compara o reino dos Céus, onde tudo é alegria e ventura, a um festim. Falando dos primeiros convidados, alude aos hebreus, que foram os primeiros chamados por Deus ao conhecimento da sua Lei. Os enviados do rei são os profetas que os vinham exortar a seguir a trilha da verdadeira felicidade; suas palavras, porém, quase não eram escutadas; suas advertências eram desprezadas; muitos foram mesmo massacrados, como os servos da parábola. Os convidados que se escusam, pretextando terem de ir cuidar de seus campos e de seus negócios, simbolizam as pessoas mundanas que, absorvidas pelas coisas terrenas, se conservam indiferentes às coisas celestes.2 2. Interpretação do texto evangélico » Então, Jesus, tomando a palavra, tornou a falar-lhes em parábolas, dizendo: O Reino dos céus é semelhante a um certo rei que celebrou as bodas de seu filho. E enviou os seus servos a chamar os convidados para as bodas; e estes não quiseram vir (Mt 22:1-3). O processo de evolução espiritual começa, efetivamente, a partir de certo nível de entendimento e de experiências, vivênciadas pelo Espírito. Somente a partir desse patamar pode o homem abrir-se para as verdades transcendentais. Dessa forma, os primeiros convidados foram os hebreus. Os hebreus foram os primeiros a praticar publicamente o monoteísmo; é a eles que Deus transmite a sua lei, primeiramente por via de Moisés, depois por intermédio de Jesus. Foi daquele pequenino foco que partiu a luz destinada a espargir-se pelo mundo inteiro, a triunfar do paganismo e a dar a Abraão uma posteridade espiritual “tão numerosa quanto as estrelas do firmamento”. Entretanto, abandonando de todo a idolatria, os judeus desprezaram a lei moral,para se aferrarem ao mais fácil: a prática do culto exterior.3 Entretanto, o chamamento não foi atendido pela maioria dos judeus, a despeito da base religiosa que possuíam. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 6 180 Vemos a situação se repetir nos dias atuais: existem milhares de pessoas que receberam educação moral, proveniente de diferentes interpretações religiosas. Entretanto, não aceitam o convite de se me- lhorarem. Preferem atender às sensações imediatistas e transitórias da vida material, numa clara manifestação de egoísmo tiranizante. Vivem como sonâmbulos que, indiferentes aos benefícios espirituais recebidos na existência, não avaliam o preço que terão de pagar por este descaso. Neste sentido, um amigo espiritual esclarece: Melhor é aquele que se julga insignificante e vive cercado de servos, com os quais trabalha para o bem comum, do que o homem pregui- çoso e inútil, faminto de pão, mas sempre interessado em honrar a si mesmo. [...] Enquanto as mãos do ímpio tecem a rede dos males, prepara com o teu esforço a colheita das bênçãos. Tudo passa no mundo. O mentiroso pagará pesados tributos. O desapiedado ferirá a si mesmo. O imprudente acordará nas sombras da própria queda. O avarento será algemado às riquezas que amontoou. O revoltado estará em trevas. Mas o homem justo e diligente vencerá o mundo.8 Os primeiros convidados podem representar, também, “[...] os doutos, os ricos, os sábios, os aristocratas, os sacerdotes, porque ninguém melhor do que estes estavam em condições de participar das bodas [...]”.5 » Depois, enviou outros servos, dizendo: Dizei aos convidados: Eis que tenho o meu jantar preparado, os meus bois e às bodas. Porém eles, não fazendo caso, foram, um para o seu campo, e outro para o seu negócio; e, os outros, apoderando-se dos servos, os ultrajaram e mataram. E o rei, tendo notícias disso, encolerizou-se, e, enviando os seus exércitos, destruiu aqueles homicidas, e incendiou a sua cidade (Mt 22:4-7). Com o ritualismo imposto pelas diferentes castas sacerdotais, a religião judaica revelou, à época de Jesus, grandes desvirtuamentos. A Lei de Deus, sintetizada nos Dez Mandamentos, era letra morta, mantida no esquecimento. Foi quando o Pai enviou-lhes Jesus para lembrá-los dos compromissos morais e espirituais assumidos. O mal chegara ao cúmulo; a nação, além de escravizada, era esfacelada pelas facções e dividida pelas seitas; a incredulidade atingira mesmo o santuário. Foi então que apareceu Jesus, enviado para os chamar à ob- servância da Lei e para lhes rasgar os horizontes novos da vida futura. Dos primeiros a ser convidados para o grande banquete da fé universal, eles repeliram a palavra do Messias celeste e o imolaram. Perderam EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 6 181 assim o fruto que teriam colhido da iniciativa que lhes coubera. Fora, contudo, injusto acusar-se o povo inteiro de tal estado de coisas. A responsabilidade tocava principalmente aos fariseus e saduceus, que sacrificaram a nação por efeito do orgulho e do fanatismo de uns e pela incredulidade dos outros. São, pois, eles, sobretudo, que Jesus iden- tifica nos convidados que recusam comparecer ao festim das bodas.3 O número de cristãos que segue o Evangelho ainda é pouco. Em geral, são pessoas que ouvem, leem, falam, interpretam e pregam as verdades imortais, mas pouco se esforçam para vivenciá-las. Não se revelam preocupadas com a salvação da própria alma. Estão sempre adiando, indefinitivamente, o momento da transformação espiritual: no próximo ano, no futuro, na reencarnação seguinte... São criaturas tão absorvidas com o dia a dia que não sentem necessidade do Evangelho — indicadas no registro de Mateus como os que foram para o “campo” e foram cuidar dos “negócios” —, sem se darem conta do mal que infligem em si mesmas. O tesouro que trazem no coração é o amor pelo dinheiro e pela aquisição de bens; pela realização de negócios lucrativos; pela vivência de prazeres. A negligência e a indiferença pelas coisas espirituais simbolizam o “ultraje” e a “morte” dos servos, ilustrados na parábola. O versículo sete “E o rei, tendo notícias disso, encolerizou-se, e, enviando os seus exércitos, destruiu aqueles homicidas, e incendiou a sua cidade”. faz referência à manifestação da lei de causa e efeito. No caso dos judeus, a história relata os sofrimentos que passaram ao longo dos tempos, a começar com o ocorrido no ano 70 d.C. foram truci- dados pelos romanos, e sua capital, Jerusalém, foi quase totalmente destruida como relata, com detalhes, Flávio Josefo, o historiador da Antiguidade, em seu livro História dos hebreus. » As bodas, na verdade, estão preparadas, mas os convidados não eram dignos. Ide, pois, às saídas dos caminhos e convidai para as bodas a to- dos os que encontrardes. E os servos, saindo pelos caminhos, ajuntaram todos quantos encontraram, tanto maus como bons; e a festa nupcial ficou cheia de convidados.E o rei, entrando para ver os convidados, viu ali um homem que não estava trajado com veste nupcial. E disse-lhe: Amigo, como entraste aqui, não tendo veste nupcial? E ele emudeceu. Disse, então, o rei aos servos: Amarrai-o de pés e mãos, levai-o e lançai-o nas trevas exteriores; ali, haverá pranto e ranger de dentes. Porque muitos são chamados, mas poucos, escolhidos (Mt 22:8-14). EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 6 182 Nestes versículos, Jesus informa “[...] que a palavra ia ser pregada a todos os outros povos, pagãos e idólatras, e estes, acolhendo-a, seriam admitidos no festim, em lugar dos primeiros convidados”.3 Sabemos que este trabalho foi realizado, após a crucificação, pelos apóstolos e alguns discípulos do Cristo, em especial o desenvolvido por Paulo de Tarso junto aos povos gentílicos. Entretanto, para participar da festa é preciso estar vestido adequadamente, com o “traje nupcial”, isto é, faz-se necessário que a pessoa traga puro o coração, livre de más intenções, ainda que não possua base religiosa ou moral significativas. “A veste de núpcias sim- boliza o amor, a humildade, a boa vontade em encontrar a verdade para observá-la [...].”6 Em síntese, é preciso que o Espírito seja guiado pelos preceitos do mandamento maior: “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo” (Mt 22:37-39). [...] não basta a ninguém ser convidado; não basta dizer-se cristão, nem sentar-se à mesa para tomar parte no banquete celestial. É pre- ciso, antes de tudo e sob condição expressa, estar revestido da túnica nupcial, isto é, ter puro o coração e cumprir a lei segundo o espírito. Ora, a lei toda se contém nestas palavras: Fora da caridade não há sal- vação. Entre todos, porém, que ouvem a palavra divina, quão poucos são os que a guardam e a aplicam proveitosamente! Quão poucos se tornam dignos de entrar no Reino dos Céus! Eis por que disse Jesus: “Chamados haverá muitos; poucos, no entanto, serão os escolhidos.”4 Dessa forma, os hipócritas, os que promovem e executam lutas fratricidas, desuniões e perturbações; os egoístas, os orgulhosos e vai- dosos; os falsos profetas e falsos cristos, oportunistas e embusteiros, que enganam as pessoas sob a aparência de bondade e de religiosidade; os que se mantêm indiferentes ao sofrimento do próximo, e que traficam com as coisas celestiais para obtenção de vantagens materiais, todos eles, serão retirados da festa por não vestirem o “traje nupcial”. Tais criaturas serão, portanto, conduzidos a reencarnações dolorosas, representadas, no texto, como “trevas exteriores” onde haverá “pranto e ranger de dentes”. Para que atinjamos no mundo, o Reino de Deus, não nos pede o Senhor peregrinações de sacrifício a regiões particulares; espera, entretanto, demonstremos coragem suficiente para viver, dia por dia, no exato cumprimento de nossos deveres, na viagem difícil da reencarnação. Não exige nos diplomemos nos preceitos gramaticais do idioma [...]; espera, porém, que saibamos dizer sempre a palavra equilibrada e re- confortante[...]. Não nos obriga a renúncia dos bens terrenos; espera, EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 6 183 todavia, que nos dediquemos a administrálos sensatamente [...]. Não nos impele as ginásticas especiais para o desenvolvimento prematuro de forças físicas e psíquicas; espera, entretanto, nos esforcemos para barrar pensamentos infelizes, dominando as nossas tendências infe- riores. Não nos solicita a perfeição moral de um dia para outro; espera, contudo, nos disponhamos a cooperar com ele, suportando injúrias e esquecendo-as, em favor do bem comum. Não nos determina sistemas sacrificiais de alimentação [...]; espera, porém, sejamos no respeito ao corpo que a lei da reencarnação nos haja emprestado [...]. Não nos aconselha o afastamento da vida social [...]; espera, no entanto, que exerçamos é bondade e paciência, perdão e amor [...]. Jesus não nos pede o impossível; solicita-nos apenas a colaboração e trabalho na medida de nossas possibilidades humanas, cabendo-nos, porém, observar que, se todos aguardamos ansiosamente o mundo feliz de amanhã, é preciso lembrar que, assim como um edifício se levanta da base, o Reino de Deus começa de nós.7 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 18, item 2, p. 324. 2. _____._____. p. 325. 3. _____._____. p. 326. 4. _____._____. p. 327. 5. SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e ensinos de Jesus. 20. ed. Matão: O Clarim, 2004. Item:Parábola das bodas, p. 72. 6. _____._____. p. 74. 7. XAVIER, Francisco Cândido. Alma e coração. Pelo Espírito Emmanuel. São Paulo: Cultix, 2006. Item: Para o reino de Deus, p. 33-34. 8. _____. Falando à terra. Por diversos Espíritos. 6. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002. Cap. De Salomão – mensagem de Souza Caldas, p. 161-162. Orientações ao monitor Ler em voz altar o texto evangélico que trata do festim das bodas, (Mateus, 22:1-14), pedindo à turma que acompanhe a leitura. Em seguida, solicitar aos participantes que apresentem o resultado da pes- quisa, indicada na reunião anterior como atividade extraclasse. Ouvir os relatos, comentando-os. Realizar uma exposição dialogada conclusiva dos assuntos, correlacionando-os com a vivência no mundo atual. EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 7 O TESOURO E A PÉROLA Objetivos » Interpretar as parábolas do tesouro escondido e da pérola de grande valor, à luz do entendimento espírita. Ideias principais » As duas parábolas colocam em relevo o estado de plenitude es- piritual, simbolizado na expressão “Reino dos céus”, situação em que o indivíduo se desfaz do apego às posses dos bem materiais. Compreende então que a [...] riqueza real é atributo da alma eterna e permanece incorruptível naquele que a conquistou. Emmanuel: Ceifa de luz. Cap. 11. » O homem que encontrou o tesouro escondido no campo ou o nego- ciante que achou a pérola de grande valor são Espíritos que souberam vivenciar a lei de amor, sublimando as suas conquistas espirituais. Trabalharam incessantemente pela conquista do “Reino dos céus”, por entenderem que para se granjear um lugar neste reino, são necessárias a abnegação, a humildade, a caridade em toda a sua celeste prática, a benevolência para com todos. [...]. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. II, item 8. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 7 186 Subsídios 1. Texto evangélico Também o Reino dos céus é semelhante a um tesouro escondido num campo que um homem achou e escondeu; e, pelo gozo dele, vai, vende tudo quanto tem e compra aquele campo. Outrossim, o Reino dos céus é semelhante ao homem negociante que busca boas pérolas; e, encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo quanto tinha e comprou-a. (Mateus, 13:44-46.) No capítulo 13 de Mateus há seis parábolas que fazem referência direta ao “Reino dos céus”: a do trigo e do joio; do grão de mostarda; do fermento; do tesouro escondido; da pérola e a da rede. Nas parábolas do “tesouro oculto no campo” e da “pérola de grande valor”, Jesus enfatiza a felicidade e a ventura de quem encontra tais riquezas, a ponto de dispor todos os demais bens que possui. Em ambas histórias predomina o sentido de transformação espiritual, pela aquisição de virtudes. Jesus aqui nos adverte de que a verdadeira finalidade de nossa vida terrena é obtermos a riqueza espiritual. Tão logo chegarmos a com- preender que a real felicidade não consiste na posse transitória das coisas do mundo, de bom grado passaremos a trabalhar ativamente para entrarmos na posse dos bens espirituais. É assim como o homem que vendeu tudo o que tinha para comprar o campo e o negociante de pérolas que trocou tudo por uma pérola de alto preço, assim também nós, quando compreendermos o valor dos bens espirituais, tudo trocaremos por eles. Quaisquer sacrifícios serão pequenos para realizarmos o reino de Deus no íntimo de nossa alma.2 O processo de aquisição de bens espirituais é variável de indi- víduo para indivíduo, entretanto, há um momento decisivo na vida de cada um, caracterizado pela transformação definitiva no bem, ou de conquista do “Reino dos céus”. Na infância da Humanidade, o homem só aplica a inteligência à cata do alimento, dos meios de se preservar das intempéries e de se defender dos seus inimigos. Deus, porém, lhe deu, a mais do que outorgou ao animal, o desejo incessante do melhor, e é esse desejo que o impele à pesquisa dos meios de melhorar a sua posição [...]. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 7 187 Pelas suas pesquisas, a inteligência se lhe engrandece, o moral se lhe depura. Às necessidades do corpo sucedem as do espírito: depois do alimento material, precisa ele do alimento espiritual. É assim que o homem passa da selvageria à civilização.1 2. Interpretação do texto evangélico » Também o Reino dos céus é semelhante a um tesouro escondido num campo que um homem achou e escondeu; e, pelo gozo dele, vai, vende tudo quanto tem e compra aquele campo (Mt 13:44). A parábola do tesouro escondido, de extraordinária beleza e simplicidade, aplica-se aos Espíritos que já possuem desenvolvida a capacidade de discernimento relativa às suas reais necessidades para a edificação de uma vida feliz. Graças [...] aos ensinos espíritas, aos Espíritos do Senhor, hoje é muito fácil ao homem achar esse tesouro. Mais difícil lhe pode ser, “vender o que tem e comprar o campo”, isto é, desembaraçar-se das suas velhas crenças, do egoísmo, do preconceito, do amor aos bens terrestres, para possuir os bens celestes. Materializado como está, o homem prefere sempre os bens aparentes e perecíveis, porque os considera positivos; os bens reais e imperecíveis ele os julga abstratos. A Parábola do Tesouro Escondido é significativa e digna de meditação: o homem terreno morre e fica sem seus bens; o homem espiritual permanece para a vida eterna e o tesouro do Céu, que ele adquiriu é de sua posse permanente.3 A expressão “Reino dos céus”, citada no texto evangélico, não se refere a um lugar específico, situado no plano físico ou no espiritual. De acordo com o entendimento espírita, indica “estado de alma” ou de plenitude espiritual. Afirma Jesus que o Reino de Deus não vem com aparência exterior. É sempre ruinosa a preocupação por demonstrar pompas e números vai- dosamente, nos grupos da fé. Expressões transitórias de poder humano não atestam o Reino de Deus. A realização divina começará do íntimo das criaturas, constituindo gloriosa luz do templo interno. Não surge à comum apreciação, porque a maioria dos homens transitam semicegos, através do túnel da carne, sepultando os erros do passado culposo.6 A parábola informa que o tesouro que o homem encontrou no campo causou-lhe imensa felicidade, tão pura e verdadeira que ele correu e vendeu tudo que o possuía, a fim de adquirir aquele campo. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 7 188 Percebe-se, claramente, o sentido simbólico deste ensinamento de Jesus: otesouro encontrado representa o ápice do esforço humano de transformação para o bem. Trata-se de um marco de grande significân- cia, que faz o Espírito ascender de um patamar evolutivo para outro. É por este motivo que ele abre mão de todos as suas posses, passando a viver a vida do Espírito. O “campo”, local onde o tesouro foi encontrado, indica o plano onde são desenvolvidas as experiências do aprendizado humano: na existência física, durante as reencarnações; no além-túmulo, nos es- tágios realizados nos diferentes planos vibracionais. Neste contexto, é importante não deixar passar as oportunidades de crescimento espiritual que nos alcançam a existência, em geral ma- nifestadas sob a forma de provas. É preciso exercitarmos a faculdade de “ver” e “ouvir”, segundo o Espírito. O egoísta fala de seu tesouro, exaltando as posses precárias; o avarento refere-se a mesquinhas preocupações; o gozador demonstra apetites insaciáveis; o fanático repete pedidos loucos. Cada qual apresenta seu capricho ferido como a dor maior. Cristo ouve-lhes as solicitações e espera a oportunidade de dar-lhes a conhecer o tesouro imperecível.5 » Outrossim, o Reino dos céus é semelhante ao homem negociante que busca boas pérolas; e, encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo quanto tinha e comprou-a (Mt 13:45-46). As pérolas verdadeiras costumam ser muito caras, em razão das dificuldades para capturá-las e pelo tempo consumido em sua produção por um certo tipo de animal marinho: o molusco. As pérolas crescem no interior das conchas desses moluscos que vivem nas águas profundas dos mares, sendo constituídas de secreções solidificadas e opacas, expe- lidas do corpo deste animal marinho, quando ele é seriamente ferido. A beleza e o brilho da pérola só se revelam quando expostos à luz do Sol. Nada mais justo, pois, Jesus comparar o Reino dos Céus a uma pérola de grande valor que, ao ser encontrada pelo negociante, vendeu tudo o que tinha para tê-la consigo. À semelhança da produção da pérola, o homem que alcança o Reino dos céus passou por muitas provações e dores; foi “ferido” em diferentes oportunidades, durante o seu processo de ascensão. Su- perados, porém, tais desafios, ele sai da “concha” e resplandece a sua luz espiritual, à vista de todos. Somente assim, após ter passado pela EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 7 189 forja das dores e das lágrimas, consegue revelar a beleza e o brilho do cabedal de virtudes que conquistou. O homem vale mais que o mundo com as suas jazidas, os seus dia- mantes, e toda a sorte de pedras preciosas. Não obstante, o homem, esquecido de seu valor intrínseco, cujo preço é inestimável, consome-se e esgota-se na conquista do que é perecível, daquilo cujo valor é muito discutível, visto como só vale mediante certa convenção estabelecida pelos caprichos e veleidades do mesmo homem. [...] Mas o verdadeiro valor está interior do homem: está no seu caráter, nos seus sentimentos, na sua inteligência [...]: é o Espírito, é a alma, o eu imortal, sede das faculdades e poderes cuja origem é divina.4 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 25, item 2, p. 406. 2. RIGONATTI, Eliseu. O evangelho dos humildes. 15. ed. São Paulo: Pensamento, 2003. Cap. XIII (A parábola do semeador), item: parábolas do tesouro escondido, da pérola, da rede, p. 137-138. 3. SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e ensinos de Jesus. 20. ed. Matão: O Clarim, 2004. Item: Parábola do tesouro escondido, p. 41-42. 4. VINÍCIUS (Pedro de Camargo). O mestre na educação. 8. ed. 2005. Cap. 19 (Valor im- perecível), p. 87-88. 5. XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, verdade e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 64 (O tesouro maior), p. 143-144. 6. _____._____. Cap. 107 (Vinda do reino), p. 229-230. Orientações ao monitor Realizar uma exposição dialogada com a turma, contemplando as ideias desenvolvidas neste Roteiro. Em sequência, pedir aos parti- cipantes que se organizem em pequenos grupos, tendo como incum- bência a elaboração de um plano que retrate procedimentos, ações ou atividades que possam auxiliar alguém a descobrir o tesouro do Reino dos céus no campo da existência humana. Utilizar os subsídios deste Roteiro como referência. Solicitar a apresentação das linhas gerais do plano, em plenária, opinando a respeito. EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 8 A PARÁBOLA DO RICO E DE LÁZARO Objetivos » Interpretar a Parábola do homem rico e do pobre Lázaro, à luz do entendimento espírita. Ideias principais » Vemos representados nesta parábola os dois extremos: opulência e miséria. Ricos e pobres são Espíritos em provação. A indigência é uma prova dura. A riqueza é uma prova perigosa. [...] Vinícius (Pedro de Camargo): Nas pegadas do mestre. Cap. Lázaro e o rico. » Se a riqueza houvesse de constituir obstáculo absoluto à salvação dos que a possuem, conforme se poderia inferir de certas palavras de Jesus, interpretadas segundo a letra e não segundo o espírito, Deus, que a concede, teria posto nas mãos de alguns um instrumento de perdição, sem apelação nenhuma, ideia que repugna à razão. [...] Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. 16, item 7. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 8 192 Subsídios 1. Texto evangélico Ora, havia um homem rico, e vestia-se de púrpura e de linho finís- simo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente. Havia também um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagas à porta daquele. E desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas. E aconteceu que o mendigo morreu e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; e morreu também o rico e foi sepultado. E, no Hades, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão e Lázaro, no seu seio. E, clamando, disse: Abraão, meu pai, tem misericórdia de mim e manda a Lázaro que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro, somente males; e, agora, este é consolado, e tu, atormentado. E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá, passar para cá. E disse ele: Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos, para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham também para este lugar de tormento. Disse-lhe Abraão: Eles têm Moisés e os Profetas; ouçam-nos. E disse ele: Não, Abraão, meu pai; mas, se algum dos mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam. Porém Abraão lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite. (Lucas, 16:19-31.) Esta parábola analisa algumas questões fundamentais relativas à riqueza: utilidade, emprego e provas; desigualdades socioeconômi- cas; apego aos bens materiais. Proclama, também, a importância da prática da caridade e revela as consequências do egoísmo, do orgulho e da humildade, assim como do desprendimento das coisas materiais. A utilidade e benefício providencial da riqueza é o controle da po- breza, não um obstáculo à melhoria de quem a possui. É um instrumento de progresso espiritual como tantos outros disponibilizados por Deus. Sem dúvida, pelos arrastamentos a que dá causa, pelas tentações que gera e pela fascinação que exerce, a riqueza constitui uma prova muito arriscada, mais perigosa do que a miséria. É o supremo excitante do EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 8 193 orgulho, do egoísmo e da vida sensual. É o laço mais forte que pren- de o homem à Terra e lhe desvia do céu os pensamentos. Produz tal vertigem que, muitas vezes, aquele que passa da miséria à riqueza esquece de pronto a sua primeira condição, os que com elea par- tilharam, os que o ajudaram, e faz-se insensível, egoísta e vão. Mas, do fato de a riqueza tornar difícil a jornada, não se segue que a torne impossível e não possa vir a ser um meio de salvação para o que dela sabe servir-se [...].1 O emprego correto da riqueza impulsiona o progresso por meio dos trabalhos desenvolvidos pelos homens. Com efeito, o homem tem por missão trabalhar pela melhoria material do planeta. Cabe-lhe desobstruí-lo, saneá-lo, dispô-lo para receber um dia toda a população que a sua extensão comporta. A atividade que esses mesmos trabalhos impõem lhe amplia e desenvolve a inteligên- cia, e essa inteligência que ele concentra, primeiro, na satisfação das necessidades materiais, o ajudará mais tarde a compreender as grandes verdades morais. Sendo a riqueza o meio primordial de execução, sem ela não mais grandes trabalhos, nem atividade,nem estimulante, nem pesquisas. Com razão, pois, é a riqueza considerada elemento de progresso.2 2. Interpretação do texto evangélico » Ora, havia um homem rico, e vestia-se de púrpura e de linho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente. Havia também um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagas à porta daquele. E desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas (Lc 16:19-21). O rico e Lázaro personificam os extremos de duas classes socio- -econômicas existentes na Humanidade: uma possuidora de recursos e facilidades concedidas pela riqueza: bens (“homem rico”); vestimentas (“vestia-se de púrpura e linho finíssimo”), alimentação e confortos (“vivia todos os dias regalada e esplendidamente”). A outra pobre e portadora de dificuldades decorrentes da privação ou escassez de bens materiais: extrema pobreza ou miséria (“certo mendigo, chamado Lázaro”), enfermidades (“que jazia cheio de chagas”), fome (“e desejava alimentar-se com migalhas”), ausência de cuidados básicos de saúde (“os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas”). EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 8 194 Este rico que vestia de púrpura e que todos os dias se regalava es- plendidamente, é o símbolo daqueles que querem tratar da vida do corpo e esquecem-se da vida da alma. São os que buscam a felicidade no comer, no beber e no vestir; são os que se entregam a todos os gozos da matéria, são os egoístas que vivem unicamente para si, os orgulhosos que, entronados nos altares das paixões vis, da vaidade, da soberba, não veem senão o que pode saciar a sede de prazeres, não cultivam senão a luxúria, que mata os sentimentos afetivos e anula os dotes do coração.4 A riqueza é um meio concedido por Deus para avaliar a sabedoria e a bondade do ser humano. É forma de testar-lhe a capacidade moral. “[...] Dando-lhe o livre-arbítrio, quis Ele que o homem chegasse, por experiência própria, a distinguir o bem do mal [...]. Cada um tem de possuí-la, para se exercitar em utilizá-la e demonstrar que uso fazer dela.”3 Representa [...] os excluídos da sociedade terrena, aqueles que, quando muito, pode chegar ao portão dos grandes templos, aqueles que não podem atravessar os umbrais dos palácios dourados, aqueles que essa sociedade corrompida do mundo despreza, amaldiçoa, cobre de labéus [desonra], crava de setas venenosas que lhes chagam o corpo todo.5 Os lázaros da parábola simbolizam todos os que, a despeito da difícil situação em que vivem, sofrem com resignação, por compreen- derem que os bens do mundo são passageiros. São Espíritos que con- fiam em Deus, em sua bondade e misericórdia. Ainda que submetidos às dolorosas provações, determinadas pela lei de causa e efeito, não se revoltam, mas mantêm-se pacientes, guiando-se pela esperança em dias melhores, no futuro, após o ressarcimento de suas faltas. Outro ponto relevante da parábola diz respeito ao que é neces- sário e ao que é supérfluo na vida, temas estudados nas questões 704 a 710 de O livro dos espíritos em O evangelho segundo o espiritismo, capítulos IX e XVI, itens 5 e 14, respectivamente. É preciso refletir sobre as implicações morais dos desperdícios, considerando o estado de fome e miséria existente no mundo. A sobra em todas as situações é o agente aferidor do nosso ajustamento à Lei eterna que estatui sejam os recursos do Criador divididos justi- ficadamente por todas as criaturas, a começar pela bênção vivificante do Sol. É assim que o leite a desperdiçar-Se, na mesa, é a migalha de EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 8 195 alimento que sonegas à criancinha órfã de pão, tanto quanto a roupa a emalar-se, desnecessária, no recanto doméstico, é o agasalho que deves à nudez que a noite fria vergasta. [...] Não olvides, assim, que toda sobra desaproveitada nos bens que desfrutas, por efeito de empréstimo da Providência maior, se converte em cadeia de retaguarda, situando-te pensamentos e aspirações na cidadela da sombra. E, repartindo com o próximo as vantagens que te enriquecem os dias, seguirás, desde a Terra, pelos investimentos do amor puro e incessante, em direitura à Plenitude celestial.11 » E aconteceu que o mendigo morreu e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; e morreu também o rico e foi sepultado. E, no Hades, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão e Lázaro, no seu seio. E, clamando, disse: Abraão, meu pai, tem misericórdia de mim e manda a Lázaro que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro, somente males; e, agora, este é consolado, e tu, atormentado. E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá, passar para cá (Lc 16:19-21). Os efeitos de nosso proceder durante a existência atual vão refletir- -se na outra vida. O rico banqueteava-se, ria, folgava. Lázaro gemia, chorava resignadamente. Vem a morte e a ambos arrebata, porque a morte é inexorável. O corpo para o túmulo, a alma para o Juízo. A consciência é a faculdade que o Espírito possui de refleti sobre si mes- mo a luz da divina justiça. Cada um traz consigo o seu juiz. Por isso o rico se viu envolvido nas chamas devoradoras do remorso, enquanto Lázaro fruía o repouso do justo.8 Cairbar Schutel compara a situação do rico e a de Lázaro, no além-túmulo, com os dois lados de uma moeda, ou medalha, esclare- cendo sobre as dificuldades de compreender o que cada face simboliza, efetivamente. O [...] mendigo vai para a abundância, e o rico é que passa a mendigar! É o reverso da medalha. Vós tendes visto muitas medalhas? Figuremo- -las numa libra esterlina: de um lado traz a figura do rei [ou rainha], mas, do outro o seu valor real. [...] Cada um de nós é uma medalha; e como medalha, a libra de ouro vale segundo o câmbio corrente, assim EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 8 196 também nós valemos de acordo com o câmbio espiritual, que taxa o valor das nossas almas. Aqueles que olham só a efígie, não conhecem o valor do dinheiro [...]. Assim também os que olham o homem só pelas aparências, pelo exterior, não conhecem o homem, porque o exterior do homem é a efígie da vaidade, do egoísmo e do orgulho. O que vale na moeda é o reverso; o que vale no homem é o interior, ou seja, o Espírito. O rico trazia no verso o característico do rei, mas, depois que morreu, mas, depois que morreu, apurou-se o valor da medalha gravado no reverso, e esse valor não permitiu o rico senão uma “entrada” no Hades [submundo, “inferno”].6 A situação de Lázaro, no plano espiritual, é de alguém vitorioso que, ao vencer a prova da pobreza, desenvolveu também a paciência, a humildade e a fé. Esta é a razão de sua felicidade, compartilhada junto a Abraão, o grande patriarca do povo hebreu. O rico por sua vez, fa- lhou na prova, uma vez que a riqueza lhe obliterou os sentimentos de amor ao próximo, desenvolveu-lheo egoísmo, acirrou-lhe o orgulho, “[...] tornando-o homem licencioso, amigo de bebedices e deleites”.7 Merece comentário o significado da palavra “abismo” existente nestes versículos: “E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá, passar para cá”. “Abismo” indica a distância evolutiva que há entre um e outro Espírito. Nesta situação, Lázaro não pode retroceder à posição anteriormente ocupada porque, pelas provações sabiamente suportadas, ascendeu na escala espiritual. Por outro lado, o rico não possuía, ainda, qualidades que o colocasse em um nível mais adiantado. Por este motivo esclarece Abraão: “de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá, passar para cá”. O sofrimento e o remorso, vivenciados pelo rico, e as benesses desfrutadas por Lázaro, no plano espiritual, são representativas da palavra “abismo.” Abismo de ordem moral, visto que como Abraão e o rico se viam e conversava. Para o Espírito culpado ou falido se reabilitar não basta o arrependimento, que é o primeiro passo a dar; é necessária a reparação. Portanto o rico não podia ser atendido em seu pedido. Cumpria-lhe voltar à Terra, e reparar o mal.9 EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 8 197 A súplica do rico (“Abraão, meu pai, tem misericórdia de mim e manda a Lázaro que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama”) revela que ele não só reconheceu as dificuldades em que se encontrava, como soube curvar a cabeça e pedir auxílio. Não era, pois, um rico tão orgulhoso; talvez tenha sido mais negligente ou indiferente ao sofrimento do próximo do que propriamente mau. » E disse ele: Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos, para que lhes dê testemunho, a fim de que não ve- nham também para este lugar de tormento. Disse-lhe Abraão: Eles têm Moisés e os Profetas; ouçam-nos. E disse ele: Não, Abraão, meu pai; mas, se algum dos mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam. Porém Abraão lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite (Lc 16:22-31). É admirável a persistência do rico em minorar, de alguma for- ma, as consequências do mau uso da riqueza: se não podia, naquele momento, reparar as ações cometidas, tentou beneficiar os seus fami- liares que ainda permaneciam reencarnados. Esta característica da sua personalidade indica que ele não era também pessoa excessivamente egoísta. Existiam aqueles que eram objeto de sua preocupação, ainda que restrita ao círculo familiar. Lázaro fortificou-se na dor: resistiu, venceu, subiu. O mesmo rico, apesar de sucumbir, tirou sérios proveitos da própria queda. Acordou para a realidade, arrependeu-se, humilhou-se e mostrou interesse pela sorte dos irmãos; numa palavra: as cordas de seus sentimentos despertaram. Ele viu Lázaro. Não viu os demais. Certamente Lázaro não era o único habitante da celestial mansão; mas, cumpria que o rico o visse, porque fora sobre ele que incidira a dureza do seu coração. O algoz deve ver e reconhecer sua vítima.7 A resposta de Abraão é sábia: o testemunho de um Espírito desencarnado não seria jamais considerado, tendo em vista que Espíritos de categoria superior, como Moisés e os profetas, não foram acreditados. Esta resposta nos faz refletir que temos o Evangelho e a Doutrina Espírita para nos guiar e nos garantir a felicidade eterna. En- tretanto, agimos como crianças espirituais que muitas vezes desprezam as seguras orientações e se enveredam por caminhos que resultam em amargas provações. A propósito, esclarece Emmanuel: EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 8 198 A resposta de Abraão ao rico da parábola ainda é ensinamento de to- dos os dias, no caminho comum. Inúmeras pessoas se aproximam das fontes de revelação espiritual, entretanto, não conseguem a libertação dos laços egoísticos de modo que vejam e ouçam, qual lhes convém aos interesses essenciais. [...] Ninguém justifique a própria cegueira com a insatisfação do capricho pessoal. O mundo está repleto de mensagens e emissários, há milênios. O grande problema, no entanto, não está em requisitar-se a verdade para atender ao círculo exclusivista de cada criatura, mas na deliberação de cada homem, quanto a caminhar com o próprio valor, na direção das realidades eternas.10 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 16, item, 7, p. 289. 2. _____._____. p. 291. 3. _____._____. Item 8, p. 292. 4. SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e ensinos de Jesus. 20. ed. Matão: O Clarim, 2004. Item:Parábola do rico e Lázaro, p. 133. 5. _____._____. p. 134. 6. _____._____. p. 135. 7. VINÍCIUS (Pedro de Camargo). Nas pegadas do mestre. 11. ed. 2007. Cap. Lázaro e rico, p. 156. 8. _____._____. p. 156-157. 9. _____._____. p. 157. 10. XAVIER, Francisco Cândido. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 29. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 116 (Ouçam-nos), p. 247-248. 11. _____. Religião dos espíritos. Pelo Espírito Emmanuel. 20. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. Sobras, p. 37-38. Orientações ao monitor Após uma rápida introdução do assunto, pedir a turma que se organize em grupos, cabendo a cada um a tarefa de ler, trocar ideias e apresentar, em plenária, a conclusão da atividade grupal. Como su- gestão, caberia a cada grupo analisar uma parte do texto evangélico e os respectivos comentários espíritas, constantes da divisão proposta nos subsídios deste Roteiro. EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 9 O AMIGO IMPORTUNO Objetivos » Explicar, à luz da Doutrina Espírita, a parábola do amigo importuno. Ideias principais » A parábola do amigo importuno é um teste que define a verda- deira amizade. » Revela que, [...] aqui mesmo na Terra, se recorrermos a um amigo quando tenhamos necessidade de um favor, haveremos de o conseguir. [...] Rodolfo Calligaris: Parábolas evangélicas. Cap. Parábola do amigo importuno. » Toda gente no mundo pode consolar a miséria e partilhar as aflições, mas raros aprendem a acentuar a alegria dos entes amados, multiplicando-a para eles, sem egoísmo e sem inveja no coração. O amigo verdadeiro, porém, sabe fazer isto. Neio Lúcio. Alvorada cristã. Cap. 18. » “O amor sobrepuja a fé, a esperança, a beneficência, o profetismo e o sacrifício” — preceitua o Apóstolo dos Gentios. No amor se contém a Lei e os profetas — rezam os Evangelhos. “Fora do amor não há salvação” — sentencia o Espiritismo. Vinícius (Pedro de Camargo): Nas pegadas do mestre. Cap. O verbo amar. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 9 200 Subsídios 1. Texto evangélico Disse-lhes também: Qual de vós terá um amigo e, se for procurá- -lo à meia-noite, lhe disser: Amigo, empresta-me três pães, pois que um amigo meu chegou a minha casa, vindo de caminho, e não tenho o que apresentar-lhe; se ele, respondendo de dentro, disser: Não me importu- nes; já está a porta fechada, e os meus filhos estão comigo na cama; não posso levantar-me para tos dar. Digo-vos que, ainda que se não levante a dar-lhos por ser seu amigo, levantar-se-á, todavia, por causa da sua importunação e lhe dará tudo o que houver mister. (Lucas, 11:5-8.) Esta parábola nos faz refletir sobre o valor da amizade e da intercessão. Principia [a parábola] fazendo-nos compreender que, aqui mesmo na Terra, se recorrermos a um amigo quando tenhamos necessidade de um favor, haveremos de o conseguir. Pode esse amigo não nos valer imediatamente, de boa vontade, pode até relutar em atender à nossa solicitação, mas, se instarmos com ele, ainda que seja para ver-se livre de nossa importunação, acabará cedendo. Pois se desconhecidos, ou mesmo adversários, quando pedem com tato e insistência, muitas e muitas vezes são atendidos, como não o seriam aqueles que gozam da simpatiae amizade do solicitado?1 Jesus atesta que o verdadeiro amigo não se sente aborrecido pelas solicitações do amigo, que corre em acudi-lo. 2. Interpretação do texto evangélico » Disse-lhes também: Qual de vós terá um amigo e, se for procurá-lo à meia-noite, lhe disser: Amigo, empresta-me três pães, pois que um amigo meu chegou a minha casa, vindo de caminho, e não tenho o que apresentar-lhe; se ele, respondendo de dentro, disser: Não me importunes; já está a porta fechada, e os meus filhos estão comigo na cama; não posso levantar-me para tos dar (Lc 11:5-7). O registro de Lucas destaca implicações existentes nos relacio- namentos entre amigos, os quais, vezes sem conta são submetidos a EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 9 201 testes. No caso, o amigo é considerado importuno não só porque busca amparo em hora tardia, num momento de descanso, mas também para resolver problema de uma terceira pessoa que, por sua vez, lhe busca o concurso fraterno. Trata-se de uma situação em que, existindo laços de verdadeira amizade, os incômodos serão ignorados e o amigo será prontamente atendido. Na verdade, o momento mais propício para re- conhecer uma amizade verdadeira é quando passamos por dificuldades. Muitos companheiros de luta exigem cooperadores esclarecidos para as tarefas que lhes dizem respeito, amigos valiosos que lhes entendam os propósitos e valorizem os trabalhos, esquecidos de que as afeições, quanto as plantas, reclamam cultivo adequado. Compreensão não se improvisa. É obra de tempo, colaboração, har- monia. [...] Existe uma ciência de cultivar a amizade e construir o entendimento. [...] Examina, pois, diariamente, a tua lavoura afetiva. Observa se está exigindo flores prematuras ou frutos antecipados. Não te esqueças da atenção, do adubo, do irrigador. Coloca-te na posição da planta em jardim alheio e, reparando os cuidados que exiges, não desdenhes resgatar as tuas dívidas de amor para com os outros.4 Nos círculos de amizade, contudo, é comum encontrarmos amigos importunos. A despeito das qualidades que possuem e dos vínculos fraternos existentes, não possuem o necessário discernimen- to que garantem as boas relações sociais. Incomodam. Aborrecem. Estabelecem constrangimentos. Dificultam a vida em comum: uma imposição aqui, uma provocação ali. Em dado momento são gentis e dedicados, noutro são ásperos e autoritários. Num instante se revelam afáveis, gratos, bondosos, noutra ocasião se deixam levar pela aspereza do trato, pela ingratidão, pela inflexibilidade. Trata-se de situações conflitantes que exigem dos envolvidos tato, paciência e tolerância. Surgem no cotidiano determinadas circunstâncias em que somos impe- lidos a reformular apreciações, em torno da conduta de muitos daqueles a quem mais amamos. [...] EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 9 202 Nesses dias, em que o rosto dos entes amados se revela diferente, é natural que apreensões e perguntas imanifestas nos povoem o espírito. Abste- nhamo-nos, porém, tanto de feri-los, através do comentário desairoso, quanto de interpretar-lhes as diretrizes inesperadas à conta de ingrati- dão. [...] Reflitamos que se a temporária falta deles nos trouxe sensações de pesar e carência afetiva, possivelmente o mesmo lhes acontece e, em vez de reprovar-lhes as atitudes — ainda mesmo afastados pela força das circunstâncias —, procuremos envolvê-los em pensamentos de simpatia e confiança, a fim de que nos reencontremos, mais tarde, em mais altos níveis de trabalho e alegria.5 Reconhecemos que há muitos amigos importunos na vida. Nós mesmos podemos ser assim qualificados, em diferentes oportuni- dades. Como criaturas situadas em processo de ascensão espiritual, nem sempre conseguimos administrar os reflexos das ações negativas perpetradas no passado, que ainda se mantêm entranhadas na nossa personalidade. Daí a ocorrência de comportamentos cíclicos, que oscilam entre pontos opostos. “Para isso, entesouremos serenidade. Serenidade que nos sustente e nos ajude a sustentar os outros.”6 O amigo importuno deve ser amparado pelas nossas preces e tratado, vida afora, com carinho e afeto, jamais como um peso. Não lhe recusemos a presença em nossa vida: cedo ou tarde ele se ajustará perante a lei de amor, da mesma forma que nós também. Aceitemos, pois, os seus incômodos, suas aparentes imposições, agindo com retidão, sem desprezo, não lhes acatando, porém, exigências descabi- das. Estejamos com ele. Oremos por ele, oferecendo-lhe o abrigo da compreensão e da amizade. Um fato que não pode passar despercebido, na parábola, é a intercessão. O amigo importuno busca auxílio em benefício de outro por não possuir recursos próprios para auxiliar; dirige-se então a quem oferece condições para tal. A súplica da intercessão é dos mais belos atos de fraternidade e cons- titui a emissão de forças benéficas e iluminativas que, partindo do espírito sincero, vão ao objetivo visado por abençoada contribuição de conforto e energia. Isso não acontece, porém, a pretexto de obséquio, mas em conseqüência de leis justas.[...]2 Quantas vezes a Boa-Nova registra a ação de Jesus em favor dos sofredores e desvalidos por intercessão de terceiros. Recordemos, como EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 9 203 ilustração, a cura do paralítico de Cafarnaum (Lc 5:18-20) ou do cego de Betsaida (Mc 8:22-26) que são conduzidos à presença do Mestre pelo auxílio de terceiros. Sendo assim, devemos, sempre, atender os amigos, de acordo com as nossas possibilidades. Naturalmente, na pauta das possibilidades justas, ninguém deverá negar amparo ou assistência aos companheiros que acenam de longe com solicitações razoáveis [...]. A lavoura alheia e as ocorrências futuras, para serem examinadas, exigem sempre grandes qualidades de ponderação. Além do mais, é imprescindível reconhecer que o problema difícil, ao nosso lado ou a distância de nós, tem a finalidade de enriquecer-nos a experiência própria, habilitando-nos à solução dos mais intrincados enigmas do caminho. [...] Atendamos aos imperativos do serviço divino que se localiza em nossa paisagem individual, não por meio de constrangimento, mas pela boa vontade espontânea, fugindo cada vez mais aos nossos interesses particularistas e de ânimo firme e pronto para servir ao bem, tanto quanto nos seja possível.3 » Digo-vos, ainda que se não levante a dar-lhos por ser seu amigo, levan- tarse-á, todavia, por causa da sua importunação e lhe dará tudo o que houver mister (Lc 11:5-8). A questão da amizade é da maior importância no texto. Estamos ligados aos amigos pelos vínculos da simpatia. Todavia, não podemos desconhecer que eles possuem concepções de vida, conquistas e pro- cessos evolutivos próprios, diferentes dos nossos. Se um amigo nos ofende, voluntária ou involuntariamente, não devemos nos conduzir por melindres, pelas suscetibilidades ou mágoas. Nas relações fraternas faz-se necessária a presença da compreensão e da tolerância. Devemos relevar as ofensas, por maiores que sejam. O dom mais precioso que existe é a amizade. As paixões esfriam. As ilusões de cargos, de posições e de poder se desintegram como em um breve sonho. Da mesma forma, posses, dinheiro e bens desaparecem, assim como surgiram. Tudo é passageiro na existência, menos a amizade. Se bem cultivada, ela se perpetua, amplia e se fortalece ao longo do tempo. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 9 204 Devemos atender as pessoas por amizade ou solidariedade, jamais para se ver livres delas. Esta é a atitude cristã e espírita. Diante dessas considerações, podemos então fazer uma nova leitura da parábola: na verdade, o amigo importuno busca auxílio na hora mais propícia, quando surge a necessidade, e, também, por ser o momento em que será possível testar a capacidade de fraternidade de quem apresenta condições para socorrer. Colocada numa situação assim, a pessoa pode vacilar: atender o amigo, apesar do sono, do can- saço, da hora tardia etc., oudesculpar-se e não lhe prestar atendimento? Trata-se, portanto, de um momento de suma importância na vida de qualquer pessoa. A verdadeira amizade, porém, não conside- ra os sacrifícios, sabe que não deve delegar a outrem o que lhe cabe realizar. Inseridos nessas circunstâncias, ambos — o que apela por socorro e o que pode conceder auxílio —, são entrelaçados numa teia de acontecimentos, aparentemente fortuitos. É o instante em que a amizade passa pelo teste da validade. Até a hora tardia, assinalada no texto evangélico, tem razão de ser. Meia-noite indica o fim de um ciclo diário e começo de outro. Pode ser aplicado, igualmente, no encadeamento do ciclo evolutivo do ser: de um lado o teste aferidor de uma etapa concluída, do outro o início de novo processo ascensional, caso tenha ocorrido aprovação no teste. Assim, o amigo bate à porta na hora propícia, quando é possível testificar o nível de aprendizado moral de quem atende. Os desafios da amizade são muitos e acontecem ao longo da existência. Importante meditar a respeito. Neste sentido, relata-nos o Espírito Hilário Silva que quando Jesus entrou vitorioso em Jerusalém, por ocasião do “domingo de ramos”, vibravam no ar ecos de grande êxito, tendo em vista a atmosfera festiva, a alegria reinante, os cânticos, as algazarras e os perfumes no ar. “[...] Não longe, Simão Pedro, que negaria o Senhor. Judas, que o negociaria. Tomé, que o abandonaria. Tiago e João, que dormiriam descuidados, sem lhe perceberem a angústia. E toda uma legião de admiradores que, no dia seguinte, se transformariam em adversários.”7 Bartolomeu, feliz, observou a atmosfera festiva e disse, contente: — Oh! Mestre, quanta felicidade! Afinal! Afinal a glória, apesar dos perseguidores! Notando que Jesus continuava em grave silêncio, o aprendiz perguntou: EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 9 205 — Por que tristeza, Senhor, se estamos triunfando de tantos inimigos? O Cristo, porém, meneou a cabeça e, fitando a turba próxima, falou sereno: — Bartolomeu, Bartolomeu, vencer, mesmo tendo inimigos, é sempre fácil, porque os inimigos se colocam à distância, por si mesmos. E profundamente desencantado: — A batalha mais árdua é vencer com os amigos.8 Referências 1. CALLIGARIS, Rodolfo. Parábolas evangélicas. 9. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. Parábola do amigo importuno, p. 68. 2. XAVIER, Francisco Cândido. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 29. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 17 (Intercessão), p. 45-46. 3. _____._____. Cap. 26 (Trabalhos imediatos), p. 63-64. 4. _____. Vinha de luz. Pelo Espírito Emmanuel. 26. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 121 (Amizade e compreensão), p. 255-256. 5. XAVIER, Francisco Cândido; VIEIRA, Waldo. Estude e viva. Pelos Espíritos Emmanuel e André Luiz. 12. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. Amigos modificados – mensagem de Emmanuel, p. 170-171. 6. _____._____. Cap. Provações de surpresa – mensagem de André Luiz, p. 172. 7. _____. A vida escreve. Pelo Espírito Hilário Silva. 10. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 25 (Amigos), p. 105. 8. _____._____. p. 105-106. Orientações ao monitor Pedir à turma que faça leitura silenciosa do texto evangélico (Lucas, 11:5-8). Em seguida, fazer breve exposição dialogada sobre o conteúdo desenvolvido neste Roteiro. Concluída esta fase da reunião, dividir a turma em dois grupos, cabendo-lhes a leitura de um destes textos: “O verbo amar”, de autoria de Vinícius, constante no livro Nas pegadas do mestre, edição FEB; e “A amizade real”, de Neio Lúcio, psicografia de Francisco Candido Xavier, existente no livro Alvorada cristã, editado pela FEB. Ouvir os relatos das conclusões do trabalho em grupo, correlacionando-os com o texto evangélico estudado. EADE – LIVRO III | MÓDULO III ENSINOS POR PARÁBOLAS Roteiro 10 O PODER DA FÉ Objetivos » Explicar a parábola do poder da fé, à luz da Doutrina Espírita. Ideias principais » A parábola analisa duas questões imprescindíveis à melhoria espi- ritual do ser humano: o valor da fé e o esforço para desenvolvê-la. A fé necessita de uma base, base que é a inteligência perfeita daquilo que se deva crer. E, para crer, não basta ver: é preciso, sobretudo, compreender. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. XIX, item 7. » Para ser proveitosa, a fé tem de ser ativa: não deve entorpecer-se. Mãe de todas as virtudes que conduzem a Deus, cumpre-lhe velar atentamente pelo desenvolvimento dos filhos que gerou. Allan Kardec: O evangelho segundo o espiritismo. Cap. 19, item 11. » A fé inoperante é problema credor da melhor atenção, em todos os tem- pos, a fim de que os discípulos do Evangelho compreendam, com clareza, que o ideal mais nobre, sem trabalho que o materialize, em benefício de todos, será sempre uma soberba paisagem improdutiva. Emmanuel: Fonte viva. Cap. 39. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 10 208 Subsídios 1. Texto evangélico Disseram, então, os apóstolos ao Senhor: Acrescenta-nos a fé. E disse o Senhor: Se tivésseis fé como um grão de mostarda, diríeis a esta amoreira: Desarraiga-te daqui e planta-te no mar, e ela vos obe- deceria. E qual de vós terá um servo a lavrar ou a apascentar gado, a quem, voltando ele do campo, diga: Chega-te e assenta-te à mesa? E não lhe diga antes: Prepara-me a ceia, e cinge-te, e serve-me, até que tenha comido e bebido, e depois comerás e beberás tu? Porventura, dá graças ao tal servo, porque fez o que lhe foi mandado? Creio que não. Assim também vós, quando fizerdes tudo o que vos for mandado, dizei: Somos servos inúteis, porque fizemos somente o que devíamos fazer. (Lucas, 17:5-10.) Por estes ensinamentos, Jesus esclarece que a fé possui um poder inimaginável, a ponto de “transportar montanhas”, como consta no registro de Mateus (Mt 17:20), ainda que pequena como um grão de mostarda. Esclarece, igualmente, que a fé se desenvolve por meio do trabalho incessante no bem. Não é algo que se adquire de uma hora para outra. Exige esforço, dedicação, perseverança. A pessoa que tem a fé desenvolvida confia em Deus, no seu amor e providência, mas também em si mesma, por conhecer os próprios limites e a própria capacidade de ação. Sabe que a verda- deira fé jamais é confundida com a presunção, mas que esta deve ser conjugada à humildade: Aquele que a possui deposita mais confiança em Deus do que em si próprio, por saber que, simples instrumento da vontade divina, nada pode sem Deus. Por essa razão é que os bons Espíritos lhe vêm em auxílio. A presunção é menos fé do que orgulho, e o orgulho é sempre castigado, cedo ou tarde, pela decepção e pelos malogros que lhe são infligidos.3 Por outro lado, a fé legítima “[...] dá uma espécie de lucidez que permite se veja, em pensamento, a meta que se quer alcançar e os meios de chegar lá, de sorte que aquele que a possui caminha, por assim dizer, com absoluta confiança”.2 EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 10 209 2. Interpretação do texto evangélico » Disseram, então, os apóstolos ao Senhor: Acrescenta-nos a fé. E disse o Senhor: Se tivésseis fé como um grão de mostarda, diríeis a esta amoreira: Desarraiga-te daqui e planta-te no mar, e ela vos obedeceria (Lc 17:5-6). O discípulo sincero reconhece, humilde, que perante as prova- ções nem sempre é possível demonstrar a fé que gostaria. Da mesma forma, os apóstolos pedem ao Mestre que lhes conceda a fé, como se esta fosse um bem material que pode ser transferido de uma pessoa para outra, como doação ou herança. “Ninguém pode, pois, em sã consciência, transferir, de modo integral, a vibração da fé ao Espírito alheio, porque, realmente, isso é tarefa que compete a cada um.”10 Diz-se vulgarmente que a fé não se prescreve, donde resulta alegar muita gente que não lhe cabe a culpa de não ter fé. Sem dúvida, a fé não se prescreve, nem, o que ainda é mais certo, se impõe. Não; ela se adquire e ninguém há que esteja impedido de possuí-la, mesmo entre os mais refratários. Falamos das verdades espirituaisbásicas e não de tal ou qual crença particular. Não é à fé que compete procurá-los; a eles é que cumpre ir-lhe ao encontro e, se a buscarem sinceramente, não deixarão de achá-la.5 Na verdade, o processo de aquisição da fé é trabalho cotidiano e persistente. As pessoas de caráter fraco ou que desanimam perante os obstáculos, demoram mais na construção do edifício da fé no íntimo do ser. Muitos iniciam essa aquisição através da religião, outros pelo controle mental, desenvolvido pela meditação e vontade disciplinada. Do ponto de vista religioso, a fé consiste na crença em dogmas es- peciais, que constituem as diferentes religiões. Todas elas têm seus artigos de fé. Sob esse aspecto, pode a fé ser raciocinada ou cega. Nada examinando, a fé cega aceita, sem verificação, assim o verdadeiro como o falso, e a cada passo se choca com a evidência e a razão. Levada ao excesso, produz o fanatismo. Em assentando no erro, cedo ou tarde desmorona; somente a fé que se baseia na verdade garante o futuro, porque nada tem a temer do progresso das luzes, dado que o que é verdadeiro na obscuridade, também o é à luz meridiana.4 É importante considerar que outras situações podem oferecer oportunidade de despertamento da fé. O seu desenvolvimento, porém, é outra história. Curiosidade ou sofrimento oferecem portas à fé, mas não representam o vaso divino destinado à sua manutenção. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 10 210 Em todos os lugares, observamos pessoas que, em seguida a grandes calamidades da sorte, correm pressurosas aos templos ou aos oráculos novos, manifestando esperança no remédio das palavras. O fenômeno, entretanto, muitas vezes, é apenas verbal. O que lhes vi- bra no coração é o capricho insatisfeito ou ferido pelos azorragues de experiências cruéis... [...] É imprescindível guardar a fé e a crença em sentimentos puros. Sem isso, o homem oscilará, na intranqüilidade, pela insegurança do mundo Intimo. [...] O divino mistério da fé viva é problema de consciência cristalina. Tra- balhemos, portanto, por apresentarmos ao Pai a retidão e a pureza dos pensamentos.11 Para a Doutrina Espírita “[...] a fé necessita de uma base, base que é a inteligência perfeita daquilo em que se deve crer. [...] Fé ina- balável só o é a que pode encarar de frente a razão, em todas as épocas da Humanidade”.6 Por não ignorar que a aquisição da fé é, em muitos casos, obra dos séculos, foi que Jesus optou por exaltar-lhe o poder, em resposta ao pedido que lhe dirigiram os apóstolos. Entretanto, a fé não precisa ser grandiosa, algo fora do comum, basta que seja verdadeira. Ainda que seja do tamanho de um grão de mostarda, uma semente tão pequena, se ela for exercitada, plantada no terreno da vida, ela crescerá e será capaz de trazer grande providência, ou seja, de realizar coisas prodi- giosas: deslocando montanhas (Mt 17:20) ou fazendo uma amoreira desenraizar-se e ser transportada até o mar (Lc 17:6). A árvore da fé viva não cresce no coração, miraculosamente. Qual acontece na vida comum, o Criador dá tudo, mas não prescinde do esforço da criatura. [...] A maioria das pessoas admite que a fé constitua milagrosa auréola doada a alguns espíritos privilegiados pelo favor divino. Isso, contudo, é um equívoco de lamentáveis consequências. A sublime virtude é construção do mundo interior, em cujo desdo- bramento cada aprendiz funciona como orientador, engenheiro e operário de si mesmo.9 Transportar montanhas e árvores, por ação da fé, são simbo- lismos usualmente utilizados por Jesus com o intuito de fixar um ensinamento. Não devem, pois, serem considerados literalmente. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 10 211 [...] As montanhas que a fé desloca são as dificuldades, as resistências, a má vontade, em suma, com que se depara da parte dos homens, ainda quando se trate das melhores coisas. Os preconceitos da rotina, o interesse material, o egoísmo, a cegueira do fanatismo e as paixões orgulhosas são outras tantas montanhas que barram o caminho a quem trabalha pelo progresso da Humanidade. A fé robusta dá a per- severança, a energia e os recursos que fazem se vençam os obstáculos, assim nas pequenas coisas, que nas grandes. Da fé vacilante resultam a incerteza e a hesitação de que se aproveitam os adversários que se têm de combater; essa fé não procura os meios de vencer, porque não acredita que possa vencer.1 » E qual de vós terá um servo a lavrar ou a apascentar gado, a quem, vol- tando ele do campo, diga: Chega-te e assenta-te à mesa? E não lhe diga antes: Prepara-me a ceia, e cinge-te, e serve-me, até que tenha comido e bebido, e depois comerás e beberás tu? Porventura, dá graças ao tal servo, porque fez o que lhe foi mandado? Creio que não. Assim também vós, quando fizerdes tudo o que vos for mandado, dizei: Somos servos inúteis, porque fizemos somente o que devíamos fazer (Lc 17:7-10). A fé estacionária não é produtiva, e se abala às menores contra- riedades ou provações. Está claramente representada na alegoria dos “servos inúteis”, isto é, dos servidores que nada mais fazem do que a própria obrigação, que agem de forma mecânica ou rotineira. Depois de exaltar o poder da fé, Jesus faz os apóstolos compreenderem “[...] que, para ser fortalecida, a fé tem que se apoiar em atos de benemerên- cia, em devotamento ao próximo, em renúncia pessoal em benefício dos semelhantes”.7 Os bons obreiros, os servos úteis, sabem que é preciso cultivar a fé. Daí o apóstolo Tiago ter afirmado com convicção: “Mas dirá alguém: Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me a tua fé sem as tuas obras, e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras.” (Tg 2:18) Em todos os lugares, vemos o obreiro sem fé, espalhando inquietação e desânimo. [...] E transita de situação em situação, entre a lamúria e a indisciplina, com largo tempo para sentir-se perseguido e desconsiderado. Em toda parte, é o trabalhador que não termina o serviço por que se responsabilizou ou o aluno que estuda continuadamente, sem jamais aprender a lição. Não te concentres na fé sem obras, que constitui embriaguez perigosa da alma, todavia, não te consagres à ação, sem fé no Poder divino e em teu próprio esforço. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 10 212 O servidor que confia na lei da vida reconhece que todos os patrimô- nios e glórias do Universo pertencem a Deus. Em vista disso, passa no mundo, sob a luz do entusiasmo e da ação no bem incessante, completando as pequenas e grandes tarefas que lhe competem, sem enamorar-se de si mesmo na vaidade e sem escravizar-se às criações de que terá sido venturoso instrumento. Revelemos a nossa fé, por meio das nossas obras na felicidade comum e o Senhor conferirá à nossa vida o indefinível acréscimo de amor e sabedoria, de beleza e poder.8 Referências 1. KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 19, item 2, p. 340. 2. _____._____. Item 3, p. 340. 3. _____._____. Item 4, p. 341. 4. _____._____. Item 6, p. 341-342. 5. _____._____. Item 7, p. 342. 6. _____._____. Item 7, p. 343. 7. CALLIGARIS, Rodolfo. Parábolas evangélicas. 9. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. Parábola dos servos inúteis, p. 114. 8. XAVIER, Francisco Cândido. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 36. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 26 (Obreiro sem fé), p. 69-70. 9. _____. Vinha de luz. Pelo Espírito Emmanuel. 26. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Cap. 40 (Fé), p. 99-100. 10. _____._____. p. 100. 11. _____._____. Cap. 131 (Consciência), p. 293-294. Orientações ao monitor Projetar o texto evangélico (Lucas, 17:5-10), objeto do estudo deste Roteiro. Em seguida, analisar em conjunto com a turma, de for- ma dinâmica e objetiva, a explicação que a Doutrina Espírita dá sobre a importância da fé e de como desenvolver esta virtude. Terminada esta etapa, pedir aos participantes que leiam, silenciosamente, o texto A crente interessada, de autoria do EspíritoHumberto de Campos (veja anexo). Após a leitura, promover um debate, correlacionando os assuntos estudados com as ideias desenvolvidas pelo autor do texto. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 10 213 Anexo A crente interessada* Humberto de Campos Dona Marcela Fonseca vivia os últimos instantes na Terra. Não obstante a gravidade do seu estado orgânico, a agonizante mantinha singular lucidez e dirigia-se à família, com voz comovedora: — A confiança em Deus não me abandonará... A celeste mise- ricórdia nunca desatendeu minhas rogativas... O Mestre divino estará comigo na transição dolorosa... Alguns parentes choravam, em tom discreto, buscando, em vão, reter as lágrimas, no amarguroso adeus. — Não chorem, meus amigos — consolava-os dona Marcela — o Espírito de minha mãe, que tantas vezes há socorrido minha alma, há de estender-me os braços generosos!... Há mais de trinta dias, sofro neste leito pesado de tormentos físicos. Que representa a morte senão a desejada bênção para mim, que estou ansiosa de liberdade e de novos mundos?!... Se me for permitido, voltarei muito breve a confortá-los. Não esquecerei os companheiros em tarefas porvindouras. Creio que a morte não me oferecerá dilacerações, além da saudade natural, por motivo do afastamento... Sempre guardei minha crença em Deus, não só na qualidade de católica e protestante, como também no que se refere ao Espiritismo, que abracei tomada de sincera confiança... com o mesmo fervor de minha assistência às missas e cultos evangélicos, dei-me às nossas sessões esperando assim que nada me falte nos ca- minhos do Além... Devemos aguardar as esferas felizes, os mundos de repouso e redenção!... Os familiares presentes choravam comovidíssimos. Dona Marcela calou-se. Depois de longos minutos de me- ditação, pediu fossem recitadas súplicas à Providência divina, * XAVIER, Francisco Cândido. Reportagens de além-túmulo. Pelo Espírito Humberto de Campos. 10. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004. Cap. 32, p. 225-231. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 10 214 acompanhando-as em silêncio. Suor gelado banhava-lhe o corpo emagrecido e, pouco a pouco, perceberam os circunstantes que a agonizante exalava os últimos suspiros. Qual sucede na maioria dos casos, portas adentro da sociedade comum, a câmara mortuária transformou-se imediatamente em zona de prantos angustiosos, onde os que não choravam se referiam em voz alta às virtudes da morta, e, em surdina, aos seus defeitos. A desencarnada, contudo, não mais permanecia no ambiente de velhos desentendimentos e reiteradas dissimulações. Sentira-se bafejada por sono caricioso e leve, após a crise or- gânica destruidora. Branda sensação de repouso adormentara-lhe o coração. Sem poder, todavia, explicar quanto durara aquele estado de tranquilidade espiritual, dona Marcela despertou num leito muito limpo, mas extremamente desguarnecido de conforto. A seu lado, uma velhinha carinhosa abraçava-a, chorando de júbilo, a exclamar: Até que enfim, querida filha! Marcela, minha adorada Marcela, que saudades do teu convívio!... A filha correspondeu às manifestações afetivas, porém, depois de fixar detidamente a paisagem nova, não disfarçou o desapontamento que lhe dominava o Espírito voluntarioso. Já não era a mesma criatura, que revelava tamanha humildade na agonia corporal. Estava agora sem o influxo das dores. Experimentava plena liberdade para respirar e mover-se. Não mais o suor incômodo, nem a martirizante dispneia a lhe torturarem o organismo. Não mais a agonizante vencida, mas a dona Marcela da estrada comum, atrabiliária, exigente, insatisfeita. Embora o impulso natural de prosseguir beijando a carinhosa mãe- zinha, não sopitou o orgulho ferido e perguntou: — Mamãe, explique-me. Por que permanece nesses trajes? Que significa esta choupana sem conforto? Que região de vida é esta, onde a vejo tão fortemente desamparada? Será crível que seja este o seu lu- gar? Não foi uma crente sincera, no curso das experiências terrestres? A velhinha, com o olhar sereno de quem não mais teme a ver- dade, acentuou resignada: — Estamos no mundo de nossas próprias criações mentais, minha filha. Segundo nossas reminiscências, fui católica funda- mente arraigada aos meus velhos princípios; contudo, não podes negar minha antiga preocupação de descansar nos esforços alheios. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 10 215 Recordas como torturava os servidores de nossa casa? Lembras minha tirania no lar, nos serviços de teu pai, nos atos da igreja? Quando acordei aqui, meus sofrimentos foram ilimitados, pois minhas criações individuais eram péssimas. As feras da inquietação, do remorso e do egoísmo observavam-me de todos os lados. Foi quando, então, roguei a Deus me permitisse destruir os trabalhos imperfeitos, para reconstruir conscientemente de novo. E aqui me tens. Tudo pobre, humilde, desvalioso, mas para mim que já desacertei demasiadamente, ferindo o próximo e desprezando as coisas sagradas, esta choupana paupérrima é a bênção do Pai, no recomeço de santas experiências. A recém-desencarnada contemplou a escassez dos objetos de serviço, fixou a miserabilidade das peças expostas, arregalou os olhos e exclamou : — Meu Deus! quantas situações estranhas! Mamãe, sempre a julguei nas esferas felizes!... Esses planos começam em nós mesmos — retrucou a genitora, com a tranquilidade da experiência vivida. Recordando as inúmeras manifestações religiosas a que em- prestara o concurso de sua presença, a senhora Fonseca redarguiu: — Não me conformo com a miséria a que a senhora parece andar presentemente habituada. E o meu lugar próprio? Visitei milhares de vezes os templos de fé, no mundo. É impossível que esteja esquecida de nossos guias e benfeitores. Onde estão Bernardino e Conrado, os amorosos diretores espirituais de nossas reuniões? Preciso interpelá- -los relativamente à minha situação. A velhinha bondosa sorriu e informou: — Ambos prosseguem na abençoada faina de orientar, distri- buindo benefícios; mas, as reuniões continuam na esfera do globo e nós nos achamos em círculo diferente. Que seria dos trabalhos terrestres, minha filha, se os servos de Deus abandonassem suas tarefas, apenas porque uma de nós fosse chamada a nova expressão de vida? Marcela entendeu o profundo alcance daquelas palavras e observou: — Qualquer outra autoridade espiritual pode servir-me. Ne- cessito receber elucidações diretas, a respeito de minha atual posição. EADE • Livro III• Módulo III • Roteiro 10 216 A velhinha carinhosa fixou na filha o olhar afetuoso e compa- decido, explicando-lhe prudentemente: — Poderei conduzir-te à presença do generoso diretor da nos- sa comunidade espiritual. Da bondade dele, recebi permissão para buscar-te no mundo. Creio, pois, que a sabedoria de nosso benfeitor será bastante aos esclarecimentos desejáveis. Com efeito, na primeira oportunidade, foi Marcela conduzida por sua mãe à presença do venerável amigo. Recebeu-as o sábio, com espontâneo carinho, o que a Srª. Fonseca interpretou como subalterni- dade, sentindo-se livre de manifestar as mais acerbas reclamações, a lhe explodirem da alma revoltada. Após minuciosa e irritante exposição, concluía lamentando: — Como sabeis, minha crença foi invariável e sincera: Na igreja católica, no templo evangélico, como no grupo espiritual, fui assídua nas manifestações de fé e nunca alvitrei a devoção. Não me conformo, portanto, com este abandono a que me sinto votada. O orientador solícito, que ouvira pacientemente a relação verbal da interlocutora, acentuou a essa altura: — Não se encontra, porém, desamparada. Autorizei sua mãe a buscá-la nas zonas inferiores, com o máximo de carinho. — Mas a própria situação de minha genitora, a meu ver, merece reparos especiais — clamou a Sra. Fonseca, intempestivamente. Sorriu o bondoso mentor ao verificar-lhe o nervosismo e ex- plicou em seguida: — Já sei. Sente-se ferida no amor à personalidade. Entretanto, talvez esteja enganada. E,