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DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 1 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPR Vívian Cristina . DEZEMBRO/2020 Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 2 VÍVIAN CRISTINA MARIA SANTOS Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros. Advogada. Mestre em Direito pela Universidade de Coimbra, Portugal. Autora de artigos publicados em revistas jurídicas e periódicos. Coautora da obra “Nova Lei de Adoção Comentada”. Professora em cursos de graduação e pós-graduação. Professora de Direito Constitucional e Direitos Humanos em preparatório para concursos. Contato: vicristinasantos@gmail.com Instagram: @humanizandodireitos Telegram: https://t.me/humanizandodireitos WhatsApp: http://bit.ly/contatohd ATENÇÃO! NÃO COMPARTILHE MATERIAL. VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS É CRIME. NÃO COLOQUE SUA NOMEAÇÃO EM RISCO! Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 https://www.instagram.com/humanizandodireitos/?hl=pt-br https://t.me/humanizandodireitos http://bit.ly/contatohd DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 3 NOÇÕES GERAIS SOBRE DIREITOS HUMANOS 1. Conceito Segundo André de Carvalho Ramos, os direitos humanos “consistem em um conjunto de direitos essenciais a uma vida digna. As necessidades humanas variam, e de acordo com o contexto histórico de uma época, novas demandas sociais são traduzidas juridicamente e inseridas na lista dos direitos humanos.” Apesar de alguns autores entenderem que não há distinção entre as expressões direitos humanos e direitos fundamentais, a doutrina majoritária faz a diferenciação entre elas. Assim, não obstante, muitas vezes, a expressão direitos humanos ser utilizada para se referir às normas de proteção da ordem jurídica interna, tecnicamente, essa referência não é correta. Os direitos protegidos no âmbito interno são os direitos fundamentais. Devemos usar o termo direitos humanos para nos referirmos a proteção internacional de tais direitos, que ampliou a proteção prevista na ordem interna. 2. Terminologia, amplitude, fundamento e conteúdo É importante distinguir a expressão direitos humanos de outras expressões que podem ser utilizadas pela doutrina, pela jurisprudência e nos próprios textos internacionais. Segundo André de Carvalho Ramos e Valério Mazzuoli, temos as seguintes expressões: Direitos das pessoas Direitos fundamentais Direitos humanos Ordem interna (estatal) Ordem internacional (sociedade internacional) Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 4 Direito natural: é uma expressão que denota o reconhecimento de direitos inerentes à natureza humana. Conforme André de Carvalho Ramos, é um conceito ultrapassado diante da constatação da historicidade dos direitos humanos. Direitos do homem: também é uma expressão de cunho jusnaturalista referente aos direitos naturais (não escritos, não positivados) aptos à proteção global do homem e válidos a qualquer tempo. É difícil encontrarmos exemplos na atualidade, visto que, os direitos estão escritos em algum documento. Para o STF, o direito à fuga e o direito à autodefesa são exemplos de direitos naturais. Existe ainda uma crítica em relação a essa expressão, ligada à determinação de gênero que faz em relação ao “homem”, sugerindo uma eventual discriminação quanto aos direitos da “mulher”, reforçando o seu desuso na atualidade. Direitos individuais: é uma terminologia considerada excludente porque apenas considera os direitos de primeira geração ou dimensão, deixando de fora os demais direitos. Liberdades públicas: também é uma expressão criticada por tratar apenas dos direitos civis e políticos (primeira geração), não abrangendo os direitos sociais, econômicos e culturais e nem os direitos difusos. É uma terminologia mais utilizada pela doutrina francesa. Direitos públicos subjetivos: é o conjunto de direitos que limita a ação estatal em benefício do indivíduo. O termo foi utilizado pela Escola Alemã de Direito Público do século XIX, sugerindo direitos contra o Estado (portanto, também deixaria de fora as outras dimensões de direitos). Direitos fundamentais: é um termo que se refere aos direitos garantidos nas Constituições dos Estados, limitados no tempo e no espaço. Por exemplo, nossos direitos garantidos na Constituição Brasileira de 1988, que apenas são válidos no território brasileiro, a partir desta Constituição. Direitos humanos: como já vimos, são os direitos protegidos em normas internacionais, especialmente em tratados internacionais. Nas palavras de Mazzuoli: “Trata-se, em suma, daqueles direitos que já ultrapassaram as fronteiras estatais de proteção e ascenderam ao plano da proteção internacional.” Se pensarmos em termos de amplitude, podemos constatar que os direitos humanos são mais amplos que os direitos fundamentais, já que, podem ser reivindicados por qualquer pessoal em qualquer condição, desde que esteja no território de um país que reconheça normas internacionais de proteção. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 5 Já os direitos fundamentais são mais restritos, pois, só valem no território do país onde estejam previstos (e nem todos valem para todas as pessoas). Ex.: os estrangeiros não podem votar, no Brasil. Os direitos humanos retiram o seu fundamento da dignidade humana. Podemos entender a dignidade como a qualidade intrínseca que se atribui a cada pessoa pelo simples fato de existir. Conforme previsto no artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.” A característica marcante do conteúdo dos direitos humanos é a indivisibilidade. Significa que os direitos civis e políticos não sobrevivem sem os direitos sociais, econômicos e culturais e direitos difusos, e vice-versa. 3. Fundamentação filosófica André de Carvalho Ramos apresenta uma breve síntese das tentativas de fundamentação dos direitos humanos. A fundamentação pode ser entendida como as razões que legitimam o reconhecimento dos direitos humanos. Podemos classificar as teorias acerca da fundamentação filosófica em três principais correntes: negacionistas, jusnaturalistas e positivistas. A corrente jusnaturalista sustenta que há normas anteriores e superiores ao direito estatal posto. Um dos grandes representantes do direito natural de inspiração divina é São Tomás de Aquino. Também os iluministas, principalmente Locke e Rousseau, retomam o racionalismo e o individualismo, trazendo a razão como fonte de direitos inerentes ao ser humano. A corrente positivista, que se desenvolveu ao longo dos séculos XIX e XX, trouxe a ideia de um ordenamento jurídico produzido pelo homem, através do conceito da pirâmide da hierarquia das leis. No topo da pirâmide, está a Constituição, pressuposto de validade de todas as demais normas do ordenamento. Os direitos humanos foram inseridos na Constituição, adquirindo status normativo superior. Como relembra André de Carvalho Ramos, “o exemplo nazista mostra a insuficiência da fundamentação do direito posto dos direitos humanos”. Nota-se o conflito entre jusnaturalistas e positivistas. Importante ainda mencionar a fundamentação moral. O conceito de direitos morais, aprofundado por Ronald Dworkin, “consiste no conjunto de direitos subjetivosoriginados diretamente de valores (contidos em princípios), independentemente da existência de prévias regras postas.” Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 6 4. Características (tópico não expresso no edital) Conforme Valério Mazzuoli, considerando a sua titularidade, natureza e princípios, é possível apresentar as seguintes características dos direitos humanos: ➢ Historicidade ➢ Universalidade ➢ Essencialidade ➢ Irrenunciabilidade ➢ Inalienabilidade ➢ Inexaurabilidade ➢ Imprescritibilidade ➢ Vedação do retrocesso (efeito cliquet) Características contemporâneas dos direitos humanos ✓ Indivisibilidade ✓ Interdependência ✓ Interrelacionariedade Na visão de André de Carvalho Ramos, são marcas distintivas dos direitos humanos: Universalidade – são direitos de todos Essencialidade – são valores indispensáveis que devem ser protegidos por todos Superioridade normativa ou preferenciabilidade – são superiores em relação às demais normas Reciprocidade – são direitos de todos e não sujeitam apenas o Estado e os agentes públicos, mas toda a coletividade 5. Gramática dos direitos humanos e interpretação conforme os direitos humanos (tópico não expresso no edital) É o estudo das normas internacionais de proteção dos direitos humanos com o objetivo de guiar o aplicador do direito à solução adequada, em especial no plano interno. Sistema global (da ONU) e dos sistemas regionais (europeu, americano e africano) de proteção dos direitos humanos, bem como os mecanismos específicos de proteção, previstos ou não tem tratados internacionais. “Cultura de direitos humanos”. Interpretação conforme os direitos humanos Princípio pro homine ou pro persona Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 7 6. Classificação dos direitos humanos (tópico não expresso no edital) 6.1 Gerações de direitos humanos O primeiro a falar em gerações foi Karel Vasak, jurista de origem tcheca, naturalizado francês, em 1979, que em uma conferência proferida no Instituto Internacional de Direitos Humanos de Estrasburgo (França), comparou as gerações à bandeira francesa e ao lema da revolução. O azul seria a liberdade, o branco a igualdade e o vermelho, a fraternidade, ou solidariedade. No Brasil, o constitucionalista Paulo Bonavides é uma das grandes referências no estudo das gerações dos direitos fundamentais. Assim, a primeira geração ou dimensão, são os direitos de liberdade, os direitos individuais, civis e políticos, que têm como marco as revoluções liberais do século XVIII na Europa e Estados Unidos. Também conhecidos como direitos de defesa. Temos como exemplos: vida, liberdade, segurança pessoal e dos bens, propriedade. Em regra, são as prestações negativas, nas quais o Estado deve proteger a esfera de autonomia do indivíduo. No entanto, como ressalta André de Carvalho Ramos (ACR): “O papel do Estado na defesa dos direitos de primeira geração é tanto o tradicional papel passivo (abstenção em violar os direitos humanos, ou seja, as prestações negativas) quanto ativo, pois há de se exigir ações do Estado para garantia da segurança pública, administração da justiça, entre outras.” A segunda geração ou dimensão, os direitos de igualdade, são os direitos sociais, econômicos e culturais. Na visão de ACR, “representa a modificação do papel do Estado, exigindo-lhe um vigoroso papel ativo, além do mero fiscal das regras jurídicas. Esse papel ativo, embora indispensável para proteger os direitos de primeira geração, era visto anteriormente com desconfiança, por ser considerado uma ameaça aos direitos dos indivíduos.”. Contudo, sob a influência das doutrinas socialistas, percebeu-se que a efetiva concretização dos direitos exige um papel ativo do Estado, que assegure uma condição material mínima de sobrevivência. Têm caráter coletivo e se concretizam, em sua maioria, a partir da atuação positiva do Estado. São frutos das lutas sociais na Europa e Américas, possuindo como marcos a Constituição mexicana de 1917 (que trouxe o direito ao trabalho e à previdência social), a Constituição de Weimar de 1919 (que estabeleceu os deveres do Estado na proteção dos direitos sociais), e no Direito Internacional, o Tratado de Versalhes, de 1919, que criou a Organização Internacional do Trabalho, reconhecendo direitos dos trabalhadores. Podemos mencionar como direitos sociais: saúde, educação, trabalho, cultura, lazer etc. (Obs.: no Brasil, a Constituição de 1934 é o grande marco da proteção desses direitos). A terceira geração ou dimensão são os direitos de fraternidade, ou solidariedade, de titularidade coletiva, chamados direitos difusos ou metaindividuais (século XX). São direitos de toda a humanidade, oriundos da constatação da vinculação do homem ao planeta Terra, com seus recursos finitos, divisão desigual de riquezas e ameaças à sobrevivência humana. Citem-se como exemplos: meio- ambiente, patrimônio histórico, direitos da criança e do adolescente, direito dos idosos, direito à paz (para Karel Vasak). Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 8 No mesmo sentido, o entendimento do STF: “Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identifica com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade.” (MS 22.164, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 30-10-1995, Plenário, DJ de 17- 11-1995.) Alguns autores já falam em uma quarta geração (para alguns autores até quinta, sexta), que seriam os novos direitos, como informática, biotecnologia, medicina genética, desenvolvimento, democracia etc., mas, tal assunto não está bem definido na doutrina. Para Paulo Bonavides (classificação trazida por Valério Mazzuoli), os direitos de quarta geração derivam da globalização dos direitos humanos, correspondendo aos direitos de participação democrática (democracia direta), direito ao pluralismo, bioética e limites à manipulação genética, fundados na defesa da dignidade humana contra intervenções abusivas do Estado ou de particulares. Bonavides defende uma quinta geração (direito da esperança), composta pelo direito à paz em toda a humanidade (Notem que o direito à paz foi classificado por Karel Vasak como um direito de terceira geração). A grande novidade seria uma sexta geração, relativa ao direito à água. Para os defensores da nova geração, “o direito fundamental à água potável, como direito de sexta dimensão, significa um acréscimo ao acervo de direitos fundamentais, nascidos, a cada passo, no longo caminhar da Humanidade. Esse direito fundamental, necessário à existência humana e a outras formas de vida, necessita de tratamento prioritário das instituições sociais e estatais, bem como por parte de cada pessoa humana.” Outra parcela da doutrina afirma que essa geração é composta pelo direito à busca pela felicidade. Fala-se ainda em uma sétima geração de direitos. Para os defensores dessa corrente, “a probidade administrativa constitui-se em direito fundamental da pessoa humana eda sociedade, que integra o direito fundamental à boa administração pública e decorre dos direitos implícitos, do regime democrático e dos princípios adotados pela Constituição Federal, revestindo-se da mesma força jurídica dos direitos fundamentais do catálogo expresso da Constituição, possuindo um caráter vinculante à administração e de plena e imediata aplicação.” Assim, teríamos o direito à probidade e à boa administração pública. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 http://www.stf.jus.br/jurisprudencia/IT/frame.asp?PROCESSO=22164&CLASSE=MS&cod_classe=376&ORIGEM=IT&RECURSO=0&TIP_JULGAMENTO=M http://www.stf.jus.br/jurisprudencia/IT/frame.asp?PROCESSO=22164&CLASSE=MS&cod_classe=376&ORIGEM=IT&RECURSO=0&TIP_JULGAMENTO=M DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 9 6.2 Teoria dos status Foi desenvolvida, no final do século XIX, por Georg Jellinek (1851-1911), no contexto de repúdio ao jusnaturalismo e defesa da ideia de que os direitos humanos devem ser previstos em normas jurídicas estatais para que possam ser garantidos e concretizados. A teoria se relaciona à posição do direito do indivíduo em face do Estado, com previsão de mecanismos de garantia a serem invocados no ordenamento estatal. Assim, a classificação é pautada no caráter positivo dos direitos e na relação vertical (desigual) entre indivíduos e Estado. Não abarca as relações entre particulares (horizontais) e nem os direitos difusos. Para Jellinek, o indivíduo pode ser encontrado em quatro situações diante do Estado: a) estado de submissão (status subjectionis ou status passivo): o indivíduo se encontra em posição de subordinação perante o Estado, que detém atribuições e prerrogativas aptas a vincular o indivíduo e exigir determinadas condutas ou impor limitações a suas ações. Para o autor, esses deveres do indivíduo são importantes para contribuir com o atingimento do bem comum. b) status negativo (status libertatis): é o conjunto de limitações à ação do Estado, voltados ao respeito dos direitos individuais. Na explicação de ACR: “O indivíduo exige respeito e contenção do Estado, a fim de assegurar o pleno exercício de seus direitos na vida privada. Nasce um espaço de liberdade individual ao qual o Estado deve respeito, abstendo-se de qualquer interferência. Jellinek, com isso, retrata a chamada dimensão subjetiva, liberal ou clássica dos direitos humanos, na qual os direitos têm o condão de proteger o seu titular (o indivíduo) contra a intervenção do Estado. É a resistência do indivíduo contra o Estado. Ao Estado cabe a chamada prestação ou obrigação negativa: deve se abster de determinada conduta, como, por exemplo, não confiscar, não prender sem o devido processo legal.” c) status positivo (status civitatis): conjunto de pretensões do indivíduo para invocar a atuação do Estado em prol dos seus direitos. Conforme ACR: “O indivíduo tem o poder de provocar o Estado para que interfira e atenda seus pleitos. A liberdade do indivíduo adquire agora uma faceta positiva, apta a exigir mais do que a simples abstenção do Estado (que era característica do status negativo), levando à proibição da omissão estatal.” Exige-se uma ação prestacional do Estado para assegurar direitos referentes à igualdade material, como saúde, educação, trabalho, moradia etc. d) status ativo (status activus): é o conjunto de prerrogativas e faculdades que o indivíduo possui para participar da formação da vontade do Estado, refletindo no exercício de direitos políticos e no direito de aceder a cargos em órgãos públicos. Obs.: Peter Häberle propõe a ampliação para o status activus processualis, para que o indivíduo possa participar do procedimento de tomada de decisão por parte do Poder Público. É visto, por exemplo, na audiência pública e na adoção do amicus curiae. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 10 6. 3 Classificação conforme o Direito Internacional dos Direitos Humanos No Direito Internacional dos Direitos Humanos, principalmente em decorrência do conflito ideológico no contexto da Guerra Fria entre os blocos capitalista e socialista, não foi possível a elaboração de um tratado (texto com natureza vinculante) que protegesse todas as espécies de direitos humanos. Por isso, os direitos humanos foram classificados – e separados – em dois blocos: de um lado, os direitos civis e políticos, e de outro, os direitos econômicos, sociais e culturais. Essa classificação será facilmente percebida quando estudarmos os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos. Obs.: A banca NC-UFPR costuma cobrar questões mais teóricas. Penso que exista uma grande chance de 1 uma das 5 questões ser desse capítulo. Como não temos muitas questões de provas anteriores (ou temos de provas que cobram tópicos diferentes da matéria) trabalharemos questões de várias bancas que podem auxiliar na fixação e revisão do conteúdo. 1. (2016/MPE-SC/MPE-SC/Promotor de Justiça) Conceitualmente, os direitos humanos são os direitos protegidos pela ordem internacional contra as violações e arbitrariedades que um Estado possa cometer às pessoas sujeitas à sua jurisdição. Por sua vez, os direitos fundamentais são afetos à proteção interna dos direitos dos cidadãos, os quais encontram-se positivados nos textos constitucionais contemporâneos. Certo/Errado 2. (2019/FEPESE/SJC-SC/Agente Penitenciário (Superior) Assinale a alternativa incorreta sobre os princípios ou especificidades dos direitos humanos. a) A indivisibilidade dos direitos humanos se refere a que não se pode cindi-los e que devem ser reconhecidos e protegidos unitariamente. b) A inalienabilidade dos direitos humanos se caracteriza por vedar a sua disposição pecuniária com o objetivo de venda. c) A imprescritibilidade dos direitos humanos reconhece que o seu exercício se dá no tempo, devendo ser exigido sob pena de perecimento. d) A irrenunciabilidade dos direitos humanos se refere à vedação da própria pessoa de permitir violações a esses direitos. e) A proibição do retrocesso representa que os direitos humanos já concretizados e alcançados não podem mais ser suprimidos. 3. (2019/CESPE/CGE – CE/Auditor de Controle Interno) A respeito dos marcos históricos, fundamentos e princípios dos direitos humanos, assinale a opção correta. a) Segundo a doutrina contemporânea, direitos humanos e direitos fundamentais são indistinguíveis; por isso, ambas as terminologias são intercambiáveis no ordenamento jurídico. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 11 b) Os direitos humanos estão dispostos em um rol taxativo, que foi internalizado pelo ordenamento jurídico brasileiro com a promulgação da Constituição Federal de 1988. c) No Brasil, os direitos políticos são considerados direitos humanos e seu exercício pelos cidadãos se esgota no direito de votar e de ser votado. d) A dignidade da pessoa humana, princípio basilar da Constituição Federal de 1988, é fundamento dos direitos humanos. e) Em razão do princípio da imutabilidade, os direitos humanos reconhecidos na Revolução Francesa permanecem os mesmos ainda na atualidade. AFIRMAÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS HUMANOS Antiguidade Oriental ✓ Período compreendido entre os séculos VIII a II a.C.: primeiro passo na afirmação dos direitos humanos. Adoção de códigos de comportamentos de vários filósofos influentes até os dias atuais (Zaratustra, Buda, Confúcio) ✓ Antigo Egito: reconhecimento de direitos individuais na codificação de Menes (3100-2850 a.C.) ✓ Suméria antiga: Código de Hammurabi (1792-1750 a.C.) , na Babilônia, com esboço dos direitos dos indivíduos e consolidaçãode costumes. ✓ Suméria e Pérsia: Declaração de boa governança de Ciro II, no século VI a.C. (Cilindro de Ciro). ✓ China: Confúcio (séculos VI e V a.C.) lançou as bases para sua filosofia, com ênfase na defesa do amor aos indivíduos. ✓ Budismo: introdução de um código de conduta pelo qual se prega o bem comum e uma sociedade pacífica, sem prejuízo a qualquer ser humano. ✓ Islamismo: prescrição da fraternidade e solidariedade dos vulneráveis. Grécia ✓ Consolidação dos direitos políticos com a participação política dos cidadãos (muitos eram excluídos) ✓ Platão, na obra A República (400 a.C.), defendeu a igualdade e a noção do bem comum. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 12 ✓ Aristóteles, na obra Ética a Nicômaco, salientou a importância do agir com justiça para o bem de todos, mesmo em face de leis injustas. ✓ Ideia de superioridade normativa de determinadas normas, mesmo diante do poder estatal. Roma ✓ Sedimentação do princípio da legalidade ✓ Reconhecimento de direitos como liberdade, propriedade, personalidade jurídica e igualdade entre as pessoas, em especial através do jus gentium (direito aplicados a todos, romanos ou não) Influências do Cristianismo ✓ Cinco livros de Moisés (Torah): apregoam solidariedade e preocupação com o bem-estar de todos (1800-1500 a.C.) ✓ Antigo Testamento: necessidade de respeito a todos, em especial aos vulneráveis. ✓ Novo Testamento: vários textos da Bíblia pregam a igualdade e solidariedade com o semelhante. ✓ Filósofos católicos: Santo Agostinho e São Tomás de Aquino. Idade Média e Idade Moderna ✓ Poder ilimitado dos governantes, baseado na vontade divina. ✓ Primeiros movimentos de reivindicação da liberdade a determinados estamentos, como a Declaração das Cortes de Leão, na Península Ibérica, em 1188 e a Magna Carta Inglesa, de 1215 (devido processo legal, limitação do poder de tributar e do confisco, Tribunal do Júri, princípio da legalidade). ✓ Renascimento e Reforma Protestante: crise da Idade Médio e surgimentos dos Estados Nacionais absolutistas, com centralização do poder na figura do rei ✓ Século XVII: questionamento do Estado Absolutista, em especial na Inglaterra. A busca pela limitação do poder é consagrada na Petition of Rights, de 1628. O Habeas Corpus Act, de 1679 regulamenta a proteção judicial dos que foram presos injustamente. ✓ Após a Revolução Gloriosa, é editado o Bill of Rights, em 1689, reduzindo definitivamente o poder dos reis ingleses. ✓ Em 1701, é aprovado o Act of Settlement, que reafirma o poder do Parlamento, fixando a linha de sucessão da coroa inglesa (os católicos foram excluídos) e impedindo a volta da tirania dos monarcas. Pensadores Iluministas ✓ Thomas Hobbes (Leviatã, 1651): direitos do ser humano no estado de natureza. Necessidade do Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 13 Estado para garantir segurança aos indivíduos (que se submetem ao seu poder). Teoria contratualista de base absolutista. ✓ Hugo Grócio (Da Guerra e da Paz, 1625): defendeu a existência de um direito natural de cunha racionalista. As normas decorrem de princípios inerentes ao ser humano. (“Deus está morto”). ✓ John Locke (Tratado sobre o Governo Civil, 1689): O objetivo do Estado deve ser a preservação dos direitos individuais, logo, o poder não pode ser ilimitado (início da teoria de separação dos poderes). ✓ Jean-Jacques Rousseau (Do Contrato Social, 1762): existe um pacto entre os homens, livres e iguais, que estruturam o Estado para zelar pelo bem- estar da maioria. Teoria contratualista de base democrática. ✓ Cesare Beccaria (Dos Delitos e das Penas, 1766) – existência de limites para o jus puniendi estatal, que persistem até os dias atuais. ✓ Kant (Fundamentação da Metafísica dos Costumes, 1785): a dignidade é um valor intrínseco a todo ser racional, que não tem equivalente. As coisas têm preço, as pessoas têm dignidade. O homem é um fim em si mesmo. Constitucionalismo liberal e declarações de direitos ✓ As revoluções liberais (inglesa, americana e francesa) marcaram a primeira afirmação histórica dos direitos humanos. ✓ Revolução Inglesa: teve como marcos a Petition of Rights, em 1628, que garantiu liberdades individuais e o Bill of Rights, de 1689, que consagrou a supremacia do Parlamento e o império da lei. ✓ Revolução Americana: retrata o processo de independência das colônias britânicas, com a Declaração de Independência, em 1776 e a Constituição norte-americana, de 1787 (em 1791, o texto constitucional recebe 10 emendas que introduzem um rol de direitos fundamentais). ✓ Revolução Francesa: Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789 (primeiro documento de vocação universal, serviu como alicerce para a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948), que consagra os valores de liberdade, igualdade e fraternidade. Projeto de Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, em 1791, proposto por Olympe de Gouges, reivindicando a igualdade de gêneros. Constituição Francesa de 1791, consagrando a perda dos direitos absolutos do monarca francês, com a implementação da monarquia Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 14 constitucional e previsão do voto (apesar de censitário). Constitucionalismo social e internacionalização dos Direitos Humanos ✓ Os franceses, ainda no século XVIII, defendiam a ampliação do rol de direitos da Declaração Francesa para abarcar os direitos sociais (como saúde, educação e assistência social). ✓ Vários movimentos socialistas na Europa, no século XIX, atacaram o modo capitalista de produção e ganharam apoio popular. Expoentes: Proudhon, Karl Marx, Engels, August Bebel. ✓ Revolução Russa, 1917: estimulou novos avanços na defesa da igualdade e justiça social. ✓ Introdução dos direitos sociais (para assegurar condições materiais mínimas de existência) em várias Constituições: Constituição do México (1917), Constituição de Weimar (1919) e Constituição Brasileira (1934). ✓ No plano internacional, é criada a Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 1919, pelo Tratado de Versalhes, voltada à melhoria das condições dos trabalhadores. ✓ Pós-Segunda Guerra Mundial: Carta de São Francisco, 1945, com a criação da Organização das Nações Unidas (ONU). A ONU proclama a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948. 1. (2018/VUNESP/PC-SP/Delegado de Polícia) No tocante à temática dos direitos humanos, considerando seu surgimento e sua evolução histórica, assinale a alternativa que contempla correta e cronologicamente seus marcos históricos fundamentais. a) O iluminismo, o constitucionalismo e o socialismo. b) O cristianismo, o socialismo e o constitucionalismo. c) A Magna Carta, a Constituição Alemã de Weimar e a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América. d) A Magna Carta, a queda da Bastilha na França e a criação da Organização das Nações Unidas. e) O iluminismo, a Revolução Francesa e o fim da Segunda Guerra Mundial. 2. (2018/FCC/DPE-RS/Defensor Público) De acordo com a historiadora americana Lynn Hunt, os direitos permanecem sujeitos a discussão porque a nossa percepção de quem tem direitos e do que são esses direitos muda constantemente. A revolução dos direitos humanos é, por definição, contínua (A Invenção dos Direitos Humanos; uma história. São Paulo: Companhia das Letras, 2009, p. 270). Em relação à evolução histórica do regime internacional de proteção dos direitos humanos, considere as assertivas abaixo. I. A Magna Carta (1215) contribuiu para a afirmação de que todo poder político deve ser legalmentelimitado. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 15 II. O Habeas Corpus Act (1679) criou regras processuais para o habeas corpus e robusteceu a já conhecida garantia. III. Na Declaração de Independência dos Estados Unidos (1776) percebe-se que a dignidade da pessoa humana exige a existência de condições políticas para sua efetivação. IV. O processo de universalização, sistematização e internacionalização da proteção dos direitos humanos intensificou-se após o término da 2ª Guerra Mundial. Está correto o que consta de: a) I, II, III e IV. b) I, II e III, apenas. c) I, III e IV, apenas. d) II, III e IV, apenas. e) I e IV, apenas. 3. (2013/VUNESP/PC-SP/Investigador de Polícia) Dentre os documentos reconhecidos internacionalmente e que limitaram o poder do governante em relação aos direitos do homem, encontra-se o mais remoto e pioneiro antecedente que submetia o Rei a um corpo escrito de normas, procurava afastar a arbitrariedade na cobrança de impostos e implementava um julgamento justo aos homens. Esse importante documento histórico dos direitos humanos denomina-se a) Talmude. b) Magna Carta da Inglaterra. c) Alcorão. d) Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da França. e) Bill of Rights. 4. (2018/VUNESP/PC-SP/Delegado de Polícia) Esse documento histórico de remota conquista dos direitos humanos foi editado com o escopo de assegurar a Supremacia do Parlamento sobre a vontade do Rei, controlando e reduzindo os abusos cometidos pela nobreza em relação aos seus súditos, em especial declarando, dentre outras conquistas, o direito de petição, eleições livres e a proibição de fianças exorbitantes e de penas severas: a) Petition of Rights, de 1628. b) Habeas Corpus Act, de 1679. c) The Bill of Rights, de 1689. d) Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789. e) Magna Carta, de 1215. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 16 INCORPORAÇÃO DE TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS 1. Conceito, processo de formação e incorporação dos tratados no ordenamento jurídico brasileiro Os tratados internacionais são incorporados de acordo com as regras do ordenamento jurídico interno de cada país. No Brasil, seguem os trâmites previstos pelo artigo 84, inciso VIII da CF/88 (assinatura e ratificação pelo Presidente da República) e pelo artigo 49, inciso I da CF/88 (aprovação pelo Congresso Nacional). Vejamos tais dispositivos: Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional; Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional; Para regulamentar o processo de formação dos tratados internacionais, foi elaborada a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, conhecida como a Lei dos Tratados. Tal convenção define tratado nos seguintes termos: Artigo n. 2, n.1, a) “tratado” significa um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação específica; Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 17 ✓ Processo de formação dos tratados internacionais Cada Estado elabora suas normas relativas à incorporação de tratados internacionais. Assim, teremos exigências constitucionais diferentes em cada Estado. No Brasil, o processo ocorre da seguinte forma: 1) Fase de negociação, conclusão e assinatura do tratado Esses atos são da competência do Poder Executivo. A assinatura é um aceite precário e provisório. Não tem o poder de vincular juridicamente o Estado. Apenas significa que ele pretende ratificar o tratado e assume o compromisso de submeter o texto à análise do Poder Legislativo. 2) Fase do Decreto Legislativo ou aprovação congressual Apreciação e aprovação pelo Poder Legislativo. Depois de assinado o tratado, o Presidente o envia ao Congresso Nacional, através de mensagem, para ser analisado. Ressalte-se que não há prazo para tal envio, sendo ato discricionário do Presidente. Também não há prazo para o rito de aprovação congressual, ficando à mercê da conveniência política (o que é muito criticado pelos doutrinadores). A aprovação do tratado pelo Congresso se dá através de Decreto Legislativo. 3) Fase da Ratificação Sendo aprovado pelo Congresso, através de Decreto Legislativo, faz-se necessária nova manifestação do Poder Executivo para ratificar o tratado. A ratificação é o ato que simboliza a confirmação formal do tratado pelo Estado brasileiro. Com a ratificação, o tratado é depositado em um órgão internacional que fica responsável pela sua custódia (por exemplo, Secretariado das Nações Unidas para os tratados assinados no âmbito da ONU). A partir desse momento, o Brasil está obrigado, perante aos demais países, ou seja, no plano internacional, a cumprir o tratado. Entretanto, segundo entendimento do STF, para que estejamos obrigados a cumprir o tratado também no plano interno, é necessário um outro ato: a promulgação de um decreto presidencial. 4) Fase do Decreto Presidencial ou Decreto de Promulgação Após a ratificação, o Presidente deve promulgar, por decreto, o texto do tratado. O STF entende que tal fase é obrigatória e apenas com ela se completa o processo de incorporação. Dessa forma garantimos publicidade e segurança jurídica a todos. (Esse, via de regra, deve ser o entendimento adotado em provas objetivas). Obs.: Os doutrinadores da matéria entendem que bastaria a ratificação para que o Brasil estivesse obrigado a cumprir, interna e externamente, o tratado internacional. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 18 Entretanto, as bancas costumam adotar o entendimento do STF em questões objetivas. Fiquem atentos! A celebração de tratados no Brasil é um ato complexo, já que, conjuga as vontades do Executivo e do Legislativo. Tal sistemática reforça o mecanismo de checks and balances entre os poderes, a independência e harmonia previstas no art. 2.º da CF/88, com fiscalização recíproca. Como explica ACR, “A participação dos dois Poderes na formação da vontade brasileira em celebrar definitivamente um tratado internacional consagrou a chamada ‘teoria da junção das vontades ou teoria dos atos complexos’: para que um tratado internacional seja formado é necessária a conjugação de vontades do Poder Executivo e do Poder Legislativo.” Esquematicamente, temos: A incorporação só está completa e o tratado só entra em vigor internamente, com a edição do Decreto Presidencial. Esse é o atual posicionamento do STF, apesar de não ser a ideia defendida pelas doutrinadores, dentre eles Flávia Piovesan e Valério Mazzuoli. Ressalte-se que o descumprimento de um tratado implica violação de obrigações assumidas no cenário internacional, gerando a responsabilização do Estado violador. 2. O status dos tratados internacionais de proteção de Direitos Humanos A CF/88 inova ao incluir dentre os direitos constitucionalmente protegidos, os provenientes de tratados internacionais dos quais o Brasil seja signatário. É esta a previsão do art. 5.º, par. 2.º: "Os direitos e garantiasexpressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte." Executivo • Negociação • Conclusão • Assinatura Legislativo • Aprovação do texto • Decreto Legislativo Executivo • Ratificação • Decreto Presidencial Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 19 Tal previsão é conhecida como cláusula de abertura constitucional e indica uma globalização da proteção dos direitos humanos, uma busca de proteção nacional e internacional de tais direitos. Segundo Flávia Piovesan, as normas provenientes dos tratados internacionais de direitos humanos fazem parte do chamado "bloco de constitucionalidade", junto com os princípios que não estão escritos no texto da CF/88. Como os tratados internacionais ingressam no ordenamento jurídico brasileiro? Identificamos três situações distintas. A) Tratados Internacionais sobre Qualquer Matéria (que não sejam de direitos humanos) São aprovados por maioria simples, em cada uma das casas do Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), e entram no nosso ordenamento com status de lei ordinária. (Atenção! Não se aplica aos tratados de direitos humanos, que nunca mais terão status apenas de lei ordinária!) B) Tratados Internacionais que tratam de Direitos Humanos B.1) Primeira Possibilidade São aprovados na forma prevista no art. 5.º, par. 3.º da CF/88: "Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais". Assinatura pelo Executivo Aprovação pelo Legislativo (Maioria simples em cada casa do Congresso Nacional) por Decreto Legislativo Ratificação pelo Executivo (Decreto presidencial) CF/88 Tratados internacionais sobre qualquer matéria (lei ordinária) Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 20 B.2) Segunda Possibilidade Não conseguem o quórum de aprovação previsto pelo par. 3.º, do art. 5.º, ou são anteriores à EC 45/2004. ATENÇÃO! Para Flávia Piovesan e Valério Mazzuoli, as normas provenientes dos tratados de direitos humanos têm status de norma constitucional, não importa como o tratado foi ratificado. Nos dizeres de Flávia Piovesan “A Constituição assume Assinatura pelo Executivo Aprovação pelo Legislativo (Votação em dois turnos, em cada casa do CN, com aprovação por 3/5 dos membros) Decreto Legislativo Ratificação pelo Executivo (Decreto presidencial) CF/88 Tratados de direitos humanos com status de EC Leis ordinárias Assinatura pelo Executivo Aprovação pelo Legislativo (sem alcançar o quórum de aprovação da EC) por Decreto Legislativo Ratificação pelo Executivo (Decreto presidencial) CF/88 Tratados de direitos humanos (caráter supralegal) Leis ordinárias Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 21 expressamente o conteúdo dos tratados internacionais dos quais o Brasil é parte. Ainda que esses direitos não sejam enunciados sob a forma de normas constitucionais, mas sob a forma de tratados internacionais, a Carta lhes confere o valor jurídico de norma constitucional.” Na explicação de Mazzuoli, ao questionar se existiria diferença entre os tratados aprovados na forma do art. 5.º, par. 3º, da CRFB/88 e dos demais, o autor conclui que “o que se quer dizer é que o regime material (menos amplo) dos tratados de direitos humanos não pode ser confundido com o regime formal (mais amplo) que esses mesmos tratados podem ter, se aprovados pela maioria qualificada estabelecida no art. 5.º, par. 3.º. Perceba-se que, neste último caso, o tratado assim aprovado será, além de materialmente constitucional, também formalmente constitucional. Assim, fazendo-se uma interpretação sistemática do texto constitucional em vigor, à luz dos princípios constitucionais e internacionais de garantismo jurídico e de proteção à dignidade humana, chega-se à seguinte conclusão: o que o texto constitucional reformado pretendeu dizer é que esses tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil, que já tem status de norma constitucional, nos termos do par. 2.º do art. 5.º, poderão ainda ser formalmente constitucionais.” Assim, segundo os autores, podemos dividir os tratados internacionais de direitos humanos em duas categorias: Tratados de direitos humanos MATERIALMENTE constitucionais Tratados de direitos humanos MATERIALMENTE e FORMALMENTE constitucionais • Pela previsão do par. 2.º do art. 5.º • Não passaram pela aprovação especial, mas tratam de matéria constitucional (para o STF, são normas supralegais) • Podem ser denunciados pelo Estado • Pela previsão do par. 3.º do art. 5.º • Tem status de emenda constitucional (aprovados por quórum especial) • Não podem ser denunciados pelo Estado Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 22 Atenção! Esse é o posicionamento da doutrina, que é diferente do posicionamento do STF. O STF que divide os tratados em normas supralegais (anteriores à EC 45/04 ou, os posteriores que não conseguiram o quórum qualificado) e tratados com status de emenda (posteriores à EC 45/04, aprovados na forma do art. 5.º, par. 3.º). Como explica ACR, o STF adota a tese do duplo estatuto dos tratados internacionais de direitos humanos. Portanto, fiquem atentos ao enunciado da questão. Até o momento, temos dois tratados internacionais aprovados, nos termos do par. 3.º, do art. 5.º, da CF/88 e já em vigor no ordenamento jurídico interno: 1. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo (Decreto Legislativo n. 186/2008 e Decreto Executivo n. 6949/2009). Como temos a Convenção e o seu Protocolo Facultativo, algumas bancas consideram como dois tratados. Entretanto, é mais comum que seja considerado como um, já que foram aprovados pelos mesmos decretos legislativo e presidencial. 2. O Tratado de Marraqueche, relativo à reprodução e a distribuição de obras, livros e textos em formato acessível a pessoas com deficiência visual foi aprovado pelo Congresso Nacional pelo Decreto Legislativo n. 261, de 25 de novembro de 2015, com status de emenda constitucional. Foi ratificado, em 11 de dezembro de 2015 e em 2018 foi promulgado o Decreto Presidencial (Decreto n. 9522, de 08 de Outubro de 2018). Assim, já está em vigor no cenário internacional e internamente. 3. Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, aprovada pelo Congresso Nacional, através do Decreto Legislativo n. 01/2021, com status de emenda constitucional. Ratificada pelo Presidente da República, em 12 de Maio de 2021. (Obs.: apesar de já estarmos obrigados internacionalmente, após a ratificação, falta a publicação do Decreto Presidencial para promulgação do texto, conforme exigido pelo STF, para que tenha vigor também internamente). ATENÇÃO! Os Estados Membros da Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovaram no dia 15 de Junho de 2015, a Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas. O Brasil foi o primeiro país a assinar junto com Argentina,Chile, Costa Rica e Uruguai. O objetivo da Convenção é o reconhecimento de que todos os direitos humanos e as liberdades fundamentais existentes se aplicam às pessoas idosas, e que devem gozar plenamente deles em igualdade de condições com os demais. Pode ser que essa seja o nosso terceiro tratado internacional com status de emenda constitucional, já que, existe recomendação nesse sentido. Mas, CUIDADO! Tal Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 23 Convenção foi apenas ASSINADA pelo Brasil. O texto ainda NÃO FOI RATIFICADO. As bancas estão cobrando esse tema. Na visão de Mazzoli, a primeira consequência de atribuirmos equivalência de emenda constitucional a um tratado de direitos humanos é a possibilidade de tais tratados reformarem a Constituição, o que não ocorre para os tratados que tenham apenas status de norma supralegal. (Por exemplo, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que uniformizou a nomenclatura a ser utilizada como “pessoas com deficiência”, teria o poder de corrigir o texto constitucional nas partes em que menciona “pessoas com deficiência”). A segunda consequência, segundo o autor, seria que os tratados de direitos humanos com status de emenda não poderiam ser denunciados pelo Presidente da República, nem mesmo com autorização do Congresso Nacional, sob pena de o Presidente da República ser responsabilizado. Portanto, existe uma impossibilidade técnica de denúncia. Quanto aos tratados de direitos humanos que sejam apenas materialmente constitucionais, entende o autor ser possível a denúncia, apesar de ineficaz sob o aspecto prático. Por fim (terceira consequência), os tratados de direitos humanos equivalentes às emendas constitucionais passam a ser paradigma do controle concentrado de convencionalidade, podendo servir de fundamento para ações do controle abstrato de constitucionalidade no STF, por parte dos legitimados do art. 103 da CRFB/88. 3. A vigência dos tratados internacionais de direitos humanos Segundo a doutrina, temos dois sistemas de incorporação de tratados: o de incorporação automática e o de incorporação legislativa. Atenção! Não temos nenhuma norma constitucional que deixe claro o posicionamento adotado pelo Brasil. O STF entende que apenas o decreto presidencial tem o poder de tornar um tratado internacional obrigatório, tanto na ordem interna, como na ordem internacional. A incorporação dos tratados, independentemente da matéria, dependeria sempre do decreto presidencial. Assim, percebemos uma tendência ao sistema de incorporação legislativa. 4. O impacto jurídico dos tratados de direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro Quando um tratado internacional é incorporado ao nosso ordenamento jurídico, três hipóteses podem ocorrer: 1) O tratado coincide com o direito interno; 2) O tratado integra, complementa e amplia os direitos constitucionalmente previstos; 3) O tratado contraria o direito interno. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 24 5. Normas de interpretação dos tratados de direitos humanos Segundo André de Carvalho Ramos (ACR), os direitos humanos assumiram um papel de centralidade no nosso ordenamento, o que gera a vinculação de todos os poderes públicos e agentes privados ao conteúdo desses direitos. Essa é a sua eficácia irradiante. Assim, a interpretação de um caso concreto exige que se aplique a norma que esteja conforme os direitos humanos. Como explica ACR: “Não há certo ou errado, mas sim uma conclusão que deve atender a uma ‘reserva de consistência’ em sentido amplo.” Conforme Peter Häberle, a reserva de consistência em sentido amplo exige que a interpretação seja: 1) transparente e sincera 2) abrangente e plural 3) consistente em sentido estrito 4) coerente Para Häberle, esse procedimento fundamentado deve ser aberto a todos os segmentos da sociedade (o autor chama de sociedade aberta dos intérpretes da Constituição). ATENÇÃO! Em que consiste a teoria da margem da apreciação? A teoria da margem de apreciação (“margin of appreciation”) é considerada pela doutrina especializada como um importante meio utilizado pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos para solucionar conflitos existentes entre os sistemas jurídicos nacionais e o sistema internacional dos direitos humanos. Tal doutrina vem sendo agasalhada pelo sistema regional europeu, que a concebe como meio para interpretação e solução de conflitos relacionados à efetividade dos Direitos Humanos. De acordo com a teoria da margem da apreciação, determinadas questões controvertidas relacionadas com as restrições estatais devem ser debatidas e solucionadas pelas comunidades nacionais, não podendo o juiz internacional apreciá-las. Assim, ficaria a cargo do próprio Estado nacional estabelecer os limites e as restrições ao gozo de direitos em face do interesse público. É mais aceita pela Corte Europeia de Direitos Humanos, não encontrando o devido amparo na Corte Americana de Direitos Humanos (que, entretanto, já reconheceu tal teoria). 6. Máxima efetividade, interpretação pro homine e princípio da primazia da norma mais favorável Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 25 O critério da máxima efetividade dos direitos humanos exige que a interpretação de determinado direito conduza ao maior proveito ao seu titular, com o menor sacrifício imposto aos titulares dos demais direitos em colisão. Já o critério da interpretação pro homine, exige que a interpretação dos direitos humanos seja sempre aquela mais favorável ao indivíduo, reconhecendo a superioridade das normas de direitos humanos. No mesmo sentido do critério pro homine, temos o princípio da prevalência ou primazia da norma mais favorável ao indivíduo, que defende a escolha mais benéfica ao indivíduo, no caso de conflito de normas (sejam nacionais ou internacionais). Não importa a origem da norma e sim o resultado, qual seja, o benefício do indivíduo. Ou seja, em última análise, seria buscar a interpretação pro homine das normas de direitos humanos (os autores não fazem uma diferenciação clara entre os critérios. Alguns tratam como sinônimos, outros entendem que o princípio pro homine seria mais amplo que o princípio da norma mais favorável). Os autores defendem o uso da interpretação do conteúdo de cada direito, no caso concreto, além da ponderação de valores, com base no critério da proporcionalidade (adequação, necessidade e proporcionalidade), a exemplo do que ocorre na solução da colisão dos direitos fundamentais. 7. Reserva e denúncia dos tratados internacionais de direitos humanos A reserva, de acordo com a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, em seu artigo 2.º, item 1, alínea d: “reserva” significa uma declaração unilateral, qualquer que seja a sua redação ou denominação, feita por um Estado ao assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado, ou a ele aderir, com o objetivo de excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do tratado em sua aplicação a esse Estado. Quanto à denúncia, que é o ato unilateral pelo qual o Estado expressa sua vontade de não mais se obrigar perante o tratado, prevê a Convenção de Viena, em seu artigo 56: 1. Um tratado que não contém disposição relativa à sua extinção, e que não prevê denúncia ou retirada, não é suscetível de denúncia ou retirada, a não ser que: a) se estabeleça terem as partes tencionado admitir a possibilidade da denúncia ou retirada; ou b) um direito de denúncia ou retirada possa ser deduzido danatureza do tratado. 2. Uma parte deverá notificar, com pelo menos doze meses de antecedência, a sua intenção de denunciar ou de se retirar de um tratado, nos termos do parágrafo 1. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 26 Até então, não temos posicionamento definitivo do STF sobre a denúncia. O rito sobre a denúncia ainda está sob apreciação na ADI 1625 e na ADC 39. Assim, conforme ACR, a posição prevalecente é a que admite a denúncia como um ato discricionário do Presidente da República, ou que poderia ocorrer por lei do Poder Legislativo, ordenando ao Executivo que denunciasse o tratado internacional. Como se trata de matéria política, entra no campo da discricionariedade. Entretanto, segundo a doutrina, esse posicionamento não poderia ser aplicado aos tratados de direitos humanos, em função da proibição do retrocesso. Como vimos, os tratados materialmente constitucionais admitiriam a denúncia, ao passo que os tratados materialmente e formalmente constitucionais não poderiam ser denunciados. Na conclusão de ACR: “Assim, há tendência da superação da visão tradicional referente ao poder arbitrário do Presidente da República para denunciar tratados, devendo ser obtida previamente a anuência do Congresso Nacional. Caso o STF confirme esse entendimento, deve ser observado, ainda, no caso dos tratados de direitos humanos aprovados pelo rito especial do art. 5.º, § 3.º, o quórum qualificado de 3/5 para aceitação da denúncia. Além disso, em qualquer hipótese, a denúncia de um tratado de direitos humanos submete-se ao crivo da proibição do retrocesso, ou seja, deve existir motivo para a denúncia que não acarrete diminuição de direitos e ainda cabe controle judicial para verificação da constitucionalidade da denúncia.” ATENÇÃO! Esse é o entendimento dos doutrinadores. Se a questão pedir o posicionamento do STF, lembrem-se que o Supremo, até então, admite a denúncia, por ato discricionário do Presidente, de qualquer tratado internacional. Devemos acompanhar o julgamento das ações em curso. 8. Controle de Convencionalidade Esse controle consiste na verificação da compatibilidade da legislação interna com os tratados internacionais de direitos humanos. Idealizado no Brasil por Valério Mazzuoli e André de Carvalho Ramos. Na conceituação de ACR: “consiste na análise da compatibilidade dos atos internos (comissivos ou omissivos) em face das normas internacionais (tratados, costumes internacionais, princípios gerais de direito, atos unilaterais, resoluções vinculantes de organizações internacionais).” Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 27 Como explica o mesmo autor, esse controle pode ter efeito negativo ou positivo. O efeito negativo consiste na invalidação das normas e decisões nacionais contrárias às normas internacionais, no chamado controle destrutivo ou saneador da convencionalidade. O efeito positivo consiste na interpretação adequada das normas nacionais para que estas sejam conformes às normas internacionais, em um controle construtivo de convencionalidade. Pode ser classificado em controle de convencionalidade de matriz internacional (autêntico ou definitivo) e em controle de convencionalidade de matriz nacional (provisório ou preliminar). O controle de convencionalidade de matriz internacional, em geral, fica a cargo de órgãos internacionais compostos por julgadores independentes, criados por tratados internacionais, para evitar que os Estados sejam, ao mesmo tempo, fiscais e fiscalizados. No campo dos direitos humanos, realizam o controle de convencionalidade internacional as cortes internacionais, por suas funções contenciosa e consultiva (Corte Europeia, Interamericana e Africana), os comitês da ONU, dentre outros. No controle de convencionalidade de matriz interna, a análise da compatibilidade é realizada pelos próprios juízes internos. Na interessante explicação de ACR: “Esse controle foi consagrado na França em 1975 (decisão sobre lei de interrupção voluntária da gravidez), quando o Conselho Constitucional, tendo em vista o art. 55 da Constituição francesa sobre o estatuto supralegal dos tratados, decidiu que não lhe cabia a análise da compatibilidade de lei com tratado internacional. Essa missão deve ser efetuada pelos juízos ordinários, sob o controle da Corte de Cassação e do Conselho de Estado. Além dos juízes, é possível que o controle de convencionalidade nacional seja feito pelas autoridades administrativas, membros do Ministério Público e Defensoria Pública (no exercício de suas atribuições) e haja, inclusive, o controle preventivo de convencionalidade na análise de projetos de lei no Poder Legislativo. Consagra-se o controle de convencionalidade de matriz nacional não jurisdicional (Corte Interamericana de Direitos Humanos, Caso Gelman vs Uruguai, supervisão de cumprimento de sentença, decisão de 20 de março de 2013, parágrafo 69).” Assim, notem que não apenas juízes, mas Delegados de Polícia, Defensores Públicos, Promotores de Justiça etc. podem e devem realizar controle de convencionalidade interno. É um raciocínio parecido com o que temos em controle de legalidade. No controle de convencionalidade externo, temos a análise de todo o ordenamento jurídico do Estado (inclusive do texto constitucional), em face dos tratados de direitos humanos (e aqui pouco importa a natureza do tratado, já que, perante o direito internacional, o direito interno é mero fato). Já no controle de convencionalidade interno, existe um limite, que o restringe, já que, não é Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 28 possível analisar as normas constitucionais originárias. Em precedente antigo, o STF afirma que “O STF não tem jurisdição para fiscalizar a validade das normas aprovadas pelo poder constituinte originário” (ADI 815, DJ de 10/05/1996). Fica claro que o controle de convencionalidade no âmbito internacional é diferente do controle de convencionalidade no âmbito interno. Percebe-se, ainda, que nem sempre os resultados do controle de convencionalidade internacional serão coincidentes com o controle de convencionalidade interno. Assim, um tribunal brasileiro pode decidir que uma lei interna é compatível com determinado tratado, e, em seguida, uma corte internacional, analisando a mesma situação, entender de maneira diversa, que a nossa lei viola o tratado (como aconteceu no julgamento do Caso Gomes Lund, pela Corte Interamericana). Devemos ressaltar ainda o controle de convencionalidade compulsório, que consiste na adoção, pelo Estado, das decisões internacionais proferidas em processos internacionais nos quais foi réu. Nesses casos, o Estado é obrigado a cumprir a decisão dada pelo órgão internacional. No já mencionado Caso Gelman vs. Uruguai, a Corte decidiu que: “quando existe uma sentença internacional ditada com caráter de coisa julgada a respeito de um Estado que tenha sido parte no caso submetido à jurisdição da Corte Interamericana, todos seus órgãos, incluídos os juízes e órgãos vinculados à administração de justiça, também estão submetidos ao tratado e à sentença deste Tribunal, o qual lhes obriga a zelar para que os efeitos das disposições da Convenção e, consequentemente, das decisões da Corte Interamericana não se vejam amesquinhadas pela aplicação de normas contrárias a seu objeto e finalidade ou por decisões judiciais ou administrativas”. (Corte Interamericana de Direitos Humanos, Caso Gelman vs Uruguai, supervisão de cumprimento de sentença, decisãode 20 de março de 2013, parágrafo 68). Por causa dessas diferenças entre o controle de convencionalidade internacional e o interno, na sentença da Corte Interamericana, no Caso Gomes Lund (contra o Brasil), o juiz ad hoc indicado pelo Brasil, Roberto Caldas, declarou que “se aos tribunais supremos ou aos constitucionais nacionais incumbe o controle de constitucionalidade e a última palavra judicial no âmbito interno dos Estados, à Corte Interamericana de Direitos Humanos cabe o controle de convencionalidade e a última palavra quando o tema encerre debate sobre direitos humanos. É o que decorre do reconhecimento formal da competência jurisdicional da Corte por um Estado, como fez o Brasil.” Um exemplo interessante de reconhecimento da legitimidade do controle pela Corte Interamericana pode ser encontrado no Caso “A Última Tentação de Cristo”, envolvendo o Chile. A Corte condenou o país a alterar a sua Constituição, que continha resquícios de censura, por violar o direito à liberdade de expressão, garantido na Convenção Americana de Direitos Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 29 Humanos. O Chile, como deve ser, acatou a decisão da Corte e alterou sua Constituição. Portanto, o controle de convencionalidade interno é importante, mas, não deve ser feito de forma isolada, levando à violação das normas contidas em tratados internacionais de direitos humanos. Deve haver um diálogo com a interpretação internacionalista dos direitos humanos, com o controle de convencionalidade internacional. É o que ACR chama de “Diálogo das Cortes” (para alguns, cosmopolitismo ético), que impediria violações de direitos humanos oriundas de interpretação equivocadas dos juízes e tribunais internos. Assim, para que o diálogo seja efetivo, deve haver: a) a menção à existência de dispositivos convencionais ou extraconvencionais de direitos humanos vinculantes ao Brasil sobre o tema objeto de julgamento; b) a menção à existência de caso internacional contra o Brasil sobre o objeto da lide e as consequências disso reconhecidas pelo Tribunal; c) a menção à existência de jurisprudência anterior sobre o objeto da lide de órgãos internacionais de direitos humanos aptos a emitir decisões vinculantes ao Brasil; d) o peso dado aos dispositivos de direitos humanos e à jurisprudência internacional. Em respeito à independência funcional e ao Estado Democrático de Direito, não é possível obrigar os juízes nacionais a observarem o Diálogo das Cortes, que seria o ideal. Nesse caso, se o diálogo inexiste ou é insuficiente, ACR propõe a aplicação da teoria do duplo controle ou crivo dos direitos humanos. A teoria do duplo controle reconhece a atuação em separado do controle de constitucionalidade (STF e juízos nacionais) e do controle de convencionalidade (Corte Interamericana e outros órgãos internacionais). A partir dessa teoria, deve-se exigir que todo ato interno esteja de acordo não só com a jurisprudência do STF, mas também com a jurisprudência da Corte Interamericana (cujo conteúdo deve ser estudado e conhecido, inclusive nas faculdades de Direito). Dessa forma, “evita-se o antagonismo entre o STF e os órgãos internacionais de direitos humanos, evitando a ruptura e estimulando a convergência em prol dos direitos humanos.” 8.1 Classificação de Valério Mazzuoli Na lição de Valério Mazzuoli, o controle de convencionalidade interno pode ser dividido em concentrado e difuso. Em relação aos tratados equivalentes às emendas constitucionais poderia ser realizado, na sua forma concentrada, no STF, pelos legitimados do artigo 103 da CRFB/88. Como não temos regulamentação do tema no Brasil, o autor sugere o uso das ações do controle concentrado de constitucionalidade, por analogia. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 30 Na forma difusa, o controle de convencionalidade poderia ser realizado por qualquer juízo ou tribunal, a requerimento das partes ou ex officio, tendo como parâmetro todos os tratados de direitos humanos que não alcançaram o quórum qualificado, ou seja, os tratados materialmente constitucionais (vale ressaltar que esse é o posicionamento de Mazzuoli. Outros autores não fazem essa diferenciação, entendendo que qualquer tratado de direitos humanos pode ser objeto do controle de convencionalidade difuso). Segundo o autor, aqui devem ser observadas as regras do controle de constitucionalidade difuso, sendo que a decisão judicial apenas produzirá efeitos inter partes. 1. (2019/MPE-GO/Promotor de Justiça) A respeito dos tratados de direitos humanos e a Constituição Federal, informe a alternativa incorreta: a) Os tratados de direitos humanos necessitam de aprovação legislativa pelo Congresso Nacional. b) Para valer no plano interno, o tratado de direitos humanos, conforme o entendimento do STF, depende da promulgação de um decreto executivo do Presidente da República autorizando a execução do tratado. c) Segundo o STF, a aplicação dos tratados de direitos humanos na ordem jurídica brasileira pode se dar a partir da sua ratificação e depósito no cenário internacional, caso se constate mora irrazoável em promover a promulgação na ordem interna. d) A promulgação do decreto executivo do Presidente da República não transforma o tratado em lei interna, ou seja, o tratado, mesmo após a promulgação, é aplicado enquanto norma internacional. 2. (2019/FCC/DPE-SP/Defensor Público) É documento internacional de direitos humanos incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro sob o rito estabelecido pelo artigo 5º, parágrafo 3º, da Constituição Federal: a) Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado. b) Convenção Interamericana sobre o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Conexas de Intolerância. c) Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas. d) Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos Humanos dos Trabalhadores Migrantes e Membros de suas Famílias. e) Tratado de Marraqueche para Facilitar o Acesso a Obras Publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com Outras Dificuldades para ter Acesso ao Texto Impresso. 3. (2017/FCC/DPE-PR/Defensor Público) Segundo jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os tratados de direitos humanos serão incorporados pela ordem jurídica brasileira a partir da a) ratificação e depósito do tratado pelo Presidente da República b) publicação de decreto legislativo, de forma conjunta, pelo Presidente da República e pelo Presidente do Congresso Nacional. c) promulgação, por um decreto executivo do Presidente da República. d) assinatura do tratado pelo Presidente da República. e) aprovação do Congresso Nacional, mediante decreto legislativo. Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 31 ESTRUTURA NORMATIVA: SISTEMAS DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS 1. Sistemas internacionais de proteção dos Direitos Humanos Podemos identificar, atualmente, quatro sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos: o sistema global ou universal, que é o sistema da Organização das Nações Unidas (ONU), também chamado de onusiano; e os três sistemas regionais de proteção, que são o europeu, o interamericano e o africano. A doutrina menciona o surgimento de novas ideias de sistemas de proteção, como o árabe e o asiático, que, entretanto, ainda não foram implementados. Portanto, não podemos considerá-los como sistemas em funcionamento. Importante ressaltarmos os princípios que se aplicam aossistemas internacionais de proteção dos direitos humanos: ✓ Coexistência dos sistemas internacionais ✓ Livre escolha ✓ Princípio da subsidiariedade ou complementaridade ✓ Princípio da cooperação 2. Principais precedentes históricos do processo de internacionalização dos direitos humanos Podemos destacar três antecedentes históricos mais relevantes ao processo de internacionalização dos direitos humanos. São eles: Direito Humanitário Internacional Liga das Nações Organização Internacional do Trabalho 3. O sistema global de proteção dos Direitos Humanos O Direito Internacional dos Direitos Humanos se consolida em meados do século XX, como consequência da Segunda Guerra Mundial. Na explicação de Thomas Buergenthal: “O moderno Direito Internacional de Direitos Humanos é um fenômeno do pós-guerra. Seu desenvolvimento pode ser atribuído às monstruosas violações de direitos humanos da era Hitler e à crença de que parte destas violações poderiam ser prevenidas se um efetivo sistema de proteção internacional de direitos humanos existisse.” Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 32 Esse processo de internacionalização dos direitos humanos surge como resposta às atrocidades cometidas durante o nazismo. A Era Hitler foi marcada pela ideia de descartabilidade e destruição da pessoa humana, resultando no extermínio de onze milhões de pessoas. No nazismo, a titularidade de direitos estava condicionada a uma condição: a de pertencer a raça pura ariana. Tornou-se necessário recuperar, reconstruir o valor da pessoa humana, como valor fonte do direito, como referencial ético que aproximasse o direito da moral. Nesse contexto, o direito mais básico de todos, na visão de Hannah Arendt, é o direito a ter direitos, o direito de ser sujeito de direitos. Como explica Flávia Piovesan, "se a Segunda Guerra significou a ruptura com os direitos humanos, o pós-guerra deveria significar sua reconstrução". Tribunal de Nuremberg (1945-1946): criado pelos Aliados (EUA, Reino Unido, França e URSS), através do Acordo de Londres, em 1945, tinha competência para julgar crimes contra a paz; crimes de guerra e crimes contra a humanidade. 3.1 Carta das Nações Unidas, 1945 Criação da ONU, em 1945 A Carta da ONU, de 1945, também chamada de Carta de São Francisco, menciona, em seu art. 1.º, os principais objetivos da ONU, quais sejam: Art. 1.º - Os propósitos das Nações Unidas são: 1. Manter a paz e a segurança internacionais e, para esse fim: tomar, coletivamente, medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que possam levar a uma perturbação da paz; Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 33 2. Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de igualdade de direitos e de autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas apropriadas ao fortalecimento da paz universal; 3. Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; e 4. Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns. Para concretizar tais objetivos, a ONU foi organizada em diversos órgãos, conforme previsão da Carta. Os seus principais órgãos são: (muitas informações constam do site da ONU no Brasil: https://nacoesunidas.org) Atenção! O edital de vocês não cobra os órgãos da ONU. Vou deixar na apostila porque costuma cair em toda prova. Mas, não é necessário estudá- los para as provas da Polícia Civil do Pará e do Paraná, está bem? Podem passar para o tópico 3.2. 3.2 Declaração Universal dos Direitos Humanos Esta declaração, também conhecida como Declaração de Paris, local de sua promulgação, surgiu como resultado de uma das etapas a serem cumpridas pela Comissão de Direitos Humanos, criada pela ONU, em 1946. Em 10 de dezembro de 1948 foi aprovado pela Assembleia Geral da ONU, com a aprovação de 48 Estados e com 8 abstenções (já foi cobrado em prova), a Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH), cumprindo-se a tarefa de elaborar uma declaração de direitos humanos, conforme previsão do artigo 55 da Carta das Nações Unidas. A segunda etapa foi cumprida em 1966 com os Pactos de Direitos Civis e Políticos e Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que seriam documentos “juridicamente mais vinculantes do que uma mera declaração”. Também foram aprovados vários tratados de proteção de direitos humanos dentro do chamado sistema especial de proteção de direitos humanos (tratados temáticos). Licensed to THIAGO SILVA - thiago.cobertor@gmail.com - 011.614.031-32 https://nacoesunidas.org/ DIREITOS HUMANOS DELEGADO DE POLÍCIA PCPA/PCPR 34 ATENÇÃO! A soma da DUDH com os dois Pactos Internacionais origina a Carta Internacional dos Direitos Humanos, muito cobrada em questões. A terceira etapa, de criar mecanismos capazes de assegurar esses direitos, e tratar os casos de sua violação, ainda não foi completada. Apenas conseguiu-se instituir um processo de reclamações junto à Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, através de um protocolo facultativo. Também se destaca nessa etapa, em fase de realização, a substituição da Comissão de Direitos Humanos pelo Conselho de Direitos Humanos, criado em 2006. Uma novidade importante trazida pela DUDH é ideia de indivisibilidade dos direitos humanos, já que seu texto conjuga o discurso liberal com o discurso social, o valor da liberdade com o da igualdade. Nos textos anteriores, esses valores apareciam separados, de acordo com o momento histórico. Os documentos do século XVIII tinham caráter liberal, enquanto os documentos do início do século XX trouxeram o compromisso com a ideologia social. Assim, a Declaração, de forma pioneira, trata dos direitos civis e políticos (art. III ao XXI) e dos direitos sociais, econômicos e culturais (XXII ao XXVII). Entretanto, os direitos de terceira dimensão não são tratados pela DUDH. Ela apenas menciona, no seu art. I, o valor da fraternidade, sem desenvolvê-lo ao longo do texto. Todos concordam que a Declaração Universal dos Direitos Humanos não é um tratado internacional. Mas, qual a natureza jurídica da Declaração Universal dos Direitos Humanos? O tema é polêmico e suscita muitas divergências. As bancas evitam cobrá-lo em questões objetivas. Mas, vejamos as duas principais correntes. 1.ª corrente: Tecnicamente, a Declaração Universal de Direitos Humanos é uma recomendação, adotada na forma de Resolução, pela Assembleia Geral da ONU (Artigo 10 da Carta das Nações Unidas). Assim, afirma-se que o documento, formalmente, não tem força vinculante, sendo apenas o precursor de um tratado internacional. Entendem, portanto, que a DUDH seria um documento do soft law, o que não significa que, materialmente, não seja vinculante ou não deva ser observada pelos países. 2.ª corrente: Apesar de não ser um tratado internacional, sabe-se que, hoje, o reconhecimento dos direitos humanos não está vinculado à previsão legal desses direitos. Exige-se o respeito à dignidade humana, contra todos os poderes estabelecidos, oficiais ou não. Há muito se reconhece que, não apenas os tratados, mas também os costumes e princípios
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