Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Daniel Silva de Santana Resumo sobre TLV, TOM, Teoria Ácido-Base e Reações Orgânicas 2 TEORIA DE LIGAÇÃO DE VALÊNCIA E TEORIA DOS ORBITAIS MOLECULARES A Teoria de Ligação de Valência (TLV) é a primeira teoria estrutural utilizada em Química Orgânica, de forma empírica. Durante o séc. XIX, muitas fórmulas estruturais foram deduzidas de forma correta para inúmeros compostos, o conceito de “valência” foi aceito, informando que um determinado átomo deveria fazer um número específico de ligações para atingirem a estabilidade. Em 1865, Kekule trazia a público a estrutura da molécula do benzeno, o conceito de grupos funcionais também foi desenvolvido, bem como o fato de que esses grupos possuíam reatividades características que eram muito independentes da estrutura de hidrocarboneto da molécula ao qual estavam ligados. No entanto, as estruturas propostas na época foram desenvolvidas sem que os químicos tivessem muita compreensão da natureza das ligações químicas, que eram representadas por linhas nas fórmulas. G.N. Lewis, em 1916, trouxe um avanço na compreensão da origem das ligações químicas quando propôs o conceito de ligações de pares de elétrons e a regra do octeto. Segundo Lewis, as ligações químicas eram resultado do compartilhamento de pares de elétrons pelos núcleos, tendo que, cada átomo envolvido, atingir um número de oito elétrons compartilhados para atingirem a estabilidade. Lewis postulou ainda que moléculas com mais de oito elétrons em qualquer átomo são instáveis e se dissociam, enquanto as que possuíam átomos com menos de oito elétrons eram altamente reativas frente a doadores de elétrons. Com isso, as fórmulas estruturais das moléculas passaram a ter um sentido mais completo, onde as linhas representavam os elétrons sendo compartilhados e os ponto representavam os elétrons não compartilhados. A TLV é fundamentada na mecânica quântica, onde cálculos demonstram que os núcleos envolvidos em uma ligação química são mantidos próximos, em função do compartilhamento dos elétrons. Dessa forma, foi possível entender que a densidade eletrônica se concentra entre os dois núcleos, sendo essa região denominada de orbital. Vale ressaltar que os pares de elétrons não compartilhados também podem ser descritos como orbitais pela TLV, porém, são menos definidos do que os orbitais de elétrons compartilhados. A TLV aborda também o conceito de hibridização dos orbitais, utilizada para explicar, em grande parte, como as ligações dos elementos a partir do segundo período da tabela periódica são formadas. A TLV se baseia na ideia de que as ligações covalentes se formam a partir da sobreposição em fase dos orbitais semipreenchidos dos átomos. Entretanto, analisando a configuração eletrônica do carbono, nota-se que ele possui apenas dois orbitais 3 semipreenchidos (Fig. 01), o que corresponderia a apenas duas ligações. Mas na realidade, o carbono necessita de quatro ligações para obedecer à regra do octeto, como é no caso do metano. Linus Pauling, na década de 1930, apresentou a solução para essa situação. Para Pauling, ao compartilhar seus elétrons em uma ligação, não era necessário que o carbono mantivesse a configuração eletrônica natural. Os orbitais 2s, 2px, 2py e 2pz poderia se combinar (hibridizar) para formar quatro novos orbitais (Fig. 02). Esses novos orbitais passam a ser chamados de orbitais híbridos sp3, resultado da hibridização de um orbital s com três orbitais p. Diferente dos orbitais de origem, todos os quatro orbitais híbridos são degenerados, fazendo com que os quatro elétrons de valência sejam distribuídos igualmente, o que deixa quatro orbitais semipreenchidos para a átomo de carbono fazer quatro ligações. Cada ligação C – H é uma ligação σ, formadas a partir da sobreposição de um orbital 1s semipreenchido do hidrogênio com um orbital sp3 do carbono. As ligações estão direcionadas para os vértices de um tetraedro, consistente com a estrutura tetraédrica do metano (Fig. 03). Essas ligações são mais fortes do que as ligações formadas por orbitais não hibridizados, como no caso das ligações dupla e tripla do eteno e etino, respectivamente, conhecidas como ligações π. Isso decorre do fato de que nas ligações σC – H, o lobo maior do orbital sp3 do carbono é que se sobrepõe ao orbital 1s do hidrogênio, concentrando a densidade eletrônica na área entre os dois átomos. A ligação dupla do eteno (onde o carbono hibridiza apenas dois orbitais p Figura 02 – orbitais híbridos do carbono F o n te – a d ap ta d o d e C ar ey , 2 0 1 1 . Figura 03 – arranjo da molécula do metano F o n te – S o lo m o n s; F ry h le , 2 0 1 3 . F o n te – a d ap ta d o d e C ar ey , 2 0 1 1 . Figura 01 – configuração eletrônica do carbonono estado fundamental 4 com um orbital s) e a ligação tripla do etino (onde o carbono hibridiza apenas um orbital p com um orbital s) são resultado da sobreposição dos orbitas p não hibridizados nos átomos adjacentes, possuindo um plano nodal. Nesse caso, a sobreposição não é tão eficiente quanto as dos orbitais sp3, sendo, portanto, mais fracas que as ligações σ. A TLV também usa o conceito de ressonância para relacionar fórmulas estruturais à descrição da estrutura molecular e a distribuição de elétrons. Muitas vezes mais de uma fórmula estrutural, equivalente, pode ser descrita para uma molécula ou íon. O benzeno é um exemplo bem clássico para compostos orgânicos. Para essa molécula, duas estruturas de Lewis podem ser descritas para ele (Fig. 04), trocando a posição dos pares de elétrons, mas sem mudar a posição dos átomos. Apesar de serem diferentes, as duas são equivalentes, sendo que a estrutura real do benzeno é uma média (ou híbrido) dessas duas contribuições. Estudos mostram que todas as ligações carbono-carbono no benzeno possuem comprimentos intermediários entre os de uma simples e os de uma dupla. A ressonância pode ser usada para explicar o fato de o benzeno ser termodinamicamente muito mais estável do que o 1,3,5-hexatrieno (um polieno não cíclico correspondente). Isso decorre do fato de que as estruturas de ressonância do benzeno distribuem a densidade de carga das ligações π igualmente entre os átomos de carbonos do anel, o que não ocorre nos polienos acíclicos, onde a densidade se concentra em pares alternados de átomos de carbono. Dessa forma, a repulsão dos pares de elétrons é reduzida no benzeno e essa diferença de energia e chamada de energia de deslocalização. Vale ressaltar que a ressonância não causa a estabilidade extra em compostos que demonstram esse fenômeno, mas apenas descreve essa estabilidade. Para que a ressonância ocorra, é necessário que o composto possua ligações duplas alternadas que permitam a sobreposição entre as ligações π adjacentes, permitindo a deslocalização da densidade eletrônica, conferindo uma maior estabilidade à molécula. Na TLV, entende-se que as ligações covalentes resultam da sobreposição de orbitais atômicos, hibridizados ou não, com os elétrons ocupando esses orbitais, que permanecem inalterados. Diferente dessa teoria, a Teoria dos Orbitais Moleculares, ou simplesmente TOM, Figura 04 – ressonância para a molécula do benzeno 5 defende que os elétrons não estão restritos aos seus respectivos núcleos, mas associados a todos os núcleos da molécula. Dessa forma, os orbitais atômicos dos átomos (OA) que participam da reação se combinam e formam orbitais moleculares (OM). O número de OM formados é sempre igual ao número de OA que se combinaram. Os elétrons podem ser considerados como partículas ou ondas, podendo, em um átomo, como partícula, estar ocupando um OA ou por uma função de onda ψ. Em uma molécula, os elétrons estariam ocupando os OM. A funçãode onda que descreve um OM pode ser obtida pela combinação linear de orbitais atômicos (CLOA). Para explicar melhor, vamos pegar o átomo de H e a molécula mais simples H2. O átomo de hidrogênio possui um orbital, 1s com um único elétron, 1s1. Na molécula de H2, os OA de cada átomo de H se combinam linearmente para formarem dois OM. Como os orbitais originais podem ser descritos por funções de onda, ψ1 para um átomo e ψ2 para o outro átomo, são possíveis duas combinações lineares nesse caso: com ψ1 e ψ2 possuindo sinais iguais (em fase, Fig. 05) ou com ψ1 e ψ2 possuindo sinais diferentes (fora de fase, Fig. 06). Figura 05 – sobreposição de dois OA com a mesma fase. Fonte – adaptado de Solomons; Fryhle, 2013. A sobreposição de dois OA 1s dos hidrogênios em fase para formar um OM ligante. Ψ1 Ψ2 ΨOM (ligante) A sobreposição de dois OA 1s dos hidrogênios fora de fase para formar um OM anligante. Ψ1 Ψ2 ΨOM (antligante) plano nodal Figura 06 – sobreposição de dois AO fora de fase. Fonte – adaptado de Solomons; Fryhle, 2013. 6 No caso de estarem em fase, o OM formado possui menor energia que os OA de origem, denominado orbital ligante (representado por σ). Se estiverem fora de fase, o OM formado possuir maior energia que os OA originais, denominado orbital antiligante, σ*. O σ é o orbital com maior probabilidade de encontrarmos os elétrons da ligação e o σ* possui um plano nodal entre eles (Fig. 07). ∆E é a diferença de energia entre os OM σ e σ*. Um elétron pode saltar de σ para o σ* caso absorva uma quantidade de energia necessária para superar essa diferença (um fóton de luz, por exemplo). Nesse caso, dizemos que o elétron se encontra no estado excitado. Para a formação de ligações em compostos como CH4, C2H6, C2H4, por exemplo, utiliza-se a hibridização dos orbitais atômicos para a posterior formação de orbitais moleculares. Dessa forma, usando o metano como exemplo, um OA 1s de um hidrogênio pode se combinar com um OA híbrido sp3 do carbono, formando um orbital ligante (σHC) e um orbital antiligante (σ*HC), conforme a Fig. 08. Assim, os quatro OM ligantes apontam para vértices de um tetraedro, de acordo com o que é previsto para a estrutura do metano pelo modelo de pares de repulsão dos elétrons e TLV. No caso do eteno, um grupo de OM é formado pelos OA 1s dos quatro átomos de hidrogênio e pelos OA 2s, 2px e 2py dos carbonos. Esse grupo de orbital corresponde às ligações σ e esses orbitais possuem pouca energia. Os OA 2pz dos carbonos formam um segundo grupo de OM, chamado de π. Esses orbitais se sobrepõem em uma ligação π, localizada sobre os Figura 07 – diagrama de energia para a molécula de H2. Fonte – adaptado de Carey, 2011. ∆E (σ) (σ*) Figura 08 – orbitais ligantes e antiligantes de uma ligação C – H. Fonte – Fleming, 2009. 7 átomos de carbono. O orbital π possuem energia maior que os σ, mas de menos energia que os orbitais σ*. A Fig. 09 demonstra o diagrama de energia dos orbitais π e π* para uma ligação C=C no eteno. Em dienos conjugados, a ligação σ central é mais curta do que a de alquenos não conjugados. Usando o buta-1,3-dieno como exemplo, a ligação σC2 – C3 é mais curta do que a ligação correspondente no butano. Outra característica peculiar dos dienos conjugados decorre do fato de que são mais estáveis termodinamicamente. Segundo a TLV, em ligações σ típicas, como a dos alcanos, resultam na sobreposição σ de orbitais sp3 sobre os carbonos adjacentes. Em um dieno conjugado a sobreposição σ ocorre com os orbitais sp2 dos átomos de carbonos adjacentes, que possuem maior caráter s e, portanto, os elétrons nesses orbitais estão mais próximos do núcleo, resultando em ligações mais curtas e mais fortes. Pela TOM, a estabilidade de dienos conjugados decorre de uma interação entre os OM π das duas ligações duplas. Quando dois OA 2pz adjacentes se combinam, forma dois OM – π e π*. No caso de um dieno conjugado como o buta-1,3-dieno, quatro OA 2pz adjacentes se combinam, gerando quatro OM π, dois ligantes e dois antiligantes, com os elétrons π ocupando os dois orbitais ligantes (Fig. 10). Os orbitais ligantes, denominados ψ1 e ψ2 na figura ao lado, são os de mais baixa energia, sendo que ψ1 não possui nenhum nó enquanto ψ2 possui um nó. Para esse composto, ψ2 é o orbital de fronteira e conhecido como orbital molecular ocupado de maior energia (da sigla em inglês Figura 09 – diagrama de energia para os orbitais π e π* no eteno. Fonte – Fleming, 2009. Figura 10 – formação dos quatro orbitais π do buta-1,3-dieno. Fonte – adaptado de McMurry, 2005 8 HOMO, highest occupied molecular orbital). Os orbitais antiligantes, denominados ψ3 e ψ4 na figura, são os de mais alta energia, sendo ψ3 denominado de orbital molecular vazio de menos energia (da sigla em inglês LUMO, lowest unoccupied molecular orbital). Essas definições fazem parte da Teoria do Orbital de Fronteiras, e, para o buta-1,3-dieno, ψ2 e ψ3 são os orbitais de fronteira e eles participam tanto no processo de transferência de elétrons. Simplificando, um elétron pode ser promovido do HOMO para o LUMO. Quanto maior a conjugação menor a variação de energia entre o HOMO e o LUMO. Quanto menor a energia, maior o comprimento de onda, consequentemente moléculas que absorvem energia na região do visível. REAÇÕES EM QUÍMICA ORGÂNICA: CARBOCÁTIONS As reações em química orgânica podem ser divididas em quatro tipos: adições, substituições, eliminações e rearranjos. Há autores que trazem as reações de oxirredução como um grupo a parte. Mas se formos pensar nesse tipo de reação, os quatro tipos já citados envolvem reações de oxirredução. As reações de adição ocorrem em insaturações, com em carbonilas de aldeídos e cetonas, bem como em ligações duplas e triplas de alquenos e alquinos. As reações de substituição ocorrem quando uma parte da molécula é substituída por outro grupo, como no caso dos haletos de alquila. As eliminações são um contrário das adições, ocorrendo quando uma parte da molécula é “expulsa” da estrutura um exemplo bem clássico é a desidratação de álcoois, onde uma molécula de água é eliminada, para fornecer um alqueno. Por fim, as reações de rearranjo ocorrem quando um reagente sofre uma reorganização em sua estrutura, como é o caso da conversão do but-1-eno em but-2-eno, quando tratado por um ácido como catalisador. As reações também possuem seus mecanismos estudados, ou seja, a forma como cada reação se dá. Por meio desses estudos, são conhecidos três tipos: as reações radicalares, as reações iônicas e as reações pericíclicas. Nas reações radicalares, ocorre a quebra homolítica da ligação covalente, onde cada fragmento possuirá um elétron após essa quebra. Esses fragmentos com um elétron desemparelhado cada são chamados de radicais. De forma homóloga, ao se ligarem, esses radicais formaram uma nova ligação de forma homogênea, pois cada um contribuirá com um elétron para a ligação. Nas reações iônicas, a ligação se quebra de forma heterolítica, ou seja, apenas um fragmento reterá o par de elétrons. De forma homóloga, quando participarem de uma reação, a ligação formada se dará de forma heterogênea, pois um fragmento contribuirá para sua formação. As reações pericíclicas ocorrem com um estado de transição cíclico, seguindo um mecanismo dito como “concertado”, sendo, geralmente, 9 consideradas como rearranjos. Mas aqui daremos foco às reações iônicas onde os intermediários formados são carbocátions, discutindo sobre os carbocátions clássicos e não clássicos. A heterólise de uma ligação C – G pode originar duas espécies: um carbocátion ou um carbânion. Um carbocátion é uma espécie onde o carbono possui uma carga positiva e no carbânion, carbono possui uma carga negativa (Fig. 11). Os carbocátionssão intermediários em diversas reações orgânicas, sendo que alguns são tão estáveis que já foram isolados, muitas vezes em formas de sais, e analisados por RMN de 1H e 13C, bem como por cristalografia de Raio-X, EM e IV. A Fig. 12 demonstra a estabilidade dos carbocátions mais simples. Os carbocátions terciários são os mais estáveis, seguidos dos secundários. Carbocátions primários são instáveis e quase nunca são formados, exceto quando podem se rearranjar para um mais estável ou possua grupos que possam estabilizá-lo. Carbocátions metila são tão instáveis que nunca se formam em condições normais. A estabilidade relatada na figura acima pode ser explicada pelo efeito polar e pela hiperconjugação. No efeito polar, os grupos não conjugados que estão ligados no carbono deficiente em elétrons, exercem um efeito indutivo doador de elétrons, que estabilizam a carga positiva. Quanto mais grupos com esse efeito, maior a estabilidade do carbocátion. Em um carbocátion terciário tem-se três grupos que exercem esse efeito, por isso são os mais estáveis da série. A hiperconjugação pode ser entendida como uma deslocalização de ligações σ por meio da sobreposição de orbitais e é muito utilizada para explicar a estabilidade de carbocátions. Analisando a Fig. 13, podemos perceber que o carbocátion primário representado possui apenas duas formas hiperconjugadas, enquanto o carbocátion terciário possui seis, o que lhe confere mais estabilidade. Figura 11 – estrutura do carbocátion e carbânion. Figura 12 – estabilidade dos carbocátions. 10 Em carbocátions alílicos, onde o carbono com a carga positiva possui uma ligação dupla adjacente, também possui bastante estabilidade. Essa estabilidade decorre do fato de que em intermediários desse tipo ocorre a deslocalização da carga positiva por ressonância. Outro carbocátion bastante estável é o íon benzila, que possui sua carga positiva deslocalizada por um anel aromático (Fig. 14). Nos carbocátions, o carbono central tem sua hibridização alterada, passando de sp3 para sp2, o que acarreta em uma mudança em sua geometria, passando ser trigonal plana, por conta do orbital desocupado. Dessa forma, por serem eletrófilos (recebem elétrons) os carbocátions são considerados ácidos de Lewis e reagem prontamente com nucleófilos (bases de Lewis). Os carbocátions vistos aqui são um grupo de intermediários com carga positiva em reações orgânicas. Existe um segundo grupo de carbocátions, os não-clássicos. Em um carbocátion clássico, a carga positiva está concentrada em um átomo ou deslocalizada por ressonância. Em um carbocátion não-clássico, a carga positiva é deslocalizada por uma ligação π que não esteja na posição alílica ou por uma ligação σ, conhecido como efeito do grupo vizinho. Um exemplo clássico é o cátion norbonila (Fig. 15). Observe que a carga positiva, incialmente está localizada no átomo de carbono 2 (I). A ligação σC6 – C1 é “desfeita” e a ligação passa a ser entre os C6 e C2, deixando o C1 com a carga positiva (II). O carbocátion Figura 13 – hiperconjugação em um carbocátion 1º e em um 3º. Fonte – Smith;March, 2007. Figura 14 – hiperconjugação em um carbocátion 1º e em um 3º. Fonte – Smith;March, 2007. 11 pode ser representado pela estrutura III, lembrando que a carga não está centrada em apenas um átomo, mas tanto em C1 quanto C2. Estudos mostram que as estruturas I e II existem em equilíbrio, o que gera debates acerca do assunto. Entretanto, a importância desses debates está no fato de que esses carbocátions podem explicar diversos mecanismos de reações orgânicas. Um exemplo é a solvólise em ácido acético do brosilato de exo-2-norbonila (IV), que é opticamente ativo, gerando uma mistura racêmica (VI e VII). Porém, nas mesmas condições, não houve formação de uma mistura racêmica do isômero endo. Estudos também mostraram que o isômero exo sofre solvólise cerca de ~350 vezes mais rápido que o isômero endo. Isso decorre do fato que o efeito do grupo vizinho 1,6 no isômero exo auxilia na saído do grupo brosilato e que no isômero endo não ocorre esse efeito em função de que o ataque por trás não é favorecido pela posição do grupo abandonador. Dessa forma, entende-se que o intermediário na solvólise do isômero endo não passa por um carbocátion não-clássico. Em outros estudos, os isômeros exo deram resultados semelhantes. Figura 15 – carbocátion não-clássico, o cátion norbonila. Fonte – adaptado de Smith;March, 2007. Figura 16 – solvólise em HOAc do brosilato de exo-2-norbonila. Fonte – adaptado de Smith;March, 2007. 12 ÁCIDOS E BASES EM QUÍMICA ORGÂNCIA: TEORIA DE PEARSON Grande parte das reações orgânicas envolvem reações ácido-base em algum estágio. Essas reações nos demonstram como as ligações se quebram e se formam à medida que as moléculas reagem, auxiliando na compreensão da relação entre estrutura e reatividade de compostos orgânicos, bem como na termodinâmica da reação. Fornecem ainda dados sobre a importância do solvente nos meios reacionais. As teorias mais conhecidas sobre acidez e basicidade são as de Arrhenius, Brønsted- Lowry, de Lewis e de Pearson. Daremos mais enfoque na teoria de Pearson, também conhecida como Teoria HSAB ou teoria dos duros e moles. Na teoria de Arrhenius, entende-se que ácido é uma espécie química que, em meio aquoso, se dissocia liberando um próton e um ânion. Já uma base, se dissocia em água, liberando íon hidróxido e um cátion: Ácido e bases de Arrhenius se ionizam em diferentes graus. Os que se ionizam por completo são ditos ácidos e bases fortes. Os que se ionizam em uma proporção são ditos ácidos ou bases fracas. A força de ácidos é dada pela constante de acidez: 𝐾𝑎 = [𝐻+][𝐴−] 𝐻𝐴 No entanto é mais comum representar a força de um ácido pelo seu pKa. Quanto menor seu valor, mais forte o ácido: 𝑝𝐾𝑎 = −𝑙𝑜𝑔𝐾𝑎 Para bases, segue-se o mesmo princípio, apenas substituindo os termos correspondentes para encontrar Kb e pKb. No entanto, são termos pouco utilizados. A teoria de Brønsted-Lowry afirma que ácidos são espécies que doam prótons e bases recebem prótons. Em comparação com a teoria de Arrhenius, esta é mais abrangente, sendo que a reação se dá por transferências de prótons entre as espécies: Nessa teoria são introduzidos dois novos conceitos, os de base e ácidos conjugados. O ácido conjugado de uma base nada mais é do que essa base protonada e vice-versa. Assim, sob 13 essa ótica, em meio aquoso, um ácido não se dissocia, mas transfere um próton para a água, assim como uma base retira um próton da água. O ácido conjugado da água é o íon oxônio, mais conhecido como íon hidrônio. O Ka aqui é calculado da mesma forma que na teoria anterior, substituindo [H+] por [H3O +], bem como o pKa. Lewis propôs uma definição mais ampla para ácidos e bases. Para ele, ácido são receptores de elétrons e bases são doadores de elétrons. Dessa forma, tanto espécies carregadas quanto neutras podem ser ácidos ou bases de Lewis: Assim, ocorre a formação de uma ligação covalente entre um ácido e uma base de Lewis. Reações de substituição são um exemplo clássico desse tipo de reação ácido-base: Os ácidos de Lewis podem ser chamados por outro nome, eletrófilos, que são espécies deficientes em elétrons. Da mesma forma, as bases de Lewis podem ser conhecidas como nucleófilos, espécies com afinidade por centros positivos. Vale ressaltar que todo nucleófilo é uma base de Lewis, mas nem toda base de Lewis é um nucleófilo. O mesmo pode ser entendido para os ácidos. 14 Por fim, a teoria de Pearson é menos estudada em Química Orgânica, porém, não menos importante do que as outras. Pearson classificou ácidos e bases em duros e moles, afirmando que bases durasformam ligações fortes com ácidos duros e bases moles formam ligações fortes com ácidos moles. Espécies moles são aquelas que podem ser facilmente polarizadas e espécies duras são menos polarizáveis. Lembrando que polarizabilidade é a capacidade que uma espécie química tem de sua nuvem eletrônica distorcida. Assim, espécies químicas com alta densidade de elétrons que estão fracamente atraídos pelo núcleo são mais fáceis de serem polarizados e tendem a ser espécies moles, como o íon iodeto, que é uma base mole. Espécies químicas pequenas e altamente eletronegativas, como o íon fluoreto, são espécies duras, pois sua nuvem eletrônica não é distorcida facilmente. Pela TOM, espécies que possuem uma diferença muito grande entre o HOMO e o LUMO são espécies duras e espécies que possuem uma menor diferença entre os dois orbitais são ditas como moles. Isso decorre do fato de que se obtém a máxima sobreposição para a ligação covalente quando a interação é entre orbitais de energia similar, entretanto, uma espécie não é totalmente dura ou totalmente mole. Assim, uma espécie que é pequena, com carga positiva alta e um LUMO de alta energia tende a ser uma espécie dura, assim como uma espécie que é pequena, com elevada carga negativa e um HOMO de baixa energia tende a ser uma base dura. Entres essas espécies, as interações serão regidas, de forma mais pronunciada, por atrações eletrostáticas. A dureza e moleza de uma espécie podem ser influenciadas por diversos fatores. Comparando os compostos 1 e 2, nota-se que 2 é mais mole do que 1, em função do átomo de enxofre ser mais volumoso e menos eletronegativo que o oxigênio, portanto, mas polarizável. Já em 3 e 4 a diferença pode ser explicada pela ressonância, que dispersa a carga negativa. Em 3, a dispersão da carga é feita entre duas carbonilas, enquanto em 4 a dispersão é feita apenas por uma carbonila, tonando a primeira espécie mais estável. 15 REFERÊNCIAS CAREY, F. A. Química Orgânica. Vol. 1, 7ed. Porto Alegre: AMGH, 2011. CAREY, F. A.; SUNDBERG, R. J. Química Orgânica Avançada: Parte A: estrutura e mecanismos. 5ed. EUA: Springer, 2007. FLEMING, I. Orbitais Moleculares e Reações em Química Orgânica. 1ª Edição Estudantil. Reino Unido: Wiley, 2009. LEE, J. D. Química Inorgânica não tão Concisa. 5ed. São Paulo: Bucher, 1999. McMURRY, J. Química Orgânica. Vol. 1, 6ed. EUA: THOMSON, 2005. SMITH, M. B.; MARCH, J. Mecanismos em Química Orgânica Avançada: reações, mecanismos e estrutura. 6ed. EUA/Canadá: Wiley, 2007. SOLOMONS, T. W. G.; FRYHLE, C. B. Química Orgânica. Vol. 1, 10ed. Rio de Janeiro: LTC, 2013. VASCONCELLOS, M. L. A. A. A teoria de Pearson para a disciplina de Química Orgânica: um exercício prático e teórico aplicado em sala de aula. Quim. Nova, Vol. 37, No. 1, 171-175, 2014.
Compartilhar