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61 Pedagogia - História da Educação UNidAde 4 A educação no Brasil: período republicano 4.1 Introdução O objetivo desta unidade é que você possa conhecer os aspectos contemporâneos da nossa história educacional, focalizando as questões sociais, políticas e econômicas que a permeiam. Iniciaremos essa reflexão a partir da reforma educacional de Benjamin Cons- tant. Em seguida, analisaremos a educação na 2ª república e, por fim, a educação superior no Brasil após a Lei de Diretrizes e Bases da Edu- cação Nacional – LDBEN – 9.394/1996. Para isso, buscaremos suporte em autores que dis- cutem essa temática. Segundo Romanelli, em 1888, o Brasil contava com apenas 250.000 alunos matricu- lados, para uma população de 14 milhões de habitantes. A autora afirma ainda que: [...] dos liceus provinciais, em cada capital de província dos colégios particula- res em algumas cidades importantes, alguns cursos normais (que formavam os professores), os Liceu de Artes e Ofícios, criado na Corte, em 1856, e mais alguns cursos superiores, que foram enriquecidos com a transformação da an- tiga Escola Central em Escola Politécnica (ROMANELLI, 1997, p. 40). Percebe-se, a partir dessa afirmativa, a preocupação com a formação superior em detrimento da formação elementar da popu- lação, fato que caracterizava a elitização do ensino. Outro fato importante a se registrar do período é a falta de dados precisos do número de matriculados na educação elementar. Como a educação ainda tinha um caráter elitista, frases como a do Senador baiano João José de Oliveira Junqueira, senador entre 1873 e 1887, ficaram famosas: “Certas matérias, tal- vez, não sejam convenientes para o pobre; o menino pobre deve ter noções muito simples”. É interessante percebermos que tal fala encontra-se coerente com a fala do Rousseau, já mencionada no capítulo anterior, que diz que para o camponês não precisa escola, pois ele já se encontra no ambiente propício para aprender o que precisa, que é a natureza. Podemos, assim, perceber que a fala do senador mencionado demonstra a falta de um compromisso político com as pessoas menos favorecidas economicamente. Dessa forma, podemos entender predominar nesse país, naquela época, uma política que não se inte- ressava pela formação de uma cultura educa- cional que atendesse aos interesses de toda a sociedade. A esse respeito, Romanelli afirma que a educação popular do período era me- ramente “propedêu- tica”, voltada para o exercício de funções, nas quais “a retóri- ca tem o papel mais importante do que a criatividade” (ROMA- NELLI, 1997, p. 41). Observe que a primeira república no Brasil inicia-se no governo do pre- sidente Marechal Deodoro da Fonseca, que governou entre 1889 e 1891, como governo provisório. Deodoro governou por decretos-leis, até que fosse promulgada a nova Constituição, pois a Constituição de 1824 não valia mais. A partir de 1890, é inicia- da a discussão para a criação da nova Consti- tuição que vigoraria durante todo o período da república velha, ou seja, de sua promulga- ção, em 1891 a 1930. Veja que, ainda de acordo com Romanel- li (1997), essa Constituição instituiu o sistema diCA Decretos-lei são atos do presidente da república com imediata efeti- vidade, ou seja, logo após publicada, passa a organizar a administra- ção pública. Demonstra centralização de poder nas mãos do presidente. ▲ Figura 28: Trabalho infantil. Fonte: Disponível em: http://4.bp.blogspot. com/__7S5KgqN1xI/ ShmWUvb65PI/AAAAA- AAAABU/hMijapmFIa0/ s320/jeito+de+crian%C 3%A7a+trabalho+de+a dulto.bmp>. Acesso em: 10/09/2008 62 UAB/Unimontes - 1º Período federativo de governo, consagrou também a descentralização do ensino, prevista em seu artigo 35, itens 3º e 4º, que reservou à União o direito de criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados, além de prover a instrução secundário no Distrito Federal. À União cabia criar e controlar a instru- ção superior em toda a Nação, bem como criar e controlar o ensino secundário acadê- mico e a instrução em todos os níveis do Dis- trito Federal. Aos Estados, cabia criar e controlar o en- sino primário e o ensino profissional. Na épo- ca, este compreendia principalmente escolas normais (de nível médio) para moças, e escolas técnicas, para rapazes. Observe que o ensino, nesse período, as- sume uma dualidade. De um lado, ofereceu oportunidade de formação prática para a po- pulação rural e desfavorecida e, por outro, re- força a preocupação com a educação da classe dominante, nas escolas técnicas e superiores. Nesse período, prevaleceram, ainda no Brasil, os ideais educacionais europeus. Ideais estes que pensavam na formação do homem com vistas a controlar o seu próprio destino. Um homem completo de corpo e alma. Para atingir este objetivo, era preciso educar o juízo do aluno ao invés de encher-lhe a cabeça com palavras e, para tanto, a prática pedagógica era voltada ao desenvolvimento da autonomia do aluno, ou seja, o professor deveria apontar o caminho, ou permitir que o aluno descubris- se seu próprio caminho. A seguir, discutiremos um pouco a respei- to das implicações da reforma educacional de Benjamim Constant no processo da história da educação brasileira. 4.2 A reforma educacional de Benjamim Constant Conforme anunciamos no início do estudo desta unidade, dialogaremos a respeito do gran- de marco educacional do período, que foi a reforma educacional proposta por Benjamim Cons- tant Botelho de Magalhães, nomeado ministro da Instrução Pública, Correios e Telégrafos entre 1889 e 1891. Vamos lá! Militar atuante e adepto aos ideais da filosofia positivista de Auguste Comte, tinha como “orientação a liberdade e laicidade do ensino, como também a gratuidade da escola primária” (RIBEIRO, 2008). Esses princípios seguiam a orientação do que estava estipulada na Constituição brasileira. Veja que, a respeito das intenções da reforma de Benjamin Constant, Azevedo (1963) afirma que foram: • transformar o ensino em formador de alunos para os cursos superiores e não apenas pre- parador; • a obrigatoriedade do regime seriado; • a duração do curso secundário em 7 anos; • a introdução no Ginásio Nacional, antigo Colégio Pedro II; • toda a série hierárquica das ciências abstratas, segundo a classificação de Compte; • a inclusão, ao lado do curso bacharelado em Letras, em 7 anos, no Ginásio Nacional; • o “exame de madureza”, como prova da capacitação intelectual dos alunos no fim dos es- tudos; • substituir a predominância literária pela científica. A esse respeito, Cunha afirma que: A reforma proposta por Benjamin Constant foi criticada pelos positivistas, pois feria os princípios pedagógicos de Comte, que defendia a predominância literária, sendo que na adaptação brasileira o que ocorreu foi o acréscimo de matérias científicas às tradicionais, tornando o ensino enciclopédico (CUNHA, 1980). diCA O caráter elitista da edu- cação era denunciado: • pela composição do corpo docente, nomeado pelo governo e formado por intelectuais de reconhecida capa- cidade nos meios acadêmicos; • pela seletividade do corpo discente, revelada pelos exa- mes de admissão e promocionais e pelo pagamento das anuidades; • pelos programas de ensino, de base clássica e tradição humanística; • pela disciplina rígida, imposta pelos Regula- mentos. Essas medidas deram ao ensino secundário oficial uma função formativa dirigida às elites, através da preparação dos alunos para o ensino superior. 63 Pedagogia - História da Educação 4.2.1 A lei orgânica Rivadávia de Correa Veremos, neste estudo, que essa reforma foi proposta durante o governo do Marechal Hermes da Fonseca, em 1911, a qual se carac- terizou com insucesso, pois propunha facultar total liberdade e autonomia aos estabeleci- mentos de ensino na sua organização, supri- mindo o caráter oficial do ensino. Você verá, ainda, que se destaca, na sua proposta, a liberdadeque pretendia dar ao ensino Superior, sendo considerada como “li- berdade de ensino” que a mesma adotara, co- rolário do dispositivo constitucional que asse- gurava a liberdade de profissão e a promessa de autonomia dos estabelecimentos federais de ensino, da extinção da ação fiscalizadora do Governo Federal sobre os estabelecimen- tos particulares. Saiba que essa reforma propunha, ainda, uma reestruturação no Conselho Superior de Ensino, então criado, e que, de acordo com a própria lei, substituiria a função fiscal do Es- tado, tendo ação sobre os estabelecimentos mantidos pelo Governo Federal, assim mesmo respeitando a autonomia a esses concedida (Decreto nº 8.659, de 05/04/1911). 4.2.2 A reforma proposta por Carlos Maximiliano Essa foi outra reforma proposta nesse período. Segundo Romanelli (1997, p. 42), ela representou uma “contramarcha, re-oficiali- zando o ensino”, ao autorizar a organização de uma Universidade Federal, constituída de Faculdade de Medicina, de Escola Politécnica, das duas Faculdades Livres de Direito do Rio de Janeiro, Universidade essa que só foi criada em 1920, no Governo de Epitácio Pessoa. As escolas particulares, que funcionavam sob o regime de concessão do poder público, deveriam ser previamente autorizadas a fun- cionar e, a seguir, reconhecidas e inspeciona- das pelos setores competentes do Ministério da Educação ou das Secretarias Estaduais de Educação, a fim de que pudessem expedir cer- tificados e diplomas válidos perante os órgãos oficiais. A reforma proposta por Carlos Maximiliano foi promulgada em 1915, e foi conhecida como Lei Carlos Maximiliano (Dec. 11.530). Ela resta- beleceu a equiparação dos estabelecimentos estaduais com os federais e manteve o exame vestibular, ao mesmo tempo em que assegurou aos alunos dos colégios particulares o direito de prestação de exames preparatórios no Colégio Pedro II e nos colégios equiparados, para fins de inscrição em exame vestibular (SILVA, 1969). 4.2.3 Reforma Rocha Vaz A reforma proposta por Rocha Vaz, no governo do presidente Arthur Bernardes, em 1925, representou a última tentativa do perío- do no sentido de instituir normas regulamen- tares para o ensino, tendo o mérito de esta- belecer, pela primeira vez, um acordo entre a União e os Estados, propondo a promoção da educação primária e eliminando os exames preparatórios para acesso à educação – o que caracterizava um processo excludente para os menos favorecidos. (ROMANELLI, 1997). Um grande traço social desse período foi a transição do modelo rural para o modelo so- cial urbano-industrial que começava a tomar fôlego no Brasil. Fato que não podemos deixar de enfatizar, porque o mesmo justifica a ne- cessidade de formar mão de obra barata para o mercado de trabalho emergente, necessitan- do de pessoas para consumir o que o merca- do oferecia, em função da abertura dos portos para a importação e entrada dos imigrantes, que, por sua vez, traziam outras culturas que incrementavam o mercado. Nesse mesmo sentido, não podemos deixar de esclarecer que juntamente com a formação das cidades, o que caracterizava a mudança de modelo de sociedade rural para urbano, ocorria a necessidade de que as pes- soas soubessem ler e escrever. Isso porque precisavam votar para eleger os representan- tes das cidades, ou seja, os políticos. Ao considerar o exposto, lembramos a você que, em função da transição do modelo rural para o modelo urbano, a reforma propos- ta por Rocha Vaz foi considerada reacionária, por conter em seu bojo a “Resistência Conser- vadora” do cenário educacional, retirando em definitivo a autonomia administrativa e didáti- ca concedida pela sua antecedente. As medidas adotadas por essa reforma GloSSáRio escolanovismo: é a concepção baseada nas ideias de John Dewey, que acredita ser a educação o único meio realmente efetivo para a construção de uma sociedade democrática, que respeite as carac- terísticas individuais de cada pessoa, inserindo -a em seu grupo social com respeito à sua unicidade, mas como parte integrante e parti- cipativa de um todo. 64 UAB/Unimontes - 1º Período concorreram para acentuar o período de crise política que resultaria na revolução de 1930; por intermédio dela, o Estado passa a contro- lar ideologicamente o sistema de ensino. É interessante, ainda, considerarmos que, nesse contexto, os conhecimentos que com- punham os conteúdos ensinados deixam de ser fundamentados na sagrada escritura para serem fundamentados nas ciências naturais, ou seja, no positivismo. Para relembrar o sig- nificado de positivismo, leia o caderno de Filo- sofia da Educação e o caderno de Pesquisa em Educação. No que se refere ao ensino na época, esse era vivenciado por meio da utilização de mé- todos que se alicerçavam nos fundamentos da teoria de Herbart que, com base na razão cartesiana, apresenta passos a serem seguidos para ensinar. Ainda vale ponderar que os intelectuais e artistas brasileiros de reconhecimento inter- nacional propunham uma “redescoberta do país” com a produção de obras de arte que va- lorizassem a cultura brasileira sem se diminuir frente às propostas artísticas europeias. Esse movimento acena para a nova eli- te intelectual brasileira que se formara e que, anos depois, alteraria sua história, agrário-pro- dutora, com novas tendências produtivas, con- forme veremos na década de trinta. 4.2.4 As reformas educacionais que influenciaram a década de 1930 Como mencionamos anteriormente, com as novas tendências produtivas a partir da dé- cada de trinta, encontra-se nesse país a acu- mulação de capital, ocorrida com a produção agropecuária, o que permitiu que o Brasil pu- desse investir no mercado interno e na produ- ção industrial. Essa nova situação econômica exigia a for- mação de mão de obra especializada e, para tal, foi necessário propor novas alternativas para o setor educacional, o que significava que a edu- cação não poderia ser pensada mais com o in- tuito de formar mão de obra barata, pois não era mais a necessidade da sociedade emergen- te. Em meio ao contexto mencionado, entram em cena educadores brasileiros que haviam estudado na Europa e Estados unidos, e que re- tornavam ao Brasil com ideias oriundas do con- texto em que se formaram, e assumem o papel de educadores e, também, cargos no governo. Compreendemos que tal realidade favo- receu a realização das reformas que mudaram o modelo da educação brasileira, por meio da implantação da escola nova, que trazia consi- go ideais referentes à visão humanista moder- na, como veremos a seguir. 4.2.5 A reforma de Lourenço Filho Veja que, de acordo com as nossas coloca- ções anteriores, referentes às necessidades da sociedade brasileira vivenciada na década de trinta, foi realizada a reforma educacional de- nominada de reforma Lourenço Filho, por meio do educador Manuel Bergström Lourenço Filho, paulistano de Porto Ferreira (1897-1970) que, fiel a seu referencial teórico, procurou intervir na educação brasileira respondendo às questões oriundas dos interesses políticos vivenciados em seu contexto histórico. Psicólogo por formação, Lourenço Filho desenvolveu o chamado Teste ABC, que verifi- cava a maturidade necessária à aprendizagem da leitura e da escrita, principalmente no que se refere à reforma educacional do Estado do Ceará, no ano de 1922. Precisamos esclarecer que, tendo em vista atender à demanda do novo modelo de educação implantado, esse educador pro- moveu a reforma no curso normal (profissio- nalização do curso), além do convite para os professores realizarem cursos de férias para o aperfeiçoamento da profissão, com fins de inovar todo o processo pedagógico. Era ainda uma exigência do educador que os professo- res aprendessem a forma correta de aplicação dos Testes, para que esses fossem utilizados de maneira cautelosa e respaldada no conteú- do teórico defendido por ele. Enfatizamos que as propostas de Louren- ço Filho foram inovadoras.Porém, ressaltamos que elas surtiram efeitos positivos apenas para os interesses políticos da época, e não para as pessoas em geral. No decorrer da história, mais precisamente em outubro de 1931, ao as- sumir a Diretoria Geral de Instrução Pública do Distrito Federal, Anísio Teixeira encontra um cenário pouco favorável à educação pública na capital do país. diCA Outro fato social marcante para o novo cenário educacional que despontava no país foi a SEMANA DE ARTE MODERNA, aconteci- mento entre os dias 11 e 18 de fevereiro de 1922, no Teatro Central, em São Paulo. 65 Pedagogia - História da Educação Veja que, naquele ano, segundo dados do Relatório de 1932, para uma população escolar mínima – crianças de 6 a 12 anos – de 196.000 indivíduos, só existiam escolas para cerca de 45% das crianças. Esse fato era agravado, ain- da, pelas condições dos prédios, tanto os pú- blicos como os alugados, cuja maioria se cons- tituía de residências particulares, impróprios ou inadequados ao funcionamento escolar. Com base nos inquéritos e levantamen- tos realizados pelo Serviço de Prédios e Apa- relhamentos Escolares, o Departamento de Educação estabeleceu um plano mínimo de construção, a ser realizado até o ano de 1938, que compreendia, entre outras coisas, a cons- trução de 74 edificações novas, ainda insufi- cientes para abrigar a população escolar atual (TEIXEIRA, 1935, p.196). No Rio de Janeiro, como em todo o Brasil, o problema de edificações escolares não ha- via sido antes objeto de soluções previamente planejadas e sistematicamente seguidas. Para resolver o problema da escassez de prédios escolares, era preciso encontrar soluções em que se contrabalançassem as deficiências em relação ao terreno, à localização, às condições do prédio, à economia ou ao programa educa- cional, principalmente quanto às grandes con- centrações escolares. Assim, já em sua administração no Rio de Janeiro, Anísio concebe uma proposta inova- dora, isto é, um “sistema” escolar com edifica- ções de duas naturezas: as escolas nucleares, ou escolas-classe e os parques escolares, onde as crianças deveriam frequentar regularmente as duas instalações. No primeiro turno, em prédio adequa- do e econômico (escola-classe), receberiam o ensino propriamente dito; no segundo turno, em um parque escolar aparelhado e desen- volvido, receberiam a educação propriamente social, a educação física, a educação musical, a assistência alimentar e o uso da leitura. Des- sa forma, no Rio de Janeiro, os prédios foram construídos obedecendo a cinco tipos: a “Es- cola Tipo Mínimo”, com 2 salas de aula e uma sala de oficinas, para as regiões de reduzida população escolar; a “Escola Tipo Nuclear” ou escola-classe, com 12 salas de aula, além de locais apropriados para administração, secre- taria e biblioteca. Esses prédios foram proje- tados pelo arquiteto Enéas Silva, da Divisão de Prédios e Aparelhamentos Escolares; Escola Platoon 25 classes (12 salas comuns, 12 salas especiais e o ginásio). O sistema “platoon” era constituído de salas de aula comuns e salas es- peciais para auditório, música, recreação e jo- gos, leitura e literatura, ciências, desenho e ar- tes industriais; e o seu funcionamento dava-se pelo deslocamento dos alunos, através de “pe- lotões”, pelas diversas salas, conforme horários pré-estabelecidos (DÓREA, 2008). BOX 4 Afirmava o documento o manifesto dos pioneiros da educação de 1932: “Em nosso regime político, o Estado não poderá, de certo, impedir que, graças à organi- zação de escolas privadas de tipos diferentes, as classes mais privilegiadas assegurem a seus filhos uma educação de classe determinada; mas está no dever indeclinável de não admitir, dentro do sistema escolar do Estado, quaisquer classes ou escolas, a que só tenha acesso uma minoria, por um privilégio exclusivamente econômico. Afastada a ideia do monopólio da edu- cação pelo Estado num país em que o Estado, pela sua situação financeira, não está ainda em condições de assumir a sua responsabilidade exclusiva, e em que, portanto, se torna necessá- rio estimular, sob sua vigilância as instituições privadas idôneas, a “escola única” se entende- rá, entre nós, não como “uma conscrição precoce”, arrolando, da escola infantil à universida- de, todos os brasileiros, e submetendo-os durante o maior tempo possível a uma formação idêntica, para ramificações posteriores em vista de destinos diversos, mas antes como a escola oficial, única, em que todas as crianças, de 7 a 15, todas ao menos que, nessa idade, sejam confiadas pelos pais à escola pública, tenham uma educação comum, igual para todos” (Mani- festo dos Pioneiros, 1932). Fonte: Disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/artigos/Educacao/ManifestoPioneiros>. Acessado em: 10/12/2008. 4.3 A educação na 2ª república Para continuarmos nossas conversas a respeito da história da educação brasileira, com vis- tas a pensar no manifesto dos pioneiros, precisamos nos lembrar de que a educação foi foco de PARA SABeR MAiS Para você entender me- lhor acesse: http://www. centrorefeducacional. pro.br/aniescnova.html Sobre Lourenço Filho, acesse: http://www. dgbiblio.unam.mx/ 66 UAB/Unimontes - 1º Período preocupação internacional e nacional, o que provocou a reforma da educação depois da Primei- ra Guerra Mundial. Tal reforma, imbuída dos interesses das políticas liberais democráticas, inspi- rou a defesa da escola para todos. Mas foi após a década de 30 que se efetivaram as mudanças, no Brasil. Conforme Azevedo, o Movimento da Reconstrução Nacional pela Educação acontece através do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova que: apontou a necessidade de repensar a formação do magistério primário, com a preparação nas escolas normais, uma vez que esse estabelecimento não conse- guia, a contento, oferecer sólida preparação pedagógica nem a educação geral que deveria (AZEVEDO, 1963, p. 73). Dessa forma, você não pode deixar de considerar que, apesar das primeiras reformas repu- blicanas e das iniciativas em prol do desenvolvimento do ensino público no país, a questão do analfabetismo continuava representando um sério problema a ser enfrentado nas décadas do século XX. É nessa realidade que o Manifesto dos Pioneiros compreende o envolvimento de di- versos educadores que se voltaram aos problemas educacionais, com a intenção de “melhorar” a situação do ensino no país. Porém, a partir do texto citado no Box anterior, do trecho retirado do Manifesto, percebe- se o caráter reivindicatório por uma educação de qualidade, ofertada pelo estado, admitindo-se cooperação do setor privado. Cooperação esta que denuncia o incentivo da privatização da edu- cação e a preocupação com a oferta de um ensino que garanta a qualidade da educação para uma classe privilegiada economicamente. Esclarecemos-lhe que, embora os educadores envolvidos no mencionado manifesto tives- sem interesses e visões distintas acerca do que era a educação, convergiam quanto à necessi- dade de uma renovação pedagógica adequada a atender ao planejamento para uma civilização urbano-industrial. 4.3.1 O manifesto dos pioneiros em 1932 Foi no bojo da manifestação política acima mencionada que, como expressão desse movi- mento, pode-se destacar o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, de 1932, em que partici- param pessoas como Roquete Pinto, Fernando de Azevedo, Cecília Meireles, Anísio Teixeira, Pas- choal Lemme e Lourenço Filho. Para continuarmos nossas conversas, você precisa ter claro que, no que diz respeito ao Ma- nifesto, este se trata de um documento de política educacional que, mais do que a defesa da Escola Nova, está em causa a defesa da escola pública. Nesse sentido, o Manifesto emerge como uma proposta de construção de um amplo e abrangente sistema nacional de educação pública, abarcando desde a escola infantil até a formação dos grandes intelectuais pelo ensino universitá- rio (Saviani, 1997, p.184). Ressaltamos que os educadores envolvidos no manifestobuscavam a hegemonia educacio- nal do país. Entretanto, havia também a intenção pela ascensão do grupo aos setores educacio- nais referenciados ao poder do Estado. Entre esses educadores, vigoravam as ideias escolanovis- tas em oposição ao ensino tradicional. Diante do exposto, esclarecemos que: A expressão Escola Nova (escolanovismo) não se refere a um só tipo de escola ou mesmo a um determinado sistema escolar, mas a um conjunto de princí- pios, que resultam em determinadas características, com o objetivo de ree- xaminar e rever os problemas didáticos tradicionais de ensino (NOGUEIRA, 2001, p.25). 67 Pedagogia - História da Educação BOX 5 O escolanovismo propõe um novo tipo de homem, defende os princípios democráticos, isto é, todos têm direito a assim se desenvolverem. No entanto, isso é feito em uma sociedade capitalista, em que são evidentes as diferenças entre as camadas sociais. Assim, as possibili- dades de se concretizar esse ideal de homem se voltam para aqueles pertencentes ao grupo dominante. A característica mais marcante do escolanovismo é a valorização da criança, vista como ser dotado de poderes individuais, cuja liberdade, iniciativa, autonomia e interesses de- vem ser respeitados. O professor passou a ser um auxiliar do desenvolvimento livre e espon- tâneo da criança; é ele o facilitador de aprendizagem. Os processos de transmissão e recepção são substituídos pelo processo de elaboração pessoal e o saber é centrado no sujeito cognos- cente e não mais no objeto de conhecimento. A valorização do clima de harmonia na sala de aula é uma forma de vivência democrática. O movimento escolanovista preconiza a solução de problemas educacionais numa perspectiva interna da escola, sem considerar a realidade brasileira nos seus aspectos político, econômico e social. O problema educacional passa a ser uma questão escolar técnica. A ênfase recai no ensinar bem, mesmo que a uma minoria. A Escola Nova transfere, portanto, a preocupação dos objetivos e conteúdos para os métodos, e da quantidade para a qualidade. Fonte: Veiga, 1989, p. 50 Ainda a esse respeito, podemos esclare- cer que a Pedagogia Nova expressa uma preo- cupação com a formação do caráter e da per- sonalidade do indivíduo, abrangendo, para tal, conhecimentos da área da biologia e também da psicologia. Um dos principais nomes relacionados ao escolanovismo é John Dewey (1859-1952), educador norte-americano que defendeu a ideia do aprender fazendo, de forma a atender aos interesses da sociedade capitalista ame- ricana, de formar as pessoas nos moldes de- mandados pelo desenvolvimento econômico. Dewey, “[...] empregou a maior parte dos seus esforços na aplicação da psicologia a proble- mas da educação” (SCHULTZ & SCHULTZ, 2000, p.158). A respeito dos fundamentos filosóficos e implicações políticas do pensamento de De- wey, você deve rever os capítulos um e dois do caderno de Didática. Ele considerava a educação como um processo social indispensável, um meio para a continuidade e o progresso ordenado da so- ciedade humana. A respeito da Escola Nova, podemos esclarecer que esta foi uma reação à Pedagogia Tradicional, a qual vigorou até o início do século XX, porém evidenciou resul- tados insatisfatórios para a educação pública, cuja estrutura não se encontrava adequada à vivência do processo educacional, conforme proposto pela mesma. Com o discurso de melhorar a qualidade, a educação muda a estrutura do modelo edu- cacional anterior, de forma a elitizar a quali- dade da educação por intermédio das escolas particulares, cuja estrutura era adequada ao trabalho pedagógico proposto, ao contrário da escola pública. Dessa forma, fica apenas no discurso atin- gir a meta da educação para todo o cidadão, visto que aproximadamente 50% da popula- ção ainda era analfabeta (FACCI, 1998). Quem tinha condições financeiras adequadas para ingressar em escolas privadas tinha acesso à educação de qualidade. Caso contrário, sub- metia-se a uma formação precária nos mais variados aspectos. Estudiosos afirmam que a Esco- la Nova procurou corrigir as “imper- feições” deixadas pela Pedagogia Tradicional; porém, contraditoria- mente, não adequaram as escolas públicas ao novo modelo idealizado para a educação, conforme o mode- lo europeu e norte-americano. O que podemos ponderar que não é diferente da atualidade, ao considerarmos o modelo educacio- nal da Espanha, que vem sendo di- fundido a todo vigor como parâme- tro a nortear a prática pedagógica vivenciada nas escolas brasileiras, a serviço dos ideais das políticas neoliberais, por intermédio do banco mundial. Voltamos a atenção à proposta educa- cional de Dewey e, assim, dizemos que esta pode ser encarada como “escola ativa”, ou seja, o aprendizado é feito a partir do trei- no – tendência influenciada pelo Tayloristo e Fordismo, fato que acena para um modelo de educação cujas origens encontram-se no pensamento de Aristóteles, que valoriza a ati- vidade teórica e a atividade prática. Porém, não supera a dicotomia entre ambas, ao com- preender que a teoria é a técnica que dirige a ação prática. Conforme acima mencionado, para o mo- vimento escolanovista, a educação deixa de ▲ Figura 29: Lourenço Filho, um dos signatários do Manifesto. Fonte: Disponível em: (CPDOC/FGV/ArquivoLou- renço FIlho/LF foto 96-1)>. Acesso em: 14/09/2008. 68 UAB/Unimontes - 1º Período ser centrada no professor que ensina, o que, tradicionalmente falando, remete à teoria. Passa, então, a centrar-se no aluno, o que re- mete à ação prática, descentraliza a atenção na quantidade do conteúdo ensinado e volta- se para a qualidade do ensino. Fato este que, com o decorrer da história da educação brasi- leira, gradativamente provoca a negação do conteúdo a favor da valorização do processo, o que, por sua vez, contribui significativamen- te com o quadro de fracasso escolar encontra- do na realidade educacional brasileira até a atualidade. Com o discurso de humanização e de negação da autoridade da escola tradicional, é proposto que a escola deixe de ser um am- biente de sujeição, de disciplina, de silêncio, para ser um ambiente de alegria, de pesquisa e de dinamismo, de assistência individualiza- da, características impossíveis de serem viven- ciadas na escola pública com as condições em que ela se encontrava, o que a tornava exclu- dente e elitista. (Nogueira, 2001, p. 28). Para Saviani (1997, p. 13), o pensamento de Dewey “desloca o eixo da questão peda- gógica do intelecto para o sentimental; do aspecto lógico para o psicológico; dos conteú- dos cognitivos para os métodos ou processos pedagógicos; do professor para o aluno”. O autor ressalta, ainda, que a teoria pedagógica de Dewey considera que o importante não é aprender, mas aprender a aprender. Importân- cia essa que precisamos esclarecer, não é coin- cidência, faz lembrar os pilares da educação atual afirmados pelas políticas internacionais de cunho neoliberal, oriundas dos países que detêm o capital, para os países periféricos en- tendidos como os mais pobres. Como no caso da América Latina, onde, por sua vez, se en- contra o Brasil. 4.3.2 Criação do Ministério da Educação Na sequência dessa reflexão, alertamos a você que, em 1930, no governo de Getúlio Var- gas, é criado o Ministério da Educação e Saúde Pública. É notório, pela criação desse ministé- rio, como os governos entendiam (e muitos hoje ainda assim o consideram) que educação e saúde deveriam andar juntos para o desen- volvimento da nação. O que não podemos es- quecer é que essa união é uma grande ferra- menta política. Francisco de Campos é nomeado o seu primeiro ministro, promovendo inovações para o setor educacional. No mesmo ano, criou o estatuto das Universidades e organi- zou o ensino secundário. Na sequência de seus atos pela educação, é fundada, em 1934, a Uni- versidade de São Paulo e, em 1937, a Universi- dade Nacional do Rio de Janeiro, atual Univer- sidade Federal do Rio de Janeiro. Duranteo Estado Novo, foram promulgadas as leis orgâ- nicas do ensino, dividindo o curso secundário em ginasial e colegial (clássico ou científico). Embora as propostas de Francisco Cam- pos tivessem o mérito de serem inovadoras, podemos entender o caráter elitista e enciclo- pedista de sua proposta. Segundo Maria Tetis Nunes, citada por Romanelli (1997), o caráter enciclopedista dos programas curriculares do período a tornavam uma educação para a elite. Além do rigor avaliativo da proposta, a obrigatoriedade de se cursar línguas como francês, alemão e latim impossibilitava o aces- so à maioria das pessoas ao ensino, de forma a dar à proposta o caráter excludente. Outra grande criação do período foi a re- forma do ensino profissional. O que não po- deríamos deixar de ponderar é que a criação dos mencionados cursos justificavam-se na demanda da mão de obra especializada para o mercado de trabalho. O primeiro curso profissional a ser cria- do pela reforma de Francisco Campos foi o de contabilidade, seguido de sua devida regula- mentação para o ensino superior (conforme decreto 20.158 de 30 de junho de 1931). Teve grande influência no período o ensino pro- fissional ministrado através das empresas e indústrias, tais como o Serviço Nacional da In- dústria (Senai) e o Serviço Nacional do Comér- cio (Senac). 4.3.3 A criação das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Na esteira da história da educação brasi- leira, encontramos a sociedade brasileira se organizando gradativamente em direção ao processo de industrialização. Em meio às polí- ticas direcionadas ao progresso, a Constituição Federal de 1946 foi a primeira a trazer no seu texto a expressão “diretrizes e bases” associa- da à questão da educação nacional. diCA Preocupados com uma educação pública de quali- dade e que se desvinculas- se totalmente dos dogmas da igreja católica, intelec- tuais do período lançaram, em 1932, o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. Tal documento foi escrito por Fernando de Azevedo e assinado por vá- rios intelectuais da época, como Hermes Lima, Carnei- ro Leão, Afrânio Peixoto, e, certamente, Anísio Teixeira, grande amigo de Fernando de Azevedo. Afirmava o do- cumento que, se a evolu- ção do sistema cultural de um país depende de suas condições econômicas, é impossível desenvolver as forças econômicas e pro- dutivas sem o preparo in- tensivo das forças culturais e o desenvolvimento das aptidões; aos fatores fun- damentais do acréscimo de riqueza de uma sociedade, a educação seria, portanto, fundamental tanto para o processo de desenvolvi- mento quanto o definiria numa ordem dialética (apud Romanelli, 1983). Alegavam os intelectuais que a educação do período privilegiava as elites – área onde atuava a igreja cató- lica com cursos pagos – e que a educação popular necessitava de maior aten- ção estatal. Além disso, a classe média ascendente do período clamava por melhoria do ensino médio, seguidos pelos anseios das classes populares que reivindicavam escolas com ensino primário de boa qualidade. Fazia parte das propostas: Educação de qualidade, pública, gratuita e totalmente laica; Direitos de todos à educação: assegurados que homens ou mulheres deveriam ter acesso às mesmas oportunidades educativas; educação posta para o desenvolvimento econômi- co, financeiro e intelectual de toda a nação; no início da escolarização, escolas pré-primárias e ensino primário se configura- riam num único bloco; o ensino primário deveria ser articulado ao ensino se- cundário; o ensino superior deveria ser diversificado, proporcionando formação em cursos para as carreiras liberais e para as profissões técnicas. 69 Pedagogia - História da Educação Porém, as discussões para a efetivação de uma lei que tratasse especificamente da edu- cação só ocorreu em 1961. Apesar de ser ino- vadora, no sentido de propor legalmente uma estrutura para a educação nacional, essa lei não trouxe significativas mudanças para o ce- nário do período. Destaca-se a sua importância na unifica- ção dos sistemas escolares e sua capacidade descentralizadora, transmitindo para os esta- dos membros da federação a autonomia para exercer a função educadora e o da distribuição de recursos para a educação. O Estado buscou, com o texto constitu- cional, no campo da educação, satisfazer às exigências políticas da época, procurando considerar as reivindicações do Manifesto dos Pioneiros (já apresentado no nosso texto an- teriormente), representante de uma ideologia renovadora próxima da concepção liberal e idealista da educação, que exigia que o Estado assumisse um programa de educação nacional, laica, pública e obrigatória para todos, contes- tando a educação como privilégio de classe. Por outro lado, este mesmo Estado ouviu as exigências da “corrente católica”, ainda dou- trinária e influente, que queria estar presente no cenário da educação, do qual foi excluí- da com a expulsão dos jesuítas. (CARVALHO, 2008). Para Saviani (1997, p.21), esse período foi marcado pelo contexto político e econômico de um país que fazia as “substituições de im- portações” e dava os primeiros passos para o avanço da industrialização, visando proporcio- nar o desenvolvimento do país, condição ne- cessária para a sua libertação nacional. Fique sabendo que, com a mudança eco- nômica e a ruptura política provocada pelo golpe militar de 1964, ao mesmo tempo em que se buscava uma libertação, propagava-se uma política ideológica nacionalista. Isso de- sencadeava um plano econômico que levava à industrialização do país, através de uma pro- gressiva desnacionalização da economia. O Brasil tinha como opção: [...] ou compatibilizar o modelo econômico com a ideologia nacionalizando a economia, ou renunciar ao nacionalismo desenvolvimentista e ajustar a ideo- logia política à tendência que se manifestava no plano econômico. (SAVIANI, 1997, p.82, apud CARVALHO, 2008). Veja você que, em 1965, através da Lei 4.464, o Brasil regulamenta a organização de órgãos de representação estudantil, e estabe- lece acordos como o MEC e seus órgãos, com a USAID (agência internacional de desenvolvi- mento dos EUA), que fazia assistência técnica e cooperação financeira, gerando o acordo MEC-USAID. Através desse acordo, as reformas no Ensino Superior acabam incorporando as tendências modernizantes da economia (CAR- VALHO, 2008). Carvalho (2008) ainda afirma que, no setor econômico, a indústria buscava ser mais autô- noma, porém, para isso, era necessário o inves- timento do capital estrangeiro que se instalava no país, trazendo junto consigo influências nos vários outros setores, como o político e o social. A educação novamente foi considerada meio para se estabelecer a ordem e o progres- so, ou melhor, para promover o desenvolvi- mento que dependia de uma modernização dos meios de comunicação. Essa preocupação foi precursora do slogan “Educação, direito de todos. Escola para todos”. Esse slogan fez com que as exigências de reestruturação educa- cional, sob a ótica do projeto de educação do MECUSAID, fossem incorporadas à Lei 5.692/71, segunda lei de diretrizes e bases da educação. Essa traz a ideia de escola única, com a justificativa de profissionalização universal do ensino de 2º grau. Assim sendo, o ensino primá- rio, antes organizado em 1º ao 4º ano primário e 1ª a 4ª série ginasial, se unifica no chamado 1º grau de 1ª a 8ª série; o 2º grau se profissionaliza e o currículo é reorganizado, tendo como prin- cipal objetivo a formação do cidadão naciona- lista, que vive na ordem e que produz para o progresso. Essa reforma trouxe um grande es- vaziamento da qualidade de ensino. Além disso, por se tratar de uma lei pro- mulgada durante o regime militar, continha fortes pressões às inovações educacionais que trouxessem qualquer tipo de ameaça para o regime ditatorial. Fortaleceu-se, no período, a criação de instituições particulares queaten- diam plenamente aos ditames dos militares (CARVALHO, 2008). Podemos considerar que, no contexto em questão, encontramos o Plano Decenal de De- senvolvimento Econômico e Social de 1967 a 1977, que ocasionou alterações tanto no Ensino Superior (Lei 5.540/68) quanto no ensino básico (Lei 5.692/71). Assim, não podemos deixar de ponderar para você que, por intermédio da entrada do capital estrangeiro, as políticas vigentes bus- cavam fortalecer o Estado, com fins a tornar o Brasil uma potência econômica, o que tornou o sistema educacional adequado ao modelo im- posto pelas políticas norte-americanas para a América Latina. Veja você que foram criadas, nesse contex- to, faculdades particulares, que funcionavam como empresas, com o intuito de obter lucros. diCA A reforma Francis- co Campos tornou obrigatória no ensino a realização de uma arguição mensal, uma prova parcial a cada dois meses e um exame final. Era o total de 130 provas e exames, o que equivalia a uma prova a cada dois dias de aula. Nesse mesmo período, era criada a função de “inspetor”, profissional que para “fiscalizar” o bom andamento das propostas educacionais. diCA Em 1911, o engenhei- ro norte-americano Frederick W. Taylor publicou Os princípios da administração cientí- fica; ele propunha uma intensificação da divisão do trabalho, ou seja, fracionar as etapas do processo produtivo de modo que o trabalha- dor desenvolvesse tare- fas ultra-especializadas e repetitivas. O norte-a- mericano Henry Ford foi o primeiro a por em prática, na sua empresa “Ford Motor Company”, o taylorismo. Posterior- mente, ele inovou com o processo do fordismo, que, absorveu aspectos do taylorismo. Consistia em organizar a linha de montagem de cada fábrica para produzir mais, contro- lando melhor as fontes de matérias-primas e de energia, os transportes, a formação da mão de obra. 70 UAB/Unimontes - 1º Período Enfim, você precisa ter claro que a organização social brasileira ocorrida nas décadas de 1960 e 1970 marcou a história da educação desse país por atribuir a ela um papel unicamente econômico, fazendo dela um veículo de desen- volvimento econômico-industrial, a favor do desenvolvimento e da manutenção de condi- cionantes sociais, políticos, ideológicos e eco- nômicos, que contribuíram decisivamente para o processo de escravização do Brasil em relação ao capital estrangeiro, representado pelas clas- ses dominantes, compostas pelos grandes em- presários e pelos Estados Unidos. Para prosseguirmos as nossas conversas, precisamos ter claro que, nas mencionadas dé- cadas, o Estado visava modelar e remodelar a formação das pessoas com um perfil técnico, para promover o desenvolvimento social de- sejado a partir da relação capital-trabalho-e- ducação como instrumento da acumulação de capital. Na sequência, é pertinente ressaltarmos que o aumento das vagas nas escolas, sem o investimento na qualidade da educação, pro- vocou a evasão e a repetência e, ainda, um processo de formação de professores inade- quado ao perfil necessário a um modelo de educação de pessoas emancipadas. Na esteira da história, com o fim da dita- dura militar e com o projeto de desenvolvi- mentismo econômico falido, ganham fôlego no Brasil discussões referentes aos problemas sociais e, em meio a tais discussões, encon- tramos as referentes à realidade educacional vivenciada no país. Por meio das discussões mencionadas, são realizadas críticas pelos educadores que se articulam com base em ideias marxistas oriundas de sociólogos fran- ceses como Bourdieu e Passeron, Baudelot e Establet e do filósofo Althusser, e assim, de- nunciam a escola como aparelho ideológico do estado. No contexto em questão, o tecnicismo vazio de conteúdo que predominava passa a dar vazão a novas concepções que, de acor- do com Mialchi (2003), implantaram-se como forma de aceitar e entender os excluídos, en- tre eles o professor. O que entendemos fazer parte de um discurso imbuído dos interesses das políticas de globalização, que priorizam perspectivas individualizantes, cujos objetos de estudo requerem a interpretação de forma subjetiva, e assim, podem ser entendidos em uma perspectiva micro, de forma a deixar à margem as questões históricas, políticas e eco- nômicas vivenciadas pela sociedade. Nesse período da história, no que se refere ao cenário mundial, é promovida pelas políticas neoliberais, por meio dos países economica- mente mais favorecidos, uma nova organização da sociedade capitalista, cujo resultado implica o domínio dos países ricos sobre os países pe- riféricos, especialmente os países da América Latina, como no caso do Brasil. Para que você compreenda melhor a his- tória da educação brasileira no período em questão, apresentamos o nosso pensamento a respeito das ideias da Jacomeli (2007), quando essa autora se refere ao cenário histórico políti- co mundial, ponderando que, com a queda do Muro de Berlim, em 1989, por meio de alianças econômicas e geopolíticas realizadas pelas su- perpotências mundiais, o mundo é redesenha- do, transpondo fronteiras e promovendo a arti- culação da globalização e do capitalismo. Assim, com o neoliberalismo, afirma-se a democracia a serviço do aumento de lucro do capital internacional, que legitima a globaliza- ção do capitalismo. Dessa forma, é difundida a ideia de que, para viver em uma sociedade com igualdade de oportunidades e mais humana, é preciso que os indivíduos sejam democráticos, para não gerar oposições e possíveis resistên- cias a favor de outra forma de ideologia. diCA O Banco Internacional de Reconstrução e De- senvolvimento (BIRD), conhecido como Banco Mundial, foi criado em 1944 e surgiu com a tarefa de reconstruir os países europeus desestruturados pelo segundo grande conflito mundial. Sob um forte domínio dos Estados Unidos, que o preside desde a fundação, o Banco tinha como objetivo discutir os rumos das reformas do pós-guerra, visando impulsionar o cresci- mento econômico e evitar novas crises inter- nacionais. Vale ressaltar que, nesse contexto, ao Banco era dado um papel secundário: o da reconstrução das eco- nomias inviabilizadas pela guerra e para con- cessão de empréstimos, a longo prazo, para o setor privado, recaindo sobre o FMI o maior interesse das nações líderes (TOMMASI, 1996, p. 18). De sua criação até hoje, o Banco Mundial passou por mudanças consi- deráveis, consequência das transformações ocorridas no cenário mundial. Assim, a partir dos anos 50, paulatina- mente, foi adquirindo um perfil de instituição financiadora de projetos em países emergentes ou em desenvolvimen- to, ampliando, inclusive, para cerca de 180 o número de países mem- bros (FONSECA, 1995, p. 46). Isto lhe deu a condição de ser, na contempora- neidade, a instituição de maior influência no cenário político e eco- nômico e educacional do mundo. Figura 30: Educação e Neoliberalismo. Fonte: Disponível em: < http://www.riopreto- -in-net.com.br/walmir/ site.html >. Acesso em: 10/09/2008 ► . 71 Pedagogia - História da Educação Ressaltamos, aqui, que as políticas eco- nômicas, sociais e educacionais brasileiras também são organizadas de acordo com o neoliberalismo. Ou seja, por organizações financeiras a serviço dos interesses das em- presas transnacionais, tornando a educação dependente das políticas e dos financiamen- tos intervencionistas dos organismos interna- cionais. Segundo Sanfelice: Hoje é notório o financiamento internacional da educação e a intervenção das agências mundiais na estruturação dos sistemas de ensino, mas na lógica de mercado a educação torna-se um produto a ser consumido por quem demons- trar vontade e competência para adquiri-la, em especial a educação ministrada nos níveis médio e superior. As teses neoliberais têm sido pródigas em propor argumentos favoráveis à privatização da educação como formadora das elites ou para dar a cada umo que sua função exige, e que não pode ser obtido por meio de uma educação pública comum. (SANFELICE, 2001, p. 10). Percebemos, assim, uma política educa- cional que não só permite como também in- centiva a privatização, assim como na década de 30. Com o discurso de investir na qualida- de, justifica-se a ideia de que a sociedade re- quer o trabalhador adequado às transforma- ções sociais originadas pela globalização. O que, por sua vez, exige a mudança do modelo de educação. Nessa mesma direção, encontramos a po- lítica de descentralização do Estado, por meio da transferência de responsabilidade aos mu- nicípios por intermédio dos serviços públicos, o que se estende ao ensino. Para prosseguirmos nossas reflexões, pre- cisamos nos ater aqui em pensar um pouco a respeito da responsabilidade que é atribuída aos municípios sobre a educação. Isto ao con- siderarmos as implicações que podem ocorrer diante de tal realidade. Por exemplo: você já pensou no fato de que os municípios brasilei- ros são muito diferentes? Tanto culturalmente, economicamente, socialmente, o que possivel- mente vai acarretar um desnível na qualidade da educação brasileira? O que podemos en- tender que determinados municípios, devido a diversos fatores, como localização geográfi- ca, cultura etc, terão possibilidades de produ- zir melhores condições de educação para as pessoas em relação a outros? Assim, ponde- ramos que tal política privilegia determinadas regiões como forma de promover a exclusão de muitas outras no que se refere à qualidade da educação das pessoas. Aqui, é conveniente sabermos também que atribuir a responsabilidade da educação ao município não é coisa tão nova, pois desde a década de 1970 tal tarefa é recomendada pelo Banco Mundial e, finalmente, consolidada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96, para atender aos interesses do Estado minimalista, idealizado pelo neoliberalismo. Assim, o Estado deixa de ser responsável pelo sistema nacional de educação e efetiva- se a descentralização da organização da es- cola, por meio da regionalização dos currícu- los. Dessa forma, desarticulados do currículo nacional, promove a fragmentação do saber, desarticula os professores, que assumem uma posição alienada, ao deixarem de questionar a sua condição político-social de sujeito da edu- cação. De acordo com Mialchi: Este processo promovido pela nova organização capitalista é em grande parte incentivado pelas suas instituições de fomento. Referimo-nos ao Banco Mun- dial e ao Fundo Monetário Internacional, que passam a ditar na década de 1990 o conjunto ideário político pedagógico aos países ditos periféricos. É assim que vemos pelo Plano Decenal de Educação para Todos (1993) elaborado pelo MEC, mas que, buscando traçar um diagnóstico da situação educacional, se detém ao ensino fundamental, a mesma perspectiva apresentada na Declaração Mun- dial sobre Educação para Todos (1990). Este último foi elaborado como diretriz à educação mundial na reunião de Joentin, Tailândia (MIALCHI, 2008, p. 38). Ao considerarmos a nova organização acima mencionada e o domínio dos países sobre outros, ressaltamos que tal realidade ocorreu por meio da inculcação de valores no indivíduo e que a escola é utilizada para incul- cação de tais valores. Assim, é necessário di- fundir a ideia de que a melhor e única maneira possível de atender socialmente é por inter- médio da educação escolar. Diante do exposto, precisamos ter claro ainda que, com o objetivo redirecionamento à educação escolar, dirigido em grande parte na figura do professor, é atribuída a ele a responsa- bilidade pelo resultado escolar dos alunos. Va- mos agora caminhar pela história da educação brasileira, com vistas a pensar a nova organiza- ção escolar, de forma a atender às demandas das políticas internacionais de cunho neoliberal. Necessitamos, ainda, esclarecer que, de acordo com a lógica das políticas internacio- nais já mencionadas, para atender à reformu- lação do currículo da educação básica, espe- diCA Da constituição de 1988 à Lei nº 9.394/1996 No ano de 1988, é promul- gada a atual Constituição que traz no artigo 3º “... educação é um direito de todos e dever do Estado e da família...” (BRASIL, 1988), para o estabelecimento do pleno desenvolvimento. Depois dessa data, vários outros documentos são criados, em âmbito nacio- nal, para fazer valer os seus ideais para a educação, vejamos: Em 24 de novem- bro de 1995, foi aprovada a Lei 9.131, dispondo sobre as atribuições do Conselho Nacional de Educação, órgão vinculado ao MEC. Tem funções normativas, deliberativas e de asses- soramento ao Ministro de Estado da Educação no desempenho das funções e atribuições do poder público federal em matéria de educação, cabendo-lhe formular e avaliar a política nacional de educação, zelar pela qualidade do ensino, velar pelo cumprimento da legislação educacional e assegurar a participação da sociedade no aprimo- ramento da educação. Em 1996, é criada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/1996. Segundo Saviani (1997), a LDBEN surge da mobilização do grupo de educadores que lutaram durante todo o nú- mero de Constituições no Brasil na época do regime militar e em consonância com as novas necessidades da sociedade brasileira. Complementa, ainda, que historicamente a nossa educação caminhou, ora respondendo às políticas, ora indo ao encontro das necessidades da nossa economia, mas pouco preocupada com um pla- nejamento a longo prazo. Em 2001, é aprovado o Pla- no Nacional de Educação (PNE) que traça diretrizes e metas para a educação no Brasil e tem prazo de até dez anos para que todas elas sejam cumpridas. Para isso, o governo transfor- mou o PNE em lei, que pas- sou a valer a partir do dia 9 de janeiro de 2001. Entre as principais metas, estão a melhoria da qualidade do ensino e a erradicação do analfabetismo. Nem todos os itens do plano foram aprovados pelo governo federal. 72 UAB/Unimontes - 1º Período cialmente o Ensino fundamental, presente na LDB de 1996, foram elaborados para o Brasil os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) em 1997, que constitui um conjunto de temas que aparecem transversalizados nas áreas definidas, isto é, permeando a concepção, os objetos, os conteúdos e as orientações di- dáticas de cada área, no decorrer de toda escolaridade obrigatória. A trans- versalidade pressupõe um tratamento integrado das áreas e um compromisso das relações interpessoais e sociais escolares com as questões envolvidas nos temas, a fim de que haja uma coerência entre os valores experimentados na vivência que a escola propicia aos alunos e o contato intelectual com tais valo- res. As aprendizagens relativas a esses temas se explicitam na organização dos conteúdos das áreas, mas a discussão da conceitualização e da forma de trata- mento que devem receber no todo da ação educativa escolar está especificada em textos de fundamentação por tema (BRASIL, 1997, p. 64). Por meio dos Parâmetros Curriculares, organizados em forma de Temas Transversais, o currículo das escolas brasileiras consiste em uma adaptação do currículo espanhol, que fora elaborado no contexto da abertura polí- tica, e que, na atualidade, não era mais condi- zente com a realidade da Espanha. Dessa forma, é produzida para a educa- ção brasileira uma maneira de difundir valores referentes ao cotidiano das pessoas a fim de promover o discurso da paz entre os homens. Valores esses necessários à manutenção do ca- pitalismo presente na sociedade globalizada. Dessa forma, atribui-se à educação escolar a função de formar pessoas para serem cidadãs do mundo, com perfil para atuar em uma so- ciedade democrática. Com o mencionado intuito, valoriza-se a vida cotidiana que, por sua vez, é expressa nos conteúdos de forma adaptada, e tem objetivos que apontam uma preocupação em construir uma identidade nacional e pessoal a valorizar apluralidade do patrimônio sociocultural das diversas nações, contra qualquer que seja o tipo de discriminação. Na verdade, com o in- tuito de globalizar a cultura dos países domi- nantes sobre os países periféricos. diCA Em 2001, é aprovado o Plano Nacional de Edu- cação. O Plano Nacional de Educação (PNE) traça diretrizes e metas para a educação no Brasil e tem prazo de até dez anos para que todas elas sejam cumpridas. Para isso, o governo transformou o PNE em lei, que passou a valer a partir do dia 9 de janeiro de 2001. Entre as principais metas estão a melhoria da qualidade do ensino e a erradica- ção do analfabetismo. Nem todos os itens do plano foram aprovados pelo governo federal. Veja aqui o que é o PNE, suas principais metas e os vetos do governo. As metas devem ser reformuladas ao final do decênio e proposta para os próximos dez anos. O governo lança o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) com medidas com as quais o governo espera melho- rar o desempenho das instituições educacio- nais de todos os níveis. Embora mais voltado para a educação básica, o Plano tem, no con- cernente à educação superior, duas metas principais: a ampliação do acesso e a articula- ção entre os programas de financiamento do ensino superior. Figura 31: Educação e igualdade. Fonte: Disponível em: < http://www.infojovem. org.br/.../educacao- -especial/ >. Acesso em: 10/09/2008. ► 73 Pedagogia - História da Educação Através dos estudos realizados, pode- mos perceber que, na história da educação brasileira, não é novidade a utilização do dis- curso de respeito às diferenças com o intuito de promover a violência cultural para favore- cer órgãos de financiamento das políticas in- ternacionais, que se interessam em globalizar o consumo. Assim, tais valores são veiculados pelos meios de comunicação, como no caso das novelas, que trazem para dentro dos lares cenários que representam culturas diversas e valores diversos a serem difundidos. Segun- do Dalarosa, nos Parâmetros Curriculares Na- cionais: [...] como se essa noção tivesse uma existência independente do texto que o instituiu como novo objeto. Da mesma forma, quem passa diretamente à análi- se dos textos específicos das áreas disciplinares é porque se torna ‘compelido’ pela ‘autoridade’ estabelecida pelo texto a não fazer certas questões prévias que poderiam colocar em dúvida as bases e os princípios sobre os quais estão assentados os PCNs. Isso nos faz concordar que colocar a ênfase no estabeleci- mento de um currículo nacional significa desviar a atenção precisamente dos fatores que estão no início da cadeia casual que leva aos baixos desempenhos (DALOROSA, 2001, p. 207). Mais uma vez, em nome da situação in- grata com as pessoas que não possuem os bens materiais necessários para vivenciar o consumo, tanto dos bens culturais como dos bens materiais de forma organizada, os PCNs afirmam que as diferenças se resumem em diferenças culturais. Ao não mencionar as di- ferenças econômicas tão evidentes nas escolas públicas desse país, limita o olhar das pessoas e, consequentemente, a consciência crítica. Ao buscarmos os objetivos dos PCNs, de acordo com o pensamento de Jacomeli (2007), compreende algo natural, promovendo um discurso de conformismo, de aceitação entre as pessoas, de forma a negar que as diferen- ciações entre as classes diversas não podem ser consideradas algo natural, pois se funda- mentam em questões econômicas, que, por sua vez, são produzidas pelos homens, de acordo com determinadas conveniências. Enfim, você precisa entender aqui que, no contexto evidenciado no parágrafo anterior, os PCNs trazem em si uma ideia de que existe um parâmetro natural a ser seguido. 4.4 A educação superior no Brasil pós LDBEN 9.394/1996 Em se tratando de ensino superior, o Brasil registra um crescimento no número de matrícula e na criação de novos cursos, sobre- tudo na rede privada. No entanto, segundo Dourado (2002), as políticas de expansão da educação superior no país caracterizam-se por serem assincrônicas e o nível de ensino por mostrar-se amplo e heterogêneo, permea- do por práticas de natureza pública e privada, com predominância destas últimas (ALMEIDA e SILVA, 2007). Nos últimos anos, houve um processo ex- pansionista no setor. Em 1999, por exemplo, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Edu- cacionais, INEP, registra que o ensino superior brasileiro cresceu substantivamente em 11,8% em relação à matrícula do ano anterior. Para a então presidente do Instituto, He- lena Guimarães de Castro, esta foi a maior taxa de crescimento das últimas duas décadas (CASTRO, 2000, apud CATANI, 2002) universi- tários, faculdades integradas, instituições de ensino superior e demais instituições isoladas, amparadas pelo Conselho Nacional de Educa- ção que, em 1999, aprovou a criação de 567 novos cursos universitários – mais da metade do que fora aprovado em toda a história do CNE (Folha de S. Paulo. 26.02.02). Nesse contexto, veja você que há, tam- bém, um novo delineamento na política de formação de professores, vinculada ao estrei- tamento das exigências postas pelas reformas educativas da educação básica, que visam à formação das novas gerações. A formação ini- cial de professores, na ótica oficial, “deve ter como primeiro referencial as normas legais e recomendações pedagógicas da educação básica” (MELLO, 2000). Constata-se, no setor, a ideia de que é inviável ao poder público finan- ciar, a preço das universidades tidas como “no- bres”, a formação superior de professores para a educação básica, uma vez que somam mais de um milhão. Diz-se que, com um volume muito menor diCA Jacomeli (2007) afirma que a Conferência Mundial de Educação para Todos, realizada em Jomtien, em 1990, marcou a articulação e interferência das agências internacionais nas políticas neoliberais, sendo que o Banco mundial passou a ser o grande financiador das propostas educacionais para os países em de- senvolvimento, dentre eles o próprio Brasil. Como financiadora das propostas, as agências internacionais se veem em condições de dizer como e o quê deve ser oferecido pela educa- ção, que passa a ter uma proposta comum de conhecimento em todos os países que vêm realizando Reformas em seus currículos educa- cionais, de forma que haja uma conformação de todos os cidadãos para uma única realida- de através de uma “sutil” inculcação ideológica. 74 UAB/Unimontes - 1º Período de recursos, em tempo e situações de aprendi- zagem, também reduzidos, chega-se ao mes- mo resultado, justificando-se a aprovação, pelo CNE, do número de cursos universitários, cita- dos acima, sobretudo na iniciativa particular, promovendo, quando não, a concorrência ou parcerias entre os setores público e privado. Ainda, a esse respeito Freitas, afirma que: A política de expansão da educação dos institutos superiores de educação e cursos normais superiores, desde 1999, obedece, portanto a balizadores postos pela política educacional em nosso país em cumprimento às lições dos orga- nismos financiadores internacionais. Caracterizados como instituições de cará- ter técnico-profissionalizante, os ISE’s têm como objetivo principal a formação de professores com ênfase no caráter técnico instrumental, com competências determinadas para solucionar problemas da prática cotidiana, em síntese, um “prático”. (FREITAS, 2002, p. 54) No viés ideológico, vamos ver que o Banco Mundial exerce uma função exponencial. No en- tendimento de Coraggio (1996), em estudo publicado por Dou- rado (2002) apud Almeida e Sil- va, (2007), esta instituição está por trás da ideia que defende um reducionismo economicista, baseado no vetor custo-benefí- cio, assim como da descentrali- zação que permite desarticular setores já organizados e da ca- pacitação docente, em progra- mas paliativos e rápidos, com os professores em serviço. Nesse último caso, cria-se a ilusãode um movimento de constante melhoria na capaci- tação pedagógica, o que, na prática, configu- ra-se por aparente atualização, muitas vezes desfigurando a realidade em que o professor atua, alienando-o com mistificações pedagó- gicas ou conteúdos vazios de formação aca- dêmica, causando uma situação inversamente proporcional ao discurso, pois exclui as popu- lações pobres do mercado, o qual baseia suas exigências no acúmulo de conhecimentos es- pecíficos, e não na educação via amenidades. O ensino no Brasil enfrenta uma situa- ção singular nas duas últimas décadas. Fruto de lutas, contradições, adaptações às ten- dências, interesses econômicos, encontra-se numa situação tanto de reestruturação quan- to de melhoria. Referências ALMEIDA, Admário Luiz de; SILVA, Huagner Cardoso da. Formação de professores e qualidade de educação no Brasil, à luz das propostas do Banco Mundial. Revista Ciranda (Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES), v. 01, p. 63-78, 2007. AZEVEDO, Fernando de. A cultura brasileira: introdução ao estudo da cultura no Brasil. 4. ed. Brasília. Ed. Universidade de Brasília, 1963. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: introdução aos parâmetros curriculares nacionais/Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997. 126 p. CATANI, Afrânio. educação superior ao Brasil: reestruturação e metamorfose das universidades públicas. Petrópolis: Vozes; 2002. CARVALHO, Rita de Cássia Gonçalves de. 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