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FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO G o v e r n o d e M i n a s G e r a i s Governador do Estado de Minas Gerais ITAMAR FRANCO Secretário de Estado do Planejamento e Coordenação Geral MAURO SANTOS FERREIRA da COSTA Presidente da Fundação João Pinheiro JARBAS NOGUEIRA de MEDEIROS SILVA Diretora do Centro de Estudos Históricos e Culturais SYLVANA de CASTRO PESSOA SANTANA • r j \ 1 RELATÓRIO TÉCNICO FINAL 100 ANOS DE MODERNIDADE: Anuário da Arquitetura de Belo Horizonte Ref.: TEC 1041/96 Financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIG Ago/1998-Abr/2000 Sistema Estadual de Planejamento Fundação João Pinheiro Centro de Estudos Históricos e Culturais Ago/1998-Fev/2001 Belo Horizonte 2001 SUMÁRIO Equipe Técnica Colaborações e Agradecimentos Apresentação Resumo O Plano e a Utopia na Construção da Cidade Moderna A Cidade como Centro Polarizador e Espaço de Diversidades Políticas Públicas e Transfigurações na Paisagem Urbana Administração e Planejamento: Tentativas de Ordenamento da Expansão Urbana O Processo de Metropolizaçao e ss Novas Diretrizes de Planejamento Viabilizando Propostas: A Cidade como Espaço do Cidadão Bibliografia EQUIPE TÉCNICA Coordenação: Carlos Roberto Noronha Pesquisa e redação final: Andréa Mendonça Lage da Cruz Carlos Roberto Noronha Fádua Maria de Sousa Güstin Maria Marta Martins de Araújo Maria Valeska Duarte Drummond Consultores: Lúcia Raquel Serrano - Projeto Gráfico Miguel Aun - Fotografia Rita de Cássia Lucena Velloso - Teoria e História da Arquitetura Normalização Helena Schirm Estagiários André Luiz de Oliveira Fernanda Cançado Fernandes Flávio de Lima Souza Gustavo de Melo Franco Juana Bárbara Castro Karina Oliveira Gonçalves Márcia de Araújo Ramilson Noronha Santiago Roberto Eustáquio M. Santos Silvânia Maria da Silva Zilda Maria Teixeira Apoio administrativo: Luzia Oliva Barros Josely Durães Caminhas Kellen Regina Rodrigues Soares Conceição Aparecida Ferreira Wallace G. T. Gomes Fernando A. Rodrigues de Paula Colaboração na I a fase - ago./dez. 1998 IEPHA-MG: Jurema de Sousa Machado Ruth Villamarin Soares Breno Decina Filho Maria Inês Cândido Silvana Cançado Trindade Daniele Groenner Barbosa Marcelo de Oliveira Marangoni Agradecimentos Para a realização deste trabalho contamos com a preciosa colaboração das seguintes pessoas e instituições: Ana Maria Saraiva Arquivo da Cúria Metropolitana de Belo Horizonte Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte Arquivo Público Mineiro Biblioteca da Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais Biblioteca Central da UFMG / Coleção Linhares Biblioteca da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG Biblioteca da Fundação João Pinheiro Biblioteca da Prefeitura de Belo Horizonte Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa Câmara Municipal de Belo Horizonte Conselho do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte Coordenadoria de Documentação e Informação da COPASA/MG Délcio Antônio Duarte Escola de Arquitetura da UFMG Faculdade de Arquitetura Isabela Hendrix Fátima Cristina Gomes Diniz Cândido Araújo Hemeroteca Pública Museu Histórico Abílio Barreto Prodabel Milton Menezes Magalhães Pedro de Fátima Teixeira Secretaria de Estado de Obras Públicas Secretaria de Estado da Cultura Secretaria Municipal da Cultura - Conselho Deliberativodo Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte Secretaria Municipal de Atividades Urbanas Universidade Federal de Minas Gerais - Departamento de Planejamento Físico e Obras Wanda Lúcia Fagundes de Freitas APRESENTAÇÃO "No capitalismo, os próprios objetos são sonhos coletivos que extraem seu poder alucinatório da produção em massa e do merchandisign." GEORG STEINER - Cambridge O sonho utópico da criação de Belo Horizonte pode ser representado pela obsessão alucinatória da produção em massa em busca da modernidade. Para Walter Benjamin, inconclusão é a palavra chave para o modernismo e Adorno afirma que a totalidade é a mentira. Estas assertivas estão refletidas na construção de Belo Horizonte e seu processo de produção do espaço, paradigma dessa modernidade, que se enquadra na poética do fragmentário, dos fragmentos que apoiam nossa ruína, ou seja, na cidade eternamente inacabada, sempre em reconstrução, de final aberto, que gera seu próprio modelo de imensidão incompleta. Belo Horizonte é sem dúvida uma cidade criada dentro da filosofia modernista. E segundo STEINER, no "modernismo a forma não é um ato concluído, mas processo e constante revisão". Neste trabalho, o fragmento tornou-se uma referência para responder a questão principal da pesquisa: como se deu a construção do espaço urbano de Belo Horizonte? Consideramos, também, que a inconclusão é uma dimensão desta empreitada de reconstituir a arquitetura de Belo Horizonte, ano a ano, abrangendo as políticas públicas, a vida cultural, as notícias em jornais e revistas, e as descrições individuais de obras arquitetônicas. Desta forma, seguindo o citado conceito de modernidade, o resultado é apresentado em "fragmentos", que possibilitam leituras dissociadas, nos volumes que compõem o relatório final. São fragmentos de políticas públicas, fragmentos de vida cotidiana, fragmentos de arquitetura, fragmentos imagéticos, enfim, fragmentos de 100 anos, ou mais, de modernidade. Assim, permanece a hipótese de que qualquer obra de arte acabada (e a cidade conforme nos coloca MUMFORD é a maior obra de arte feita pelo homem, junto com a linguagem), significa a morte de sua intenção, da visão conceituai que a originara. Esse duplo enfoque da inconclusão - da cidade de Belo Horizonte e do presente trabalho - deixa como desfecho a possibilidade de uma complementação, uma obra em aberto, que talvez nunca venha a se concretizar plenamente. Como os principais filósofos da modernidade - HEIDEGGER, que não concluiu a prometida terceira parte de Ser e Tempo, e WITTGENSTEIN, que não chegou ao final das Totalidades Formais (prometidas) —, nós, sem a pretensão de nos igualarmos aos grandes mestres, também deixamos inacabada a pesquisa, ou talvez, aberta, passível de ser tomada como referência para continuidades frituras... O século XX, que podemos designar, dentre outros codinomes, como aquele além da modernidade, não exige a perfeição, pois a realização concluída, como vimos acima, é a antítese da modernidade. STEINER coloca que "a aceleração e a violência da história [...], o desaparecimento em grande escala dos privilégios da privacidade, do silêncio e do lazer, que permitiam o exercício da leitura e da resposta estética, a economia do efêmero, do descartável e reciclável que alimenta o mercado de consumo de massa, seja na mídia, seja na fábrica, militam contra as representações de completude e totalidade [...] A colagem feita de detritos, de coisas efêmeras, de utensílios banais..." são os componentes estruturais dessa pesquisa. Esses detritos, essas coisas efêmeras, as formas banais, dão o ritmo aos capítulos, cuja "seqüência" não tem a pretensão de esgotar o assunto. Trata-se de uma organização cronológica, que tenta penetrar e invadir a privacidade de alguns lugares e objetos capazes de construir, de forma relativamente efêmera, o fragmentado cenário urbano atual. Após uma pesquisa na qual foram consultados, principalmente, mais de 20.000 micro-filmes e projetos pertencentes a Secretaria Municipal de Atividades Urbanas e à PRODABEL, conjugadas com as pesquisas ano a ano efetuadas em jornais e revistas nos arquivos públicos de Belo Horizonte, ficamos imbuídos do desejo de ampliar os conhecimentos sobre a cidade. A investigação mostra uma contínua destruição de legados deixados por nossos antecedentes, tanto por parte do poder público como pela iniciativa privada. Os valores para justificar essa destruição são fornecidos pelo capitalismo e pelo mercado de massa. Cada informaçãoera uma trilha aberta para novas investigações. As descobertas nos apontavam que fatos "adormecidos deveriam ser despertados". Sem dúvida, a vasta investigação realizada abriu sótãos e porões cheios de memórias. Assim, em função de sua amplitude, todas as pesquisas efetivadas, por mais de dois anos, não puderam ganhar uma formatação adequada ao relatório. Ficaram grande parte delas apenas como vestígios, que vão possibilitar novas incursões e releituras dos fatos. Pela necessidade de concluir o inconcluível, partimos para uma triagem, em que cada pesquisador, de acordo com sua área de atuação, elegeu aspectos prioritários, que ganharam maior visibilidade nos documentos finais. Grande parte das referências iconográficas encontradas não puderam ser transformadas em cópia, devido aos custos previstos para o projeto. Assim, também, foram priorizadas as imagens até os anos de 1960, compatíveis com o orçamento, e mais difíceis de serem resgatadas posteriormente. Uma parte significativa das imagens referentes ao período 1960/2000 foi catalogada. Algumas destas foram fotografadas, porém, como simples referências para trabalhos posteriores, servindo como suporte para descrições de obras do período. É desejo da Fundação João Pinheiro tornar pública uma versão, conclusiva, de toda a pesquisa, através do projeto de editoração, já elaborado, intitulado: Belo Horizonte: a construção do espaço e modos de representação de sua arquitetura. Cabe ressaltar que se trata de um trabalho inédito, dado que não existem obras que sintetizem um conjunto tão significativo de informações, além de corrigir, ainda, algumas informações equivocadas que constam de outras publicações. Sabemos que, além da cidade legal, estende-se uma outra cidade que escapa das regulamentações e normas do poder público. Pesquisar esta outra cidade, com sua arquitetura de cunho popular, demandaria métodos de investigação mais complexos, além de um tempo maior, que extrapolaria o cronograma fisico-financeiro inicialmente proposto. Ressalta-se que a pesquisa privilegiou o exame das obras civis que passaram por aprovação municipal, tentando suprir uma lacuna existente nesta área e, inclusive, como afirmamos, corrigir algumas leituras do espaço legalmente construído. Conscientes dos limites da pesquisa, finalmente, observamos que o cenário esboçado neste estudo representa apenas parte do espaço construído da cidade de Belo Horizonte. A equipe técnica - fevereiro de 2001 RESUMO Diferentemente da grande maioria das cidades, Belo Horizonte não surgiu do livre movimento das forças econômicas e sociais, mas de uma vontade política, ou seja, da iniciativa de um grupo dirigente que, no intuito de demarcar claramente o seu tempo e sua origem, empregou todos os recursos disponíveis na construção de uma capital-símbolo. Republicana, moderna e científica, Belo Horizonte nasceu assim em fins do século XIX com a grande tarefa de materializar ideais, sonhos e esperanças. Sonhos de uma nova arquitetura que se colocava em oposição ao 'Velho e repetitivo estilo colonial"; das ruas largas e das grandes avenidas; da eletricidade, traduzida em iluminação pública e bondes; enfim, dos novos hábitos urbanos. Nesse sentido, uma das particularidades de Belo Horizonte é, portanto, o papel significativo desempenhado pelo poder público desde a sua criação. Segundo a ótica de seus idealizadores e primeiros administradores, era preciso conduzir atentamente tanto a implantação como a consolidação desse novo espaço proposto para ser o centro administrativo e econômico de Minas Gerais. Evidentemente, esse processo não foi linear e nem mesmo unilateral. Desde o seu início, foi claramente marcado pelo embate entre os interesses públicos e privados e pela contradição entre os projetos e as propostas urbanas e a realidade concreta. Este volume busca, então, analisar o papel exercido pelo poder público na configuração do espaço urbano e na conformação arquitetônica de Belo Horizonte a partir de um amplo trabalho de pesquisa e análise de fontes primárias, podendo ser destacados os relatórios administrativos, toda a legislação produzida sobre o tema, além de jornais e diversos textos de época. Em função dos parâmetros e diretrizes adotados no planejamento e condução das políticas públicas, em diferentes momentos da trajetória da cidade, foi proposta uma periodização, dentro da qual foram estruturados os capítulos e a narrativa histórica apresentada a seguir. 1 O PLANO E A UTOPIA NA CONSTRUÇÃO DA CIDADE MODERNA Belo Horizonte, enquanto cidade planejada para ser a capital de Minas Gerais, nasceu sobretudo da vontade política e do compromisso de um grupo de indivíduos com a consolidação do regime republicano. "A criação de Belo Horizonte, encerramento do século passado, romântico e oratorio, marca a presença de uma nova mentalidade política, mais de acordo com a era técnica característica do século XX. Foi uma espécie de novo bandeirismo, o impulso que então dominou o governo mineiro e as camadas mais influentes da opinião popular. Bandeirismo nada primitivo, mas racionalista, científico, cujos capitães de tropa eram jovens ou já famosos engenheiros, higienistas, construtores, calculistas, desenhistas, técnicos de todo gênero." (FRANCO, 1955, v. l , p. 277). Concebida por uma comissão construtora formada, na sua grande maioria, por engenheiros da Escola Politécnica do Rio de Janeiro, a Nova Capital reproduz no seu plano as tendências urbanísticas de sua época. As origens e a própria formação histórica de Belo Horizonte podem ser então decifradas através de uma análise mais profunda da convivência, nem sempre harmoniosa, entre a política e a técnica1 e, por outro lado, do conflito que se estabelece entre a utopia de uma cidade símbolo do progresso e da modernidade e sua tradução numa perspectiva racional e normalizadora do espaço e dos usos na cidade - o plano - e a realidade histórica. E nesse jogo entre, de um lado, política e técnica, aliadas por um urbanismo ainda emergente, para o caso brasileiro, e a prática social, sempre inovadora e criadora de novas possibilidades, que se configura um modelo de gestão urbana bastante peculiar e uma fisionomia estética e arquitetural própria. 1 Essa questão já se observa desde o início do processo de mudança da Capital. Não foi mantida a indicação de Aarão Reis, que apontou, como a melhor localização para a Nova Capital, a Várzea do Marçal, decidindo-se, no Congresso Mineiro, pelo arraial do Belo Horizonte. "Os votos decisivos a favor de Belo Horizonte vêm, contraditoriamente, de representantes de Ouro Preto, em uma estratégia que pensava inviabilizar a mudança da capitai através da escolha de um sítio no qual se mostraria inviável realizar, nos quatro anos determinados, a mudança pretendida." (SANEAMENTO..., 1997, p. 30-31). 1 Num certo sentido, inaugurando as discussões acerca do urbanismo no Brasil, Belo Horizonte surge no final do século XIX materializando uma nova época e uma nova ordem política e social e, nesse sentido, enquanto espaço-laboratório para uma atuação deliberada no campo do planejamento. 2 No caso de Minas Gerais, a antiga capital Ouro Preto era considerada, por muitos e sob os mais variados aspectos, inadequada, em resumo, espaço pouco favorável à expansão urbana e portanto, ao livre desenvolvimento das novas forças econômicas e sociais. No entender dos que eram favoráveis à mudança, era preciso construir uma nova capital a partir de um espaço essencialmente neutro e manipulável: de um lado, testemunha clara do poder da técnica e de sua potencialidade transformadora do real; de outro, meio ideal para se formar homens saudáveis e moralizados, elementos essenciais do projeto político republicano que tinha no pensamento higienista o seu fundamento maior/ Em Belo Horizonte, a produção do espaço urbano ocorre sob a égide do poder público,mas não exclusivamente. Várias interpretações acerca da formação histórica de Belo Horizonte caracterizam a ação posterior do poder público como a grande responsável pelos equívocos na execução do plano original da cidade, inclusive, pela especulação imobiliária.4 Entretanto, há que se considerar, como faz LEFEBVRE, que todas as cidades são, historicamente, uma produção e uma reprodução de seres humanos por seres "Ao longo da Primeira República, o padrão de intervenção na cidade se dá através dos chamados 'planos de melhoramentos, embelezamento e expansão' que não configuram exatamente o modelo do plano urbanístico, já que em geral não consideram a cidade na sua totalidade, apenas se dedicando a intervenções localizadas (Pereira Passos) ou setoriais (Plano de Avenidas). Apenas na década de 20 têm início os debates sobre a necessidade da introdução do urbanismo no Brasil, principalmente na imprensa especializada, culminando com o convite a Agache para a elaboração do Plano do Rio de Janeiro."(RIBEIRO, CARDOSO, 1994, p. 81). 3 "E importante ressaltar o papel de conceitos e procedimentos higiênicos nessa concepção científica da cidade. Aqui como nos países estrangeiros, os preceitos médicos-sanitaristas contribuíram, decisivamente, para a produção do espaço." (JULIÃO, 1996, p. 56). 4 Ver a esse respeito: GUIMARÃES (1991), O PROCESSO... (1979) e PLANO... (1995). 2 humanos, ou seja: "a cidade tem uma história; ela é obra de uma história, isto é, de pessoas e de grupos bem determinados que realizam essa obra nas condições históricas. As condições, que simultaneamente permitem e limitam as possibilidades, não são suficientes para explicar aquilo que nasce delas, através delas". (1991, p. 46-47). No âmbito de uma cidade planejada, como é o caso de Belo Horizonte, o poder público assume efetivamente e, sobretudo, na sua primeira fase, o papel de protagonista maior. Contudo, a intervenção dos diferentes sujeitos sociais contribui para a redefinição de suas funções e atribuições. Seduzidas pela própria imagem de um poder que se constitui acima das demais forças sociais, diversas abordagens encaminham-se no sentido de ressaltar os erros e equívocos, buscando sempre uma eficácia maior das políticas públicas, como se isso fosse real e historicamente possível.5 Nessa perspectiva, somente uma abordagem mais ampla da atuação dos diferentes agentes permitirá uma melhor compreensão do papel assumido historicamente pelo poder público na sua ação de planejamento e ordenamento da ocupação do espaço urbano e de seu papel na configuração arquitetônica de Belo Horizonte. A própria imagem de uma iniciativa privada que se configura atuando sempre na esteira ou a reboque do poder público precisa ser relativizada diante da realidade histórica e, nesse sentido, evitar interpretações como a que se segue: "Com a iniciativa privada indisposta a correr riscos, o Estado provê, além da infra-estrutura, grande parte das construções e dos investimentos criadores dos nós ou focos de atividade. Com isso, inibe ainda mais o ímpeto de criação de novas oportunidades pela empresa privada, que desempenha um papel muito aquém do que poderia na construção da cidade. A empresa privada se reserva para os investimentos de retorno garantido e inova pouco porque espera que o Estado faça os investimentos mais arriscados e mesmo os de maturação lenta. (...) Esteve sempre a reboque dos estímulos dos Poderes Públicos, aproveitando-se muitas vezes de sua omissão ou das brechas da legislação para empreendimentos oportunistas "(ANDRADE, GUIMARÃES, 1998, p. 38). 5 Eis aqui um exemplo: "sendo o principal proprietário dos terrenos e das construções, coube a ele (poder público) a responsabilidade pelas transações imobiliárias ocorridas e, inclusive, pela especulação de terrenos que cedo se instaura na nova capital". (PLANO..., 1995, p. 42.) 3 Já nas primeiras iniciativas do poder público, estava clara a visão da importância da iniciativa privada para o sucesso do projeto da Nova Capital. Em todos os documentos oficiais, mensagens e relatórios do Governo e da Comissão Construtora, é constante a ênfase na necessária adesão dos interesses particulares, afinal uma cidade não se estabeleceria sem o seu elemento básico que é a sua população. Essa adesão ocorreu efetivamente e a história de Belo Horizonte é rica em exemplos nesse sentido, uma vez que não foram poucos os que se aventuraram e estabeleceram seus negócios numa cidade ainda emergente.6 Quando inaugurada, em 1897, grande parte das construções existentes correspondia à iniciativa de particulares. Ao longo do desenvolvimento histórico de Belo Horizonte, as relações entre o poder público e os interesses privados ocorreram de forma matizada, caracterizando-se em diferentes situações pela complementaridade7 ou, até mesmo, pelo conflito. Estas foram algumas considerações gerais que permitem situar a perspectiva adotada na análise das políticas públicas e sua relação com a formação urbana e arquitetônica de Belo Horizonte. Em suma, defende-se uma possibilidade de leitura da cidade, na qual a forma urbana e suas dimensões estéticas e arquiteturais possam ser percebidas como a tradução de sua humanidade mais concreta e do seu viver cotidiano, evidentemente, sem esquecer de que se trata de uma cidade que já nasce prescrita, ou seja, com um destino previamente definido em seu plano original. Apesar de inaugurada em 12 de dezembro de 1897, com a denominação de Cidade de Minas, Belo Horizonte foi um sonho que começou a se concretizar logo após a mudança do regime. 6 Uma longa lista com os primeiros estabelecimentos instalados na nova capital pode ser encontrada em BARRETO (1996, v. 2, p. 534-543). ' Um exemplo claro dessa complementaridade pode ser encontrado nos procedimentos adotados quanto ao problema da moradia operária, a partir do momento em que o poder público recorre à iniciativa privada, oferecendo alguns benefícios aos que se dispusessem a construir esse tipo de moradia. Todavia, apenas se repetia em Belo Horizonte o que já acontecia no resto do País. "Ainda que, desde 1853, já existisse no Brasil algumas iniciativas voltadas para a questão, a ação do Estado limitava-se ao estabelecimento de isenções de impostos às companhias que se dispusessem a construir casas para os operários". (GUIMARÃES, 1991, p. 71). 4 O processo de mudança da Capital iniciou-se, efetivamente, em 1891, quando foram autorizados estudos em cinco localidades: Belo Horizonte, Paraúna, Barbacena, Várzea do Marçal e Juiz de Fora e, para tal, constituída uma comissão técnica sob a chefia do engenheiro Aarão Reis, da Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Ao final dos estudos, foi apresentado o relatório da comissão tendo em vista o estabelecimento de uma cidade de 150 a 200 mil habitantes apontando-se, inclusive, a despesa mínima a ser gasta com as obras. (REIS, 1893). Interessante observar que muitas das diretrizes técnicas prevalecentes no projeto da Nova Capital estão esboçadas nesse documento, no qual são apresentados, inclusive, os projetos dos principais edifícios públicos, prenunciando as características e o estilo que iriam prevalecer na arquitetura da futura cidade. Na escolha do local para a edificação da Nova Capital, prevaleceu, entretanto, o critério político. Em seu relatório, Aarão Reis optara pela Várzea do Marçal, alegando principalmente fatores de ordem econômica, contudo venceu no Congresso Mineiro o arraial do Belo Horizonte. A lei adicional n. 3, de 17 de dezembro de 1893, além de designar Belo Horizonte como o local para a construção da capital do Estado, determinou as bases para a organização do plano definitivo da nova cidade: "a), divisão dos terrenos em lotes destinados a edificações urbanas, a quintas ou chácaras, com determinação dos preços de cada categoria, atendendo à sua colocação, proximidade do centro da cidade e outras condiçõesque possam incluir no respectivo valor; b). determinação dos terrenos que devem ser reservados para edifícios públicos do Estado, ou da União e municipalidade, praças, jardins, passeios públicos, mercados, estações de estradas de ferro e tramways (sic), casas de caridade, hospitais, templos e cemitérios (...)." Entre outras disposições, autorizava o governo a estabelecer em regulamento os planos e as condições higiênicas e arquitetônicas que deveriam orientar as edificações; a conceder gratuitamente, aos funcionários estaduais e a cada um dos atuais proprietários de casas em Ouro Preto, um lote de terreno para construção - com a condição de o fazerem dentro de dois anos após a aprovação da planta da cidade, sob pena de 5 caducidade da concessão - e, promover a construção de casas "em condições higiênicas e de aluguel barato" para operários. Determinava um prazo de 4 anos para a transferência definitiva do governo para a nova capital e, no artigo 8 o , estabelecia o que por vários anos se manteve como uma prerrogativa do governo estadual no sentido de sua intervenção nos negócios e na administração pública da nova cidade.8 Definidas as diretrizes básicas, é criada a Comissão Construtora da Nova Capital, através do decreto n. 680, de 14 de fevereiro de 1894. Com poderes bastante amplos, foi estruturada em divisões técnicas, cada uma delas responsável por um setor e subdividas em seções. Os chamados "trabalhos técnicos" eram de responsabilidade da 3 o divisão e cabia à seção de número 3, a cargo de um engenheiro-arquiteto, a organização de todos os projetos de edifícios, monumentos, jardins, bosques, avenidas e mais construções arquitetônicas a serem executadas, assim como a indicação das regras arquitetônicas a serem observadas nas edificações particulares; e "a organização dos tipos gerais de prédios que convenha adotar, em diversos pontos da nova cidade, para garantia do efeito artístico dos monumentos ou dos edifícios aí levantados".9 A construção dos edifícios públicos e a fiscalização das edificações particulares, 'Velando pela observância dos regulamentos, tipos e mais condições higiênicas, arquitetônicas e sanitárias que forem adotadas", estavam a cargo da 2 a seção da 6 a divisão, que era responsável pelos estudos definitivos e construção dos edifícios públicos e particulares e obras públicas. Entretanto, dada a própria exiguidade do prazo para a construção da cidade, as obras teriam que ser feitas por empreiteiros. Contudo, para garantir a qualidade e a segurança das mesmas, a Comissão Construtora elaborou um roteiro detalhado contendo as especificações dos materiais e descrição dos processos construtivos correspondentes a 8 "Art. 8. A direção econômica e administrativa da capital do Estado denominada - Minas - ficará a cargo do Presidente do Estado, enquanto o Congresso não deliberar a respeito nos termos da Constituição."(lei adicional n. 3, de 17 de dezembro 1893.) Considerada um marco na história da nova cidade, a data dessa lei servirá de denominação para a grande avenida de contorno proposta posteriormente no plano de Aarão Reis. 9 Instruções regulamentares para o funcionamento das divisões da Comissão Construtora da Nova Capital. (BARRETO, 1996, v. 2, p. 122-163). 6 todas as etapas de uma construção e tabelas de preços para serem seguidas na contratação dos empreiteiros. (BARRETO, 1996, v. 2, p. 203-241). Antes mesmo da apresentação da planta geral da cidade, Aarão Reis enviou ao Secretário da Agricultura, Comércio e Obras Públicas os projetos do palácio presidencial, do templo que iria substituir a matriz da cidade e do abastecimento d'água. Sobre o projeto do palácio presidencial houve, entretanto, divergências e é enviado ao engenheiro chefe um parecer técnico da Secretaria.1 0 Contudo, em oficio endereçado a Aarão Reis, em 9 de dezembro de 1894, o Secretário da Agricultura, Francisco Sá, faz um longo comentário sobre as observações feitas quanto ao critério artístico adotado no projeto e diz, inclusive, que discorda de algumas delas, uma vez que "tenderiam a dar ao edifício proporções mais grandiosas do que as que ele já tem e que não pecam por deficiência". Sua argumentação, entretanto, permite perceber quais eram algumas das diretrizes básicas do governo quanto aos critérios arquitetônicos a serem adotados na Nova Capital. "Sobre este ponto, aliás, V. Ex 2, que já esta familiarizado com os hábitos mineiros, reconhece, de certo, que nunca será demasiada a sobriedade. As nossas tendências, modestas e econômicas, não toariam edifícios muito suntuosos: a cidade em que estes se erigissem, começaria por não ser uma cidade mineira. Insistindo sobre este ponto, quero deixar claro o mesmo pensamento em relação às opiniões, como a do parecer que envio, que pediriam maior magnificência nos edifícios, quando, ao contrário, o governo e a opinião do estado o que desejam é que se conciliem as exigências da representação a que eles têm de satisfazer com a necessidade imperiosa de economia com que devem ser construídos. Conheço o justo renome do arquiteto da comissão, e por isto mesmo sei quanto é difícil aos talentos artísticos, cujo ponto de vista é sempre exclusivo, restringir o amor às belezas da arte e a energia de suas faculdades criadoras ao círculo da parcimônia e da modéstia impostas pelas condições da execução." Todavia, alguns detalhes técnicos são apontados como problemas no projeto do palácio: a colocação dos aposentos particulares do Presidente sobre a estrebaria e a Parecer assinado por J. Gambara, Ouro Preto, 3 de dezembro de 1894. Além do aspecto estético do prédio, são apontados vários defeitos de ordem técnica, por exemplo, relacionados à higiene e à circulação. 7 estreiteza do vão das portas. 1 1 No caso do templo, sugere que sejam ampliadas as portas principais para satisfazer certas práticas religiosas, como as procissões com andores. Sobre o Palácio da Administração, então em estudos, aponta a conveniência de dividi-lo em três secretarias: primeiro, porque mais depressa ficariam construídos e segundo porque os "serviços que ali vão ser instalados, estão apenas iniciados, não podendo prever-se o desenvolvimento, talvez desigual, que hão de ter futuramente, e que poderá exigir modificações e acréscimos mais fáceis em cada um dos três edifícios, do que em um só". A vantagem da concentração dos diversos serviços administrativos, ele contrapõe a possibilidade de colocar os três edifícios numa mesma praça. Entretanto, deixa a questão ao critério de Aarão Reis, chamando a atenção para a importância de não se exceder o prazo constitucional da mudança, pois iam nisso "grandes interesses públicos". 1 2 Em 1895, é publicado o Regulamento para as bases do levantamento do Plano Geral da Capital do Estado em Belo Horizonte, determinando a divisão da cidade em seções, quarteirões e lotes, "com espaços, avenidas e ruas necessárias para a rápida e fácil comunicação dos seus habitantes, boa ventilação e higiene". (REGULAMENTO..., 1895, p. 5). Na planta seriam designados os locais destinados aos edifícios públicos e equipamentos coletivos, bem como os quarteirões e lotes a serem reservados por um prazo de 10 anos e os destinados aos funcionários públicos e proprietários de casas em Ouro Preto e aos ex-proprietários em Belo Horizonte. Tratava-se do decreto n. 803, de 11 de janeiro de 1895, que estipulava também as bases para a concessão, venda e distribuição dos lotes urbanos e suburbanos. No que se refere à concessão de lotes a funcionários e proprietários, o prazo para construção era de dois anos improrrogáveis, sob pena de caducidade, e além de um lote gratuito era 1 1 Em ofício de 29 de janeiro de 1896, José de Magalhães encaminha a Francisco Bicalho, então engenheiro chefe da comissão construtora, os originais do Palácio Presidencial, informando ainda que os detalhes finais só estariam prontos daí a doismeses. 1 2 Observando-se a planta apresentada por Aarão Reis, percebe-se que foi acatada a sugestão do governo no sentido da construção de três prédios separados para as secretarias estaduais, entretanto estão localizadas numa praça triangular, intitulada Progresso, local ocupado atualmente pelo Colégio Arnaldo. 8 possível a compra de um lote contíguo, sendo o pagamento à vista. Os lotes destinados a particulares seriam vendidos em hasta pública e, à proporção que fosse concluída a demarcação dos lotes de cada seção, caberia ao engenheiro chefe da comissão construtora comunicar ao governo, que autorizaria a venda, "tendo em vista o desenvolvimento progressivo das redes de canalização d'água e do esgoto, dos calçamentos e da iluminação", o que na prática não ocorreu em função das dificuldades encontradas na execução desses serviços básicos, mesmo na zona urbana e no trecho inicialmente designado para ocupação. Com o intuito de evitar a especulação em torno dos terrenos, o decreto 803 estipulava ainda que "a ninguém era permitido adquirir, por si ou por interposta pessoa, seja por adjucação (sic) em concorrências diversas, seja por transferência de outros adquirentes que ainda não tenham edificado em seus lotes, mais de vinte lotes urbanos, de dez suburbanos, ou de vinte entre os de uma e outra espécie". Cada adquirente de lote, além de sujeitar-se às regras de construção, higiene e segurança dos prédios que seriam posteriormente estabelecidas, teriam um prazo de quatro anos para construção e deveriam obedecer à algumas disposições, discriminadas diferentemente para a zona urbana e suburbana. Na zona urbana, eram maiores as exigências quanto à construção de muros e passeios, entretanto, nos dois casos, quando se tratassem de lotes contíguos, ficava obrigado o cultivo de flores, árvores frutíferas e hortaliças pelo menos na metade de todo o terreno. A 23 de março de 1895 ficou concluída a planta geral da nova capital. A área urbana, em formato xadrez, tinha um total de 8 815 382m 2 e era delimitada por grande avenida de contorno que a separava da zona suburbana, com 24 930 803m 2. Existia ainda uma terceira zona reservada para sítios de pequena lavoura, com 17 474 619m 2. Para a localização dos primeiros 30 000 habitantes foram reservadas as seções I a VII da área urbana e as I e VI da zona suburbana, compreendidas todas na faixa determinada por duas linhas paralelas traçadas pelo eixo das avenidas Cristóvão Colombo e Araguaia (atual Francisco Sales). Em 15 de abril de 1895, o Governo promulga o regulamento para construção de 9 casas para funcionários públicos concessionários de lotes na nova capital, através do decreto n. 818. A construção seria paga pelo Estado e o resgate da dívida seria feito por meio de descontos mensais nos vencimentos dos funcionários, incluídos juros de 5% na prestação invariável, começando o desconto na data de entrega do título provisório da propriedade. Antes de extinta a dívida, não poderiam ser alienados ou hipotecados os prédios, sem permissão do governo e os prazos para amortização eram de 10, 15, 20, 25, 30 anos. Foram propostos 6 tipos de casas correspondentes a seis classes de valores, determinados em vista dos vencimentos anuais dos funcionários. Designadas pelas letras do alfabeto, as casas-tipo A destinavam-se a porteiros, contínuos e serventes, funcionários que recebiam até dois contos de réis, e, na outra extremidade, as do tipo F corresponderiam aos funcionários cujos vencimentos ultrapassavam os doze contos de réis, posteriormente conhecidas como casas-tipo "desembargador". Segundo justificava o Governo, atendendo à necessidade de facilitar aos funcionários públicos a realização de modificações nos projetos de suas residências, foi permitida, através do decreto n. 849, de 23 de agosto de 1895, a ampliação no tipo da casa escolhida em até 25% do valor, definindo-se um prazo de um ano para o respectivo pagamento. l o A casa de Virgílio de Mello Franco, na época senador estadual e professor da Escola de Direito, foi uma das primeiras residências construídas pela Comissão Construtora, o que só ocorreu a partir de novembro de 1895. "Era do chamado 'tipo desembargador', que eram as maiores e ainda não estava acabada quando a família para lá se mudou em fins de 1897, faltavam portas e janelas e os animais, galinhas, cabras e burros vagavam pacatamente pela rua apenas esboçada nos capinzais fronteiros." (FRANCO, 195 5, p. 278-279). Concordando com Afonso Arinos, as primeiras residências da capital eram casas de transição entre a fazenda e a cidade, cercadas por plantas e árvores frutíferas e 1 3 Todavia, antes de findo o prazo estabelecido, o decreto n. 937, de 20 de maio de 1896, altera o prazo, marcando dez anos para o pagamento dos aumentos. 10 abrigando numerosos animais, pássaros, galinhas, carneiros, cavalos, esses últimos aliás imprescindíveis numa cidade que só em 1902 terá os seus primeiros bondes. Paralelamente ao trabalho de construção das casas dos funcionários, à cargo das empreiteiras contratadas pela Comissão Construtora, ia crescendo o movimento das construções particulares. Em setembro de 1895, foram aceitas as primeiras 25 propostas para a compra de lotes na Capital. Em dezembro do mesmo ano, aconteceu a segunda concorrência para a venda de lotes, e na imprensa da época, encontram-se as observações a seguir: t cPodemos informar aos nossos leitores que não são exagerados os preços mínimos da avaliação nele contidos, pois que já se tem feito vendas particulares por preços iguais e superiores." E ainda: "Diversas casas particulares se estão levantando e muitíssimas plantas já foram aprovadas pela Seção Municipal da Comissão. (...) A comissão facilita as construções particulares vendendo-Ihes, com insignificante lucro (10%) toda a espécie de materiais, que contratou em grande abundância." (BELO HORIZONTE, 1895, p. 2). Em seu relatório de abril de 1896, o engenheiro-chefe teceu algumas considerações sobre o andamento das edificações particulares. Segundo informa, foram aprovadas 28 plantas de casas particulares e concedidas licença para construção de 17, as quais achavam-se em andamento. c cPara quem julga de longe e na ignorância das circunstancias locais, parecem muito reduzidos aqueles números, quando, entretanto, patenteiam eles a confiança dos interessados no futuro da nova cidade e o desejo, bem pensado, de antecipar o gozo de suas propriedades, arcando embora com as muitas sérias dificuldades que até aqui existiam, por falta de transportes e providências que facultassem a obtenção de materiais indispensáveis; estes primeiros construtores são dignos de elogio, pela coragem com que empreenderam trabalho em época que foi difícil para a própria Comissão, que aliás dispunha de outros recursos." (BARRETO, 1996, v. 2, p. 545). A primeira residência particular construída em Belo Horizonte pertenceu a Carlos Monte Verde e foi inaugurada de forma festiva no dia 8 de fevereiro de 1896. Localizava-se na avenida Amazonas, entre a praça Sete de Setembro e a rua Tupinambás. Em abril do mesmo ano, o proprietário inaugurou nesse mesmo local o 11 Hotel Monte Verde, primeiro estabelecimento desse gênero que se abriu na nova capital. Segundo informe publicitário que se veiculava na época: "Este bem montado hotel, a primeira e definitiva casa construída na nova capital, dá hospedagem a viajantes e operários em boas condições. Todo o serviço é dirigido pelo proprietário e sua senhora". 1 4 Com a saída de Aarão Reis da Comissão Construtora, a 20 de maio de 1895, coube ao seu substituto, Francisco Bicalho, iniciar efetivamente as obras da Nova Cidade. Uma de suas principais reivindicações ao Presidente do Estado foi alterar as regras relativas à concessão de lotes, terrenos e construções, permitindo a concessão de lotes, fora de hasta pública, para empresários da indústriade materiais de construção, essenciais naquele momento. No sentido de dar maior autonomia à chefia da comissão, o decreto n. 959, de 20 de agosto de 1896, vem alterar o antigo regime das concorrências e institui a venda direta de lotes urbanos, suburbanos e de sítios e a ser feita pelo Engenheiro Chefe, mediante requerimento do comprador. Na exposição de motivos do decreto, levantaram-se os seguintes aspectos: "O Dr. Presidente do Estado de Minas Gerais, atendendo à necessidade de facilitar o desenvolvimento das edificações particulares na nova Capital, e, considerando que a sujeição de concorrência pública para a venda de terrenos na nova cidade impossibilita a realização imediata de construções particulares em situação determinada não incluída nas concorrências; Considerando, também, que o estado de adiantamento das edificações públicas e particulares permite a cada um apreciar e escolher a colocação que mais convenha à sua indústria ou profissão; Considerando ainda que o valor dos lotes urbanos já se acha determinado por concorrências públicas e o dos suburbanos selo-a na concorrência já anunciada para o dia I o de setembro próximo (...). 1 4 Segundo BARRETO, o hotel, à princípio familiar, transformou-se num lugar mal frequentado. Só não se transformou efetivamente em bordel, por interferência do subdelegado de polícia, o famoso Capitão Lopes, porém continuou decadente chegando mesmo a ser ocupado como cortiço. Para evitar mal-entendidos, o outro Hotel Monte Verde, o famoso Hotel Floresta, responsável, segundo Barreto, pelo nome do atual bairro da Floresta, foi uma iniciativa do mesmo que conseguiu assim instalar na zona suburbana o seu famigerado bordel "barulhento, de orgias e escândalos", onde se reuniu por um bom tempo a "rapaziada boêmia" de Belo Horizonte. (1996, v. 2,p.543). 12 Art. 1 Fica o engenheiro chefe da comissão construtora da nova Capital autorizado a vender diretamente àqueles que o requerem e quando o julgar conveniente, qualquer lote de terreno urbano, suburbano ou sitio, desde que o adquirente se obrigue a realizar a edificação definitiva de prédios, dentro do prazo máximo de 2 anos.(...)" Apesar das tentativas do poder público no sentido de estimular e facilitar a ocupação de Belo Horizonte, apenas uma pequena parte dos lotes previstos para venda no trecho definido para ocupação inicial, estava vendida na data de inauguração da cidade. Apesar da determinação existente na lei adicional n. 3, de 17 de dezembro de 1893, estipulando a construção de casas "em condições higiênicas e de aluguel barato" para operários, Aarão Reis não previu em seu plano um local destinado a essas habitações. Diante da necessidade de alocar os operários que trabalhavam nas obras da cidade, a própria Comissão Construtura abriu mão da proibição de edificações provisórias e passou a construir pequenas casas de pau-a-pique cobertas de zinco. Todavia, a omissão do governo no tocante a esse aspecto deixou em aberto um espaço importante para os interesses privados, como atestam várias iniciativas colocadas em prática ao longo da história da cidade. Contando com o respaldo do poder público, a primeira dessas iniciativas, a 21 de agosto de 1897, 1 5 partiu de Alberto Bressane Lopes que, apontando a urgência da "construção de casas a pequenos e módicos aluguéis para residência de operários e empregados", solicitava autorização para construir 100 casas conforme as plantas que apresentava e obedecendo à várias condições, presumivelmente impostas pela própria Comissão Construtora. Nesse sentido, obrigava-se a construir cinqüenta casas até 31 de dezembro de 1897 e as restantes até o fim do ano seguinte, cobrando de 25$ a 70$ mensais conforme os tipos já definidos nas plantas, excluindo desses valores 4 residências maiores. Segundo a proposta encaminhada ao Secretário da Agricultura, Comércio e Obras 1 5 Conforme ofício datado de 21 de agosto de 1897 e endereçado ao Secretário da Agricultura, Comércio e Obras públicas. 13 Públicas, e aprovada em 29 de agosto de 1897, o proponente obrigava-se a comprar todos os materiais das casas velhas de Belo Horizonte, pelos preços que fossem combinados com a Comissão Construtora, comprometendo-se a demolir os prédios que fossem por ela indicados. Estabelecia-se ainda que seria adiantado ao proponente sessenta contos de réis, a serem pagos em prestações mensais. Já antevendo a necessidade de iniciar o processo de estruturação administrativa da nova cidade, foi instituída na Comissão Construtora uma divisão para cuidar especificamente da organização dos serviços municipais. Tinha como chefe Adalberto Ferraz, não por acaso, o primeiro prefeito de Belo Horizonte. Por intermédio da imprensa, foram divulgados os primeiros atos normativos referentes às construções urbanas, como é o caso do edital publicado na imprensa (A CAPITAL, 1897, p. 1), no qual as fábricas e demais estabelecimentos industriais que se estabelecessem na zona urbana da cidade teriam que se sujeitar, além das demais regras de construção, a várias condições. Dentre elas, dispor de uma chaminé de alvenaria de modo que as fumaças pudessem ser disseminadas na atmosfera, "sem prejuízo da saúde pública"; ventilação e luz suficiente; paredes e pisos revestidos com material impermeável e de superfície lisa, "afim de evitar a impregnação de detritos e resíduos e prestar-se a lavagens frequentes" e um bom sistema de escoamento das águas servidas. Entre as atribuições da 3* divisão estavam a venda de lotes, expedição de títulos e aprovação de plantas. Em relatório referente ao ano de 1897, informa-se que foram apresentadas e aprovadas 254 plantas correspondentes a 262 prédios, destinados a serem construídos na zona urbana e 82 plantas, correspondentes a 112 casas para serem construídas na zona suburbana. Além dos alvarás de licença referentes aos prédios das zonas urbana e suburbana, foram expedidos, surpreendentemente, 1.258 licenças para a construção de cafuas e barracões diversos. (BARRETO, 1996, v. 2, p. 685). Segundo BARRETO, quando da inauguração de Belo Horizonte, contava a cidade, além de considerável número de casas velhas e dos grandes bairros de cafuas e barracões - 'Tavela" e "leitão" - 200 casas de funcionários, 300 de particulares e 16 prédios públicos. (1950, p. 153). O cenário de andaimes, tijolos, poeira e lama, com seus 14 poucos habitantes, principalmente operários, estava longe da cidade moderna preconizada pelos idealizadores da mudança da capital, porém era o começo. Em 12 de dezembro de 1897, foi oficialmente instalada, como a nova sede dos Poderes Públicos do Estado de Minas Gerais, a cidade de Minas - denominação mantida até 1901 e a partir daí mudada para Belo Horizonte. Na mensagem dirigida pelo governador Bias Fortes ao Congresso Mineiro, em 1897, o estímulo dado à construção da nova capital era visível. As principais obras em andamento destinavam-se a edificações que possibilitariam a organização administrativa da cidade, "a sua proteção e a formação moral de seu povo". Dentre elas, destacavam-se os edifícios destinados à Presidência do Estado, às secretarias do Interior e de Finanças, ao Ginásio Mineiro, ao Quartel, à Capela, às casas de funcionários públicos e às obras de canalização de água potável e de esgotos. Ou seja, o aparelhamento básico da cidade estava em formação, como afirmou o governador: "Têm tido máximo impulso as obras da nova Capital do Estado. Não obstante as grandes dificuldades desse árduo cometimento e o brevíssimo prazo pelo legislador constituinte fixado para sua realização, é com desvanecimento que o governo pode assegurar que a lei, cuja execução lhe foi confiada, há de ser cumprida dentro das previsões do legislador, porquanto tudo se acha aparelhado para que no prazo constitucional fique efetuada a mudança da sede da administração para Belo Horizonte." (MINAS GERAIS. Presidente...,1897, p. 18). A Prefeitura logo foi criada por meio do decreto n. 1 088, de 29 de dezembro 1897, na prática muito mais uma repartição do governo estadual do que um verdadeiro executivo municipal, até mesmo porque a organização municipal de Belo Horizonte só virá a acontecer mais tarde. 1 6 Nos termos desse decreto, o prefeito era de livre nomeação do Presidente do Estado, a quem caberia deliberar sobre os destinos da nova cidade, atuando inclusive no âmbito legislativo, uma vez que suas resoluções seriam 1 6 Quando, em 1898, é proposto um projeto nesse sentido, contrapôs-se o argumento de que a população da cidade ainda mantinha um caráter provisório, sendo habitada principalmente por operários, muitos deles imigrantes, tomando clara a distinção estabelecida entre os que eram e os que não eram efetivamente cidadãos. A esse respeito ver MINAS GERAIS. Anais ... (1898). 15 consideradas leis municipais. "A história política de Belo Horizonte é bastante peculiar em comparação com a dos demais municípios de Minas Gerais, uma vez que somente em 1947 foi-lhe concedida plena autonomia política, sendo seus habitantes investidos do direito de eleger o prefeito municipal."(DULCI, 1996, p. 15). Nesse sentido, a cidade construída para ser o símbolo da república que, em oposição ao regime imperial, propugnava pela ampliação das liberdades políticas, transforma-se ela mesma num exemplo claro do que na realidade foram os primeiros anos do novo regime e, sobretudo, do viés autoritário que continuou a caracterizar a atuação política das elites brasileiras ainda por várias décadas. A imposição constitucional no sentido de que os impostos municipais só poderiam ser votados por representantes do povo levou à criação do Conselho Deliberativo, em 12 de setembro de 1899. Submetido ao Poder Executivo Municipal e, consequentemente, ao governo do estado, suas deliberações, com exceção do regimento interno, eram sujeitas à sanção do Prefeito, cujo veto só poderia ser rejeitado por 2/3 dos votos. Até a Revolução de 1930, quando são fechadas todas as casas legislativas do País, permaneceu o Conselho Deliberativo enquanto instância legislativa municipal, apesar de suas limitações, uma vez que essa função também continuou a ser exercida pelo governo estadual, ancorado no artigo n.° 8 da lei adicional n. 3, de 1893. Sobretudo nos primeiros anos da cidade, questões importantes como a venda de lotes e alterações no plano original, assim como as regulamentações mais gerais continuaram sendo objetos de decretos estaduais. Em abril de 1898, há uma mudança significativa na política anteriormente adotada para a venda dos lotes da nova capital. Segundo o governo do estado, para atender a necessidade de facilitar o desenvolvimento das edificações na capital e à conveniência de limitar as construções ao perímetro já edificado, aproveitando os terrenos desocupados, deixaram de ser reservados, podendo ser vendidos diretamente, os lotes como tais considerados na planta da Capital das l. a , 2. a, 3. a , 4 a e 5 a seções urbanas, os quarteirões 5 o e 11.°, e o que fica logo após o 30° da seção 3. a os 7 o , 8.°, 20.°, 27° e 16 29° da 4. a seção e os 5.° e 2 1 0 da 5. a seção. 1 7 Sem condições de atacar outras frentes de trabalho e de ampliar a área de ocupação da nova cidade, o poder público adota uma perspectiva mais imediata e decreta o fim da reserva, anteriormente prevista para 10 anos, desses lotes situados em pontos estratégicos da cidade. Com isso perde um poderoso instrumento de intervenção futura, sacrificando uma visão de planejamento que já existia anteriormente. Contrariando as expectativas otimistas quando da inauguração da cidade, a crise financeira de 1898 contribuiu para uma espécie de retrocesso no ritmo de crescimento da nova cidade, implicando em cortes orçamentários, paralisação de obras e até mesmo o êxodo de uma significativa parcela de sua população inicial, como atesta a imprensa da época. Por outro lado, a crise econômica foi responsável pela expansão das favelas: "Os pedreiros, os operários, na maior penúria, construíram para si e suas famílias miseráveis cabanas em Santa Teresa, Lagoinha e Barroca." (TEULIÈRES, 1957, p. 8-9). O grande número dessas habitações clandestinas no interior da zona urbana, levou o prefeito Adalberto Ferraz, em agosto de 1898, a designar uma área na região suburbana da Lagoinha para venda de lotes aos operários e proprietários de cafuas. Com o decreto n. 1 208, de 27 de outubro de 1898, a Prefeitura da nova capital teve uma primeira e provisória organização. Segundo era estipulado, constaria apenas de uma diretoria de obras, fazenda e viação responsável pela execução de todos os serviços municipais, inclusive superintender e fiscalizar as obras, construções e demolições; inspecionar o serviço de viação, alinhamento, nivelamento e calçamento das ruas, avenidas e praças; inspecionar as pontes e canais, bem como os trabalhos de saneamento 1 7 Decreto n. 1 118, de 22 de março de 1898. Inclusive, nesse decreto também ficou estabelecido o aforamento dos terrenos do Estado. Para esse fim foram divididos em três classes os terrenos urbanos e suburbanos e fixado o foro correspondente a cada classe, tendo-se em vista a qualidade e situação dos lotes e as condições que influíam para seu maior ou menor valor. Logo depois, pelo decreto n. 1 211, de 31 de outubro de 1898, foi revogado o regime de aforamento de terrenos, talvez em decorrência da crise econômica do estado, sendo que aos que obtiveram lotes urbanos sob este regime foi permitido optar pela compra no prazo de dez dias, pagando 300S000 por lote - um preço bem abaixo do que o mesmo decreto estipulava para os lotes urbanos: 500SOOO. Quanto aos lotes suburbanos não há essa diferença, pois os lotes aforados poderiam ser comprados por trinta réis o metro quadrado, mesmo preço anterior. 17 e embelezamento da cidade; além disso, vistoriar os edifícios em ruínas ou que não oferecessem segurança e condições higiênicas e organizar as bases para os fornecimentos e obras sujeitas à concorrência pública. A prefeitura contaria com quatro fiscais, sendo um de construções, estando entre suas atribuições, a inspeção das obras que se fizessem por administração ou arrematação nos distritos rurais e que deveriam ser feitas de acordo com as ordens da Prefeitura. Logo em seguida, é regulamentado, pelo decreto n. 1 210, de 31 de outubro de 1898, o imposto predial, compreendendo construções e terrenos com qualquer denominação, forma, uso ou destino. Para efeito de lançamento, o valor locativo era estipulado da seguinte maneira: para os prédios locados era determinado o valor segundo o preço do aluguel, acusado nos recibos ou nos contratos de locação; no caso dos prédios não locados, era determinado esse valor pela declaração escrita do dono ou seu representante legal. O proprietário deveria fazer a declaração do valor que atribuía ao seu prédio e sobre este valor, se fosse aceito, calcular-se-ia o locativo na razão de 5%. Apesar das taxas serem consideradas baixas em função dos valores cobrados na maioria das cidades brasileiras, a conjuntura econômica não era favorável ao lançamento do imposto sendo grande a reclamação por parte da população da cidade. Isso fica mais claro em artigo publicado na imprensa, por Hermilo Alves, ex- integrante da Comissão Construtora, sobre o imposto predial: "O mal está na própria lei cuja aplicação nesta cidade, daqui a um ou dois anos, poderá ser muito justa, mas não o é na atualidade pelo estado de penúria em que se acha o povo, e pela disparidade de preços de aluguéis conforme as épocas dos contratos feitos. Todos sabem quantos distratos se têm feito ultimamente, e quantas questões se suscitam todos os dias pela impossibilidade de pagamento dos aluguéis contratados no tempo em que havia nesta cidade em que se ganhar a vida com facilidade."(BELO HORIZONTE,1899, p. 1). Uma primeira tentativa de regulamentação das construções pode ser encontrada no decreto n. 1 211, de 31 de outubro de 1898, que estabeleceu as posturas da cidade de Minas. Em seus artigos iniciais, fica evidente a preocupação em acelerar o ritmo das 18 construções, estipulando-se que os adquirentes de lotes, após a publicação oficial, deveriam iniciar as obras no prazo de seis meses e concluí-las no de doze, prorrogável por mais seis, caso estivessem adiantadas. Findos esses prazos, caso a obra não tivesse sido iniciada, seria declarada sem efeito a venda. Ainda segundo o decreto, quinze dias, pelo menos, antes de terminar o prazo para o início da construção, deveria ser submetido à aprovação da prefeitura os desenhos do projeto a executar acompanhados do pedido de alvará de licença para a construção, sendo que também eram sujeitos à aprovação da Prefeitura, os projetos de acréscimos ou modificação. O construtor era obrigado a ter sempre no local da obra o alvará de licença e o exemplar do projeto aprovado, que deveriam ser apresentados ao fiscal da construção, quando exigidos. E só poderiam ser iniciadas as obras assim que estivessem reunidos no local das mesmas os materiais necessários à construção das fundações para serem examinadas pelo fiscal, sob pena de cassação da licença e aplicação de multa. Para os objetivos desse trabalho, interessam mais de perto os artigos reunidos sob o Titulo IV, que trata das construções e demolições. Além dos respectivos proprietários, só poderiam dirigir as construções de prédios, engenheiros diplomados e aqueles matriculados como mestres de obras, sendo todos obrigados ao pagamento dos respectivos impostos. Para isso haveria na Prefeitura um livro especial para matrícula de mestres de obras, sendo admitidos aqueles que exibissem atestados ou comprovantes de suas habilitações, sendo que esses deveriam ser aceitos pelo diretor de obras. Segundo o artigo 36, na construção de prédios seriam observadas as seguintes prescrições: " I a A altura mínima do primeiro pavimento será de 4,50 ms., a do segundo de 4 ms., e a do terceiro de 3,8 ms.; 2 a Os prédios construídos nas esquinas de ruas ou avenidas terão o canto arredondado, quando o ângulo formado pelos alinhamentos for reto; quando o ângulo for agudo, terão o canto chanfrado, formando uma face de 2,5 ms. de largura, no mínimo. Excetuam-se dessa disposição os prédios que forem construídos nas esquinas de cruzamentos em que existam outros já construídos, observando-se nesse caso as disposições destes outros prédios que estejam em idênticas condições relativamente aos ângulos dos alinhamentos, 3 a O pavimento ao rez do chão ou será cimentado sobre uma camada de concreto de pedra britada ou cascalho miúdo, cimento e areia de 20 cm. de espessura, ou será assoalhado, assentando-se os barrotes sobre uma camada de areia lavada, cascalho ou moinha de carvão, de 30 cm. de espessura, enchendo-se também os intervalos entre os barrotes dos mesmos materiais.; 4 a Não serão permitidos porões de altura inferior a 80 cm., e serão estes providos de mezaninos externamente e aberturas nas paredes internas que permitam franca circulação de ar e penetração de luz. Só poderão ser habitados ou aproveitados para qualquer mister, quando tenha altura superior a 2,5 ms. e neste caso terão o pavimento nas condições do número anterior, as paredes rebocadas e caiadas e dimensões não inferiores a 60 cm. x 40 cm. 5 a Terão abundância de ar e luz direta em todos os compartimentos; 6 a As áreas centrais serão suficientemente largas, proporcionais à altura do prédio e terão calçamento estanque e serão providos de ralos destinados ao escoamento das águas pluviais; 7 a As fachadas obedecerão às regras da estética arquitetônica e serão encimadas com platibandas, quando estiverem no alinhamento da rua, avenida ou praças, mas poderão ter as outras beiradas do telhado prolongadas, nunca além de um metro, porém, providas de calhas e condutores para as águas pluviais; 8 a. Os mezaninos, óculos, janelas e portas terão as proporções devidas afim de darem luz e ar em quantidade suficiente; 9 a. As escadas retas que se elevarem a mais de 2,5 ms. Serão divididas em dois ou mais lances, com interposição de patamares. 10a. Os corredores maiores de 8 ms. de comprimento deverão receber luz direta e terão a largura mínima de 1,4 m.; 1 I a. Todos os tetos, inclusive os dominados por soalhos superiores, serão ventilados por meio de gregas de madeira ou tela de arame, colocadas entre a cimalha e o forro; 12a. Todo o pavimento térreo será elevado de 20 cm., pelo menos, sobre o nível da calçada, 13a. Todos os cômodos destinados a dormitórios terão as janelas providas de venezianas, podendo estas fazer parte dos caixilhos nas vidraças (...)" Além das indicações acerca dos alinhamentos e afastamentos obrigatórios, são fornecidas as prescrições higiênicas para as instalações sanitárias domiciliares. Nesse aspecto, é feita uma ressalva, no artigo 49, com relação às residências dos subúrbios, "posto que devam obedecer as prescrições de solidez e higiene, ficam dispensadas daquelas prescrições que, em conseqüência de suas condições especiais, não possam ser observadas, a juízo do Prefeito". 20 Também em outros artigos, fica evidente essa diferença de tratamento entre a zona urbana e a suburbana. No caso da zona urbana, eram proibidas construções com cobertura de capim ou quaisquer materiais inflamáveis e a instalação de chiqueiros e estábulos de vacas e, com objetivos mais estéticos, obrigava-se a todos os proprietários de prédios já construídos a fazerem os respectivos passeios dentro de três meses, sob pena de ser a obra feita ou reparada por sua conta. Com relação às casas velhas do antigo arraial, era proibida qualquer reparação, sem licença do Prefeito, e seus aluguéis deveriam ser pagos antecipadamente. Ainda segundo o decreto: "todas as casas velhas situadas na área urbana serão demolidas oportunamente à proporção que for sendo necessário ou conveniente à juízo do Prefeito". Com o decreto 1 135, de 18 de junho de 1898, o Governo do Estado determinou a entrega oficial das casas aos funcionários públicos transferidos de Ouro Preto, terminando assim com os títulos provisórios e ficando as casas hipotecadas segundo a escritura de venda. Entretanto, ao proceder ao levantamento dos débitos, encontrou o Governo a reclamação geral dos funcionários que, segundo o Secretário de Agricultura, Américo Werneck, foram levados "pela corrente das imprudências até o abuso do crédito e sacrifício de minguados recursos" e que só após levantadas as dívidas conheceram a gravidade dos compromissos que haviam assumido. "As reclamações tinham invariavelmente por tema o acréscimo no orçamento das casas e seus vícios de construção. Provinham quase sempre de exigências imprudentes, alterações solicitadas, melhoramentos introduzidos e acidentes comuns em construções desta natureza, e também de aquisição de lotes contíguos que aumentavam consideravelmente as despesas com a construção dos passeios e muros divisórios." Todavia, ainda segundo Américo Werneck, existia também uma parcela de responsabilidade que cabia ao próprio Estado: "É certo também que o Estado, sob o regime dos preços excepcionais, impôs aos funcionários o pagamento de passeios dispendiosos, que não deviam obedecer a um plano de luxo, excedeu-se um pouco na despesa e não fiscalizou as obras, de modo a conseguir com a mesma quantia construções mais bem acabadas, embora ofereçam estas todas as condições de solidez 21 desejáveis.(...) Isto posto, pesando bem a natureza e procedência das queixas, submeto ao vosso lato critério a proposta de redução de 10% no débito de todos os funcionários do Estado ou seus sucessores." (MINAS GERAIS, 1899, p. I ) 1 8 Se por um lado, o poder público, em consonância com o que já vinha sendo feito anteriormente,cede à pressão dos funcionários públicos, concedendo-lhes os mais diversos privilégios, por outro, age de forma improvisada diante de problemas que iam se tornando crônicos na cidade como é o caso do déficit habitacional. Quando o Prefeito de Belo Horizonte, em janeiro de 1899, elevou ao dobro o preço dos aluguéis das casas velhas do antigo arraial, a imprensa não deixou de censurá- lo, argumentando que tais prédios não deveriam ter sido destinados aos "desfavorecidos da fortuna" - como foi o entendimento da Prefeitura - uma vez que se esperava deles um rendimento maior. Informa ainda que aqueles locatários não tinham outra alternativa de moradia, uma vez que estava "dificílimo arranjar prédio barato, inclusive umas casinhas que há por aí, feitas com material velho, verdadeiras caixinhas de fósforos." E que, de forma insensível, estava o poder público a apertá-los, "exigindo pagamento adiantado e, ditatorialmente, duplicando o aluguel." (BELO HORIZONTE, 1899, p. 1). Em função da crise econômica e da paralisação das obras, foi constituída uma comissão de representantes da população para reivindicar junto ao poder público providências urgentes. Além de Bernardo Monteiro, futuro prefeito da cidade, compunha a comissão alguns dos nomes mais representativos da iniciativa privada local, envolvidos, desde o começo, no empreendimento da nova capital: Francisco Soucasaux, Antônio do Prado Lopes Pereira, Mariano Ribeiro de Abreu, Luiz Silva e Francisco Feio. Chamando a atenção para a responsabilidade do poder público em relação aos destinos da nova cidade, assim inicia a representação redigida pela comissão e enviada ao Presidente do Estado: "Imprevidentes ou infelizes aqueles que procuraram a nova cidade e nela empregaram os seus capitais", pois segundo dizem, "fizeram-na confiantes na 1 8 A solicitação de Américo Wemeck foi atendida, resultando no decreto n. 1 239, de 01 de janeiro de 1899. 22 palavra do governo de Minas". Várias eram as medidas propostas, uma delas tratando, inclusive, da demolição das casas velhas do antigo arraial: "Aqueles, que empregaram aqui os seus capitais na construção de casas, sofrem com grandes injustiças, a concorrência de casas velhas, cuja demolição, a bem da saúde púbüca e do embelezamento da cidade, é indispensável, mesmo porque elas foram desapropriadas para serem destruídas. Foi em nome da necessidade e utilidade públicas que os seus proprietários, por uma lei de exceção, se viram delas privados." (MINAS GERAIS, 1899a, p. 2). No sentido de incentivar o crescimento da cidade, aumentando a sua população e atraindo novos investimentos privados, a comissão sugere que seja restabelecida a venda de lotes suburbanos, segundo informam, mais procurados. Ainda observam que, tendo o governo diminuído o preço dos lotes urbanos, poderiam ser acrescentados nos preços dos lotes, os valores dos meios-fios e da respectiva mão de obra, de maneira que fossem eles fornecidos e colocados pela própria Prefeitura, que na ocasião deveria fazer também as sarjetas, "evitando assim o prejuízo que sofrem os proprietários com o desmoronamento dos passeios, pela falta destas." (MINAS GERAIS, 1899b, p. 2). Em resposta à moção, que além daqueles, tratava de vários outros aspectos, resolveu o Governo: "a) o Banco de Crédito Real estenderia às indústrias da capital os mesmos favores de que gozava a lavoura (letras hipotecárias a juros de 7%); b) construir uma casa para o mercado, no centro da cidade; c) mandar orçar as obras da estrada desta cidade a Paraopeba; d) continuar a demolição das casas velhas do Arraial; e) mandar pôr à venda terrenos suburbanos; f) estudar as propostas que lhe fossem enviadas para concessão de estabelecimentos dentro do Parque; g) impulsionar a colonização em derredor da Capital."(PENNA, 1997, p. 58). O decreto 1 273 de 11 de abril de 1899, vem regulamentar algumas dessas propostas. Além de revogar o dispositivo legal que anteriormente suspendia a concessão de lotes suburbanos, altera o zoneamento da cidade dando novos limites às zonas urbana, 23 suburbana, colonial e de sítios. A zona colonial ficaria diretamente subordinada à Secretaria de Agricultura, Comércio e Obras Públicas e as demais à Prefeitura. Logo em seguida, são criados três núcleos coloniais: a Colônia Afonso Pena compreendendo as 4 a e 5 a seções suburbanas (Córrego do Leitão); a Colônia Bias Fortes em parte da 8 a seção suburbana (Cardoso) e a Colônia Adalberto Ferraz na 3 a seção suburbana (Acaba Mundo) Ao final de 1899, assumiu a prefeitura Bernardo Monteiro, cuja administração - compreendendo o período de 12 de setembro de 1899 a 31 de agosto de 1902 - foi marcada pela tentativa de superação da crise e pela retomada do desenvolvimento da cidade. Como ele afirma em seu relatório, assumiu a Prefeitura em um momento de grandes dificuldades, inclusive de corte de despesas, pois o Estado já não tinha condições de sustentar com facilidade os trabalhos na capital. Na sua descrição: "era doloroso assistir o êxodo de operários, que abandonavam a cidade por falta de trabalho. As próprias construções particulares rareavam; atingíamos o período da liquidação das hipotecas, ao extremo da desvalorização das propriedades."(BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal, 1902, p. 6). Segundo o prefeito, trabalhou-se no sentido de não permitir essa saída dos operários e empreiteiros da cidade, bem como tentou-se atrair para a capital alguns estabelecimentos industriais, tendo em vista o futuro promissor da capital e de seu desenvolvimento, como pode-se averiguar pela justificativa elaborada pelo administrador da cidade: "O progresso, exclama notável publicista, não se faz impunemente! A ousadia do administrador se legitima todas as vezes que sua ação se funda no bem estar social. A situação era incontestavelmente a seguinte: cruzar os braços e deixar que o desânimo crestasse as benfazejas iniciativas, por ventura resistentes, permitir que continuassem a emigrar centenares de operários, perdendo-se por tal forma um precioso elemento de trabalho, que, aliás, convinha conservar para dias afortunados, ou encorajar essa população, levantando cometimentos, encetando serviços, agitando enfim quanto trouxesse arúmação e vida. Foi esse o meu constante cuidado." (BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal, 1902, p. 8). Atendendo à solicitação de Bernardo Monteiro, e no sentido de propiciar a 24 retomada das obras da cidade, o Conselho Deliberativo, na sua primeira lei, datada de 25 de janeiro de 1900, autorizou operação de crédito para a realização de obras de calçamento, iluminação, construção de reservatórios de água, incluindo também a construção do edifício da Prefeitura. O Conselho Deliberativo atuou nesse momento em bastante consonância com o poder executivo e, dentro de suas possibilidades, buscou incentivar novas construções e o embelezamento da cidade. 1 9 Um ponto de destaque da gestão de Bernardo Monteiro foi a elaboração de legislação concernente a questões de higiene e estética da cidade, segundo o prefeito, a partir do estudo realizado nas legislações das grandes capitais. Organizou-se e aprovou- se, portanto, a regulamentação dos seguintes temas: instalações sanitárias, polícia sanitária, cemitério, matadouro, mendigos, teatros, construções e demolições. O regulamento para construção e policiamento dos teatros, decreto n. 1 360 de 14 de fevereiro de 1900, é bastante incisivo nos aspectos referentes à circulação e à segurança. Os teatros deveriam ser construídos isoladamente, sem contato com outros prédios e com dimensões proporcionais ao número de espectadores, "de modo que cada um destes disponha pelo menos de 50 metros cúbicos de ar renovado por hora". A ventilação natural seria direta e nunca feita através de corredores. Além da ventilação natural, deveriam ser levados em conta os processos de ventilação artificial. Dentre os diferentesprocessos de ventilação artificial, seria preferível o de "insuflações mecânicas". O ar introduzido artificialmente nos salões deveria ser puro e dirigido de modo que a velocidade da corrente aérea não incomodasse os espectadores. As disposições do regulamento evidenciam uma grande preocupação com a possível ocorrência de incêndio, nesse sentido eram exigidos a instalação de uma bomba de água 1 9 Como por exemplo, no artigo 7 o da lei n. 1, de 25 de janeiro de 1900, taxando-se os terrenos urbanos sem edificação e no artigo 7 o das disposições permanentes da lei n. 4, de 25 de janeiro de 1900, estipulando-se multa para os terrenos da zona urbana que não estivessem cultivados, arborizados, ajardinados, ou em pomar. 25 no exterior do prédio e funcionários habilitados para manejá-la. E ainda: "A nenhuma casa de espetáculos concederá o Chefe de Polícia autorização para inaugurar-se sem que se tenha verificado, por intermédio da Prefeitura, a solidez, condições sanitárias e comodidade do edifício, podendo aquela autoridade mandar fechá-la quando ameace a segurança ou prejudique o bem estar do público, especialmente quando as divisões internas não ofereçam fácil saída aos espectadores, na hipótese de algum sinistro." A preocupação com a higiene das habitações levou à criação de uma legislação tratando especialmente das instalações sanitárias domiciliares e também das construções de uso coletivo. O decreto n. 1 366, de 28 de fevereiro de 1900, determinou a instalação de aparelhos sanitários em todas as propriedades da Capital. Obrigava a construção, em todas as habitações urbanas, de gabinetes especiais para latrina e banheiro, recebendo luz e ar diretamente, com janela, superfície de 2 metros quadrados e capacidade de 8 metros cúbicos. Estipulava um gabinete nas habitações de mais de um andar e um gabinete para cada grupo de 20 pessoas nas habitações coletivas, armazéns, fábricas, hotéis, oficinas, escolas. Além disso, são fornecidas várias orientações técnicas sobre a construção das instalações, incluindo as ligações de esgoto e o escoamento das águas pluviais. A importância atribuída à polícia sanitária e a própria abrangência de sua atuação em todos os aspectos concernentes à vida e à convivência social, são uma característica do urbanismo do início do século, e, no caso mais específico de Belo Horizonte, configura-se no principal instrumento do poder público no sentido de viabilizar a "cidade moderna" tão propagada por seus idealizadores. Portanto, o que mais se destaca no primeiro regulamento da polícia sanitária, decreto n. 1 367, de 2 de março de 1900, é a sua abrangência. Bastante elucidativo disso, é o dispositivo que determina o máximo de horas de trabalho para os operários, inclusive estabelecendo variações quanto à idade e sexo. 2 0 A questão da higiene nas construções e, sobretudo, nas habitações coletivas e locais de trabalho é abordada em vários artigos desse decreto, entretanto, o que mais chama a atenção é o Título IV que trata das A esse respeito ver o artigo 79 do decreto n. 1 367 de 2 de março de 1900. (REGULAMENTO.., 1900, p. 14). 26 habitações operárias. Estipulava-se que as habitações de operários não poderiam ser construídas sem apresentação de planos e sua respectiva aprovação, de acordo com o que se exigia para as habitações particulares, e que só poderiam ser construídas fora da zona urbana. Conforme era indicado, seria preferível pequenas casas isoladas para cada família ou em grupo de duas até quatro, tendo cada grupo vestíbulo especial com um pequeno jardim. No sentido de evitar a propagação de doenças, determinava-se que as paredes internas deveriam ser caiadas uma vez por ano. Cada casa deveria ter instalações higiênicas próprias e, nas vilas operárias, reservar-se-ia espaço para o estabelecimento de banheiros e lavanderias públicas. Os cortiços e as cozinhas ao ar livre eram terminantemente proibidos, assim como "as grandes casas constituindo domicílio comum a um grande número de indivíduos". Sobre esse aspecto, estipulava-se ainda que as casas de mais de um pavimento deveriam ser divididas verticalmente de modo a não estabelecer divisões internas. Como um meio de evitar a formação de futuros cortiços, o decreto, na parte referente às habitações coletivas, indicava que seria preferível sempre estendê-las em superfície evitando tanto quanto possível os andares superpostos, sendo também melhor aceita a construção de pavilhões isolados. Pelo decreto n. 1 453, de 27 de março de 1901, foi aprovado o primeiro Regulamento de Obras da Nova Capital. De uma forma geral, o regulamento procura sistematizar vários aspectos que já tinham sido abordados em decretos e regulamentos anteriores, como é o caso da matrícula de arquitetos e construtores. Para efeito das condições regulamentares, classificavam-se as edificações em urbanas e suburbanas. O regulamento é bastante extenso e minucioso, ficando aqui registrados alguns aspectos mais essenciais, inclusive os que evidenciam o cuidado diferenciado com as edificações da zona urbana. Os prédios urbanos que fossem construídos a partir de então deveriam ficar afastados das linhas divisórias do terreno pelo menos 1,5 metro e só poderiam ser construídos dois prédios unidos por uma mesma parede divisória, se todos os seus cômodos recebessem luz e ar diretamente, e se entre cada um deles e o prédio imediato 27 ficasse um espaço livre de 3 metros no mínimo. Na zona urbana não seriam permitidos no interior dos terrenos dependências destinadas à habitação de pessoas que não fossem empregadas no serviço do prédio, e que tivessem dependência doméstica separada, sendo terminantemente proibidos os cortiços, estalagens, albergues ou casas para moradia coletiva sob qualquer denominação, que não cumprissem as condições exigidas para os hotéis e estabelecimentos congêneres. As edificações não poderiam ocupar mais de dois terços da área total dos respectivos terrenos, ficando o restante destinado a pátios, jardins, culturas ou qualquer espécie de logradouro descoberto, que permitissem o arejamento e a iluminação, francos e abundantes, do prédio e de suas dependências. Há um cuidado especial quanto ao aspecto arquitetônico das fachadas: "Art. 31. As fachadas, ou frentes das casas, que dêem vista para as vias públicas, devem observar as regras da estética arquitetônica; Parágrafo único. O estilo arquitetônico, não podendo ser determinado, ficará sujeito ao arbítrio e ao critério da Prefeitura, que deve ter sempre em vista o embelezamento da cidade e de suas edificações. Art. 32. As fachadas devem ser sempre pintadas a cores, não sendo permitida a caiação ou pintura branca. §1. Nos prédios urbanos, as fachadas providas de platibanda devem ser pintadas a óleo com três mãos de tinta. §2. As pinturas das fachadas devem ser renovadas sempre que estiverem danificadas ou que apresentarem aspecto desagradável."2 1 Além disso, as fachadas de prédios urbanos, construídos nos alinhamentos das vias públicas, não poderiam ter altura menor de 6 metros, do passeio à parte superior da platibanda, nem comprimento menor de 7 metros e não seriam permitidas saliências de qualquer natureza que não fossem sacadas, molduras e ornatos de acordo com o seu estilo arquitetônico, não sendo permitidas as sacadas cobertas. Quanto à altura dos pavimentos dos prédios urbanos, manteve-se o que já estava anteriormente estipulado nas Posturas Municipais: 4,5 metros para o primeiro pavimento e 4 metros para o segundo, contudo, diminuindo a altura do terceiro e dos excedentes 2 1 Decreto n. 1 453, de 27 de março de 1901. 28 para 3,5 metros. No caso dos prédios suburbanos, a altura mínima para qualquer pavimento era de 3,5 metros. Na zona urbana não seria permitida a construção de prédios de mais de três pavimentos, salvo em casos especiais, justificados por necessidades de arte, comércio e indústria,
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