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Como já é de conhecimento popular, o ar inalado em cada inspiração não é estéril. Pode conter microrganismos potencialmente lesivos ao sistema respiratório, além de substâncias gasosas ou partículas em suspensão que também podem atuar promovendo lesão. Desse modo, os mecanismos de defesa descritos a seguir impedem que agentes infecciosos ou outras partículas cheguem aos pulmões, e, quando isso eventualmente ocorre, os mecanismos de defesa eliminam tais agentes agressores. Portanto, resumidamente, a função desses mecanismos de defesa é proteger o parênquima pulmonar (alvéolos) por meio da remoção de agentes potencialmente lesivos, além de umedecer e aquecer o ar inspirado, o que ocorre principalmente nas vias respiratórias superiores. Os mecanismos de defesa do trato respiratório incluem: o lençol mucociliar; a microbiota bacteriana saprófita; os macrófagos alveolares; o tecido linfoide broncoassociado; e reflexos protetores, como tosse e espirro. Cada um desses mecanismos será detalhado a seguir. O lençol mucociliar faz com que toda a superfície das vias respiratórias, incluindo a traqueia, os brônquios e os bronquíolos, seja coberta por uma camada praticamente contínua de muco, a qual se move no sentido da laringe por meio do batimento dos cílios das células ciliadas do epitélio respiratório. A alteração morfológica e funcional dos cílios, que ocorre na condição conhecida como discinesia ciliar primária, faz com que ocorra comprometimento desse mecanismo, estando esta alteração associada à predisposição acentuada a rinites e broncopneumonias. As funções primordiais do lençol mucociliar são a remoção de partículas do trato respiratório e a difusão de substâncias protetoras. A remoção de partículas depositadas no lençol mucociliar ocorre em apenas algumas horas; geralmente, em poucas horas quando as partículas se depositam na traqueia, ou até 24 h quando se depositam em brônquios ou bronquíolos. O muco, secretado pelas células caliciformes do epitélio respiratório, favorece a adsorção de partículas, entre as quais, agentes físicos ou biológicos potencialmente lesivos ao trato respiratório. O muco é então carreado pelos batimentos ciliares, que alcançam aproximadamente 1.000 bpm, dos segmentos mais profundos do trato respiratório até a laringe e a faringe, onde as partículas inaladas misturadas ao muco são deglutidas. Coincidentemente, na nasofaringe estão localizados grandes aglomerados de tecido linfoide. A facilidade com que as partículas são removidas pelo lençol mucociliar depende de seu tamanho. Partículas com mais de 10 μm de diâmetro sofrem remoção virtualmente completa até a laringe, enquanto a maior parte das partículas com 1 a 2 μm de diâmetro se deposita na junção bronquíoloalvéolo, o que justifica a vulnerabilidade desse segmento do trato respiratório. Sob o ponto de vista prático, isso equivale a dizer que, em condições normais, a maioria das bactérias em suspensão no ar inspirado é retida pelo lençol mucociliar, mas outros agentes potencialmente lesivos, com tamanho inferior a 1 a 2 μm de diâmetro, em particular agentes virais, podem facilmente atingir o alvéolo pulmonar. Contudo, obviamente, a eficiência desse mecanismo depende da intensidade do desafio, de modo que essa regra não é absoluta. Por exemplo, partículas de asbestos de até 100 μm de comprimento podem chegar ao parênquima pulmonar. É importante acrescentar que, além da remoção de partículas inaladas, o lençol mucociliar também contribui para a eliminação de gases hidrossolúveis inalados, potencialmente tóxicos ao parênquima pulmonar. Além da ação mecânica de retirada de material particulado do trato respiratório, o lençol mucociliar desempenha outro papel importante, que é o transporte e a difusão de substâncias humorais protetoras, como anticorpos produzidos pelo tecido linfoide associado aos brônquios, particularmente imunoglobulina A (IgA). Esse tipo de imunoglobulina atua na neutralização e favorece a fagocitose de agentes invasores. Além dos anticorpos, outras substâncias protetoras também são difundidas pelo lençol mucociliar, como o interferon, que limita a infecção viral, a lisozima e o lactoferrin, que têm atividade antibacteriana seletiva, além de fatores do sistema do complemento. Embora o lençol mucociliar seja extremamente eficiente na remoção de partículas inaladas, algumas partículas, particularmente aquelas com tamanho igual ou inferior a 1 μm, podem chegar aos alvéolos pulmonares. Em condições normais, os alvéolos são estéreis, sendo a defesa e a esterilidade alveolar mantidas graças à atividade fagocitária de macrófagos alveolares. A fagocitose de pequenas partículas ocorre em torno de 4 h e é facilitada pela presença de imunoglobulinas específicas, por meio do processo de opsonização. Além da fagocitose, os macrófagos alveolares são importantes fontes de interferon. A população de macrófagos residentes no pulmão inclui, além dos alveolares, macrófagos localizados no interstício e macrófagos intravasculares (que somente são observados no parênquima pulmonar). Esses macrófagos têm função de fagocitose de microrganismos ou outras partículas que atingem os alvéolos. Além disso, por meio da secreção de diversas citocinas, os macrófagos pulmonares desempenham importante papel na modulação da resposta inflamatória e dos processos de reparação do parênquima pulmonar. Além de macrófagos, há também células dendríticas no parênquima pulmonar, que têm como funções primárias a apresentação de antígenos e a regulação da resposta imune adaptativa. Outro componente fundamental da defesa pulmonar é a microbiota saprófita, presente predominantemente no trato respiratório superior. Essa microbiota atua por competição, por meio da aderência dos pili bacterianos aos receptores das células epiteliais, de modo a não possibilitar a colonização do trato respiratório por organismos de maior potencial patogênico. Em várias regiões do trato respiratório, particularmente nos brônquios, são observados aglomerados de células linfoides com localização adjacente às vias respiratórias, chamados de tecido linfoide broncoassociado. Esses aglomerados linfoides frequentemente apresentam morfologia de folículo linfoide, com centro germinativo evidente. A população celular é constituída por linfócitos T e B, com predominância de linfócitos B, que são responsáveis pela produção de IgA, IgG, IgM e IgE. Em animais saudáveis, podem ser detectadas moléculas de IgA específicas contra vírus e bactérias patogênicos para o trato respiratório. Embora a importância dos anticorpos produzidos no trato respiratório não esteja totalmente esclarecida, estes facilitam o processo de fagocitose de agentes infecciosos por meio do fenômeno de opsonização, que favorece a ação dos macrófagos alveolares, mecanismo fundamental para a defesa do pulmão. Finalmente, os mecanismos de defesa do trato respiratório se completam com mecanismos reflexos, como o espirro e a tosse, que proporcionam a eliminação mecânica de partículas ou material estranho ao trato respiratório. O reflexo de tosse é um mecanismo importante para a eliminação de quantidades excessivas de muco ou de exsudato presentes nas vias respiratórias, prevenindo, assim, a chegada desse material ao parênquima pulmonar. Para que esse mecanismo seja eficiente, é importante que o parênquima pulmonar (alvéolos) suprido pela via respiratória a ser desobstruída tenha sua elasticidade normal e contenha ar. Referência: Patologia Veterinária - Renato de Lima Santos, Antônio Carlos Alessi. 2.ed. Rio de Janeiro: Roca, 2016.
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