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Imediaticidade na Prática Profissional do Assistente Social

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 
 CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS 
 ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL 
 
 
 
 
 
MARILENE APARECIDA COELHO 
 
 
 
 
 IMEDIATICIDADE NA PRÁTICA PROFISSIONAL 
DO 
ASSISTENTE SOCIAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2008 
 
 
 
 
 
Livros Grátis 
 
http://www.livrosgratis.com.br 
 
Milhares de livros grátis para download. 
 
 
 
1 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 
 CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS 
 ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL 
 PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL 
 
 
 
 
MARILENE APARECIDA COELHO 
 
 
 IMEDIATICIDADE NA PRÁTICA PROFISSIONAL 
DO 
ASSISTENTE SOCIAL 
 
Tese apresentada ao Programa de 
Pós-Graduação em Serviço Social da 
ESS/UFRJ, como requisito parcial para 
obtenção do título de Doutor em Serviço 
Social. 
 
Orientador: Prof. Dr. Carlos Eduardo 
Montaño. 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2008 
 
 
 
2 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 
 CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS 
 ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL 
 PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL 
 
 
 
MARILENE APARECIDA COELHO 
 
 IMEDIATICIDADE NA PRÁTICA PROFISSIONAL 
DO 
ASSISTENTE SOCIAL 
 
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação 
em Serviço Social da ESS/UFRJ, como requisito 
parcial para obtenção do título de Doutor em 
Serviço Social. Aprovada pela banca abaixo 
indicada: 
 
______________________________________ 
Prof. Dr. Carlos Eduardo Montaño. 
 
 _____________________________________ 
Prof. Dr. José Paulo Netto 
 
______________________________________ 
 Profa. Dra Maria Inês Souza Bravo 
 
______________________________________ 
Profa. Dra Yolanda Guerra 
 
_____________________________________ 
Profa. Dra Maria Lucia Duriguetto 
 
 
 
 
 
3 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Ficha Catalográfica 
 
 Coelho, Marilene Aparecida 
 
 
 Imediaticidade na prática profissional do assistente social/ 
 Marilene Aparecida Coelho; orientador: Carlos Eduardo Montaño − 
 Rio de Janeiro: UFRJ, Escola de Serviço Social, 2008. 
 
 319 f.; 
 
 Tese (doutorado) − Universidade Federal do Rio de Janeiro, 
 Escola de Serviço Social. 
 
 Inclui referências Bibliográficas 
 
 1. Serviço Social. 2. Prática profissional. 3. Razão histórico- crítica. 4. 
Imediaticidade. I Montaño, Carlos. II. Universidade Federal do Rio de 
Janeiro, Escola de Serviço Social. III. Título. 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 À Joana Maria, 
minha filha querida, que ilumina o 
futuro. 
 
À Isabel Cristina, irmã amiga, 
que recompõe o nosso passado. 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 O momento de externar os agradecimentos àqueles que 
contribuíram diretamente para o cumprimento de uma jornada tão rica em 
aprendizagem é necessário e oportuno. 
 Os primeiros agradecimentos dirigem-se à Universidade Católica de Goiás, por 
meio da Pró-Reitoria de Pós-graduação e Pesquisa, que oportunizou as 
condições e o apoio para a realização deste doutorado, particularmente, o 
Departamento de Serviço Social da Universidade Católica de Goiás. Em 
especial, à professora Carmen Paro, diretora do Departamento de Serviço 
Social, sempre atenta às nossas necessidades e partilhando cada momento, 
cada batalha. Agradeço, também, todas as colegas professoras do 
Departamento, indistintamente. 
 Agradeço e compartilho com alegria, respeito e admiração todas 
as conquistas com a nossa querida amiga professora Walderez, que nos inspira 
em sua coerente trajetória profissional de luta e atitude crítica. 
 O percurso iniciado com o processo de seleção e que culmina com 
a apresentação da tese não foi realizado solitariamente, pois alguns ombros 
amigos foram fundamentais para o cumprimento dessa tarefa. Dentre eles, 
agradeço a minha irmã, Isabel Cristina, e a sua família, pelo apoio logístico 
durante a minha estada na cidade do Rio de Janeiro, sempre amiga, 
companheira, preocupada com cada detalhe e com o bem-estar de minha filha. 
Agradeço às colegas do curso de doutorado, especialmente Eleusa e Omari 
pelos momentos compartilhados, pelas discussões teóricas e troca de saberes, 
e, ainda, à amiga e colega da comissão de ensino, Terezinha e a Leile pelo apoio. 
 Contei, nessa trajetória, com uma companheirinha destemida: 
Joana Maria, minha filha, que mudou de cidade, de escola, conheceu novos 
 
 
6 
horizontes, fez amigos, cresceu, amadureceu e aprendeu a exercitar a 
paciência, acompanhando-me para verificar in loco como eram interessantes as 
aulas ministradas por meus professores, ouvindo as dúvidas, as angústias, as 
euforias pelas descobertas e as reclamações pelo cansaço. 
 Estudar em um programa da Escola de Serviço Social da 
Universidade Federal do Rio de Janeiro é um grande privilégio, e procurei 
valorizar cada momento, da forma mais intensa possível. Nesse caminho, 
encontrei mestres que me instigaram e que, apaixonados por seus ofícios, 
profundamente comprometidos com o conhecimento e com o Serviço Social 
brasileiro e latino-americano, me estimularam a redescobrir as dimensões 
teórico-metodológicas, ético-políticas e técnico-operativas da profissão. 
Dentre esses mestres, destaco os professores José Paulo Netto, Yolanda 
Guerra e, especialmente, Carlos Montaño, meu querido orientador. Produzir 
uma tese não é uma tarefa fácil, o processo é árduo, doloroso, exaustivo 
intelectual e fisicamente. O professor Carlos assumiu um comportamento 
pedagógico ímpar, conjugando rigor, exigência e respeitando meus limites para 
a produção intelectual na dose certa. Aprendi, ao longo desse processo, a 
admirá-lo como pessoa e como intelectual, a valorizar as suas produções, a 
compreender a importância da ação política e profissional desse jovem 
professor na América Latina. 
 Por último, gostaria de agradecer aos professores doutores que 
gentilmente aceitaram participar da banca de qualificação dos papers, do 
projeto de tese, da pré-defesa e da defesa da tese − Yolanda Guerra, José 
Paulo Netto, Maria Inês Souza Bravo, Elaine Berhing e Maria Lúcia Duriguetto. 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 SUMÁRIO 
 
 
 
RESUMO............................................................................................................................. 9 
ABSTRACT........................................................................................................................10 
APRESENTAÇÃO............................................................................................................. 11 
 
CAPÍTULO I – FENOMENOLOGIA DA PRÁTICA PROFISSIONAL 
DO ASSISTENTE SOCIAL: O APARECER NA TOTALIDADE ...........................18 
1.1 Emergência do Serviço Social e as bases teóricas e ideo-políticas 
da prática profissional.......................................................................................... 25 
1.2 Concepção de Serviço Social e a prática profissional................................... 43 
1.3 A fenomenologia em Hegel: o aparecer da prática profissional ................. 58 
1.4 A fenomenologia da prática profissional do assistente social: 
a preponderância da certeza sensível............................................................... 65 
 1.4.1 A prática profissional assistencialista................................................ 72 
 1.4.2 A prática profissional imediatista ....................................................... 77 
1.5 A percepção e a prática profissional do assistente social............................91 
 
CAPÍTULO II – O REINO DO ENTENDIMENTO E A PRÁTICA 
PROFISSIONAL DO ASSISTENTE SOCIAL ...................................................... 107 
2.1 A força do entendimento.................................................................................... 112 
2.2 A força do entendimento, o pensamento burguês e o Serviço Social ...... 131 
2.3 Descrição da práticaprofissional do assistente social orientada 
 pelo entendimento ................................................................................................155 
2.4 A prática profissional burocratizada e repetitiva..........................................173 
 
 
 
 
8 
CAPÍTULO III – RAZÃO DIALÉTICA IDEALISTA E A RAZÃO 
HISTÓRICO-CRÍTICA: COTIDIANO E IMEDIATICIDADE...........................190 
3.1 Razão dialética idealista hegeliana................................................................... 191 
3.2 A perspectiva ontológica da concepção materialista: a razão 
 histórico-crítica...................................................................................................204 
3.3 A unidade teoria e prática..................................................................................216 
3.4 Cotidiano e Imediaticidade ...............................................................................223 
3.5 Alienação, valores e vida cotidiana..................................................................230 
3.6 Reconstrução do trajeto: imediaticidade uma categoria 
 reflexiva ................................................................................................................238 
3.7 O sentido da prática ...........................................................................................246 
 
CAPÍTULO IV – RAZÃO HISTÓRICO-CRÍTICA, SERVIÇO SOCIAL 
E IMEDIATICIDADE..................................................................................................252 
4.1 O processo de renovação do Serviço Social brasileiro e a razão 
 histórico-crítica...................................................................................................258 
4.2 O processo de desenvolvimento da perspectiva marxista no 
 Serviço Social brasileiro....................................................................................265 
4.3 A prática profissional orientada pela razão histórico-crítica ..................276 
4.4 Descrição da pratica profissional histórico-crítica: 
 determinações, mediações e legalidades .......................................................284 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Imediaticidade na prática 
profissional do assistente social................................................................................314 
Referências Bibliográficas .........................................................................................330 
 
ANEXO 
Pesquisa documental ....................................................................................................345 
 
 
9 
 
 
 
 
 RESUMO 
 
 
O presente estudo propõe investigar a imediaticidade na prática 
profissional cotidiana do assistente social. A superficialidade extensiva da 
vida cotidiana, a forma fragmentada de apreensão da realidade hegemônica na 
sociedade capitalista e sua tendência à naturalização dos fenômenos sociais, 
conduzem ao obscurecimento da essência, ao considerar o aparente como a 
substância. O conhecimento da realidade implica o desvelamento da aparência, 
e a consciência assume um papel fundamental nesse processo. Para apreender a 
essência, a consciência movimenta-se dialeticamente, a fim de capturar as 
mediações que conectam os complexos sociais constitutivos e constituintes da 
totalidade do ser social, e supera, no plano do pensamento, a imediaticidade. 
A descrição desse movimento, pautado no discurso dos 
assistentes sociais relativo à prática profissional possibilitou submeter à 
crítica como a imediaticidade ou a imediatez do fazer profissional condiciona a 
concepção que os assistentes sociais têm da elaboração teórica e, portanto, ao 
empobrecê-la, perpetuam a prática reiterativa. Possibilitou, também, analisar a 
relação teoria e prática no âmbito da certeza sensível, da percepção, do 
entendimento e da razão histórico-crítica. A base filosófica e teórico-
metodológica para o desenvolvimento da presente tese fundamenta-se na 
tradição marxista e foram realizadas pesquisas bibliográfica e documental. 
 
Palavras-chave: prática profissional − imediaticidade − razão histórico-crítica. 
 
 
 
 
 
10 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
 
This study investigates the immediacy in professional practice of 
everyday social worker. The extensive superficiality of daily life, the 
fragmented way of apprehending reality hegemonic in capitalist society and 
its tendency to naturalization of social phenomena, leads to the obscurity of 
the essence, when considering the apparent as the substance. Knowledge of 
reality involves the unveiling of appearance, and awareness is a key role in this 
process. To grasp the essence, the conscience moves up dialectically, in order 
to capture the mediations that connect the complex social constituent and 
and the constituents of social being's totality, and exceeds, in terms of 
thinking, the immediacy. 
The description of this movement, based on the discourse of 
social workers on professional practice, allowed to submit the criticism of how 
the immediacy of professional practice stipulates the view that social workers 
have about the theoretical development and therefore as they impoverish it, 
perpetuate the reiterative practice. Also enabled exam the relationship 
theory and practice within the sensitive sure, the perception, understanding 
and historical-critical reason. The philosophical and theoretical – 
methodological base for the development of this thesis is based on Marxist’s 
tradition and literature and bibliography and documentary searches were 
made. 
 
Key Words : profissional practice − immediacy − historical-critical reason 
 
 
 
11 
 
 
 
 
APRESENTAÇÃO 
 
 
O presente estudo propõe investigar a imediaticidade na prática 
profissional cotidiana do assistente social. A superficialidade extensiva da 
vida cotidiana, a forma fragmentada como o pensamento hegemônico apreende 
a realidade na sociedade capitalista e sua tendência à naturalização dos 
fenômenos sociais, conduzem ao obscurecimento da essência, ao considerar o 
aparente como a substância. O conhecimento da realidade implica o 
desvelamento da aparência, e a consciência assume um papel fundamental 
nesse processo. Para apreender a essência, a consciência movimenta-se 
dialeticamente, a fim de capturar as mediações que conectam os complexos 
sociais constitutivos e constituintes da totalidade do ser social, e supera, no 
plano do pensamento, a imediaticidade. 
Entende-se imediaticidade como uma categoria reflexiva que 
designa um certo nível de recepção do mundo exterior pela consciência. Para 
estudar a imediaticidade na prática profissional do assistente social, buscou-
se discernir as formas como a consciência conhece a realidade, movimentando-
se dialeticamente tanto sobre o seu saber quanto sobre o seu objeto. A 
descrição desse movimento tem como referência os discursos dos assistentes 
sociais relativos à prática profissional, problematizado no âmbito da certeza 
sensível, da percepção, do entendimento e da razão histórico-crítica. 
 Essa perspectiva de investigação possibilitou a discussão e a 
análise da imediaticidade na prática do assistente social por meio de dois eixos 
que se conectam. Primeiro, abriram-se caminhos para submeter à crítica como 
 
 
12 
a imediaticidade ou a imediatez do fazer profissional condiciona a concepção 
que os assistentes sociais têm da elaboração teórica e, que, ao empobrecê-la, 
restringem-se à prática reiterativa. A reiteração, segundo Vasquez (1977), é 
um componente da práxis e constitui um nível da prática ineliminável, mas não 
pode ser toda a prática. Segundo, adentra-se o debate acerca da relação 
teoria e prática, enfatizando os estágios da consciência a caminho do 
conhecimento e buscando elucidar o debate filosófico entre o entendimento e 
a razão. 
A tese apresentada neste estudo é que a prática profissional 
assume diferentes orientações e característicasem decorrência do nível de 
receptividade do mundo exterior pela consciência. Como na cotidianidade 
tende a prevalecer a conexão imediata entre pensamento e ação, a 
imediaticidade é a categoria reflexiva que orienta a prática profissional 
quando o nível de consciência do assistente social atém-se à certeza sensível, 
ou à percepção ou ao entendimento. 
Verifica-se que a prática profissional do assistente social 
caracteriza-se pela rotina, repetição de tarefas e pela espontaneidade 
necessárias para a reprodução do indivíduo e da profissão, a fim de responder 
às múltiplas exigências estabelecidas no âmbito da reprodução social. Para 
responder às heterogêneas e imediatas demandas sócio-institucionais no 
cotidiano da prática profissional, os assistentes sociais − como muitas outros 
profissionais −, por meio do movimento da consciência que se atém à certeza 
sensível, ou à percepção ou ao entendimento, apreendem apenas as expressões 
fenomênicas da realidade, conectando imediatamente teoria e prática. 
A base filosófica e teórico-metodológica para o desenvolvimento 
da presente tese sustenta-se na dialética materialista marxiana. Para analisar 
o caminho que a consciência percorre em busca do conhecimento recorreu-se à 
obra de Hegel (2001), Fenomenologia do espírito. Conforme o autor, nesse 
 
 
13 
caminho, a consciência movimenta-se da certeza sensível para a percepção, da 
percepção para o entendimento, e do entendimento, para a razão dialética. 
Esse movimento realiza-se por meio da supra-sunção, isto é, a consciência, ao 
exercitar-se em si mesma, tanto em seu saber quanto em seu objeto, eleva-se 
de um estágio a outro. 
O caminho para o conhecimento inicia-se no estágio da certeza 
sensível, no qual a consciência, ao indagar sobre si mesma e sobre o seu objeto, 
torna-se cônscia de que o conhecimento, que, de início, provém da certeza do 
indivíduo como ser singular, em relação ao objeto singular, que simplesmente é, 
se relaciona com o universal. Nesse momento, ocorre a supra-sunção para a 
percepção. 
Quando atinge esse estágio, a consciência, para conhecer o 
objeto singular, quer apreender as propriedades desse objeto, no entanto, tais 
propriedades relacionam-se entre si, e apenas podem ser firmadas na relação 
com as propriedades do próprio objeto. Abalada na verdade da percepção, a 
consciência movimenta-se para o reino do entendimento. Essa dimensão é 
constitutiva, segundo Hegel (2001), de dois momentos: o momento da força e o 
momento da formulação de leis. 
O momento da força implica um retorno à percepção, relacionando 
as propriedades, agora de diferentes objetos, em um movimento complexo, no 
qual a consciência passa de um extremo a outro. De um lado, desse extremo 
está o solicitante e, de outro, o solicitado. De um lado está o objeto e, de 
outro, o sujeito e o seu conhecimento sobre as propriedades de diferentes 
objetos. No momento seguinte, cônscia desse movimento, a consciência 
formula leis relacionando as características singulares e universais desses 
objetos. No entanto, esses objetos relacionam-se entre si apenas para 
firmarem o que eles são. Quando a consciência busca estabelecer as mediações 
 
 
14 
entre os objetos e a existência desses objetos, ocorre a supra-sunção para a 
razão dialética. 
 
 Trata-se de um movimento que, ao mesmo tempo, aniquila, 
recupera e supera os conhecimentos do sujeito em relação ao objeto, 
conduzindo a consciência à supra-sunção de um estágio a outro até chegar à 
verdade que, para o pensamento hegeliano, resulta da idéia. 
Como a realidade, para Hegel (2001), é posta pelo pensamento, 
buscou-se no materialismo histórico-dialético fundado por Karl Marx (2004; 
2005; 2007), os fundamentos ontológicos para compreender a caráter 
concreto do ser social, com base nas dinâmicas de suas contradições 
dialéticas, suas conexões e legalidades, a fim de estabelecer a relação entre 
imediaticidade e mediação e demonstrar que a vida cotidiana freqüentemente 
oculta a essência do próprio ser. 
Para investigar a imediaticidade na prática profissional do 
assistente social no cotidiano, foram realizadas pesquisas bibliográfica e 
documental. A pesquisa bibliográfica objetivou a apreensão da categoria 
imediaticidade como categoria reflexiva, problematizada com base na relação 
sujeito e objeto conforme a dialética idealista de Hegel (2001), e na ontologia 
do ser social, segundo a dialética materialista de Karl Marx (1988; 2004; 
2005; 2007). Lançou-se mão, ainda, da ontologia do ser social, de Georg Lukács 
(1966; 1979a; 1979b; 1997), e se buscaram trabalhos de outros autores 
contemporâneos, como Eric Hobsbawm (1994), David Harvey (1989), Agnes 
Heller (2000; 2002) e István Mészáros (2002) 
A pesquisa bibliográfica para apreender as particularidades do 
Serviço Social subdivide-se em fontes de referências teóricas e referências 
 
 
15 
empíricas1. As fontes de pesquisa das referências teóricas foram embasadas, 
especialmente, nas obras de Marilda Iamamoto (1982; 1998, 2002; 2007) e 
José Paulo Netto (1994; 1996; 2000; 2004). Foram pesquisadas, ainda, obras 
de Ana Elizabete Mota (1998, 2000), de Maria do Carmo Falcão (2000), Maria 
Inês Souza Bravo (1996), Maria Lúcia Martinelli (2003), Maria Lúcia Silva 
Barroco (2005), Yolanda Guerra (1999; 2004), Carlos Eduardo Montaño (1998; 
2007), Ana Maria Vasconcelos (2003), Reinaldo Pontes (1997), Consuelo 
Quiroga (1991), dentre outros. Para a investigação das referências empíricas, 
foram buscadas, especialmente, as seguintes fontes bibliográficas: 
Vasconcelos (2003), Silva et al. (1980), Silva e Hackbart (1998), Freire (2003) 
e Torres (2006). 
A pesquisa documental foi realizada com o objetivo de apreender, 
por meio dos discursos dos assistentes sociais, como a imediaticidade 
comparece na prática profissional na cotidianidade. Para a sua realização, 
recorreu-se às comunicações orais2 apresentadas no XI Congresso Brasileiro 
de Assistentes Sociais3 e III Encontro Nacional de Serviço Social e 
Seguridade, realizado na cidade de Fortaleza, em 2004, organizados pelas 
entidades da categoria − o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) e 
Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS), a Associação Brasileira de 
Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) e a Executiva Nacional de 
Estudantes de Serviço Social (ENESSO). Nesse congresso, as comunicações 
 
1 Tais referências são de absoluta importância, uma vez que o presente estudo utilizou pesquisas realizadas 
por diferentes autores em momentos históricos diferenciados. 
2 Segundo a comissão organizadora do evento, foram apreciados 1.367 trabalhos e selecionados 1.169, 
apresentados em sessões temáticas e painéis, na forma de comunicações orais e pôsters. 
3 O Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS) constitui o maior evento da categoria no Brasil, e 
reúne, trienalmente, profissionais de todo o território brasileiro para debater as relações sociais e o Serviço 
Social. A pesquisa documental foi realizada durante o período de junho de 2006 a maio de 2007, e buscou-
se, naquele momento, acesso às comunicações do último congresso realizado, o XI CBAS. 
 
 
16 
orais foram organizadas em dezessete eixos, apresentadas em sessões 
temáticas4 simultâneas. 
Foram pesquisadas as comunicações orais cujos títulos continham 
referência direta à prática profissional (análise e sistematização da prática e 
narrativas de experiências). Com base nesse critério, foram selecionadas 65 
comunicações orais, analisadas conforme os seguintes aspectos: área de 
atuação, tema, concepção de Serviço Social, problematização da realidade, 
referência bibliográfica, proposições, atividades/ações desenvolvidas, dados 
empíricos e objetivos da prática. Recorreu-se, ainda, às comunicações 
apresentadas no VI Seminário de Teorização de Serviço Social5, realizado na 
cidadedo Rio de Janeiro, de 26 a 29 de agosto de 1997, organizado pelo 
Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais (CBCISS) 
e aos artigos publicados na última década que analisam a prática profissional 
do assistente social. 
Os conteúdos da tese são abordados em quatro capítulos. A 
estrutura dos capítulos segue o movimento da consciência a caminho do 
conhecimento e explicita as características da prática profissional em cada 
estágio que conduz ao processo de conhecimento. Buscou-se, por meio desse 
movimento, apreender as dimensões teórico-metodológicas, ético-políticas e 
técnico-operativas da profissão, contextualizado-as no movimento das 
relações de reprodução social. 
 
4 As comunicações orais e os pôsters foram apresentados conforme as seguintes sessões temáticas: Estado, 
direitos e democracia; Seguridade social (concepção, controle social, financiamento, gestão); Direitos 
geracionais (infância e juventude, velhice); Questões de gênero, raça, etnia e sexualidade; Direitos e garantias 
das pessoas com deficiência; Famílias e sistemas de proteção social; Questão urbana e direito à cidade; 
Questão agrária e o acesso à terra; Desenvolvimento regional, meio ambiente e direito à vida; Direitos 
humanos e segurança pública; Políticas alternativas de geração de trabalho e renda; Sociedade civil e a 
construção da esfera pública; O projeto ético-político, trabalho e formação profissional; Etica e Serviço 
Social; Serviço Social, educação e expressões artísticas; Serviço Social e sistema sócio-jurídico, Serviço 
Social e as relações de trabalho. 
5 Recorreu-se às comunicações do seminário em referência com o objetivo de apreender a pluralidade 
teórico-metodológica, técnico-operativa e ideo-política presente no Serviço Social brasileiro. 
 
 
17 
No primeiro capítulo, descrevem-se as características da prática 
profissional orientada pela certeza sensível e pela percepção. O segundo 
capítulo trata da prática profissional orientada pelo entendimento, suas 
características sócio-históricas, sua direção social e os fundamentos teórico-
metodológicos que a alicerçam. Contrapõem-se, ainda, nesse capítulo, a 
concepção de entendimento para o pensamento hegeliano e o entendimento 
para o pensamento kantiano. 
No terceiro capítulo, procura-se apreender o movimento da 
consciência no estágio da razão dialética e evidenciar a crítica às antinomias 
contidas na dialética hegeliana, aproximando-se da razão histórico-crítica que 
capta as contradições, determinações, mediações e legalidade da realidade 
com base no movimento do real em sua totalidade. Busca-se, ainda, analisar a 
relação entre teoria e prática com base nos fundamentos filosóficos 
vinculados à ontologia do ser social, problematizando-a com base na esfera do 
cotidiano. No quarto capítulo, apreendem-se, no contexto do processo de 
renovação do Serviço Social brasileiro, os elementos sócio-históricos que 
possibilitaram a aproximação de segmentos da profissão com a teoria social de 
Karl Marx, nas décadas de 1970 e 1980. Procura-se evidenciar a concepção 
marxiana de prática com base nas Teses sobre Feuerbach, e descreve-se a 
prática profissional do assistente social orientada pela razão histórico-crítica. 
A categoria imediaticidade perpassa todos os capítulos, constituindo, assim, a 
categoria central do presente estudo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
18 
 
 
 
 
 
 
 
 
CAPÍTULO I −−−− A FENOMENOLOGIA DA PRÁTICA PROFISSIONAL DO 
ASSISTENTE SOCIAL: O APARECER NA TOTALIDADE 
 
A consciência na vida cotidiana tem, em geral, 
por seu conteúdo, conhecimentos, experiências, 
sensações de coisas concretas, e também, pensamento, 
princípios − o que vale para ela como um dado ou então 
como ser ou essência fixos e estáveis. A consciência, em 
parte, discorre por esse conteúdo; em parte, 
interrompe seu [dis]curso, comportando-se como um 
manipular do mesmo conteúdo, desde fora. Reconduz o 
conteúdo a algo que parece certo, embora seja só a 
impressão do momento; e a convicção fica satisfeita 
quando atinge um ponto de repouso já conhecido 
(HEGEL, 2002, p. 47). 
 
O processo de formação profissional do assistente social, 
materializado nas diretrizes curriculares do curso de Serviço Social provoca 
mal-estar em um segmento dos assistentes sociais que não encontram 
aplicabilidade para os conteúdos históricos, teórico-metodológicos, ético-
políticos e técnico-operativos que conformam tais diretrizes. 
Esse mal-estar, entre outras ocasiões, evidenciou-se no processo 
de construção das novas diretrizes curriculares do Curso de Serviço Social, 
permeado por um amplo e sistemático debate desencadeado pela Associação 
 
 
19 
Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS), a partir de 1994. 
Conforme as deliberações da XXVIII Convenção Nacional da ABEPSS (então 
denominada como Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social − ABESS) 
dentre os encaminhamentos para a revisão do currículo mínimo, desde 19826, 
dever-se-ia proceder a uma profunda avaliação do processo de formação 
profissional, tendo em vista as exigências decorrentes das transformações 
societárias do último quartel do século XX. Foram promovidas e organizadas 
pela ABEPSS, aproximadamente 200 oficinas locais nas 67 unidades de ensino 
filiadas à entidade, 25 oficinas regionais e duas nacionais que, na primeira 
etapa, avaliaram os impasses e as tensões presentes no processo de formação 
profissional, dentre os quais se destacava a relação entre a teoria e a prática. 
A problematização dessa inquietação dá-se em duas direções. A 
primeira nega qualquer possibilidade de mediação entre a realidade, a prática 
profissional e o conhecimento, sustentando que os fundamentos teórico-
metodológicos e ético-políticos que alicerçam o processo de formação 
profissional não têm utilidade prática para o cotidiano do exercício 
profissional. A explicitação dessa negação evidencia-se, prioritariamente, no 
discurso dos profissionais que conectam de forma imediata a teoria e a ação. 
Observa-se que o recurso utilizado por esse segmento é o discurso que unifica 
pensamento, linguagem e realidade, conferindo uma suposta veracidade àquilo 
que está sendo afirmado. Trata-se de um discurso que se propagou 
rapidamente e teve forte apelo porque uma parte do meio profissional nele 
reconhece o escape para as dificuldades encontradas na prática profissional, 
cujo horizonte é a cotidiano. Trata-se, também, de um discurso generalista 
que universaliza as particularidades e dilui as diferenças histórico-sociais, 
institucionais e a própria competência profissional. Esse discurso é uma peça 
 
6 Resolução nº 6 de 23 de setembro de 1982 (BRASIL, CFE, 1982a) e parecer do Conselho Federal de 
Educação nº 412, de 4 de outubro de 1982 (BRASIL, CFE, 1982b). 
 
 
20 
de retórica utilizada para descrever a realidade no cotidiano da prática 
profissional institucionalizada tal qual como ela aparece em sua 
fenomenalidade. 
Esse discurso encontra receptividade também no meio acadêmico, 
entre docentes e discentes nas escolas de Serviço Social porque ele, ao mesmo 
tempo em que reprime o conhecimento científico tem a sua base em um 
determinado pensamento e justifica um determinado modo de ser da 
sociedade. 
 A segunda perspectiva de problematização dessa inquietação é 
aquela que se contrapõe aos fundamentos históricos, teórico-metodológicos, 
ético-políticos e técnico-operativos expressos nas diretrizes curriculares, 
argumentando que os conteúdos transmitidos nas escolas não instrumentalizam 
os profissionais para exercício da prática no cotidiano das instituições que 
compõem o mercado de trabalho dos assistentes sociais e propõe outros 
referenciais teórico-metodológicas. 
Tais direções, na atualidade, são expressões de determinadas 
formas de objetivação do ServiçoSocial e podem ser identificadas no 
discurso de um segmento profissional, em sistematizações da prática 
profissional e em reflexões teóricas relativas à profissão, que criticam a 
perspectiva que se fundamenta na teoria social marxista no interior do 
Serviço Social brasileiro. 
Os discursos que explicitam esse mal-estar imputam essa fissura 
ao processo de formação e o seu suposto distanciamento com o exercício 
profissional cotidiano nas instituições, dando a impressão que se trata de um 
problema do tempo presente e com a pertinência restrita ao Serviço Social. 
No afã em evidenciar esse mal-estar, denunciam o descompasso e 
o distanciamento entre o processo de formação e o exercício profissional que, 
de uma forma reduzida, é identificado como prática, sinônimo de ação 
 
 
21 
interventiva. O tratamento dessa questão como um descompasso permite 
suscitar a hipótese de que seria uma questão de tempo para que ocorresse o 
encontro entre os fundamentos que alicerçam o processo de formação e o 
exercício profissional. No entanto, não se trata de um descompasso. A questão 
exige a reflexão para ultrapassar o maniqueísmo e o mecanicismo presentes na 
reprodução desse pensamento, e apreender essa problemática para além do 
Serviço Social, isto é, para além da coisa em-si7. 
Na direção da análise do Serviço Social no âmbito das relações de 
produção e reprodução da sociedade capitalista, os esforços e os avanços 
obtidos pelo Serviço Social brasileiro são consideráveis e reconhecidos 
nacional e internacionalmente, dos quais emerge a crítica e a possibilidade de 
superação a um modo específico pelo qual a prática profissional se objetiva − 
aquela que se atém ao imediatismo/espontaneísmo e ao imediato, que se retém 
à fenomenalidade dos processos sociais. 
Aparentemente, a questão seria meramente teórica e, para 
tanto, se faz necessária uma adequação: substituir a teoria que não responde 
ao discurso do profissional que vivencia o exercício profissional ou 
desqualificar esse discurso. A questão, todavia, é de cunho prático-social e 
político-ideológico, pois envolve a razão, a consciência dos assistentes sociais, 
o significado que atribuem à prática profissional e a direção social que 
reforçam com a sua intervenção. 
Na literatura referente ao Serviço Social brasileiro, identifica-
se um crescente esforço em apreender o significado da profissão e suas bases 
de objetivação no âmbito das relações sociais. Observa-se uma crescente 
produção acadêmica dos assistentes sociais − fomentada pelos cursos de pós-
 
7 Segundo Japiassú e Marcondes (2006, p. 48), coisa significa, no âmbito do pensamento filosófico, “tudo 
aquilo que possui uma existência individual e concreta.Sinônimo de objeto, portanto realidade objetiva, isto 
é, independente da representação. Nesse sentido, a coisa de apõe à idéia. Em Descartes, a coisa é sinônimo de 
substância, de algo que existe em si mesmo (...). Em Kant, a coisa em si designa aquilo que existe 
independentemente do espírito e do conhecimento que este tem dela, sendo em si mesma incognoscível”. 
 
 
22 
graduação − e apresentação de comunicações em encontros da categoria 
resultantes de pesquisas ou de sistematizações do exercício profissional. Tais 
produções e sistematizações do exercício profissional explicitam as principais 
preocupações dos assistentes sociais e, dentre elas, se destacam as tensões 
vivenciadas no cotidiano. 
Constata-se, ao mensurar quantitativamente o acervo de 
comunicações8 enviadas pelos assistentes sociais para o XI Congresso 
Brasileiro de Assistentes Sociais e II Encontro Nacional de Serviço Social e 
Seguridade, realizado em 2004, na cidade de Fortaleza, dentre aquelas que 
foram aprovadas pela comissão técnica organizadora, que 7,5% se referem 
diretamente ao trabalho, ou atuação, ou exercício, ou prática profissional. 
Verifica-se, na análise da produção literária do Serviço Social brasileiro 
resultantes de pesquisas apresentadas em trabalhos acadêmicos dos cursos de 
pós-graduação e em artigos publicados em revistas da área nas últimas duas 
décadas, a recorrência da temática que reflete a relação entre a teoria e a 
prática na agenda profissional. 
A prática começa a ser problematizada e se conforma em objeto 
de preocupação vinculado aos fundamentos históricos e teórico-metodológicos 
da profissão a partir da década de 1960, quando se instaurou o pluralismo 
teórico, ideológico e político no Serviço Social brasileiro. Segundo Netto 
(1996, p. 128), 
 
é inconteste que o Serviço Social no Brasil, até a primeira 
metade da década de sessenta, não apresentava polêmicas 
de relevo, mostrava uma relativa homogeneidade nas suas 
projeções interventivas, sugeria uma grande unidade nas 
suas propostas profissionais, sinalizava uma formal 
 
8 As comunicações orais fundamentam-se em diferentes matrizes teórico-metodológicas. 
 
 
23 
assepsia de participação político-partidária, carecia de 
uma elaboração teórica significativa e plasmava-se numa 
categoria profissional onde parecia imperar, sem disputas 
de vulto uma consensual direção interventiva e cívica. 
 
Netto (1996) não nega a existência de conflitos e tensões no 
Serviço Social brasileiro até a década de 1960, mas eles não provocavam 
perturbações no âmbito profissional, ao passo que o processo desencadeado, a 
partir de então, configura-se em ruptura, cujas bases se vinculam à laicização 
do Serviço Social e suas incidências no mercado nacional de trabalho e nas 
agências de formação profissional. Para Netto (1996), esse é um dos 
elementos caracterizadores do processo de renovação do Serviço Social sob a 
autocracia burguesa, conduzindo à diferenciação da categoria profissional e à 
disputa pela hegemonia em todas as suas instâncias − projetos de formação, 
órgãos de representação, valores e princípios e paradigmas de intervenção. 
A refuncionalização da prática profissional e o redimensionamento 
das condições de formação são apreendidos pelo autor com base no movimento 
sócio-histórico das relações sociais na sociedade brasileira, do qual o Serviço 
Social é constitutivo e constituinte. Assinala Netto (1996, p. 129): 
Ao refuncionalizar a contextualidade da prática 
profissional e redimensionar as condições da formação 
dos quadros por ela responsáveis, o regime autocrático 
burguês deflagrou tendências que continham forças 
capazes de apontar para o cancelamento de sua 
legitimação. 
 
O regime autocrático burguês, ao implementar o modelo de 
modernização conservadora de desenvolvimento das relações capitalista criou 
 
 
24 
suas demandas específicas mas, também, as condições e as possibilidades de 
“se gestarem alternativas às práticas e às concepções profissionais que ela 
demandava”, afirma Netto (1996, p. 129, grifos do autor9). Nesse cenário 
deflagrou-se, em meados da década de 1960, o processo de renovação do 
Serviço Social no Brasil, entendido por Netto (1996, p. 131) como 
 
o conjunto de características novas que, no marco das 
constrições da autocracia burguesa, o Serviço Social 
articulou, à base do rearranjo de suas tradições e da 
assunção do contributo de tendência do pensamento social 
contemporâneo, procurando investir-se como instituição 
dotada de legitimação prática, através de respostas a 
demandas sociais e da sua sistematização, e de validação 
teórica, mediante a remissão às teorias e disciplinas 
sociais. 
 
O processo de renovação do Serviço Social brasileiro não liquidou 
o Serviço Social tradicional, mas a instauração do pluralismo possibilitou aos 
assistentes sociais acessarem e construírem procedimentos diferenciados 
para embasar a sua prática profissional. Trata-se de um processo repleto de 
tensão, pois a homogeneidade nas projeções interventivas no Serviço Social 
brasileiro foi posta em questão,a assepsia de participação política-partidária 
foi desbloqueada e se iniciou um processo no qual o significado sócio-histórico 
da profissão passou a referenciar-se em matrizes teóricas antagônicas, 
explicitando a disputa por projetos societários. O consenso relativo à direção 
interventiva e cívica no interior da categoria profissional deixou de existir e 
 
9 Quando não houver indicação expressa, os grifos são do texto original. 
 
 
25 
uma parcela da categoria passou a ter a compreensão da relação entre a 
prática e a teoria que se constituir em objeto de permanente indagação. 
As bases teóricas e ideo-políticas que sustentavam o modelo de 
intervenção do Serviço Social tradicional foram discutidas, avaliadas, 
criticadas, renovadas, mas ainda permanecem no ideário de um segmento da 
profissão. Essas bases constituem e são constituídas pelo padrão hegemônico 
de objetivação da sociedade burguesa que “confere aos fenômenos e 
processos sociais uma positividade que privilegia o seu tratamento ao nível da 
sua imediaticidade” (NETTO, 1988, p. 142). Trata-se de um modelo de 
intervenção cujas bases teóricas e ideo-políticas sustentam que os fenômenos 
sociais estão postos, estabelecidos. 
Na trajetória do Serviço Social brasileiro, esse modelo de 
intervenção prescritiva sustentou a prática profissional do assistente social 
em sua emergência e permanece presente na atualidade, referendado em 
diferentes matrizes teóricas, mas que expressam uma forma de conhecer e 
agir circunscrita ao imediato e contribui para conservar a sociedade vigente. A 
caracterização e a lógica que permeiam a sua forma de aparecer foram 
desveladas no processo de renovação do Serviço Social brasileiro. Para 
compreender a reprodução desse modelo prescritivo de intervenção 
profissional na atualidade, faz-se necessário retomar o seu processo de 
constituição, enfatizando os parâmetros teórico-metodológicos que o 
sustentam. 
 
1.1 Emergência do Serviço Social e as bases teóricas e ideo-políticas da 
prática profissional 
 
A constituição do Serviço Social como profissão reveste-se de 
ambigüidades, decorrentes de sua necessidade de legitimar-se perante a 
 
 
26 
classe burguesa e a classe trabalhadora. As transformações sócio-históricas 
são impulsionadas pela permanente luta que essas classes travam entre si no 
âmbito das relações de produção e de reprodução social. Para manter-se 
desfrutando do poder econômico-político e ideológico, a classe hegemônica 
deve manter a classe subalterna sob controle. O desenvolvimento das forças 
produtivas complexifica as relações sociais, colocando e recolocando a 
exigência de reordenamento das estratégias dos instrumentos de coerção e 
persuasão que a classe burguesa utiliza para garantir a valorização, a 
acumulação e a ampliação do capital. 
Na fase do capitalismo monopolista, o Estado, como instância 
política e econômica da burguesia, ampliou as suas funções. Segundo Netto 
(2001), no capitalismo concorrencial, a intervenção estatal no enfrentamento 
às seqüelas da questão social circunscrevia-se básica e coercitivamente às 
lutas da classe trabalhadora e à necessidade de preservar o conjunto de 
relações pertinentes à propriedade privada burguesa. No capitalismo 
monopolista, o Estado assumiu, além daquelas, a função de preservar e 
controlar a força de trabalho, ocupada e excedente, assinala Netto (2001). 
Essa assunção é compulsória e suas determinações vinculam-se às contradições 
da economia capitalista que aumenta a capacidade de produção social da 
riqueza mas gera, simultaneamente e na mesma proporção, a pobreza. Na idade 
do capitalismo monopolista, para garantir o aumento das taxas de 
lucratividade, o Estado assegura a manutenção e a reprodução da força de 
trabalho, ocupada e excedente, mas também 
 
é compelido (e o faz mediante os sistemas de previdência 
e segurança social) a regular a sua pertinência a níveis 
determinados de consumo e a sua disponibilidade para a 
ocupação sazonal, bem como a instrumentalizar 
 
 
27 
mecanismos gerais que garantam a sua mobilização e 
alocação em função das necessidades e projetos do 
monopólio (NETTO, 2001, p. 27). 
 
O sistema de poder da burguesia tem como objetivo central 
garantir a lucratividade do capital monopolista, mas para exercer as suas 
funções econômicas necessita legitimar-se ideo-politicamente perante a classe 
trabalhadora que, para o atendimento as suas necessidades sociais, se 
organiza, luta e reivindica direitos econômico-sociais e políticos. Para 
responder às demandas do capital na fase dos monopólios, o Estado amplia a 
sua base de sustentação e legitimação sócio-político, absorvendo demandas da 
classe trabalhadora, institucionalizando o acesso aos direitos de cidadania. 
Trata-se de um processo permeado por confrontos e conflitos entre as classes 
sociais e, para atenuá-los e refuncionalizá-los conforme a lógica e os 
interesses do capital, o Estado burguês intervém, como pseudo-agente neutro, 
regulando as relações sociais por meio da força e da persuasão. 
Na ordem do capitalismo monopolista, uma das respostas dada 
pelo Estado é a intervenção contínua e sistemática nas expressões da questão 
social, implementando políticas sociais como estratégias de preservação e de 
controle da força de trabalho, ocupada e excedente, e regulando o patamar 
mínimo de aquisição para o consumo. Ao implementar a política social, o Estado 
burguês no capitalismo monopolista 
 
procura administrar as expressões da questão social de 
forma a atender às demandas da ordem monopólica 
conformando, pela adesão que recebe de categorias e 
setores cujas demandas incorpora, sistemas de consenso 
variáveis, mas operantes (NETTO, 2001, p. 30). 
 
 
28 
 A racionalidade burguesa é a fonte inspiradora para a 
organização da política social que se fragmenta em políticas sociais, 
respondendo de forma fracionada à questão social, cujas manifestações são 
recortadas e enfrentadas como problemáticas particulares. Como problemas 
sociais, as expressões da questão social são individualizadas e psicologizadas e 
se tornam problemas pessoais, de ordem moral. 
Ao tomar para si as respostas às expressões da questão social 
como agente regulador das relações sociais, o Estado cria as condições 
histórico-sociais para que se constitua o espaço sócio-ocupacional na divisão 
social e técnica do trabalho de práticas profissionais como do assistente 
social, assinalam Iamamoto (1982, 2002) e Netto (2001). 
O Serviço Social, no contexto do capitalismo monopolista, surgiu 
como profissão, e o modelo de intervenção profissional adotado centrava-se 
em valores ético-morais cultuados pela burguesia e necessários para o 
estabelecimento e a manutenção da ordem social baseados na resignação 
humana, na concepção fatalista da vida e na naturalização dos fenômenos e 
processos sociais. 
No período que antecedeu a Primeira Grande Guerra (1914-1918), 
a assistência social, na Europa, organizava-se com o objetivo de controlar, 
policiar e contrapor-se ao movimento da classe trabalhadora, com o intuito de 
frear as utopias revolucionárias e dotar os operários dos condicionamentos 
básicos para a obediência e a vivência dos bons costumes, afirma Verdès-
Leroux (1986). 
A concepção que os assistentes sociais tinham do modo de vida 
dos operários era aquela transmitida e captada pela classe burguesa, com 
todas as suas implicações morais e culturais. Para elas, os operários eram 
homens simples, mas perniciosos, noviços, decadentes, grosseiros; nada havia 
neles de artificial, mas eram muitas vezes alcoólatras, viciados, decadentes; 
 
 
29 
eram fracos porque se deixavam levar pelos agitadores profissionais − os 
dirigentes sindicais. O projeto de assistência social nascente era o de educar 
a classe operária, isto é, “fornecer-lhe regras de bom senso e razõespráticas 
de moralidade, corrigir seus preconceitos, ensinar-lhe a racionalidade; 
discipliná-la em seus trajes, nos lares, nos orçamentos domésticos, na maneira 
de pensar”, declara Verdès-Leroux (1986, p. 15). O trabalhador social era 
parte de uma engrenagem que controlava coercitivamente os operários, 
interferindo em seu modus vivendi, impondo e reproduzindo a moralidade e as 
regras adequadas aos interesses da burguesia. 
Este discurso é substituído após a Primeira Guerra Mundial, pois a 
correlação de forças entre as classes sociais alterou-se e, com ela, o eixo 
orientador da assistência social. O governo, representante da classe burguesa, 
propunha o pacto de colaboração sincera entre o patronato e os operários10. 
Para a viabilização desse pacto, a assistência social tornou-se um instrumento 
legítimo e ganhou novos impulsos. Ao final da Primeira Grande Guerra o mundo 
acordou profundamente transformado, pela experiência da própria guerra que, 
segundo Hobsbawm (1995), evidenciou o colapso da sociedade ocidental do 
século XIX e o impacto da Revolução Russa de 1917. A sociedade ocidental do 
século XIX que entrou em colapso era 
 
uma civilização capitalista na economia; liberal na 
estrutura legal e constitucional; burguesa na imagem de 
sua classe hegemônica característica; exultante com o 
avanço da ciência, do conhecimento e da educação e 
 
10 Verdès-Leroux (1986) destaca que as autoridades do governo francês buscam, para a grandeza da França 
e o futuro de sua civilidade a paz e a colaboração entre as classes sociais, destacando a atitude patriótica dos 
operários que pagaram fisicamente um tributo esmagador. As conquistas sociais da classe trabalhadora 
anterior a 1914 fora questionadas, as leis sociais foram suspensas, a jornada de trabalho foi prolongada. Os 
salários rebaixados e congelados. Após 1920, o discurso social modifica-se, rondava a Europa e o mundo a 
revolução bolchevique na Rússia, trazendo conseqüências na forma como as assistentes sociais passaram a 
ver a classe operária. 
 
 
30 
também com o progresso material e moral; e 
profundamente convencida da centralidade da Europa, 
berço das revoluções da ciência, das artes, da política e 
da indústria e cuja economia prevalecera na maior parte 
do mundo, que seus soldados haviam conquistado e 
subjugado; uma Europa cujas populações (incluindo-se o 
vasto e crescente fluxo de emigrantes europeus e seus 
descendentes) haviam crescido até somar um terço da 
raça humana; e cujos maiores Estados constituíam o 
sistema da política mundial (HOBSBAWM, 1995, p. 16). 
 
 Nesse cenário de colapso da sociedade do século XIX, na Europa, 
as práticas do Serviço Social modificaram-se em busca da interação entre as 
classes sociais. O assistente social foi chamado a intervir nas demandas 
sociais, constituídas com base nas relações de produção nas fábricas e nos 
conjuntos habitacionais operários e se criou o serviço social das empresas, das 
caixas de compensação, da habitação, das caixas de seguro social, da infância, 
e outros, afirma Verdès-Leroux (1986). O Serviço Social, adequando-se à 
concepção fragmentária do homem e da sociedade, e nela, das políticas sociais, 
enfatizava a fragmentação de seu saber e de seu fazer. 
O significado da prática, contudo permaneceu o mesmo. Tratava-
se de mudanças na forma e de continuidade, de permanência e de sofisticação 
do conteúdo11. Resultou dessa fragmentação a diversificação das funções e das 
atividades no âmbito da assistência social segundo os espaços de atuação: 
enfermeira-visitadora, superintendente de fábrica, visitadora-controladora do 
seguro social e assistente familiar. Estrategicamente, os trabalhadores sociais 
 
11 Nesse momento, a assistência social reconhecia a importância do Estado e, ao mesmo tempo, era por ele 
reconhecida e encontra guarida no governo e nos meios políticos. Segundo VerdèsLeroux (1986), as 
assistentes sociais faziam elogios sem reservas às autoridades governamentais. 
 
 
31 
participavam dos mecanismos de controle sócio-econômico e ideo-político da 
classe dominada, inserindo-se de forma parcializada e fragmentada nas 
esferas constitutivas do ser social e contribuindo para aumentar o domínio 
sobre a vida cotidiana dos operários. O processo de formação era permeado 
por essa lógica, pois eram habilitadas visitadoras sociais, superintendentes de 
fábrica, assistentes familiares, assistentes sociais, entre outros. 
 Para Verdès-Leroux12 (1986), o trabalho social impôs-se, 
arbitrariamente, pela violência simbólica por meio de práticas produzidas pelo 
habitus, isto é, pela interiorização de normas e valores e por sistemas de 
classificação vinculados às representações sociais dominantes. As modalidades 
de intervenção constituem o meio pelo qual ocorre a inculcação de normas e 
valores e, conforme o campo de forças entre as classes sociais, tais valores e 
modalidades de intervenção são adaptados ideologicamente aos interesses da 
classe dominante, a eles se adequando também os espaços e as formas de 
celebração da profissão. Segundo a autora, o habitus que conforma a prática 
dos trabalhadores sociais, isto é, o conjunto de valores, costumes, formas de 
percepção dominantes, os modelos de pensamento incorporados pelos 
profissionais que orientam e regulam o fazer profissional são ideologicamente 
 
12 O tangenciamento analítico de Verdès-Leroux (1986) é aquele que concebe o Serviço Social 
como evolução, racionalização, organização e profissionalização das formas anteriores de 
ajuda, a caridade e a filantropia. Contudo, o seu arcabouço teórico-analítico apreende − no 
jogo da correlação de força entre as classes sociais, no campo das forças simbólicas que 
atuam na lógica da dominação − o significado e as modalidades de ação do trabalho do 
assistente social como agente a serviço do controle social, denominado como o habitus dos 
assistentes sociais. O conceito de habitus que permeia a análise do trabalho do assistente 
social de Verdès-Leroux (1986) inspira-se no pensamento do sociólogo contemporâneo Pierre 
Bourdieu (1930-2002), e propõe desnudar o modo de engendramento da prática desses 
agentes profissionais. Para Bourdieu, segundo Canesin (2001, p.114), o “Habitus produz a 
prática, porque ela é produto da relação dialética entre uma situação (condições objetivas da 
estrutura) e um Habitus. Autônoma em relação à situação, a prática nasce da relação dialética 
de uma estrutura − por intermédio do Habitus como princípio mediador − e uma conjuntura 
entendida como as condições de atualização desse Habitus. Há pois, entre as estruturas e as 
práticas, a mediação operada pelo Habitus como estruturas interiorizadas social e 
individualmente”. 
 
 
 
32 
inculcados mediante suas modalidades de intervenção e impõem aos 
trabalhadores assistidos a violência simbólica por meio do controle, do 
constrangimento, da tutela, da imposição da moralidade burguesa, da invasão e 
da vigilância da vida privada das classes dominadas. 
O significado do Serviço Social vincula-se à reprodução ideológica 
da ordem burguesa por meio do poder conferido aos profissionais que 
objetivam a assistência social. São profissionais subalternos, cujas práticas se 
caracterizam pelos baixos níveis de teorização e objetivam impregnar a 
população de princípios simples, moldando-a conforme as necessidades da 
classe dominante, assinala Verdès-Leroux (1986). O estudo em tela evidencia a 
fragmentação do trabalho social em relação aos espaços sócio-ocupacionais e a 
divisão de funções para garantir o controle social da vida cotidiana dos 
trabalhadores. 
As primeiras assistentes sociais no Brasil buscavam a sua 
formação acadêmica na Bélgica, cujo padrão desde o término da Primeira 
Guerra Mundial até 1936, segundo Verdès-Leroux(1986), fundava-se no 
discurso da paz social e na proximidade com o operariado, alterando a marca 
do período precedente de violência moral e juízo negativo e depreciativo 
explícito em relação aos hábitos de vida dos trabalhadores. Tratava-se de uma 
aproximação cujo objetivo era, sobretudo, o controle ideológico. 
 Os traços ideológicos e doutrinários que permearam o Serviço 
Social latino-americano em sua gênese foram sugados, acriticamente, do 
modelo belga-francês e, a partir do início da década de 1940, do funcionalismo 
norte-americano. Derivam-se daí, modalidades de práticas que se reproduzem 
na atualidade e habitam o imaginário dos profissionais e estudantes, 
conformando a representação da profissão como vocação. A formação 
 
 
33 
profissional nas primeiras escolas de Serviço Social13 na América Latina 
objetivava dotar essa vocação de referências doutrinárias para diferenciar a 
atividade profissional da ação de caridade, com o intuito de salvaguardar os 
interesses da igreja, assinalam Castro (1989) e Carvalho (1982). 
No entanto, encontrava-se em jogo, sobretudo, a necessidade de 
alterações o padrão de dominação burguesa no momento sócio-histórico de 
trânsito do capitalismo concorrencial para o capitalismo monopolista. A 
formação profissional ocultava essas reais necessidades e se constituía de 
estudos teóricos fundamentados na doutrina social da Igreja Católica, na 
filosofia neotomista e de atividades práticas de cunho adestrador, consistindo 
na transmissão/assimilação de modelos prescritos14. 
A profissão era exercida majoritariamente por mulheres, que 
eram preparadas para atuar na área da saúde e higiene, tal qual como se 
organizava o trabalho social na França e na Bélgica. Assim como o modelo 
europeu, o processo de seleção das futuras profissionais era rigoroso e elas 
deveriam enquadrar-se nos seguintes critérios: serem moças de boas famílias, 
educadas no berço da tradição cristã-católica, com boa saúde, devidamente 
atestada, e antecedentes probatórios de honorabilidade. A prática 
profissional desenvolvia-se em instituições assistências, públicas e 
filantrópicas, cujas características era marcadamente permeadas, segundo 
Carvalho (In: Iamamoto e Carvalho, 1982), pelo autoritarismo, paternalismo, 
 
13 Segundo Castro ( 1989) a primeira escola de Serviço Social na América Latina foi fundada por Alejandro 
Del Rio, médico, sanitarista, em 1925, no Chile, em um contexto de crise institucional e contínuos 
protestos, no qual a “classe operária experimentou significativo crescimento em sua organização e 
consciência política” (p. 64). Em 1929, foi criada a primeira escola católica de Serviço Social que pretendia, 
afirma Castro (1989), no contexto dos interesses globais da igreja, recuperar o seu papel de condutora da 
moralidade. 
14 Os estudos teóricos no processo de formação profissional, segundo Carvalho (In Iamamoto e Carvalho, 
1982), abordavam os fundamentos gerais de sociologia, pedagogia, economia social, legislação social, 
instrução cívica, anatomia e fisiologia, higiene privada, ética profissional e religião. No ensino prático, 
destacavam-se: tratamentos de caso individual, encaminhamentos jurídicos, técnicas de escritório e 
estatísticas, contabilidade, primeiro socorros, cuidados domiciliares a doentes, puericultura, nutricionismo, 
trabalhos manuais e exercícios de oratória. 
 
 
34 
doutrinarismo e ausência de base técnica. Tais características refletiam a 
ideologia da classe dominante e assumiam determinadas particularidades em 
decorrência das condições sócio-históricas de cada país latino-americano. 
 No exame dessas condições, destacam-se a dinâmica das relações 
econômicas, sócio-culturais e políticas entre os países centrais e os países 
periféricos de economia capitalista dependente e subdesenvolvidos e a 
formação dos sujeitos sócio-históricos e o padrão de dominação burguesa em 
cada país, levando-se em consideração a sua inserção na lógica de acumulação 
do capital. Elucidar esse complexo emaranhado constitui o grande desafio para 
compreender a emergência do Serviço Social no Brasil, na década de 1930, o 
seu significado e à sua funcionalidade em um país com baixíssimo grau de 
escolaridade, com o acesso restrito à educação, com mão-de-obra 
desqualificada, com ausência de políticas de saúde e estrutura de saneamento 
e atendimento médico-hospitalar e com o espectro do comunismo rondando a 
classe trabalhadora. Nesse momento, a economia brasileira encontra-se 
premida, pelas condições externas e internas, a substituir o esgotado modelo 
de desenvolvimento agro-exportador para o modelo urbano-industrial no 
contexto do capitalismo monopolista. 
 Segundo Fernandes (2006, p. 346), as conexões da dominação 
burguesa com a transformação capitalista “se alteram de maneira mais ou 
menos rápida, na medida em que se consolida, se diferencia e se irradia o 
capitalismo competitivo no Brasil e, em especial, em que se aprofunda e se 
acelera a transição para o capitalismo monopolista”. 
O comando da máquina propulsora de tais alterações guiava-se 
pelos interesses econômicos do capitalismo central das nações hegemônicas e 
o elemento principal era a emergência da industrialização “como um processo 
econômico, social e cultural básico, que modifica a organização, os dinamismos 
e a posição da economia urbana dentro do sistema econômico brasileiro”, 
 
 
35 
assinala Fernandes (2006, p. 346). Subproduto da hegemonia do complexo 
industrial-financeiro, a hegemonia urbano e industrial intensificava a 
concentração de recursos materiais, técnicos e humanos nas grandes cidades, 
“dando origem a fenômenos típicos de metropolização e de satelitização sob o 
capitalismo dependente” (FERNANDES, 2006, p. 346). 
 No momento específico de trânsito à fase do monopólio, pode-se 
apreender a particularidade da gênese histórico-social do Serviço Social, 
afirma Netto (2001, p. 18). Essa apreensão busca as raízes das conexões 
sócio-históricas entre a forma, a natureza e as funções da dominação 
burguesa e a emergência do Serviço Social, permitindo, por sua vez, 
compreender a forma, a natureza e as funções do Serviço Social. No momento 
de emergência do Serviço Social, as conexões entre os interesses econômicos 
da burguesia local, o padrão de dominação burguesa e a profissão eram 
viscerais, decorrendo a assimilação de uma compreensão que naturaliza os 
processos sociais, fragmenta os fenômenos relativos à questão social e 
enfatiza o aspecto moralizador para salvaguardar a ordem e o progresso. 
As condições sócio-históricas da emergência do Serviço Social, 
até então, foram encobertas por descrições fincadas em um sentimento de 
mundo, no qual a profissão teria surgido da institucionalização de suas 
protoformas. As pesquisas realizadas por Iamamoto e Carvalho (1982) ilustram 
a relação visceral entre os interesses da burguesia e a profissão, ao 
analisarem a constituição do grupo pioneiro, a criação das primeiras escolas de 
Serviço Social no Brasil, o papel da Igreja15 e do Estado. 
 
15 Para contrapor o perigo do movimento socialista dos trabalhadores, a Igreja 
intensificou a sua presença nas vilas operárias e incentivava a participação do 
laicado em obras assistências surgindo, no princípio da década de 1920, a 
Associação das Senhoras Brasileiras, no Rio de Janeiro, e a Liga das Senhoras 
Católicas em São Paulo. Tais associações, tuteladas e imbuídas pelo 
pensamento social da Igreja, foram instituídas tendo como perspectiva a 
 
 
36 
As intervenções desenvolvidas pelas obras sociais vinculadas à 
Igreja eram caracterizadas como ajuda, caridade, filantropia e denominadas, 
como as anteriores formas de ajuda. Segunda a tese endogenista, essas ações 
criaram as bases para a emergência do Serviço Social. Os objetivos dessas 
ações vinculavam-seao atendimento e à atenuação de determinadas seqüelas 
produzidas e reproduzidas pelo desenvolvimento capitalista admitindo-se os 
problemas estruturais advindos do modo ser da sociedade do capital, mas a 
intervenção centrava-se no indivíduo, considerado o responsável por todos os 
seus infortúnios. 
Os preceitos que embasavam o projeto de formação profissional 
das primeiras escolas de Serviço Social16 no Brasil, ignoravam as condições 
sócio-históricas que engendraram a emergência da profissão. Dentre elas, há 
que se pontuar que o mercado de trabalho para o assistente social constituiu-
se, de fato, quando o Estado assumiu para si as respostas às expressões da 
questão social17. As primeiras assistentes sociais foram contratadas para 
atuarem em institutos e caixas de pecúlios, na Legião Brasileira de Assistência 
(LBA), no Serviço Social da Indústria (Sesi), no Serviço Nacional de 
 
formação das bases organizacionais e doutrinários do apostolado laico, objetivando “a assistência preventiva, 
de apostolado social, atender e atenuar determinadas seqüelas do desenvolvimento capitalista, principalmente 
no que se refere a mulheres e crianças”, assinala Carvalho (1983, p. 170). Para efetivar tais objetivos foi 
criado o Centro de Estudo e Ação Social de São Paulo (Ceas), em 1932, com o objetivo de promover as 
obras de filantropia vinculadas às classes dominantes, e as moças, representantes de frações da classe 
dominante, foram convidadas para participar de um curso intensivo de formação social, com uma 
representante da escola de Serviço Social de Bruxelas, para orientá-las, esclarecer as idéias e formar um 
julgamento acertado acerca dos problemas da atualidade. Por problemas da atualidade, entendem-se os 
movimentos sociais − fundamentalmente a organização sindical da classe trabalhadora − considerados 
altamente subversivos, desafetos da Igreja e do Estado. 
16 Em 1936, o Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo, vinculado a Igreja católica criou a primeira 
Escola de Serviço Social. Carvalho (In: Iamamoto e Carvalho, 1982, p. 180) assinala que “esta não pode ser 
considerada como fruto de uma iniciativa exclusiva do Movimento Católico Laico, pois já existe presente 
uma demanda − real ou potencial − a partir do Estado, que assimilará a formação doutrinária própria do 
apostolado social”. 
17 Na década de 1930, o Estado brasileiro organizou-se para garantir as bases de sustentação econômica e 
social para garantir o desenvolvimento urbano-industrial. No Estado de São Paulo o governo criou o 
Departamento de Assistência Social, em 1935, com as seguintes finalidades: “a) superintender todo o serviço 
de assistência e proteção social; b) celebrar, para realizar o seu programa, acordos com as instituições 
particulares de caridade, assistência e ensino profissional; c) harmonizar a ação social do Estado, 
articulando-a com a dos particulares; d) distribuir subvenções e matricular as instituições particulares 
realizando o seu cadastramento” , assinala Carvalho (In: Iamamoto e Carvalho, 1982, p. 178). 
 
 
37 
Aprendizagem Industrial (Senai), nas prefeituras municipais, e, sobretudo, em 
órgãos governamentais federais e dos estados federativos que começavam a 
estruturar as políticas socais. 
No âmbito desses espaços sócio-ocupacionais, a intervenção 
profissional do assistente social deveria transpor o caráter intuitivo e os 
sentimentos de compaixão balizadores das ações caritativas, que do ponto de 
vista do capital apenas mantinha o círculo vicioso da pobreza, para tornar-se 
racionalmente eficaz na utilização dos recursos técnicos e competente na 
inculcação de valores morais adequados aos interesses do capital. Além do 
caráter assistencial em si-mesmo, a intervenção profissional imbuía-se da 
dimensão educativa para moldar o comportamento, os costumes e hábitos da 
população alvo, os operários. 
O sentido da educação na perspectiva da burguesia era a 
preparação técnica para o trabalho e para a vida cotidiana (hábitos e 
costumes), por meio do adestramento, cujos conteúdos moralizadores se 
revestiam do necessário para a reprodução da subalternidade. O caráter 
pragmático da intervenção sócio-assistencial moldada para essas finalidades 
vinculava-se ao desenvolvimento urbano-industrial em curso na década de 
1930, isto é, a necessidade de mão-de-obra para a nascente indústria de base 
e a retenção dos movimentos dos trabalhadores por meio da persuasão 
ideológica. 
Nessa direção, os problemas sociais com as quais os assistentes 
sociais deparavam-se eram a infância abandonada, as condições de habitação, o 
carecimento econômico, a ausência de saúde e a falta dos hábitos de higiene, o 
despreparo técnico para o mercado de trabalho, a fraqueza moral dos 
operários que se deixavam influenciar por agitadores comunistas. A 
identificação das necessidades sociais ocorria por meio da abordagem 
 
 
38 
individual, o Serviço Social de caso, com o atendimento estendido aos 
familiares. 
A sustentação da ação profissional erguia-se em um tênue fio 
condutor de princípios pincelados da doutrina neotomisto e do pragmatismo. 
Dessa tríade provinha a visão transcendental idealista do mundo no qual a 
razão humana é a expressão imperfeita da razão divina e a ela se encontra 
subordinada, a democracia balizada na liberdade do mercado e o princípio da 
utilidade guiando e justificando a intervenção. Esse arranjo pretende eliminar 
as desigualdades sociais estruturais per-si, atribuindo ao homem a 
responsabilidade por suas imperfeições e resulta na prática voltada apenas por 
sua utilidade imediata. Pode-se afirmar que os pressupostos contidos nesse 
arranjo têm sua proveniência das práticas produtivas capitalistas, ao mesmo 
tempo que se constituem em mecanismos ideológicos estratégicos para a 
garantia de sua reprodução. 
 Ao reproduzir as normas e os valores morais18 da burguesia, a 
prática profissional do assistente social reorientava os costumes e os valores 
da classe trabalhadora. A ação educativa consistia na impregnação de normas e 
valores que projetavam um dever-ser pautado no senso moral, adequado às 
necessidades do capital que se incorporavam à vida cotidiana dos 
trabalhadores. 
A formação profissional para a efetivação de tais funções 
requeria a assimilação acrítica das doutrinas moralizadoras e o domínio de 
técnicas adequadas ao adestramento de comportamentos sociais para a vida 
cotidiana. Tratava-se de reproduzir modelos ideais para legitimar o Serviço 
Social diante das necessidades vinculadas à reprodução do capital e solidificar 
o padrão de dominação da burguesia. 
 
18 Os parâmetros ideais para mensurar o que é moralmente adequado − bom ou ruim, certo ou errado, bonito 
ou feio, virtuoso ou vergonhoso − são estabelecidos por determinações sócio-históricas e, ainda que devam 
ser aceitos individualmente, expressam e objetivam interesses de classes. 
 
 
39 
Tendo em vista tais atribuições e responsabilidades, a prática 
profissional iniciava-se com a identificação dos problemas bio-psíquicos e 
sócio-comportamentais dos operários19 e seus familiares que buscavam as 
instituições e os órgãos governamentais20. Esta identificação ocorria por meio 
da abordagem individual, utilizando como instrumental técnico-operativo o 
diagnóstico. A execução desse procedimento técnico-operativo iniciava-se com 
a ausculta do indivíduo queixoso que demandava o auxílio assistencial, a fim de 
instituir o caso, procedendo-se ao estudo para efetuar o diagnóstico, 
averiguar a pertinência das solicitações e estabelecer os encaminhamentos 
subseqüentes − o tratamento. 
No estudo do caso, o profissional recorria a instrumentos 
técnico-operativos de apoio, dentre os quais se destacavama entrevista e a 
visita domiciliar, que possibilitavam a coleta de dados, o acesso aos costumes e 
hábitos higiênicos da família e a averiguação da veracidade das informações 
fornecidas pelo assistido. A entrevista apoiava-se nas fichas sócio-econômicas 
e/ou anamnese, instrumento de coleta de dados sócio-econômicos das famílias 
dos operários pertinentes e relevantes para justificar a intervenção 
profissional na instituição/programa e possibilitar o registro para fins 
estatísticos. Com base nesse estudo concluía-se o diagnóstico estabelecendo 
as medidas a serem aplicadas no tratamento do caso. Tais medidas 
comportavam respostas às necessidades de cunho social, econômico, 
educacional, saúde, jurídico e moral. Assim, um caso, em sua face de 
tratamento, demandava encaminhamentos diversos, constituindo-se na forma 
preponderante de ação, ou seja, 
 
 
19 O público alvo atendido pelo Serviço Social de caso eram os operários e suas famílias, os artesãos, viúvas 
e aposentados . 
20 Departamento de Serviço Social do Estado de São Paulo que, segundo Carvalho (In: Iamamoto e Carvalho, 
1982) absorvia 17 entre as 27 profissionais em exercício, em 1940, Departamento Estadual do Trabalho e 
Juízo de Menores. 
 
 
40 
o tratamento dos casos [era] basicamente feito através 
de encaminhamentos, colocação em empregos, abrigo 
provisório para necessitados, regularização da situação 
legal da família (casamento), etc., e fichário dos 
assistidos (CARVALHO, in Iamamoto e Carvalho, 1982, p. 
194). 
 
Como os problemas de ordem estruturais existentes, em 
decorrência da relação que os homens estabelecem entre si eram 
desconsiderados, o indivíduo situava-se no centro da atividade porque ele era o 
responsável por suas condições de vida e de sua família, considerada como a 
célula básica da sociedade. Segundo Iamamoto (2002), a individualização dos 
casos sociais, em detrimento do reconhecimento da situação comum vivida 
pelos seguimentos da classe trabalhadora que demandam serviços sociais, é 
uma característica do movimento reformista-conservador presente na prática 
profissional. Nessa perspectiva, a ação profissional orientava-se por princípios 
e postulados centrados no indivíduo Iamamoto (2002, p. 19-20): 
 
os indivíduos são encarados como seres únicos e 
particulares, com potencialidades a serem desenvolvidas, 
desde que estimuladas, cuja dignidade de seres humanos e 
cuja liberdade merecem o respeito do profissional. Porém, 
tais características tendem a ser apreendidas sem 
vinculação com suas bases materiais, isto é, 
subjetivamente e apartadas da situação social de vida dos 
clientes, transformando-se em princípios e postulados 
universalizantes orientadores da ação profissional. 
 
 
 
41 
Os princípios e os critérios de validade da verdade eram tomados 
como conhecimentos constitutivos e derivados da sensibilidade, da cultura 
cristã e da experiência profissional. Conforme essa percepção, quanto mais 
sensível, portadora de uma cultura geral adquirida no seio da convivência 
familiar e dos círculos sociais freqüentados e experiente a profissional, mais 
eficaz e parcimonioso era o seu trabalho. Essas qualidades ressaltadas nas 
assistentes sociais pioneiras são constantemente destacadas na atualidade 
quando se discutem as dificuldades relacionadas ao processo de ensino e 
aprendizagem na formação profissional. 
Carvalho (In: Iamamoto e Carvalho, 1982) transcreve o relato de 
um caso no qual se apreendem os objetivos, as atividades e os procedimentos 
realizados pelo profissional no atendimento do caso. Verifica-se que, ao 
prestar a assistência, por meio de auxílios monetários, encaminhamentos a 
órgãos assistencias, educacionais, hospitalares e jurídicos, o profissional 
intervinha no cotidiano da família com um poder que implicava até mesmo 
encaminhamentos que separavam pais e filhos. Recaía sobre o indivíduo o 
julgamento moral sobre a sua (in)capacidade de prover a si mesmo e à sua 
família. Tratava-se de uma prática fincada na tutela, permeada pelo sentido do 
dever e baseada na força da opressão. 
Independentemente do espaço sócio-ocupacional, os balizamentos 
das ações profissionais eram mensurados pelos benefícios que poderiam ser 
obtidos para consolidar os interesses da classe burguesa, reafirmando sempre 
as normas e os padrões da racionalidade que espelham o seu mundo e de suas 
práticas produtivas21. A ação do assistente social objetivava remediar as 
 
21 Assim, por exemplo, nas creches, uma vez que as operárias continuavam a amamentar seus filhos além 
dos dias regulamentados pela legislação trabalhista, a profissional as encaminhava ao serviço médico para 
obter orientações de dietas alimentares para as crianças e encaminhava os nomes das operárias que cometiam 
a infração à gerência das fábricas para que suas saídas fossem impedidas com o objetivo de salvaguardar “os 
interesses legítimos da empresa, que perdia muitas horas de trabalho” (CARVALHO. In Iamamoto e 
Carvalho, 1982, p. 198). 
 
 
42 
deficiências dos indivíduos e da coletividade tendo em vista o ajustamento à 
ordem burguesa. O atendimento ocorria por meio de uma ação individualizada, 
e a ação nas coletividades não devia atingir as estruturas dos grupos sociais. 
Os estudos disponíveis referentes a prática profissional no 
período da emergência do Serviço Social até o final da década de 1950 
revelam a explícita sintonia e defesa dos interesses da classe burguesa. Sem 
uma contraposição interna, o discurso, os registros da prática profissional não 
escamoteiam o significado da profissão, os interesses defendidos, os 
parâmetros normatizadores das atividades e dos procedimentos. 
Segundo Carvalho (In: Iamamoto e Carvalho, 1982), nesse 
contexto, as atividades desenvolvidas pelos assistentes sociais eram restritas 
em virtude dos limites de atuação dos órgãos públicos e da incapacidade de as 
instituições viabilizarem os encaminhamentos requeridos no atendimento de 
casos individuais. 
Com o recurso heurístico fundado na teoria social marxiana, a 
partir da década de 1970, o significado da emergência do Serviço Social deixa 
de ser narrado na perspectiva da evolução, organização e profissionalização 
das formas de ajuda para o enfrentamento de desvios sócio-comportamentais 
cujas causas relacionavam-se à inadaptabilidade do indivíduo. No entanto, essa 
marca indelével permanece, guiando um determinado modo de ser do Serviço 
Social, deixando um rastro que se identifica a um sulco fechado, isto é, um 
rego que se abriu de um arranjo, forjou uma técnica que se repete 
indefinidamente no interior da profissão e prende o fazer profissional às 
expressões fenomênicas do ser social, circunscrito ao espontâneo e ao 
imediato. 
Trata de um arranjo cuja sustentação se encontra em seu escopo 
− a reprodução de um padrão de dominação que objetiva o ajustamento do ser 
que vive do próprio trabalho à ordem do capital. A finalidade vinculada à 
 
 
43 
utilidade do Serviço Social é o elemento que permanece como norteador e 
justificador da prática forjada por esse arranjo, ignorando o significado, a 
concepção, os princípios, a funcionalidade da profissão que aparecem apenas 
como gomas que mudam de cor dependendo das circunstâncias e, por isso 
mesmo, carecem de sentido ou se constituem no verniz que encobre o real. Em 
decorrência, há constantes tentativas de burilar uma concepção de Serviço 
Social sustentado em si-mesmo, a permanente busca por uma identidade 
profissional, o contínuo mal-estar atribuído à dicotomia entre a teoria e a 
prática. São os falsos dilemas encobrindo as contradições que engendram a 
constituição e o significado da profissão e, se de um lado, contribuem para 
explicitar os vínculos e os compromissos com direções sociais contrapostas, de 
outro, embaraçam, amarram

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