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UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL – UAB UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS – UNIMONTES Centro de Educação a Distância - CEAD Curso de Tecnologia em Gestão de Saúde Pública HOMOFOBIA E VIOLÊNCIA CONTRA POPULAÇÃO LGBT NO BRASIL: UMA REVISÃO DE LITERATURA Joaíma-MG Março / 2021 Ilvan André Silva Wilkson Santos HOMOFOBIA E VIOLÊNCIA CONTRA POPULAÇÃO LGBT NO BRASIL: UMA REVISÃO DE LITERATURA Trabalho apresentado à disciplina de TCC II, do Curso de Tecnologia em Gestão de Saúde Pública, ofertado pela Universidade Estadual de Montes Claros como exigência para obtenção do grau de Tecnólogo em Gestão de Saúde Pública. Orientadora: Prof.. Ma. Marcilei da Conceição Horn. Joaíma-MG Março / 2021 HOMOFOBIA E VIOLÊNCIA CONTRA POPULAÇÃO LGBT NO BRASIL: UMA REVISÃO DE LITERATURA Ilvan André Silva1 Wilkson Santos² Marcilei da Conceição Horn³ RESUMO Introdução: No decorrer da história é notável a falta de compreensão acerca da legitimidade da forma homossexual de expressão da sexualidade humana. A homofobia como preconceito, tem seu último grau na violência, colocando em risco a vida da população de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros (LGBT). Esse fato não se resume, porém, apenas aos indivíduos homossexuais, pois a homofobia engloba questões de igualdade de direitos e a luta por políticas públicas que assegurem tais direitos. Objetivo: analisar a literatura específica acerca da homofobia e violência de LGBTs no Brasil. Metodologia: Trata-se de uma revisão integrativa da literatura com artigos disponíveis nas bases de dados SCIELO e LILACS, publicados entre os anos de 2015-2020. Reultados: A violência psicológica como a principal manifestação de violência cometida contra LGBT’s, o que, em consequência, eleva o risco das violências físicas, falta de indicação nos boletins de ocorrências policiais e nas estatísticas de mortalidade, das causas dessas mortes, fazendo com que o número de pessoas trans vítimas de homicídio seja maior do que o apresentado pelas organizações. Conclusão: Destacamos preconceitos velados e explícitos, violências caracterizadas como “crimes de ódio” por unicamente sua orientação homossexual. Palavras-Chave: : População LGTB; Homofobia; Violência. ABSTRACT Introduction: Throughout history, there is a notable lack of understanding about the legitimacy of the homosexual form of expression of human sexuality. Homophobia as a prejudice, has its last degree in violence, putting the lives of the Lesbian, Gay, Bisexual and Transgender (LGBT) population at risk. This fact is not limited, however, to homosexual individuals only, since homophobia encompasses issues of equal rights and the struggle for public policies that ensure such rights. Objective: This research aims to investigate existing laws and public policies that ensure the rights of the LGBT population in Brazil and seek to reduce violence against homosexuals. Methodology: This is an integrative literature review with articles available in the SCIELO and LILACS databases, published between the years 2016-2020. Results: The consequence, therefore, is the invisible deaths of transvestites and transsexuals, due to the lack of indication in the police reports and in the mortality statistics, of the causes of these deaths, making the number of trans people victims of homicide more than than that presented by organizations (BONASSI, et. al., 2015). Conclusion: We highlight veiled and explicit 1 Graduando em Tecnólogo de Gestão em Saúde Pública pela (Unimontes), Joaíma, Minas Gerais, Brasil 2 Graduando em Tecnólogo de Gestão em Saúde Pública pela (Unimontes), Joaíma, Minas Gerais, Brasil 3 Mestra em Saúde Coletiva pela Universidade Federal de Mato Grosso, docente orientadora no curso Tecnologia em Gestão de Saúde na Unimontes. prejudices, violence characterized as “hate crimes” for its homosexual orientation only and the lack of preparation of health and safety professionals trained to serve this audience. Key Words: Laws; Public policy; LGTB population; Homophobia; Violence. INTRODUÇÃO Quando uma pessoa nasce ela é identificada pela sua genética que é definida como masculina ou feminina. E a partir desta definição as pessoas assumem o papel social correspondente (MATOS e CIDADE, 2016). Historicamente, a homossexualidade no Brasil, é caracterizada um tanto quanto já dita preconceituosa, pelo fato dessa caracterização se dar pela vinculação aos papéis sexuais das Lésbicas, Gays Bissexuais, Travesti (LGBTs), como por exemplo, (o bofe, homem masculino sexualmente; e a bicha, um homem feminino e passivo sexualmente) (COSTA et al., 2015). O termo se tornou popular e usual do ativismo político, que representou um avanço nas reivindicações da população LGBT bem como na compreensão do preconceito que assola essa população (COSTA e NARDI, 2015). A LGBTfobia, por sua vez, como descrita por Junqueira (2007), se refere a sentimentos negativos relacionados ao “medo” e ao “semelhante” direcionados a gays, lésbicas, travestis, transexuais e bissexuais. O ataque LGBTfóbico é sempre um conflito entre dois semelhantes, um que vivencia de forma plena a sua sexualidade e o outro que a esconde e tem vergonha dela. Segundo Lima (2014) o regime autoritário abafou as iniciativas no movimento Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros. Entretanto no ano de 1978 os jornais alternativos e movimentos sociais se expandiram no país, criticando o Regime Militar. Machado e Brotto (2016) afirma que a proteção social básica tem como responsabilidade tratar de questões em que busca prevenir o indivíduo e sua família que estão em situação de vulnerabilidade, buscando ações que visam fortalecer os vínculos familiares e comunitários no combate às desigualdades sociais. Segundo Perucchi et al. (2014) a população LGBTs sendo vítima de rejeição e discriminação preconceituosa, acaba sendo tarefa dificil para o jovem assumir não como heterossexual, uma vez que nem sempre encontram apoio e respeito por parte da família. Quando as condutas desses indivíduos são colocadas em questão, muitas vezes as regras não são atendidas na íntregra como disposto pelos superiores, às vezes usam mecanismos violentos sendo estes físicos ou psicológicos, tudo isso para repreendê-los e enquadrá-los à norma. O relatório Violência LGBTFóbicas no Brasil: dados da violência (BRASIL, 2018) disponibilizado pelo Ministério dos Direitos Humanos analisa dados quantitativos da Ouvidoria de Direitos Humanos – Disque 100, Grupo Gay da Bahia (GGB) e Rede Trans Brasil (RedeTrans) para mensuar a violência sofrida pela população LGBT em 2016. O GGB, como afirma o relatório, analisou principais canais midiáticos e quantificou 343 violações LGBTfóbicas das quais 50% aconteceram com homens gays e 42% com travestis e transexuais. Um relatório mais recente do Grupo Gay da Bahia (2018) aponta que a cada 20 horas morre de forma violenta um LGBT no Brasil por motivação discriminatória. Antes da criação efetiva do PNSILGBT, outros fatores foram importantes para a luta LGBT no que tanque a saúde equitativa. Assim, devemos pontuar o direito ao uso do nome social por meio da Carta Dos Direitos Humanos, a presença de militantesLGBT no Conselho Nacional de Saúde, a inclusão de orientação sexual e a identidade de gênero na análise de determinação social da saúde na 13ª Conferência Nacional de Saúde, a realização da 1ª Conferência Nacional de LGBT e a publicação da Portaria nº 457 que implantou as cirurgias de redesignação sexual para mulheres trans. (POPADIUK et al., 2016). Diante disto, o Ministério da Saúde instituiu, no segmento do Sistema Único de Saúde (SUS), a Política Nacional de Saúde Integral de Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais atráves da Portaria GM/MS nº 2.836 de 1º de dezembro de 2011. O documento exibe em 5 capítulos uma discussão sobre a temática e uma apresentação com fundamentação legal, objetivos, estratégias e ações. Esta política pública tem com objetivo geral “promover a saúde integral da população LGBT, eliminando a discriminação e o preconceito institucional e contribuindo para a redução das desigualdades e para consolidação do SUS como sistema universal, integral e equitativo.” (BRASIL, 2013). A política é, então, um instrumento de ação para os gestores e profissionais da saúde. A partir do exposto, questiona-se: O que a literatura entre 2016-2021 tem discutido sobre a violência e homofobia de LGBTs no Brasil? Percebe-se que a violência contra LGBTs no Brasil é um problema de ordem social que ainda persiste. Assim, o objetivo da pesquisa é analisar na literatura específica acerca da homofobia e violência de LGBTs no país. METODOLOGIA Trata-se de uma revisão integrativa da literatura. Buscou-se reunir em duas bases de dados pré-definidas, referências que discutissem a homofobia bem como violências dirigidas a essa população. A busca de referências para embasar esse trabalho foi realizada na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), com busca de publicações dos últimos 6 anos, nas bases de dados de Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Scientifc Eletronic Library Online (SciELO) e a partir dos descritores: População LGTB; homofobia; violência, utlizando o operador booleano AND na combinação entre os descritores. Critérios de inclusão: artigos em português do Brasil e completos disponíveis na internet. Foram consideradas como critério de exclusão as publicações que não se enquadraram na modalidade artigo, os que foram publicados fora do recorte temporal definido, os que não apresentaram pesquisa de acordo com o tema abordado, teses, capítulos de teses, capítulos de livros, anais de congressos, idioma diferente ou por não preencher os critérios do estudo. A coleta ocorreu no mês de março e abril de 2021. Inicialmente, foram encontrados 1649 artigos, que versavam sobre a temática da violência homofóbica. Foi realizada a leitura dos títulos e dos resumos, e após aplicação dos critérios de exclusão, foram selecionados 07 artigos da língua portuguesa. RESULTADOS Os sete artigos selecionados, após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, foram lidos na íntegra e elencados no Quadro 3. Quadro 1– Descrição resumida das cinco referências analisadas no estudo. TÍTULO/AUTORES /ANO OBJETIVO PRINCIPAIS RESULTADOS Situações de violência contra travestis e transexuais em um município do nordeste brasileiro (SILVA et. al., 2016). Análise do perfil sócio demográfico e da violência praticada contra travestis e transexuais de Cajazeiras-PR. 81,25% da amostra se identificou como travesti, a maioria de cor parda, ensino médio completo, e profissão cabeleireira; 75% da amostra sofreu violência, a maioria do tipo verbal, e psicológica, 75% das violências ocorreram na rua. Violência física contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais no interior do nordeste brasileiro (PARENTE et. al., 2018). Análise do perfil sócio demográfico e da violência praticada contra a população LGBTT no interior do Ceará 70% são do sexo biológico masculino, 51,2% homossexuais gays, pardos, solteiros, ensino médio completo e com trabalho formal; 78,8% sofreu violência psicológica; das agressões físicas, 21,8% foram empurrões e a maioria na face; 13,6% dos agressores de rua são transeuntes, e 7,3% dos agressores conhecidos foram amigos. Violência psicológica em lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais no interior do Ceará, Brasil (ALBUQUERQUE et. al., 2016). Análise do perfil da violência psicológica praticada contra a população LGBTT 78,8% já foi vítima de violência psicológica, 70,6% do sexo masculino, maioria de gays e identidade de gênero masculino e homossexuais; 77,5% das violências foram à distância, 45,4% desconhecidos na rua, a reação principal foi agressão física e 52,2% tiveram como consequência a tristeza. Vulnerabilidades mapeadas, Violências localizadas: Experiências de pessoas travestis e transexuais no Brasil (BONASSI et. al., 2015). Investigar a violência contra travestis e transexuais de Santa Catarina, visando o perfil psicossocial e mapeamento de vulnerabilidades 48% da amostra era de pessoas brancas, entre 18 a 50 anos, a maioria travestis, com ensino médio completo e pertencentes ao mercado de trabalho informal; 87% afirmaram ter sofrido discriminação, 76% violência psicológica, 62% violência física, 37% violência institucional; entre a agressão psicológica destaca-se a humilhação; em relação ao agressor, 65% declarou que são pessoas da população em geral. Foi como se a gente tivesse visto a morte: estigmatização, sofrimento psíquico e homossexualidade (RIOS et. al, 2018). Analisar e discutir a relação entre estilos corporais estigmatização e sofrimento psíquico em homens homossexuais do recife 65,5% da amostra se identificou como negros, 18 a 24 anos, a maioria com curso superior, emprego formal com carteira assinada, 23,3% do estilo másculo e 31,8% do estilo efeminado; 32,9% afirmou ter sofrido violência por orientação sexual e 57,1% sofreu discriminação; efeminados apresentam 1,9 vezes mais relatos de violência e 2 vezes mais de discriminação que os másculos; 76,6% dos que sofreram violência apresentaram depressão e 79,2% dos efeminados apresentaram 1,6 mais relatos de depressão que os másculos (50%). A política nacional de saúde integral de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais: uma revisão bibliográfica;(NEGREIROS et al., 2019). Analisar a formação médica para a assistência à saúde da população LGBT na perspectiva de médicos que atuam na atenção básica. O GGB, como afirma o relatório, analisou principais canais midiáticos e quantificou 343 violações LGBTfóbicas das quais 50% aconteceram com homens gays e 42% com travestis e transexuais. Um relatório mais recente do Grupo Gay da Bahia (2018) aponta que a cada 20 horas morre de forma violenta um LGBT no Brasil por motivação discriminatória. O Direito à Saúde da População LGBT: Desafios Contemporâneos no Contexto do Sistema Único de Saúde (SUS); Montenegro, Velasque, Legrand, Whetten, Mattos, & Rafael (2019) Discutir as possibilidades de prejuízos para a população vivendo com HIV/aids durante o governo de Jair Bolsonaro, diante da diminuição do SUS e do aumento do setor privado de saúde. O governo de Jair Bolsonaro, juntamente a um Congresso majoritariamente conservador, promove cortes do financiamento de políticas de saúde, educação e pesquisa. Essas medidas podem implodir ações de defesa de direitos humanos focadas em minorias. Fonte: Elaborado pelos autores, maio de 2021. DISCUSSÃO Silva et. al. (2016) relata que as pessoas com identidades transgênero são estigmatizadas e o fato de a identificação de seu gênero estar em discordância com o sexo biológico resulta em situações de constrangimento e violência, sendo, portanto,comum ceder à heteronormatização. Essa lógica, no entendimento de Bonassi et. al. (2015), é socialmente imposta mesmo antes do nascimento, a qual considera apenas duas possibilidades, quais sejam, homem e mulher, cuja identificação decorre somente a partir de genitais. Tal imposição cultural além de legitimar a patologização das transgeneridades, torna-se alavanca propulsora das violências transfóbicas. Em relação ao perfil psicossocial, Parente et. al. (2018) e Albuquerque et. al. (2016) encontraram resultados coincidentes que apontam para a maioria das vítimas sendo do sexo biológico masculino, identidade de gênero masculina e orientação sexual homossexual gay. Quanto à escolaridade, Silva et. al. (2016), Parente et. al. (2018) e Bonassi et. al. (2015) demonstraram que a maior parte das vítimas possui ensino médio completo, em sentido contrário de Rios et. al. (2018) identificou que a maior parte de sua amostra possui nível superior, completo ou não. Importante destacar que tal resultado referente à escolaridade pode estar relacionado aos subgrupos participantes das pesquisas, pois no artigo de Rios et. al. (2018) a amostra era formada por homens homossexuais, diferentemente de Silva et. al. (2016) e Bonassi et. al. (2015), que trataram exclusivamente de transexuais e travestis, e Parente et. al. (2018) que envolveu um grupo mais abrangente de participantes, o que aponta para uma diferenciação com tendência ao agravamento das violências e estigmatizações em relação às travestis e transexuais. Ressaltam-se, portanto, que Silva et. al. (2016) e Bonassi et. al. (2015) delimitaram a pesquisa nas categorias “travestis” e “transexuais”, a primeira discutindo violência física, e a outra, psicológica, respectivamente, das quais emerge uníssona argumentação: a de que tais categorias apresentam elevado grau de marginalização, repúdio e, em consequência, são os maiores alvos da violência. Rios et. al. (2018), em seu estudo sobre estigmatização e violência contra homossexuais, informa que na comunidade gay do Recife, os homens masculinos são denominados “boys” e os femininos “pintosas”, e a maior parte dos relatos sobre o que é ser “pintosa”, está relacionada a situações de violência e discriminação, notadamente por estar em descordo com as normas sociais, em contraste com o padrão esperado para homens, que tem “passabilidade heterossexual” (RIOS et. al. 2018, p. 148). Tal argumentação é fortemente demonstrada através dos altos índices de vitimização encontrados pelos artigos em questão, onde a quase totalidade dos participantes afirmou ter sido vítima de algum tipo de violência (PARENTE et. al., 2018; ALBUQUERQUE et. al., 2016; SILVA et. al., 2016). Destaca-se, por conseguinte, que em se tratando de violência física, que as regiões corporais mais atingidas pelos atos violentos são a face e membros superiores, exatamente em razão do caráter humilhante representado por uma lesão na face (PARENTE, et. al., 2018). Outro aspecto em comum nos artigos ora analisados refere-se a naturalização das violências pelas próprias vítimas. Bonassi et. al.(2015) ressalta que considerável parte de sua amostra apresentou dificuldade de compreender o que seria violência psicológica e seus subtipos (humilhação, hostilização, ameaça, calúnia/injúria/difamação), por entenderem, a exemplo, que humilhação não integra o conceito de violência por estar presente de forma corriqueira e habitual no cotidiano dessas pessoas. Segundo Parente et. al. (2018), a violência psicológica assume a primeira posição (78,8%) nos tipos de violência pelas quais a população LGBT passa ao logo da vida, sendo esse um indício dessa naturalização das agressões psicológicas, o que, em consequência, eleva o risco das violências físicas. Tais dados, no entendimento de Albuquerque et. al. (2016) apontam a violência psicológica como a principal manifestação de violência cometida contra LGBT’s e mais difícil de ser visibilizada, uma vez que se apoia em mecanismos simbólicos de poder cujo preconceito é caracterizado como uma questão natural em nossa sociedade. A consequência, portanto, são as mortes invisibilizadas de travestis e transexuais, em razão da falta de indicação nos boletins de ocorrências policiais e nas estatísticas de mortalidade, das causas dessas mortes, fazendo com que o número de pessoas trans vítimas de homicídio seja maior do que o apresentado pelas organizações (BONASSI et. al., 2015). Parente et. al. (2018) ressalta que os relatórios anuais do Disque 100 indicam que entre os anos de 2011 a 2013, a Região Norte liderou as estatística de denúncias no canal governamental com 43% das mortes. Os autores, Silva et. al. (2016, Bonassi, et. al., 2015 ) apontam, inclusive, a inexistência de informação sobre registro de Boletins de Ocorrências ou notificações em sistemas de informações, como uma lacuna em seu estudo, travestindo-se, dessa forma, em um tipo de violência institucional, também elencada nas obras em tela, com o agravamento do sofrimento e diminuição da procura de estabelecimentos que, em tese, seriam destinados a proteção e ao acolhimento. Em Saúde de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais: da Formação Médica à Atuação Profissional, Negreiros et al (2019) apresentam médicos de atenção básica que têm discursos discriminatórios. Um médico afirma que não é possível tratar travesti como pessoa normal, pois a considera uma pessoa de alto risco. Há, ainda, uma forma de relacionar a população às infecções sexualmente transmissíveis (ISTs). Tanto os gestores quanto os médicos compactuam com essa visão, como na fala de um médico: “Não dá pra não associar esse público às DST, como a aids mesmo.” (NEGREIROS et al., 2019, p. 28). O texto de Negreiros et al. (2019) contribui com essa percepção, visto que, em relação ao nome social, um médico relatou que pode causar confusão na Unidade Básica de Saúde e na consulta e assim, apresentando desconhecimento sobre a importância do direito. Outro ponto que se faz necessário citar é uma regularidade discursiva nos artigos. Tanto os médicos quanto os gestores de saúde colocam-se em uma posição de isenção de responsabilidade e culpabilizam os sujeitos pelos preconceitos que são submetidos. Destacam-se, aqui, dois fragmentos que expressam este aspecto: “O preconceito e a discriminação vêm por parte da própria população, que já chega aqui se sentindo excluída e discriminada; sem motivo, vem com expressões agressivas com a equipe, sem nenhuma situação de discriminação e exclusão” e “O preconceito é próprio deles, não é da equipe, de jeito nenhum! Eles já andam traumatizados. Alguns não se aceitam, outros a família abandona, não arrumam trabalho por causa do jeito deles. É um público fragilizado!” (NEGREIROS et al., 2019, p. 29). A nomeação da pastora evangélica Damares Alves para o Ministério das Mulheres, da Família e dos Direitos Humanos representou um retrocesso para os direitos da população LGBT, para a população indígena e para as pessoas vivendo com HIV/aids. O novo ministério se recusou a adicionar a população LGBT como um grupo protegido pelo seu governo, declarando que políticas de diversidade ameaçam a família brasileira (Montenegro et al., 2019). Observa-se nas falas de Damares ideias que reforçam os estereótipos de gênero e dificultam o trabalho das políticas públicas voltadas para a população LGBT. Esse posicionamento conservador é observado na primeira declaração da ministra: “Meninas vestem rosa, e meninos vestem azul”, afirmando que “não haverá mais doutrinação de gênero para as crianças e adolescentes do Brasil” (Montenegro et al., 2019). Além disso, o atual presidente da República, Jair Bolsonaro, já afirmou publicamente ser homofóbico, declarando que preferia ver seu filho morto em um acidente do que ser gay. O governo federal, aliado ao Congresso mais conservadordesde o período do regime militar, pode comprometer os direitos da população LGBT no Brasil, país com maior índice de homicídios LGBTfóbicos e considerado o mais perigoso para as pessoas transgêneras do mundo (Montenegro et al., 2019). Enquanto a tendência mundial é de queda do crescimento dos casos de HIV/aids, o Brasil segue o rumo oposto e tem um aumento nos casos registrados, principalmente entre homens jovens que fazem sexo com outros homens, tal como destacam Montenegro et al. (2019). É importante ressaltar que o risco e a vulnerabilidade dos homossexuais femininos e masculinos com relação à infecção pelo HIV são resultado da falta de informação, do preconceito e do grande estigma social que recai sobre essa população (Santos et al., 2015). O atual governo também tem representado retrocessos nas políticas de combate ao HIV. Em janeiro de 2019, o governo de Bolsonaro censurou um manual, desenvolvido pelo Departamento Nacional de Vigilância, Prevenção e Controle de Doenças Sexualmente Transmissíveis, HIV/aids e Hepatites Virais (DDAHV), que abordava a saúde dos homens transgêneros, incluindo estratégias de redução de danos (por exemplo, necessidade de evitar seringas ou agulhas ao usar hormônios). De acordo com o Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, a política de HIV/aids não deve desrespeitar a instituição familiar (Montenegro et al., 2019). Os posicionamentos atuais do governo se mostram em desacordo com os eixos da Resolução n. 26 (2017), que prevê: I − Acesso da população LGBT à atenção integral à saúde; II − Promoção e vigilância em saúde; III − Educação permanente, educação popular em saúde e comunicação; IV − Mobilização, articulação, participação e controle social; V − Monitoramento e avaliação das ações de saúde para a população LGBT. (p. 2). Mesmo com os avanços da população LGBT no combate à epidemia de HIV/aids, que assolou sobremaneira esse segmento da população na década de 1980, ainda existem ameaças à população LGBT no combate a essa epidemia. Santos et al. (2015) apontam que os movimentos da população LGBT concentraram-se no combate à discriminação e ao preconceito e na prevenção da incidência no vírus, tanto para a própria comunidade quanto para a população geral. Os autores pontuam que, além do combate à homofobia, o combate à epidemia de HIV/aids contribuiu para a consolidação desses grupos, alvos de grande estigma social e de falta de informação. Para que seja possível efetivar a mudança proposta pela Política Nacional de Saúde Integral LGBT e proporcionar o correto atendimento à população em sua diversidade, é necessário que os profissionais de saúde passem por revisão de seus pensamentos e posturas éticas. Os códigos de ética de profissões da saúde devem ser observados em suas pontuações enfáticas sobre a não discriminação nos atendimentos. A imposição da heterocissexualidade como o comportamento sexual padrão pode contrariar o princípio da autonomia, uma vez que limita as possibilidades de autodeterminação do usuário, obrigando-o a se submeter a padrões externos de retidão. Uma das formas de promover as mudanças necessárias nos serviços de saúde perpassa pelo questionamento da heterossexualidade como a única possibilidade aceitável de orientação sexual, buscando abarcar as especificidades dos diversos segmentos populacionais (Santos et al., 2015). Os espaços institucionalizados devem ser ocupados por representantes da população LGBT, de forma a exercer-se o controle social no SUS. Essa dinâmica se dá pelo contato com gestores dos níveis municipais, estaduais e federais para a propositura de políticas novas e acompanhamento da implementação das existentes. A vulnerabilidade e a exposição aos riscos desse grupo social fazem com que seja necessário maior afinco nas pressões feitas (Silva et al., 2017). A Lei n. 8.080, de 1990, que instituiu o SUS, no Capítulo II, artigo 7º, define a participação comunitária enquanto um dos princípios do Sistema ali detalhado. O Estado Brasileiro reconhece a participação social enquanto fator potente e necessário de enfrentamento às desigualdades características de nossa sociedade, de forma a fortalecer a democracia (Brasil, 2013). CONSIDERAÇÕES FINAIS O artigo teve como foco apresentar uma revisão de literatura sobre a violência LGBTs. Destacamos preconceitos velados e explícitos, violências caracterizadas como “crimes de ódio” por unicamente sua orientação homossexual. Quanto as políticas públicas, elas continuam sendo acatadas por meio dos movimentos LGBT em reuniões e assembleias organizadas com o intuito de fazer valer as leis que já estão em vigor e acabar de vez com a violência contra essa população no Brasil. Quanto ao conceito de homofobia, tratá-la como doença, reforça o conceito patológico. Conclui-se que o padrão das violências se assemelha nas pesquisas encontradas, sobressaindo as agressões psicológicas, seguidas das físicas, com notória diferenciação entre as categorias que compõem a população LGBT, destacando-se as praticadas contra travestis e transexuais. Nesse cenário preocupante, caracterizado por relatos de violência, com assustadores níveis de crueldade na prática dos crimes, e a normalização das condutas discriminatórias, faz- se necessário o aprofundamento dos estudos sobre o tema, para a necessária a compreensão da dinâmica dos delitos praticados contra a população LGBTs, para implementação de medidas preventivas e coercitivas, tendo em vista o fortalecimento da comunidade com o consequente enfrentamento necessário ao combate da violência. É preciso a penalização aos agressores homofóbicos e resolutividade dos registros, pois dessa forma, será possível estabelecer medidas mais eficazes no combate aos crimes de intolerância de modo geral. 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