Buscar

Resumo - C GEERTZ - Uma descrição densa

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 6 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 6 páginas

Prévia do material em texto

Uma descrição densa: por uma teoria interpretativa da cultura – Clifford Geertz
I. Certos conceitos e ideias surgem com tremendo impacto no âmbito intelectual e científico, de maneira que, a princípio, são utilizados largamente, com todos os propósitos possíveis, sendo vistas diversas extensões, generalizações e derivações. Após um tempo, eles se tornam parte de um amplo arcabouço conceitual e as altas expectativas cessam a um nível de maior equilíbrio, de maneira que se tenta aplica-los, até mesmo expandi-los, mas quando não é possível, desiste-se. Segundo Clifford Geertz, assim foi para o conceito de Cultura, entorno do qual surgiu e ganhou fôlego o trabalho antropológico, o qual tem sido feito no sentido de “limitar, especificar, enfocar e conter” seu sentido. O autor acredita que um conceito de cultura dessa forma pode não somente assegura-lo a devida importância, mas também torna-lo teoricamente mais poderoso, ao invés de debilitá-lo, como é o caso de um conceito muito amplo. A partir disso, apresenta uma profusão de entendimentos acerca do que é cultura e, acreditando ser necessário escolher um caminho, afirma que a perspectiva por ele adotada é aquela semiótica. O autor entende, assim como Max Weber, que o homem está amarrado em teias de significados por ele mesmo tecidos e que a cultura é, portanto, não somente essas teias de significados, mas também sua análise. Trata-se de uma perspectiva de abordagem interpretativa, à procura do significado, ao contrário de “uma ciência experimental em busca de leis” gerais (p.4).
II. A prática realizada pela Antropologia é a Etnografia, a qual, para além de uma metodologia de trabalho, é uma forma de conhecimento, é o empreendimento de técnicas, procedimentos e esforço intelectual em prol de uma descrição densa, que vá além da superfície dos gestos enquanto meros atos casuais, e sim, como dotados de significado. O que os olhos do antropólogo procuram encontrar é “uma hierarquia estratificada de estruturas significantes em termos das quais” as ações humanas são produzidas, percebidas e interpretadas, e sem as quais essas ações de fato não existiriam (p.5). Entretanto, cabe lembrar que há um conjunto de estruturas superpostas de inferências e implicações através das quais o pesquisador deve mergulhar. Assim, a análise requer a escolha entre as estruturas de significação e a determinação de sua base social e de sua importância (p.7). Por isso, o etnógrafo faz uma descrição densa, pois enfrenta “uma multiplicidade de estruturas conceituais complexas, muitas delas sobrepostas ou amarradas umas às outras, que são simultaneamente estranhas, irregulares e inexplícitas, e que ele tem que, de alguma forma, primeiro apreender e depois apresentar” (p.7).
III. A cultura é tida como um documento de atuação, sendo, portanto, pública, pois o significado é público; ela não existe na cabeça das pessoas ou tem uma identidade oculta. O comportamento humano é visto como uma ação simbólica, devendo o pesquisador indagar qual é a sua importância, evitando reduzir o conceito de cultura a um padrão de comportamentos variáveis a depender da comunidade estudada ou reificá-lo enquanto uma realidade “superorgânica”, o que poderia levar a tomar descrições superficiais por densas.
IV. A etnografia trata-se de uma experiência pessoal, que requer do antropólogo que ele tente formular a base na qual imagina se situar, não na expectativa de se tornar nativo ou copiá-los, mas procurando não simplesmente falar por eles, mas conversar com eles. Um dos objetivos principais da Antropologia é visto como o alargamento do universo do discurso humano (p.10). 
	“Como sistemas entrelaçados de signos interpretáveis (...), a cultura não é um poder, algo ao qual podem ser atribuídos casualmente os acontecimentos sociais, os comportamentos, as instituições ou os processos; ela é um contexto, algo dentro do qual eles podem ser descritos de forma inteligível – isto é, descritos com densidade” (p.10). “Procurar o comum em locais onde existem formas não-usuais ressalta não, como se alega tantas vezes, a arbitrariedade do comportamento humano (...), mas o grau no qual o seu significado varia de acordo com o padrão de vida através do qual ele é informado. Compreender a cultura de um povo expõe a sua normalidade sem reduzir sua particularidade” (p.10). 
	O fazer antropológico, a interpretação antropológica acerca dos sistemas simbólicos de outros povos deve ser orientada pelos atos humanos. Além disso, as descrições das culturas não partem da realidade que descrevem, pois, sendo antropológicas, produzidas pelo antropólogo, “partem de um sistema em desenvolvimento de análise científica” (p.11). As produções decorrentes são elas mesmas interpretações antropológicas, por natureza distintas das interpretações em primeira mão feitas pelos nativos, portanto, uma ficção, uma fabricação, no sentido de que são construídas pela interpretação, pela imaginação do pesquisador através do contato com as vidas de outros estranhos. Assim, a linha entre a representação e o conteúdo substantivo é, segundo o autor, intraçável, o que poderia ameaçar a objetividade do conhecimento antropológico.
V. Segundo o autor, é através do fluxo do comportamento, da ação social, que as formas culturais encontram articulação e, assim, os sistemas de símbolos dos nativos podem ser acessados empiricamente através da inspeção de acontecimentos. Assim, nega a ideia de cultura como um sistema puramente simbólico que, isolando seus elementos, suas relações internas, seria possível caracterizar todo o sistema de forma global, enquanto uma entidade abstrata. Além disso, a coerência não pode, segundo ele, ser usada como teste de validade de uma descrição cultural, pois a força das interpretações não pode repousar “na rigidez com que elas se mantêm ou na segurança com que são argumentadas” (p.13). A descrição antropológica constrói uma leitura do que acontece, exigindo, assim, que se descubra o que significa toda a trama descrita, sua interpretação, em prol de uma descrição densa. 
	A interpretação antropológica consiste em “traçar a curva de um discurso social; fixá-lo numa forma inspecionável” (p.13). Isso equivale a dizer que o etnógrafo “inscreve” o discurso social, fixando-o em um acontecimento passado que pode ser consultado novamente. Assim, cabe notar que não se trata de inscrever o discurso social bruto, o acontecimento como acontecimento, trata-se de fixar o significado do que foi dito ao etnógrafo, daquela pequena parcela do qual os informantes levaram o pesquisador a compreender. “A análise cultural é (ou deveria ser) uma adivinhação de significados, uma avaliação das conjeturas, um traçar de conclusões explanatórias a partir das melhores conjeturas e não a descoberta do Continente dos Significados e o mapeamento da sua paisagem incorpórea” (p.14).
VI. Segundo Geertz, a descrição etnográfica possui quatro características: “ela é interpretativa; o que ela interpreta é o fluxo do discurso social e a interpretação envolvida consiste em tentar salvar o ‘dito’ num tal discurso da sua possibilidade de extinguir-se e fixá-lo em formas pesquisáveis” (p.15); ela é microscópica. Partindo de um extenso conhecimento sobre assuntos muito pequenos, sobre uma pequena comunidade, o antropólogo aborda interpretações mais amplas e abstratas, grandes realidades, como questões de poder e trabalho. É nesse contexto que tais conceitos assumem formas domésticas em contextos caseiros, uma vantagem para o etnógrafo. Entretanto, o estudo de pequenas comunidades não pode ser tomado por si só como correspondente à essência de sociedades nacionais, o que se confirma no entendimento de que “o locus de estudo não é o objeto de estudo” (p.16), pois o antropólogo não estuda determinada aldeia, mas em determinada aldeia.
	Por outro lado, a noção de “laboratório natural” é por ele rejeitada por ser uma falsa analogia, uma vez que os parâmetros não são manipuláveis, além de levar à ideia de que os dados etnográficos são mais puros ou elementares do que outros produzidos pordiferentes pesquisas sociais. Assim, entende que as produções etnográficas, seus dados, seus achados, não são privilegiados, mas particulares: sempre uma nova variação na forma de vida humana, nada mais, nada menos. 
	A relevância geral das etnografias é “sua especificidade complexa, sua circunstancialidade” (p.16) e os megaconceitos caros às Ciências Sociais atuais, como a modernização e o conflito, “podem adquirir toda espécie de atualidade sensível que possibilita pensar não apenas realista e concretamente sobre eles, mas, o que é mais importante, criativa e imaginativamente com eles” (p.17). “O problema metodológico que a natureza microscópica da etnografia apresenta (...) deverá ser solucionado – ou tentar sê-lo de qualquer maneira – através da compreensão de que as ações sociais são comentários a respeito de mais do que elas mesmas; de que de onde vem uma interpretação não determina para onde ela poderá ser impelida a ir. Fatos pequenos podem relacionar-se a grandes temas, (...) porque são levados a isso” (p.17). 
VII. A dificuldade da abordagem interpretativa, não só em Antropologia, mas em outros campos, é que ela tende a resistir à articulação conceitual, levando os pesquisadores a apenas insinuar teorias, pois, segundo Geertz, falta-lhes o poder de expressá-las. Então, apresenta como primeira caraterística da teoria da interpretação cultural sua necessidade de permanecer próxima de seu terreno de estudo, diferente de outras abordagens e ciências que podem caminhar para maior abstração imaginativa. Essa situação tem a inerente consequência de uma tensão entre a necessidade de penetrar e apreender um universo não-familiar de ação simbólica e as exigências do avanço técnico na teoria, a necessidade de analisar. Assim é que os estudos não buscam, e não podem buscar, a comprovação de teoremas ou a criação de novos, construindo-se uns sobre os outros, tendendo mais a aprofundar-se nos mesmos temas, uma vez que melhor informados e conceitualizados. Desse modo, as formulações teóricas acabam por se tornar tão próximas de suas interpretações que dificilmente fazem sentido fora delas, pois, não sendo gerais, tendem a poder ser afirmadas em conjunto com suas aplicações. “(...) Aqui a tarefa essencial da construção teórica não é codificar regularidades abstratas, mas tornar possíveis descrições minuciosas; não generalizar através dos casos, mas generalizar dentro deles” (p.18). Enfim, segundo o autor, no estudo da cultura, os significantes são os atos simbólicos ou seus conjuntos, e o objetivo é a análise do discurso social, de forma que a teoria é usada para investigar a importância não-aparente das coisas (p.18).
	A segunda característica da teoria cultural apresentada é que ela não é profética, o que levou à má compreensão de que isso significaria que a interpretação cultural se dá apenas post facto, quando, na verdade, espera-se que o arcabouço teórico a partir do qual foi feita uma interpretação seja capaz de render interpretações defensáveis a partir do surgimento de novos fenômenos sociais. Trata-se, aqui, de diferenciar a descrição densa, a inscrição, de diagnose, de especificação. “Nossa dupla tarefa é descobrir as estruturas conceituais que informam os atos dos nossos sujeitos, o ‘dito’ no discurso social, e construir um sistema de análise em cujos termos o que é genérico a essas estruturas, o que pertence a elas porque são o que são, se destacam contra outros determinantes do comportamento humano. Em etnografia, o dever da teoria é fornecer um vocabulário no qual possa ser expresso o que o ato simbólico tem a dizer sobre ele mesmo – isto é, sobre o papel da cultura na vida humana” (p.19). Assim, uma gama de conceitos acadêmicos é mobilizada na tentativa de tirar grandes conclusões a partir de fatos simples, porém profundamente entrelaçados. Trata-se de “(...) apoiar amplas afirmativas sobre o papel da cultura na construção da vida coletiva empenhando-as exatamente em especificações complexas. (...) É um argumento no sentido de que remodelar o padrão das relações sociais é reordenar as coordenadas do mundo experimentado. As formas da sociedade são a substância da cultura” (p.20).
VIII. Partindo de uma abordagem semiótica da cultura, a análise cultural se torna essencialmente incompleta, ainda mais quanto mais profunda for, de maneira que as afirmativas mais marcantes são as que têm a base mais frágil. Assim, a etnografia se mostra fundamentalmente contestável e o progresso da antropologia interpretativa se dá menos pelo consenso e mais pelo refinamento do debate. Nesse sentido, a posição de Geertz tem sido a de “tentar resistir ao subjetivismo, de um lado, e ao cabalismo de outro, tentar manter a análise das formas simbólicas tão estreitamente ligadas quanto possível aos acontecimentos sociais e ocasiões concretas, o mundo público da vida comum, e organizá-la de tal forma que as conexões entre as formulações teóricas e as interpretações descritivas não sejam obscurecidas por apelos à ciências negras (mágicas)” (p.21). Pois “na busca de tartarugas demasiado profundas, está sempre presente o perigo de que a análise cultural perca contato com as superfícies duras da vida – com as realidades estratificadoras políticas e econômicas, dentro das quais os homens são reprimidos em todos os lugares – e com as necessidades biológicas e físicas sobre as quais repousam essas superfícies. A única defesa contra isso e, portanto, contra transformar a análise cultural numa espécie de esteticismo sociológico é primeiro treinar tais análises em relação a tais realidades e tais necessidades” (p.20).

Continue navegando