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1CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 EDIÇÃO ESPECIAL COM MUITO MAIS CONTEÚDO 2 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 GESTÃO SEGUINDO NA LUTA - PELO FORTALECIMENTO DA CATEGORIA EM DEFESA DO PROJETO ÉTICO-POLÍTICO (2014-2017) Sede (BH) Presidente: Leonardo David Rosa Reis Vice-presidente: Jefferson Pinto Batista 1ª Secretária: Viviane Arcanjo de Oliveira 2º Secretário: Douglas Alves 1º Tesoureiro: Maykel Marinho Calais de Araújo 2ª Tesoureira: Marisaura dos Santos Cardoso Conselho Fiscal Débora Calais Oliveira Correa Thiago Prisco Silva Ana Maria Arreguy Mourão Suplentes Daniela Patrícia Miranda Rezende Gustavo Henrique Teixeira Simone Gomes da Silva Janaína Andrade dos Santos Sandra Mara Teixeira de Castro Ana Maria Gomes de Souza Bertelli Danielle Vassalo Cruz Marília Soares Nascimento Ricardo Silvestre da Silva Seccional Juiz de Fora Coordenadora: Raquel Mota Dias Gaio Secretária: Vanêssa Sales Alves Tesoureiro: Geovane Martins Gonçalves Suplentes Jhony Oliveira Zigato Susana Maria Maia Ana Luíza Avelar de Oliveira Seccional Montes Claros Coordenadora: Rosilene Aparecida Tavares Secretária: Viviane de Castro Afonso Tesoureira: Mariana Abiachell Medeiros Suplentes Denise Veloso Pinto Grace Aparecida Sarmento Rodrigues Seccional Uberlândia Coordenadora: Ana Lúcia Martins Kamimura Secretária: Valdirene Beatriz Cardoso Tesoureira: Luana Braga Suplentes Ana Carolina Pontes Ros Gláucia de Almeida Ramos Cleidislene Conceição Silva O CRESS-MG, consciente das questões sociais e ambientais, utiliza na impressão deste material papéis certificados pela FSC (Forest Stewardship Council). A certificação FSC é uma garantia de que a matéria-prima advém de uma floresta manejada de forma ecologicamente correta, socialmente adequada e economicamente viável. Ficha técnica Comissão de Comunicação (2014-2017) Ana Carolina Ros, Douglas Alves, Geovane Gonçalves, Leonardo David Rosa Reis, Marcela Viana, Marisaura dos Santos Cardoso, Rosilene Tavares e Thiago Alcântara Comissão de Comunicação (2011-2014) Carla Alexandra Pereira, Cristiano Costa de Carvalho, Janaína Andrade dos Santos, Leonardo David Rosa Reis, Marcela Viana, Marisaura dos Santos Cardoso, Raquel Mota Dias Gaio, Renato Mateus de Santana e Thiago Alcântara REVISTA CONEXÃO GERAES Tiragem: 17.000 exemplares Coordenação: Comissão de Comunicação Projeto gráfico e diagramação: Thiago Alcântara Ilustração de capa e verso: Rafael de Castro Jornalista responsável: Marcela Viana (17.386 MG) Assessor de Comunicação: Thiago Alcântara Assessora Adjunta de Comunicação: Marcela Viana comunicacao@cress-mg.org.br CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL DE MINAS GERAIS (CRESS-MG) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) R454 CDD 362.1 CDU 36 Revista Conexões Geraes/ Conselho Regional de Serviço Social de Minas Gerais. v. 3, n.5 (2014). – Belo Horizonte: CRESS 6° Região, 2014. - Semestral ISSN: 2358-839X 1. Serviço Social 2. Politicas sociais. 3. Cidades. I. Conselho Regional de Serviço Social de Minas Gerais. II Titulo 3CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 Cara/o assistente social, O III Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais reuniu mais de mil profissionais e estudantes, nos dias 7, 8 e 9 de junho de 2013, em BH, marcando a história do Serviço Social de Minas Gerais. Os debates realizados instigaram e ao mesmo tempo alentaram a todos que participaram do evento. As palestras proferidas por estudiosos da área contribuíram para solidificar e dar consistência teórica às discussões que o Serviço Social realiza na atualidade. Esta publicação traz algumas das reflexões realizadas pelos palestrantes convidados. A nossa intenção é, mais uma vez, registrar este momento apresentando alguns dos principais artigos que sintetizaram os debates realizados. Tais discussões deixaram ricas e valorosas reflexões sobre alguns dos temas que compõem o arcabouço teórico desta profissão. Sabemos que existem muitas descobertas que precisam ser realizadas, muitos desafios a serem superados, como as mudanças socioculturais e econômicas que tanto desafiam nossa profissão em seu cotidiano de trabalho, impelindo-a na busca pela formação continuada e pelo adensamento do seu arcabouço teórico-político e do seu projeto profissional. Por isso, esperamos que estas reflexões continuem a nos instigar cada dia mais, tornando fecundas as nossas ações, tendo em vista que o ponto de partida é a defesa pela afirmação e materialização dos direitos sociais, a luta contra todas as formas de exploração e opressão e a concretização de um desenvolvimento social que possa contemplar a emancipação dos indivíduos e o princípio da liberdade com equidade e justiça social. Desejamos que você tenha uma excelente leitura e que continuemos com os ânimos revigorados, na certeza que estamos trilhando caminhos desafiadores e profícuos no que se refere ao acúmulo e solidez do nosso patrimônio intelectual, do nosso projeto profissional e das nossas bandeiras de luta. Boas reflexões a todas/os. GESTÃO SEGUINDO NA LUTA: PELO FORTALECIMENTO DA CATEGORIA EM DEFESA DO PROJETO ÉTICO-POLÍTICO (2014-2017) Índice Configurações da crise capitalista e incidências no mundo do trabalho – página 6 Carlos Montaño A ideologia neodesenvolvimentista e as Políticas Sociais no Brasil: apontamentos sobre crise e hegemonia na periferia do capitalismo – página 15 Cézar Henrique Maranhão Política social no Brasil: notas e críticas a partir da teoria marxista da dependência – página 25 Rodrigo de Souza Filho Em defesa da qualidade da formação e do trabalho profissional: materialização do projeto ético-político profissional em tempos de barbárie – página 34 Yolanda Aparecida Demetrio Guerra Serviço Social no campo sociojurídico: possibilidades e desafios na consolidação do projeto ético-político profissional – página 41 Eunice Teresinha Fávero e Valéria Forti Serviço Social, Projeto Profissional e Prática na Saúde – página 49 Fátima de Maria Masson Políticas educacionais e contribuições do Serviço Social – página 56 Eliana Bolorino Canteiro Martins Questão urbana e direito à cidade: reflexões sobre o trabalho social na política urbana – página 63 Tânia Maria Ramos de Godoi Diniz Questão urbana e Serviço Social – página 70 Teresa Hilda Costa Controle social e planejamento urbano participativo: contribuições do Serviço Social – página 74 Mônica Abranches Apresentação 4 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 Esta publicação refere-se às valiosas reflexões dos assistentes sociais suscitadas por ocasião do III Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais organizado pelo CRESS-MG, realizado em BH, em junho de 2013. Este encontro teve como eixo central o debate sobre as "expressões socioculturais da crise do capital e suas implicações para a garantia dos direitos sociais". O III Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais reuniu mais de mil profissionais e estudantes com a finalidade de adensar o debate e as análises sobre a sociedade imersa na égide capitalista, suas crises, os impactos para o mundo do trabalho e, estrategicamente, os desafios para o exercício profissional desta categoria profissional. Uma categoria que se distingue e é reconhecida por suas mentes inquietas, corações apaixonados e espírito lutador. Oportunamente, registram-se as contribuições de todos os profissionais que se dedicaram à produção de trabalhos e dos conferencistas que, de forma extremamente elucidativa e crítica, trouxeram os fundamentos para um debate profícuo sobre o mote em questão, reafirmando a direção teórica, metodológica, ética e política da profissão. O objetivo aqui é instigar a leitura das ricas análises estruturadas pelos autores nos artigos, que se dedicaram à arte de interpretar a dinâmica do cotidiano societário, marcada pela contradição de classes. Assim, foram elencados eixos temáticos, no esforço deabarcar os conteúdos elaborados pelo conjunto da categoria, que contribui de forma relevante para adensar o conhecimento nas diversas áreas de intervenção profissional. É importante destacar o alinhamento dos diversos autores e conferencistas com a perspectiva teórica e metodológica orientada pela tradição marxista. Destacam-se as palavras de Carlos Montaño nesta ocasião: “O marxismo entende que somente as lutas de classe e as mudanças na correlação de forças, orientadas pela emancipação política e humana, podem enfrentar as sequelas do desenvolvimento capitalista e suas particularidades no momento de crise”1. Partindo deste entendimento, o leitor encontrará no material aqui disponível, elaborações com aprofundamentos sobre as questões estruturais do modo de produção capitalista e a centralidade do trabalho enquanto categoria fundamental de análise da realidade social, sempre acompanhada de forte componente ideológico que perpassa a compreensão e a explicação das crises cíclicas do capital. O modo de produção capitalista apresenta uma contradição central entre a socialização da produção e a apropriação privada do seu produto, o que conduz a concentração do capital, expulsão constante e paulatina da força de trabalho substituída por maquinaria e tecnologia, e pauperização da classe trabalhadora. Sem dúvida, a crise do capital faz parte da dinâmica do desenvolvimento capitalista e não é antagônica a ele. No cenário de crise contemporânea, o capital busca reestruturar-se orientado pela estratégia da lógica neoliberal e da programática hegemonia financeira. Observe que a base mais profunda do que chamamos de QUESTÃO SOCIAL é resultado do desenvolvimento do modo de produção capitalista. A economia capitalista cresce e ao mesmo tempo persistem as contradições dos polos de acumulação versus pobreza, exploração, privações, desemprego, flexibilização do trabalho etc, e nestes campos pulsa a atuação profissional dos assistentes sociais. Enquanto arena de mediação entre o capital e o trabalho, as políticas sociais, em suas diversas áreas, se reafirmam como necessidade à reprodução do capital. Com esta clareza e de forma crítica, os autores buscaram desenvolver, a partir da dimensão investigativa da profissão, análises aprofundadas e complexas sobre a Prefácio 5CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 realidade social e o papel do Estado na efetivação dos direitos sociais. São diversas as produções no campo das proteções e políticas sociais, com destaque para as reflexões estruturadas em relação à assistência social, saúde, educação, previdência social, habitação, socioambiental, sistema prisional, cultura, planejamento urbano, direitos humanos, financiamento. Ocupam-se também das reflexões que perpassam o judiciário e suas especificidades. Fruto do amadurecimento intelectual da profissão, são expressivas as elaborações que tratam da formação e do exercício profissional dos assistentes sociais, com ênfase nas incursões sobre a materialização do projeto ético-político profissional em tempos de barbárie. As contribuições dos conteúdos sobre o método, a teoria social crítica (materialismo histórico-dialético), as tecnologias do trabalho e a imagem social da profissão, nos chamam ao desafio constante de aprimoramento da práxis profissional, orientada pelos alicerces de base crítica. Destacam-se também as produções referentes às temáticas intrínsecas ao exercício profissional em seus diversos espaços sociocupacionais, como a gestão, intersetorialidade, pobreza, desigualdade, participação e controle social, famílias e os ciclos de vida, adoção, gênero, propriedade privada da terra, racismo, violência e violações de direitos, sindicalismo e cidadania. Estes trabalhos delineados sobre as diversas áreas e temáticas demonstram a riqueza de escopo e amplitude dos campos de atuação e reflexão dos profissionais do Serviço Social. Justifica-se deste modo, a importância da direção teórico-metodológica, o significado da expressão ético-política hegemônica da categoria e o compromisso destes trabalhadores na materialização técnico-operativa frente às multifacetadas manifestações da questão social. Como poderá observar o leitor, os textos aqui apresentados representam a maturidade, a solidez e a sobriedade da profissão que se vincula de forma explícita a um projeto societário que propõe a ruptura com a lógica da sociedade capitalista e que evoca novas bases societárias alicerçadas em parâmetros de uma emancipação humana e política conforme argumentos gramiscianos. Arrisca-se, diante do exposto, atribuir a esta categoria qualidades e adjetivos que condensam seus compromissos humanos e profissionais. Suas mentes inquietas por serem desafiadas a todo momento pelas determinações históricas que configuram as expressões da questão social, tendo como perspectiva a dimensão da totalidade. De corações apaixonados que impulsionam a intervenção profissional compreendendo as subjetividades coletivas e buscando alternativas para o fortalecimento da classe trabalhadora. E espírito lutador por considerar as correlações de forças e as contradições sociais e se apropriar de suas multifacetadas dimensões para contribuir com as transformações societárias. Por fim, reafirmo a gratidão por fazer parte desta história e poder colaborar com a categoria através desta breve elucidação elaborada para ensejar os conteúdos desta publicação. À gestão 2011-2014 do CRESS-MG e a cada um dos trabalhadores desta entidade, expresso minha admiração e respeito pelo esforço permanente e vigoroso em defesa da hegemonia do projeto ético-político desta categoria que nos orgulha e engrandece. Desejo a todas/os as/os companheiras/os uma ótima leitura! No suave inverno de Belo Horizonte, 2014. Fabrícia Cristina de Castro Maciel Coordenadora da Escola de Serviço Social do Centro Universitário UNA. Conselheira do CRESS-MG na Gestão “Compromisso e Luta: Em Defesa da Categoria e do Nosso Projeto Ético-Político” (2011-2014) NOTAS 1 - Conferência de abertura realizada no primeiro dia do III Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais, em 07/06/2013, com o tema “Configurações da crise capitalista e incidências no mundo do trabalho”. 6 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 1 - INTRODUÇÃO Vivemos em tempos onde as afirmações sobre o “fim da centralidade do trabalho”, e a “diversidade das crises” tornaram-se lugares comuns. Assim: - o trabalho já não forma identidades nem congrega adesões; - o trabalho assalariado deve ser substituído pelo empreendedorismo; - a crise atual é uma crise do emprego, uma crise do Estado bem-feitor (fiscal e de governança), uma crise da produção fordista e uma crise de ideologias (todas desvinculadas umas das outras e da estrutura social). Trataremos aqui o trabalho em contexto de crise, seus fundamentos e rebatimentos e impacto no próprio processo e condição de trabalho e nas lutas de classes. A análise do processo de transformação nas relações e nas condições de trabalho, na relação capital- trabalho, tanto no processo de produção, como no desenvolvimento das lutas de classes, pressupões a clara compreensão dos fundamentos do Modo de Produção Capitalista, na caracterização da sua fase monopolista, e do atual contexto de crise1. Assim, tendo a crise atual do capital causas fundamentalmente endêmicas, e sendo uma crise eminentemente estrutural, geral e cumulativa, o projeto construído hegemonicamente nos anos pós-45, que conformou o que Harvey (1993) denominou por “regime de acumulação fordista/ keynesiano”, onde os interesses do capital são “permeados” por demandas trabalhistas, no que alguns autores chamaram de “compromisso” ou “pacto keynesiano”, parece agora inteiramente desnecessário, ineficiente e até negativo para o capital (e crise e sob o comando financeiro). Aquele regime (“fordista/keynesiano”) deve ser substituído poruma nova estratégia hegemônica. Uma estratégia que anule as conquistas trabalhistas e que permita a super-exploração do trabalho como um todo; uma estratégia que altera as condições do contexto anterior criando, no pós-70, um novo “regime de acumulação” que Harvey denomina de “flexível”: a ofensiva neoliberal. Essa nova estratégia sustenta-se em três pilares fundamentais necessariamente articulados, no atual contexto de crise e mundialização do capital: a) a ofensiva contra o trabalho e suas formas de organização e lutas, b) a reestruturação produtiva e c) a (contra-)reforma do Estado. Doutor em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ, Rio de Janeiro, 2001). Professor associado e pesquisador da mesma Universidade. Graduado em Serviço Social pela Universidad de la República (UdelaR, Montevidéu-Uruguai, 1989). Realizou estudos de pós-doutorado no Instituto Superior Miguel Torga (ISMT, Coimbra-Portugal, entre 2009 e 2010). Autor dos livros, Microempresa na era da globalização (Cortez, 1997); A natureza do Serviço Social (Cortez, 1998 e 2007); Terceiro Setor e Questão Social (Cortez, 2002 e 2005) e Estado, Classe e Movimento Social (Cortez, 2010). Coordenador da Biblioteca latinoamericana de Servicio Social (Cortez). Professor visitante e conferencista em diversos países da América Latina. Foi membro da Direção Executiva de ALAEITS (2006-2008) e coordenador nacional de relações internacionais da ABEPSS (Brasil, 2008-2010 e 2011-2012). Coordena o Núcleo de Estudos Marxistas sobre Política, Estado, Trabalho e Serviço Social (PETSS/ESS-UFRJ) Carlos Montaño Configurações da crise capitalista e incidências no mundo do trabalho 7CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 Desta forma, o “projeto/processo neoliberal” constitui a atual estratégia hegemônica de reestruturação geral do capital – face à crise, ao avanço tecno-científico e às lutas de classes que se desenvolvem no pós- 70, e que se desdobra basicamente em três frentes: a ofensiva contra o trabalho (atingindo as leis e direitos trabalhistas e as lutas sindicais e da esquerda), e as chamadas “reestruturação produtiva” e “(contra-)reforma do Estado”. 2 - OS IMPACTOS NA CONDIÇÃO DO TRABALHO E NAS LUTAS DE CLASSES 2 - 1 - Os impactos na condição do trabalhador 1. Direitos trabalhistas/salário (no Brasil de hoje) e “Custo Brasil” (valor da F.T.) Costuma-se justificar a redução/precarização dos “direitos trabalhistas” e do salário na necessidade de diminuição do “Custo Brasil” (redução do valor da força de trabalho), o que permitiria aumentar o nível de emprego no país. No entanto, não há relação direta (nem teórica, nem histórica) entre valor da força de trabalho (salários e direitos trabalhistas) e nível de desemprego: a redução/precarização dos direitos trabalhistas não traz diminuição do desemprego, pois este não depende do custo de produção, mas da relação produção/comercialização, oferta/demanda. Muito pelo contrário, quanto mais precário for o salário dos trabalhadores, menos poder aquisitivo terá a população, tendendo a cair o consumo interno, o que tende a levar à diminuição do investimento produtivo - derivando em menor produção e maior desemprego. 2. Direitos trabalhistas/salário (no Brasil de hoje) e relação oferta/demanda de trabalho (fatores econômicos e políticos dessa relação) Observa-se sim, uma relação entre “oferta de força de trabalho” e “oferta de emprego”, ou entre oferta e demanda de trabalho. É a alteração desta relação a que pode incidir na diminuição do desemprego. Tal relação pode ser alterada conforme os seguintes fatores: a) por fatores econômicos - por exemplo: - aumento do consumo, que tende a derivar em aumento da produção, e com ela a maior contratação de força de trabalho, - investimento produtivo/comercial e investimento financeiro, - emprego do trabalho gratuito, voluntário, auto- emprego; b) por fatores políticos – a través da pressão política das classes para: - aprovação/eliminação de Leis Trabalhistas, Políticas e Sociais, - ampliação/redução do Tempo de Serviço (idade de aposentadoria), - ampliação/redução da Jornada de Trabalho (a 35 horas/semanais), - sistema tributário (sobre o patrimônio/riqueza, sobre o trabalho ou sobre o consumo). Todos estes fatores, no Brasil atual, tem sido negativos aos interesses do trabalhador. Vejamos isso: 1) o consumo vem caindo desde 1973 (e com a crise tende a continuar); 2) há fuga de investimento da atividade produtivo/ comercial para a especulação financeira; com isso vem o menor crescimento produtivo e aumento ainda maior do desemprego (o Brasil tem mais de 12 milhões de desempregados); 3) promoção (por motivos econômicos: estratégia contra o desemprego ou para complemento salarial; e ideológicos: “ócio criativo”, “emprendedorismo”, “economia solidária”, “solidariedade social”, “terceiro setor”) do chamado “trabalho voluntário”; na verdade, de trabalho gratuito para o capital, que substitui o trabalho remunerado; 4) as políticas e serviços sociais vêm sofrendo redução do seu financiamento e precarização (acompanhada da focalização); 5) as leis trabalhistas e salários vem sendo precarizadas no mundo inteiro (países centrais e periféricos), até como parte das exigências do FMI para empréstimos e renegociação da dívida externa (ver Gonçalves, 1994, 1999 e Gonçalves e Pomar, 2000). Na década de 90, a renda média real do trabalhador caiu 8%, segundo o IBGE. Segundo relatórios da OIT, nos governos FHC, os três pilares da regulação trabalhistas foram corroídos: contrato (antes por tempo indeterminado, agora com contratos precários), jornada (antes fixa, 8 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 agora flexibilizada pelo banco de horas) e salário (antes amparado por políticas salariais, agora depende da negociação no mercado, cujo resultado tem sido a redução sistemática do salário base, e a participação no lucro e sistemas de premiação à produtividade). Porém, para a continuidade da sua “flexibilização” se prevê a “reforma sindical” como forma de enfraquecer a resistência dos trabalhadores; sendo assim, a “reforma sindical” é a ante-sala da “trabalhista”; 6) o peso da ação sindical tem perdido força, seja pelo seu enfraquecimento interno, seja pela redução de impacto social, seja pela ameaça de desemprego, ou até pelo elevado nível de desemprego; 7) paralelamente a isto, a chamada “Reforma Sindical” (elaborada no atual governo, em concordância com os governos FHC, através do Fórum Nacional do Trabalho - FNT, criado em 2003), ameaça a possibilidade do instrumento de greve perder efetividade (o projeto prevê: o “aviso prévio” - por escrito ao patrão com 72 horas antes da paralisação - ; a manutenção de “serviços essenciais”; a determinação de que a greve não pode causar “prejuízo irreparável ao patrimônio do empregador ou de terceiros”; a permissão de contratação de substitutos para os grevistas etc.). Também o projeto do FNT prevê a exclusão do “princípio do uso da norma mais benéfica aos trabalhadores” (em caso de conflito entre duas leis, prevalece a que mais beneficia o trabalhador), estabelecendo a prevalência do negociado sobre o legislado (num contexto de correlação de forças desfavorável para o trabalhador, principalmente quando a negociação for por empresas ou até individualmente); 8) em contraste com as possibilidades que abre o desenvolvimento tecnológico (automação etc.), que libera tempo de trabalho aumentando a produtividade, nos governos FHC e Lula, temos assistido ao aumento da idade de aposentadoria, aumentando o tempo de serviço, e a idade de aposentadoria. Paralelamente á extensão formal/legal desta idade, os aposentados tendem a ampliar seu tempo de trabalho para garantir uma renda maior que sua aposentadoria; 9) com a única exceção da França, que nos anos 90 reduziu a jornada de trabalho de 40 para 35h/semanais, observamos a tendência mundial (maisexpressiva nos países periféricos) da flexibilização e ampliação da jornada de trabalho - seja pela terceirização e subcontratação, pelo “trabalho informal”, seja pelo novo “trabalho de escravidão por dívida”, ou pela necessidade e complacência do trabalhador para completar seu baixo salário nominal com horas extras, e até, pelo sistema de “banco de horas” (que de fato elimina a lei de 8 horas); 10) O sistema tributário, que não tributa a especulação financeira, a grande riqueza e o patrimônio, que pesa na atividade produtiva, tende cada vez mais a ser direcionado ao consumo. 11) Estímulo ao “primeiro emprego”, como parte das políticas de “geração de emprego e renda”, claramente orientadas como política compensatória ao setor mais empobrecido, não como, a exemplo da política keynesiana, incentivo à produção e ao consumo, impactando ainda na precarização do emprego - o incentivo às cooperativas, às microempresas, ao aprendiz etc., são formas de fornecer ao capital mão de obra barata, mesmo que possam significar uma renda para a população empobrecida. Todos estes aspectos mostram uma realidade muito desfavorável para o trabalhador, na correlação de forças com o capital, em relação aos direitos trabalhistas, salário e condições de contrato e de trabalho. A mudança no direcionamento hegemônico atual, nas dimensões econômica, política, ideológica, são as variáveis para pensar qualquer alteração no rumo atual dos direitos trabalhistas e sociais. Vejamos, sinteticamente, algumas das mudanças (regressivas) nos direitos trabalhistas que foram realizadas no contexto de hegemonia neoliberal no Brasil: a) a Lei n.º 9.601 (de 1998), onde foram ampliadas as possibilidades de contratação temporária e instituído o banco de horas, o que permitiu o tempo de compensação do excesso de jornada para até um ano, sem que haja pagamento de horas extras; b) a desregulação das relações de trabalho no Brasil pós-90 também permitiu ampliar a jornada de trabalho - seja pela terceirização e subcontratação, pelo “trabalho informal”, seja pelo novo “trabalho de escravidão por dívida”, ou pela necessidade e complacência do trabalhador para completar seu baixo salário nominal; 9CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 c) o decreto 2100 (de 1996), em que o Brasil renunciou a Convenção n.º 158 da OIT (que dava garantias ao trabalhador contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa, prevendo, naqueles casos, indenização compensatória); d) a Medida Provisória n.º 1709 (de 1998), que criou o regime de trabalho com jornada de tempo parcial, definindo remuneração proporcional à duração semanal da jornada; e) a Emenda Constitucional n.º 20 (de 1998), que limitou o benefício do salário família aos trabalhadores considerados de baixa renda; f) o Projeto de Lei nº 5.483/01, agora PLC 134/01, (apresentado em outubro de 2001), que altera o artigo 618 da CLT, parte do suposto de que “os instrumentos de negociação coletiva entre sindicato e empresa prevaleçam sobre a lei, salvo em se tratando de preceito constitucional”, eliminando o “princípio do uso da norma mais benéfica aos trabalhadores” (para a qual, em caso de conflito entre duas leis, prevalece a que mais beneficia o trabalhador), estabelecendo a prevalência do negociado sobre o legislado (num contexto de correlação de forças desfavorável para o trabalhador, principalmente quando a negociação for por empresas ou até individualmente); g) em contraste com as possibilidades que abre o desenvolvimento tecnológico (que libera tempo de trabalho aumentando a produtividade), nos governos FHC e Lula temos assistido ao aumento da idade de aposentadoria, e aumentando o tempo de serviço; h) finalmente, o sistema tributário, que não tributa a especulação financeira, a grande riqueza e o patrimônio, que pesa na atividade produtiva, tende cada vez mais a ser direcionado ao consumo, pesando no trabalhador cujo consumo representa o total da sua renda. 2 - 2 - A ofensiva neoliberal contra o trabalho Diversas são as modalidades de combate do capital e do neoliberalismo contra o trabalho, como forma de diminuir e até eliminar qualquer tipo de resistência ao processo de (contra-)reformas neoliberais: a) O primeiro tipo de medidas adotadas pelo capital, na ofensiva neoliberal contra o trabalho, que caracteriza o claro rompimento com o chamado “pacto keynesiano” (ou “pacto populista”, como no Brasil) remete ao enfraquecimento das organizações sindicais e trabalhistas. O capital, e o Estado comandado por governos neoliberais, investem nisto de diversas formas: negando-se à negociação com os trabalhadores em greve; reprimindo qualquer medida de luta dos trabalhadores (seja uma manifestação, seja uma paralisação ou uma greve); dilatando as greves dos trabalhadores, ao não responder nem atender qualquer de suas reivindicações, como forma de quebrar financeiramente o movimento e incluso sua organização sindical. Harvey lembra, como resultado do governo da primeira ministra inglesa, Margaret Tatcher (entre 1979 e 1990), que a atividade de greve caiu para 1/10 do seu nível anterior (2008: 69). b) Um segundo tipo de medidas direciona-se ao desprestígio das lutas e das organizações do trabalhadores perante a opinião pública. Como afirma Mota, “a trajetória política do grande capital no Brasil dos anos 80 e 90, aponta para uma tentativa de construção da sua hegemonia, tendo como instrumento básico a formação de uma cultura marcada pela necessidade de desqualificação das demandas dos trabalhadores, enquanto exigências de classe”, fundamentalmente passando a “idéia de que a crise econômica afeta a sociedade e que, por isso, necessita da colaboração de todos” (1995: 163). Maciçamente o neoliberalismo investe, com a colaboração das empresas de jornalismo (meios de comunicação de massa), na desinformação e na descaracterização das lutas e resistências dos trabalhadores, apresentando-os ora como “baderneiros”, ora como “preguiçosos”, ora como “marajás” ou “privilegiados”, tratando as lutas trabalhistas, que legitimamente opõem-se aos desmontes neoliberais de seus direitos, às privatizações, às precarizações de serviços e políticas públicas, como negativas para a população (ex.: greves dos transportistas, dos trabalhadores da saúde, da educação etc.). Neste processo, inteiramente ideológico, o linguajar ocupa um espaço fundamental: ocupações de terra improdutivas são tratadas como “invasões”; manifestações populares são informadas como “baderna”, como “caos” nas vias publicas; greves nos serviços públicos como “falta de atendimento à população pobre”. c) Finalmente, e facilitado pelos mecanismos anteriores, a ofensiva neoliberal contra o trabalho completa-se com a desregulamentação do mercado 10 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 de trabalho e precarização do emprego. Por um lado, com a enorme expulsão de força de trabalho do mercado de formal trabalho (produto da automação e das crises) amplia-se significativamente o excedente de força de trabalho, ou seja, muitos trabalhadores desempregados para poucos empregos; os efeitos disto são: tendência à queda salarial, perda de poder político dos trabalhadores (ver Marx, 1980: 730-743), atitude individualista e defensiva do trabalhador (ver Mota, 1995). Por outro lado, com a crescente subcontratação ou terceirização, o trabalhador se submete à precarização e esvaziamento dos direitos trabalhistas (desenvolvidos para o trabalhador contratado). Finalmente, com o pretexto de “flexibilizar” as relações de trabalho, mediante (contra-)reformas na legislação trabalhista, o neoliberalismo acomete contra os direitos do trabalhador. Pois bem, se num contexto de expansão capitalista, porém tenso, conflitivo e ameaçador, o capital vê-se obrigado, justamente pelas pressões trabalhistas e lutas de classes, a incorporar demandas dos trabalhadores no interior do seu projeto hegemônico, o queocorre então num contexto de crise e num clima de inibição dessas lutas, de perda de poder sindical, de falta de apoio popular às lutas de sindicatos, de descrença nos instrumentos de lutas por conta de derrotas sucessivas, de pulverização dos trabalhadores, de extinção dos regimes não-capitalistas (do chamado “socialismo real”), onde a alternativa a curto prazo parece ser, não o aumento salarial ou as melhores condições de trabalho, mas o desemprego ou a perda de direitos e a baixa salarial? A mesma crise que obriga o capital a se reestruturar e a diminuir custos de produção, coloca o trabalho numa atitude defensiva. Essa crise se põe como o campo mais fértil para o capital processar a desconstrução e reversão dos ganhos e conquistas trabalhistas e sociais desenvolvidas ao longo da história. Assim, o combate ao trabalho é pressuposto para operar os demais “ajustes” com a menor resistência daqueles que poderiam enfrentar tal processo: os trabalhadores. 2 - 3 - A situação atual das lutas de classes2 Se o capital está em crise; seria isso bom para as lutas dos trabalhadores? Se o capital ingressou numa fase de crise, poderia se concluir que este encontrar-se-ia fragilizado, e que a classe trabalhadora então teria melhores condições de desenvolver sua luta na defesa dos seus interesses? ... À crise capitalista impactaria na correlação de forças entre capital e trabalho, favorecendo esta última? Uma análise superficial poderia nos levar a festejar a crise capitalista, como fundamento de fragilização do capital, e “empoderamento” da classe trabalhadora. Uma análise superficial... e equivocada. Se a crise golpeia o capital, ela impacta profundamente o trabalhador. O efeito da crise se reverte trágica e imediatamente em aumento do desemprego e da pauperização e miserabilidade a ele associadas, em acirramento da exploração capitalista - que visará retomar e/ou ampliar as formas de extração de mais- valia absoluta, como aumento da jornada de trabalho, da idade de aposentadoria, do trabalho escravo- por-dívida etc. - , na perda de direitos trabalhistas conquistados, na precarização de políticas e serviços sociais estatais, e até na perda ou esvaziamento de direitos políticos e civis. Paralelamente a classe trabalhadora, com os efeitos do aumento do desemprego (e do Exército Industrial de Reserva) passa a desenvolver uma atitude mais individualista e defensiva, até aceitando muitas perdas para garantir seu emprego, o que impacta nas lutas dos trabalhadores e nos seus efeitos sociais. A crise capitalista, portanto, longe de beneficiar à sua classe antagônica, precariza, inibe e submete ainda mais o trabalhador e suas lutas, contribuindo até a criar as melhores condições para os ajustes e as (contra-)reformas estruturais necessários para os interesses do capital: o projeto neoliberal. Vejamos alguns desses efeitos reconfigurando as lutas sociais. 1 - A reestruturação produtiva golpeia o trabalhador: os impactos nas condições de trabalho, direitos e salários A reestruturação produtiva (a automação e a consequente substituição da força de trabalho, a subcontratação e a precarização do contrato de trabalho), as privatizações, as reformas da seguridade social, a redução de políticas sociais, todos esses processos derivados do novo projeto hegemônico do capital não ocorreram com ausência de conflitos, de oposição, com aceitação passiva das classes trabalhadoras. 11CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 A questão não é a “ausência” de lutas de classes, derivada de uma suposta superação dos conflitos ou antagonismos entre capital e trabalho; o ponto a analisar é a diminuição do peso político dos trabalhadores no atual contexto e suas possibilidades de defender seus interesses e de enfrentar o novo projeto hegemônico do capital. Como aponta Cueva: “... na realidade esta aparência de passividade [dos trabalhadores] expressa o predomínio interno das forças mais reacionárias” e não a ausência de lutas de classes (1983: 167). Com a crescente complexificação da produção, ocorre uma também maior complexificação das relações sociais, o que paralelamente leva a uma heterogeneização dos setores trabalhadores (ver Harvey, 1993: 143 e ss.; Antunes, 1995: 41 e ss. e 1999: 101 e ss.): operários industriais estáveis, servidores públicos, trabalhadores informais e por conta própria, trabalhadores subcontratados, de micro e pequenas empresas, profissionais liberais, diaristas, trabalhadores imigrantes, camelôs (ver Mattoso, 1995: 110; Morice in Malaguti et alii, 1998: 112 e ss.), numa diversidade cada vez maior. Processo que emoldura a reestruturação produtiva, com impactos nefastos para o trabalhador, é a expulsão da força de trabalho promovida pela automação da produção, substituindo como nunca antes, trabalhadores por maquinaria (apropriada pelo capital). Paralelamente, opera-se a externalização do trabalhador, por via da terceirização, promovido fundamentalmente mediante Programas de Demissão Voluntárias (PDV). O resultado: tendência à queda salarial, à perda de direitos trabalhistas e piores condições de trabalho. 2 - A busca do grande capital por ampliar os lucros em contexto de crise, acirrando a exploração do trabalhador: a tendência à atitude “individual e defensiva” do trabalhador Em função do anterior, e na tentativa de reestruturar as bases da hegemonia burguesa em contexto de crise econômico-política, o capital hegemônico tende a acirrar sua ofensiva contra os capitais mais fracos e contra o trabalho, o que termina por afetar as lutas de classes e seus impactos sociais. Cueva sustenta a tese de que “as crises do capitalismo, por si sós, não fazem mais do que produzir efeitos negativos nos pontos débeis do sistema” (1983: 167); para Mattoso, é o enfraquecimento (financeiro, político e institucional) do Estado que favorece “a aventura neoliberal de desestruturação selvagem do início dos anos 90” (1995: 135); Mota afirma que, “em períodos de crise, há um acirramento da ação ofensiva do capital”, e, “o movimento dos trabalhadores tende a assumir posições defensivas em função da agressão que sofre com a ameaça do desemprego, das perdas salariais” (1995: 180). Mota (1995) caracteriza isso como desenvolvimento de uma cultura da crise. É que, em contextos de crises - de superprodução e superacumulação, para o capital, e de desemprego e subconsumo, para o trabalho - , tanto a tendência à queda da taxa de lucro leva o capitalista a acirrar sua sede de exploração de mais-valia (donde objetiva a redução dos direitos trabalhistas e dos empecilhos à acumulação), quanto a ameaça que pesa sobre o trabalhador, de desemprego, de queda do seu padrão de vida (ver Mattoso, 1995: 77 e ss.), é de tal ordem que ele, individualmente, tende a se preocupar mais por manter, em algum nível, os direitos adquiridos (conquistados historicamente) do que por lutar por um projeto alternativo ou trabalhista, o que o fragiliza na luta/negociação com o capital. Conforme Mota, “os trabalhadores que permanecem no mercado de trabalho tendem a defender, corporativamente, as conquistas obtidas” (1995: 136); assim, Brunhoff entende que os corporativismos, hoje, são, antes de tudo, uma das formas assumidas pela concorrência da crise entre operários, quando falta uma saída coletiva” (in Mota, ibidem). Assim, continua, “a partir de 1989 [no Brasil], há paulatinamente um deslocamento de natureza ideológica na ofensiva do capital e na posição dos trabalhadores que passam a privilegiar a conjuntura de crise econômica, em detrimento do embate em torno de projetos societais. Aí reside, objetivamente, o campo da formação da cultura da crise que, sob a direção da burguesia, pode desqualificar as demandas dos trabalhadores ...” (1995: 191). Para a autora, “esse deslocamento (...) redireciona o conteúdo das suas reivindicações para o campo das ideologias práticas, marcadas pelas suas necessidadesimediatas. Nesse sentido, os trabalhadores terminam por reduzir as suas propostas ao campo da preservação das conquistas ou, tão somente, das possibilidades postas pela conjuntura da crise” (ibidem). Verifica-se uma acentuada diminuição do número de greves. Como explicita Matos (2009: 28) tomando as greves como mobilizações da classe trabalhadora, os dados revelam significativo recuo: “das quase 4.000 12 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 greves de 1989 (...) passamos a patamares médios de cerca de 700 greves anuais nos anos 1990”. Em 2004, o Dieese “encontrou perto de 300 greves em média nos anos seguintes (até 2007)”. É de destacar que, “ao exercer os direitos sociais e políticos conquistados ao longo deste século, o proletariado submeteu-se às normas e procedimentos do Welfare State liberal-democrático, perdendo gradualmente a sua identidade socialista e/ou revolucionária dominante ao longo do século XIX” (Abreu, 1997: 66). Para o autor, “é no vazio deixado por esta crise de identidade que os interesses e valores identificados com a desregulação política das relações sociais vêm progredindo. É razoável supor que dificilmente haveria espaço para os valores neoliberais diante de uma identidade coletiva com força e legitimidade para forçar e implementar novos pactos sociais e políticos” (idem: 68). 3 - A crise na consciência de classe do trabalhador: a substituição pós-moderna da classe pela “identidade” e da exploração pela “exclusão” Para os trabalhadores, além dos impactos objetivos da crise (desemprego, precarização do trabalho, dos salários e dos sistemas de proteção social), ocorreu uma outra também no plano ideológico: o “culto de um subjetivismo e de um ideário fragmentador que faz apologia ao individualismo exacerbado contra as formas de solidariedade e de atuação coletiva e social” (Antunes, 1999: 48). Essa fragmentação opera refrações na prática organizativa das classes trabalhadoras e pode criar, especialmente em conjunturas de crise, as bases para a institucionalização de formas corporativas de organização e a exclusão de um grande número de trabalhadores da representação sindical. Por outro lado, a descrença nos macro-projetos (típico do pensamento pós-moderno, e da resignada descrença em mudanças estruturais, também produto da crise do “bloco soviético”) provoca expansão dos movimentos “culturalistas” e “poli-classistas” (ecológicos, gays, juvenis, comunitários etc.) que se organizam em torno de demandas e respostas, legítimas e necessárias, porém geralmente pontuais e imediatas, o que desperta maior adesão, aceitação e visibilidade num contexto de descredibilidade dos macro-projetos e que, por isso, não conseguem articular e co-organizar suas ações. Isso levou muitos autores (de Jürgen Habermas a Boaventura de Souza Santos) a acreditarem mais nas mudanças localizadas e do “mundo da vida”, no “terceiro setor”, do que nas grandes transformações pela via das lutas de classes, tendo como referência as relações econômicas. Sem desconhecer a importância desses movimentos, o fato de retirar a sua dimensão econômica e de luta de classes leva a uma convivência tensa, mas compatível, entre eles e o sistema capitalista. 4 - Pulverização e heterogeneização do trabalho: a substituição das lutas de classes pelas “ações sociais” e “parceria” e a perda do poder de barganha do trabalhador As formas diferenciadas do uso da força de trabalho, para além da dificuldade de desenvolver laços e consciência de classe, vêm se expressando na expulsão de milhares de trabalhadores das formas de representação de seus interesses, ou seja, estão fora das organizações sindicais. Com isto, há um decréscimo efetivo nas taxas de sindicalização produzido pelo desemprego e pela informalização, causando o processo conhecido por dessindicalização. Nesta verdadeira dessindicalização e heterogeneização das classes trabalhadoras, os interesses dos trabalhadores aparecem cada vez mais diferenciados, por vezes até opostos, rompendo com a tendência à bipolarização das classes fundamentais que se podia vislumbrar no século XIX. O que ocorre é uma verdadeira “pulverização” e um ocultamento da maioria trabalhadora (ver Montaño, 1999: 44 e ss.). Com tal (de)composição segmentada e pulverizada das classes trabalhadoras, o poder político das suas organizações cai significativamente: a) primeiramente, temos uma diminuição do espaço fabril que leva à redução do número de membros de cada sindicato; b) em segundo lugar, a subcontratação, informalização do trabalho3 e a heterogeneização dos setores trabalhadores exclui amplos segmentos destes da organização sindical, fundamentalmente composta por trabalhadores assalariados4; c) por outro lado, uma onda ideológica de ocultamento das lutas de classes e desprestígio do movimento operário tem, no contexto da empobrecida racionalidade pós-moderna, um campo fértil de 13CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 expansão social; procura inculcar a ideia, sobre as lutas dos trabalhadores, de antiquada e antipopular (substituindo as “lutas de classes” e a “exploração”, por vagas noções de “ação social” e “exclusão social”); d) um quarto aspecto a considerar é a tendência à transformação no nível da organização sindical: com a inexistência de uma forte organização internacional, tal como no final do século XIX e inícios do século XX, propõe-se a passagem de sindicatos nacionais, para sindicatos por indústria (ou ramo industrial) procurando atingir (como ocorre no Japão) a organização sindical por empresa; o que ratifica e enfatiza a perda do poder de luta dos trabalhadores. Ocorre uma “ramificação” e setorialização das medidas de lutas; cada vez mais se pensa em greves (e, até, em negociação) por ramo e categoria, e até o acordo direto entre patrão e empregado, do que em greves gerais, diminuindo o impacto social da medida de luta. Podemos identificar pelo menos três vertentes que tratam das lutas ou ações sociais para enfrentar o contexto de crise: 1 - primeiramente uma vertente de cunho neoliberal, caracterizada pela “terceira via”, que, a exemplo de Bresser Pereira (1998), promove a desestatização (ou desresponsabilização do Estado) da ação social, passando a ser desenvolvida pelas organizações do setor público-não-estatal, ou “terceiro setor” (o que é tratado como “publicização”); 2 - em segundo lugar, a vertente pós-moderna, que, tendo Boaventura de Souza Santos (1997) como destacado expoente, defende as ações locais, o empoderamento, a Economia Solidária, as ações focalizadas em pequenos grupos, também inseridos no chamado “terceiro setor”; 3 - finalmente, a vertente representada fundamentalmente pelo marxismo, que se orienta nas lutas anti-capitalistas, que a exemplo de Petras, Boron, Chomsky, dentre outros (ver, por ex. Boron, org., 2004; Amin e Houtart, orgs., 2003), entende que só a luta de classes, orientada à emancipação humana, pode enfrentar as seqüelas desta crise e resolver a desigualdade social. Isso significa tanto (no curto prazo) a garantia das conquistas já realizadas, nos direitos trabalhistas, políticos, sociais, e, para tanto, o papel do Estado nas suas responsabilidades constitucionais, como (a longo prazo) as mudanças na correlação de forças para a superação da exploração e a sociedade dividida em classes. 5 - Com a diminuição do poder do trabalhador, o aumento do poder do grande capital Como corolário, e reforçando a diminuição do poder dos trabalhadores, ocorre, com a centralização de capital, um processo paralelo de centralização de poder político, concentrado na fração de classe hegemônica, a burguesia monopolista, hoje particularmente ligada ao capital financeiro. Em outros termos, clara reversão dos avanços da cidadania e da democracia, que derivaram do “pacto keynesiano” (ou “populista”). Com isto, o aumento do poder monopolista vai acompanhado de umaredução do poder do trabalhador: desorganização, desmobilização, segmentação, descrédito. Sendo falsa a afirmação da extinção das lutas de classes, não é errada a constatação de que elas têm-se redimensionado a partir de uma significativa retração dos seus impactos sociais e políticos. Num exercício analítico, Trotsky afirma que: Para Trotsky, isto é excessivamente abstrato e unilateral, na medida em que é impossível especular com a ausência das lutas de classes. Porém, não ignorando a real presença destas lutas, mesmo num contexto de tensão social interclasses, o fato é que no período pós-70 o poder político, o nível de organização e adesão das classes trabalhadoras tem diminuído significativamente; nestas condições, a afirmação de Trotsky resulta profética. Nesse contexto das lutas de classes observa-se, desde o término dos acontecimentos de 1968, um refluxo dos trabalhadores, acumulando derrotas frente ao capital monopolista e aos governos nacionais que “se admitirmos - e vamos fazê-lo por um momento - que a classe operária deixe de se levantar numa luta revolucionária, e permita que a burguesia dirija os destinos do mundo durante numerosos anos, (...) então certamente alguma espécie de novo equilíbrio será estabelecida. A Europa será violentamente lançada num retrocesso. Milhões de operários morrerão de desemprego e desnutrição. Os Estado Unidos serão compelidos a se reorientar no mercado mundial, a reconverter sua indústria e a sofrer restrições durante considerável período” (in Mandel, 1982: 153-4). 14 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 começam a desonrar o “pacto keynesiano” e que vão perdendo autonomia relativa frente ao capital transnacional, levando a uma significativa retração do movimento trabalhista; alcançando até retrocessos de conquistas históricas, como direitos civis, políticos e sociais, legislação trabalhista, contratos coletivos, protecionismo estatal, negociação tripartite. Przeworski entende que esta é “a crise do capitalismo democrático” (in Netto, 1993: 70), caracterizando o neoliberalismo como “um projeto histórico próprio” da direita que procura “libertar a acumulação de todas as cadeias impostas pela democracia” (idem: 80). Assim, Netto aponta que “é precisamente o conteúdo político desta despolitização [das relações sociais no mercado] que permitiu ao neoliberalismo converter-se em concepção ideal do pensamento antidemocrático contemporâneo” (ibidem). Como afirma Petras, “o declínio ou avanço dos direitos sociais variam com o nível e intensidade da luta de classe, as mudanças no poder político e o compromisso dos líderes em tomar ações decisivas. O retrocesso dos direitos trabalhistas e sociais não é o resultado de processos globais abstratos, mas o resultado de políticas de Estado, relações de classes e liderança política e social” (1999: 66). Para o autor, “onde o poder de classe do trabalhador permanece coeso, a retirada [dos direitos conquistados] é menos evidente” (idem: 54). Assim, se na fase inicial do monopolismo, sob o regime de acumulação fordista/keynesiano, a racionalidade hegemônica do capital induziu os indivíduos a pensar que o capitalismo não precisava ser alterado/superado (pois ele tinha se “civilizado”, incorporando as demandas e interesses de todos os setores sociais, a partir de um “pacto social”), no atual contexto de crise e hegemonia neoliberal, induz-se o trabalhador a pensar que o capitalismo não pode ser alterado/superado (pois ele seria a única e última forma possível de desenvolvimento social, moderno e “globalizado”). Na primeira fase do monopolismo (no Regime de Acumulação Fordista-Keynesiano) a estratégia hegemônica do capital aponta à diminuição das resistências operárias mediante a incorporação sistemática de demandas trabalhistas, mostrando um sistema (e um Estado) supostamente capaz de gerar “bem-estar social” para todos. Na segunda (e atual) fase, de crise e financeirização do capital, a estratégia hegemônica aposta na desmobilização mediante a resignação frente a fenômenos supostamente naturais, irreversíveis, inalteráveis. Aqui, só o “possível” parece ser o horizonte “razoável”. Isto emoldura a situação das lutas de classes que permitem ao capital, não sem resistências, avançar mais facilmente no seu processo de ofensiva contra o trabalho, de reestruturação produtiva e (contra-) reforma do Estado, no interior do novo projeto hegemônico do capital (financeiro). NOTAS 1 - Sobre isto ver: Netto e Braz. Economia Política (São Paulo, Cortez, 2006) e Montaño e Duriguetto (São Paulo, Cortez, 2010). 2 - Baseado em Montaño e Duriguetto. Estado, classe e Movimento Social. São Paulo, Cortez, 2010. 3 - Segundo pesquisa do IBGE, nas seis principais regiões metropolitanas do Brasil (São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador e Recife), o trabalho informal (sem carteira assinada) cresceu 62% na década de 90 (em São Paulo este crescimento foi de 81%), atingindo 4,4 milhões de pessoas trabalhando sem carteira; a eles somam-se os 3,8 milhões que trabalham por conta própria (ver Soares, 2000: 67). 4 - Segundo registra Soares, na América Latina o percentual de trabalhadores sindicalizados está caindo em relação à população ocupada: na Argentina é de 42%, no Peru 7,8% e na Guatemala 2,9% (Soares, 2000: 57). 15CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 No Brasil dos últimos tempos assistimos a taxas de crescimento da economia que giraram em torno de 1,0% a 7,5%, atingindo uma média de 4,06% no período de 2003 a 2010. Se levarmos em consideração a média histórica brasileira desde 1890 que é de 4,5% os números estão longe de figurarem como extraordinários. (Gonçalves, 2010). No entanto, para uma economia que amargou nas últimas décadas um insólito revesamento entre a inflação e a estagnação econômica, as atuais taxas de crescimento trouxeram consigo eufóricos discursos políticos e análises acadêmicas de grupos intelectuais otimistas sobre a retomada do crescimento econômico, a diminuição da pobreza, a geração de novos postos de trabalho, o surgimento de uma nova classe média consumidora e outros elementos que indicariam uma nova etapa de desenvolvimento econômico e social no Brasil. Nessa conjuntura, vem obtendo sucesso entre diversos setores da sociedade um ideário que defende o surgimento de um suposto novo-desenvolvimentismo brasileiro que traria consigo uma nova etapa de crescimento e avanço para o país. Embora não componha um bloco intelectual coeso e seja integrado por uma inegável heterogeneidade de argumentos, os chamados “novos desenvolvimentistas” possuem uma questão em comum: sugerem que vivemos uma nova fase no modelo de desenvolvimento capitalista no Brasil. Para esse conjunto de ideólogos, superada a fase neoliberal, agora vivemos uma espécie de déjà vu dos esperançosos e conturbados anos da industrialização brasileira, na qual reatualiza-se o antigo mito desenvolvimentista segundo o qual os ganhos civilizatórios da modernização capitalista nos países centrais podem ser finalmente universalizados para os países periféricos. Dito de outra forma, o novo ideário desenvolvimentista pretende recuperar as promessas civilizatórias não alcançadas pelo processo histórico de modernização capitalista no Brasil e que atualmente, segundo seus defensores, voltam a figurar como horizonte histórico nacional. 1 - O DESENVOLVIMENTISMO COMO EXPRESSÃO IDEOLÓGICA DO PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO BRASILEIRA Em uma publicação de 1974, um dos mais proeminentes teóricos do subdesenvolvimento, o economista brasileiro Celso Furtado reconhece a construção e a importância histórica do que chama de “mito do desenvolvimento econômico” como ideologia “diretora” do processo de modernização brasileira. De acordo com o economista cepalino, o mito de que os países periféricos pudessem superar o subdesenvolvimento e atingir as mesmas condições de vida dospaíses desenvolvidos exerceu uma forte e inegável influência sobre a mente dos homens que se empenharam em pensar os rumos da economia e da política no Brasil. Para o autor a renovação contínua desse mito ao longo da história operou como um verdadeiro farol que iluminou o campo de percepção dos pesquisadores, planejadores, burocratas e governantes indicando o caminho que toda a sociedade brasileira deveria seguir para atingir seu objetivo final: estar entre o rol dos países plenamente desenvolvidos. Como indica Furtado (1974), levando em consideração o ambiente de país periférico, com altos índices de desigualdade social, o mito do desenvolvimento tornou-se, ao longo da história, uma construção ideológica fundamental para que a classe dominante brasileira elaborasse sua ideologia específica e ao mesmo tempo socializasse com as demais classes e frações de classe as promessas de um futuro de crescimento econômico e de melhoria das condições sociais. Através da elaboração e socialização desse conjunto ideológico, foi possível à burguesia brasileira apresentar seu projeto particular de industrialização Professor adjunto da Escola de Serviço Social da UFRJ e pesquisador do Núcleo de Pesquisas sobre Política, Estado, Trabalho e Serviço Social - PETSS Cézar Henrique Maranhão A ideologia neodesenvolvimentista e as Políticas Sociais no Brasil: apontamentos sobre crise e hegemonia na periferia do capitalismo 16 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 como um projeto de toda a sociedade brasileira, mobilizando amplos esforços e legitimando as ações e estratégias necessárias à condução do processo de industrialização. Em diferentes fases do processo histórico de industrialização brasileira, a ideologia de superação do subdesenvolvimento, através das políticas desenvolvimentistas, cumpriu o papel de oferecer o horizonte ideológico que possibilitou à burguesia mobilizar as forças políticas necessárias para impulsionar a industrialização brasileira. É assim, que sob o amplo ideário desenvolvimentista, surgem uma heterogeneidade de grupos políticos, representados pelos mais diversos interesses, mas que de uma forma ou de outra adotavam os discursos e as promessas desenvolvimentistas de planejamento econômico, crescimento industrial, defesa da intervenção estatal, universalização do trabalho assalariado, como portadores inerentes da ultrapassagem do subdesenvolvimento e da melhoria nas condições de vida de toda a população brasileira. Dessa forma, o conjunto heterogêneo de propostas desenvolvimentistas adquiriram força material na condução do processo de industrialização brasileira através de 3 características principais: 1) Em primeiro lugar, possibilitou a burguesia brasileira construir o cimento ideológico necessário para unir as mais diferentes frações da classe dominante nacional numa arena heterogênea de alternativas políticas que permitiu a construção de debates e concertações no interior da classe dominante sobre as alternativas possíveis para os caminhos da modernização brasileira. 2) Por outro lado, a ideologia desenvolvimentista e suas heterogêneas propostas (que aglutinavam nos quadros desenvolvimentistas sujeitos tão diversos como Celso Furtado e Roberto Campos) permitiu à classe dominante brasileira vislumbrar a possibilidade de construir um projeto hegemônico de direção política, que através de um “pacto social” (sob a direção político e ideológica das classes dominantes), conduziria a “modernização conservadora” e o processo de inserção brasileira no capitalismo monopolista avançado. 3) E uma terceira e não menos importante característica, a ideologia desenvolvimentista ao se colocar como único caminho para o processo de modernização nacional tinha como objetivo principal escurecer, enevoar, colocar nas sombras a construção de uma alternativa socialista para o Brasil. O objetivo oculto era banir do cenário nacional os grupos políticos que reivindicavam uma saída socialista para a modernização brasileira. De certa forma, nessa época de incertezas e intensas disputas, central para a definição dos rumos políticos do Brasil, o bloco político que compunha a classe dominante brasileira logrou alguns êxitos através da ideologia desenvolvimentista. O maior deles com certeza foi fazer com que parte da esquerda brasileira assumisse como sua uma tese que está no interior do discurso desenvolvimentista: a tese da incompletude do capitalismo brasileiro. Mas naquele período, em seu eixo fundamental, o bloco histórico formado pelas classes dominantes brasileiras não obteve êxito na construção de um consenso amplo e ativo em torno do projeto de modernização conservadora no Brasil. A heterogeneidade da ideologia desenvolvimentista apesar de ter possibilitado a mobilização das mais diferentes forças políticas em torno do esforço de modernização não conseguiu construir um consenso social duradouro em torno dos interesses particulares da burguesia. Em meados da década de 1960, as contradições do processo de modernização capitalista periférico, somadas a correlação de forças entre as classes sociais, acabaram possibilitando o surgimento de fissuras no consenso burguês. Aos poucos ganharam espaço forças políticas contestatórias que advindas dos setores populares, progressistas e da classe trabalhadora propunham políticas que ultrapassavam os estreitos limites da aliança conservadora burguesa ameaçando o controle ideopolítico das classes dominantes sobre o processo de modernização capitalista. Foi assim que em 1964, a burguesia brasileira, sentindo que a sua direção política do processo de modernização estava ameaçada pela possibilidade de surgimento de um projeto popular-socialista no Brasil, rompeu com o estatuto democrático abrindo mão da tentativa de construção de uma consolidação consensual do capitalismo monopolista no Brasil e desfraldando um golpe de Estado que desnudou toda a sua cultura política contra-revolucionária. Em nome da continuidade do processo de “modernização conservadora”, a burguesia brasileira abandonava qualquer possibilidade de construção ideológica de um consenso em torno de sua hegemonia para novamente adotar uma transição política baseada em soluções predominantemente coercitivas. 17CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 2 - DESTRUTIVIDADE DO CAPITAL, CRISE ESTRUTURAL E RENOVAÇÃO DA IDEOLOGIA BURGUESA Em 1972, Francisco de Oliveira ao escrever A crítica a razão dualista, um clássico da crítica ao binômio desenvolvimento/subdesenvolvimento, conclui que a ideologia desenvolvimentista a partir da teoria do subdesenvolvimento, elaborada pela CEPAL, analisou toda a questão do desenvolvimento capitalista periférico sob o ângulo dualista contrapondo o Brasil “arcaico” (da desigualdade, da miséria e do subemprego) ao Brasil Moderno (do crescimento econômico, do consumo de luxo e da modernização do mercado). Com seus estereótipos de “desenvolvimento auto- sustentado”, “internalização do centro de decisões”, “integração nacional”, “planejamento”, etc, a teoria do subdesenvolvimento sentou as bases da ideologia desenvolvimentista que, no período de transformação da economia de base agrária para a industrial-urbana, desviou a atenção teórica e a ação política do problema da luta de classes. Ao final da sua conclusão o autor arremata: A entrada do Brasil no cenário da “redemocratização”, o acirramento das contradições econômicas próprias da fase de crise estrutural do capital e a nova correlação de forças entre as classes e frações de classes nas décadas de 1980 e 1990, reservavam um novo lugar para a ideologia desenvolvimentista na condução ideológica do capitalismo periférico brasileiro. Num primeiro momento, nas décadas de 1980 e 1990, período em que o potencial expansivo de acumulação já oferecia sérios sinais de desgaste e a crise estrutural do capital (Mészaros, 2002) já ameaçava as economiascapitalistas, as transformações que se processaram no sistema capitalista mundial e o surgimento do neoliberalismo como direção ideopolitica do processo de restauração do capital em crise fizeram com que as promessas da ideologia desenvolvimentista gradativamente passassem a entrar em contradição com os interesses do projeto burguês. Nesse momento histórico de intensificação da mundialização capitalista, o objetivo da política neoliberal era se apresentar como uma alternativa ideológica viável ao esgotamento do antigo modelo de substituição de importações e da ideologia desenvolvimentista. O grande compromisso dos neoliberais era restituir um novo cenário de crescimento no continente latino-americano, prometendo acabar com a crise da dívida externa e a alta inflação, através da liberalização econômica e política de privatizações. Foi assim que as promessas desenvolvimentistas de superação do subdesenvolvimento passaram a ser continuamente negadas e substituídas pelo novo consenso político neoliberal, liderado pela oligarquia financeira internacional e organizados em torno do Consenso de Washington. A essência econômica do processo político denominado de neoliberalismo, que nas últimas décadas intensificou o poder expropriador do capital, está relacionada ao complexo processo de mundialização capitalista que possibilitou a gradativa retomada, sob novas bases, do domínio econômico e político da fração mais reificada do metabolismo capitalista. Tal fração do capital, nomeada por Hilferding (1985) e Lênin (1982) de capital financeiro, com o atual acirramento da crise estrutural do capital e o processo de mundialização capitalista, adquire novas determinações e complexidades oferecendo um patamar ainda mais intenso à lógica destrutiva do capital. Com a crise e as quedas acentuadas nas taxas de lucro, o capital foi obrigado a desenvolver grandes transformações na sua dinâmica de reprodução ampliada. Diante do futuro crítico, gradualmente emergem soluções que pretendem desregulamentar a economia de mercado, visando impulsionar a liberdade dos investimentos financeiros capitalistas. Ao longo dos anos 1980, a antiga política estatal keynesiana de “eutanásia do rentista”, cede lugar a um conjunto de políticas do Estado que têm como finalidade a reanimação dos investimentos capitalistas e um agressivo pacote de incentivos para a expansão do mercado privado. Podemos destacar três principais processos históricos que se desenvolveram de forma concomitante e complementar ao longo dos mecanismos que possibilitaram a mundialização do capital: a) a internacionalização do capital financeiro; b) a nova gestão da produção capitalista e a intensificação da extração de mais-valia; A teoria do subdesenvolvimento foi, assim, a ideologia própria do chamado período populista; se ela hoje não cumpre esse papel é porque a hegemonia de uma classe se afirmou de tal modo que a face já não precisa de máscaras. (Oliveira, 1975, pg. 13) 18 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 c) o avanço de novas formas de expropriação capitalista. O primeiro desses processos históricos se dá a partir dos anos 1980, quando as diversas frações da burguesia internacional promovem uma grande conciliação em torno do projeto de expansão da acumulação financeira, que estabelece a internacionalização e a desregulamentação dos mercados. A partir da hegemonia política neoliberal, a força restauradora do capital para liberalizar e mundializar os mercados capitalistas no mundo se espraia com grande ímpeto e velocidade. Talvez a grande conquista neoliberal tenha sido fazer com que as políticas liberalizantes fossem desenvolvidas não só pela vitória eleitoral dos partidos conservadores, mas também através de governos de esquerda que, ao tentarem manter a política de reformas social-democratas, acabaram cedendo ao poder corrosivo e incontrolável do capital internacional1. A fase capitalista decorrente da liberalização financeira e da internacionalização dos mercados é uma etapa que cada vez mais produz de forma ágil e rápida, de um lado, mundializando e externalizando as etapas do processo produtivo e, de outro, intensificando os métodos de extração da mais-valia. Como já apontavam Marx (1985-86), Hilferding (1985) e Lenin (1982), o sistema capitalista funciona como “uma economia monetária de produção”, e é sobre essas condições que a produção capitalista passará a exigir uma reorganização da produção capitalista em nível mundial. Os processos de fusão e incorporação de empresas, desenvolvidos desde a fase monopolista do capitalismo, apesar de tentarem realizar uma unidade entre as diversas formas de capital2, sempre foram acompanhados por uma inconveniente porosidade entre os processos de criação do valor (capital produtivo) e as formas lucrativas de apropriação desse valor já criado (capital-dinheiro). Os diversos momentos do circuito de valorização do capital são quase autonomizados como ramos particulares de produção de mercadorias: o comércio, a indústria, os serviços e os bancos. Com o atual movimento de mundialização dos mercados e reestruturação dos capitais, assistimos a uma busca incessante por um maior controle do processo de valorização e pelo aumento da taxa de lucros dos grandes grupos oligopolistas, através de estratégias renovadas de monopolização dos mercados e reestruturação de ramos inteiros do ciclo de valorização capitalista. A fusão de vários grupos financeiros e o investimento massivo em ciência e pesquisa possibilitaram a incorporação de maquinários ultramodernos e de tecnologias informacionais no interior dos processos manufatureiros que resultaram num controle e monitoramento ainda maior do processo de trabalho e de todo circuito reprodutivo do capital. Para continuamente deslocar a tendência decrescente dos lucros intensificada pela crise estrutural e, assim, manter os altos níveis de lucratividade, o capitalismo atual deve intensificar constantemente suas formas de produção de mercadorias. Na fase atual do capitalismo o contínuo revolucionamento da produção não se faz acompanhar por uma expansão horizontal dos mercados. Isso não poderia ser diferente num capitalismo que já se transformou em uma grande comunidade internacional produtora de mercadorias. O que tem ocorrido nos últimos tempos é que o complexo sistema de reprodução ampliada do capital assimilou uma estratégia renovada de expropriações, desenvolvendo-a em escala mundial, não só apropriando-se das áreas geográficas inexploradas, como também expropriando esferas que antes escapavam à dinâmica de acumulação capitalista. O poder expropriador do capital, impulsionado pela avidez de superlucros do capital, manifesta-se atualmente por meio de algumas características facilmente identificadas: i) uma nova partilha das áreas geograficamente estratégicas e das terras coletivas e públicas no mundo, ii) a intensificação da extração de mais-valia no mundo, iii) a mudança nos regimes de manufatura e organização do trabalho, iv) a criação de uma superoferta de força de trabalho, garantida por uma multidão de trabalhadores que compõe um exército industrial de reserva mundial; e, por fim, v) a forma de expropriação que é a captura do fundo público dos diversos Estados nacionais e de suas instâncias “democráticas” de controle social. Nessas condições, entramos numa quadra histórica em que o capital se vê enredado pela sua própria dinâmica contraditória: para impulsionar o crescimento econômico e o avanço civilizatório as soluções e 19CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 ajustes econômicos capitalistas devem paralelamente intensificar seus métodos bárbaros de intensificação da exploração e expansão das expropriações. Segundo Meszaros (2002), a diferença é que no passado tais contradições críticas puderam ser exportadas para setores periféricos da economia e atémesmo para outros países e continentes, mas, atualmente, ela atinge todas as esferas de produção e reprodução do sistema capitalista. Com a crise estrutural, os ajustes anteriormente mobilizados pelos Estados nacionais para os deslocamentos dos efeitos das crises já não apresentam a mesma eficiência. As antigas técnicas keynesianas ou desenvolvimentistas realizadas no passado para retomar o impulso do crescimento e ampliar os ganhos econômicos, em grande parte perderam seu potencial civilizatório. A estrutura e a dinâmica do capitalismo contemporâneo pôs por terra as esperanças de equalização entre crescimento capitalista e ampliação de ganhos civilizatórios significativos. Tal impulso destruidor do capital que intensifica o antagonismo entre desenvolvimento da acumulação e avanço civilizatório gerou também nefastas consequências cotidianas para a condição de vida e trabalho da população. Em várias partes do planeta, podemos visualizar o saldo da política de liberalização dos mercados que intensificou as contradições típicas da sociedade capitalista3. Todas as políticas sugeridas pelo Consenso de Washington e executadas pelos governos dos diversos países, principalmente na periferia do sistema, longe de cumprirem suas promessas de expansão dos mercados livres e de desenvolvimento com estabilidade resultaram no aumento das desigualdades em todos os níveis: econômico, político, social e cultural. Não é a toa que as consequências das políticas neoliberais somadas às crises econômicas, cada vez mais frequentes e turbulentas, passam a abrir espaço para o surgimento de lutas de resistência ao neoliberalismo na América Latina. Os países latino-americanos, nos primeiros anos do século XXI, testemunharam um aprofundamento da luta de classes, das crises políticas de fundo e uma intensa contraposição à intervenção política imperialista nos rumos do continente. Todas as mobilizações e crises políticas latino-americanas formavam um novo quadro político radicalizado. Agora a onda de mobilizações populares não enfrentava ditaduras militares como no passado, mas os regimes neoliberais “democráticos” desenhados pelos EUA e as burguesias locais. Logo depois, através de situações diversas, uma parte da esquerda latino-americana chegou ao governo de seus países, diretamente ou em coalizões, impulsionada pela crise política e a bancarrota econômica no continente. As burguesias locais e o capital internacional tiveram que aceitar a virada política que se processava na América Latina, uma verdadeira “virada à esquerda” que remodelou a conjuntura política do continente. (Coggiolla, 2008). Na presença deste quadro de avanço da barbárie social e de resistências políticas aos investimentos das megacorporações, inicia-se um lento processo em que organizações multilaterais como o FMI e o Banco Mundial começam a admitir que a ortodoxia do Consenso de Washington, baseada no louvor aos mercados livres, não vinha oferecendo respostas políticas adequadas para garantir a administração dos conflitos e a boa governança dos mercados emergentes. Até mesmo ideólogos do grande capital, como o ex-presidente do Banco Mundial Joseph Stiglitz (2002), passam a discordar sobre a forma como vinha sendo conduzido o consenso político em torno das propostas capitalistas de globalização econômica. Na verdade, podemos afirmar que alguns ideólogos capitalistas passaram a perceber que a ortodoxia neoliberal, ao defender tão arraigadamente os valores do livre mercado e da governança coorporativa, subestimou os elementos de consenso político e ideológico que devem acompanhar todo processo de mudanças sociais. Como afirma Mota (1995, p. 84): “Esse fracasso, contraditoriamente, incide sobre a ortodoxia liberal e aponta para a impossibilidade de tratar a economia longe da política, isto é, de implementar as reformas econômicas sem a obtenção de consensos de classe.” (MOTA, 1995, p. 84). Nessas condições, a crise do capital se transforma em uma crise de dominação e as classes dominantes precisam encontrar maneiras de restabelecerem sua direção política e dominação ideológica sobre o conjunto da sociedade4. Hoje, diante do quadro crítico de deslegitimação do projeto neoliberal, o capital necessita, cada vez mais, de respostas que não só garantam o crescimento exponencial das taxas de lucro (como pregava o receituário neoliberal), mas também amenizem a condição dos derrotados e estabeleçam um consenso mínimo em torno das transformações capitalistas. 20 CRESS-MG | Revista Conexão Geraes | 2º semestre de 2014 3 - A IDEOLOGIA DO NOVO DESENVOLVIMENTISMO: EXPRESSÃO IDEOLÓGICA DA CRISE NO BRASIL CONTEMPORÂNEO É de posse dessas contradições sociais intensificadas pela dinâmica de acumulação capitalista atual que a intelectualidade da classe dominante enfrentará uma quadra histórica de deslegitimação do discurso neoliberal e se empenhará na reconstrução política e ideológica de sua dominação de classe. No Brasil, esse processo começa com os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso (FHC), mas se desenvolve plenamente com a eleição de Luís Inácio da Silva para a presidência da república. Nessa conjuntura se abrirá uma oportunidade histórica para a ampliação do leque de alianças políticas em torno do projeto burguês. As novas diretrizes de “desenvolvimento social e humano”, já defendidas pelos organismos internacionais e agências multilaterais encontrarão sob a gestão presidencial do antigo líder sindical o ambiente econômico e os elementos políticos e ideológicos necessários para continuidade da sua agenda política5. Em 2002, Luís Inácio Lula da Silva é eleito através de uma heterogênea aliança política que aglutinou importantes setores do sindicalismo nacional, intelectuais, funcionários públicos, movimentos populares, frações da classe média e também setores da burguesia brasileira. O governo Lula sustentava grandes expectativas em parte da esquerda e dos setores progressistas brasileiros. Porém, ainda na ante- sala do poder, com o documento conhecido pelo nome de “carta aos brasileiros”, o governo petista já acenava com a continuidade da política econômica de FHC e depois da posse presidencial ratificou a conciliação com o projeto hegemônico da grande burguesia local e internacional. Aos olhos das megacorporações, optou em desempenhar o papel da esquerda “sensata”, “moderna e aberta” - seguindo a recomendação do mexicano Jorge Castañeda6 - pronta a manter e ampliar os velhos compromissos econômicos de subordinação ao grande capital. Através dessa conformação de interesses, ao assumir o poder o governo Lula manteve a mesma política econômica do segundo governo FHC: metas de inflação, ajuste fiscal permanente, câmbio flutuante, etc. Assim, o governo Lula reafirmou a política econômica e apoiado no melhor desempenho conjuntural do setor externo e no apoio político de uma ampla base sindical e popular deu novo fôlego ao “modelo liberal periférico” (ancorado no estímulo à economia exportadora de commodities e atrelada aos desígnios do capital financeiro internacional) legitimando-o politicamente e amalgamando com maior intensidade os interesses do bloco de poder dominante. (Filgueiras; Gonçalves, 2003) Foram tais determinações econômicas e políticas que possibilitaram ao governo Lula transformar ideologicamente a recuperação da economia em um ”espetáculo do crescimento”, reposicionando o Brasil na vitrine do mercado internacional das chamadas “nações emergentes”. Claro que o crescimento econômico e a melhoria na condição de vida e trabalho dos brasileiros ficou longe de sustentar um momento espetacular, mas deu provas de que seria possível conjugar a continuidade do modelo capitalista periférico com um renovado conjunto de promessas que supostamente trariam um futuro de crescimento econômico e desenvolvimento social para o Brasil. É a partir desse momento histórico que começa a emergir no
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