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UNIVERSIDADE PAULISTA - UNIP POLO LUZIÂNIA LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS HISTÓRIA, ARTES E CULTURAS INDÍGENAS: MARCOS REGULATÓRIOS E BNCC TC – Trabalho de Conclusão Artes Visuais – Prof. Rodrigo Di Carlo Matarazzo – Marcos Rodrigues da Paixão Silva / RA: 1827782 Luziânia/GO 2020 MARCOS RODRIGUES DA PAIXÃO SILVA HISTÓRIA, ARTES E CULTURAS INDÍGENAS: MARCOS REGULATÓRIOS E BNCC Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à comissão julgadora da Universidade Paulista - UNIP, Polo Luziânia, como parte dos requisitos para obtenção do título de Licenciado em Artes Visuais. Orientador: Prof. Rodrigo Di Carlo Matarazzo Coorientador: Prof. Ms. Bruno César dos Santos Luziânia/GO 2020 Silva, Marcos Rodrigues da Paixão. .... HISTÓRIA, ARTE E CULTURA INDÍGENAS : MARCOS REGULATÓRIOS E BNCC / Marcos Rodrigues da Paixão Silva. - 2020. ....33 f. ....Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) apresentado ao curso de Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Paulista, Luziânia, 2020. ....Orientador: Prof. Rodrigo Di Carlo Matarazzo. ....Coorientador: Prof. Bruno César dos Santos. ....1. Relações étnico-raciais. 2. História, arte e cultura. 3. Educação e currículo. 4. Educação artística. 5. Artes visuais. I. Matarazzo, Rodrigo Di Carlo (orientador). II. dos Santos, Bruno César (coorientador). III. Título. Elaborada de forma automática pelo sistema da UNIP com as informações fornecidas pelo(a) autor(a). MARCOS RODRIGUES DA PAIXÃO SILVA HISTÓRIA, ARTES E CULTURAS INDÍGENAS: marcos regulatórios e BNCC Universidade Paulista – UNIP, LUZIÂNIA 2020 Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do título de Graduação em Licenciatura em Artes Visuais apresentado à Universidade Paulista – Unip. Aprovado em: BANCA EXAMINADORA ______________________________________/_____/_____ Prof. XXXXXXXX Universidade Paulista - UNIP ______________________________________/_____/_____ Prof. XXXXXXXX Universidade Paulista – UNIP ______________________________________/_____/_____ Prof. XXXXXXXX Universidade Paulista - UNIP AGRADECIMENTOS A Deus por sempre cuidar da minha família e de mim, proporcionando oportunidades para seguir meus sonhos. A minha mãe Rosimeire Rodrigues da Silva, por sempre acreditar nos meus planos e se esforçar para me ajudar a realizá-los. A Professora Marcella Suarez Di Santo, que mesmo pertencendo ao corpo docente de outra instituição me auxiliou na construção desse trabalho com muito carinho e paciência. Ao meu orientador Professor Rodrigo Di Carlo Matarazzo e meu coorientador Professor Bruno César dos Santos, pelo grandioso suporte no pouco tempo que lhes couberam. A minha vó Apolônia Maria da Paixão Silva, por acreditar na minha capacidade e até fazer uma promessa para que eu me formasse com êxito. Ao pessoal do Polo da UNIP de Luziânia, pelo apoio pedagógico durante esses últimos 3 anos. Aos meus amigos, João Lucas, Tainara, Victor, Marianne, Lucas, Wênia e Ana Carolina pelas ocasiões de descontração nos meus momentos de quase estafa mental. E a todos, que direta e indiretamente fizeram parte da minha formação, o meu muito OBRIGADO! Nossas vidas começam a acabar no dia em que nos calamos sobre o que importa. (Martin Luther King Jr.) RESUMO Foi percebido que durante o curso de Artes Visuais bem como nas escolas de educação básica em disciplinas como Educação Artística, História ou Geografia os focos de estudo são majoritariamente as civilizações europeias, que de fato, tiveram uma grande importância para a construção social e cultural dos brasileiros, mas que não deve ser tratada como a única influenciadora. Na tentativa de recuperar a valorização da auto identidade proveniente de outros povos que constituíram o Brasil esta pesquisa tem como objetivo enaltecer a história e cultura indígena através das artes visuais, levantando questões como racismo, estereótipos e preconceitos que invalidaram durante séculos as culturas indígenas e afetando diretamente na nossa identidade nacional. O eurocentrismo apagou a história dos nativos, dando-lhe importância apenas ao período posterior ao descobrimento e os currículos escolares não tratavam como obrigatoriedade a questão étnico-racial, mas após longos anos de lutas sociais, documentos legais marcaram uma nova etapa para a educação, incluindo a história e cultura dos povos minoritários como obrigatoriedades no currículo escolar. Palavras-chave: Relações étnico-raciais. História, arte e cultura. Educação e currículo. ABSTRACT It was noticed that during the Visual Arts course degree as well as in basic education schools in subjects as Art Education, History or Geography, the focus of study is mostly European civilizations, which, in fact, had a great importance for the social and cultural construction of the Brazilians people, but that should not be treated as the only influencer. In an attempt to recover the appreciation of self-identity from other peoples that constituted Brazil, this research aims to enhance indigenous history and culture through visual arts, raising issues such as racism, stereotypes and prejudices that have invalidated indigenous cultures for centuries and affecting directly in our national identity. Eurocentrism erased the history of the natives, giving importance only to the period after the discovery and the school curricula did not treat ethnic-racial issues as mandatory, but after long years of social struggles, legal documents marked a new stage for education, including the history and culture of minority peoples as mandatory in the school curriculum.. Keywords: Ethnic-racial relations. History, art and culture. Education and curriculum. 9 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 11 1 CAPÍTULO I: UMA ABORDAGEM CONCEITUAL .................................................... 14 1.1 IDENTIDADE, DIFERENÇA E REPRESENTATIVIDADE .......................................................... 14 1.2 RACISMO E ESTEREÓTIPOS CULTURAIS............................................................................ 16 2 CAPÍTULO II: HISTÓRIA, ARTES E CULTURAS INDÍGENAS .............................. 18 2.1 O SURGIMENTO DO HOMEM NA AMÉRICA ........................................................................ 18 2.2 OS A ARTE PRÉ-HISTÓRICA BRASILEIRA ........................................................................... 18 2.2.1 Cerâmicas e Esculturas ........................................................................................... 19 2.2.1.1 Tradição Tupi-Guarani ..................................................................................... 19 2.2.1.1.1 Tradição Tupi-Guarani .............................................................................. 19 2.2.1.1.2 Tradição Sambaquiera ............................................................................... 20 2 2.1.1.3 Tradição Umbu .......................................................................................... 21 2.2.1.1.4 Tradição Marajoara e Tapajônica .............................................................. 21 2.2.1.1.5 Sociedades da Amazônia Pré-Colonial...................................................... 22 2.2.1.2 Gravuras e Pinturas ...........................................................................................22 2.2.1.2.1 Tradição Agreste........................................................................................ 23 2.2.1.2.2 Tradição Nordeste...................................................................................... 23 2.2.1.2.3 Tradição Planalto ....................................................................................... 23 2.2.1.2.4 Tradição São Francisco ............................................................................. 23 2.2.1.2.5 Tradição Geométrica ................................................................................. 24 2.2.1.2.6 Tradição Meridional .................................................................................. 24 2.2.1.2.7 Tradição Amazônica .................................................................................. 24 2.2.1.2.8 Tradição Costeira ....................................................................................... 24 2.2.1.2.9 Tradição Itacoatiara ou Itaquatiara ............................................................ 25 2.2.2 As artes indígenas na atualidade ............................................................................ 25 3 CAPÍTULO III: O PERCURSO DAS RELAÇÕES ÉTINICO-RACIAIS NA EDUCAÇÃO BRASILERA ................................................................................................... 27 3.1 LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL .................................................. 27 3.2 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS ...................................................................... 28 3.3 PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO ................................................................................... 29 10 3.4 DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA .................................... 29 3.5 BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR .......................................................................... 30 3.5.1 Artes Visuais e Temática indígena na BNCC .......................................................... 30 ARGUMENTAÇÃO E DISCUSSÃO ................................................................................... 30 CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 31 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 32 11 INTRODUÇÃO Arte é uma nomenclatura proveniente da língua latina que em sua forma de origem ars dispõem do significado de técnica e/ou habilidade. O que hoje entendemos por arte só passou a receber esse vocábulo durante o século XVIII, até então não havia a existência de uma única palavra que unificasse o sentido de todas as práticas dessa atividade humana. Para Gombrich (1998, p. 15) tal palavra pode significar coisas muito diferentes, em tempos e lugares diferentes. Os primeiros registros do que se pode identificar como arte vem do período paleolítico em que grupos pré-históricos buscavam retratar suas percepções do seu cotidiano. Desde então a arte vem se modificando junto com a história humana, cada período é único nas suas regras sociais e consequentemente nas obras de arte que as refletem. As artes visuais que são o foco deste estudo podem ser classificadas pela criação da cerâmica, desenho, pintura, escultura, gravura, design, artesanatos, fotografia, vídeo, produção cinematográfica e arquitetura. Atualmente a arte é vista não apenas como uma forma de retratar a realidade em que o autor da obra está inserido, ou como ornamento utilitário do dia a dia na sua função pragmática, mas também como produto de venda. O mercado da arte contemporânea está ligado diretamente ao poder aquisitivo dos compradores, prática desenvolvida após a adoção do capitalismo nos modelos de governo ao redor do mundo. A compra de uma obra de arte pode aumentar o prestigio social e contribuir para o status da aristocracia, os profissionais que surgiram com esse tipo de comércio são os responsáveis diretos pela validação ou não de um objeto, são eles os críticos de arte, estudiosos, mercadores, etc. e dispõe também de espaços específicos para sua comercialização ou exposição, como galerias, museus e até mesmo e-comerce. Portanto o valor e prestígio dado a segmentos de arte, obras ou autores é seletivo e a concepção de arte pela arte ligada a estética pouco importa na atualidade. Povos minoritários detém de uma menor representatividade na comunidade em que estão inseridos, portanto para as ambições do mercado artístico poucos artísticas provenientes de grupos minoritários tem a oportunidade de serem reconhecidos. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, A população brasileira segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD é formada por 46,80% Pardos, 1.10% Indígenas e Amarelos, 42.70% Branco e 9.40% Pretos. A partir desses números é possível notar uma parte não branca da população que 12 mesmo sendo juntos mais da maioria do total (57,3%), não se veem representados nos comerciais de TV, nas universidades, em posições de prestígio social, em espaços culturais etc. Na arte não é diferente, o mercado atual da arte é elitista e busca prestigiar apenas obras que vão buscar gerar lucro, para Bourdieu (1987, p.4). "[...] os poderes sociais fundamentais são: em primeiro lugar o capital econômico, em suas diversas formas; em segundo lugar o capital cultural, ou melhor, o capital informacional também em suas diversas formas; em terceiro lugar, duas formas de capital que estão altamente correlacionadas: o capital social, que consiste de recursos baseados em contatos e participação em grupos e o capital simbólico que é a forma que os diferentes tipos de capital toma uma vez percebidos e reconhecidos como legítimos." As mazelas menos favorecidas da sociedade possuem um difícil acesso a arte, e quando tentam expressar sua individualidade por meio dela, buscam movimentos eurocêntricos deixando na maior parte das vezes suas raízes de lado por não as verem representadas, uma das principais causas é a falta de divulgação dos estudos que buscam estudar essas artes marginalizadas e a maneira falha como é conduzida as aulas de educação artística. Além do mercado da arte, outro aspecto que dificulta o reconhecimento de obras e artistas não brancos na sociedade é o racismo, portanto para que haja garantia da validação da arte afro-brasileira, africana e indígena bem como sua história e cultura a Lei nº 11.645/08 entra em vigor visando o estudo da história e cultura afro-brasileira e africana nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, públicos e privados. O objetivo desse estudo é reunir e apresentar uma introdução da história, artes e culturas dos povos indígenas, e sua presença nos parâmetros curriculares da educação básica. Para a realização deste estudo se foi necessário partir de um estudo bibliográfico que segundo Silveira e Córdova (2009, p.37), “[...] consiste em realizar o levantamento de referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos, páginas de web sites.” Por meio de fichamentos e análises textuais a fundamentação teórica do trabalho foi ganhando forma, buscando conceitos que fossem suficientes para descrever e finalizar essa etapa de “mineração bibliográfica”. Posteriormente, a necessidade de entender como a temática indígena estava sendo tratada nos currículos escolares originou numa pequena etapa de análise documental, em que escritos como a Base Nacional Comum Curricular, foram primordiais para assimilação geral do projeto. Espera-se com este estudo intensificar a importância das pesquisas para a temática racial nos âmbitos educacionais. 13 Duranteo Capítulo I questões fundamentais como identidade e diferença serão conceituadas através de autores e pesquisadores da área. É um capítulo inicial que se mostra necessário para o entendimento da importância de combater preconceitos e estereótipos na sociedade. O capítulo II é constituído pela história dos primeiros humanos a chegarem na américa até suas culturas e artes desenvolvidas desde antes da chagada da colonização europeia, momento em que os grupos indígenas passaram a fazer parte de uma minoria cultural aos olhos do colonizador. Por último o Capítulo III busca reunir informações sobre a educação para as relações étnico raciais nos currículos de educação básica através de leis e documentos legais que asseguram o estudo da temática afro-brasileira, africana e indígena nas escolas. 14 1 CAPÍTULO I: IDENTIDADE E DIFERENÇA: UMA ABORDAGEM CONCEITUAL Diante da temática racial que será abordada ao longo desse trabalho, alguns conceitos e ideias são fundamentais para se entender a necessidade da implementação de leis e documentos oficiais que garantam o estudo da história e cultura indígena e afro- brasileira no currículo da educação básica. Durante esse capítulo será evidenciado conceitos e definições a respeito do que é identidade e diferença, tal como a importância do sentimento de representatividade social. Posteriormente ainda nesse capítulo discorremos acerca das origens e definições da prática racista e estereótipos culturais, caracterizando-se como assuntos de extrema importância para o debate de ideias relacionando-se a educação étnico-racial no Brasil. 1.1 Identidade, diferença e representatividade Regularmente a diferença é compreendida como uma entidade independente que se autorreferencia, nessa concepção a diferença é tomada como aquilo que o outro é, da mesma forma que a identidade é simplesmente aquilo que se é. Quando digo “sou brasileiro” parece que estou fazendo referência a uma identidade que se esgota em si mesma. “Sou brasileiro” - ponto. Entretanto, eu só preciso fazer essa afirmação porque existem outros seres humanos que não são brasileiros (SILVA, 2000, p. 74 - 75). Nesse olhar sobre o que é identidade e diferença, uma afirmação como “sou indígena” lê-se como: “não sou branco”, “não sou pardo”, “não sou preto” entre outros. Para que não haja a necessidade de pronunciar todas essas negações, a gramática simplifica a ideia geral da afirmativa ao dizer apenas “sou indígena”. Na perspectiva que propõe o autor Tomaz Tadeu da Silva “a identidade depende da diferença, a diferença depende da identidade. Identidade e diferença são, pois, inseparáveis (SILVA, 2000, p. 75). Essa alegação surge da hipótese de que se não existisse diferença no mundo, tão pouco, existiria a identidade, portanto é refutada a ideia que sugere ambas como entidades próprias que auto referenciam-se. De acordo com Fernandes e Souza, Na sociedade brasileira [...] as representações que prevalecem são construídas por narrativas hegemônicas, capazes de representar um grupo social em detrimento de outros. Essas representações foram construídas mediante a óptica 15 eurocêntrica, que institui sentidos de “normalidade” e “anormalidade”, estabelecendo como norma padrão o homem, branco, heterossexual, cristão. (FERNANDES; SOUZA, 2015, p. 104) De acordo com Fernandes e Souza (2016, p. 104 apud HALL, 1997), A representação é o processo pelo qual membros de uma cultura usam a linguagem para instituir significados. Essa definição carrega uma premissa: as coisas, os objetos, os eventos do mundo não têm, neles mesmos, qualquer sentido fixo, final ou verdadeiro. Somos nós, em sociedade, entre culturas humanas, que atribuímos sentidos às coisas. Os sentidos, consequentemente, sempre mudarão de uma cultura para outra e de uma época para outra. Algumas representações ganham mais alcance do prestígio social que outras, no Brasil o homem, heterossexual, branco e cristão tem um maior prestígio do que aqueles que não possuem tais caraterísticas, esse é um pensamento que advém de uma postura eurocêntrica, herança dos anos de colonização europeia e teorias eugenistas que ocorreram ao longo da idade moderna. Os indivíduos que não possuem o padrão citado são classificados como “diferentes” ou minorias, ocasionando em exclusão social e preconceito. A representatividade é tão importante para as pessoas, que mesmo não sendo uma minoria populacional, os negros (pretos, pardos e indígenas) continuam sendo o grupo mais afetado nesse processo de identidade. O oposto ao sujeito padrão mencionado anteriormente e bem visto aos olhos da sociedade brasileira seria uma mulher, homossexual, preta e desvinculada a qualquer prática religiosa ligada ao cristianismo. O sujeito agora mencionado tem uma representação social muito aquém ao primeiro exemplo, ao enxergar-se como parte do grupo da diferença, visto equivocadamente como algo negativo, dá-se início a um processor de crise de identidade, afinal, se o brasileiro bem visto pela sociedade é o seu oposto, como poderá esse indivíduo sentir-se tão parte dessa comunidade quanto o outro? Conforme ressalta Pereira (2004, p. 88 apud HALL, 2003) A chamada crise de identidade pode ser compreendida num processo mais amplo de deslocamento e mesmo de fragmentação do indivíduo moderno. Os quadros de referência que davam ao indivíduo uma certa sensação de pertinência em um universo centrado, de alguma forma, entram em crise, e passam a se constituir em algo descentrado e fragmentado. Os povos indígenas são um dos grupos mais afetados com essa perda de identidade, entre todas as etnias que constituem a população brasileira, hipoteticamente está quase sempre ocultada das grandes mídias, e não se vê esse povo representado em 16 diferentes âmbitos da sociedade como outros, as únicas referencias que se tem acesso são pautadas em estereótipos culturais, muitas vezes disseminados nos próprios espaços educacionais. 1.2 Racismo e Estereótipos Culturais Constantemente ouve-se que certo país tem uma cultura desenvolvida, ou mesmo que esse desenvolvimento está atrelado a questões tecnológicas e/ou industriais, se tratando de povos indígenas, desde a colonização foram enxergados como povos “sem cultura”, selvagens ou até mesmo sem alma. Segundo aponta Laraia, [...] a floresta amazônica não passa para o antropólogo — desprovido de um razoável conhecimento de botânica — de um amontoado confuso de árvores e arbustos, dos mais diversos tamanhos e com uma imensa variedade de tonalidades verdes. A visão que um índio Tupi tem deste mesmo cenário é totalmente diversa: cada um desses vegetais tem um significado qualitativo e uma referência espacial. (2001, p. 67) Portanto é um erro tentar classificar uma cultura como inferior a outra, por exemplo, existem saberes tribais que para um europeu em meio a grandes cidades populosas não seriam de nenhuma utilidade, da mesma maneira que algo como dirigir um carro não seria útil para o modo de vida dos nativos. “A nossa herança cultural, desenvolvida através de inúmeras gerações, sempre nos condicionou a reagir depreciativamente em relação ao comportamento daqueles que agem fora dos padrões aceitos pela maioria da comunidade. Por isto, discriminamos o comportamento desviante” (LARAIA, 2001, p. 67). O etnocentrismo é uma tendência em enxergar sua cultura como superior a outras, gerando desvalorização, preconceitos e estereotipagem de povos e conhecimentos milenares. Racismo é uma palavra derivada de racionalismo, uma antiga doutrina que dizia existir diferenças biológicas entre etnias, até o século XIX, raça era um sinônimo de linhagem e uma palavra pouco usada, ao longo do tempo passou a ser utilizado para designar diferenças entre espécies de animais e a espécie humana. “O racismo é uma doutrinaque já chegou a ter estatuto de teoria científica, mas que continuou vigorando como senso comum mesmo tendo sido amplamente contestado pela ciência contemporânea.” (BARRETO; ARAÚJO; PEREIRA, 2009, p. 192). 17 O racismo não afeta apenas a forma como um determinado grupo étnico é classificado na sociedade, ele promove desigualdades e exclusões, afetando diretamente nossa própria cultura de forma macro, a identidade brasileira devia acolher as diferenças que a constituem, e não as discriminá-las. Segundo levantamento realizado pelo IBGE em 2010, tínhamos no Brasil pouco mais de 800 mil indígenas (IBGE, 2012), uma população em crescimento demográfico, visto que, em 2001, eram 572 mil (IBGE, 2000). Em 2000, 44% viviam em zonas urbanas e 42% deles estavam fora das terras indígenas. De acordo com esses dados, os índios se encontram numa condição de exclusão social e moral: 51% não possuíam renda fixa e 32,5% possuíam renda inferior a R$ 576,00 (IBGE, 2000). Em 2010, os índios possuíam o mais baixo valor médio do rendimento mensal nos grupos de cor do Brasil: R$ 735,00, contra R$ 1538,00 dos brancos e R$ 834,00 dos negros. Ou seja, o rendimento médio de um índio perfazia 47,8% do rendimento de um branco (LIMA; FARO; SANTOS, pag. 221 apud IBGE, 2012). É importante ressaltar que o racismo sempre parte dos indivíduos que estão no topo dos padrões sociais para as minorias, de forma que questões como racismo contra brancos, ou racismo reverso não existe. Atualmente a prática racista é considerado um crime inafiançável, segundo o inciso XLII do artigo 5º, promulgado pela Constituição Federal de 1988, “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”. 18 2 CAPÍTULO II: HISTÓRIA, ARTES E CULTURAS INDÍGENAS 2.1 O surgimento do homem na América Entre as teorias que buscam compreender a chegada do homem no continente americano duas são mais aceitas entre os estudiosos. A primeira teoria, conhecida como a hipótese asiática, datada entre 18 e 13 mil anos que sugere a chegada dos seres humanos através do cruzamento de uma pequena ponte de gelo localizada numa região entre a Rússia e os Estados Unidos, conhecida como o estreito de Bering. Seguindo essa linha de raciocínio, teriam aos poucos se dispersado em direção ao sul. A outra hipótese é denominada malaio-polinésia, e propõe a chegada dos seres- humanos por meio de embarcações primitivas através das ilhas do pacífico a costa sul do continente americano, por volta de 10 mil anos. Entretanto descobertas como o fóssil humano encontrado em Lagoa Santa no estado de Minas Gerais, com datação aproximada em 11.500 anos, e o resquício do que poder vir a ser uma possível fogueira pré-histórica encontrada no estado de Piauí, com datação aproximada em 48.500 anos, contribuíram para novas hipóteses de migração. Umas das hipóteses mais aceitas para a chegada do homem no Brasil é a defendida por Walter Neves, que afirma que teriam ocorrido duas migrações separadas de dois grupos diferentes, ambas, porém, provenientes da Ásia. Segundo ele, a primeira teria ocorrido há cerca de 13 mil anos e seria de uma população com feições semelhantes às dos aborígenes australianos. Para ele, esses homens pré-históricos teriam entrado no continente americano pelo Alasca, provavelmente com auxílio de canoas. Essa teoria explicaria as características encontradas na reconstituição do crânio de Luzia. (SANTIAGO, 2015, p. 33) Apesar das muitas hipóteses estudadas sobre o surgimento do homem nas Américas, é fato que eles deram origem aos povos nativos que aqui vivem desde o período anterior a chegada dos Europeus. Ao contrário do senso comum, estudos mostram que esses grupos desenvolveram civilizações e estabeleceram uma grande diversidade de culturas, linguagens, crenças e conhecimentos. 2.2 A arte pré-histórica brasileira A arte é uma palavra contemporânea, aos homens pré-históricos não é possível saber se existiu alguma nomenclatura para designar as mesmas ideias de arte da atualidade, 19 entretanto possuíam comportamentos similares aos nossos, como por exemplo o prazer visual e tátil. Acredita-se que esse ser humano primitivo buscava representar o mundo e a sua realidade em imagens e figuras presentes de formas figurativas ou abstratas. Durante o período paleolítico as representações eram feitas de forma naturalista e figurativa, buscando o máximo de fidelidade ao real, no período neolítico as imagens valorizadas buscavam ressaltar formas geométricas, símbolos e uma certa poética visual. Diferentemente da Europa, no Brasil o período considerado como pré-história remete a todo a época anterior a chegada dos portugueses. Os conceitos de Pré-história na Europa e na América são distintos. Na Europa, referem-se ao período do surgimento do homem e aos primeiros ideogramas, cerca de 3500 a.C. a 4000 a.C. Para Funari e Noelli, o conceito na América se aplica ao período que antecede a chegada dos europeus, em 1942, de forma geral e, no caso dos brasileiros, em 1500 (PEREIRA, 2011, p.23). A pré-história brasileira é contrária a contada pela percepção europeia, foi marcada pela ausência de um clima frio, não se alojavam em grutas e cavernas, e não havia presenças de animais normalmente representados em pinturas rupestres pela Europa, como mamutes e bisões. Hipoteticamente essas ideias errôneas sobre a história do Brasil anterior a colonização, se deve pelo fato de não ser tão explorada como deveria nos currículos da educação básica e mesmo no ensino superior. 2.2.1.1 Cerâmicas e Esculturas A arte dos ameríndios é marcada sobretudo pela fabricação de cerâmicas, estátuas, pinturas corporais e ornamentos de decoração, pela grande diversidade de povos existentes até chegada dos portugueses em que estimasse a presença de mais de cinco milhões de indivíduos, é natural que os grupos se diferenciassem entre si, por isso na arqueologia a chamada “tradição” busca identificar quais eram essas populações pré-históricas que se localizavam ao longo do território brasileiro. 2.2.1.1.1 Tradição Tupi-Guarani A produção de cerâmica na tradição tupi-guarani se dividiu em dois grupos geográficos, o primeiro localizado a partir do litoral de São Paulo ao Ceará, denominados como proto-tupi, e o segundo entre o sul do litoral de São Paulo e o norte da Argentina, 20 conhecidos como proto-guarani. “A parte pintada “proto-tupi” é reservada para a parte interna de grandes vasos, que mediam entre 30 e 70 centímetros [...] eram pintados com figuras geométricas, combinando as cores vermelha, preto e branco” (SANTIAGO, 2015, p.94). Referente a cerâmica proto-guarani “[...] se destaca pela produção de grandes urnas com até 1 metro de diâmetro. [...] As vasilhas pintadas meridionais eram decoradas com figuras geométricas de maneira regular e repetitiva.” (SANTIAGO, 2015, p.95). Era vasta a quantidade de materiais em cerâmica produzidos por esses povos, como tigelas, pratos, panelas, decorações, urnas funerárias e ornamentos labiais. Era atribuído as mulheres a produção e decoração das cerâmicas que tinham como características bordas reforçadas, fundos arredondados e linhas e pontilhados com pigmentos predominantes em vermelho, preto e marrom. 2.2.1.1.2 Tradição Sambaquiera Entre 6500 anos a 500 anos atrás os povos da tradição sambaquiera eram caçadores, coletores e estabeleciam seus acampamentos em áreas estratégicas. A palavra sambaqui oriunda do tupi-guarani significa “monte de conchas”, isso se deve ao fato de seus assentamentos estarem localizados em montes de conchas empilhadas que produziam mini morros, em muitos desses morros encontrou-se objetos pessoais desses povos, como cerâmicas a urnas funerárias com fosseis humanos. Desenvolveram a produção de instrumentos conhecidocomo indústria odonto- osteo-malacológica, um termo que designa o uso de ossos de animais, dentes e conchas para a confecção de perfuradores, arpões, pingentes e objetos cortantes. Entre suas esculturas pode-se encontrar dois grupos distintos de produções, um que priorizava formas geométricas como cruz, ovoides e triângulos, e outro que figuravam zoólitos naturalistas esculpidos em pedras, geralmente utilizados em rituais ou no cotidiano. Por terem uma cultura voltada para a apreciação dos rios, lugar onde pescavam e se locomoviam, era comum a predominância de estátuas que representassem os animais aquáticos. O fato de a grande maioria das esculturas apresentarem a cavidade na parte ventral leva a pensar que estão referidas ao domínio da reprodução e da fertilidade. A reprodução de maneira bem explícita está mencionada nas esculturas que mostram pássaros copulando e a fertilidade, no objeto que apresenta um casal de peixes no momento d\a desova (GASPAR, 2000, p.54) 21 Com o tempo os povos da tradição sambaquiera foram desaparecendo ao longo em que a presença dos tupis-guaranis foram crescendo, muitos dos sambaquis que guardavam objetos e fósseis foram usados durante a colonização portuguesa para a produção de cal, utilizado nas construções de cidades. 2.2.1.1.3 Tradição Umbu Uma tradição de aproximadamente 12 mil anos que foi constituída por comunidades caçadoras provenientes do sul do Brasil, ainda se tem pouco conhecimento sobre esses povos, mas sabe-se que viviam em cavernas ou ambientes abertos e produziam instrumentos de pedra “extremamente trabalhados, que são verdadeiras belezas, como pontas de lança, pontas de flechas, raspadores, furadeiras, facas e boleadeiras” (SANTIAGO, 2015, p.98). 2.2.1.1.4 Tradição Marajoara e Tapajônica Estabelecida entre os séculos IV e XII d.C. encontrassem duas culturas paraenses muito importantes para o estudo da pré-história brasileira. A tradição marajoara é advinda da Ilha de Marajó e se desenovelou por volta de 1.800 anos. “Considerada sofisticada pelos pesquisadores, ocupou morros artificiais chamados tesos. Esses eram construídos ao longo dos rios e às margens de lagoas, para que as moradias não fossem alagadas durante as cheias” (SANTIAGO, 2015, p.98). Em suas esculturas destacam-se as Muiraquitãs, entalhadas em madeira, jade ou pedra, representam o sexo feminino. Conforme aponta Proença (2005, p. 191), A produção mais característica desses povos, foi a cerâmica, cuja modelagem era tipicamente antropomorfa. Ela pode ser dividida entre vasos de uso doméstico e vasos cerimoniais e funerários. Os primeiros são mais simples e geralmente não apresentam a superfície decorada. Já os vasos cerimoniais possuem uma decoração elaborada, resultante da pintura bicromática ou policromática de desenhos feitos com incisões na cerâmica e de desenhos em relevo. Geralmente as peças de cerâmica eram pintadas com tinta branca e decoradas com figuras geométricas com pimentos vermelho ou preto. As cerâmicas tapajônicas datam de aproximadamente 6.500 a.C. ao século XVI , e são caracterizadas pela presença de pinturas 22 com representações humanas ou animais em relevo, além de vasos também são encontradas cerâmicas em forma de cachimbos e estatuetas voltadas ao naturalismo. 2.2.1.1.5 Sociedades da Amazônia Pré-Colonial Ao contrário do que acreditam os leigos, estudos apontam a presença de sociedades bem estabelecidas socialmente na região da floresta amazônica. Eduardo Góes Neves, do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, e sua equipe mapeou setenta sítios arqueológicos na região de confluência entre os rios Solimões e Negro, a trinta quilômetros de Manaus. As análises apontam para o fato de que, ao contrário do que se imaginava, existiram sociedades bastante complexas na Amazônia antes da chegada dos portugueses no século XVI (SANTIAGO, 2015, p.103). Em meio as escavações foram localizadas urnas funerárias, esqueletos humanos e fragmentos de cerâmica, o solo dessas descobertas conhecido como terra preta, são extremamente férteis, entretanto com a chegada dos europeus esses solos foram desaparecendo e se tornando raros na Amazônia. 2.2.1.2 Gravuras e Pinturas Atualmente é tido como consenso entre os pesquisadores que o Brasil é um país rico em pinturas rupestres, apenas no estado do Piauí existem cerca de seiscentos sítios arqueológicos com esse tipo de produção. Essas pinturas registram a presença das primeiras manifestações estéticas do Brasil e marcam o início da arte no país. Muitas são as interpretações que se pode ter dessas imagens na atualidade, conforme afirma Prous (1992), “existe uma possível associação com a representação de rituais e magia.” Evidenciando a relação dos homens pré-históricos com crenças religiosas, outras interpretações são comumente ligadas a efeitos alucinógenos, onde as figuras não identificáveis poderiam ter sido resultantes de algum ritual com ingestão de plantas consideradas sagradas para esses povos. Devido as dimensões continentais do Brasil, os pesquisadores, assim como nas cerâmicas e esculturas, agrupam as pinturas e gravuras encontradas em sítios arqueológicos a partir da temática e dos elementos em comum com alguma ligação entre si, essa unidade também é conhecida como tradição. 23 2.2.1.2.1 Tradição Agreste Localizada em estados do Nordeste como Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Piauí, a tradição Agreste teria surgido a 9 mil anos e apresenta uma variedade de grandes figuras geométricas e biomorfas. Marcas carimbadas de mãos e pés também são comuns. A tradição agreste é subdividida nos estilos Cararis Velhos, Sobradinho, Piauí e Apodi. 2.2.1.2.2 Tradição Nordeste Dentro dessa cultura está a região da Serra da Capivara no Piauí, um dos parques mais importantes do mundo para o estudo de pinturas e figuras rupestres. Há presença de muitas representações de figuras humanas, animais, plantas e objetos, sua característica de arte formalista despensa o uso do naturalismo e projetando ao observador uma sensação estética de movimento. Por ser uma tradição com muitas quantidades de sítios arqueológicos, dividiu-se a tradição em sub tradições e estilos, o mais amplamente estudado é a Várzea Grande no Piauí, outros sub estilos encontrados são a Serra da Capivara, Serra Talhada, Serra Branca e a Seridó. 2.2.1.2.3 Tradição Planalto Disseminada ao longo dos estados de São Paulo, Minas Gerais e Bahia a tradição planalto é marcada pela presença de grafismos usualmente nas cores vermelho, preto, amarelo e branco. As representações mais comunssão antropomorfas e zoomorfas, sendo essa último por animais como cervídeos, peixes ou pássaros. A região de Lagoa Santa em Minas Gerais, onde foi encontrado o fóssil mais antigo das américas, pertence a essa tradição. 2.2.1.2.4 Tradição São Francisco É uma tradição que está presente nos estados de Minas Gerais, Bahia, Sergipe, Goiás e Mato Grosso as margens do Rio São Francisco. Normalmente apresenta figuras 24 geométricas e abstratas com a presença da bicromia, predominado as cores amarelo e vermelho. 2.2.1.2.5 Tradição Geométrica Uma das maiores tradições do brasil, se localiza entre o sul do estado de Santa Catarina ao nordeste brasileiro. Com um surgimento aproximado entre 6 mil a 4 mil anos, as pinturas são consideradas grafismos puros. Partes do corpo como mãos, pés, figuras humanas e animais como lagartos e outros repteis aparecem com frequência e são característicos de outras regiões como no Chile e na Oceania. 2.2.1.2.6 Tradição Meridional Raramente encontrada em abrigos e grutas, a tradição meridional é típica do estado do Rio Grande do Sul. A gravuras apresentam padrões geométricos e muitas vezes representação do que seria a pegada de animais típicos da região, como por exemplo felinos e aves. Era comum o uso da técnica de picotamento para a criação das pinturas, a predominância de cor é o preto, verde e marrom, os pesquisadores acreditam que os povos da tradição meridional estejam associados com os grupos da tradição umbu. 2.2.1.2.7 Tradição Amazônica Diferente do senso comum, as pinturas dessa tradição não se encontram em grutas e cavernas, e sim em rochas encontradas ao longo dos rios, esteticamente é a mais diferente das outras tradições encontradas no Brasil, aproximando-se mais a figuras encontradas em outros países da região amazônica. 2.2.1.2.8 Tradição Costeira Oriunda do litoral catarinense, apresenta figuras geométricas com a presença de triângulos e pontos, assim como na tradição meridional, a utilizavam técnica de polimento e picotamento, criando ranhuras de aproximadamente três centímetros. Essas representações são de difícil acesso, sendo encontradas apenas em ilhas costeiras. 25 2.2.1.2.9 Tradição Itacoatiara Devido a sua grade dimensão, do norte ao sul do Brasil, apresenta algumas diferenças que levantam discussões acerca da existência ou não existência da tradição itacoatiara. Os grupos de grafismo dessa tradição são separados em duas subdivisões, as itacoatiaras do oeste e as itacoatiaras de leste, presentes no nordeste brasileiro e com representações voltadas ao culto das águas. 2.2.2 As artes indígenas na atualidade Segundo aponta Proença (2005, p. 193), Apesar de terem existido muitas e diferentes tribos, é possível identificar ainda hoje duas modalidades gerais de culturas indígenas: a dos silvícolas, que vivem nas áreas florestais, e a dos campineiros, que vivem nos cerrados e nas savanas. Os silvícolas possuem um conhecimento agrícola desenvolvido associado a atividades de caça e pesca, entre suas produções estão a cerâmica, a tecelagem e o trançado de cestas. Os campineiros têm uma cultura mais simples e seus artefatos são menos elaborados que os silvícolas, porém detém a produção de cestos que figuram entre os mais bem elaborados pelos indígenas. Além disso é comum que os grupos indígenas da atualidade tenham um interesse na arte plumária e na pintura corporal sendo essa uma das poucas modalidades de arte indígena que não é utilitária, se atendendo apenas a fins estéticos em busca da beleza. 26 3 CAPÍTULO III: O PERCURSO DAS RELAÇÕES ÉTINICO-RACIAIS NA EDUCAÇÃO BRASILERA Durante o curso de Artes Visuais bem como nas escolas de educação básica em disciplinas como Educação Artística, História ou Geografia os focos de estudo são majoritariamente as civilizações europeias, que de fato, tiveram uma grande importância para a construção social e cultural dos brasileiros, mas que não deve ser tratada como a única influenciadora. Na tentativa de recuperar a valorização da auto identidade proveniente de outros povos que constituíram o Brasil alguns documentos legais vêm sendo instituídos para que se torne obrigatório a inserção de conteúdos com temáticas raciais na educação básica e superior. As leis Lei nº 10.639/03 e Lei nº 11.645/08 torna obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e africana nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, públicos e privados. A lei ainda traz os seguintes parágrafos: § 1° O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil. § 2° Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras.” (Brasil, 2008) O Brasil é um país de muitos grupos étnicos que ao longo de sua história conseguiu o êxito de se manter geograficamente unificado, diferentemente dos seus vizinhos sul-americanos, atualmente em seu macrocosmo possui uma cultura compartilhada por todo o território nacional, com diferenças regionais. Ao menos é essa a crendice do senso comum, questões como o racismo são altamente abomináveis na sociedade atual, mas ela zela por uma cultura europeia e despreza as outras raízes étnicas que constituíram a pátria. 3.1 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional A Lei de Diretrizes e Bases da Educação é um documento que define e regulariza a organização da educação no Brasil segundo os princípios estabelecidos pela constituição 27 federal no artigo 206. Foi criada em 1961 conhecida como Lei Darcy Ribeiro, vindo a ser reformulada em 1971, e mais recentemente em 1996. Composta por 92 artigos, rege desde o ensino infantil ao ensino superior. Segundo o Art. 26-A. “Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro- brasileira e indígena” (BRASIL, 1997). Entretanto esse é um texto que foi inserido pela redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008, caracterizando, portanto, na não obrigatoriedade da temática indígena no currículo escolar antes do ano de 2008. 3.2 Parâmetros Curriculares Nacionais Os Parâmetros Curriculares Nacionais é um referencial para a educação de qualidade no ensino fundamental, visando a orientação para a prática docente de professores de escola públicas e particulares, contam com um total de 10 volumes, sendo esses língua portuguesa, matemática, história e geografia, ciência, arte, educação física, ética, meio ambiente, saúde pluralidade cultural e orientação sexual. Os Parâmetros Curriculares Nacionais constituem um referencial de qualidade para a educação no Ensino Fundamental em todo o País. Sua função é orientar e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional, socializando discussões, pesquisas e recomendações, subsidiando a participação de técnicos e professores brasileiros, principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com a produção pedagógica atual. (PCNs, 1997, pag. 13) Os PCNs foram criados no ano seguinte a LDB em 1997, numa tentativa do governo em melhorar a qualidade da educação já que a oferta de vaga não era suficiente para garantir uma aprendizagem significativa. Analisando o PCN de História e Geografiaé possível encontrar o seguinte objetivo: A opção de introduzir estudos de povos indígenas é relevante por terem sido os primeiros habitantes das terras brasileiras e, até hoje, terem conseguido manter formas de relações sociais diferentes das que são predominantes no Brasil. A preocupação em identificar os grupos indígenas que habitam ou habitaram a região próxima do convívio dos alunos é a de possibilitar a compreensão da existência de diferenças entre os próprios grupos indígenas, com especificidades de costumes, línguas diferentes, evitando criar a imagem do índio como povo único e sem história. (1997, pag. 36) Portanto, deu-se a opção de introduzir a temática indígena ao longo do desenvolvimento do conteúdo, entretanto não se tornando algo obrigatório, já no PCN de 28 Arte a única menção sobre os indígenas em todo volume se resume em utilizá-lo como exemplo situacional em que uma criança “da cidade” pode estabelecer mais contato com um indígena observando sua arte do que participando dos seus ritos nas comunidades propriamente ditas. 3.3 Plano Nacional de Educação O Plano Nacional de Educação (PNE) é uma Lei Federal N° 13.000/2014 onde são definidas metas a serem alcançadas por meio de ações e estratégias, visando uma melhoria na qualidade da educação nacional. O PNE garante que as comunidades indígenas e quilombolas tenham acesso a educação básica, priorizando sua identidade cultural e ofertando serviços como o Atendimento Educacional Especializado (AEE), entretanto se tratando da inserção da história e cultura indígena, o item 7.25 é o único que aborda a temática, Garantir nos currículos escolares conteúdos sobre a história e as culturas afro- brasileira e indígenas e implementar ações educacionais, nos termos das Leis nºs 10.639, de 9 de janeiro de 2003, e 11.645, de 10 de março de 2008, assegurando- se a implementação das respectivas diretrizes curriculares nacionais, por meio de ações colaborativas com fóruns de educação para a diversidade étnico-racial, conselhos escolares, equipes pedagógicas e a sociedade civil; (BRASIL) O item assim como na LBD passa a ser considerado como fundamental no currículo escolar após as Leis nºs 10.639, de 9 de janeiro de 2003, e 11.645, de 10 de março de 2008, que tratam especificamente desse assunto. 3.4 Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica fala do conjunto sequencial das etapas das modalidades da educação básica, as etapas são a educação infantil, o ensino fundamental, o ensino médio e as modalidades são as formas como a educação acontece, podendo ser educação profissional, educação indígena e quilombola, educação especial, educação de jovens e adultos e educação a distância. Baseia-se no direito de toda pessoa ao seu pleno desenvolvimento. 29 3.5 Base Nacional Comum Curricular A Base Nacional Comum Curricular é um documento para toda a educação básica, atendendo a educação infantil, ensino fundamental e médio A BNCC integra a política nacional da Educação Básica e vai contribuir para o alinhamento de outras políticas e ações, em âmbito federal, estadual e municipal, referentes à formação de professores, à avaliação, à elaboração de conteúdos educacionais e aos critérios para a oferta de infraestrutura adequada para o pleno desenvolvimento da educação. [...] espera-se que a BNCC ajude a superar a fragmentação das políticas educacionais, enseje o fortalecimento do regime de colaboração entre as três esferas de governo e seja balizadora da qualidade da educação. Assim, para além da garantia de acesso e permanência na escola, é necessário que sistemas, redes e escolas garantam um patamar comum de aprendizagens a todos os estudantes, tarefa para a qual a BNCC é instrumento fundamental. (BRASIL, p. 8) A BNCC preocupa-se em seu planejamento na reversão da situação de exclusão histórica vivida pelos povos indígenas, vejamos a seguir. 3.5.1 Artes Visuais e Temática indígena na BNCC A BNCC traz como competências para o ensino na disciplina de arte, Explorar, conhecer, fruir e analisar criticamente práticas e produções artísticas e culturais do seu entorno social, dos povos indígenas, das comunidades tradicionais brasileiras e de diversas sociedades, em distintos tempos e espaços, para reconhecer a arte como um fenômeno cultural, histórico, social e sensível a diferentes contextos e dialogar com as diversidades. (BRASIL, p. 198) Portanto é possível observar que ao longo do currículo de arte na BNCC, os conteúdos que envolvem a temática indígena e afro-brasileira se mostram presentes de o ensino infantil ao ensino médio, abordando os conteúdos de igual para igual. 30 ARGUMENTAÇÃO E DISCUSSÃO Diante do estudo estabelecido, percebe-se a importância dos povos indígenas para a construção do Brasil como nação, foram os primeiros habitantes a chegarem as terras americanas e a se estabelecerem, demonstrado uma rica cultura de muitas especificidades entre si mas que após a chegada dos europeus e sua respectiva colonização foi se extinguindo da nossa história. Após a dominância europeia sobre as terras onde hoje se situa o Brasil os padrões sociais mudaram drasticamente, o olhar eurocêntrico passou a predominar na sociedade e tudo o que fosse diferente causaria estranheza e inferiorização, portanto estereótipos e preconceitos raciais foram e são muito presentes. Entender que a história do Brasil não começa com a chegada dos portugueses, nem que nossa arte se inicia com o barroco são questões que não tinham obrigatoriedade nos currículos escolares, o aluno não pertencente a etnia caucasiana sempre se via como parte de um grupo historicamente minoritário e sem representação em quaisquer campos prestigiados na sociedade. Em busca do fim desses preconceitos medidas legais foram tomadas para que se resgatasse essa identidade e importância cultural, e atualmente os currículos da educação básica contam com a presença efetiva da temática racial, mudando o percurso da identidade brasileira e contribuindo para a valorização de todas as culturas encontradas no Brasil. 31 CONCLUSÃO Conclui-se com esse trabalho que a riqueza de culturas e artes indígenas são uma parte a se orgulhar da História do Brasil, mas que nem sempre se deu dessa maneira. A educação para as relações étnico raciais é uma proposta nova de ensino, buscando a igualdade curricular ao abordar conteúdos curriculares que contribuem para a formação da identidade do indivíduo brasileiro, a inclusão da temática racial de afro-brasileiros e indígenas deve ser vista como uma forma de reparar os anos de preconceito e exclusão que causaram no atraso do desenvolvimento do país. Com esse estudo foi possível perceber que a temática indígena, especificamente aqui tratada, não era uma obrigatoriedade no currículo da educação básica até a criação da lei nº 10.639/03, portanto, apesar de na atualidade essas questões serem tratadas com o vigor e importância que mereciam, ainda é preciso muitos anos de desenvolvimento dessas práticas igualitárias para se alcançar os objetivos apontados nos diversos documentos regulatórios de educação. 32 REFERÊNCIAS BARRETO, A.; ARAÚJO, L.; PEREIRA, M. E. (Org.). 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