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Ensaio 2 de SJ - A relação entre liberalismo e escravidão no Brasil como resultado de uma construção política

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE DIREITO
DISCIPLINA: SOCIOLOGIA JURÍDICA
DOCENTE: MATEUS ROCHA TOMAZ
DISCENTE: JOÃO GUILHERME BEZERRA DA SILVA OLIVEIRA
MATRÍCULA: 200058509
Segundo Módulo
Tema: Como Marcelo Neves, Alfredo Bossi, Susan Buck- Morss e Marcos Queiroz articulam a relação entre liberalismo, constitucionalismo e escravidão no Brasil do século XIX?
Título: A relação entre liberalismo e escravidão no Brasil como resultado de uma construção política
Introdução:
A escravidão, como modelo socioeconômico utilizado pelas potências europeias durante a colonização das américas, se baseava no tráfico de escravos oriundos do continente africano por meio do Oceano Atlântico, cujas rotas ligavam os continentes americano, africano e europeu. Mesmo após a sua completa abolição, concretizada após a declaração da Lei Áurea em 1888 no Brasil, as consequências da escravidão ainda são feridas abertas nas sociedades americanas, especialmente no que se refere ao Brasil, o último país ocidental a abolir a escravidão por completo.
Com base nisso, empreenderemos nesse ensaio uma análise de como que a escravidão foi capaz de perseverar como sistema socioeconômico no Brasil, e qual o papel do liberalismo e da política nessa manutenção do escravismo durante o século XIX.
Desenvolvimento:
O paradigma, conceito oriundo da filosofia da ciência de Thomas Kuhn, nos permite compreender que o desenvolvimento da ciência em uma determinada época se limita aos esquemas de pré-compreensão e às visões de mundo que as pessoas desse tempo possuem. Nesse caso, o desenvolvimento científico se dá por meio de rupturas desses entendimentos pré-determinados por novos, e isso se aplica a todas as áreas do conhecimento, inclusive o direito. (CARVALHO NETTO, 2004, p.29)
Nesse sentido, o professor Menelick de Carvalho Netto definiu 4 paradigmas do direito: o pré-moderno, o Estado de Direito, o Estado de Bem-Estar Social e o Estado Democrático de Direito, sendo que os três últimos pertencem à Modernidade. (IBIDEM) Para fins deste ensaio, apenas o paradigma do Estado de Direito importa.
O Paradigma do Estado de Direito, ou Paradigma do Estado Liberal, surge do movimento constitucionalista dos séculos XVIII-XIX, e é caracterizado pelo papel exercido pelo direito de ordenamento constitucional e legal, que impõe os ideais abstratos de liberdade individual e igualdade perante a lei (IBIDEM, p.31). Essas ideias, advindas do jusracionalismo iluminista, vão se tornar a base jurídico-política dos países ocidentais, e isso inclui os países americanos.
Contudo, o grande defeito desse paradigma liberal é que, como dissertado por Menelick, a vivência das leis abstratas acaba que por nega-las na prática. (IBIDEM, p.34) Enquanto que na Europa havia a exploração econômica absurda da classe operária pela burguesia e a limitação da participação política segundo o critério de renda, nas sociedades coloniais havia a paradoxal defesa do liberalismo e da escravidão.
Apesar de parecer uma contradição absurda, a coexistência do liberalismo e da escravidão era muito comum em países como os Estados Unidos e o Brasil, porém especialmente no segundo, visto que, como já mencionado na introdução, este foi o último país americano a abolir a escravidão. Além disso, pode-se inclusive afirmar que o liberalismo foi imprescindível para a defesa da escravidão no Brasil do século XIX.
Isso se deve ao fato de que o liberalismo brasileiro não era o mesmo que o liberalismo europeu, que defendia o trabalho livre e assalariado afim de beneficiar a burguesia industrial, mas sim um liberalismo que defendia o trabalho escravo, com o objetivo de agradar a burguesia senhorial e escravocrata. Entretanto, seria correto chamar isso de liberalismo? Afinal, a defesa do trabalho livre e da liberdade individual sempre foram características fundamentais da ideologia liberal, logo, seria correto chamar o que existia no Brasil de liberalismo?
No que se refere a isso, a dissertação do professor Marcelo Neves é essencial para entendermos a lógica desse liberalismo-escravista. Com o intuito de rebater uma tese do professor Roberto Schwarz de que os ideais liberais no Brasil seriam “ideias fora do lugar”, Marcelo Neves retoma a ideia de sociedade mundial de Luhman, defendendo que é impossível entender a sociedade brasileira de maneira isolada do resto do mundo, pois o sistema de comunicação é mundial. 
Com base nisso, Neves afirma que as ideias liberais são artefatos semânticos da sociedade moderna mundial, que variam segundo a sua adequação aos diversos contextos do planeta. No caso do Brasil, uma vez que a escravidão era o modelo socioeconômico desde seu tempo como colônia, e como existia uma elite de fazendeiros brancos que dependiam do trabalho escravo, os princípios liberais foram entrecortados para se adequarem a defesa da escravidão. 
Ademais, essa adequação era mais fácil, visto que os dois principais pilares da ideologia liberal sempre foram a defesa da liberdade individual e da propriedade privada. Nesse sentido, como o escravo era considerado como propriedade de seu dono, e como todos tem direito à propriedade privada, a posse de um ser humano por outro era completamente legítima. Por isso que a afirmação de Alfredo Bossi de que o impasse entre liberalismo e escravidão no Brasil era falso (BOSSI,1992, p.195) é tão importante, pois reafirma a tese de Marcelo Neves de que os ideias liberais, retirados de seu contexto europeu e contextualizados no Brasil, são plenamente compatíveis com a escravidão.
Além disso, as contribuições de Alfredo Bossi sobre esse assunto são deveras importantes, pois elas demonstram a importância da classe política na manutenção do regime escravocrata. Como representantes das elites açucareiras, dos traficantes negreiros e das firmas exportadores, era dever dos políticos, conservadores ou liberais, defenderem a escravidão, afim de manter os lucros dos fazendeiros e das firmas, já que a economia brasileira era agroexportadora, e o tráfico negreiro, visto que a compra e a venda de escravos é fundamental para que a escravidão perdure.
Inclusive, o Brasil possuía leis que desde 1826 criminalizavam o tráfico negreiro, oriundas de um acordo com a Inglaterra, que eram motivo de grande revolta por parte dos políticos brasileiros, contrários a intervenção britânica em assuntos internos do país, que feriam a soberania do Brasil e os direitos individuais dos brasileiros (IBIDEM, p.197). Mais uma vez, percebe-se o uso de vocábulos do constitucionalismo liberal, como soberania e direitos individuais, para defender o direito das elites de possuírem escravos.
Entretanto, apesar de acordos como o de 1826 ou leis como a de 7 de novembro 1831, que dava liberdade a todos os escravos que entrassem no território brasileiro a partir dessa data, a escravidão corria a todo o vapor, com a conivência das autoridades públicas e dos políticos. Ademais, é interessante ressaltar que, durante a maior parte do século XIX, havia pouca ou nenhuma diferença entre os partidos liberal e conservador, uma vez que ambos representavam os mesmos grupos, e a sua unidade é aquilo denominado por Bossi como neutralização ideológica, isto é, a indiferença dos espectros políticos no que se refere à prática. (IBIDEM, p.219)
Entretanto, esse panorama político muda a partir de dos anos 60 do século XIX, pois nessa época há o surgimento de uma nova corrente do liberalismo, denominada liberalismo radical, que tem como principais integrantes Joaquim Nabuco e Rui Barbosa. Esse novo movimento surge da mudança da dinâmica econômica devido a extinção do tráfico negreiro e da liberação de dinheiro para afluir a economia, o que acelerou o processo de urbanização e possibilitou a troca do trabalho escravo pelo trabalho livre em algumas regiões do Brasil, como o Norte e o Nordeste. (IBIDEM, p.223)
Para esses novos liberais, a escravidão era um dos fatores que tornavam o Brasil um país atrasado, em desconformidade com as potências europeias e com os Estados Unidos, então era necessário abolir a escravidão para que o paíspudesse se desenvolver com a indústria e o trabalho livre. Além disso, para políticos como Joaquim Nabuco, a abolição era um assunto de interesse nacional, não apenas porque ela é responsável pelo atraso econômico da sociedade, mas também por uma questão moral, uma vez que a ela é um crime contra a humanidade (PUBLIFOLHA,2000, p.29), e também porque ela impede a criação de uma pátria nacional, pois retira a cidadania dos negros, que são parte integrante do povo brasileiro. (IBIDEM, p.6)
Uma das grandes inspirações de Joaquim Nabuco foi o político brasileiro José Bonifácio de Andrada e Silva, presidente da Assembleia Constituinte de 1823, na qual defendeu a abolição, reformas para os escravos e promulgação de leis que eliminassem gradualmente a escravidão e o tráfico negreiro. Suas principais influências liberais vieram de sua experiência na Europa, onde estudou por um tempo, e que lhe permitiram dar corpo a um movimento intelectual que pensava o Brasil como nação, e para que ela se desenvolvesse socialmente e economicamente, era necessário acabar com a escravidão. Ademais, também considerava a escravidão como um crime aos direitos naturais, pois retirava à força a autonomia dos escravos e os colocava em posição de objetos.
Nesse contexto, outro liberal radical importante foi Rui Barbosa, que tecia severas críticas aos fazendeiros e donos de escravos. Consoante ele, era inútil depender dos donos dos escravos para realizar as reformas, pois os interesses destes jamais permitiriam que eles apoiassem a abolição (BARBOSA,1884, p.163), e isso era facilmente demonstrado, por exemplo, pela defesa por parte dos políticos escravistas de que se deveria devolver os filhos dos escravos aos seus donos, o que contrariava a já aprovada Lei do Ventre Livre (IBIDEM, p.166). Além disso, para ele, a escravidão obedecia uma lógica fatal, pois ela legitimava o tráfico e o tratamento cruel dado pelo senhor, uma vez que, como o escravo foi adquirido por meio de compra, o senhor pode fazer o que bem entender. (IBIDEM, p.167) Entretanto, apesar de sua posição contrária à escravidão, ele acreditava que o melhor para o Brasil era uma transição passageira para o fim da escravidão, mediada por reformas graduais, de modo a não afetar abruptamente a economia e causar a desordem social. (IBIDEM, p. 170-171)
Nesse sentido, percebe-se uma grande inovação progressista dentro do liberalismo brasileiro, com uma defesa mais coerente das liberdades individuais e do direito à propriedade, de uma maneira que não retira os direitos e a autonomia do escravo. Todavia, esse novo movimento liberal ainda possuía muitas contradições. Isso se deve ao fato de que, tanto José Bonifácio como Joaquim Nabuco têm uma visão extremamente idealizada da sociedade brasileira, afirmando que na sociedade brasileira não existe preconceito, que a cor não é um obstáculo para os indivíduos racializados (PUBLIFOHA,2000, p.7), isso sem mencionar o racismo de ambos com outros povos como os indígenas e, no caso de Joaquim Nabuco em específico, com os chineses (IBIDEM, p.57). Além disso, pode-se incluir também o fato de que Nabuco defendia abertamente a imigração europeia para o Brasil como maneira de ajudar o país a se desenvolver (IBIDEM, p. 54), uma retórica muito similar à dos cafeicultores do Oeste Paulista, que pretendiam substituir a mão de obra escrava negra pela dos imigrantes europeus. 
Essas contradições podem ser melhor explicadas analisando um dos momentos mais importantes para o constitucionalismo brasileiro, a Assembleia Constituinte de 1823, presidida por José Bonifácio, e que deveria formular a nova Constituição para o país. Como dissertado pelo professor Marcos Queiroz, a função da constituinte era tecer os fios unificadores do Brasil, isto é, definir o funcionamento do país e como relacionar os diversos grupos que a integravam (QUEIROZ,2017, p.122). Nesse caso, era necessário discutir sobre qual seria o lugar do negro naquela sociedade. 
Contudo, é impossível entender completamente a importância da constituinte para a formação social brasileira sem analisar o contexto da época. Como já mencionado anteriormente, a contradição entre liberalismo e escravidão era aguda nas antigas colônias americanas, como é o caso dos EUA, que em sua constituição evocava os direitos naturais dos homens enquanto legalizava a escravidão (BUCK-MORSS,2011, p.137-138). Entretanto, havia uma ex-colônia que de fato assegurava o princípio iluminista da liberdade humana, advindo da Revolução Francesa: São Domingos, ou como é conhecida atualmente, Haiti.
O Haiti era uma antiga colônia francesa que possuía cerca de 500.000 escravos, possuindo a maior população de escravos das américas (IBIDEM, p.135). Contudo, enquanto a Revolução Francesa ocorria, os escravos se rebelaram violentamente e obrigaram a França a abolir a escravidão daquela e de todas as colônias francesas, e em 1801, o líder de São Domingos, Toussaint-Louverture, escreveu uma constituição para a colônia, a qual incluía a igualdade racial como um de seus princípios. Logo após uma guerra contra o exército de Napoleão, que tentou restituir a escravidão, a colônia de São Domingos sai vitoriosa e se declara independente, mudando o seu nome para Haiti (IBIDEM, p.138-139).
Nesse contexto, a Revolução Haitiana se tornou um grande símbolo de esperança para os negros, pois demonstrava que eles eram sim capazes de serem reconhecidos como seres humanos e terem direitos que nem os brancos. Nesse sentido, Queiroz pretende demonstrar como que o medo das elites brancas e escravocratas de um possível levante negro parecido com o do Haiti influenciou os debates parlamentares da Constituinte de 1823, e como que eles influenciam até hoje a tradição jurídica brasileira.
Segundo Queiroz, a função da Constituinte de 23 era garantir uma passagem tranquila e estável do Brasil colônia para um Brasil independente, assegurando os direitos compatíveis com a nova nação (QUEIROZ,2017, p.130). Entretanto, esses direitos compatíveis com a nação se referiam, em grande parte, aos direitos das elites econômicas de possuírem escravos, afim de se beneficiarem com a política agroexportadora, facilitada pela abertura dos portos em 1808. Como demonstra Bossi, a defesa do livre comércio desses liberais não significava necessariamente a defesa do trabalho livre, pois a escravidão foi mantida e inclusive fortalecida. (BOSSI,1992, p.198)
Nesse caso, os parlamentares precisavam criar uma identidade para o Brasil, e além disso, vincular essa identidade à escravidão. Nesse sentido, é possível compreender a defesa, por grande parte dos deputados, da monarquia constitucional como forma de governo pois, para eles, era o único governo que assegurava a unidade do país que e seria capaz de evitar uma revolução. Inclusive, o próprio José Bonifácio defendia os excessos cometidos pelo imperador, afirmando que era necessário calar as vozes opositoras ao Império e à “causa do Brasil” (QUEIROZ,2017, p.138).
Ademais, a fala de Bonifácio é importante para entender o racismo dos políticos que se diziam abolicionista e contrários à escravidão, visto que ele defende um modelo de governo que, na prática, beneficiava apenas as elites brancas escravocratas que, aterrorizadas com a possibilidade de uma revolta negra, queriam reafirmar e fortificar as hierarquias raciais e sociais. Infelizmente, esse posicionamento não era incomum, como demonstrado pelo discurso do deputado Silva Lisboa, que acreditava que os negros alforriados deveriam possuir direitos civis, além de defender uma abolição lenta e gradual da escravidão, que nem Rui Barbosa, e acompanhada por uma instrução moral dos escravos. (IBIDEM, p.162)
Pode-se depreender várias problemáticas da fala de Lisboa, como o fato dele defender o acesso aos direitos civis mas não mencionar os direitos políticos, porém acredito que sua defesa da abolição lenta e gradual, acompanhada por uma instrução moral é mais importante para compreender aquilo que Queiroz chama de abolicionismo branco. Isso se deve por dois motivos: primeiro, porquedemonstra que a percepção dos negros como inferiores aos brancos era homogênea entre todos os grupos, e segundo porque a defesa de uma abolição lenta e gradual é uma demonstração do medo que os brancos tinham do que aconteceria se houvesse uma libertação completa dos escravos. 
Inclusive, é importante mencionar que até mesmo os fazendeiros paulistas se juntaram ao movimento abolicionista, porém isso apenas aconteceu quando a mão de obra negra foi substituída pela dos imigrantes europeus, ou seja, quando não existia mais a chance de acontecer uma revolta negra. Desse modo, pode-se entender o abolicionismo brasileiro como um abolicionismo branco, que apesar de sua retórica progressista, é marcado por ideias racistas e pelo medo da real emancipação negra. Isso explica não apenas as posições racistas de políticos abolicionistas, mas também o racismo presente na tradição jurídica brasileira, que longe de ser uma exceção, é apenas a confirmação da regra.
Conclusão:
A construção social brasileira, no que se refere a questão da raça, foi definida pela ligação entre o liberalismo e a escravidão, juridicamente construída por uma classe política que representava os interesses de uma elite branca escravocrata, e efetivada pela Constituição de 1824, formulada por essa mesma classe política, sob a influência do medo de um levante negro que garantisse o reconhecimento da humanidade dos negros e seus direitos como seres humanos. Logo, é necessário estudar a formação do Brasil tendo em mente a raça como um de seus principais marcadores sociais, de modo a não cair na cegueira parcial, típica da literatura acadêmica ocidental, que tende a considerar fatos como a escravidão como meros detalhes, e não como fundamentais para a compreensão do mundo ocidental. (BUCK-MORSS,2011, p.134)
Referências
ANDRADA E SILVA, José Bonifácio de. Projetos para o Brasil. São Paulo: Companhia das letras, 1998, p.45-65, 150-182, 200-204, 206-220, 235-236.
BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo, Companhia das Letras, 1992. Capítulo 7 – A escravidão entre dois liberalismos.
BARBOSA, Rui. Apreciação Geral da Reforma. In: Emancipação dos Escravos. Câmara dos Deputados. Sessão de 4 de agosto do 1884. Projeto n. 48. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1884, p.163-186.
BUCK-MORSS, Susan. Hegel e o Haiti. Tradução: Sebastião Nascimento. In: Novos Estudos, CEBRAP, n. 90, 2011.
CARVALHO NETTO, Menelick de. A hermenêutica sob a Paradigma do Estado Democrático de Direito. In: Cattoni, Marcelo (coord.) Jurisdição e Hermenêutica Constitucional no Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 25-54.
NABUCO, Joaquim. O abolicionismo. São Paulo: Publifolha, 2000. Capítulos III, X, XI e conclusão.
NEVES, Marcelo. IDEIAS EM OUTRO LUGAR? Constituição liberal e codificação do direito privado na virada do século XIX para o século XX no Brasil. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais. RBCS, Vol. 30, n° 88, junho 2015.
QUEIROZ, Marcos Vinícius Lustosa. Constitucionalismo brasileiro e o Atlântico Nego: a experiência constitucional de 1823 diante da Revolução Haitiana. 2017, 200 f., il. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade de Brasília, Brasília, 2017.
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