Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
INTRODUÇÃO Informação e conhecimento constituem dimensões de uma nova fonte para a geração de riqueza nas organizações, os ativos intangíveis, que são “aqueles fatores não físicos e recursos sob algum grau de controle que são críticos para o sucesso do negócio, e que não são demonstrados no balanço financeiro” (ALLEE, 2003, p. 263). Nessa linha, em livro recentemente publicado, Haskel e Westlake (2018) enfatizaram uma grande mudança na natureza da acumulação moderna de capital: o investimento crescente de grandes e pequenas empresas não está mais nos chamados bens tangíveis, como máquinas, fábricas e escritórios, mas, sim, nos “intangíveis”, como produtos de software, bases de dados, marcas e design, entre outros. A gestão da informação e do conhecimento tem sido um tema bastante difundido na literatura acadêmica desde as duas últimas décadas do século XX, a partir das obras pioneiras de Drucker (1997) sobre a gestão da informação e de Nonaka e Takeuchi (1997) a respeito da gestão do conhecimento. A partir do crescimento de serviços e produtos baseados na internet por meio de empresas como a Google, das plataformas de redes sociais como o Facebook,1 e de um quadro de tecnologias que surgem e se renovam de forma cada vez mais rápida, o que se convencionou chamar de tecnologias emergentes da informação – TEI (TAURION, 2015). Hoje, constata-se que as empresas priorizam a busca de soluções para usar as informações de forma mais assertiva para apoiar a sua gestão. Nesse contexto, a gestão da informação e do conhecimento (GIC) ganha nova fronteira nas organizações, como apoio à percepção, pelos gestores, do uso das TEI como oportunidades de agregação de valor aos negócios, no plano interno e nas relações com o ambiente externo, tendo como base uma tríade composta de pessoas, processos e tecnologias. 1 Citamos Google e Facebook porque essas empresas constituem referência em nível mundial e estão presentes no imaginário das pessoas como modelos de uso dos ativos intangíveis no cerne dos negócios. _______________ Tendo as pessoas como o principal alicerce desse tripé, a GIC está ganhando uma nova dimensão nas organizações, apoiada nos recursos de computação cognitiva e orientada para a descoberta de insights relevantes para o processo de gestão. Dessa forma, convivem hoje nas organizações duas naturezas de inteligência: a humana, inerente às pessoas e comunidades que dela fazem parte; e a artificial, sob a forma de algoritmos criados para otimizar a execução dos processos de trabalho e a tomada de decisões. SUMÁRIO MÓDULO I – NOVAS FRONTEIRAS DA GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO ............ 7 PROCESSO DECISÓRIO E FORMAÇÃO DO CONVENCIMENTO DO GESTOR ................................... 8 ATIVOS INTANGÍVEIS: INFORMAÇÃO, CONHECIMENTO E INTELIGÊNCIA ..................................... 13 GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO ..................................................................... 18 DIMENSÕES HUMANA E PROCESSUAL DA GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO ............................................................................................................................................................ 20 SÍNTESE DOS TEMAS E CONCLUSÕES DO MÓDULO I ................................................................. 23 MÓDULO II – MÉTODOS E TECNOLOGIAS DE APOIO À GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO .................................................................................................................................. 25 ENTENDIMENTO DO DOMÍNIO DO NEGÓCIO ............................................................................. 27 Quadro de modelo de negócios ............................................................................................ 27 Design thinking .......................................................................................................................... 28 IDENTIFICAÇÃO E MONITORAMENTO DAS CADEIAS DE VALOR E PROCESSOS DE NEGÓCIO ............................................................................................................................................................ 29 Automação e monitoramento dos processos de negócio ................................................. 32 AMBIENTES DE DADOS E INFORMAÇÕES PARA A GESTÃO DOS PROCESSOS DE NEGÓCIO . 33 Big data analytics ...................................................................................................................... 35 COMPUTAÇÃO COGNITIVA COMO INSTRUMENTO PARA A GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO .............................................................................................................................. 38 Conceitos e aplicações da inteligência artificial ................................................................... 39 Conceitos e métodos para modelagem e estruturação do conhecimento organizacional .......................................................................................................................... 40 Arquitetura de informação e do conhecimento organizacional .................................. 41 Taxonomias ......................................................................................................................... 43 Tesauros .............................................................................................................................. 45 Ontologias ........................................................................................................................... 45 SÍNTESE DOS TEMAS E CONCLUSÕES DO MÓDULO II................................................................ 47 MÓDULO III – MODELOS, PROCESSOS E PRÁTICAS PARA GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO .................................................................................................................................. 49 ALINHAMENTO ENTRE AS ESTRATÉGIAS DO NEGÓCIO E DA GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO .............................................................................................................................. 50 ATIVOS INTANGÍVEIS NA AGREGAÇÃO DE VALOR PARA O NEGÓCIO ....................................... 52 MODOS DE CRIAÇÃO E COMPARTILHAMENTO DO CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL: ESPIRAL DO CONHECIMENTO ........................................................................................................ 55 Dimensão epistemológica da criação e compartilhamento do conhecimento............... 57 Dimensão ontológica da criação e do compartilhamento do conhecimento ...................... 59 PRÁTICAS DE GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO ............................................. 60 Práticas voltadas à socialização ............................................................................................. 61 Práticas voltadas à externalização ........................................................................................ 62 Práticas voltadas à combinação ............................................................................................ 63 Práticas voltadas à internalização ......................................................................................... 63 SÍNTESE DOS TEMAS E CONCLUSÕES DO MÓDULO III .............................................................. 64 MÓDULO IV – IMPLEMENTAÇÃO DE AMBIENTES DE INFORMAÇÃO E CONHECIMENTO ............. 67 PAPEL DA LIDERANÇA INOVADORA NA GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO 67 FATORES CRÍTICOS DE SUCESSO NOS PROJETOS DE GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO .............................................................................................................................. 69 ESTRATÉGIAS DE IMPLEMENTAÇÃO .............................................................................................. 70 DESENVOLVIMENTO E IMPLEMENTAÇÃO DEPROJETO PILOTO ................................................ 74 SÍNTESE DOS TEMAS E CONCLUSÕES DO MÓDULO IV .............................................................. 76 BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................................... 77 PROFESSOR-AUTOR ............................................................................................................................. 81 Os anos recentes têm-se caracterizado por avanços significativos nas tecnologias da informação e da comunicação, com profundos impactos na sociedade: na forma como vivemos e trabalhamos, como tomamos decisões e como interagimos com outras pessoas e em comunidades. A partir do crescimento de serviços e produtos baseados na internet e de um quadro de tecnologias que surgem e se renovam rapidamente, hoje se constata que as empresas priorizam a busca de soluções para usar a informação e o conhecimento de forma mais assertiva para apoiar a sua gestão. É nesse contexto que se inserem as chamadas tecnologias emergentes da informação – TEI (TAURION, 2015): ambientes de big data, computação em nuvem, plataformas de redes sociais, dispositivos que favorecem a mobilidade e a ubiquidade da informação, internet das coisas e inteligência artificial. É nesse quadro que a gestão da informação e do conhecimento está ganhando novas fronteiras nas organizações, apoiada nos recursos de computação cognitiva orientada para a busca de insights relevantes para o processo de gestão e de exploração dos negócios. Neste módulo, vamos apresentar os conceitos clássicos ligados à gestão da informação e do conhecimento, contextualizando-os na perspectiva do uso das tecnologias emergentes da informação, notadamente quanto a: � processo decisório e formação do convencimento do gestor; � ativos intangíveis – informação, conhecimento e inteligência; � gestão da informação e do conhecimento – aplicações na gestão interna e nas interações com o ambiente externo e � dimensões humana, processual e de métodos e tecnologias de gestão da informação e do conhecimento. MÓDULO I – NOVAS FRONTEIRAS DA GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO 8 Processo decisório e formação do convencimento do gestor A dinâmica do processo decisório nas organizações deve ser entendida a partir das seguintes premissas: � Os gestores em todos os níveis organizacionais tomam decisões, no seu dia a dia, para resolver problemas ou aproveitar oportunidades que se apresentam na sua esfera de competência de gestão. � Nos horizontes de médio e longo prazo, decidem sobre estratégias, planos de ação, bem como captação e aplicação de recursos, contemplando áreas funcionais, processos do negócio, ou o contexto da empresa de uma forma global. O desempenho efetivo de uma organização, portanto, é resultante da atuação individual das pessoas que dela fazem parte, e da ação integrada dos seus “times de gestão”, por meio de um conjunto de decisões nos planos estratégico, gerencial tático e operacional, associadas ao negócio. Cabe salientar que usamos o termo negócio, no contexto da disciplina, na acepção a ele conferida por Soares Neto (2009, p. 65): “negócio quer dizer não ócio (do latim negotium = nego + otium), significando ação, ocupação, envolvimento em alguma atividade produtiva”. Assim, quando falamos em “processo de negócio”, fazemos referência a atividades de interesse empresarial que são objeto de decisões, conceito aplicável tanto no setor privado como no âmbito da administração pública. Finalmente, a capacidade das pessoas para agir e decidir com efetividade é condicionada pelas suas competências, notadamente o seu conhecimento técnico e experiência adquirida relacionados a funções e tarefas específicas, a sua sensibilidade para perceber insights relevantes nas situações contextuais vivenciadas, os seus valores, as suas crenças e sua intuição. Sendo o processo decisório componente essencial do desempenho do gestor, pressupõe-se que as decisões sejam sempre tomadas em um contexto de plena racionalidade. Entretanto, essa situação ideal nem sempre se verifica na prática do dia a dia das organizações. Tal afirmativa foi originalmente sustentada por Simon (1965), na sua teoria da racionalidade limitada, na qual postulou que os modelos racionais de tomada de decisão tendem a explicar como os gestores deveriam tomar decisões, e não como as tomam efetivamente. Ainda segundo aquele autor, as pessoas no processo decisório são intencionalmente racionais, buscando tomar as decisões mais corretas possíveis dentro de um conjunto de restrições de tempo, de recursos e de capacidade, adotando, portanto, uma racionalidade limitada no seu modelo mental para analisar fatos e decidir, conforme ilustrado na figura que segue: 9 Figura 1 – Limitações à racionalidade no processo decisório Fonte: adaptado de Sobral e Pecci. Administração: teoria e prática no contexto brasileiro. 2008, p. 110. Nessa linha, ele afirma que a racionalidade do processo decisório sempre é condicionada por limitações situacionais e individuais, exprimindo, de um lado, a incapacidade do gestor de dominar toda a complexidade de situações objeto da tomada de decisões e, de outro, os limites cognitivos individuais das pessoas para acessar as informações e perceber insights relevantes para a gestão. Dessa forma, nas situações reais, as pessoas não conseguem alcançar a racionalidade objetiva – chegar de forma garantida à melhor escolha –, pois são limitadas e influenciadas pela sua incapacidade física e mental de conhecer, em tempo hábil, tudo o que é necessário para tomar decisões. Para minimizar o problema, os gestores tendem a adotar a intuição no processo decisório, amparada em regras empíricas que captam as características essenciais dos problemas e indicam tendências, conhecidas como heurísticas de apoio à decisão. A intuição é baseada na experiência passada das pessoas e em valores incorporados ao seu modelo mental, permitindo-lhes reconhecer os aspectos críticos de um problema e chegar a uma solução sem passar por um processo cognitivo demorado e trabalhoso. Assim, tendemos a otimizar as decisões por meio do recurso a heurísticas, “que são atalhos do cérebro para tomar decisões a partir de um repertório de experiências e informações acumuladas ao longo da vida” (CARVALHO, 2017, p. 13). Entretanto, nem sempre essas experiências ou informações passadas, conhecidas na literatura como heurísticas de disponibilidade, conduzirão o gestor a uma decisão melhor, o que é decorrente, em boa parte, do fenômeno dos vieses cognitivos. 10 Os vieses cognitivos podem gerar alguma perda para o tomador de decisão. Apesar disso, em um ambiente corporativo, uma decisão tomada sob a influência de um viés cognitivo pode gerar perda para a empresa [...] Tal possibilidade cresce quando o processo de decisão ocorre em um cenário que envolve uma grande quantidade de dados, variáveis e informações imperfeitas (CARVALHO, 2017, p. 13). Contudo, os processos heurísticos cada vez mais tendem a incorporar instrumentos de computação cognitiva, como o big data, o analytics e o aprendizado de máquina – machine learning –, tornando mais assertivos os resultados da análise intuitiva. As limitações contextuais quanto à tomada de decisão são sentidas de forma mais significativa nos processos de negócio intensivos em conhecimento, nos quais, segundo Papavassiliou e Mentzas (2003), faz-se necessária uma forte interação do gestor com ambientes de conhecimento, seja por meio da utilização de bases de dados e sistemas informatizados de apoio à decisão, pelo acesso e uso de conhecimentos técnicos especializados, seja pelo compartilhamento de ideias e experiências entre comunidades internas ou com o ambiente externo. A figura a seguir ilustraa classificação de processos de negócio segundo o seu nível de complexidade: Figura 2 – Nível de complexidade dos processos organizacionais 11 De acordo com a figura, os processos com menor grau de estruturação e natureza predominantemente cognitiva são na sua maior parte caracterizados por decisões complexas e não repetitivas – cada caso abrange um contexto de fatos particular e específico –, envolvendo a necessidade de intensa utilização de conhecimentos explícitos e tácitos. Tais decisões são tipificadas por Haag et al. (1998) como não estruturadas, caracterizando- se pelo fato de que, dependendo de cada caso específico, pode haver diversas respostas “certas” para um dado problema. Nessas situações, então, não existe um conjunto de regras ou critérios preestabelecidos para garantir precisamente ao gestor uma solução ótima para o problema enfrentado: eles necessitam pensar bem a situação objeto e as variáveis envolvidas no problema, antes de chegar a uma decisão. Ainda segundo os mesmos autores, as decisões não estruturadas estão essencialmente presentes nos trabalhos de natureza intelectual, nos quais os gestores cada vez mais se valem dos sistemas informatizados para o apoio à decisão. Os processos e decisões não estruturados são, dessa forma, altamente suscetíveis ao uso de técnicas e ferramentas associadas à “descoberta” de conhecimento, utilizando recursos de big data e de computação cognitiva. À medida que se vão revestindo de natureza predominantemente transacional, os processos usualmente são dotados de maior grau de estruturação, e as decisões associadas tendem a ganhar maior previsibilidade. Novamente recorrendo a Haag et al. (1998), uma decisão estruturada envolve o processamento de certo tipo de informação, sempre de uma forma específica, a partir do que se obtém uma resposta adequada. Nessas situações, geralmente a tomada de decisão envolve pouca intuição – feeling – do responsável por ela. Tais decisões são do tipo que se pode programar: “se você usa um certo conjunto de inputs e os processa de uma forma precisa, chegará a um resultado correto” (HAAG et al., 1998, p. 165). Esses processos são mais suscetíveis à utilização de práticas de “cunho taylorista”, tais como o estabelecimento de padrões de execução de tarefas e rotinas, o uso de regras preestabelecidas para executar tarefas e tomar decisões, e a roteirização de atividades e de tramitação de documentos, entre outros aspectos. As características previsíveis das decisões estruturadas tornam esses processos altamente suscetíveis ao uso de artefatos de automação em larga escala, hoje tratados na literatura técnica especializada pelo nome de automação de processos com o apoio de robôs (robotic process automation – RPA). Outro aspecto relevante da tomada de decisão diz respeito ao processo de formação do convencimento do gestor, que é o modelo mental que cada um desenvolve para entender o problema objeto de decisão, analisar as diversas variáveis envolvidas e chegar à escolha e à implementação da melhor alternativa, considerando os aspectos de viabilidade técnica, operacional, econômica e financeira. 12 Embora cada processo de tomada de decisão englobe peculiaridades inerentes a cada indivíduo e situação específica, já existem na literatura diversos esquemas que procuram descrever como as pessoas tomam decisões. Nessa linha, ainda Haag et al. (1998, p. 166) formularam um modelo conceitual das etapas do processo decisório, como ilustrado na figura que segue: Figura 3 – Etapas do processo decisório Fonte: adaptado de HAAG et al. Management Information Systems for the Information Age. 1998, p. 167. No esquema apresentado, a tomada de decisão se desenvolve em quatro etapas: inteligência, projeto – análise de alternativas –, escolha – da melhor alternativa – e implementação. De acordo com os autores, “essas etapas não são necessariamente lineares: frequentemente se reconhecerá ser útil ou necessário retornar a uma fase anterior ao longo do processo” (HAAG et al., 1998, p. 167). A inteligência consiste no reconhecimento de um problema, necessidade ou oportunidade, e é considerada a etapa diagnóstica do processo decisório: “a fase de inteligência envolve a detecção e a interpretação de sinais que indicam uma situação que precisa da sua atenção” (HAAG et al., 1998, p. 166). Tais “sinais” podem apresentar-se sob diversas formas: demandas consistentes de clientes sobre produtos ou serviços, manifestações encontradas nas redes sociais, comparações com ofertas da concorrência, declínio em vendas, inovações tecnológicas, entre outras. O projeto – análise – abrange a consideração das possíveis alternativas de solução do problema ou aproveitamento de oportunidade detectados na etapa anterior, sendo aqui equacionadas todas as possibilidades de solução para a questão objeto de análise e decisão. 13 A escolha contempla o exame e a comparação dos méritos de cada alternativa de solução, avaliando as suas consequências individualmente, tendo como resultado a escolha de uma entre elas. A “melhor solução” pode envolver aspectos objetivos e subjetivos, dependendo das condições situacionais relacionadas ao fato objeto da decisão e a fatores como normas legais, custo-benefício e conveniências de implementação, entre outros. A implementação diz respeito à execução da alternativa de solução escolhida, seguida do acompanhamento dos resultados alcançados e da realização dos ajustes que se fizerem necessários. Ativos intangíveis: informação, conhecimento e inteligência As limitações situacionais e individuais dos gestores, como apresentado anteriormente na teoria da racionalidade limitada, têm sido, em parte, superadas pelo uso de uma gama mais abrangente de informações e pela ampliação do conhecimento disponibilizado para a tomada de decisão. Assim, informação e conhecimento constituem dimensões de uma nova fonte para a geração de riqueza nas organizações, os ativos intangíveis, que incorporam ainda a inteligência organizacional, como decorrência do uso cada vez mais acentuado dos recursos de computação cognitiva. Para discutir o tema, vamos inicialmente desenvolver os conceitos relacionados a dados, que irão embasar a posterior compreensão das questões associadas à informação, ao conhecimento e à inteligência organizacional. Segundo O’Brien (2001, p. 23), “dados são fatos ou observações crus, normalmente sobre fenômenos físicos ou transações de negócios”, constituindo registros relacionados a fatos observados por alguém – uma ou mais pessoas –, por meio de sensores ou por meio de máquinas. Os dados são capturados, depurados e preservados, constituindo a matéria-prima a ser tratada com a finalidade de gerar informações. Os dados podem ser de dois tipos: estruturados e não estruturados. Os dados estruturados são baseados em números e guardados em um determinado formato para posterior recuperação com o propósito de gerar informação e conhecimento. A temperatura ambiente em um local em determinado momento, o consumo de água registrado no medidor de uma residência, as vendas em um supermercado e as transações bancárias em uma agência constituem exemplos desta categoria dados. Os dados não estruturados não têm uma formatação específica, sendo constituídos principalmente por textos em formato livre como um manual de procedimentos, um parecer a respeito de determinado assunto, registros de e-mails e comentários em redes sociais. Ainda estão nesta categoria imagens, vídeos, sons, mapas, registros de sensores e outros elementos que podem residir em arquivos internos da empresa ou ser encontrados na web. Segundo autores como Jenkins (2004, p. 21), os dados não estruturados em uma organização, especialmente a partir do acesso a ambientes externos como as redes sociais e 14 documentos consolidadosem textos, constituem 90% do acervo potencial de dados a ser tratado nas empresas para a geração de ambientes de informação e de conhecimento. O termo informação apresenta inúmeras acepções na literatura, desde a clássica definição de Drucker apud Davenport (1998, p. 19), “dados dotados de relevância e propósito”, passando por Bahra (2001, p. 66), “dados categorizados, analisados, sumarizados e colocados em um contexto”, indo até Hislop (2005, p. 15), “dados organizados em um padrão com significado, em que algum insumo intelectual foi agregado”. Essas definições nos levam a concluir que a geração de uma determinada informação, por mais simples que seja, está baseada em dados e exige análise no sentido da definição precisa dos seus atributos: contexto, propósito e destinatários. O gráfico a seguir nos ajuda a entender essas características básicas que devem orientar a construção da informação: Figura 4 – Exemplo de Informação: comportamento do Ibovespa No gráfico acima, o contexto refere-se ao comportamento do Ibovespa em um determinado dia de operação – Intraday a cada 15 minutos. O seu propósito é informar de forma sintética o comportamento de um grupo de ações na data e no período considerados, e os seus destinatários são os investidores no mercado acionário. A partir do momento que uma informação tem os seus atributos perfeitamente delimitados, a reunião e o tratamento de um conjunto de dados ganham finalidade e tornam possível estabelecer os meios que vão possibilitar a sua geração de forma sistematizada e contínua. As informações podem ser apresentadas de diversas maneiras, desde relatórios periódicos, sob forma de tabelas ou gráficos, até insights pontuais relevantes para determinado gestor, os quais, muitas vezes, permanecem “escondidos” em meio a milhares de transações que acontecem nas empresas a cada dia, tanto no contexto interno como nas relações com os clientes. 15 Um exemplo simples de insights no ambiente de negócios, tendo como referência a gestão dos bancos, pode ser descrito da seguinte forma: � Determinado cliente faz uma consulta no site da instituição sobre ofertas de empréstimos. � Essa transação é registrada na base de dados da organização. � Um software de análise de dados identifica esse “rastro” deixado pelo correntista no ambiente de dados e gera uma informação relevante para o gerente da sua conta, sinalizando o potencial interesse do correntista de realizar uma operação de crédito. A importância da informação como um ativo organizacional começou a ser ressaltada quando Drucker, entre outros autores, salientou o papel essencial que ela passaria a desempenhar nas corporações do futuro, por ele denominadas de “organizações fundamentadas na informação” (1997, cap. 14). Aquele autor ainda teceu considerações sobre a forma como a informação agrega valor ao desempenho das organizações: melhor controle das operações internas e maior conhecimento dos clientes e das condições ambientais externas, possibilitando a tomada de decisão de melhor qualidade, resultando em menores custos de produção de bens ou de prestação de serviços, crescimento da receita operacional e maior rentabilidade para o negócio. Entretanto, somente a disponibilidade de informações adequadas não é suficiente para agregação de valor aos processos de negócios objeto de gestão, que depende, ainda, da capacidade dos seus usuários para a sua exploração de forma produtiva. Isso nos remete à consideração dos aspectos ligados ao conhecimento e à compreensão – inteligência – como elementos essenciais para a efetividade da gestão. Discorrer sobre conhecimento é tarefa bastante mais complexa, considerando-se que ele pode apresentar diversos sentidos dependendo da perspectiva sob a qual é tratado nos diversos ramos da ciência. Alguns autores recomendam cautela no tratamento do tema, como Tissen et al. (1998, p. 169): O que é conhecimento? As pessoas vêm tentando responder esta questão por centenas de anos. Os filósofos mais celebrados e respeitados vêm tentando encontrar a resposta. E, geralmente, têm falhado. Então continuar a argumentar a respeito neste livro seria presunção. Dessa forma, vamos limitar a discussão à sua aplicação ao contexto da gestão dos processos de negócio das empresas. Inicialmente, recorrendo a Houaiss e Villar (2001, p. 802), conhecimento é definido como “domínio, teórico ou prático, de um assunto, uma arte, uma ciência, uma técnica; competência, experiência, prática”. 16 Em uma perspectiva estreitamente relacionada com a gestão empresarial, outra propositura bastante adequada é a de O’Dell e Grayson Jr. (2000, p. 23): Conhecimento é a informação em ação. No contexto organizacional, é aquilo que as pessoas em uma empresa sabem acerca de seus clientes, produtos, processos, erros e acertos, seja esse conhecimento tácito ou explícito. Ou seja, na sua relação com os processos de negócio, o conhecimento pode ser entendido como emergindo do uso produtivo e objetivado das informações, a partir da sua interpretação e da agregação de significado para uma situação específica. Finalmente, de forma a consolidar as conceituações precedentes, recorremos à interpretação de Hislop (2005, p. 15, 16): O conhecimento pode ser entendido como emergindo da aplicação, análise e uso produtivo de dados e informações. Em outras palavras, o conhecimento pode ser visto como dados ou informações com um nível mais aprofundado de análise intelectual agregada, onde eles são interpretados, significado é agregado, e existe estruturação e ligação com sistemas existentes de crenças e contextos de conhecimento. Ele então provê meios para analisar e entender dados e informações, gerando entendimento a respeito da causalidade de eventos e ações e referências para conduzir pensamento e ação. As considerações precedentes nos levam à assunção de que o conhecimento tem duas características fundamentais a ele associadas, quando aplicado no contexto da gestão: � De um lado, envolve a interação humana com uma determinada realidade, ou com outros conhecimentos disponíveis sob forma explícita ou tácita. � De outro lado, é direcionado para a prática, para o apoio ao equacionamento e à resolução de problemas em um contexto de processos e casos específicos. Finalmente, outro aspecto relevante nas definições anteriores diz respeito à consideração de duas naturezas básicas de conhecimento, a explícita e a tácita, postulações derivadas dos estudos de Nonaka e Takeuchi (1997). O conhecimento explícito é aquele articulado na linguagem formal, por meio de afirmações gramaticais, expressões matemáticas, programas computacionais e manuais de procedimentos, entre outros aspectos. Esta categoria de conhecimento é mais suscetível de ser organizada e compartilhada: pode ser documentada, categorizada e ilustrada para todos por meio de 17 demonstrações, explanações, fluxos e procedimentos vinculados aos processos de negócio, e regras associadas a sistemas computacionais, nos seus mais variados níveis de complexidade, desde os sistemas transacionais até algoritmos de aprendizado de máquina e outras aplicações de inteligência artificial. O conhecimento tácito envolve as habilidades pessoais, as especialidades adquiridas em processos formais de aprendizado, as experiências vividas, crenças, perspectivas e sistemas de valor de cada pessoa, e se reveste de duas dimensões distintas: a técnica, constituída por habilidades e práticas sobre como fazer; e a cognitiva, associada a esquemas, modelos mentais, crenças, percepções e experiências vividas. Este tipo de conhecimento é mais difícil de ser articulado e transmitido de uma pessoa para outra: explicar como a experiência vivida pode ser aplicada à resolução de um tipo de problema específico envolve distintas dimensões de complexidade e de compreensãopara cada situação específica, nem sempre possíveis de avaliar com facilidade. Complementando essas noções básicas sobre conhecimento, do ponto de vista da sua aplicabilidade à gestão, Wiig (2004, p. 336) o define da seguinte forma: “o conjunto de entendimentos e padrões de ação que condicionam a construção de sentidos, a tomada de decisão, a execução e o monitoramento das ações”. A abordagem da informação e do conhecimento como recursos estratégicos tem sido embasada desde os anos 1980 na ciência da computação e da informação, o que é potencializado nos dias de hoje pelas tecnologias emergentes da informação. Dentro desse contexto evolutivo, deve ser salientada a diferença que existe entre conhecimento – knowledge – e compreensão/cognição – knowing. Os defensores desta linha de raciocínio, como Hislop (2005), argumentam que todo conhecimento tem uma dimensão tácita que, por ser inseparável da prática, está associada a cada indivíduo e às suas vivências específicas. Este novo patamar, denominado na literatura como inteligência, seria definido da forma que se segue: a inteligência é entendida como uma propriedade/habilidade atribuída a pessoas, como saber, pensar, conversar e aprender [...] em síntese, a inteligência envolve conhecimento associado à capacidade de perceber, sentir, compreender, processar, comunicar, julgar e aprender.2 Em face dos avanços da computação cognitiva, especialmente na direção da “humanização” das máquinas no sentido de dotá-las de capacidade de raciocinar, tomar decisões e resolver problemas, torna-se imperativo incorporar a inteligência como um novo componente dos ativos intangíveis a serviço da gestão. 2 TUTORIALSPOINT: simply easy learning. Introducing to artificial intelligence. Disponível em: <https://www.tutorialspoint.com/prolog_in_artificial_intelligence/ai_introduction.asp>. Acesso em: 19 fev. 2018. 18 Nesse sentido, a nossa disciplina tratará da gestão da informação e do conhecimento, mas considerando a inteligência organizacional como resultante do uso adequado dessas duas variáveis anteriores. Gestão da informação e do conhecimento A gestão da informação e do conhecimento consolidou-se academicamente a partir dos anos 1980, com publicações que contemplavam separadamente cada um desses ativos. A partir dos anos 2000, houve tendência de incorporação da gestão da informação no contexto da gestão do conhecimento, o que se vem consolidando com a disseminação do conceito de inteligência de negócios e com o uso das tecnologias emergentes da informação. Na nossa disciplina, trabalhamos com esse conceito ampliado, tratando da gestão da informação e do conhecimento como uma entidade única, que pode ser entendida a partir de um conjunto de definições encontradas na literatura, das quais salientamos as três que se seguem: Abordagem sistemática e integrada, para identificar, gerenciar e compartilhar todos os ativos da empresa, incluindo bases de dados, documentos, políticas e procedimentos, bem como a sua “expertise” adquirida e não articulada e a experiência detida individualmente pelos trabalhadores (BARRON, 2000, apud BAHRA, 2001, p. 72). A facilitação e o suporte de processos, para criar, sustentar, compartilhar e renovar o conhecimento organizacional, no sentido da geração de riqueza econômica, criação de valor ou melhoria de performance (ALLEE, 2003, p. 264). Gestão do Conhecimento Organizacional: meta-processo para lidar com os programas, políticas e processos deste recurso intangível, o Conhecimento Organizacional, sendo composta de um conjunto de ações e práticas de apoio que, de forma explícita e sistemática, contribui para a sustentabilidade da organização [...]. (GOLDMAN; CASTRO apud RODRIGUEZ y RODRIGUEZ, 2010, p. 136). 19 No contexto brasileiro, cabe ainda salientar a definição do Comitê Executivo do Governo Eletrônico, com foco para a aplicação à administração pública: Conjunto de processos sistematizados, articulados e intencionais, capazes de incrementar a habilidade dos gestores públicos em criar, coletar, organizar, transferir e compartilhar informações e conhecimentos estratégicos que podem servir para a tomada de decisões, para a gestão de políticas públicas e para a inclusão do cidadão como produtor de conhecimento coletivo (BRASIL, 2004 apud BATISTA, 2012, p. 42). As definições apresentadas, respeitando as especificidades de cada autor e contexto, indicam-nos que a gestão da informação e do conhecimento é uma atividade que lida essencialmente com três variáveis fundamentais: os processos do negócio, as tecnologias da informação e da comunicação (TIC) e as pessoas. Nessa perspectiva, contempla essencialmente o saber da organização, assumindo um papel de aglutinadora e facilitadora dos processos voltados ao desenvolvimento contínuo de uma inteligência coletiva, conforme proposto por Lévy (1998, p. 28): “inteligência distribuída por toda parte, incessantemente valorizada, coordenada em tempo real, que resulta em uma mobilização efetiva das competências”, sejam estas no nível: (1) individual; (2) de comunidades; (3) da instituição; ou (4) das interações com o ambiente externo. Considerando as pessoas como o principal alicerce desse tripé, cabe ainda enfatizar que o sucesso de tais iniciativas tem como requisito essencial a adoção de modelos de gestão empresarial que privilegiem o desenvolvimento de ambientes organizacionais orientados para o aprendizado, nos quais a aquisição, o compartilhamento e a aplicação do conhecimento constitui um processo contínuo e sistemático, em sintonia com os objetivos estratégicos do negócio. Outro aspecto marcante das organizações orientadas para o aprendizado é o deslocamento do centro de gravidade na empresa do trabalho procedimental para o trabalho intelectual, característica essencial de um novo conjunto de profissionais – os trabalhadores do conhecimento (knowledge workers) – que dependem essencialmente da informação e do conhecimento para o desempenho das suas tarefas. 20 Dimensões humana e processual da gestão da informação e do conhecimento Para gerar, capturar e compartilhar a informação e o conhecimento, necessitamos de duas coisas: uma infraestrutura adequada de tecnologias e procedimentos, e um ambiente cultural, composto por pessoas dispostas a aderir a um processo de gestão orientado para o aprendizado e para o compartilhamento do saber. Nesse contexto, as ações de gestão da informação e do conhecimento devem contemplar duas dimensões: a humana e a processual, como será discutido a seguir. A dimensão humana leva em conta que as pessoas são os atores centrais em uma organização: a competência para ações efetivas depende dos modelos mentais individuais de cada um dos seus componentes e daqueles associados às comunidades que dela fazem parte, assim definidos por Wiig (2004, p. 83): Os modelos mentais codificam situações que conhecemos a partir de vivências pessoais, que aprendemos em outras fontes, ou que geramos em nossas mentes a partir da reflexão derivada de experiências, raciocínio orientado para objetivos ou simplesmente do pensamento a respeito de algo. Além disso, ainda segundo o autor, outros construtos mentais são derivados de cada fato específico com o qual somos confrontados e de conceitos, crenças, expectativas, doutrinas, métodos e tecnologias que condicionam a atuação de cada um e das comunidades que se reúnem em torno de propósitos e interesses específicos. Em função disso, na dimensão humana, as organizações se constituem em torno de diferentes habitats de informação e conhecimento, cabendo à gestão a sua identificação e a canalização do seu potencial para a construção do conhecimento coletivo, buscando alcançar o que Albrecht (2003, p. 58) denominoude sintropia: “a reunião de pessoas, ideias, recursos, sistemas e lideranças de modo a capitalizar plenamente as possibilidades de cada um”. A resultante da sintropia seria, dessa forma, a multiplicação do poder cerebral da organização, por meio do ganho de sinergia decorrente da integração inteligente das competências dos seres humanos, o que ocorre quando as pessoas se dispõem a compartilhar o que sabem. Tal disposição depende fundamentalmente da existência de um clima de confiança entre as pessoas e destas com a organização. Para que alguém se disponha a compartilhar o que conhece é necessária a percepção de que haverá um benefício mútuo, o que depende da criação de uma “cultura de compartilhamento” no ambiente organizacional. 21 Ainda nessa linha, a figura que se segue ilustra as principais variáveis a serem consideradas em um modelo de implementação da gestão da informação e do conhecimento nas organizações, na perspectiva da dimensão humana: Figura 5 – Dimensão humana da gestão da informação e do conhecimento Em primeiro lugar, cabe identificar as comunidades – culturas de conhecimento – suscetíveis de participar de um projeto de implementação de ambientes de conhecimento e, a partir daí, conhecer as pessoas interessadas em participar da criação de espaços de conhecimento coletivo – os agentes do conhecimento. Os grupos de pessoas com interesses afins passam a ser considerados como comunidades de conhecimento, que serão mobilizadas para a implementação das redes de conhecimento organizacional. Ainda tendo em conta a consideração das pessoas como o principal alicerce para a implementação das estruturas de informação e conhecimento, um ponto fundamental a ser tratado diz respeito à realização de um inventário das categorias de conhecimento tácito existente no ambiente organizacional, conforme proposto por Wiig (2004, p. 284): � Quem são as pessoas que detêm informação e conhecimento relevantes para as estratégias do negócio? Quantos são e onde estão localizados? Quais são as funções desempenhadas e os cargos ocupados por essas pessoas na estrutura organizacional? � Qual é a natureza de conhecimento que essas pessoas detêm no sentido de contribuir para o desenvolvimento das competências essenciais estratégicas da organização? 22 � Qual é o seu nível de expertise – conhecimento formal adquirido em formação básica e complementar, experiência prática vivenciada, outras qualificações? � Qual é o nível e o tipo de contribuição dessas pessoas à criação e ao compartilhamento do conhecimento organizacional? Quais são as experiências passadas e as lições aprendidas com a inserção dessas pessoas em programas formais ou informais de criação e compartilhamento do conhecimento na organização? A dimensão processual consiste na articulação dos processos de mobilização sistemática das ações de indivíduos ou grupos, por meio de mecanismos formais de funcionamento e meios tecnológicos de apoio, embasados em um conjunto sequencial e dinâmico de atividades, conforme a seguir apresentado: Figura 6 – Dimensão processual da gestão da informação e do conhecimento Fonte: adaptado de Rodriguez y Rodriguez, M. Gestão de Conhecimento e Inovação nas empresas. 2010, p. 15. O modelo acima tem como base as considerações de dois autores a respeito do tema, Rodriguez y Rodriguez (2010, p. 13, 14) e Batista (2012, p. 62-64), e cada uma das etapas pode ser descrita da seguinte forma: � Criar/Identificar/Obter – busca a criação, a identificação e a obtenção das informações e dos conhecimentos necessários para atender aos processos de gestão, assegurando o acesso às fontes da sua disponibilidade no ambiente interno (ambientes de dados estruturados e não estruturados) ou externo (bases de dados, redes sociais, documentos publicados na web e outros ambientes de aquisição de dados estruturados e não estruturados). � Reter/Armazenar – consiste em explicitar, sistematizar e reter a informação e o conhecimento considerados críticos para o sucesso do negócio. Nas situações relacionadas à experiência e à especialização das pessoas, existentes sob forma tácita, o processo de retenção consiste em colocar os detentores do conhecimento em contatos com outras no sentido de viabilizar a transferência do conhecimento tácito. 23 � Disseminar/Compartilhar – envolve a promoção de um ambiente propício e favorável para a colaboração entre as pessoas e comunidades, visando à troca de informação e conhecimento, tendo como resultado o desenvolvimento contínuo de uma inteligência coletiva na organização. � Aplicar/Incorporar – esta atividade tem por finalidade a aplicação objetivada dos acervos de conhecimento explícito e do conhecimento tácito das pessoas nos processos do negócio, tendo como consequência melhoria dos produtos fornecidos e dos serviços prestados, maior satisfação dos clientes e melhores resultados para a gestão, entre outros aspectos. � Proteger – nesta atividade, busca-se proteger os acervos explícitos de conhecimento disponíveis e garantir o acesso seguro e controlado das pessoas aos mesmos. Síntese dos temas e conclusões do Módulo I � A partir do crescimento de serviços e produtos baseados na internet e de um quadro de tecnologias que surgem e se renovam rapidamente, constata-se hoje que as empresas priorizam a busca de soluções para usar a informação e o conhecimento de forma mais assertiva para apoiar a sua gestão. � É neste quadro que a gestão da informação e do conhecimento está ganhando novas fronteiras nas organizações, apoiada nos recursos de computação cognitiva orientada para a busca de insights relevantes para o processo de gestão e de exploração dos negócios. � A informação e o conhecimento constituem dimensões de uma nova fonte para a geração de riqueza nas organizações, os ativos intangíveis, que incorporam ainda a inteligência organizacional, como decorrência do uso cada vez mais acentuado dos recursos de computação cognitiva. � A gestão da informação e do conhecimento (GIC) é uma atividade que lida essencialmente com três variáveis fundamentais: os processos do negócio, as tecnologias da informação e da comunicação (TIC) e as pessoas. � Nessa perspectiva, contempla essencialmente o saber da organização, assumindo um papel de aglutinadora e facilitadora dos processos voltados ao desenvolvimento contínuo de uma inteligência coletiva. � A dimensão humana da GIC leva em conta que as pessoas são os atores centrais em uma organização: a competência para ações efetivas depende dos modelos mentais individuais de cada um dos seus componentes e daqueles associados às comunidades que dela fazem parte. � A dimensão processual da GIC consiste na articulação dos processos de mobilização sistemática das ações de indivíduos ou grupos, por meio de mecanismos formais de funcionamento e meios tecnológicos de apoio, embasados em um conjunto sequencial e dinâmico de atividades. Para a exploração das novas fronteiras da gestão da informação e do conhecimento, devem- se inicialmente entender as características predominantes do negócio objeto de estudo, a partir do que os gestores e os profissionais especialistas nos métodos e nas tecnologias emergentes da informação estarão capacitados para encontrar as soluções mais adequadas para cada ambiente empresarial específico. O desenvolvimento deste módulo está sustentado no modelo conceitual apresentado a seguir: Figura 7 – Estratégia para implementação de ambientes do conhecimento organizacional Fonte: adaptado de Newton Meyer Fleury. Modelo Conceitual de Ambiente Conhecimento para Apoio à Formação do Convencimento do Magistrado. Tese de Doutorado, 2011. MÓDULO II – MÉTODOS E TECNOLOGIAS DE APOIO À GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO 26 Ele parte da premissa de que cada ambiente de negócio tem as suascaracterísticas peculiares, que devem ser percebidas pelo que chamamos de entendimento da sua lógica dominante – essência do negócio: clientes, produtos e serviços ofertados, propostas de valor na perspectiva dos clientes, competências essenciais do negócio. O conhecimento dos processos do negócio relevantes indica quais são aqueles que mais contribuem para agregar valor para os clientes e para a gestão, merecendo, dessa forma, maior atenção nos processos de implementação de ambientes de informação, conhecimento e inteligência. A etapa seguinte busca formalizar as características do ambiente decisório associados aos processos de negócio entendidos como os mais relevantes para a gestão. Neste momento, são entendidas as características da formação do convencimento dos gestores para os processos mais relevantes que são objeto da tomada de decisões. A identificação das necessidades de informação para a tomada de decisão, associada às características dos ambientes decisórios precedentemente examinadas, busca elencar os ativos de informação e conhecimento que devem ser acessados para apoio ao processo decisório, divididos em quatro categorias principais: � conhecimento explícito interno sob formato analógico – planilhas, normas, planos e políticas, entre outros; � conhecimento explícito sob formato digital – bancos de dados, regras associadas a procedimentos automatizados, painéis de indicadores de desempenho, entre outros; � conhecimento tácito – quem conhece o quê? Como acessar os detentores do conhecimento? – e � conhecimento externo, detido por parceiros ou existentes no ambiente da web. A modelagem do conhecimento organizacional é um trabalho técnico que busca criar regras formais sobre determinada estrutura de informações, para a compreensão tanto pelos humanos como por agentes de software. Desse modo, utiliza formalismos para a sua representação de forma a possibilitar a construção dos artefatos – programas computacionais – de apoio à cognição. Tendo como referência os conceitos apresentados, vamos tratar de métodos, técnicas e tecnologias apresentadas na literatura, ou de soluções ofertadas no mercado, para o entendimento de modelos de negócios, das suas cadeias de valor e dos seus respectivos processos, e para apoio à tomada de decisões em situações específicas de gestão, no âmbito das tecnologias emergentes da informação: � entendimento do domínio do negócio; � identificação e monitoramento das cadeias de valor e processos de negócio; � ambientes de dados e informações para a gestão dos processos de negócio e � computação cognitiva como instrumento para a gestão da informação e do conhecimento organizacional. 27 Entendimento do domínio do negócio Existem diversos métodos e técnicas para o entendimento das características do domínio de negócios, de forma a nortear o uso efetivo dos ativos de informação, de conhecimento e de inteligência no processo de gestão. Vamos, em seguida, apresentar dois deles: quadro de modelo de negócios e design thinking. Quadro de modelo de negócios Entre as diversas alternativas propostas na literatura, para o entendimento das características dos ambientes de negócios, destacamos o método de inovação em modelos de negócios, conhecido como Business Model Generation, proposto por Osterwalder e Pigneur (2011). Trata-se de um foco de análise que enfatiza o compartilhamento de ideias entre os componentes de uma organização, usando uma linguagem de fácil compreensão, buscando preencher o Quadro de Modelo de Negócios da empresa objeto de estudo, ilustrado como segue. Figura 8 – Quadro de modelo de negócios Fonte: adaptado de Osterwalder, A. & Pigneur, Y. Inovação em Modelos de Negócios. 2011. Na perspectiva do entendimento do negócio, para o alinhamento das estratégias quanto à gestão e os ambientes de informação, conhecimento e inteligência, devem ser formalizados os seguintes elementos: segmentos de clientes, propostas de valor, canais, relações com os clientes, atividades chave, recursos chave e parcerias estratégicas (OSTERWALDER; PIGNEUR 2011, p. 14-51). 28 Embora a descrição detalhada do método não seja objeto da nossa disciplina, cabe salientar as suas características principais para criar foco em torno dos direcionadores institucionais estratégicos, que deverão nortear as ações e os projetos de gestão da informação, do conhecimento e da inteligência organizacional: � Quais são os diferentes grupos de pessoas ou organizações que a empresa busca alcançar e atender – segmentos de clientes. � Qual é o pacote de produtos e serviços que cria valor para um segmento de clientes específico, isto é, quais são os motivos pelos quais os clientes vão escolher a nossa empresa em detrimento de outras que concorrem conosco de forma direta ou sucedânea – propostas de valor. � Como a empresa se comunica – ou deveria comunicar-se – e alcança os seus segmentos de clientes para entregar uma proposta de valor – canais de comunicação, distribuição e venda. � Como a empresa se relaciona com os seus segmentos de clientes, tais como assistência pessoal, serviços automatizados, comunidades e cocriação – modalidades de relacionamento. � Quais são os processos mais importantes que a empresa deve realizar, dentro da sua cadeia de valor, de forma a fazer com que o seu modelo de negócios funcione com efetividade, eficácia e eficiência – atividades-chave. � Quais são os recursos críticos exigidos para o funcionamento do modelo de negócios estabelecido ou desejado: competências essenciais das pessoas, tecnologias emergentes da informação, conhecimento – know-how – associado à natureza do negócio. � Quem são os nossos parceiros atuais – ou potenciais – que complementam a nossa cadeia de valor, contribuindo para o alcance das propostas de valor estabelecidas – parcerias estratégicas. Design thinking As técnicas de design thinking incorporam uma nova maneira de pensar soluções no contexto dos modelos de negócios inovadores, por meio das quais os gestores envolvidos com a estratégia desafiam as regras empresariais existentes. Nessa linha, Tim Brown, da consultoria IDEO, afirma que o design thinking “é uma disciplina que usa a sensibilidade e os métodos do designer para combinar as necessidades das pessoas com o que é tecnicamente viável e estrategicamente comercial para poder converter em valor de cliente e oportunidade de mercado” (DRUDI, 2017). 29 Entre as inúmeras formas de uso desta técnica, relacionamos a seguir aquelas propostas por Osterwalder e Pigneur (2011, p. 45-191): � Empatia e insights dos clientes – significa perceber a proposta de valor que melhor atende às expectativas dos clientes, o que pode ser detectado por meios como pesquisas de mercado convencionais junto a segmentos específicos, sessões de brainstorming envolvendo clientes e parceiros externos, e processos de coleta, análise e monitoramento de dados por meio de instrumentos de mineração de informações nas redes sociais. � Ideação – identificação de novas formas e mecanismos de criação de valor para os clientes e de novas fontes de receita para o negócio, tendo como base epicentros potenciais de inovação “descobertos” a partir de ideias derivadas da discussão das sete dimensões do quadro de modelo de negócios. � Pensamento visual – uso de meios visuais como figuras, diagramas e post its (blocos de notas), além de ferramentas automatizadas de apoio a discussões em grupo e registros de ideias geradas e compartilhadas. � Protótipos – meios de aprofundamento de uma ideação, de forma a tornar mais concreta e objetiva a percepção da criação de valor a partir de novas ideias geradas. � Histórias – utilização de narrativas para ajudar a comunicação de uma nova ideia ou a apresentação de resultados da interpretação de dados sobre um determinado contexto ou perspectiva donegócio (pontos de vista alternativos como aqueles observados de dentro da empresa para fora, e do cliente para a organização). � Cenários – formas alternativas de tornar concreto o abstrato, por meio da descrição de ambientes futuros alternativos nos quais determinado modelo de negócios pode desdobrar-se. Identificação e monitoramento das cadeias de valor e processos de negócio Como visto na apresentação precedente sobre o quadro de modelo de negócios, um dos principais elementos diferenciadores da estratégia competitiva é a identificação e a gestão das suas cadeias de valor e respectivos processos de negócio. A visualização da empresa por meio das cadeias de valor não é uma ideia recente, tendo sido originalmente desenvolvida por Porter (1990) nos anos 1980 como um dos pilares da sua literatura sobre estratégia. A despeito de ter mais de 30 anos, o conceito ainda é amplamente utilizado nas instituições pela sua objetividade e praticidade para representar visualmente um negócio por meio de um conjunto de atividades encadeadas associadas a resultados específicos. 30 Vejamos um exemplo prático tendo como referência a Receita Federal do Brasil.3 Nele, a instituição é vista como um agregado constituído de 12 cadeias de valor, como ilustrado a seguir: Figura 9 – Cadeias de valor da Receita Federal do Brasil Fonte: adaptado de Portal da Receita Federal do Brasil. Disponível em: < http://idg.receita.fazenda.gov.br/sobre/institucional/cadeia-de-valor-1 >. Acesso em: 14 fev. 2018. Cada cadeia de valor é desdobrada em processos, e o exemplo que segue se refere à Gestão do Crédito Tributário, constituída por seis processos de negócio, ainda tendo como referência informações extraídas do portal da Receita Federal do Brasil: Figura 10 – Cadeia de valor: Gestão do Crédito Tributário Fonte: Gestão do Crédito Tributário. Disponível em:< http://idg.receita.fazenda.gov.br/sobre/institucional/cadeia-de-valor- 1/gestao-do-credito-tributario >. Acesso em: 14 fev. 2018. 3 Disponível em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/sobre/institucional/cadeia-de-valor-1/gestao-do-credito-tributario>. Acesso em: 14 fev. 2018. 31 O enfoque de gestão das organizações por meio das suas cadeias de valor e dos seus processos de negócio é um dos que mais se prestam à utilização dos ativos intangíveis de informação, conhecimento e inteligência. Conforme o BPM CBOK (2013, p. 35), “processos são compostos por atividades inter- relacionadas que solucionam uma questão específica. Essas atividades são governadas por regras de negócio e vistas no contexto de seu relacionamento com outras atividades para fornecer uma visão de sequência e fluxo”. Os processos são representados por meio de linguagens, e atualmente o padrão mais adotado é o BPMN, que significa em inglês Business Process Modeling Notation e em português Notação de Modelagem de Processos de Negócios. Ele consiste em um conjunto de ícones padrões para o desenho – mapeamento e modelagem – de processos de negócio, o que facilita a leitura e o entendimento dos mesmos tanto pelos técnicos como pelos usuários leigos dentro da organização, como ilustrado a seguir: Figura 11 – Exemplo de representação visual de processos 32 A partir da formalização das atividades inter-relacionadas que compõem o processo, e da identificação das características associadas à sua execução e gestão, podem então ser formalizadas as regras de negócio e os ativos de informação e conhecimento que condicionam e suportam a sua execução: � conhecimento explícito interno sob formato analógico – planilhas, normas, planos e políticas, entre outros; � conhecimento explícito sob formato digital – bancos de dados, regras associadas a procedimentos automatizados, painéis de indicadores de desempenho, entre outros; � conhecimento tácito – quem conhece o quê? Como acessar os detentores do conhecimento? – e � conhecimento externo, detido por parceiros ou existentes no ambiente da web. Automação e monitoramento dos processos de negócio Em um nível mais avançado, existem métodos e ferramentas para a automação dos processos e o monitoramento automático dos resultados da sua execução, conhecidos pelos acrônimos BPMS e BAM. BPMS (Business Process Management Suites) são plataformas de software para automação da execução, controle e acompanhamento de processos sob forma automatizada. Uma característica de tais plataformas é a possibilidade de utilização em modos alternativos: na rede interna da instituição ou na modalidade de computação em nuvem.4 Existem várias alternativas de BPMS oferecidas no mercado, entre as quais Bizagi BPM Suite, Lecom BPM, Oracle BPM Suite e Oracle PCS (Process Cloud Service), Orquestra BPM e Sydle Seed (FLEURY, 2017). BAM (Business Activity Monitoring) são plataformas de software que possibilitam a realização de monitoramento em tempo real de indicadores de desempenho corporativos associados aos processos do negócio. Nessas situações, busca-se a percepção de situação e a análise de indicadores críticos de desempenho dos processos de negócio da empresa com base em informações geradas em tempo real. Tais ferramentas disponibilizam interfaces gráficas para a exibição de informações, em formato de painel de bordo – dashboard –, utilizando o conceito de visualização de dados como meio para transmitir informações relevantes de forma clara e objetiva: uma imagem diz mais que mil palavras. 4 A computação em nuvem é o fornecimento de serviços de computação – servidores, armazenamento, bancos de dados, rede, software, análise e muito mais – pela internet (“a nuvem”). As empresas que oferecem esses serviços de computação são denominadas provedoras de nuvem e costumam cobrar pelos serviços de computação em nuvem com base no uso, da mesma forma que você seria cobrado pela conta de água ou luz em casa. Disponível em: <https://azure.microsoft.com/pt-br/overview/what-is-cloud-computing>. Acesso em: 15 fev. 2018. 33 Existem diversos produtos de software – aplicativos – para a implementação da visualização de dados, usualmente incorporadas nas ferramentas de espectro mais amplo associadas ao domínio da inteligência de negócios. Ainda no âmbito das cadeias de valor e dos seus processos de negócios, outra tendência associada ao uso da informação e do conhecimento está vinculada à automação cognitiva de processos. Trata-se do uso de robôs – softwares – para apoiar, ou substituir em algumas situações, não somente as tarefas repetitivas, mas também parte daquelas executadas pelos denominados trabalhadores do conhecimento – knowledge workers. Esse é o domínio das aplicações computacionais conhecidas pelo acrônimo RPA (robotic process automation), nas quais as regras associadas aos processos são automatizadas a partir do uso de algoritmos computacionais. Segundo recente publicação do Gartner Group, Os processos que são mais adequados para o RPA possuem uma alta taxa de transação de dados digitalizados estruturados, com caminhos de processamento relativamente fixos e/ou interfaces de usuário que não mudam com frequência e são atividades baseadas em regras [...] os processos com dados não estruturados não são adequados para a maioria das ferramentas RPA.5 Ambientes de dados e informações para a gestão dos processos de negócio A despeito dos avanços significativos no campo das tecnologias da informação e da comunicação, a plena utilização dos dados disponíveis, tanto no ambiente organizacional interno como em repositórios externos, ainda encontra barreiras em muitas situações, decorrentes do paradoxo da sobrecarga da informação, fenômeno assim descrito por Breuker et al. (2009, p. 3): Há uma situação paradoxal no mundo moderno: a despeito dehaver uma superabundância de informação disponível, frequentemente é difícil obter informações relevantes quando dela necessitamos. Adicionalmente, pesquisadores nas áreas de organização e gestão do conhecimento constataram que a qualidade e a eficiência do processo decisório variam em função da quantidade de informações em relação às quais as pessoas são expostas. A performance correlaciona-se positivamente com a 5 Disponível em: <https://www.gartner.com/doc/reprints?id=1-3U26FK2&ct=170222&st=sb>. Acesso em: 18 fev. 2018. 34 quantidade de informação recebida, mas só até certo ponto. A partir daí, mais informações levarão ao rápido declínio do desempenho do indivíduo que as utiliza. Dessa forma, no contexto da gestão, somos agora potencialmente capazes de acessar e utilizar um incomensurável acervo de dados para agregar valor ao processo de gestão por meio da informação, do conhecimento e da inteligência. Entretanto, em muitas situações esse potencial de agregação de valor não é concretizado devido à forma como os dados estão organizados: dispersos entre diversas bases de dados e documentos não interligados entre si, estejam eles no ambiente interno ou externo. Daí decorre a relevância da estruturação dos processos e das tecnologias de gestão dos dados para o negócio, o que é implementado por meio dos ambientes de big data, termo cunhado para abrigar o conjunto de soluções tecnológicas capaz de lidar com dados digitais em grandes volumes, variedade e velocidade, existentes no interior das organizações ou provenientes do ambiente externo. Como vimos precedentemente, eles se constituem em duas categorias: estruturados e não estruturados. Conforme postulado por Carvalho (2017), na primeira categoria são considerados o cadastro dos clientes, as transações comerciais e as informações bancárias, organizados em tabelas e bancos de dados, com características de formato e processos de captação, organização e recuperação bem definidos. Na segunda categoria, podemos ter textos livres colocados em documentos como normas internas, em Word ou PDF, imagens, vídeos e mapas, além de arquivos de voz, de textos colocados em blogs, ou em formato para construção das páginas na internet. Parte desses dados é denominada por alguns autores como semiestruturados:6 apresentam uma representação estrutural heterogênea, não sendo nem completamente não estruturados nem estritamente estruturados. Dados da web se enquadram nessa definição, em alguns casos eles possuem uma descrição uniforme – um catálogo de produtos; em outros, algum padrão estrutural pode ser identificado – um conjunto de documentos no formato de artigo – ou, então, praticamente não existem informações descritivas associadas – um arquivo de imagem. Além da complexidade inerente ao trabalho com as dimensões anteriores, cabe assinalar que outra preocupação com os ambientes de big data é a necessidade de garantir que os dados obtidos sejam autênticos e provenientes de fontes de informação confiáveis. Finalmente, os dados a serem obtidos e utilizados devem incorporar um potencial efetivo de agregação de valor para a gestão do negócio, o que pressupõe que o primeiro cuidado, em qualquer projeto de big data, esteja relacionado com a definição do problema do negócio: o que se deseja conhecer, com que finalidade, e quais são as fontes internas e externas para a sua captação. 6 Disponível em: <https://www.ime.usp.br/~jef/semi-estruturado.pdf>. 35 As primeiras formas de exploração mais inteligente dos ambientes de dados foram por meio de um contexto de análise denominado de business intelligence – BI (inteligência de negócios), que visa a captar dados de diferentes sistemas de informação internos à organização, ou provenientes de ambientes externos relacionados a clientes e fornecedores, concentrando-os em um local único – denominado datawarehouse – para a sua recuperação e análise visando à geração de informações relevantes para a gestão do negócio nos planos estratégico e tático gerencial. No contexto do BI, ainda podemos incluir os programas de mineração de dados, um processo de descoberta de informações acionáveis em grandes conjuntos de dados, usando análise matemática e modelos estatísticos para derivar padrões e tendências que existem neles. Esses padrões e essas tendências podem ser coletados e definidos como um modelo de mineração de dados, aplicados a cenários específicos, tais como previsões, análises de risco e probabilidade, recomendações quanto a tendências de vendas “casadas” de produtos em um supermercado, ou separação de clientes em categorias específicas, entre outros. Outra técnica de análise de dados dentro do mesmo contexto, agora no domínio não estruturado, é a mineração de textos, voltada à extração de insights relevantes em bases de dados textuais, como documentos no campo jurídico – análise de acórdãos e sentenças, interpretação de textos provenientes de gravações em processos de atendimento em contact centers, e textos capturados das redes sociais, entre outros. Big data analytics As aplicações mais recentes para a geração de informação, conhecimento e inteligência para a gestão são conhecidas pela expressão Big Data Analytics, que constituem uma evolução do BI. Os métodos de analytics “referem-se uso de poderosos produtos de software capazes de tratar os dados para transformá-los em informações úteis às organizações, permitindo analisar de forma combinada dados estruturados e não estruturados”.7 7 CASTELHANO, Lucinda Marinho. O guia definitivo de big data para iniciantes. Disponível em: <http://docplayer.com.br/36518034-O-guia-definitivo-de-big-data-para-iniciantes.html>. Acesso em: 15 fev. 2018. 36 A inteligência analítica, como apresentado, é uma transformação radical nos conceitos e no modo de usar os dados para gerar informação e conhecimento, combinando diversas fontes para identificar insights valiosos para a gestão. Existem quatro tipos principais de big data analytics,8 conforme ilustrado no gráfico a seguir: Figura 12 – Estágios do BI/Analytics Fonte: adaptado de Gartnet Group. Estágios de Maturidade do Analytics. O gráfico apresentado mostra quatro estágios de analytics, cada um deles voltado a responder a uma indagação específica: o que aconteceu? (análise descritiva); por que aconteceu? (análise diagnóstica); o que acontecerá? (análise preditiva); e como podemos fazer acontecer? (análise prescritiva). A sequência mostrada no gráfico traduz uma relação entre os dois eixos – dificuldade e agregação de valor ao negócio –, mas tais combinações não significam que, necessariamente, haja um “percurso linear” evolutivo obrigatório no uso das técnicas de analytics. Autores como Kaduk (2016) propõem outro tipo de segmentação, em duas categorias: � De um lado, juntando os estágios que respondem às questões relacionadas a o que, envolvendo os dados históricos existentes (análise descritiva) e dados históricos extrapolados para o futuro, usando técnicas de aprendizado de máquina e de modelos estatísticos (análise preditiva). 8 HEKIMA. Tipos de análise de Big Data: você conhece todos os 4? Disponível em: <http://www.bigdatabusiness.com.br/conheca-os-4-tipos-de-analises-de-big-data-analytics>. Acesso em: 18 fev. 2018 e FAROL TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO. Conheça os 4 tipos de análise do Big Data Analytics! Disponível em: <http://farolbi.com.br/conheca-os-4-tipos-de-analise-do-big-data-analytics>. Acesso em: 18 fev. 2018. 37 � De outro lado, respondendo a questões por meio de dados históricos associados à inteligência de negócios (análises diagnóstica e prescritiva), baseadas em algoritmos e modelosestatísticos, mas com uma alta dose de inteligência humana (conhecimento tácito das pessoas, especialmente formação técnica e experiências vividas). Para concluir, cabem os seguintes comentários complementares sobre as características de cada tipo de analytics, e possibilidades da sua aplicação nos modelos de negócios: � Análise descritiva (o que aconteceu?) – busca compreender, em tempo real, determinados acontecimentos ou fenômenos que estão ocorrendo na execução de um processo de negócio, visando à antecipação de problemas, à minimização de riscos ou ao aproveitamento de oportunidades. As instituições financeiras utilizam a análise descritiva para entender os riscos envolvidos na concessão de crédito para um determinado cliente ou segmento específico, e para o combate às fraudes em transações com cartões de crédito, entre outros exemplos. � Análise diagnóstica (por que aconteceu?) – busca compreender os efeitos de uma determinada ação empreendida e as suas causas, buscando obter respostas para questões como “por que aconteceu?”. Usando o exemplo de uma hipotética elevação na taxa de churn, buscam-se aqui as causas mais prováveis do efeito não desejado usando técnicas como a mineração de dados, a mineração de textos e modelos estatísticos. � Análise preditiva (o que acontecerá?) – usada para prever tendências futuras a partir de instrumentos de análise como a mineração de dados e a mineração de textos, e apoiando- se em dados históricos e modelos estatísticos. Busca obter respostas para perguntas como “o que é mais provável que aconteça?”, sendo aplicada para orientar estratégias voltadas à retenção de clientes e à redução de taxas de cancelamento de serviços contratados (taxa de churn).9 � Análise prescritiva (como podemos fazer acontecer?) – trabalha com a mesma lógica da técnica anterior, mas busca simular hipóteses quanto a recomendações de ações alternativas e possíveis consequências de cada uma delas, buscando responder a questões como: se dermos um desconto de 3% no preço dos produtos, qual é a chance de diminuirmos a taxa de churn? 9 As taxas de churn dizem respeito ao cancelamento de serviços contratados e encerramento de contas, o que é atentamente acompanhado em empresas de telefonia e bancos, por exemplo. 38 Computação cognitiva como instrumento para a gestão da informação e do conhecimento Em recente publicação,10 colocamos em discussão a seguinte questão: as máquinas estão adquirindo capacidade para pensar ou para ajudar o ser humano a raciocinar e tomar decisões? Isso tem sido bastante tratado na literatura, especialmente a partir do desenvolvimento de aplicações de computação cognitiva, cujas referências mais citadas são o programa Watson da IBM (LEAL, 2017) e o uso mais disseminado da inteligência artificial nos processos de gestão dos negócios. Tais aplicações são baseadas em algoritmos, que nada mais são do que um conjunto de regras e operações definidas, destinadas à solução de um problema específico de forma procedural. Um exemplo: cinco vezes cinco é igual ao número cinco somado cinco vezes (5x5 = 5+5+5+5+5). Esta regra de somar é um algoritmo simples, que está presente nas máquinas de calcular e nos smartphones, e que usamos intuitivamente no nosso cotidiano. Em várias situações do nosso dia a dia, nós nos orientamos, tomamos decisões e nos movimentamos com base em algoritmos, que existem em vários níveis de complexidade, inseridos em programas computacionais que realizam procedimentos para solucionar um problema. Ao nos comunicarmos com outras pessoas de forma rápida e fácil, por meio de aplicativos como o WhatsApp, estamos usando um algoritmo. O mesmo acontece quando nos orientamos para encontrar a rota mais adequada para chegar a um destino com apoio do Waze, quando fazemos uma pesquisa no Google ou quando usamos os serviços de transporte do Uber. Os sistemas baseados em conhecimento se constituem por meio de algoritmos de maior complexidade, são os denominados sistemas especialistas, amplamente utilizados em diversas áreas de especialização, como a Medicina, a Engenharia e, mais recentemente, nas Finanças e no Direito. Outras aplicações de algoritmos associados ao conhecimento do cliente são os “algoritmos de recomendação”, utilizados por empresas como Amazon, Google, Facebook, Netflix, e todas aquelas focadas no marketing digital. Os recursos de recomendações on-line utilizam os dados capturados, relativos à navegação daqueles que acessaram o site para, a partir da sua análise, oferecer opções semelhantes ou complementares aos produtos e serviços visitados, buscando direcionar o interesse e influenciar compras do consumidor potencial. 10 FLEURY, Newton. Computação cognitiva: as máquinas podem pensar? Medium, 8 de julho de 2017. Disponível em: <https://medium.com/@fleurynewton/computa%C3%A7%C3%A3o-cognitiva-as-m%C3%A1quinas-podem-pensar- c17febc3b367>. Acesso em: 20 fev. 2018. 39 Conceitos e aplicações da inteligência artificial11 Como já abordado anteriormente, a inteligência é entendida como uma propriedade/habilidade atribuída a pessoas, como saber, pensar, conversar e aprender. Em síntese, envolve conhecimento associado à capacidade de perceber, sentir, compreender, processar, comunicar, julgar e aprender. A inteligência artificial é um subcampo interdisciplinar da ciência da computação, com o propósito de desenvolver técnicas e ferramentas para resolver problemas, seja de forma autônoma pelas máquinas seja em interação com as pessoas. O termo inteligência artificial (IA) nasceu há mais de 50 anos e, desde então, diferentes correntes de pensamento têm estudado formas de estabelecer comportamentos inteligentes associados aos programas computacionais. Nessa linha, o grande desafio das pesquisas em IA, desde a sua criação, pode ser sintetizado com a indagação feita por Minsky (2003) há quase 30 anos: “Como fazer as máquinas compreenderem as coisas?”. A inteligência artificial vem adquirindo grande prestígio e interesse com a difusão do seu uso como instrumento de inteligência para o apoio às estratégias dos negócios, baseado principalmente nos conceitos e nas técnicas de aprendizado de máquina (machine learning). O aprendizado de máquina refere-se a algoritmos e técnicas por meio dos quais os sistemas “aprendem”, de maneira autônoma, a partir de resoluções específicas de problemas, da observação de casos e situações práticas, como nos exemplos descritos a seguir:12 � criação de listas personalizadas de recomendação de filmes e vídeos que aparecem no Netflix e no YouTube; � versionamento de textos de um idioma para outro, baseado em aprendizado de modelos para tradução de expressões e frases, como no caso do Google Tradutor e � diagnóstico de possíveis doenças em um paciente, a partir de um conjunto elencado de sintomas. Para completar a explicação dos conceitos sobre inteligência artificial, são a seguir comentados três exemplos da sua aplicação, especialmente quanto à gestão da informação e do conhecimento organizacional: Base de conhecimentos – consiste na captura e aplicação de conhecimento especializado para o apoio à resolução de problemas em um domínio de negócio limitado, usualmente compostos de três módulos principais: (1) base de conteúdo, que abriga o conhecimento 11 O entendimento dos conceitos básicos sobre a Inteligência Artificial está baseado em: <https://www.tutorialspoint.com/prolog_in_artificial_intelligence/ai_introduction.asp>. Acesso em: 19 fev. 2018. 12 HEKIMA. Machine Learning: tudo que você precisa saber. Disponível em: <http://www.bigdatabusiness.com.br/o-que-e- machine-learning>. Acesso em: 19 fev. 2018. 40 especializado a ser utilizado nas interações
Compartilhar