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DIREITO_A_SAUDE_SOB_O_PRISMA_DA_JUDICIAL

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100 
 
DIREITO À SAÚDE SOB O PRISMA DA JUDICIALIZAÇÃO NA CONJUNTURA 
DO SISTEMA PÚBLICO DE SAÚDE BRASILEIRO 
RIGHT TO HEALTH TROUGH THE PRISM OF JUDICIALIZATION AT THE 
JUNCTURE OF THE BRAZILIAN PUBLIC HEALTH SYSTEM 
 
 
Joyce Sant’Anna Simões∗∗∗∗ 
Mayanne Bezerra Gomes∗∗∗∗ 
 
 
Resumo 
O presente trabalho tem como escopo promover uma análise teórica acerca do recente 
fenômeno da judicialização da saúde no Brasil, através de uma exposição quanto ao direito à 
saúde, ao dever jurídico do Estado em sua promoção, a judicialização e suas implicações. No 
que diz respeito à saúde, esta pertence ao rol dos direitos fundamentais, com íntima ligação ao 
direito à vida e à dignidade da pessoa humana, sendo um direito de todos os indivíduos e um 
dever do Estado. Contudo, diante da insuficiência do Sistema Único de Saúde Brasileiro no 
que diz respeito à efetivação deste direito e ao atendimento das demandas populacionais, o 
Poder Judiciário vivencia um processo em que a saúde tornou-se um dos assuntos mais 
recorrentes e relevantes em diversos Tribunais do país, devido à busca da população pela 
tutela judiciária para garantir, de fato, o seu direito. Sendo assim, a judicialização da saúde 
emerge como fenômeno merecedor de estudo, devido às suas implicações jurídicas, sociais, 
políticas e econômicas na sociedade como um todo, e com respaldo fundamental, no dever 
jurídico objetivo estatal, como meio garantidor da promoção da saúde pública brasileira. 
Palavras-chaves: direito à saúde; judicialização da saúde; sistema único de saúde brasileiro. 
 
Abstract 
This academical article has to aim a promotion of a theoretical analysis by the recent 
phenomenon of health judicialization in Brazil, through an exhibition about the right to 
health, the legal obligation of the State in its promotion and the judicialization and her effects. 
In what refers to health, it belongs on the topic of fundamentals rights, with a closer 
connection to the right of life and to the dignity of human being, as a right for all people and 
as an obligation of the State. With the insufficiency of the Unique System of Health, in what 
refers to a promotion of that right and the treatment of the population, the Judicial Power lives 
 
∗Graduanda do Curso de Bacharelado em Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba. 
∗Graduanda do Curso de Bacharelado em Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba. 
 
 
101 
 
a process which the health became one of the most relevant and recurrent issues in many 
courts of the country, due to the population demands for judicial protection to effectuate, 
indeed, this right. In this way, the judicialization of the health emerge like a phenomenon that 
deserves more studies, due to its implications juridical, social, politics and economics in the 
society, and based fundamentally on the juridical objective obligation of the State, in a way 
that promote the public health in Brazil. 
Keywords: right to health; judicialization of health; brazilian unique system of health. 
 
1Introdução 
 
O direito à saúde é classificado no rol dos direitos fundamentais, sendo um direito 
universal, social e humano, o qual pertence ao rol daqueles relacionados ao mínimo 
existencial, devido à tamanha essencialidade que representa para a vida e sobrevivência de 
todo ser indivíduo. 
Com base em sua importância para a sociedade, e tendo-se em vista o dever jurídico 
do Estado, consagrado constitucionalmente no art. 196 da Constituição Federal de 1988, que 
enuncia que a saúde é “direito de todos e dever do Estado”, instituindo também, o “acesso 
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”, tem-se 
o início a formação da base para a judicialização da saúde no país. 
Como enunciado na Carta Magna, a saúde como um dever do Estado pressupõe uma 
conduta positiva deste no consoante à garantia, efetivação e promoção deste direito a todos. 
Com este fundamento, o Estado Brasileiro criou através da Lei nº 8.080/90, o Sistema Único 
de Saúde, com o objetivo fundamental de promover o acesso universal e igualitário a todos os 
que se encontrem em território nacional, e necessitem de atendimento médico-hospitalar, bem 
como de medicamentos, cirurgias, tratamentos e outras políticas relacionadas à saúde pública. 
Entretanto, a demanda populacional requer que o Sistema Único de Saúde (SUS) seja 
eficiente e realmente disponível, para que, no momento em que os indivíduos dele necessitem, 
este esteja presente. A teoria diverge da realidade neste aspecto, sendo ressaltada a 
insuficiência de insumos no que concerne ao atendimento populacional. Os problemas são 
recorrentes, notórios e transmitidos pela mídia com frequência, sendo lembrados pela 
população quanto à falta de médicos, principalmente em regiões remotas do país, falta de 
medicamentos, lentidão para realização de cirurgias, procedimentos e atendimento médico, 
 
 
102 
 
além da falta de estruturas hospitalares em diversas unidades básicas de saúde e hospitais, 
que, muitas vezes, se encontram em estado precário. 
Diante de todos estes problemas estruturais vivenciados recorrentemente pela 
população, surge no Brasil um movimento em que o indivíduo já não recorre diretamente ao 
SUS para a efetivação de seu direito, mas sim, ao Poder Judiciário, a fim de garantir os seus 
direitos através da tutela jurisdicional. Nesse contexto, tem início a chamada judicialização da 
saúde. 
Apesar de possuir como objetivo precípuo a garantia da tutela jurisdicional àqueles 
que procuram e necessitam da saúde pública brasileira, a judicialização excessiva preocupa 
juristas, gestores e até mesmo estudiosos, devido, principalmente, ao desdobrar de suas 
consequências, em que se evidencia, mais uma vez, o déficit do sistema implantado. 
A fim de ilustrar a dimensão da questão, Bassette (2011, p. 22) destaca que: 
 
Os valores gastos pelo Ministério da Saúde para cumprir decisões judiciais que 
determinavam o fornecimento de medicamentos de alto custo aumentaram mais de 
5.000% de 2005 a 2010. Foram gastos R$ 2,24 milhões em 2005 contra R$ 132,58 
milhões em 2010, 1,8% do total do orçamento destinado ao departamento2. 
 
Neste sentido, somente no ano de 2005, o custo do Ministério da Saúde para 
atendimento de ações judiciais em saúde foi de R$ 2,24 milhões e em 2007 de R$ 25,1 
milhões, caracterizando um crescimento exponencial no impacto orçamentário da 
judicialização na gestão pública3. 
A situação parece ser ainda mais grave considerando as ações interpostas em face 
dos municípios, que têm orçamentos menores, mas não podem se eximir da responsabilidade 
 
2A análise do panorama da judicialização no Brasil pela Advocacia Geral da União parece resumir a questão: 
“não há elementos seguros para aferir a razão do crescimento numérico das ações judiciais em face da União, 
mas o sucesso quase certo dessas demandas, associado à interiorização da Justiça Federal, parecem concorrer 
fortemente para essa evolução”. 
3Os números falam ainda mais alto quando se somam os valores dispendidos pela União e pelos Estados. É um 
fato que, definitivamente, não pode ser ignorado, considerando ainda o levantamento do Ministério da Saúde: 
“(...) apesar de existirem apenas 240.980 processos em trâmite no Judiciário (dados do CNJ), os gastos que esses 
processos representaram, apenas no ano de 2010, somam a quantia de R$ 949.230.598,54 (...), quase 1 bilhão de 
reais, considerados os dados colhidos com a União e os Estados de Goiás, Santa Catarina, São Paulo, Pará, 
Paraná, Pernambuco, Minas Gerias, Tocantins e Alagoas (excluídos os outros 17 Estados, o DF e todos os 
Municípios). Vale destacar que os gastos federais com medicamentos no ano de 2010, para atendimento de todos 
os usuários do SUS, foram da ordem de R$ 6,9 bilhões, o que significa que, no mesmo período,os gastos com 
ações judiciais, apenas daqueles 8 entes, corresponderam a quase 1/7 desse orçamento”. 
 
 
103 
 
imposta pelo Judiciário. E observa-se que, já em 2010, o custo com essas ações somou quase 
2% do orçamento da saúde do país. Diante da problemática exposta, é oportuno enunciar mais 
profundamente sobre o direito à saúde, a judicialização deste direito e suas consequências 
vivenciadas. 
 
2 Desenvolvimento 
 
2.1O direito à saúde no Brasil 
 
A saúde encontra-se no rol dos direitos fundamentais expressamente assegurados 
pelo texto constitucional de 1988, encontrando-se sua previsão no art. 196 da Carta Magna 
que enuncia: “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas 
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso 
universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação”. 
As constituições brasileiras passadas continham a previsão do direito à saúde, 
entretanto, foi com a Constituição Federal de 1988, que este direito ganhou status social-
fundamental, em conformidade com as declarações e tratados internacionais atuais. 
Segundo Cunha (2012, p. 1305), “por constituir um direito fundamental, o Estado 
tem a obrigação constitucional de disponibilizar as ações e prestar todos os serviços 
necessários para garantir a saúde de todos, notadamente dos hipossuficientes”.Neste sentido, a 
saúde também é reconhecida como direito humano, sendo objeto da Organização Mundial de 
Saúde (OMS) que, no preâmbulo de sua Constituição (1946), assim a conceitua: "saúde é o 
completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença". 
A saúde engloba como destinatário todos os que estejam em território brasileiro, 
sendo natos, naturalizados ou estrangeiros, independentemente de possuírem ou não domicilio 
no país, devido a sua premissa básica da universalidade. O art. 6º da Constituição Federal 
ainda menciona, de modo expresso, que o direito à saúde é um direito social, assim como o 
direito à educação, sendo um dever do Estado sua implementação. Ele também compõe o rol 
dos direitos relacionados à seguridade social, juntamente com a previdência e a assistência 
social. 
 
 
104 
 
Além disso, a saúde é um direito diretamente interligado ao direito à vida e ao direito 
da dignidade da pessoa humana, sendo parte de um grupo seleto que adentra ao rol do mínimo 
existencial, devido a sua essencialidade na vida de todos os indivíduos. Neste sentido, 
assevera Novelino (2011, p. 852) que: 
 
Por ser indissociável do direito à vida e da dignidade da pessoa humana, o direito à 
saúde possui um caráter de fundamentalidade que o inclui, não apenas dentre os 
direitos fundamentais sociais, mas também no seleto grupo de direitos que compõe o 
mínimo existencial. 
 
Já no consoante ao respeito aos deveres decorrentes da prestação da saúde no Brasil, 
estes são de responsabilidade do Estado e dos demais entes federativos, de modo solidário, 
visto que ao Poder Público incumbe formular e implementar políticas sociais e econômicas 
preventivas ou reparativas, que visem assegurar aos cidadãos este direito fundamental. 
Em julgamento recente, o Supremo Tribunal Federal (STF) ressalta a 
responsabilidade solidária do direito à saúde entre os entes federativos, como pode ser visto 
na jurisprudência abaixo elencada: 
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM 
AGRAVO. CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. 
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DOS 
ENTES DA FEDERAÇÃO. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I A 
jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que ésolidária a obrigação 
dos entes da Federação em promover os atos indispensáveis à concretização do 
direito à saúde, tais como, na hipótese em análise, o fornecimento de medicamento 
à recorrida, paciente destituída de recursos materiais para arcar com o próprio 
tratamento. Desse modo, a usuária dos serviços de saúde, no caso, possui direito de 
exigir de um, de alguns ou de todos os entes estatais o cumprimento da referida 
obrigação. (grifo nosso). (STF - AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 
COM AGRAVO: ARE 788795 PR, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, julgado 
em 18/03/2014). 
 
O Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em entendimento jurisprudencial, também 
enuncia acerca da importância do direito à saúde e sua intima ligação com o princípio 
fundamental da dignidade da pessoa humana, ressaltando a responsabilidade do Estado em 
oferecer os meios necessários para sua garantia: 
 
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO À SAÚDE. 
TRATAMENTO MÉDICO-HOSPITALAR EM REDE PARTICULAR. PEDIDO 
 
 
105 
 
SUBSIDIÁRIO NA FALTA DE LEITO NA REDE PÚBLICA. GARANTIA DE 
EFETIVIDADE DA TUTELA JUDICIAL. (...) 2. O direito à saúde, como 
consectário da dignidade da pessoa humana, deve perpassar todo o 
ordenamento jurídico pátrio, como fonte e objetivo a ser alcançado através de 
políticas públicas capazes de atender a todos, em suas necessidades básicas, 
cabendo, portanto, ao Estado, oferecer os meios necessários para a sua 
garantia. (grifo nosso). (STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 1409527 RJ 
2013/0288479-1; Relator Ministro Humberto Martins; Julgado em 08/10/2013). 
 
A saúde no Brasil é considerada um direito universal sendo regido pelo princípio da 
igualdade e do acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde, sendo efetivado por 
meio do Sistema Único de Saúde (SUS) em âmbito nacional. O Sistema Único de Saúde 
(SUS) tem como objetivo primordial atender as necessidades da população, em âmbito 
nacional, além de cuidar de questões que influenciam o fornecimento de uma saúde pública de 
qualidade, como o meio ambiente, a vigilância sanitária, a fiscalização de alimentos, entre 
outros. 
Segundo Tavares (2012, pág. 855): 
 
As ações e serviços de saúde submetem-se ao princípio do atendimento integral, que 
é diferente do acesso universal. Este se refere a um atendimento que é atribuído por 
qualquer pessoa, já o atendimento integral refere-se ao próprio serviço, que no caso, 
deve abranger todas as necessidades do ser humano relacionadas à saúde. Portanto, 
não só todos têm direito a saúde como esta deve ser prestada de maneira completa, 
sem exclusões de doenças ou patologias, por dificuldades técnicas ou financeiras do 
Poder Público. Não é permitido a este esquivar-se da prestação de saúde em todos os 
setores. 
 
O Sistema Único de Saúde é previsto no art. 198 da Constituição Federal e foi 
regulamentado pela Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/90), sendo caracterizado como uma 
rede regionalizada e hierarquizada, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: a) 
descentralização, com direção única em cada esfera de governo; b) atendimento integral, com 
prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; c) 
participação da comunidade. 
Ainda segundo o art. 198 da Constituição, esse sistema é financiado com recursos da 
seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de 
outras fontes, ficando previstos recursos mínimos a serem aplicados, anualmente, em ações e 
serviços públicos de saúde. 
 
 
106 
 
Já de acordo com o art. 199 e o seus respectivos parágrafos, no país é facultada à 
iniciativa privada a assistência à saúde, podendo as instituições privadas participar de forma 
complementar do Sistema Único de Saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de 
direito público ou convênio, tendo preferência às entidades filantrópicas e sem fins lucrativos, 
vedando a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições 
privadas com fins lucrativos, bem como a participação direta ou indireta de empresas ou 
capitais estrangeiros na assistência à saúde no País, salvo nos casos previstos em lei. 
Cabe ressaltar que, a atuação do Estado, seja através da melhoria contínua do SUS ou 
através da implementaçãode políticas ligadas à área da saúde, muitas vezes encontra-se 
limitada devido à limitação dos recursos públicos. Uma forte discussão entre a sociedade civil 
e os poderes políticos ocorreu recentemente no país, sobre a temática da necessidade de 
maiores fontes de custeio destinadas à saúde, culminando com a sanção, no ano de 2013, da 
Lei nº 12.858 de 09 de setembro de 2013, que destina 25% dos royalties do pré-sal à saúde. 
Tendo-se em mente a quantidade de recursos financeiros que a saúde pública 
demanda do Estado Brasileiro, bem como a amplitude de usuários que o sistema criado 
engloba e o dever objetivo que o Estado possui em efetivar este direito, a saúde pública 
brasileira encontra-se em uma situação delicada, quando se trata do atendimento ao usuário. 
As problemáticas existentes no SUS e constantemente reivindicadas e ressaltadas 
pela mídia, como a falta de médicos em diversas regiões do país, falta de medicamentos 
básico, falta de atendimento e realização de cirurgia, bem como as condições precárias de 
diversos hospitais, que não comportam, muitas vezes, um procedimento especifico e obrigam 
o cidadão a procurar na iniciativa privada uma segunda opção, são tão recorrentes no 
cotidiano, que mesmo com a implantação de políticas públicas específicas a este setor, o 
problema não se encontra perto de ser resolvido. 
Em uma tentativa de promover a assistência farmacêutica básica no âmbito do SUS, 
o Ministério da Saúde, com base nesta legislação infraconstitucional, formulou uma listagem 
de medicamentos que devem estar disponíveis em toda rede, à qual atribui a designação 
“Relação Nacional de Medicamentos Essenciais – RENAME”. Entretanto, mesmo os 
medicamentos considerados essenciais, muitas vezes, se encontram em falta, impossibilitando 
o acesso do usuário. Além disso, a RENAME deveria ser atualizada com periodicidade, a fim 
 
 
107 
 
de não se tornar obsoleta e acompanhar as mudanças vivenciadas pela saúde pública 
brasileira, contudo, a frequência de atualização não é como se deveria, o que também 
prejudica o cidadão-usuário do sistema. 
Como dito, diante das inúmeras problemáticas vivenciadas pelo SUS, o Estado 
Brasileiro vive um momento em que o cidadão já não procura o Sistema Único de Saúde para 
a efetivação de seus direitos, mas sim, a tutela jurisdicional. 
No mesmo sentido, Cunha (2012) assevera que na hipótese de frustação desse 
direito, por omissão do poder público na implementação das políticas sociais e econômicas, 
qualquer pessoa pode acionar judicialmente o Estado visando a efetivação desse importante 
direito de cunho social. Nesse sentindo vem proclamando a jurisprudência dos tribunais, em 
especial, do Supremo Tribunal Federal. 
Sendo assim, a fim de demandar pelo seu direito fundamental e exigir a tutela 
objetiva da saúde pública, que teoricamente deveria ser garantida pelo Estado, a saúde 
brasileira passa pelo processo de judicialização, em que as demandas processuais específicas 
sobre políticas públicas destinadas à saúde ganharam grande repercussão nos diversos 
tribunais do país, em um processo que vem acarretando importantes consequências jurídicas, 
sociais, políticas e econômicas para toda a sociedade e será abordado mais a fundo. 
 
2.2 A problemática da judicialização da saúde no brasil 
 
Antes de enfatizar a discussão a respeito do fenômeno da judicialização da saúde no 
Brasil, é fundamental citar três premissas escolhidas, as quais orientam e auxiliam a busca 
pela compreensão dessas novas demandas que estão sendo levadas ao Poder Judiciário. São 
elas: a consolidação do Estado Social, o movimento jurídico-acadêmico conhecido como 
doutrina brasileira da efetividade e a postura ativista do Poder Judiciário, que poderia, em 
linhas gerais, ser melhor visualizada como uma confluência das primeiras proposições. 
No Estado Liberal, o Poder Público assumia o compromisso de abster-se de praticar 
atos que obstassem o exercício dos direitos e garantias individuais, adotando uma postura 
“negativista”. Já com a implantação do Estado Social, este se viu compelido, além de 
continuar evitando a interferência no direito à liberdade do indivíduo, a oferecer prestações 
 
 
108 
 
“positivas”, mediante políticas sociais e econômicas interventivas, que modificam 
substancialmente o relacionamento entre o cidadão e o Estado, agora responsável por 
proporcionar de maneira satisfatória a realização dos direitos sociais. 
Quanto à segunda conjuntura, precipuamente nos últimos anos, o constitucionalismo 
brasileiro vem passando por uma guinada capaz de separá-lo em dois momentos distintos, 
sobretudo quando o debate gira em torno dos direitos e garantias individuais e sociais: um, no 
qual as normas representavam tão somente uma intenção do poder constituinte, sendo 
consideradas diretrizes que deveriam ser observadas pelos atos do Poder Público; outro (o 
atual), em que os mesmos preceitos devem ser aplicados de modo direto e imediato, já que 
possuem força normativa amparada na ideia de que a Constituição é o fundamento de todo o 
ordenamento jurídico, seja em sentido formal ou material. 
Esse contexto apresentou um campo fértil para a prolação de decisões de juízes e 
tribunais que, muitas vezes, sobretudo quando se está diante de omissões ou insuficiências 
dos Poderes Legislativo e Executivo e sob o argumento de estarem concretizando os direitos 
previstos na Carta Magna, acabam por extrapolar as suas competências, interferindo em 
situações que, a priori, deveriam ser solucionadas pelo processo político. 
Diante disso, o direito à saúde não ficou isento de ter o seu complexo conteúdo 
decomposto em várias ações e prestações pleiteadas junto ao Poder Judiciário, no intuito de 
que este execute a obrigação constitucional de prestação universalizada do serviço de saúde, 
mobilização que deu origem à “judicialização da saúde”. 
À vista da rápida expansão desse fenômeno, não só a comunidade jurídica, mas 
também os profissionais da saúde, os gestores públicos e a própria sociedade civil, são 
constantemente instados a se posicionarem sobre o tema, que, por isso mesmo, não pode ser 
examinado a partir de um único ponto de vista, devendo, necessariamente, ser analisado sob 
uma perspectiva interdisciplinar, para que, além de entender os seus contornos, seja possível 
refletir a respeito das consequências que estão por trás desse processo. 
Por que cada vez mais cresce o número de ações individuais relativas ao direito à 
saúde se existe um rol de medicamentos e tratamentos disponibilizados pelo Sistema Único de 
Saúde (SUS)? Considerando que essa lista é incompleta ou obsoleta, seria da competência do 
 
 
109 
 
Poder Judiciário preencher essas lacunas e obrigar o Poder Público a realizar tais ações e 
serviços? 
É certo que nenhuma “lesão ou ameaça a direito” deixará de ser apreciada pelo Poder 
Judiciário, todavia, quais seriam os limites dessa atuação? Até onde garantir certo tratamento 
para um paciente específico pode significar a criação de obstáculos para a realização desse 
direito social em um sentido mais amplo? São questões complexas que, ao fim e ao cabo, 
significa mesmo discutir sobre a função do Poder Judiciário em um Estado Democrático de 
Direito. 
Não obstante, para que seja possível apresentar possíveis respostas a tais 
questionamentos, é preciso conceituar o que seria a “judicialização da saúde”. Como destaca 
Barroso (2014, p. 3): 
 
Judicialização significa que algumas questões de larga repercussão política ou social 
estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias políticas 
tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder Executivo (...). Como intuitivo, a 
judicialização envolve uma transferência de poder para juízes e tribunais, com 
alterações significativas na linguagem, na argumentação e no modo de participação 
da sociedade. O fenômeno tem causas múltiplas. Algumas delas expressamuma 
tendência mundial; outras estão diretamente relacionadas ao modelo institucional 
brasileiro. 
 
Assim, a judicialização da saúde pode ser traduzida como uma sequência de ações 
propostas em face do Poder Público, as quais envolvem diversas questões relacionadas ao 
preenchimento do direito à saúde e que, neste momento, estão sendo decididas em grande 
escala pelo Poder Judiciário, e não pelos demais poderes. 
No Brasil, este movimento teve início na década de 90, protagonizado pelos 
portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV), os quais, por intermédio de 
assistência jurídica de ONGs, pleiteavam junto ao Poder Judiciário o fornecimento de 
antirretrovirais pelo Poder Público. 
Naquele contexto, as drogas eram indispensáveis para a garantia da sobrevida destes 
pacientes e já tinham sido liberadas nos EUA, embora ainda não fossem disponibilizadas nas 
unidades de saúde públicas brasileiras. Esse marco produziu efeitos que se prolongaram no 
decorrer do tempo, como se observa no julgamento do STF abaixo colacionado: 
 
 
 
110 
 
O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível 
assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 
196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve 
velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular – e 
implementar – políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos 
cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário 
à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. O direito à saúde – além de 
qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas – representa 
consequência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, 
qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização 
federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da 
população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave 
comportamento inconstitucional. A interpretação da norma programática não pode 
transformá-la em promessa constitucional inconsequente. O caráter programático da 
regra inscrita no art. 196 da Carta Política – que tem por destinatários todos os entes 
políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado 
brasileiro – não pode converter-se em promessa constitucional inconsequente, sob 
pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela 
coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável 
dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a 
própria Lei Fundamental do Estado. (...) O reconhecimento judicial da validade 
jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, 
inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/Aids, dá efetividade a preceitos 
fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na 
concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde 
das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a 
consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do 
STF." (RE 271.286-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 12-9-2000, 
Segunda Turma, DJ de 24-11-2000.) No mesmo sentido: AI 550.530-AgR, rel. min. 
Joaquim Barbosa, julgamento em 26-6-2012, Segunda Turma, DJE de 16-8-2012; 
RE 368.564, Rel. p/ o ac. Min. Marco Aurélio, julgamento em 13-4-2011, Primeira 
Turma, DJE de 10-8-2011; STA 175-AgR, Rel. Min. Presidente Gilmar Mendes, 
julgamento em 17-3-2010, Plenário, DJE de 30-4-2010. Vide: RE 668.722-AgR, rel. 
min. Dias Toffoli, julgamento em 27-8-2013, Primeira Turma, DJE de 25-10-2013; 
AI 734.487-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 3-8-2010, Segunda Turma, 
DJE de 20-8-2010. 
 
Atualmente, com novas roupagens, o fenômeno se expandiu de maneira alarmante, 
estendendo-se para conceder fármacos para o tratamento de outras moléstias, além de várias 
medidas e terapias em diversos casos, internação hospitalar, providências administrativas para 
a melhoria de atendimento hospitalar, ampliação de unidade de terapia intensivo-adulta em 
unidade hospitalar, custeio de tratamento médico no exterior, entre outros provimentos, de 
que é exemplo a ementa do STF abaixo: 
 
Direito à saúde. Portador de doença grave. Determinação para que o Estado 
forneça fraldas descartáveis. Possibilidade. Caracterização da necessidade. (...) O 
Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a administração 
pública adote medidas concretas, assecuratórias de direitos constitucionalmente 
 
 
111 
 
reconhecidos como essenciais, como é o caso da saúde. A Corte de origem 
consignou ser necessária a aquisição das fraldas descartáveis, em razão da condição 
de saúde do agravado e da impossibilidade de seu representante legal de fazê-lo às 
suas expensas. (RE 668.722-AgR, rel. min. Dias Toffoli, julgamento em 27-8-2013, 
Primeira Turma, DJE de 25-10-2013.) Vide: RE 271.286-AgR, rel. min. Celso de 
Mello, julgamento em 12-9-2000, Segunda Turma, DJ de 24-11-2000. (grifo nosso). 
 
 Neste cenário, Nunes (2014, p. 328) busca apontar quais seriam as causas para o 
surgimento e crescimento desse fenômeno, entre as quais se destacam: 
 
A judicialização não é um fenômeno apartado, mas, especialmente, consequência da 
estruturação do SUS, das falhas das políticas públicas, da má gestão administrativa, 
do desinteresse político, do subfinanciamento e da utilização indevida de 
mecanismos processuais. 
 
É diante dessa complexidade que a judicialização deve ser problematizada e 
analisada à luz de diversos critérios, para evitar o risco de se adotar uma visão limitada, 
segundo a qual o provimento jurisdicional deve ser deferido, porque significa a efetivação do 
direito à saúde. 
Desta feita, cumpre ressaltar que não se está a olvidar que o Poder Público pode ser 
obrigado por determinação judicial a oferecer meios concretos de materializar o direito à 
saúde. Como bem ensina Schwartz (2001, p. 163): 
 
A saúde, como direito público subjetivo e fundamental do ser humano, quando 
lesionada, não pode ser excluída da apreciação do Poder Judiciário. Essa é, no 
constitucionalismo contemporâneo, a tarefa mais elevada do Poder Judiciário: 
garantir a observância e cumprimento dos direitos fundamentais do homem. 
 
Todavia, existem limites fáticos e jurídicos que precisam ser observados, já que o 
Direito, sendo um produto cultural, não existe se afastado da realidade. Nesta seara, torna-se 
fundamental estabelecer critérios objetivos e parâmetros capazes de impedir a sobreposição de 
funções entre o Poder Judiciário e o Poder Executivo, principal responsável pelo 
desenvolvimento das políticas públicas, a fim de que os meios processuais colocados à 
disposição dos indivíduos não sejam desvirtuados. 
Além disso, deve-se afastar da concepção de que o relato teórico e abstrato da 
petição inicial e da legislação é suficiente, posto que, na análise das consequências do 
 
 
112 
 
processo de judicialização da saúde não podem deixar de serem considerados fatores 
relacionados à conjuntura política, econômica e social da sociedade brasileira. 
 
2.3 A intervenção do poder judiciário na efetividade do direito à saúde e suas 
implicações 
 
Como foi visto alhures, no mundo do dever ser, a possibilidade de o direito à saúde 
ser concretizado mediante a simples propositura de uma ação judicial, seria prodigioso. Em 
que pese os benefícios potenciais que a judicialização poderia trazer para efetivação desse 
direito social, não se pode desconsiderar os riscos à gestão causados por essas decisões. 
Isto porque, há de se considerar que a intervenção do Poder Judiciário produz um 
impacto no macrossistema social, expandindo-se para além da esfera jurídica do demandante. 
Sendo assim, esse fenômenosó poderá ser conveniente quando forem encontrados meios que 
consigam acabar, ou pelo menos diminuir, as preocupantes consequências advindas de tal 
ocorrência. 
Uma vez que inexiste embasamento suficiente para se considerar que todas as 
demandas relativas aos direitos fundamentais, sejam eles individuais ou sociais, deverão ser 
levadas à apreciação do Poder Judiciário para que sejam solucionados os problemas 
decorrentes, principalmente, do caráter programático das normas constitucionais, deve-se 
fazer uma análise crítica para melhor entender a complexidade do fenômeno da judicialização 
e, consequentemente, as implicações dele decorrentes. 
Ponderando acerca dessa questão, Romero (2014, p. 14) destaca que: 
 
Atualmente, os governos federal, estaduais e municipais – gestores do SUS – sofrem 
uma avalanche de ordens judiciais determinando a dispensação de medicamentos, o 
que gera efeitos negativos, especialmente sobre o gerenciamento da assistência 
farmacêutica nos estados e sobre os seus benefícios diretos, como a interrupção do 
tratamento de pacientes regulares em razão da transferência de medicamentos em 
estoque que lhe seriam destinados para pacientes beneficiados por determinação 
judicial (TCU, 2005). Essas decisões da Justiça comprometem, assim, a dispensação 
regular, o atendimento de prioridades definidas e a implementação das políticas de 
assistência farmacêutica aprovadas, já que os gestores precisam remanejar recursos 
vultosos para atender situações isoladas. 
 
 
 
113 
 
Logicamente, não se está a olvidar a grande contribuição do Poder Judiciário para a 
garantia do respeito aos direitos essenciais de qualquer ser humano, mormente quando se está 
diante da omissão ou ineficiência na execução de políticas públicas e/ou elaboração das leis. 
Não obstante, é também a partir das constatações de excessos e falhas que são aprimoradas as 
formas de melhor oferecer uma tutela jurisdicional equânime e justa. 
Posto isto, tem-se que a primeira dificuldade encontrada ao examinar a temática da 
judicialização da saúde, reside no próprio conteúdo deste mesmo direito, porquanto esteja 
intimamente entrelaçado com o princípio da dignidade da pessoa humana e o próprio direito à 
vida. 
Tal característica, por si só, é capaz de alargar de sobremaneira o seu espectro de 
abrangência e interpretação. Neste sentido, por várias vezes, percebe-se que a racionalidade é 
dispensada quando são levadas ao Poder Judiciário ações cujos pedidos giram em torno da 
obtenção de sabão de coco, óleo de soja, creme fixador de dentadura, farinha láctea, etc. 
Não é que esteja sendo contestada a real necessidade ou não de tais produtos, ocorre 
simplesmente que essa “processualização” deve ter um caráter excepcional, pois, caso 
contrário, a função do Poder Judiciário não ficará bem delimitada e este será visualizado 
como uma “panaceia” capaz de resolver, de maneira favorável e prestativa, qualquer impasse 
do cidadão no usufruto dos seus direitos. 
Com essa atuação, o judiciário, de certo modo, usurpa uma competência do Poder 
Executivo (elaborar as políticas públicas responsáveis pela garantia do direito à saúde), 
causando um desequilíbrio na administração estatal e diminuindo a sua eficiência, através do 
desperdício de recursos. Isto acontece porque o executivo despende tempo para planejar a 
distribuição das verbas orçamentárias, enquanto o judiciário, através das suas decisões, impõe 
outro destino às finanças. Os dois poderes, portanto, atuam de forma desarmônica, mesmo que 
buscando atingir os mesmos objetivos finais. 
Segundo Marques (2014, p. 65): 
 
Analisa-se o direito social, em cada caso individual apresentado, através de uma 
determinação oriunda do Poder Judiciário que, muitas vezes, contrasta com a 
política estabelecida em matéria de assistência à saúde e com a própria lógica de 
funcionamento do sistema político. 
 
 
 
114 
 
Com a confusão de papeis, os indivíduos sentem-se à vontade para ir direto ao Poder 
Judiciário na tentativa de encurtar etapas e ver o seu direito assegurado tão logo quanto 
possível. Neste viés, alegando que as demandas do Sistema Único de Saúde são 
demasiadamente complexas e vultuosas, bem como que os casos de urgência não são de 
imediato resolvidos, são formulados pedidos liminares para que o direito à saúde seja 
materializado mesmo antes da apreciação meritória. 
Nesses casos, a situação agrava-se e os impactos podem ser mais facilmente 
percebidos. Como o direito à saúde, em regra, está vinculado ao direito à vida, as liminares, 
em grande parte, são concedidas, bastando apenas que o juiz, mediante uma cognição sumária 
convença-se do alegado e vislumbre o perigo da demora no caso concreto para, inclusive, 
impor ao Poder Público o pagamento de multa por dia de descumprimento. 
Essa cominação gera um caráter de obrigatoriedade ainda maior para a determinação 
judicial, haja vista que surte efeitos diretos no orçamento do Estado. Unindo-se a isso o fato 
de ser estabelecido um prazo curtíssimo para que o direto seja efetivado, tem-se como 
resultado, por exemplo, a compra de medicamentos sem a realização do processo licitatório, o 
que significa desperdiçar recursos públicos. 
Seguindo a mesma linha de raciocínio, é de se conceber que a “presunção” de que as 
ações serão julgadas em desfavor do Poder Público, pode, como é noticiado em várias 
reportagens, dar origem a uma “indústria da ação judicial”, na qual podem estar envolvidos 
advogados, laboratórios farmacêuticos e médicos. 
Explica-se: primeiro que, como o cumprimento da decisão judicial deve ser feito 
rapidamente, alguns laboratórios aumentam consideravelmente o custo de aquisição dos seus 
produtos pelo Poder Público; em segundo lugar, constantemente é solicitada a 
disponibilização de tratamentos experimentais ou medicamentos que ainda não estão 
registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), podendo ser esta uma 
forma de introduzir um novo fármaco no mercado, o que favorece os interesses econômicos 
de uma minoria. 
Além disso, essa grande quantidade de processos com pedido de liminar contribui 
com a morosidade do sistema jurídico, visto que a intrínseca relevância do direito à saúde faz 
 
 
115 
 
com que seja dada prioridade a essas ações, enquanto processos que versam sobre outras 
temáticas passam longos anos “engavetados”. 
Outra barreira está relacionada ao despreparo técnico não só dos magistrados, mas 
dos demais profissionais do mesmo ramo, que, por muitas das vezes, não tem conhecimento 
acerca da existência de políticas públicas voltadas para o fim pretendido com a judicialização 
do problema e não consegue diferenciar quais são as prescrições negligentes e que 
recomendam tratamentos inócuos4. 
Como última sequela da judicialização da saúde aponta-se a discussão sobre os 
impactos orçamentários decorrentes dessa concretização do direito à saúde feita pelo 
judiciário. Tratando-se os direitos sociais de prestações estatais positivas, certamente a sua 
efetivação significa um “gasto” para o Poder Público. Acontece que enquanto a sociedade tem 
necessidades ilimitadas, os recursos são finitos, e isso constrange o Estado a fazer escolhas 
que tenham por objetivo destinar os recursos financeiros para que o executivo desenvolva 
políticas públicas adequadas a fornecer um “mínimo existencial” para todos os cidadãos. 
O próprio Min. Celso de Mello, em decisão do STF proferida na ADPF n.º 45/DF, 
consignou o seguinte: 
 
Desnecessário acentuar-se, considerando o encargo governamental de tornar efetiva 
a aplicação dos direitos econômicos, sociais e culturais, que os elementos 
componentes do mencionado binômio (razoabilidade da pretensão + disponibilidade 
financeira do Estado) devem configurar-se de modo afirmativo e em situação de 
cumulativa ocorrência, pois, ausentes qualquer desses elementos, descaracterizar-se-
á a possibilidade estatal de realizaçãoprática de tais direitos. (ADPF-MC N.º 45, 
Rel. Celso de Mello, DJ 4.5.2004). 
 
Isto advém do fato de que não existe uma previsão orçamentária específica para o 
cumprimento de tais decisões judiciais. Dessa forma, o que ocorre? O Poder Público é forçado 
a realocar os recursos que já estavam destinados para atender outras demandas, ficando 
impedido de concretizar de maneira eficaz outros direitos sociais (educação, lazer, etc.), 
principalmente a nível municipal, onde as receitas são bem menores. 
 
4É por esta razão que a Resolução nº 31 do CNJ, aponta como sendo fundamental “a adoção de medidas visando 
melhor subsidiar os magistrados e demais operadores do direito, para assegurar maior eficiência na solução das 
demandas judiciais envolvendo a assistência à saúde”. 
 
 
116 
 
O que dizer então quando a despreocupação do magistrado com tais impactos torna 
as suas decisões um vetor de dissipação das finanças, na medida em que medicamentos de 
alto custo são concedidos quando outros genéricos já possuem a mesma função para o 
tratamento da doença? Quando gastos desnecessários são feitos em claro desrespeito ao 
princípio da reserva do possível? 
De acordo com Silva (2014, p. 26): 
 
Em linhas gerais, o princípio da reserva do possível regula a possibilidade e a 
extensão da atuação estatal no que se refere à efetivação de alguns direitos sociais e 
fundamentais, tais como o direito à saúde, condicionando a prestação do Estado à 
existência de recursos públicos disponíveis. Em geral, o magistrado não se preocupa 
com os impactos orçamentários de sua decisão, muito menos com a existência de 
meios materiais disponíveis para o seu cumprimento. Esquece-se, porém, que os 
recursos são finitos. 
 
Finalmente, há de se conceber que essa realocação de recursos significa beneficiar 
um indivíduo em detrimento da coletividade, pois, se em alguns casos extraordinários o 
judiciário deve mesmo atuar para conferir o usufruto de um direito assegurado 
constitucionalmente, uma atuação excessiva pode consubstanciar-se na “falência” do Estado 
e, de forma incongruente, traduzir-se na diminuição das políticas voltadas para a 
materialização desses mesmos direitos. 
Afastando-se de uma abordagem individualista dos problemas sociais, pode-se 
perceber que a judicialização da saúde é um fenômeno hábil a comprometer a ideia da 
universalização desse direito social, pois estabelece desigualdades entre cidadãos e dificulta a 
eficácia das políticas públicas de saúde, considerando que grande parte dos recursos alocados 
à saúde destina-se às demandas judiciais. 
 
3 Conclusões 
 
É inegável a importância e a dimensão que a judicialização da saúde vem 
desempenhando nos últimos anos, sendo um dos temas mais debatidos entre acadêmicos e 
juristas devido à dificuldade encontrada pelo poder estatal para propor medidas amenizá-la. 
Ao possuir como alicerce a questão da saúde pública brasileira e dos meios disponíveis para a 
sua efetivação, a judicialização engloba diversos olhares e fundamentações. 
 
 
117 
 
Deixando-se, todavia, a discussão doutrinária um pouco de lado, o que se pretende 
ressaltar é que este movimento surgiu como uma busca para a satisfação de direitos por parte 
da população, que, frente ao poder estatal, encontrava-se, muitas vezes, em uma condição de 
hipossuficiência quanto à garantia do seu direito à saúde. 
Neste contexto, visualiza-se com facilidade, que apesar dos contornos negativos que 
a problemática ganhou com o passar do tempo, como as irrestritas demandas descobertas em 
diversos tribunais brasileiros, sua origem remonta, tão somente, a função típica do Poder 
Judiciário como protetor da lei e julgador de litígios. O que se objetiva destacar é que o 
processo de judicialização na atual conjuntura brasileira gera consequências jurídicas e 
fáticas, as quais devem ser analisadas em sua completude. 
Seja pelo âmbito do orçamento público, que fica defasado devido aos cumprimentos 
de uma vasta quantidade de liminares não previstas inicialmente pelos gestores, e 
prejudicando as finanças dos entes federativos e a destinação de recursos para outras políticas 
sociais; seja pela morosidade judicial que este fenômeno acarreta, devido ao caráter urgente 
que as liminares apresentam, impedindo os julgadores de dar continuidade aos processos que 
já haviam sido interpostos; a judicialização caracteriza-se como uma fuga do cidadão para a 
via judicial, devido à insuficiência do atendimento estatal em outras esferas, 
É oportuno ressaltar que não está sendo enunciado que a proteção do direito à saúde 
depende do orçamento público, mas sim que, é de fundamental importância a união de 
esforços conjuntos entre os entes e poderes federativos para a garantia deste direito. O que se 
combate é a utilização irrestrita dos recursos públicos e a massividade desarrazoada, que 
prejudica todo o sistema. 
As consequências negativas podem ser amenizadas por uma atuação estatal comum e 
criativa, como está sendo vivenciada em diversos lugares do país, com a criação de câmaras 
técnicas – que auxiliam o julgador em sua tomada de decisão, sobre a real necessidade de 
cada paciente –, a implantação do orçamento participativo em vários municípios – que 
possibilita a participação da população quanto à escolha da destinação de recursos –, e a 
criação dos conselhos nacional, estadual e municipal de saúde – que agem em suas respectivas 
esferas e possuem funções fiscalizatórias e positivas, em uma garantia de direitos junto à 
população. 
 
 
118 
 
Deste modo, não se pretende rotular a judicialização da saúde como boa ou ruim, 
como positiva ou negativa, mas sim, expor que esta resulta do amadurecimento acerca da 
concretização judicial dos direitos relacionados à saúde, atitude advinda da sociedade, através 
de um clamor público no sentido de que este direito é essencial à sobrevivência e a condição 
humana, e por isso, deve ser, de fato, universal e integralmente garantido, senão pelo Estado, 
pelo Poder Judiciário. 
 
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