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1 FERNANDA MAGNI BERTHIER POLÍTICA E TEORIA DE ESTADO II Fernanda Magni Berthier Professor Valin 2018/2 2 FERNANDA MAGNI BERTHIER SUMÁRIO 1. A SEPARAÇÃO DE PODERES ................................................................................................................................ 3 1. 1. FÓRMULA DE MONTESQUIEU ............................................................................................................................... 3 1. 1. 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................ 3 1. 1. 2. MONTESQUIEU ............................................................................................................................................. 3 1. 2. O PROBLEMA DO ALCANCE DA SEPARAÇÃO DOS PODERES .................................................................................. 7 1. 2. 1. VERTENTES DOUTRINÁRIAS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES ........................................................................ 7 1. 2. 2. A FEDERAÇÃO: OS ESTADOS UNIDOS E A SEPARAÇÃO DOS PODERES ......................................................... 7 1. 2. 3. SISTEMA DE FREIOS E CONTRAPESOS ......................................................................................................... 10 1. 3. A RIGIDEZ DA SEPARAÇÃO DOS PODERES ........................................................................................................... 11 1. 4. COMISSÕES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO ................................................................................................... 11 1. 5. PERSPECTIVAS DO STF ......................................................................................................................................... 13 2. TEORIAS DO MANDATO ..................................................................................................................................... 16 2. 1. TEORIA DO MANDATO IMPERATIVO ................................................................................................................... 16 2. 2. TEORIA DO MANDATO IMPUTATIVO .................................................................................................................. 17 2. 3. TEORIA DO MANDATO PARTIDÁRIO ................................................................................................................... 18 2. 4. RESUMO TEORIAS DO MANDATO ....................................................................................................................... 18 3. SISTEMAS DE GOVERNO .................................................................................................................................... 19 3. 1. PARLAMENTARISMO ........................................................................................................................................... 19 3. 1. 1. CARACTERÍSTICAS BÁSICAS ......................................................................................................................... 19 3. 1. 2. HEXAPARTIÇÃO DOS PODERES APLICADA AO PARLAMENTARISMO .......................................................... 24 3. 1. 3. SÍNTESE ....................................................................................................................................................... 25 3. 1. 4. CASOS DE PARLAMENTARISMO .................................................................................................................. 26 3. 2. PRESIDENCIALISMO ............................................................................................................................................ 27 3. 2. 1. CARACTERÍSTICAS BÁSICAS ......................................................................................................................... 28 3. 2. 2. TRIPARTIÇÃO DOS PODERES APLICADA AO PRESIDENCIALISMO ................................................................ 29 3. 2. 3. SÍNTESE ....................................................................................................................................................... 30 3. 3. SEMIPRESIDENCIALISMO .................................................................................................................................... 31 3. 3. 1. CARACTERÍSTICAS BÁSICAS ......................................................................................................................... 31 3. 3. 2. HEXAPARTIÇÃO DOS PODERES APLICADA AO SEMIPARLAMENTARISMO .................................................. 32 3. 3. 3. OBSERVAÇÕES ............................................................................................................................................ 33 3. 3. 4. SÍNTESE ....................................................................................................................................................... 36 4. PARTIDOS POLÍTICOS E SISTEMAS PARTIDÁRIOS ................................................................................................ 37 4. 1. PARTIDOS POLÍTICOS .......................................................................................................................................... 37 4. 1. 1. CARACTERIZAÇÃO DOS PARTIDOS POLÍTICOS ............................................................................................ 37 4. 1. 2. DIFERENCIAÇÃO EM RELAÇÃO A OUTRAS FORÇAS POLÍTICAS ................................................................... 38 4. 1. 3. FUNÇÕES DOS PARTIDOS POLÍTICOS .......................................................................................................... 38 4. 1. 4. TIPOLOGIA DOS PARTIDOS POLÍTICOS ........................................................................................................ 39 4. 1. 5. PARTIDOS ANTISSISTEMA ........................................................................................................................... 41 4. 2. SISTEMAS PARTIDÁRIOS ...................................................................................................................................... 42 4. 2. 1. SISTEMAS UNIPARTIDÁRIOS ....................................................................................................................... 42 4. 2. 2. SISTEMAS BIPARTIDÁRIOS .......................................................................................................................... 42 4. 2. 3. SISTEMAS PLURIPARTIDÁRIOS .................................................................................................................... 43 5. SISTEMAS ELEITORAIS ........................................................................................................................................ 45 5. 1. SISTEMAS MAJORITÁRIOS ................................................................................................................................... 45 5. 1. 1. PATOLOGIAS DO SISTEMA MAJORITÁRIO ................................................................................................... 45 5. 1. 2. VARIAÇÕES DO SISTEMA MAJORITÁRIO ..................................................................................................... 46 5. 2. SISTEMAS PROPORCIONAIS ................................................................................................................................ 48 5. 2. 1. TEORIAS DE SUSTENTAÇÃO ........................................................................................................................ 48 5. 2. 2. COMO FUNCIONA NO BRASIL ..................................................................................................................... 48 3 FERNANDA MAGNI BERTHIER RESUMO PTE II FERNANDA MAGNI BERTHIER – 2018/2 1. A SEPARAÇÃO DE PODERES 1. 1. FÓRMULA DE MONTESQUIEU 1. 1. 1. INTRODUÇÃO • Considerações: Embora seja clássica a expressão “separação de poderes”,o Estado é uno indivisível. Assim, ainda que haja muitos órgãos exercendo o poder soberano do Estado, a unidade do poder se mantém. Na atualidade, a importância prática dessa polêmica está intimamente relacionada com a concepção do papel do Estado na vida social. De fato, quando se pretende desconcentrar o poder, atribuindo o seu exercício a vários órgãos, a preocupação maior é a defesa da liberdade dos indivíduos, pois, quanto maior for a concentração do poder, maior será o risco de um governo ditatorial. Diferentemente, quando se ignora o aspecto do poder para se cuidar das funções, o que se procura é aumentar a eficácia do Estado, organizando-o da maneira mais adequada para o desempenho de suas atribuições1. • Aristóteles: Aristóteles foi o antecedente mais remoto da separação de poderes. Ele considerava injusto e perigoso atribuir a um só indivíduo o exercício do poder. Além disso, há a questão da eficiência, quando, em sua obra, menciona a impossibilidade prática de que 1 só homem previsse tudo o que nem a lei pode especificar. Dessa forma, ainda que, com Aristóteles e outros autores, já houvesse uma semente da separação dos poderes, Montesquieu é o grande teórico. 1. 1. 2. MONTESQUIEU Com Montesquieu, a teoria da separação dos poderem é concebida como um sistema em que se conjugam um legislativo, um executivo e um judiciário, harmônicos e independentes entre si, tomando, praticamente, a configuração que iria aparecer na maioria das Constituições. 1 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 215. Política e Teoria de Estado 11 O que se verifica é que Montesquieu, já adotando a orientação que seria seguida pelo liberalismo, não dá ao Estado qualquer atribuição interna, a não ser o poder de julgar e punir. Assim, as leis, elaboradas pelo Legislativo, deveriam ser cumpridas pelos indivíduos, e só haveria interferência do Executivo para punir quem não as cumprisse. 4 FERNANDA MAGNI BERTHIER Como é óbvio, dando atribuições tão restritas ao Estado, Montesquieu não estaria tão preocupado com a sua eficiência. A tripartição seria um instrumento para garantir a liberdade individual. 2 • 3 Poderes: 2 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 217 PODER EXECUTIVO GENTES PODER EXECUTIVO DIREITO CIVIL PODER LEGISLATIVO FUNÇÕES Manter a ordem interna e garantir a segurança externa Punir os crimes e resolver os conflitos entre particulares Deliberar e estatuir (Câmara Baixa) / moderar e julgar nobres (Câmara Alta) TITULARIDADE Monarca Juízes Eletiva (CB)/Hereditária (CA) FILOSOFIA DE MONTESQUIEU: • Filósofo da moderação, dos limites. • “Todo homem que tem poder é levado a abusar dele”, assim, a chave do equilíbrio é a Eurritmia do desejo, pois somos infelizes por desejarmos muito ou pouco. A solução seria dividir/ separar o poder. Cada Estado teria 3 tipos de poder. • Liberdade: como finalidade e meio: o Meio para que os indivíduos possam trabalhar e enriquecer moderadamente (produz segurança). o Fim supremo do direito da política. •= Poder Executivo atual; •O titular é o monarca, e a função é manter a ordem interna e a segurança externa. •Submisso à lei. •Feição liberal, não intervencionista. Direito e política existiriam para garantir a liberdade. Não é trabalho do Estado tornar os indivíduos felizes, isso seria função do próprio indivíduo. PODER EXECUTIVO DAS COISAS QUE DEPENDEM DO DIREITO DAS GENTES •= Poder Judiciário atual •Não utilizar o termo “Poder Judiciário”! •A função é punir os crimes e resolver os conflitos entre particulares. •Juízes: •Não são juízes de carreira. Ideia próxima à do júri dos anglos-saxões. •Eram recrutados, de tempos em tempos, pelo Estado, de forma que diferem do conceito atual de “juiz”. •Deviam ser submissos à lei (La Bouche de La Lei), contra qualquer ativismo judicial. É o poder mais submisso. •Positivistas: legalistas, submissos, amigos da aplicação da lei. •“A potência de julgar é de alguma forma nula, ela não é criativa. “ •Não podem modificar a essência das normas do Legislativo, nem criar regras primárias de direitos e deveres. PODER EXECUTIVO DAS COISAS QUE DEPENDEM DO DIREITO CIVIL 5 FERNANDA MAGNI BERTHIER • Poder Legislativo Bicameral: O bicameralismo surge da ideia da necessidade de moderar – Montesquieu é considerado o filósofo da moderação e dos limites. De todos os poderes do Estado democrático, o Legislativo é, sem dúvidas, o maior. Confiá-lo a uma câmara única é criar circunstâncias favoráveis ao despotismo. Dessa forma, o bicameralismo é uma expressão conservadora: a segunda câmara teria um papel moderador sobre a câmara popular. 3 O Senado, por ter um mandato mais longo e por ser composto de homens mais velhos, com mais experiência, seria estável por não se deixar transformar facilmente em joguete das paixões do momento. É mais ponderado, mais conservador e representa melhor a força inibitória necessária para o progresso. Como a câmara popular – mais impulsiva e ligada a interesses partidários – por vezes vota em leis prejudiciais, inoportunas e perigosas, o exame pelo Senado pode corrigir esses defeitos.4 Em suma, na chamada Câmara popular (Baixa), representa-se a nação como entidade política, com representação proporcional à população de cada estado. Já no Senado, representam-se, igualmente, os estados como órgãos formadores da União Federal – por isso, independentemente da quantidade de população, assegura-se a todos o mesmo número de representantes. Se não houvesse esse segundo órgão, com os estados representados a pé de igualdade, se teria apenas uma relação de subordinação, na qual a vontade dos mais fortes se impusesse à dos mais fracos.5 3 AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. São Paulo: Globo, 2008. p. 208-209. 4 Ibidem. p. 209-210. 5 Ibidem. p. 212. CÂMARA BAIXA • Eletiva - comuns; • Elemento democrático; • Poder de deliberar/ estatuir; • Mais atingida pelas agitações populares; • Mais numerosa; • Mandato mais curto. CÂMARA ALTA • Hereditária - lordes; • Controla e modera os excessos da câmara baixa; • Possui o poder de julgar nobres; • Mais estável; • Menos numerosa; • Mandato mais longo. •A função é fazer e revogar leis. •É o poder mais relevante. •Sistema bicamaral: Câmara Alta e Câmara Baixa. •Observação: na passagem do Estado Liberal para o Estado Social houve uma alteração paradigma dos poderes: enquanto para o Liberalismo Clássico o Poder Legislativo e a sua função de controlar a autoridade tinham destaque, no Estado Social, em razão das novas necessidades e responsabilidades do Estado, o Poder Executivo ganhou a relevância que o Legislativo tinha anteriormente PODER LEGISLATIVO 6 FERNANDA MAGNI BERTHIER Essa divisão é acusada pelos críticos de tornar excessivamente lento o processo legislativo, em decorrência da necessidade da deliberação em duas assembleias. Darcy Azambuja responde, argumentando que a demora legislativa era também fruto do regime de ampla discussão nas democracias, e que essa demora não era um mal, mas um bem: não se precisa de muitas leis, mas de boas leis. Com a demora, tem-se tempo de estudo entre a apresentação do projeto e a sua decisão, permitindo boa reflexão e ponderação.6 No Brasil atual, o Poder Legislativo Federal é bicameral, ou seja, composto por 2 casas: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Nesse sistema, cada uma das Casas Legislativas inicia o processo legislativo e a outra o revisa. Assim, ambas devem se manifestar sobre a elaboraçãodas leis, com raras exceções. O objetivo desse sistema é fazer com que as leis sejam mais debatidas, e, seguindo a ideia do sistema de freios e contrapesos, evitar excessos e decisões precipitadas na produção das leis. • Observações Importantes: o Veto absoluto: § Rei dispõe poder de veto que não pode ser derrubado. § Participação do Poder Executivo no Legislativo. o Nobres não estariam submetidos ao poder de julgar. § Para Montesquieu, nobres deveriam ser julgados pelos seus pares, ou seja, pela Câmara Alta. § Participação do Legislativo (Câmara Alta) na função Judiciária. • Comparação Senado brasileiro e Câmara Alta de Montesquieu: 6 AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. São Paulo: Globo, 2008. p. 213-214. SEMELHANÇAS DO PAPEL MODERADOR: • Idade Mínima: 35 anos. Se acredita que os mais velhos tenham mais experiência e pudor. • Mandato dos senadores: 8 anos (2 legislaturas). O tempo mais longo favoreceria o esquecimento das decisões impopulares tomadas por eles. O Senado Brasileiro, além de controlar as decisões do legislativo, tem outro poder: manter o equilíbrio entre os estados. Por isso todos os estados possuem o mesmo número de senadores, independentemente de seu tamanho territorial e populacional. Os senadores são, além de representantes dos estados, representantes do povo, uma vez que votam em todos os projetos de lei. As semelhanças apontadas acima demonstram a expressão conservadora. OBS: SENADO X CÂMARA DOS DEPUTADOS: A Câmara, diferentemente do Senado, representa o povo, não os estados, sendo análoga à Câmara Baixa inglesa. Assim, a quantidade de deputados por estado não é fixa. Além disso, ela é eleita por voto proporcional, enquanto o Senado é majoritário. A união da Câmara com o Senado forma o Congresso Nacional, que também se reúne em sessões conjuntas para algumas atividades específicas. 7 FERNANDA MAGNI BERTHIER 1. 2. O PROBLEMA DO ALCANCE DA SEPARAÇÃO DOS PODERES • Definição do problema do alcance: procura estabelecer de que maneira se deve interpretar a separação de poderes e o quão separados os poderes devem estar. 1. 2. 1. VERTENTES DOUTRINÁRIAS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES 1. 2. 2. A FEDERAÇÃO: OS ESTADOS UNIDOS E A SEPARAÇÃO DOS PODERES CONFEDERAÇÃO FEDERAÇÃO Estados Soberanos Estados Autônomos Direito de secessão existente Direito de secessão inexistente Poder central não legisla diretamente aos indivíduos (ratificação Estados-Membros) Poder central legisla diretamente aos indivíduos 1776 1787 REVOLUÇÃO AMERICANA/ INDEPENDÊNCIA EUA CONVENÇÃO DA FILADÉLFIA/ CONSTITUIÇÃO DOS EUA • Exclusividade do poder na esfera de ação - domínio total; • Padrão ultra ortodoxo (além de Montesquieu), muito rigoroso; • Qualquer interferência entre os poderes seria inconstitucional, pois violaria a separação dos poderes; • Exemplo: somente o Legislativo poderia legislar. CORRENTE DA EXCLUSIVIDADE • É a mais utilizada. • Predomínio, não exclusividade, do poder na sua esfera de ação - quem tem predomínio não tem tudo! • Padrão menos rigoroso; • Interferências poderiam ser aceitáveis e, até mesmo, desejáveis; • Exemplo: poder de veto do rei. CORRENTE DO PREDOMÍNIO “Ou os poderes se trancam, ou eles marcham em conjunto harmonicamente.” 8 FERNANDA MAGNI BERTHIER Após a colonização inglesa, os colonos passaram a associar diretamente “poder central” à “exploração”, de forma que o primeiro era sempre visto com desconfiança. Por isso, foi adotada a Confederação como forma de Estado, pois ela coibia os abusos do poder central, garantindo certa liberdade. Neste modelo, cada uma das 13 colônias adquiriu soberania e o direito de secessão. Ainda nesse modelo, para a lei do poder central ser aprovada, seria necessária a ratificação pelos Estados-membros. A experiência demonstrou, em pouco tempo, que os laços estabelecidos pela confederação eram demasiados frágeis, e que a união dela resultante era pouco eficaz. Embora houvesse um sentimento de solidariedade generalizado, havia também conflitos de interesses, que prejudicavam a ação conjunta e ameaçavam a própria subsistência da confederação. 7 Em 1787, na Convenção da Filadélfia, foi aprovada a Constituição dos EUA, adotando o federalismo como forma de Estado. A partir disso, os membros não eram mais soberanos, apenas autônomos, e sem o direito de secessão, ou seja, o vínculo seria praticamente indissolúvel. Além disso, o poder central passaria a legislar diretamente aos indivíduos dentro de suas competências. Essa constituição foi ratificada por cada um dos Estados-membros. Vários críticos argumentaram que a Constituição violava o princípio da Separação de Poderes, uma vez que o presidente teria poder de veto. A resposta para essas críticas foi a alegação de que a separação de poderes não proibia que um departamento interferisse na esfera de ação de outro departamento, o que era proibido era que um departamento tomasse completamente o lugar de outro. Fortemente influenciados por Montesquieu, os constituintes norte-americanos acreditavam fervorosamente no princípio da separação dos poderes, orientando-se por ele para a composição do governo da federação. Elaborou- se, então, o sistema chamado freios e contrapesos, com os 3 poderes, Legislativo, Executivo e Judiciário, independentes e harmônicos entre si, não se admitindo que qualquer deles seja mais importante que os demais. Foi também preciso conciliar a necessidade de um governo central com a intransigência dos Estados que não abriam mão de sua autonomia política. 8 • Características da Federação: o As atribuições da União e das unidades federadas são fixadas na Constituição. Não existe hierarquia na organização federal, porque cada esfera de poder corresponde a uma competência determinada. Assim sendo, quando se tratar de assuntos de competências de uma unidade federada, esta é que pode legislar sobre o assunto, não a União, e vice-versa.9 o Não há direito de secessão. Uma vez efetivada a adesão de um Estado, este não pode mais se retirar por meios legais. Em algumas Constituições, é expressa tal proibição, mais ainda que não o seja, ela é implícita. A Constituição da ex-União Soviética era uma exceção a essa regra, pois, embora se tratasse de um Estado Federal, pela Constituição, era conservado a cada República federada o direito de sair livremente da URSS. A partir da Constituição da Federação Russa, de 1993, o desligamento de um membro da Federação foi condicionado à concordância da Federação Russa. 10 7 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 253. 8 Ibidem. p. 254. 9 Ibidem. p. 255. 10 Ibidem. p. 255. 9 FERNANDA MAGNI BERTHIER o A base de uma Federação é uma Constituição rígida: Baseando-se a união numa Constituição, todos os assuntos que possam interessar a qualquer dos componentes da federação devem ser conduzidos de acordo com as normas constitucionais. 11 Como características da federação, a intervenção federal ocorre nas hipóteses taxativas da Constituição e os estados-membros podem propor mudanças na Constituição. Quanto à nomenclatura utilizada, “Rígida” diz respeito ao fato de que só pode ser alterada por processos mais rígidos e solenes do que os das leis ordinárias. Assim, enquanto, para as leis ordinárias, bastam 1 turno em cada casa para serem aprovadas, as PECs necessitam 2. o Cada ente da Federação tem tributos e rendas próprios. Dar-se competência é o mesmo que atribuir encargos. É indispensável, portanto, que se assegure a quem tem osencargos uma fonte de renda suficiente, pois, do contrário, a autonomia política se torna apenas nominal, pois não pode agir com independência quem não dispõe de recursos próprios. 12 o Só o Estado Federal tem soberania. Soberania é diferente de autonomia! A primeira é a qualidade do poder de supremacia, enquanto a segunda é a capacidade de criar as próprias normas dentro dos limites da constituição. No caso norte-americano, como no brasileiro e em vários outros, foi dado o nome de Estado a cada unidade federada, mas apenas como artifício político, porquanto na verdade não são Estados. 13 11 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 254. 12 Ibidem. p. 255. 13 Ibidem. 10 FERNANDA MAGNI BERTHIER Os Estados que ingressarem na federação perdem sua soberania no momento mesmo do ingresso, preservando, contudo, uma autonomia política limitada. Pelo próprio conceito de soberania se verifica ser impossível a coexistência de mais de uma soberania no mesmo Estado, não tendo, portanto, qualquer consistência a pretensão de que as unidades federadas tenham soberania limitada ou parcial. 14 • Crítica ao Processo de Ratificação: Cada colônia precisava ratificar a constituição para ela se tornar válida – processo que levou alguns anos pois sofreu resistências. Foi criticada a Constituição com base no argumento de que ela violava a separação dos poderes, visto que previa o poder de veto do presidente em relação às leis do Congresso. Assim, Hamilton, Jay e Madison, usando o pseudônimo “Publius”, escrevem os Federalist Papers, artigos em jornais para defender a Constituição Federalista. Para isso, se baseiam na corrente do predomínio, afirmando “a separação dos poderes não impede que um poder invada parcialmente o campo de ação de outro, apenas que um tome o lugar do outro”. 1. 2. 3. SISTEMA DE FREIOS E CONTRAPESOS O sistema de separação dos poderes, consagrado nas Constituições de quase todo o mundo, foi associado à ideia de Estado Democrático, e deu origem a uma engenhosa construção doutrinaria, conhecida como sistema de freios e contrapesos – “Checks and Balances”. Essa era uma compreensão de um poder atuando nos outros: nessa lógica, as interferências parciais são admissíveis – inclusive, desejáveis – entre os poderes, para que eles controlem uns aos outros, com a possibilidade de fiscalização. Caso não houvesse tais interferências exercendo controle recíproco, a finalidade da separação de poderes não se realizaria. Nessa teoria, há os atos gerias e os atos especiais.15 Dessa forma, consoante a doutrina de Darcy Azambuja, cada órgão exerce principalmente sua função peculiar, porém não exclusivamente, pois pratica atos que, por sua natureza, pertencem à função diversa. Assim, a função legislativa é desempenhada principalmente pelo órgão legislativo, o Parlamento, mas o órgão executivo coopera nessa função, propondo leis e limitando o órgão legislativo por meio da negação a sanções ou do veto às leis. O órgão judiciário igualmente tem função legislativa, porque pode declarar a inconstitucionalidade de uma lei. Por sua vez, o Legislativo colabora com o Executivo e limita-o, pois muitos atos do segundo dependem da aprovação do primeiro. 16 14 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 255. 15 Ibidem. p. 218. 16 AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. São Paulo: Globo, 2008. p. 206. •Consistem na emissão de regras gerais e abstratas. ATOS GERAIS •Depois de emitida a norma geral, se abre a possibilidade de atuação dos demais poderes, por meio de atos especiais. ATOS ESPECIAIS “Os 3 poderes não podem ser 3 retas paralelas, que nunca se encontram: eles devem se intercruzar.” 11 FERNANDA MAGNI BERTHIER 1. 3. A RIGIDEZ DA SEPARAÇÃO DOS PODERES • Separação de órgãos e de funções: A separação de poderes não é só uma separação de órgãos, mas também de funções e atividades. O órgão e as atividades nem sempre coincidem, mas o órgão deve sempre ter o predomínio sobre sua respectiva função. Um exemplo é a atividade de legislar: embora a criação de leis caiba tipicamente ao legislativo e aos seus órgãos (Câmara dos Deputados, Senado Federal, Câmara de Vereadores, Assembleia Legislativa), em um maior ou menor grau os órgãos dos outros poderes acabam participando de uma certa forma da atividade legislativa. O Executivo, quando o presidente da República veta uma lei, o Judiciário ao editar súmulas vinculantes. • Consequências da rigidez da separação dos poderes: Se a separação é rigorosíssima, qualquer mínima interferência acaba gerando uma inconstitucionalidade. Assim, ao se admitir interferências parciais, fica mais difícil declarar que os atos são inconstitucionais. • Do poder de veto: Na origem do poder de vetar, ou seja, de negar a validade de uma lei criada pelo poder legislativo, cabia ao monarca exercer essa função – nesse primeiro momento, adjetivava-se o veto como "absoluto", uma vez que ele não poderia ser contestado, tornando inválido por definitivo a legislação vetada. Paulatinamente, observou-se a passagem do veto absoluto para o veto suspensivo, sendo esse último o mais adotado na atualidade, estando ele previsto no ordenamento jurídico brasileiro. Dessa forma, após o titular do poder executivo vetar em caráter suspensivo uma lei aprovada pelas casas legislativas, poderão elas derrubar o veto dado, tornando válido o diploma previamente vetado. 1. 4. COMISSÕES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO • Caracterização: a) São expressamente previstas: “§ 3º As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores. ” o As CPI podem ser da Câmara, do Senado ou de ambos, conjuntamente; o Para a abertura de uma CPI é necessário 1/3 das assinaturas dos membros da casa; o As CPI terão poderes de investigação próprios de autoridade judicial. 12 FERNANDA MAGNI BERTHIER b) São órgãos extraordinários: o A CPI necessariamente é temporária e tem um prazo de duração determinado. § Pelo Artigo 35 do regimento interno da Câmara dos Deputados, a CPI dura 120 dias, podendo ser prorrogada por mais 60 dias. Já no Senado, o requerimento do pedido deve conter o prazo de duração. § Não existe CPI que ocorra indefinidamente. c) São órgãos colegiados: o É uma parte dos parlamentares que comporá a CPI; o Devem-se levar em conta as relações de forças que há no plenário; o A composição da CPI respeitará o quanto possível a proporção dos partidos/ blocos parlamentares. • Objeto da CPI: o A Constituição exige fato determinado; o fato que gera uma CPI deve ser relevante para a vida pública, deve estar bem caracterizado no requerimento da CPI, ou seja, deve ser um fato com certo grau de verossimilitude; o As circunstâncias do fato devem estar marcadas de um forte matiz de ilicitude; o A investigação não é um fim em si mesmo; • Poderes da CPI: o Convocar ministros; o Recolher depoimentos de quaisquer autoridades, sejam elas federais, estaduais ou municipais; o Ouvir os indiciados; § Há um precedente em relação aos indígenas: eles só podem ser ouvidos em território indígena em presença de antropólogo, tradutor etc. o Inquirirtestemunhas; o Requisitar informações ou documentos de órgãos públicos; o Transportar-se a qualquer lugar em que se fizer necessária sua presença; o Quebrar sigilo bancário, fiscal ou telefônico § Quebra apenas de dados, não de conteúdo das ligações telefônicas. Sem necessidade de autorização judicial, mas é necessário que se motive o ato de quebra. • Imunidades da CPI: o As ditas imunidades da CPI não são direitos objetivos, mas prerrogativas do Parlamento para proteção. o Material: § Inviolabilidade por opiniões, palavras, votos etc. É civil e penal e possui natureza de exclusão do delito. § Inarrestabilidade: os congressistas não podem ser presos, salvo em flagrante delito de crime inafiançável. o Formal: § Improcessabilidade: imunidade processual penal. É causa de suspensão do processo. PUNIBILIDADE CPIs: A CPI não pune penalmente ou administrativamente, ela apenas elabora um relatório, apurando fatos determinados. Suas conclusões, se for o caso, são encaminhadas ao Ministério Público, a quem cabe prosseguir com as investigações da denúncia e promover a adequada responsabilização civil ou criminal dos infratores. A CPI não existe para provocar escândalos. Em si, ela não pune ou condena ninguém, mas pode acabar resultando em consequências graves para os investigados. 13 FERNANDA MAGNI BERTHIER 1. 5. PERSPECTIVAS DO STF • Habeas Corpus 92628 Habeas Corpus é um remédio constitucional para garantir a liberdade de ir e vir, de locomoção, servindo, por exemplo para o réu solicitar a sua saída da prisão. Qualquer um pode impetrar um HC sem necessidade de formalidades, não sendo necessário um advogado, justamente para ajudar a garantir a liberdade do réu. Enquanto, no furto com concurso de pessoas, a pena dobra, no roubo, a pena aumenta de 1/3 a ½. A Defensoria Pública alegou nesse caso que esse tratamento viola o princípio da proporcionalidade, que está implícito na Constituição - uma vez que o furto em concurso de pessoas teria um tratamento jurídico mais rigoroso do que o roubo, crime que envolve a utilização de violência, podendo ser, portanto, considerado como mais grave, e, consequentemente, podendo ser esperado que ele tivesse um agravante mais severo do que o de um simples furto. Assim, o réu pediu que o caso de furto fosse julgado com o agravante do roubo. O STF julgou improcedente o pedido, afirmando que se prolatasse uma sentença em sentido diverso, estaria criando uma terceira espécie normativa. A separação dos poderes diz que o juiz não pode alterar a essência da norma criada pelo legislativo e tampouco pode criar normas jurídicas primárias. Ademais, enquanto o princípio da proporcionalidade não é explícito na Constituição, o princípio da separação de poderes está explícito. FURTO 1 PESSOA = 1 a 4 anos de prisão CONCURSO DE PESSOAS = 2 a 8 anos de prisão ROUBO 1 PESSOA = 4 a 10 anos de prisão CONCURSO DE PESSOAS = aumenta de 1/3 a 1/2 DESPROPORCIONAL!!! MOTIVAÇÕES LEGAIS: Furto – Art. 155 Código Penal - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. Furto qualificado § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido: IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas. Roubo – Art. 157 Código Penal - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. § 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade: II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; 14 FERNANDA MAGNI BERTHIER • Ação Direta de Inconstitucionalidade 2911 Enquanto a CF do Brasil se restringe a permitir a convocação exclusiva de membros do poder executivo (sendo ainda impossível chamar o chefe desse poder), a CE do Espírito Santo autoriza o chamamento de membros do poder judiciário e, inclusive, do chefe desse poder em nível estadual, a saber, o Presidente do Tribunal de Justiça. O princípio de freios e contrapesos é materialmente inelástico, ou seja, só se aplica às hipóteses previstas pela Constituição Federal, e, no seu Art. 50, só é prevista a convocação de Ministros de Estado e titulares de órgãos subordinados à presidência da república. Apenas a Constituição Federal tem o poder de criar o sistema de pesos e contrapesos, um estado não pode criar hipóteses que não estejam previstas, de forma que uma Constituição Estadual não pode inovar, pois uma norma hierarquicamente inferior não pode estar em contradição com uma norma hierarquicamente superior. Poder-se-ia afirmar, contudo, que a Constituição Capixaba está em consonância com a Constituição Federal, uma vez que nela está prevista a possibilidade de membros do poder legislativo chamar membros de outro poder para prestar esclarecimento. Entretanto, ensina a hermenêutica jurídica que normas restritivas devem ser interpretadas restritamente. Nesse caso, não cabe o uso de analogias ou de uma interpretação extensiva. Sendo a norma expressa no art. 50 da Constituição Federal eminentemente uma norma restritiva, a interpretação a ela adequada é que somente poderá ser convocado para prestar esclarecimentos os Ministros de Estados, correspondentes aos Secretários de Estados na órbita estadual. Consequentemente, por questão de da necessidade de simetria da Constituição Estadual com a Federal, essas somente poderão autorizar o chamamento dos Secretários de Estado, não cabendo a autorização para que membros de outros poderes sejam convocados a prestar esclarecimentos. • Mandato de Segurança 23452 A Comissão Parlamentar de Inquérito, enquanto projeção orgânica do Poder Legislativo da União, é a longa manus do próprio Congresso Nacional ou das Casas que o compõem. Nesse caso de Mandato de Segurança, particulares tiveram seu sigilo quebrado, sem a apresentação de justificativas. O controle da separação dos poderes salvaguarda as liberdades dos cidadãos, visto que controla excessos cometidos por esferas governamentais, sendo, assim, essencial ao regime democrático. Cabe ao Poder Judiciário essa função de controle, inclusive, dos atos praticados por CPIs – quando incidirem em abuso de poder ou em desvios inconstitucionais, no desempenho de sua competência investigatória. Assim, os poderes das comissões parlamentares de inquérito, embora amplos, não são ilimitados e nem absolutos, e o controle jurisdicional de abusos praticados por comissão parlamentar de inquérito não ofende o princípio da separação de poderes. MOTIVAÇÕES LEGAIS: Constituição do estado do Espírito Santo Art. 57. A Assembleia Legislativa ou qualquer de suas comissões, através da Mesa, poderá convocar Secretário de Estado, Presidente do Tribunal de Justiça, Presidente do Tribunal de Contas e o Procurador-Geral da Justiça, para prestarem, pessoalmente, as informações sobre assunto previamente determinado, importando a ausência sem justificação adequada, crime de responsabilidade. Constituição Federal Art. 50. A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, ou qualquer de suas Comissões, poderão convocar Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado, importando crime de responsabilidade a ausência sem justificação adequada. 15 FERNANDA MAGNI BERTHIER Os direitos e garantias individuais não têm caráter absoluto. É permitido que sejam limitados visando a proteger a integridade do interesse social e a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento daordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros. A quebra do sigilo constitui poder inerente à competência investigatória das comissões parlamentares de inquérito, que podem quebrar o sigilo bancário, o sigilo fiscal e o sigilo telefônico (dados/registros) com a finalidade de investigação. No entanto, para decretarem, legitimamente, a quebra do sigilo, devem demonstrar a existência concreta de causa provável que legitime a medida excepcional da ruptura da esfera de intimidade de quem se acha sob investigação. Nessa lógica, quando as deliberações de qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito forem destituídas de motivação, elas mostram-se írritas e despojadas de eficácia jurídica, pois nenhuma medida restritiva de direitos pode ser adotada pelo Poder Público, sem que o ato que a decreta seja adequadamente fundamentado pela autoridade estatal. Não é viável indicar, a posteriori, a fundamentação da quebra, pois a existência contemporânea da motivação constitui pressuposto de legitimação. • Mandato de Segurança 25510 – “CPI dos Bingos” A CPI dos Bingos foi instalada no final de junho de 2005 para investigar a atuação do ex-assessor da Casa Civil Waldomiro Diniz, flagrado em vídeo negociando propina com um empresário do ramo de jogos. Entre as principais reclamações dos integrantes da CPI estão as decisões concedidas pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que impediram a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico de uma série de suspeitos. O presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, foi um dos beneficiados pelas decisões do STF. A CPI suspeita que Okamotto tenha liderado um esquema de arrecadação de recursos entre prefeituras petistas para as campanhas eleitorais do partido. A CPI dos Bingos realizava suas investigações quando se deu conta de que uma juíza federal havia concedido várias liminares em favor de uma empresa contra a Caixa Econômica Federal. A CPI decreta a quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico da juíza em questão. O supremo fornece dois argumentos que chegam à conclusão de que a quebra havia sido indevida: (1) a quebra pela CPI não foi bem fundamentada, ou seja, a CPI não teria fundamentado adequadamente a decisão de quebra, por isso ela não seria aceita do ponto de vista constitucional. (2) o princípio da intangibilidade da prestação jurisdicional, sendo que esse argumento é de que os juízes, quando exercem sua atividade típica, são invioláveis, intocáveis. Não é possível que outro poder viole a prestação jurisdicional, uma vez que ela é intangível. • Mandato de Segurança 24831 Para um inquérito parlamentar ser instaurado, é necessária a satisfação de três exigências: (1) subscrição do requerimento da constituição da CPI por, no mínimo, 1/3 dos membros da Casa Legislativa, (2) indicação do fato determinado a ser objeto de apuração e (3) temporariedade da comissão parlamentar de inquérito. Após o preenchimento dos requisitos, impõe-se a criação da CPI – que independe da vontade da maioria legislativa. Pelo Estatuto Constitucional das Minorias Parlamentares, é prevista a participação ativa no Congresso de grupos minoritários, que teriam o direito de fiscalizar o exercício do poder. Essa prerrogativa institucional não pode ser comprometida pelo bloco majoritário, pois, dessa forma, o direito de oposição não seria efetivo e o poder de fiscalização seria frustrado. Ninguém, nem mesmo os grupos majoritários, pode se sobrepor aos princípios da Constituição. No caso desse Mandato, relativo à abertura da CPI dos Bingos, a oposição tinha satisfeito as exigências para abertura e foi deferida pela mesa. No entanto, foi proposta uma questão de ordem contra a mesa, desejando o fechamento da CPI por irregularidades formais no requerimento – o que foi indeferido pela mesa, que manteve a decisão original. Depois de recorrer ao plenário, a questão de ordem foi deferida, e o fechamento da CPI foi declarado. A decisão final foi a concessão do mandato de segurança, para assegurar o direito à efetiva composição da CPI. 16 FERNANDA MAGNI BERTHIER 2. TEORIAS DO MANDATO As teorias do mandato visam a compreender a natureza da relação existente entre quem vota e quem é votado, constituindo o estudo de uma relação político-jurídica. Existem três teorias (principais) existem sobre o mandato: a Teoria do Mandato Imperativo, Teoria do Mandato Imputativo e Teoria do Mandato Partidário 2. 1. TEORIA DO MANDATO IMPERATIVO Tendo raízes medievais, é a mais antiga entre as 3 teorias analisadas. É fruto de um eleitorado reduzido (sufrágio restrito), em que os eleitores têm maiores possibilidade de contato com eleito. Quanto maior a população, maior a pluralidade de pensamento, tornando mais difícil a efetivação do proposto por essa teoria. Considera o mandato como uma espécie de contrato entre o eleitor e seu representante, aplicando uma lógica do Direito Privado no Direito Público. O contrato de mandato supõe que alguém atribua poderes a outrem, assim, os eleitores confeririam ao eleito o poder e junto com ele uma lista de demandas para serem cumpridas. Caso o eleito não realizar o prometido, ou seja, as tarefas dadas pelos eleitores, seu mandato pode ser revogado (finalizado antes do tempo previsto). Embora alguns países proíbam esse tipo de mandato (a constituição francesa, por exemplo, veda expressamente o mandato imperativo), em outros, é possível perceber algumas reminiscências, por exemplo, o Recall. • Recall o É a possibilidade, por meio de um plebiscito, de interromper o mandato de um oficial eleito mediante consulta popular, seja ele do Legislativo, do Judiciário ou do Executivo. Por meio dele, é possível retirar um indivíduo eleito de um cargo público, membro de qualquer um dos poderes o Supõe certo número de assinaturas e por último uma consulta popular o É uma prática do que conhecemos como democracia participativa ou democracia semidireta. É um apelo essencialmente político ao eleitorado, não sendo um julgamento, nem um processo legal, é comum, especialmente na tradição anglo-saxã, alguém perder o seu cargo conferido pelo voto popular caso não esteja cumprindo satisfatoriamente as funções para as quais ele fora designado o Fases do Recall: • Exige-se uma proposta para a realização do Recall de alguém que teve o seu cargo conferido mediante um processo eleitoral. Em seguida, desenrola-se a coleta de assinaturas e o depósito de certa quantia em dinheiro. FASE DA PETIÇÃO • Existe uma confrontação eleitoral, assemelhada a uma campanha eleitoral, inclusive com horário político na mídia. • São escutados os argumentos, tanto daqueles favoráveis ao recall quanto aos contrários. FASE DA CAMPANHA • Ocorre a consulta às urnas, o momento em que se decide pela interrupção do mandato ou não. • Se o eleitorado vota favoravelmente ao Recall, o dinheiro recolhido na primeira fase do recall é devolvido, e o sujeito perde seu cargo. • Caso a opção seja pela manutenção do mandato e o recall seja derrotado, o montante arrecadado é retido pelos cofres públicos, e o sujeito permanece em seu cargo. FASE PLEBISCITÁRIA 17 FERNANDA MAGNI BERTHIER • Comparativo entre Impeachment e Recall: RECALL IMPEACHMENT CAUSA Funcionário eleito ruim Crime de responsabilidade PROCESSO Eleitoral Jurídico (legal, com ampla defesa e contraditório) NATUREZA Política Híbrida (política e jurídica) CONSEQUÊNCIA Perda de cargo Perda de cargo e inabilitação para serviço público 2. 2. TEORIA DO MANDATO IMPUTATIVO Próprio do Estado Liberal Clássico (que abominava a Teoria do Mandato Imperativo), é avesso aos partidos políticos, rejeitando-os e combatendo-os. Ao contrário disso, se pregava que deveria ser escolhidoum indivíduo que se destacasse – nos EUA, por exemplo, ainda existe a possibilidade de alguém se candidatar sem se filiar a um partido. A Teoria do Mandato Imputativo prega que, a partir do voto, imputa-se aos eleitores a vontade que é originária do eleito, ou seja, presume-se que a vontade dos eleitores é igual à do eleito. Assim, se o eleito pensa ou fala “X”, presume-se que o eleitorado pensa “X” também – raciocínio “de cima para baixo”. Nessa teoria, o eleitor só tem o papel de voto, não tendo mais poder de interferência sobre o eleito. Além disso, o representante representa a nação como um todo, não somente aqueles que votaram nele. Lembrar que nação é uma comunidade histórico-cultural, com valores permanentes. Essa visão reduz a participação política dos eleitores apenas ao voto. Conforme Rousseau, “os ingleses pensam que são livres, mas são livres apenas a cada cinco anos, durante um dia, quando votam”. Esse modelo previa a despolitização dos indivíduos: quanto mais livre de influências de pressões de grupos, melhor seria o parlamentar. Ainda no liberalismo, a lei é a expressão da vontade geral. Dessa forma, o inimigo do Parlamento e dos seus representantes são as facções/ interesses parciais, ou seja, pensamentos que não visam ao bem comum da nação. Exemplo disso é quando parlamentares privilegiam determinados setores da economia, regiões, classes sociais. É preciso trabalhar para o bem comum, de forma que se faz necessário que o Parlamento combata essas facções/ interesses parciais. A concepção é de uma política que funcionaria em dois níveis: PARLAMENTO e INDIVÍDUO. Entre eles, haveria os chamados grupos intermediários, como sindicatos, partidos e corporações. A partir do liberalismo, se prega que o representante só será um ser realmente racional se estiver totalmente livre de influências. O Parlamento seria um “órgão de notáveis”, os quais, usando sua razão, baseados em informações e livres de influências externas, produziria a vontade geral. 1 2 PARLAMENTO INDIVÍDUOS GRUPOS INTERMEDIÁRIOS SINDICATOS PARTIDOS CORPORAÇÕES 18 FERNANDA MAGNI BERTHIER 2. 3. TEORIA DO MANDATO PARTIDÁRIO A Teoria do Mandato Partidário surge a partir da metade do século XIX, com a quebra do consenso da ideologia liberal, sobretudo, do liberalismo econômico. Para que se evitasse um conflito violento, devido à presença de muitas ideologias diferentes, concedeu-se a racionalização do poder. Isso acontece notavelmente com a Constituição de Weimar (1919, Alemanha): nela, há a racionalização do poder. Racionalizar é organizar o convívio entre as diferentes ideologias. Assim, o objetivo era enquadrar, na Constituição, todas as correntes ideológicas, de modo a promover uma alternância entre as mesmas, cujo árbitro seria o eleitor. O eleitor, ao votar, escolheria mais do que um candidato, escolheria um membro de um partido, que estaria vinculado ao programa desse partido. Dessa forma, o eleitor decide qual a corrente ideológica, qual o programa político, que ele irá conferir poder. Não se vota em um candidato pelas suas virtudes, mas pelo seu programa político. O eleitor seria como um consumidor, “vende-se” a ele a proposta do partido, tentando o convencer de que esta seria a melhor. Nesse contexto, tem grande peso o marketing eleitoral. 2. 4. RESUMO TEORIAS DO MANDATO TEORIA DO MANDATO IMPERATIVO TEORIA DO MANDATO IMPUTATIVO TEORIA DO MANDATO PARTIDÁRIO PERÍODO Idade Média / Idade Moderna Modernidade Estado Liberal Século XX Estado Social PARADIGMA Relação eleitores-eleito com natureza contratual (direito civil) Imputa-se aos eleitores a vontade do eleito Eleitor escolhe um partido/ indivíduo que o represente ELEITO REPRESENTA Seus eleitores Toda a nação Projetos do partido INFLUÊNCIA Intensa: “lista de tarefas” dos eleitores para o eleito, que deve cumprir Fraca: eleitores só tem força quando vão às urnas Média: partidos políticos abrem-se à participação das massas INTERRUPÇÃO Possibilidade de interrupção prematura do mandato Ingerências são desestimuladas ou combatidas Há canais de democracia participativa e controle de constitucionalidade ADVERSÁRIO O monarca (contexto da bipartição) Os interesses parciais no Parlamento Os extremismos ideológicos FIM DA HEGEMONIA LIBERAL NECESSIDADE DE NOVA TEORIA DO MANDATO TEORIA DO MANDATO PARTIDÁRIO 19 FERNANDA MAGNI BERTHIER 3. SISTEMAS DE GOVERNO 3. 1. PARLAMENTARISMO O parlamentarismo foi produto de uma longa evolução histórica, não tendo sido previsto por qualquer teórico, nem se tendo constituído em objeto de um movimento político determinado. Suas características foram se definindo paulatinamente, durante muitos séculos, até que se chegasse, no final do século XIX, à forma precisa e bem sistematizada que a doutrina batizou de parlamentarismo. Assim, ele não foi planejado, racionalizado, mas surgiu aos poucos, com a presença de fatos acidentados e de várias influências ideológicas diferentes. 17 Através de uma longa sequência de acontecimentos, foram sendo, gradualmente, estabelecidas as características do parlamentarismo. É preciso lembrar que, não obstante ter nascido na Inglaterra, onde coexistem a monarquia e o sistema partidário, o parlamentarismo foi implantado também em Estados que têm governo republicano e sistema pluripartidário, o que obrigou a certas adaptações, indispensáveis para possibilitar o funcionamento do sistema. 18 3. 1. 1. CARACTERÍSTICAS BÁSICAS • Distinção entre Chefia de Estado e Chefia de Governo: 17 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 229. 18 Ibidem. p. 232. • É o Presidente da República ou o Monarca. • Se caracteriza por ser o defensor político da constituição e defender os valores do país. •Não participa das decisões políticas, exercendo, preponderantemente, uma função de representação do Estado. • Além de atuar como vínculo moral do Estado, colocado acima das disputas políticas, ele desempenha um papel de especial relevância nos momentos de crise, quando é necessário indicar um novo Primeiro-Ministro à aprovação do Parlamento. Essa indicação é extremamente difícil, pois deve ser escolhido alguém que revele estar em condições de compor um Gabinete que obtenha a aprovação da maioria parlamentar. CHEFIA DE ESTADO • É o Primeiro Ministro. • Papel ativo: é ele quem exerce o Poder Executivo. • Primeiro Ministro só pode assumir a chefia do governo e se manter nela com a aprovação da maioria parlamentar. • Realizador de políticas públicas do governo: "governar é formular políticas e concretizá-las". CHEFIA DE GOVERNO 20 FERNANDA MAGNI BERTHIER • Responsabilidade coletiva do Governo: Se o gabinete cair, caem todos os membros que o constituem. Nota que o Gabinete é diferente do Ministério: o Gabinete é o órgão composto por alguns ministros (1o Ministro e outros mais importantes), enquanto o Ministério é o conjunto de todos os ministros (os do gabinete e os outros da administração pública). • Responsabilidade do Governo perante o Parlamento: A responsabilidade do governo é perante a maioria parlamentar, pois ela faz – ou, se desejar, desfaz – o governo. Ainda que o ato formal de designar o governo seja do Chefe de Estado, ele é, na verdade, o reflexo da maioria parlamentar. O fato de a maioria parlamentar escolher e demitir o governo posiciona a mesma no centro das atenções, juntamente com o Gabinete. Assim, o sistema partidário tende a amadurecer. Dessaforma, o Chefe de governo, aprovado pelo Parlamento, não tem mandato com prazo determinado, podendo permanecer no cargo por alguns dias ou por muitos anos, ambas as hipóteses já tendo ocorrido na prática. Há dois fatores que podem determinar a demissão do Primeiro-Ministro e de seu Gabinete: a perda da maioria parlamentar ou o voto de desconfiança.19 19 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 233. CHEFE DE ESTADO CHEFE DE GOVERNO CONSTITUIÇÃO DESRESPEITADA ADVERTÊNCIA 21 FERNANDA MAGNI BERTHIER o Tipos de Moção de Desconfiança: § Moção de Desconfiança Simples: ⇒ Mais frequente, é a reunião dos votos necessários para derrubar o gabinete. As exigências de conteúdo e de quórum variam de país para país. § Moção de Desconfiança Construtiva: ⇒ Criada pelos alemães; ⇒ Deve reunir votos para, além de derrubar o gabinete, já apresentar a nominata de outro, o que evita a instabilidade dos gabinetes. • OBS: quando o novo gabinete demora para ser escolhido, 2 fatores são importantes para a manutenção da estabilidade: 1) O ministro anterior continua exercendo suas funções até que seja substituído pelo próximo gabinete; 2) A administração pública, poder separado, é técnica, imparcial, apartidária e estável. • Num sistema bipartidário, quando se realizam eleições para o Parlamento, a chefia do governo está sempre em jogo. • Se o partido a que pertence o Primeiro-Ministro conseguir manter a maioria parlamentar, ele permanece no cargo. • Se o maior número de cadeiras for conquistado por outro partido, este, automaticamente, adquire a chefia do governo, devendo ser escolhido, entre os seus membros, o novo Primeiro Ministro. PERDA DA MAIORIA PARLAMENTAR • Se um parlamentar desaprova, no todo ou num importante aspecto particular, a política desenvolvida pelo Primeiro-Ministro, propõe um voto de desconfiança. • Se este for aprovado pela maioria parlamentar, isso revela que o Chefe do Governo está contrariando a vontade da maioria do povo, de quem os parlamentares são representantes. Assim, deve demitir-se. VOTO DE DESCONFIANÇA REGIME DE MOÇÕES: Negativamente, o regime como moções é instável, uma vez que podem cair os gabinetes a qualquer momento – situação a qual pode gerar um caos político. Por outro lado, o uso dessas moções resolve a crise de governabilidade de forma rápida, permitindo a eficaz e ágil substituição do chefe de governo da situação por outro. Não confundir as moções contra o gabinete com o impeachment (presidencialismo), que envolve crime de responsabilidade! 22 FERNANDA MAGNI BERTHIER OBS: A Constituição elenca como crimes de responsabilidade os atos do presidente da República que atentam contra: a própria Constituição, a existência da União; o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário, do Ministério Público e dos estados; o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; a segurança interna do país; a probidade administrativa; a lei orçamentária; o cumprimento da lei e das decisões judiciais. • Mandato do Primeiro Ministro: Conforme visto anteriormente, o 1 o Ministro não tem mandato fixo – podendo durar dias ou anos, de acordo com as circunstâncias políticas – e pode ter fim com a perda da maioria parlamentar ou com uma moção de desconfiança. o Dissolução do Parlamento: Uma característica importante do sistema inglês é a possibilidade de ser dissolvido o Parlamento, considerando- se extinto o mandato dos membros da Câmara dos Comuns antes do prazo normal. Isso pode ocorrer visando à ampliação da maioria parlamentar ou com a intenção de evitar a ocorrência de uma moção de desconfiança. 20 20 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 233. MOÇÃO DE DESCONFIANÇA IMPEACHMENT FREQUÊNCIA Usual Extraordinário PRESSUPOSTO Crise de Governabilidade – Incompatibilidade 1o Ministro e Maioria Parlamentar. Por “governo ruim” Crime de Responsabilidade: requisito jurídico: não basta o governo ser ruim, ele deve ter cometido crime. PROCEDIMENTO Simples e célere (rápido) Processo, exige contraditório (constatação) CONSEQUÊNCIAS Não tem caráter punitivo: queda do governo (gabinete), devido à sua responsabilidade coletiva Tem caráter punitivo: acarreta na perda do cargo a na inabilitação para cargos públicos por 8 anos NATUREZA Puramente Política Natureza híbrida Político-jurídica • Quando o Primeiro-Ministro percebe que só conta com uma maioria e acredita que a realização de eleições gerais irá resultar numa ampliação dessa maioria favorável a ele. AMPLIAÇÃO DA MAIORIA • Quando o Primeiro-Ministro recebe um voto de desconfiança mas entende que o Parlamento é que se acha em desacordo com a vontade popular. • Essa situação é, principalmente, em países pluripartidários. NEGAÇÃO DE VOTO DE DESCONFIANÇA 23 FERNANDA MAGNI BERTHIER § Condições de ocorrência: ⇒ Pressuposto: Crise Governamental: a Crise Governamental significa, no parlamentarismo, uma desavença entre gabinete e maioria do parlamento, sendo que pode terminar em Moção de Desconfiança. ⇒ Decisão: cabe ao 1o Ministro: antecipando-se a uma possível moção de desconfiança, o 1o Ministro pode dissolver o Parlamento, embasando-se em sua livre vontade política. ⇒ Formalização: Chefe de Estado: o Chefe de Estado deve formalizar o pedido. Não pode se negar a fazê-lo. ⇒ Risco: Incerteza Eleitoral: não se pode prever o resultado das eleições. São duas as armas políticas: a Moção de Desconfiança e a Dissolução do Parlamento. A segunda é mais arriscada, uma vez que o Primeiro Ministro não tem garantia alguma sobre qual será a reação do eleitorado. Reações possíveis: § Casos históricos de dissolução do Parlamento: ⇒ Caso 1: O 1º Ministro da Inglaterra, John Major, conservador, entra depois de Margareth Tatcher. Teve um gabinete tumultuado pelo próprio partido. Ele dissolve o parlamento – que era conservador, mas ambíguo – e as eleições dão vitória à oposição (trabalhista), que fará Tony Blair 1º Ministro. A expectativa de Major era conseguir mais conservadores que o apoiassem. DISSOLUÇÃO DO PARLAMENTO 3 POSSIBILIDADES Eleitorado renova a Maioria Parlamentar favoravelmente ao 1o Ministro 1o Ministro consegue uma base de apoio no Parlamento + fiel Eleitorado mantém a Maioria Parlamentar desfavorável ao 1o Ministro Eleitorado renova a Maioria Parlamentar passando o poder à antiga oposição 1o Ministro é demitido com seu gabinete Minoria Parlamentar se torna Maioria Parlamentar VITÓRIA DO 1O MINISTRO DERROTA DO 1O MINISTRO DERROTA DO 1O MINISTRO E DOS EX-PARLAMENTARES 24 FERNANDA MAGNI BERTHIER ⇒ Caso 2: Crise das 2 dissoluções: Na França, no século XIX, os Bourbons voltam ao poder depois de derrotarem Napoleão – famoso período de restauração da monarquia. Luis XVIII foi o primeiro da dinastia Bourbon a voltar ao poder. Com sua morte, assume seu irmão Charles X (saudoso da monarquia absolutista), que realizou 2 dissoluções (ocorreram pelo monarca porque o parlamentarismo ainda não estava consolidado). Ele patrocinou o partido conservador. Na eleição seguinte, a direita ultraconservadora perdeu. Charles faz uma dissolução para tentar restaurá-los no poder. No entanto, a direita extremista perde novamente, ele faz outra dissolução. A partir disso começa uma revolução popular que dá fim à dinastia Bourbon. Cria-seuma nova constituição e se institui o Rei Burguês, Felipe de Orleans, quando realmente começa o parlamentarismo. 3. 1. 2. HEXAPARTIÇÃO DOS PODERES APLICADA AO PARLAMENTARISMO • Administração Pública: o Adquiriu sua independência como uma consequência do Estado Social, que trouxe a necessidade de controle de eventuais excessos do governo. o Diferente do governo, ela é um órgão de meios, serviços: ela é quem oferece as condições para a execução das políticas do governo. o Se caracteriza pela estabilidade, imparcialidade e tomada de decisões técnicas. • Chefe de Estado: o Ou é o Monarca (monarquia) ou é o Presidente (república). o Age como defensor político da Constituição. • Chefe de Governo: o É o Primeiro Ministro. o Responsável pela dinâmica do sistema. • Legislativo: o Responsável principal pela criação das leis. • Judiciário: o Responsável pela jurisdição comum. • Tribunal Constitucional: o É o defensor Jurídico da Constituição, que, com a jurisdição constitucional, cria um limite para o governo. o Atenção: NÃO é poder judiciário, não constitui grau recursal. PODER MODERADOR ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PODER EXECUTIVO PODER LEGISLATIVO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Administração Civil + Forças Armadas Chefe de Estado 1o Ministro + Gabinete Parlamento RELAÇÃO DE INTERDEPENDÊNCIA 25 FERNANDA MAGNI BERTHIER O Chefe de Estado poderá ser um monarca (em monarquias como a Inglaterra) ou um presidente (em repúblicas como a Alemanha). O Chefe de Governo é escolhido pelo Parlamento. O 1 o Ministro só fica no poder enquanto mantém o apoio do Parlamento, de forma que não existe um tempo definido. Há maior dependência, portanto, entre os parlamentares e o chefe do Executivo. 3. 1. 3. SÍNTESE ELEIÇÕES ESCOLHA PARLAMENTO ESCOLHA 1O MINISTRO CHEFE DE GOVERNO EXEMPLOS 26 FERNANDA MAGNI BERTHIER 3. 1. 4. CASOS DE PARLAMENTARISMO A compatibilidade de um indivíduo ser parlamentar e membro do gabinete ao mesmo tempo depende do rigor da Separação de Poderes. Se for possível ser membro dos dois, há um menor nível de rigor entre a Separação. A França tem uma rigorosa Separação de Poderes, sendo ela o exemplo de país que existe essa incompatibilidade (art. 23 da Constituição Francesa). • Observações: o O gabinete responsável perante tanto a Câmara baixa e pela alta simultaneamente, como é no caso da Itália, cria um elemento de estabilidade para o Primeiro Ministro. o Um primeiro ministro que é capaz de dissolver tanto a câmara baixa quando a alta tem mais força do que um chefe de governo cujo poder de dissolução apenas alcança a Câmara Baixa. o Nos países em que a responsabilização do primeiro ministro ocorre somente perante uma das casas do legislativo, apesar de criar um elemento de instabilidade política, acaba por tornar mais célere a resolução de crises de governabilidade. 3. 1. 4. 1. PARTICULARIDADES DO PARLAMENTARISMO INGLÊS • Shadow Cabinet (gabinete sombra): É um instituto típico do parlamentarismo inglês, reconhecido desde 1937, como um gabinete não oficial formado pela oposição para assumir, caso, eventualmente, o gabinete oficial seja deposto. O Shadow Cabinet é oficialmente reconhecido, recebendo os seus membros inclusive remuneração, correspondente, aproximadamente, a metade do salário dos membros do gabinete oficial. Esse gabinete vai analisando propostas, o que garante maior estabilidade para o eleitorado. A sua existência qualifica o governo, permite debates entre oposição e governo. • Constituição inglesa: Ela é esparsa, repleta de costumes e leis não codificados. Não existe um livro que compile ou que codifique a Constituição inglesa. • Parlamento inglês: Na tradição constitucional inglesa, há o bicameralismo de Montesquieu, sendo o parlamento formado pela Câmara Alta, pela Câmara Baixa e pelo Monarca. • Poderes intangíveis do monarca: São aqueles poderes que existem, mas são de difícil visualização no concreto, ou seja, têm uma difícil percepção imediata. Eles podem se materializar por meio de influência do monarca no andar político do país. Além disso, para a INGLATERRA ESPANHA ALEMANHA ITÁLIA RESPONSABILIDADE DO GABINETE PERANTE A QUEM? Câmara Baixa Câmara Baixa Câmara Baixa Câmara Baixa e Câmara Alta DISSOLUÇÃO DO PARLAMENTO; QUAIS CASAS? Apenas a Câmara Baixa Câmara Baixa e/ou Câmara Alta Apenas a Câmara Baixa Câmara Baixa e/ou Câmara Alta COMPATIBILIDADE ENTRE SER MEMBRO DO GABINETE E PARLAMENTAR Sim Sim Sim Sim 27 FERNANDA MAGNI BERTHIER nomeação de alguns cargos, bem como para a dissolução do parlamento, é necessária a formalização do Chefe de Estado, no caso inglês, do monarca. Assim, por causa dessas solenidades e formalidades, o chefe de Estado é capaz de influenciar os rumos políticos do país • Escolha do primeiro ministro: Por via de regra, o partido vencedor das eleições (aquele que obteve a maioria das cadeiras do parlamento inglês) já tem um líder, que se tornará o primeiro ministro. Isso ocorre sempre quando se trata do partido trabalhista e na maioria das vezes com o conservador. Pode ocorrer de, quando os Torys se afirmarem como o partido vencedor, não existir a figura de um líder pré-determinado. Assim, o primeiro ministro escolhido pelo monarca se torna o líder do partido. Quando há empate nas eleições 1/3 dos votos para cada partido (Liberais, Trabalhistas e Conservadores) cabe ao monarca decidir qual dos líderes dos partidos que será o 1º Ministro. Essa situação só ocorreu uma vez. 3. 2. PRESIDENCIALISMO O presidencialismo também não foi produto de uma criação teórica, não havendo qualquer obra ou autor que tivesse traçado previamente suas características e preconizado sua implantação. No entanto, ele não resultou de um longo e gradual processo de elaboração. Ele foi uma criação americana do século XVIII, sendo resultado da aplicação das ideias democráticas, concentradas na liberdade e na igualdade dos indivíduos e na soberania popular. A péssima lembrança que tinham da atuação do monarca, somada com a influência dos autores iluministas, determinou a criação de um sistema que, consagrando a soberania da vontade popular, adotava ao mesmo tempo, um mecanismo de governo que impedia a concentração do poder. O sistema presidencial norte-americano aplicou, com o máximo rigor possível, o princípio dos freios e contrapesos, contido na doutrina da separação dos poderes. 21 Assim, o sistema presidencialista nasceu na Convenção da Filadélfia de 1787, pelos pais fundadores liberais dos EUA. Em um contexto com ideologia liberal dominante, o presidencialismo foi pensado para funcionar em um Estado Liberal, ou seja, em um Estado fraco. Seus idealizadores se distanciaram do Rei da Inglaterra, pois não gostavam e desconfiavam do governo, querendo que ele fosse o mais limitado possível. Por conseguinte, queriam que o governo não funcionasse e deixasse tudo na mão invisível do mercado, ou seja, a tendência natural é o choque. Os fundadores do Estado norte-americano tinham plena consciência de estarem criando uma nova forma de governo. Na medida do possível, aplicaram as ideias de Montesquieu, relativas à liberdade, à igualdade e à soberania popular. Além disso, atentaram para as necessidades práticas, procurando conciliar os conflitos de interesses e de tendências registrados entre os constituintes, criando um sistema de governo suficientemente forte e eficiente para cumprir suas tarefas e convenientemente contido para não degenerar num absolutismo. 22 Na AméricaLatina, o problema é que eles adotaram o sistema norte-americano, idealizado segundo as necessidades daquele povo, que obviamente, não eram as mesmas que as suas, ou seja, era incompatível. Assim, ou o presidente anda em desacordo com a Maioria, ou ele a coage para seus interesses. 21 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 237. 22 Ibidem. p. 238. 28 FERNANDA MAGNI BERTHIER PAÍS BRASIL ESTADOS UNIDOS FONTE REAL DO PODER Enraizado na autoridade ou no estamento burocrático que controla o governo. Emana do povo. FISCALIZAÇÃO E CONTROLE DOS GOVERNANTES Vida comunitária fraca, opinião pública mal organizada e espírito público ausente. Comunidade pouco reage aos abusos do governante. Povo com forte capacidade associativa. Opinião pública tem instrumentos capazes para se manifestar. TRANSFORMAÇÕES POLÍTICAS E SOCIAIS As principais transformações ocorreram através de movimentos de cúpula, com outorgas posteriores à sociedade. Conquistas obtidas por meio de movimentos populares de grande abrangência. CARÁTER SOCIOLÓGICO E PSÍQUICO DO POVO Paternalismo: o brasileiro enxerga no Estado a figura de um pai, criador e protetor. Ao norte-americano médio, repugna depender do Estado. 3. 2. 1. CARACTERÍSTICAS BÁSICAS • Indistinção entre Chefia de Estado, Chefia de Governo e Chefia da Administração: Ambas funções, no presidencialismo, competem ao Presidente da República, que é o ativo defensor das políticas públicas e é o responsável por resguardar os valores nacionais. A crítica feita é a incompatibilidade dessas funções, pois o presidente seria, analogicamente, o jogador e o árbitro. Além disso, principalmente na América Latina, há o problema que o comandante das forças armadas é o chefe de Estado. Assim, os governos presidencialistas utilizam as forças armadas para reprimir a oposição, potencializando golpes de Estado e golpes militares. • Mandato do presidente: O presidente tem um mandato fixo e predeterminado. No entanto, através do Impeachment, pode o Presidente da República ser destituído de seu mandato. A substituição de um governo ineficiente ou fracassado exige, via de regra, uma ruptura das instituições, tratando-se de um episódio traumático. O Presidente não tem, muitas vezes, o apoio da maioria parlamentar, não é escolhido pela mesma. Mas não pode ser responsabilizado politicamente, inexiste moção de desconfiança. • Partidos Políticos: Quanto à fidelidade partidária, para agir, o Presidente da República, se não dispuser de maioria do Legislativo, deve contar com uma porção infiel da oposição que seja favorável a ele. Nesse contexto, a infidelidade é um mal necessário. A constante necessidade de formação de maioria parlamentar enfraquece os partidos políticos, cujos membros devem ser atraídos a por favores e benefícios a cada votação importante. Os partidos são pragmáticos. 29 FERNANDA MAGNI BERTHIER • Inexistência da responsabilidade civil coletiva perante o Parlamento: Não existe a possibilidade de a Maioria Parlamentar fazer ou desfazer o governo. Os ministros do presidencialismo são de livre nomeação e exoneração pelo presidente da República. O governo é a principal garantia de estabilidade. • Poder de veto do presidente: Orientando-se pelo princípio da separação dos poderes, os constituintes norte-americanos atribuíram ao Congresso, composto de Câmara e Senado, a totalidade do Poder Legislativo. Entretanto, para que não houvesse o risco de uma verdadeira ditadura do Legislativo, reduzindo-se o chefe do Executivo à condição de mero executor automático das leis, lhe foi concedida a possibilidade de interferir no processo legislativo através de veto. Os projetos aprovados pelo Legislativo, a não ser que se tratem de uma das raras hipóteses de competência exclusiva deste, devem ser remetidos ao Presidente da República para receberem sua sanção, que é a manifestação de concordância. Se ele considerar o projeto inconstitucional ou inconveniente, veta-o, negando-lhe sanção e comunicando o veto ao Legislativo. Este deve, então, apreciar o veto do presidente mediante votação especial. Se o acolher, o projeto será rejeitado, mas, se, pelo contrário, houver rejeição do veto, o projeto se considera aprovado, mesmo contra o desejo expresso do chefe do Executivo.23 3. 2. 2. TRIPARTIÇÃO DOS PODERES APLICADA AO PRESIDENCIALISMO É a tripartição idealizada por Montesquieu, com a substituição do monarca pelo presidente. A independência dos poderes, no presidencialismo, se dá no sentido de que não há subordinação entre eles, não há supremacia de um sobre o outro. São independentes dentro das atribuições que a Constituição lhes outorga, mas colaboram e se limitam reciprocamente.24 23 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 241. 24 AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. São Paulo: Globo, 2008. p. 324. PODER JUDICIÁRIO Presidente PODER LEGISLATIVO CHEFE DE ESTADO CHEFE DE GOVERNO 30 FERNANDA MAGNI BERTHIER O mandato do presidente tem um tempo fixado por lei, não sendo tão flexível. Em diversos países, há a possibilidade de reeleição. Não havendo crime de responsabilidade, que gere um impeachment legítimo, ou um golpe, o presidente se mantém até o fim do seu mandato. Não existe 1 o Ministro: nesse sistema, as funções de Chefe de Estado e de Chefe de Governo são exercidas pela mesma pessoa – o presidente. 3. 2. 3. SÍNTESE ELEIÇÕES ESCOLHA PRESIDENTE CHEFE DE ESTADO E CHEFE DE GOVERNO EXEMPLOS ESCOLHA PARLAMENTO 31 FERNANDA MAGNI BERTHIER 3. 3. SEMIPRESIDENCIALISMO Pós 2 a Guerra, antes do semipresidencialismo, a França adotava um Parlamentarismo Clássico, previsto pela Constituição da Quarta República Francesa (1946). Esse sistema era caracterizado pelo Chefe de Estado eleito indiretamente, pelo Parlamento, e tendo poderes discretos. Ela encontrava-se extremamente debilitada. Até a 2 a Guerra Mundial, era uma potência colonial, mas, em 1954, perde a Indochina, e, em 1958, está prestes a perder a Argélia, tendo uma considerável redução de seu território. Esse processo foi muito traumático, gerando grandes abalos na França. Os vários gabinetes subsequentes não conseguem resolver o problema da independência da Argélia. Assim, para resolver a crise, os franceses chamam o general De Gaulle. Em face do momento de dificuldade, De Gaulle aceitava ser 1 o Ministro com a condição de que uma nova Constituição fosse feita. Isso promoveu a passagem da 4 a para a 5 a República Francesa, com a elaboração da outorgada Constituição de 1958, ainda vigente. Essas alterações acabaram por criar um contexto de maior estabilidade, coadunando com o espírito francês. A mentalidade da reforma de De Gaulle era a desconfiança em relação aos partidos políticos e ao Parlamento – pois acreditava que os extremismos partidários representavam um enfraquecimento através das disputas políticas; o reforço da Chefia de Estado (transferência de parte do poder do Parlamento para o presidente) e a presença de um certo saudosismo em relação à monarquia. 3. 3. 1. CARACTERÍSTICAS BÁSICAS • Presidente da República é eleito diretamente: ele passa a ser um novo polo do poder político ao lado do parlamento, enquanto, no parlamentarismo puro, o centro
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