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1 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 ❖ Resumo elaborado com base nas aulas e slides apresentados em 2021/1 e nos livros “Rang & Dale - Farmacologia”, “As Bases Farmacológicas da Terapêutica De Goodman e Gilman - Brunton”, “Farmacologia Básica e Clínica – Katzung”, “Farmacologia Ilustrada – Karen Whalen”, “Farmacologia Clínica e Terapêutica – Fuchs”, “Princípios De Farmacologia: A Base Fisiopatológica – Golan” e “Farmacologia Clínica – Rosane Gomez”. 2 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 SUMÁRIO Aula.................................................................................................................................Página Contraceptivos hormonais.......................................................................................................3 Tratamento de disfunção erétil e hiperplasia prostática benigna.......................................... 12 Tratamento de incontinência urinária................................................................................... 16 Uso de fármacos em idosos.................................................................................................. 18 Tratamento de cefaleia......................................................................................................... 24 Tratamento de anemia.......................................................................................................... 30 Tratamento de doenças da tireoide...................................................................................... 36 3 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 FARMACOLOGIA → CONTRACEPTIVOS HORMONAIS » Introdução ► Controle neuro-hormonal do sistema reprodutor feminino: O ovário desempenha funções gametogênicas importantes, que estão integradas com a sua atividade hormonal. Na mulher, a gônada permanece relativamente em repouso durante a infância, o período de rápido crescimento e de maturação. Na puberdade, o ovário inicia um período de função cíclica de 30 a 40 anos de duração, denominado ciclo menstrual, em virtude dos episódios regulares de sangramento que constituem a sua manifestação mais óbvia. A partir de então, os esteroides sexuais, estrógenos e progesterona, estão envolvidos no ciclo menstrual e na gravidez. O ciclo menstrual começa com a menstruação, que perdura por 3 a 6 dias, durante a qual a camada superficial do endométrio uterino é eliminada. O endométrio regenera-se durante a fase folicular do ciclo, após o término do fluxo menstrual. Um fator liberador, o GnRH, é secretado por neurônios peptidérgicos do hipotálamo, que os libera de modo pulsátil cerca de uma descarga por hora. O GnRH estimula a adeno-hipófise a liberar hormônios gonadrotróficos – FSH e LH. Estes atuam nos ovários para promover o desenvolvimento de pequenos grupos de folículos, cada um contendo um óvulo. Um dos folículos desenvolve-se mais rapidamente que os outros e forma o folículo de Graaf, que secreta estrógenos, e o restante se degenera. O folículo de Graaf maduro consiste em células da teca e granulosas dispostas ao redor de um núcleo preenchido por líquido, dentro do qual está o óvulo. Os estrógenos são responsáveis pela fase proliferativa da regeneração endometrial, que ocorre de 5 a 6 dias até a metade do ciclo. Durante essa fase, o endométrio aumenta em espessura e vascularização, e no pico de secreção de estrógeno há secreção cervical abundante de muco, de pH 8 a 9, rico em proteínas e carboidratos, que facilita a entrada dos espermatozoides. O estrógeno tem efeito de retroalimentação negativa na adeno-hipófise, diminuindo a liberação de gonadotrofina tanto durante a administração crônica de estrógeno como na contracepção oral. Em contraste, a secreção endógena elevada de estrógeno exatamente antes da metade do ciclo sensibiliza as células liberadoras de LH da hipófise à ação do GnRH e 4 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 induz o surto de secreção de LH na metade do ciclo. Isso causa rápido inchaço e ruptura do folículo de Graaf, resultando na ovulação. Se a fertilização ocorrer, o óvulo fertilizado desce as tubas uterinas em direção ao útero, começando a dividir-se no trajeto. Estimuladas pelo LH, as células do folículo rompido proliferam e desenvolvem-se no corpo lúteo, que secreta progesterona. A progesterona atua, por sua vez, no endométrio preparado pelo estrógeno, estimulando a fase secretória do ciclo, que se traduz em endométrio suscetível à implantação do óvulo fertilizado. Durante essa fase, o muco cervical torna-se mais viscoso, menos alcalino e, em geral, menos oportuno para o espermatozoide. A progesterona exerce retroalimentação negativa no hipotálamo e na hipófise, diminuindo a liberação de LH. Ela também tem efeito termogênico, causando, por ocasião da ovulação, elevação da temperatura corporal em cerca de 0,5°C, sendo mantida até o final do ciclo. Se não ocorrer a implantação de um óvulo fertilizado, a secreção de progesterona para, desencadeando a menstruação. Por outro lado, se a implantação ocorrer, o corpo lúteo continua a secretar progesterona e, pelo seu efeito no hipotálamo e na adeno-hipófise, previne uma ovulação adicional. O córion (um antecessor da placenta) secreta gonadotrofina coriônica humana (hCG; do inglês, human chorionic gonadotropin), que mantém o revestimento do útero durante a gravidez. À medida que a gravidez prossegue, a placenta desenvolve outras funções hormonais e secreta uma variedade de hormônios, incluindo gonadotrofinas, progesterona e estrógenos. A progesterona secretada durante a gravidez controla o desenvolvimento do alvéolo secretor da glândula mamária, enquanto o estrógeno estimula os ductos lactíferos. Após o parto, o estrógeno, juntamente com a prolactina, é responsável pela estimulação e manutenção da lactação, enquanto doses suprafisiológicas de estrógeno suprimem a lactação. ► Estrogênios: Os estrógenos são sintetizados pelo ovário e pela placenta e, em pequenas quantidades, pelos testículos e pelo córtex da suprarrenal. A substância inicial para a sua síntese e de outros esteroides é o colesterol. Os precursores imediatos para os estrógenos são substâncias androgênicas – androstenediona ou testosterona. Há três estrógenos endógenos principais nos humanos: estradiol, estrona e estriol. O estradiol é o principal e mais potente estrógeno secretado pelo ovário. Existem também estrogênios sintéticos, produzidos a partir de diversas alterações químicas nos estrogênios naturais. 5 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 ➔ Estrogênios naturais: Estradiol, estrona e estriol ➔ Estrogênios sintéticos: Mestranol, etinilestradiol, dietilestilbestrol Mecanismo de ação: Os estrógenos se ligam a receptores nucleares, como outros hormônios esteroides. Existem pelo menos dois tipos adicionais de receptores para estrógenos, chamados de ERα e ERβ. A ligação é seguida pela interação dos complexos resultantes com pontos nucleares e efeitos genômicos subsequentes. Além desses receptores intracelulares “clássicos”, alguns efeitos estrogênicos, em particular suas ações vasculares rápidas, são iniciados pela interação com receptores de membrana, incluindo o receptor de estrógeno acoplado à proteína G (GPER; do inglês, G protein-coupled estrogen receptor). Efeitos fisiológicos: Os estrogênios afetam muitos tecidos e possuem várias ações metabólicas nos seres humanos e em animais. Esses efeitos dos estrogênios sobre determinados aspectos do metabolismo mineral, dos lipídeos, bem como dos carboidratos e das proteínas, são particularmente importantes ao entendimento de suas ações farmacológicas. Os estrogênios exercem efeitos positivos sobre a massa óssea, pois regulam diretamente os osteoblastos e aumentam a sobrevida dos osteócitos aoinibir a apoptose. Além disso, diminuem o número e a atividade dos osteoclastos. Os estrógenos têm ações mineralocorticoides, promovendo retenção de sais e água. Eles aumentam as concentrações plasmáticas de lipoproteínas de alta densidade (HDL), um efeito potencialmente benéfico que pode contribuir para o risco relativamente baixo de doenças ateromatosas em mulheres em pré-menopausa, comparadas com homens da mesma idade. Entretanto, os estrógenos também aumentam a coagulação sanguínea e o risco de tromboembolia. Usos clínicos: Os estrogênios são mais frequentemente usados para contracepção e tratamento hormonal (TH) pós-menopausa. Os estrogênios também são usados no tratamento de reposição em pacientes pré- menopáusicas com deficiência desse hormônio, em casos de hipogonadismo. Efeitos adversos: Náuseas e sensibilidade nas mamas são os efeitos adversos mais comuns do tratamento estrogênico. Além disso, o tratamento estrogênico causa retenção de sal e água resultando em edema, aumenta o risco de eventos tromboembólicos e cardiovasculares e câncer de mama e endometrial. ► Progestogênios: O hormônio progestacional natural (progestógeno) é a progesterona, que é secretada pelo corpo lúteo na segunda parte do ciclo menstrual e pela placenta durante a gravidez. Quantidades pequenas também são secretadas pelos testículos e pelo córtex da suprarrenal. Existem também progestogênios sintéticos, produzidos a partir de diversas alterações químicas nos progestogênios naturais. ➔ Progestogênios naturais: Progesterona ➔ Progestogênios sintéticos: Desogestrel, dienogeste, drospirenona, levonorgestrel, noretisterona, noretisterona, norgestimato, norgestrel, medroxiprogesterona, hidroxiprogesterona, didrogesterona. Mecanismo de ação: Os progestogênios exercem seu mecanismo de ação de forma análoga à de outros hormônios esteroides. 6 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Efeitos fisiológicos: A progesterona estimula a atividade da lipoproteína lipase e parece favorecer a deposição de gordura. O hormônio tem efeito termogênico, causando, por ocasião da ovulação, elevação da temperatura corporal em cerca de 0,5°C, sendo mantida até o final do ciclo. Usos clínicos: Os principais usos clínicos de progestogênios são a contracepção e o tratamento hormonal (TH) pós- menopausa. Além disso, os progestogênios também são usados para o controle do sangramento uterino disfuncional, para o tratamento da dismenorreia, para o controle da endometriose e para o tratamento da infertilidade. Efeitos adversos: Os principais efeitos adversos associados ao uso das progestinas são cefaleia, depressão, aumento de massa corporal e alterações na libido. Progestinas derivadas da 19-nortistosterona (p. ex., noretisterona, acetato de noretisterona, norgestrel, levonorgestrel) têm alguma atividade androgênica, devido à similaridade estrutural com a testosterona, e podem causar acne e hirsutismo. Assim, a espironolactona (um inibidor da produção de androgênios e antagonista dos seus receptores) pode ser utilizada concomitantemente para combater hirsutismo e acne nessas mulheres. Possui o benefício adicional de ser um diurético leve. Todavia, é teratogênica. A ciproterona (agonista parcial de receptores para os androgênios) também pode ser utilizada para esta finalidade. » Fármacos utilizados para contracepção hormonal O desenvolvimento de contraceptivos seguros e eficazes para mulheres revolucionou as práticas sexuais. As duas classes de contraceptivos orais amplamente utilizadas são combinações de estrógeno- progestágeno e contracepção com progestágeno apenas. Existem ainda outros tipos de métodos contraceptivos que serão abordados. Por fim, o desenvolvimento de contracepção masculina constitui uma área ativa de pesquisa, e as abordagens atuais para essa terapia são discutidas de modo sucinto no final da seção. • Contraceptivos orais ⤷ Pílula combinada, com estrogênio e progestogênio. ⤷ Minipílula, apenas com progestogênio. • Outros sistemas • Contracepção pós-coito • Contracepção masculina ► Contraceptivos combinados (associações de estrógeno-progestágeno): A combinação de um estrógeno e um progestágeno constitui o método mais potente conhecido de suprimir a secreção de GnRH, LH e FSH, suprimindo o desenvolvimento folicular e inibindo a ovulação. A coadministração de estrógeno e progestágeno também pode inibir a gravidez por vários mecanismos secundários, incluindo alterações em peristaltismo tubário, receptividade endometrial e secreções de muco cervical. Essas últimas ações juntas poderiam inibir o transporte apropriado de óvulo e espermatozoides, mesmo se tivesse ocorrido ovulação. Em conjunto, esses mecanismos explicam a eficácia de ∼ 99% dos contraceptivos orais combinados. Os estrógenos utilizados nos contraceptivos combinados consistem em etinilestradiol e mestranol. O uso de estrógenos “sem oposição” promove crescimento endometrial, e estudos iniciais de anticoncepcionais com predomínio estrogênico estabeleceram que esses agentes aumentam o risco de 7 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 câncer endometrial. Em decorrência desse achado, estrógeno é sempre administrado concomitantemente com progestágeno para limitar a extensão do crescimento endometrial. São utilizados numerosos progestágenos nos contraceptivos combinados, e todos são potentes agonistas dos receptores de progesterona. O progestágeno ideal deveria apresentar apenas atividade nos receptores de progesterona; entretanto, quase todos os progestágenos atualmente disponíveis também exibem alguma reatividade cruzada androgênica. Progestágenos variam quanto à sua atividade androgênica. Em base molar, norgestrel e levonorgestrel são os que apresentam maior atividade androgênica, enquanto noretindrona e acetato de noretindrona apresentam atividade androgênica mais baixa. Progestágenos de terceira geração – etinodiol, norgestimato, gestodeno e desogestrel – exibem reatividade cruzada ainda menor com receptores de andrógeno. Drospirenona é progestágeno sintético que também exibe atividade antiandrogênica. Pode-se também classificar os anticoncepcionais orais combinados em monofásicos (todos os comprimidos da cartela possuem a mesma concentração hormonal), bifásicos (duas concentrações de um ou ambos os componentes da fórmula) e trifásicos (três concentrações). Todavia, os bifásicos ou trifásicos não apresentam nenhuma vantagem em relação aos monofásicos, não havendo justificativas para seu emprego. Os esquemas clássicos de anticoncepcionais orais combinados consistem na administração de comprimidos durante 21 dias, seguidos de 7 dias de pílula placebo. O período de 7 dias com placebo remove a estimulação hormonal exógena, promovendo a descamação do endométrio e consequente sangramento. Como a administração de progestágeno durante todo o ciclo inibe o crescimento proliferativo do endométrio, a maioria das mulheres tem períodos menstruais menos intensos quando fazem uso de anticoncepcionais orais combinados, e, com frequência, o ciclo menstrual torna-se mais regular. A formulação do ciclo 21-7 teve por objetivo simular um ciclo de 28 dias; todavia, é relativamente arbitrário. Dispõe-se também de formulações que contêm 24 pílulas de hormônios diários, com 4 dias de placebo. Uma vantagem dessa formulação é que a ovulação não tende a ocorrer se a mulher se esquecer de iniciar seu novo ciclo de pílulas por 3 ou 4 dias. Cartela com 21 comprimidos ativos (a mulher deve fazer a pausa por conta, sem tomar placebo) Cartela com 21 comprimidos ativos + 7 placebo Cartela com 24 comprimidos ativos (a mulher deve fazer a pausa por conta, sem tomar placebo) Cartela com 24 comprimidos ativos + 4 placebos 8 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Efeitos adversos • Ganho de peso • Retenção de líquido (edema) • Náusea e vômito • Cefaleia • Depressão • Fadiga eirritabilidade • Alteração da libido • Aumento da pigmentação da pele • Aumento da oleosidade da pele • Amenorreia após a cessação da ingestão da pílula • Aumento da coagulabilidade do sangue • Aumento do riso de doença cardiovascular • Aumento do risco de desenvolvimento de câncer endometrial, ovariano e colorretal • Aumento do risco de desenvolvimento de câncer mama ► Minipílula (contracepção apenas com progestogênios): Em situações nas quais o estrógeno possa estar contraindicado, é possível justificar o uso contínuo de progestágenos orais em baixas doses. Além disso, está indicado durante a amamentação, pois não inibe a produção de leite. A contracepção oral só com progestágenos impede a ocorrência de ovulação, provavelmente porque os progestágenos alteram a frequência dos pulsos de GnRH e diminuem a responsividade da adeno-hipófise ao GnRH. A despeito da frequência relativamente alta de ovulação, esse método de contracepção tem eficácia de 92%, sugerindo que certos mecanismos secundários também atuam, como alterações em muco cervical, receptividade do endométrio e peristaltismo das tubas. Como a progesterona inibe a proliferação do endométrio e promove sua secreção, é também possível que o ovo seja incapaz de se implantar em endométrio continuamente exposto a progestágeno. Mulheres que tomam esses fármacos geralmente não menstruam, porém é comum a ocorrência de sangramento inesperado e de períodos menstruais irregulares e de pouca intensidade durante o primeiro ano de administração. O uso desses fármacos deve ser diário, sem pausa entre as cartelas, preferencialmente no mesmo horário. Cartela com 28 comprimidos ativos Cartela com 35 comprimidos ativos Vantagens e desvantagens adversos Por não conterem estrógenos, os anticoncepcionais orais progestogênicos têm menores riscos de complicações, como acidente vascular encefálico, infarto agudo do miocárdio e tromboembolismo venoso. Também parece não haver efeito significativo sobre o metabolismo dos lipídios e carboidratos. 9 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Todavia, a desvantagem em seu uso é a necessidade de adesão cuidadosa ao método, além da possibilidade de alteração de padrão menstrual, com sangramento irregular, ocasional ou prolongado. Além disso, é menos eficaz que a pílula combinada. ► Contracepção de emergência (“pílula do dia seguinte”): Contracepção de emergência refere-se à administração de medicamentos para impedir a gravidez após falha de contraceptivo de barreira (ruptura de preservativo) ou relação sexual desprotegida recente (incluindo estupro). Historicamente, os comprimidos de estrógeno- progestágeno eram administrados para contracepção de emergência. Ensaios clínicos recentes demonstraram que o contraceptivo de emergência mais eficaz e com menos efeitos adversos é levonorgestrel oral de 1,5 mg, administrado em dose única, o mais rápido possível após a exposição. Levonorgestrel é potente progestágeno capaz de bloquear o surto de LH, interrompendo a ovulação normal, e de produzir alterações endometriais que impedem a implantação. A contracepção de emergência deve ser utilizada até 72h após a relação. Se realizado corretamente, o percentual de eficácia deste método é de aproximadamente 98%. Como pode causar náuseas, para evitar que a pílula pode seja perdida, pode-se associar um antiemético ao esquema. ► Outros métodos: Além dos contraceptivos orais, a terapia hormonal está disponível na forma de adesivos transdérmicos, anéis vaginais, injeções intramusculares, implantes subcutâneos e dispositivos intrauterinos (DIU). → Adesivo transdérmico: O anticoncepcional transdérmico consiste em matriz que l ibera continuamente etinilestradiol e progestágeno sintético, a norelgestromina. O adesivo é trocado semanalmente, durante 3 semanas. Na quarta semana, o adesivo não é utilizado, e pode ocorrer menstruação. → Anel vaginal: O anel vaginal consiste em cilindro de silicone contendo etinilestradiol e progestágeno, o etonogestrel. Os esteroides são liberados com cinética de ordem zero. O anel é aplicado na vagina, onde permanece por 21 dias. Em seguida, é removido, e, 7 dias depois, coloca- se novo anel. Durante os 7 dias após a remoção do anel vaginal, pode ocorrer menstruação. → Injeções intramusculares: Os anticoncepcionais hormonais combinados injetáveis são utilizados mensalmente. Os mais utilizados são o de valerato de estradiol com enantato de noretisterona, e o cipionato de estradiol com acetato de medroxiprogesterona. A aplicação ocorre via intramuscular no músculo deltoide a cada 30 dias. O sangramento menstrual ocorre a cada três semanas após o 22° dia da injeção. Além disso, acetato de medroxiprogesterona pode ser administrado por via parenteral a cada 3 meses. 10 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 → Implante subcutâneo: Dispõe-se também de implante de silicone que libera etonogestrel; esse método mostra-se efetivo por 3 anos. O implante normalmente é inserido na face dorsal do antebraço. → DIU: O DIU de levonogestrel, também conhecido pelo nome comercial Mirena, é um dispositivo de poliuretrano em forma de T que libera 20mcg levonorgestrel por dia. Tem validade de cerca de 5 anos. Funciona levando ao efeito a atrofia do endométrio, tornando o muco cervical espesso e dificultando a espermomigração e motilidade tubária. ► Contracepção masculina: O objetivo da contracepção masculina seria suprimir de modo reversível a produção endógena de espermatozoides, ocasionando um estado de azoospermia (ausência de espermatozoides no ejaculado), sem suprimir a libido ou a função erétil. A inibição confiável da espermatogênese é tarefa difícil, uma vez que até mesmo redução de 99% da espermatogênese ainda resultaria em número suficiente de espermatozoides viáveis para fertilização. Os estudos iniciais de contracepção masculina se concentraram na administração parenteral de ésteres de testosterona, como enantato de testosterona ou undecanoato de testosterona. Como produto final do eixo hipotálamo-hipófise-gônadas, a testosterona suprime significativamente a liberação de gonadotrofinas. Os níveis circulantes reduzidos de LH e FSH são incapazes de estimular a função das células de Sertoli, resultando em diminuição da espermatogênese. Em ensaio clínico de grande escala, essa abordagem produziu taxa de fracasso contraceptivo de 1 por 100 homens-ano. Ensaios clínicos recentes indicam que a administração concomitante de andrógeno e progestágeno pode ser superior ao andrógeno isoladamente na supressão da espermatogênese, uma vez que a combinação suprime mais completamente a secreção de GnRH e a liberação de gonadotrofinas. As seguintes combinações 11 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 demonstraram ser contraceptivos masculinos reversíveis efetivos: enantato de testosterona por via parenteral, mais levonorgestrel oral diariamente; e undecanoato de testosterona por via parenteral, mais acetato de medroxiprogesterona injetável; e administração transdérmica de testosterona e progestágeno sintético, a nestorona. As principais dificuldades encontradas com essa abordagem têm sido: acentuada variabilidade no grau de inibição da espermatogênese (em média, apenas 60% dos homens apresentam azoospermia) e efeitos adversos significativos, incluindo acne, ganho de peso, policitemia e aumento potencial no tamanho da próstata. 12 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 FARMACOLOGIA → TRATAMENTO DE DISFUNÇÃO ERÉTIL E HIPERPLASIA PROSTÁTICA BENIGNA Disfunção erétil e hiperplasia prostática benigna são distúrbios urológicos comuns nos homens. » Disfunção erétil A disfunção erétil é a incapacidade de manter a ereção peniana para realizar a atividade sexual bem-sucedida. O termo – mais adequadodo que a palavra impotência, com conotação negativa – representa o distúrbio sexual masculino mais comum, classificado de acordo com a etiologia em psicogênica, orgânica e mista. Embora a maioria dos pacientes apresente fatores psicológicos e orgânicos associados (isto é, uma disfunção erétil mista), pode haver predomínio de uns ou outros. Quanto à intensidade, pode ser categorizada em leve, moderada ou grave. Embora não constitua ameaça à vida dos pacientes, essa condição gera profundo impacto na qualidade de vida dos homens e casais afetados. Aproximadamente 25 milhões de homens no Brasil sofrem de disfunção erétil em algum grau, sendo moderada ou grave em cerca de 11 milhões deles. Fisiologia da ereção: A estimulação sexual resulta em relaxamento da musculatura lisa do corpo cavernoso, aumentando o influxo de sangue. O mediador dessa resposta é o óxido nítrico (NO), liberado tanto por nervos nitrérgicos como pelo endotélio. O NO ativa a guanilil ciclase, que forma monofosfato cíclico de guanosina (GMPc) a partir de trifosfato de guanosina. O GMPc produz relaxamento do músculo liso pela diminuição da concentração intracelular de Ca2+. Fármacos utilizados no tratamento da disfunção erétil: A terapêutica da disfunção erétil abrange medidas não medicamentosas (psicoterapia, terapia a vácuo, tratamento cirúrgico, inserção de prótese peniana) e medicamentosas. Fármacos são usados por vias oral e intracavernosa e sob forma de reposição hormonal. ► Inibidores da 5-fosfodiesterase (PDE5): ➔ Representantes: Sildenafila, vardenafila, tadalafila e avanafila Para a terapia inicial de disfunção erétil, recomendam-se os inibidores da 5-fosfodiesterase por causa de sua eficácia, facilidade de uso e perfil de efeito colateral favorável. Mecanismo de ação: A 5-fosfodiesterase (PDE5) é a enzima que inativa o GMPc. Consequentemente, a inibição da fosfodiesterase V potencializa o efeito, sobre o músculo liso vascular peniano, do óxido nítrico. As 13 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 concentrações plasmáticas máximas da sildenafila ocorrem aproximadamente 30 a 120 min após doses orais e são retardadas pela ingestão de alimentos; por isso, ela é ingerida 1 h ou mais antes da atividade sexual. É administrada em dose única, quando necessário. A tadalafila tem meia-vida mais longa que a sildenafila e, por isso, pode ser tomada muito antes da atividade sexual. Efeitos adversos: Muitos dos efeitos adversos dos inibidores da 5-fosfodiesterase são causados pela vasodilatação de outros leitos vasculares; eles incluem hipotensão, rubor e dor de cabeça. Além disso, alterações visuais são ocasionalmente descritas, e é consenso que a sildenafila tem alguma ação na 6-fosfodiesterase, presente na retina e importante na visão (um processo também dependente do GMPc). Logo, os fabricantes avisam que a sildenafila não deve ser usada em pacientes com doenças degenerativas hereditárias da retina (tais como retinite pigmentar), devido ao risco teórico de contribuir para o agravamento da doença. A vardenafila é mais seletiva para a isoenzima tipo 5 do que a sildenafila, mas é também contraindicada em pacientes com doenças hereditárias na retina. Interações medicamentosas: A sildenafila é metabolizada pela CYP3A4, que é induzida por carbamazepina, rifampicina e barbitúricos, e inibida por cimetidina, antibióticos macrolídios, imidazolinas antifúngicas e alguns agentes antivirais, como o ritonavir. Esses fármacos podem interagir com a sildenafila em consequência disso. Interação farmacodinâmica clinicamente importante, comum a todos os inibidores de 5-fosfodiesterase, ocorre com todos os nitratos orgânicos, que trabalham por meio do aumento de GMPc e são, portanto, marcadamente potencializados pela sildenafila. Consequentemente, o uso de nitrato ao mesmo tempo contraindica o uso concomitante de qualquer inibidor de 5-fosfodiesterase. ► Outros: Ao longo dos séculos, tem ocorrido um comércio de diversas substâncias para o tratamento de disfunção erétil. A ioimbina, um antagonista de um receptor α2-adrenérgico, pode ter algum efeito positivo nesse sentido, mas os testes realizados mostraram-se inconclusivos. A apomorfina, agonista da dopamina, causa ereções em humanos, assim como em roedores, quando injetada subcutaneamente, mas é um poderoso emético, efeito desvantajoso nesse contexto. O quadro mudou quando foram descobertos fármacos vasodilatadores injetados diretamente no corpo cavernoso, causando a ereção peniana. A papaverina, se necessário com adição de fentolamina, foi usada nessa via. A via de administração não é aceitável para a maioria dos homens; contudo, os diabéticos, em particular, frequentemente não se assustam com agulhas, e esse enfoque foi uma verdadeira dádiva para a maioria desses pacientes. A PGE1 (alprostadil) é comumente combinada com outros vasodilatadores quando administrada por via intracavernosa. Ela pode também ser administrada por via transuretral, como alternativa para a injeção, embora esse método também seja “pouco romântico”. Efeitos adversos: Efeitos adversos de todos esses fármacos incluem o priapismo (ereção prolongada e dolorosa com risco de lesão tecidual permanente), que não representa problema trivial. O tratamento consiste em 14 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 aspiração do sangue e, se necessário, administração intracavernosa cuidadosa de um vasoconstritor, como a fenilefrina. » Hiperplasia prostática benigna A hiperplasia prostática benigna é o aumento não maligno da próstata, que ocorre naturalmente com o avanço da idade do homem. Conforme a próstata aumenta, desenvolvem-se sintomas no trato urinário inferior que podem impactar na qualidade de vida do paciente. Fármacos utilizados no tratamento da hiperplasia prostática benigna: As principais classes de fármacos são usadas para tratar a hiperplasia prostática benigna: antagonistas α1-adrenérgicos e inibidores da 5-α-redutase. Todavia, outros fármacos podem ser utilizados. ► Antagonistas α1-adrenérgicos: ➔ Representantes: Terazosina, doxazosina, tansulosina, alfuzosina e silodosina Mecanismo de ação: Estes fármacos são bloqueadores competitivos seletivos do receptor α1. Assim, causam relaxamento da musculatura lisa do colo da bexiga e da cápsula prostática, o que melhora o fluxo da urina. Por isso, tais fármacos são úteis no tratamento da retenção urinária associada à hiperplasia prostática benigna. Os receptores α1A são encontrados na próstata, os receptores α1B estão presentes na próstata e nos vasos e os receptores α1D são encontrados nos vasos. Bloqueando os receptores α1A e α1B na próstata, os α-bloqueadores causam relaxamento do músculo liso prostático, o que melhora o fluxo da urina. Doxazosina, terazosina e alfuzosina bloqueiam os receptores α1A e α1B e assim, pelo bloqueio dos receptores α1B, diminuem a resistência vascular periférica e a pressão arterial, por relaxarem os músculos lisos arteriais e venosos. Em contraste, tansulosina e silodosina têm menor efeito na pressão arterial, pois são mais seletivos para o receptor α1A específico da próstata. Efeitos adversos: Os α1-bloqueadores podem causar tontura, falta de energia, congestão nasal, cefaleia, sonolência e hipotensão ortostática. Como já comentado, a tansulosina e a silodosina inibem os receptores α1A encontrados no músculo liso da próstata e, dessa forma, essa seletividade é responsável pelos efeitos relativamente mínimos na pressão arterial. 15 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Devido ao risco de hipotensão ortostática, esses fármacos geralmente são administrados na hora de dormir e a dose é então titulada ao longo de várias semanas. Assim, pressão arterial deve ser monitorada em pacientes que iniciaram o tratamento com bloqueadores dos receptores alfa-adrenérgicos. Além disso, cerca de 82% dos homens tratados com qualquer bloqueador alfa-adrenérgicotêm algum grau de disfunção ejaculatória. Todavia, os α1-bloqueadores não afetam a função sexual masculina de modo tão acentuado quanto os α-bloqueadores não seletivos, isto é, que atuam tanto em receptores α1, quanto em α2, como fenoxibenzamina e fentolamina. ► Inibidores da 5-α-redutase: ➔ Representantes: Finasterida e dutasterida Mecanismo de ação: Estes fármacos inibem a enzima 5-α-redutase, que é responsável por converter testosterona em di- hidrotestosterona (DHT) mais ativa. A DHT é o androgênio que estimula o crescimento da próstata. Assim, reduzindo a DHT, a próstata encolhe, e o fluxo melhora. Efeitos adversos: Os inibidores da 5-α-redutase causam efeitos adversos sexuais, como diminuição da libido, disfunção erétil, diminuição do volume seminal e ginecomastia. Finasterida e dutasterida têm potencial teratogênico. Logo, mulheres grávidas ou em idade fértil não devem manusear ou ingerir qualquer um dos fármacos, pois isso pode causar defeitos congênitos graves envolvendo a genitália de fetos masculinos. ► Inibidores da 5-fosfodiesterase (PDE5): ➔ Representante: Tadalafila A tadalafila é o único inibidor da PDE-5 aprovado para o tratamento da hiperplasia prostática benigna. A enzima 5-fosfodiesterase está presente na próstata e na bexiga. Assim, a inibição da 5-fosfodiesterase pela tadalafila permite a vasodilatação e o relaxamento do músculo liso da próstata e da bexiga, o que reduz os sintomas da hiperplasia prostática benigna. 16 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 FARMACOLOGIA → TRATAMENTO DE INCONTINÊNCIA URINÁRIA Incontinência urinária é definida como qualquer perda involuntária de urina. Essa perda involuntária de urina pode estar associada com a urgência ou também com esforço, incluindo atividades esportivas ou em espirros ou tosse. É uma condição que afeta dramaticamente a qualidade de vida, comprometendo o bem-estar físico, emocional, psicológico e social. A incontinência urinária pode acometer indivíduos de todas as idades, com maior prevalência entre os idosos; e de ambos os sexos, porém a incidência dentre as mulheres chega a ser o dobro em relação aos homens. » Tratamento não medicamentoso Em casos leves, o tratamento da incontinência urinária pode ser feito com fisioterapia, especialmente em pacientes idosos, podendo ser realizada por meio de diversas técnicas de reabilitação do assoalho pélvico, visando fortalecer a musculatura perineal e melhorando o suporte vesical. Além disso, outras medidas terapêuticas não-farmacológicas envolvem reduzir peso, cessar tabagismo, diminuir o consumo de fluidos em excesso – especialmente de cafeína, álcool, bebidas carbonatadas e bebidas dietéticas – e estabelecer horários específicos para urinar durante o dia (intervalos a cada 2 a 3 horas parecem adequados). » Tratamento medicamentoso Os anticolinérgicos (antagonistas muscarínicos) constituem o grupo de drogas de primeira escolha. Outra opção medicamentosa são os agonistas β3-adrenérgicos. ► Antagonistas muscarínicos: ➔ Representantes: Oxibutinina, tolterodina e darifenacina Mecanismo de ação: Os antimuscarínicos atuam inibindo a contração do músculo detrusor da bexiga e estimulando a contração dos esfíncteres e, assim, são úteis no tratamento da incontinência urinária. A proporção de pacientes que relatam controle dos sintomas com esses fármacos é de 49%. Efeitos adversos: Os principais efeitos adversos desses fármacos advêm justamente de seu mecanismo de ação, isto é, bloquear receptores muscarínicos. Assim, podem causar midríase, visão borrada, constipação, retenção urinária, boca seca, hipertermia e confusão mental. Infelizmente, esses efeitos adversos acabam muitas vezes limitando o uso desses fármacos, visto que muitos pacientes não conseguem os tolerar. ► Agonistas β3-adrenérgicos: ➔ Representantes: Mirabegrona Mecanismo de ação: A mirabegrona é um agonista β3 adrenérgico. O receptor β3 está presente no músculo detrusor da bexiga e, assim, ao ser ativado, promove relaxamento deste músculo, aumentando a capacidade de armazenamento da bexiga, tendo, dessa forma, seu efeito no tratamento da incontinência urinária. 17 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Tal fármaco deve ser considerado no tratamento da incontinência urinária caso o paciente tenha alguma contraindicação ao antagonista muscarínico, como glaucoma de ângulo fechado e arritmias cardíacas. Além disso, pode ser utilizado de maneira sinérgica com um antagonista muscarínico naqueles pacientes que não respondem à monoterapia. Efeitos adversos: Da mesma forma, os principais efeitos adversos desses fármacos advêm justamente de seu mecanismo de ação, isto é, ativar receptores adrenérgicos. Logo, podem causar arritmia, hipertensão, cefaleia, hiperatividade, tremores, insônia e náusea. 18 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 FARMACOLOGIA → USO DE FÁRMACOS EM IDOSOS Na atualidade, a população brasileira é constituída por 12,5% de pessoas com mais de 60 anos de idade, segundo projeções do IBGE. A velocidade de envelhecimento é elevada, permitindo estimativas de que em 2030 o número proporcional de idosos será superior ao de indivíduos com menos de 14 anos de idade, com completa inversão da pirâmide etária em 2050. Tal realidade permite estimar o processo de transição epidemiológica com potencial impacto sobre as ações de saúde, visto que diversas são as peculiaridades fisiológicas e patológicas associadas ao envelhecimento. Isso coloca o indivíduo idoso sob maior risco de desenvolver doenças, maior demanda de tratamentos e maior risco de complicações não intencionais associadas a esses tratamentos, ou seja, iatrogenia. A iatrogenia, em virtude de seu significativo impacto clínico sobre a saúde do idoso, é considerada uma das síndromes geriátricas ou “gigantes da geriatria”. » Heterogeneidade do envelhecimento e vulnerabilidade individual De forma relevante, alterações próprias do envelhecimento (senescentes), em conjunto com as alterações patológicas (senis), reduzem a reserva funcional orgânica e têm consequências clínicas que se traduzem em menor resiliência e maior vulnerabilidade a distintos estímulos. Entretanto, não se trata de tradução de um processo dicotômico: ser ou não ser vulnerável. Há um espectro que parte de idosos plenamente robustos, passando por fenótipos intermediários de fragilização, até aqueles com dependências totais em situação de fragilidade plena; o que caracteriza a heterogeneidade do envelhecimento. Cabe destacar que esse fator independe da idade. Entre as diferentes categorias de vulnerabilidade, um mesmo estímulo nocivo poderá tanto ser inerte – naqueles mais robustos – como acarretar distintos graus de gravidade de complicações nos mais frágeis. Por outro lado, diferentes graus de estímulos nocivos podem causar uma mesma complicação (p. ex., hospitalização por evento adverso de fármaco), dependendo do perfil de vulnerabilidade do paciente exposto. Ou seja, pequeno estímulo nocivo (p. ex., diurético de alça em baixa dose) pode ter repercussão danosa em idoso frágil; porém, exposição a fármaco com alto potencial iatrogênico (p. ex., quimioterápico em alta dose) será necessária para desencadear evento clínico adverso de igual magnitude em idoso robusto. A figura abaixo ilustra tal fenômeno de interação de fatores tendo iatrogenia como desfecho. Portanto, identificar idosos de alto risco é fundamental ao adequado planejamento de prescrição e supervisão dos tratamentos. » Alterações farmacocinéticas e farmacodinâmicas no envelhecimento Modificações de funções fisiológicas decorrentes do processo de envelhecimento alteram tanto a farmacocinética como a farmacodinâmica nos idosos, mesmo na ausência de doenças, contribuindosignificativamente para maior suscetibilidade à iatrogenia, assim como para menor efetividade dos tratamentos. ► Alterações farmacocinéticas: Alterações farmacocinéticas relacionadas ao envelhecimento ocorrem nas distintas fases do processamento medicamentoso: absorção, distribuição, metabolismo e excreção. 19 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 A absorção dos fármacos não se altera de forma clinicamente relevante em condições usuais de envelhecimento, mesmo diante de menor superfície de absorção intestinal e motilidade do trato gastrointestinal, já que ocorre um balanço entre alterações que promovem ou retardam a absorção medicamentosa. Contudo, situações clínicas frequentemente observadas em idosos acabam contribuindo significativamente para alterações da absorção: problemas de deglutição, desnutrição proteica, alimentação por sondas e utilização de outros fármacos que atuam sobre pH e fluxo sanguíneo gástricos podem interferir na absorção de medicamentos. A distribuição dos fármacos é o processo farmacocinético de maior modificação com o envelhecimento, motivada, por exemplo, por alterações de constituição corporal e níveis plasmáticos de albumina. À medida que o corpo envelhece, há contínua redução de massa magra (muscular) e aumento da massa adiposa, também associada à lipossubstituição dos tecidos. Dessa forma, fármacos lipofílicos têm seu volume de distribuição elevado, o que justifica o aumento de sua meia-vida. Exemplo muito destacado em geriatria é o comportamento farmacocinético de diazepam nos idosos, fármaco altamente lipofílico, cuja meia-vida pode chegar a 96 h, aumentando o risco de complicações iatrogênicas. Níveis plasmáticos de albumina podem estar reduzidos, sobretudo em idosos com doenças crônicas, havendo consequente maior disponibilidade de frações livres de medicamentos. Sendo assim, a distribuição pode estar alterada de forma a tanto interferir na eficácia dos fármacos como elevar seu potencial tóxico. O metabolismo hepático de fármacos também se altera na senectude. À medida que um indivíduo envelhece, há redução de fluxo sanguíneo hepático e de parênquima funcionante do órgão, observando- se redução de 30 a 40% na depuração de alguns medicamentos. As alterações mais proeminentes ocorrem sobre as reações de fase I (oxidação, redução, hidrólise) e sobre o metabolismo de primeira passagem. Por conseguinte, maiores níveis circulantes dos fármacos que se destoxificam pelo fígado são encontrados em idosos. A excreção renal de fármacos também se altera. No envelhecimento, o rim reduz massa total e fluxo sanguíneo renal. As alterações mais significativas estão relacionadas a redução do fluxo (cerca de 50% menor em octogenários em comparação a adultos jovens), esclerose glomerular e progressiva diminuição da taxa de filtração glomerular após a quarta década de vida. Consequentemente, há menor reserva funcional renal e maior acúmulo dos fármacos eliminados por essa via. Postula-se que o produto final do somatório dessas alterações farmacocinéticas seja maior acúmulo de fármacos e potencial aumento na toxicidade dos medicamentos em idosos. 20 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 ► Alterações farmacodinâmicas: Há também alterações farmacodinâmicas que podem influenciar a eficácia dos fármacos durante o envelhecimento, principalmente relacionadas aos efeitos em sistema cardiovascular e sistema nervoso central (SNC). Em grande parte, tais modificações de comportamento farmacológico se explicam por alteração no número de receptores celulares ou em suas afinidades. É muito difícil prever as respostas individuais dos idosos a diferentes medicamentos, porém, partindo-se das evidências de alterações de ação de alguns fármacos, deve-se ter maior precaução mediante prescrição de medicamentos com resposta hipotensora, efeitos inotrópicos negativos e ação no SNC. » Risco de iatrogenia medicamentosa em idosos Eventos adversos de fármacos, importante forma de iatrogenia, ocorrem em cerca de 20% de todos os tratamentos prescritos e já constituem a sexta causa de morte entre idosos dos EUA. Quando graves, eventos adversos de fármacos exigem hospitalização e são mais comuns em idosos. E grande parte das vezes, são evitados com simples prevenção. Uma metanálise de estudos observacionais evidenciou que esses eventos são responsáveis por até 16% das internações hospitalares e, de forma alarmante, demonstrou que 88% delas poderiam ter sido evitadas. Falhas na prescrição e no uso de medicamentos associam-se a desfechos negativos relacionados a fármacos em considerável monta, principalmente quando há superdosagem. Contudo, recente publicação evidenciou que tratamentos em si são causa desses eventos em cerca de 90% das vezes, mesmo quando adequadamente prescritos. Portanto, há risco iatrogênico significativo mesmo quando os fármacos são adequadamente prescritos e consumidos. E, como já comentado, parte do que ocorre se deve a vulnerabilidade individual e alterações fisiopatológicas que acompanham o envelhecimento. Todavia, isso não explica a totalidade do fenômeno, com outra parte do problema residindo no emprego dos fármacos. Nesse cenário, dois fatores se destacam: a polifarmácia e o potencial iatrogênico de cada medicamento. ► Polifarmácia: Caracteriza-se pelo uso concomitante de 5 ou mais medicamentos, definição respaldada por maior frequência de mortalidade, fragilidade, quedas e incapacidades. A polifarmácia prevalência elevada em idosos. Estudo brasileiro de base populacional evidenciou que 91% dos idosos utilizavam pelo menos 1 medicamento, e que 27% deles recebiam diariamente 5 ou mais fármacos. Nos EUA, a prevalência foi de 50% para 5 ou mais medicamentos e de 12% para uso regular de pelo menos 10 fármacos. Contudo, a coocorrência de doenças crônicas não transmissíveis é fator de risco robusto para a polifarmácia, podendo corresponder a potencial viés na associação entre essa condição e desfechos. Entretanto, recente metanálise de 50 estudos observacionais de boa qualidade metodológica foi capaz de demonstrar associação entre polifarmácia e desfechos negativos de forma independente das comorbidades. Os medicamentos mais frequentemente prescritos e associados à polifarmácia são justamente os com maior potencial de alterações farmacodinâmicas e responsáveis pela maior frequência de eventos adversos em idosos, tendo ação sobre sistemas nervoso central e cardiovascular. Portanto, polifarmácia constitui fator de risco em pacientes com 60 anos ou mais, impondo revisões constantes da prescrição farmacológica e abordagens de uso racional de medicamentos. 21 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 ► Potencial iatrogênico de cada medicamento: Tão ou mais importante do que o número de fármacos prescritos, o potencial iatrogênico individual de certos medicamentos pode agregar maior risco ainda a essa suscetível população. Isso decorre de sua maior permanência e disponibilidade na corrente sanguínea, seu comportamento farmacodinâmico e seu potencial de interação farmacológica. Diversos fármacos com alto potencial iatrogênico individual costumam ser rotulados de “Medicamentos Potencialmente Inapropriados para Uso em Idosos” ou “PIMs” (sigla oriunda da expressão em inglês). Esse termo foi difundido na comunidade científica a partir de consenso de especialistas publicado pela primeira vez em 1991, conhecido como “Critérios ou Lista de Beers”, sobrenome do primeiro autor. Esse consenso, posteriormente adotado e frequentemente revisado pela American Geriatrics Society (AGS), tornou-se norteador da prescrição farmacológica adequada ao idoso. De forma prática, PIMs são separados por classes ou ações farmacológicas, com seus respectivos racionais teóricos e níveis de evidência para fazer adequadas recomendações. Além disso, há uma tabela de PIMs, categorizados pela potencial interação de um fármaco com uma doençaou síndrome, descrevendo as possíveis complicações iatrogênicas da citada interação. O quadro abaixo, no mesmo formato dos Critérios de Beers, traz exemplos de fármacos frequentemente utilizados e potencialmente inapropriados para idosos. O quadro abaixo, igualmente adaptado da mesma publicação, apresenta exemplos de interação fármaco-doença. 22 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Apesar de ser amplamente utilizada como referência na avaliação de risco para eventos adversos de fármacos em idosos, a categorização de Beers contém medicamentos usados pela minoria deles (12 a 21% e perto de 35% das populações idosas norte-americana e brasileira, respectivamente). Adicionalmente, a maior parte dos eventos graves é causada por medicamentos não contemplados por essa diretriz, o que caracteriza a maior limitação do método. Cerca de 70% das internações hospitalares decorrentes de eventos graves são causados por varfarina (33%), insulinas (14%), antiagregantes plaquetários (13%) e hipoglicemiantes orais (10%). Diante disso, outras formas de avaliação de potencial iatrogênico individual de fármacos em formato de PIMs foram publicadas e têm seu espaço tanto na clínica diária como em cenários de pesquisa. Por exemplo, o STOPP/START (Screening tool of older people’s prescriptions/Screening tool to alert to right treatment) traz, além dos PIMs, uma lista de omissões frequentes de prescrição de medicamentos com benefício claro e sustentado por evidências científicas, equívoco tão potencialmente danoso como prescrições inapropriadas. Exemplos são mostrados no quadro abaixo. Existem ainda outras avaliações de risco que priorizam identificação de prescrição e uso de medicamentos com ação anticolinérgica e sedativa, e suas consequências sobre sistema nervoso central. 23 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Dentre elas, destaca-se a escala de risco anticolinérgico. A partir de escore de potencial anticolinérgico individual de diversos fármacos (de 1 a 3 pontos), soma-se a pontuação total conferida pelos fármacos em uso. Quanto maior a pontuação, maior o risco de eventos adversos de fármacos anticolinérgicos, tanto centrais como periféricos. O papel fundamental da escala é chamar a atenção para o tópico e educar quanto ao potencial iatrogênico de fármacos comumente prescritos. Em conclusão, aspectos relacionados ao indivíduo (alterações fisiopatológicas e vulnerabilidade relacionadas ao envelhecimento) e aos fármacos (polifarmácia e potencial iatrogênico) são os principais fatores de risco para iatrogenia em idosos. » Uso racional de medicamentos e otimização da prescrição farmacológica no idoso Caracterizado o problema, sua qualificação de risco e seu impacto clínico na iatrogenia em idosos, cabe destacar ações para preveni-lo e/ou minimizá-lo. O primeiro passo é diagnosticar corretamente e só usar medicamento quando realmente se faz necessário (evitar medicalização); o segundo é avaliar o paciente de forma ampla para identificar vulnerabilidade e eventual redução de suas reservas funcionais; o terceiro é avaliar se são cabíveis medidas não farmacológicas, respeitando o preceito de efetividade demonstrada cientificamente. Em sequência, procede-se à escolha apropriada do medicamento, de sua dose e tempo de intervenção para a determinada condição de saúde no paciente específico. Considerar comorbidades, medicamentos já em uso (potenciais interações) e fármacos classificados como potencialmente inapropriados para idosos faz parte desse processo de escolha. Entretanto, tratamentos podem ser iatrogênicos mesmo quando bem escolhidos e prescritos, principalmente em idosos. Diante disso, a prevenção da iatrogenia vai além da escolha do fármaco. Envolve diagnóstico correto, tratamento direcionado a diagnósticos documentados, escolha do medicamento e dose, escalonamento gradual da dose, educação dos pacientes (e familiares) e contínua reavaliação, preferencialmente de forma sistematizada para permitir aferição de qualidade de cuidado. Esse tipo de processo é parte relevante da boa prática clínica em todas as faixas etárias. Porém estima-se que nos pacientes com maior vulnerabilidade, tais processos devem ser agregados a itens pontuais que, por sua frequência e impacto na prática clínica, podem evitar tanto eventos iatrogênicos como a subprescrição de fármacos com potencial benefício. Baseando-se nisso, um projeto denominado Assessing Care of Vulnerable Elders (ACOVE), promovido por organização sem fins lucrativos com sede nos EUA, elencou indicadores de qualidade do uso de medicamentos, além das demais ferramentas de avaliação de qualidade no cuidado do idoso vulnerável. Dentre seus diversos itens, destacam-se alguns: 24 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 FARMACOLOGIA → TRATAMENTO DE CEFALEIA Cefaleia é uma queixa extremamente comum, tanto em atendimentos de emergência quanto em consultas ambulatoriais. A prevalência média em 1 ano de cefaleia é de 46%. De acordo com o estudo Global Burden of Disease de 2010, cefaleia tipo tensão e migrânea são respectivamente a segunda e a terceira doença mais comum do mundo, perdendo apenas para cáries dentárias. As cefaleias podem ser classificadas como primárias ou secundárias, e é de fundamental importância a distinção etiológica destas, especialmente porque as cefaleias secundárias estão associadas a outras patologias subjacentes, algumas, potencialmente ameaçadoras à vida. As cefaleias primárias compreendem a migrânea (conhecida como enxaqueca), cefaleia tipo tensão, cefaleias trigêmino- autonômicas e outras cefaleias primárias. Por outro lado, toda cefaleia nova que possa ter iniciado após alguma perturbação, seja ela da natureza que for, com uma estreita relação causal comprovada, é uma cefaleia secundária. Fica implícito que tal distúrbio precisa de fato ser uma causa de cefaleia, como traumatismo crânio encefálico, hemorragia intracraniana, lesão intracraniana com efeito de massa, infecção de seios paranasais, por exemplo. » Bases fisiopatológicas da enxaqueca Para entendermos os fármacos mais utilizados no tratamento da enxaqueca, precisamos compreender as suas bases fisiopatológicas. As causas da enxaqueca não estão totalmente compreendidas. Historicamente, houve o desenvolvimento de três hipóteses principais e que tinham em conta os sintomas. A teoria “vascular” clássica, inicialmente proposta há cerca de 50 anos por Wolff, implicava uma vasodilatação causadora da cefaleia. A hipótese “cerebral” associa os sintomas ao fenômeno da depressão alastrante cortical. Este fenômeno, embora dramático, é pouco compreendido e pode ser desencadeado experimentalmente em animais pela aplicação local de K+ no córtex. Parece ocorrer em humanos, por exemplo, após uma concussão. Nesse caso, uma concussão provoca o avanço de uma onda de profunda inibição neural, que evolui lentamente sobre a superfície cortical a uma velocidade aproximada de 2 mm/min. Na área afetada, o equilíbrio iônico é grosseiramente perturbado por uma concentração extracelular de K+ extremamente alta e redução do fluxo sanguíneo. A hipótese “inflamatória” propõe que a ativação das terminações nervosas trigeminais, localizadas nas meninges e vasos extracranianos, constitui o evento primário de uma crise de enxaqueca. Esse evento causaria diretamente a dor e também induziria alterações inflamatórias via liberação de neuropeptídeos e outros mediadores inflamatórios a partir das terminações nervosas sensitivas (inflamação neurogênica). » Iniciando o tratamento O tratamento das cefaléias começa com um diagnóstico adequado, com a identificação de suas causas primárias e secundárias. Uma vez realizado o diagnóstico de cefaléia primária, os pacientes se beneficiarão de uma explicação completa acerca de sua patologia. Muitos pacientes com cefaléia recorrente acreditam que suas queixas não são levadas a sério e geralmentese preocupam com condições 25 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 secundárias que poderiam estar deflagrando sua dor de cabeça, como, por exemplo, tumores cerebrais e/ou aneurismas cerebrais. Além disso, é necessário esclarecer aos pacientes os objetivos do tratamento. » Tratamento abortivo O tratamento abortivo é aquele utilizado durante as crises dolorosas. O seu objetivo é o alívio rápido e sustentado da dor. O paciente deve ser orientado acerca da dose diária máxima (para que determinado valor não seja excedido), da frequência máxima de uso semanal (visto que o uso crônico de medicamentos além de efeitos adversos, pode levar ao desenvolvimento de cefaleia por abuso de analgésicos) e do uso precoce desses fármacos. ATENÇÃO: Opioides NUNCA são usados na cefaleia, pois são menos efetivos, podem diminuir o efeito dos medicamentos profiláticos e estão associados a maior risco de induzir cronificação da dor. Opções farmacológicas: • Para cefaleia de intensidade leve a moderada: ⤷ Analgésicos simples ⤷ AINES • Para enxaqueca de intensidade moderada a forte: ⤷ Triptanos ⤷ Ergotamínicos 26 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 ► Tratamento abortivo da cefaleia de intensidade leve a moderada: Para crises de cefaleia de intensidade leve a moderada, analgésicos simples (como paracetamol e dipirona) ou AINEs (como AAS, ibuprofeno e diclofenaco de sódio) são os agentes de primeira escolha porque são eficazes, menos caros e menos propensos a causar efeitos adversos do que os agentes específicos da enxaqueca, como triptanos ou ergotamínicos. Quando ataques leves a moderados estão associados a náuseas ou vômitos graves, um antiemético pode ser usado em conjunto com os analgésicos referidos. ► Tratamento abortivo da enxaqueca de intensidade moderada a forte: Para crises de cefaleia de intensidade leve a moderada, triptanos são os agentes de primeira escolha. Já os ergotamínicos são indicados apenas quando o paciente não consegue usar os triptanos. Triptanos: ➔ Representantes: Sumatriptano, naratriptano, almotriptano, eletriptano, frovatriptano, rizatriptano e zolmitriptano Esses fármacos são agonistas de receptores serotoninérgicos do tipo 5-HT1 e são, em geral, classificados como agonistas 5-HT1B/1D, em grande parte devido à dificuldade para distinguir as ações nesses dois receptores. Assim, agem em um subgrupo de receptores de serotonina encontrado em pequenos nervos periféricos que inervam os vasos intracranianos. Logo, são úteis no tratamento da enxaqueca, pois atuam em receptores pré-sinápticos do nervo trigêmeo, impedindo a liberação de neuropeptídeos vasoativos. Além disso, provocam vasoconstrição direta. Os efeitos adversos associados a esses fármacos são náusea, vômitos e diarreia. Também estão associados a parestesias, rubor facial, palpitação, dor ou sensação de peso no tórax, pescoço e mandíbula. Além disso, devido ao efeito de vasoconstrição, podem causar um episódio de isquemia periférica e, portanto, são contraindicados em pacientes com cardiopatia isquêmica e HAS não controlada. Ergotamínicos: ➔ Representantes: Ergotamina e di-hidroergotamina Os ergotamínicos são agonistas não-seletivos do receptor de serotonina do tipo 5-HT1. Dessa forma, possuem o mesmo mecanismo de ação dos triptanos, mas são menos potentes e estão associados a mais efeitos adversos. No Brasil, os ergotamínicos só estão disponíveis via oral e em associação com analgésicos simples e cafeína. Não são vendidos de maneira isolada. Os efeitos adversos associados a esses fármacos são náusea, vômitos e diarreia. Além disso, devido ao efeito de vasoconstrição, podem causar um episódio de isquemia periférica e, portanto, são contraindicados em pacientes com cardiopatia isquêmica e HAS não controlada. 27 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 ► Tratamento abortivo da enxaqueca em situações de emergência: ● Administrar antiemético parenteral se vômitos ou uso prévio de medicações: dimenidrato 30mg por via intravenosa (IV) diluído em 100ml de soro fisiológico a 0,9% ou dimenidrato 50 mg por via intramuscular (IM); ● Dipirona 1 grama (2 ml) IV diluído em água destilada (8ml); ● Cetoprofeno 100mg IV diluído em soro fisiológico 0,9% (100ml) ou 100mg IM. ● Recomenda-se jejum, com reposição de fluidos (soro fisiológico 0,9%) por via intravenosa (IV) se houver indícios de desidratação; Recomenda-se reavaliar paciente em 1 hora; se não houver melhora, prescrever sumatriptano 6mg subcutâneo (1 seringa com 0,5ml), repetindo a dose, se necessário, em 2 horas. Se houver melhora da dor, liberar o paciente e encaminhar para acompanhamento ambulatorial na UBS. Se houver piora ou não melhora da dor após 2 horas de observação, encaminhar paciente para hospital terciário por meio da Central de Regulação para avaliação de neurologista. ● Tratamento da crise como citado anteriormente associado a dexametasona 10mg (ampola 10mg/2,5ml) IV lento. ● Jejum e acesso venoso para reposição de fluidos se necessário. Infundir soro fisiológico a 0,9% 500ml em pinça aberta; Se não melhorar com dexametasona e estiver na urgência da UBS encaminhar o paciente para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), onde deverá ser prescrito: clorpromazina 0,1-0,25mg/kg IM (ampola 25 mg/5 ml); manter infusão de soro fisiológico a 0,9%. Se em 1 hora o paciente mantiver a dor, repetir clorpromazina por até três vezes, no máximo. » Tratamento profilático O tratamento profilático é aquele feito para evitar o acontecimento de novas crises. O objetivo é obter uma redução de pelos menos 50% da frequência, duração ou intensidade nas crises de cefaleia em um período de 3 meses e evitar o desenvolvimento da cefaleia por abuso de analgésico. Nos casos em que a dor tem duração inferior a 72 horas: Nos casos em que a dor tem duração superior a 72 horas (estado migranoso): ➢ Crises frequentes (mais de duas por mês) ➢ Cefaleia interfere significativamente no dia a dia do paciente, apesar do tratamento abortivo das crises ➢ Uso excessivo de medicamentos (em razão de crises frequentes, incapacitantes ou de longa duração) ➢ As medicações utilizadas na terapia abortiva são inefetivas, contraindicadas ou causam efeitos adversos intoleráveis ➢ Preferência do paciente ➢ Presença de condições incomuns de migrânea (potencialmente graves), incluindo migrânea hemiplégica, basilar, com aura prolongada ou infarto migranoso 28 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Os fármacos utilizados são escolhidos com base no perfil de efeitos adversos e na resposta individual. A resposta farmacológica é avaliada entre 2 a 6 meses após o início da terapêutica. Obs.: Em pacientes com enxaqueca, essas quatro classes farmacológicas podem ser utilizadas. No entanto, na cefaleia do tipo tensional, a tendência é utilizar mais os antidepressivos tricíclicos. Beta-bloqueadores: ➔ Representantes: Propranolol Os beta-bloqueadores atuam modulando as vias serotonérgicas e adrenérgicas, aumentando o limiar para a crise. Os beta-bloqueadores não seletivos, como o propranolol, são mais eficazes. Os indivíduos que mais se beneficiam com o uso dessas medicações são pacientes com HAS, ansiedade ou cardiopatia isquêmica. Os efeitos adversos são bradicardia, hipotensão, alterações do sono, disfunção erétil, tontura e fadiga. Há contraindicação para pacientes com asma e DPOC (devido a broncoconstrição), depressão e diabetes (visto que pode mascarar uma crise de hipoglicemia). Anti-convulsivantes: ➔ Representantes: Ácido valproico e topiramato O ácido valproico atua bloqueando canais de sódio e cálcio, além de ter efeito agonista de GABA. Como consequência, aumenta o limiar nociceptivo para uma crise de enxaqueca. É uma boa opção terapêutica para pacientes que têm comorbidades como transtornos psiquiátricos (como bipolaridade) ou epilepsia. Os principais efeitos adversosdo uso deste fármaco são ganho de peso, alopecia e tremores. Além disso, devido ao risco de hepatotoxicidade, é necessária a monitorização da função hepática. Além disso, o valproato é teratogênico, logo é necessário atenção no seu uso por mulheres em idade fértil. O topiramato tem como mecanismo de ação ser antagonista de glutamato, agonista de GABA e bloquear canais de sódio e cálcio. Como consequência, também aumenta o limiar nociceptivo para uma crise de enxaqueca. É uma boa opção terapêutica para pacientes que têm comorbidades como epilepsia ou sobrepeso/obesidade. Os efeitos adversos são parestesias, fadiga, perda ponderal, glaucoma e prejuízos cognitivos. São contraindicados em pacientes com história de litíase renal. Opções farmacológicas: • Beta-bloqueadores ⤷ Propranolol • Anticonvulsivantes ⤷ Ácido valproico ⤷ Topiramato • Antidepressivos tricíclicos ⤷ Amitriptilina • Bloqueadores dos canais de cálcio ⤷ Verapamil ⤷ Flunarizina 29 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Antidepressivos tricíclicos: ➔ Representantes: Amitriptilina, nortriptilina, clomipramin e imipramina A amitriptilina é o antidepressivo tricíclico mais utilizado para o tratamento profilático da cefaleia. O efeito desse fármaco na dor de cabeça independente da atividade antidepressiva. Os antidepressivos tricíclicos atuam bloqueando as bombas de recaptação de noradrenalina (NAT ou NET) e de serotonina (SERT). Dessa forma, acabam aumentando o limiar de ação nociceptivo para a crise de dor. Além disso, também bloqueiam os receptores serotoninérgicos, α-adrenérgicos, histamínicos e muscarínicos. Ainda não se sabe se alguma dessas ações é responsável pelo benefício terapêutico desses fármacos; contudo, as ações nesses receptores provavelmente são responsáveis por muitos dos seus efeitos adversos. Logo, tais fármacos possuem, como efeitos adversos, efeitos anti-muscarínicos, como xerostomia, constipação, retenção urinária, glaucoma, taquicardia e confusão mental, efeitos anti-histamínicos, como sedação e ganho ponderal, e efeitos do bloqueio alfa-adrenérgico, como hipotensão ortostática e retardo da condução atrioventricular. Bloqueadores dos canais de cálcio: ➔ Representantes: Verapamil e flunarizina Tais fármacos são muito utilizados no tratamento profilático de pacientes com cefaleia associada a transtornos vestibulares. Os efeitos adversos do verapamil são constipação, náusea e vômito, tontura, hipotensão, edema e alterações da condução cardíaca. Os efeitos adversos da flunarizina são ganho ponderal, sonolência, depressão, tontura, xerostomia e parkinsonismo. 30 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 FARMACOLOGIA → TRATAMENTO DA ANEMIA A anemia é definida como a concentração plasmática de hemoglobina abaixo do normal. Qualquer condição que resulte em deficiência funcional da medula óssea, anormalidade primária no eritrócito e destruição ou perda aumentada, pode levar à anemia. As manifestações clínicas dependem fundamentalmente de intensidade e velocidade do desenvolvimento da anemia, mas também de idade, estado físico do paciente e comorbidades. Nas anemias crônica e aguda, os sintomas relacionam-se principalmente à hipoxemia de tecidos e órgãos. As manifestações mais precoces de anemia moderada são cansaço, fraqueza generalizada seguida de palpitação e dispneia aos esforços. » Ferro O ferro é uma substância inorgânica, necessária em pequenas quantidades e amplamente disponível na dieta. Encontra-se principalmente em vegetais verdes, trigo, coração, fígado, gema de ovo e carne. Cerca de 5 a 10% do ferro ingerido são absorvidos em condições normais, principalmente em duodeno e jejuno. Parte do ferro ingerido permanece na própria ferritina das células mucosas, e o restante tem acesso ao plasma. A absorção depende da forma de ferro. Absorvem- se 20 a 40% do ferro contido no pigmento heme e 5% do não heme (grãos e vegetais). O ferro não heme tem sua absorção diminuída por constituintes de dietas vegetarianas, especialmente o fosfato. Ácido ascórbico e carne aumentam a absorção, ao passo que inflamações gastrointestinais crônicas e agudas a diminuem. O transporte de ferro no plasma é feito por transferrina. A quantidade total de ferro do organismo (50 mg/kg em homens e 35 mg/kg em mulheres) distribui-se entre hemoglobina (65%), ferritina e hemossiderina (30%), mioglobina e enzimas (5%). Como constituinte da heme e pela facilidade com que sofre reações de oxirredução, o ferro exerce seu papel fisiológico fundamental, o transporte de oxigênio. 31 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 O ferro é rigidamente conservado pelo organismo. Não há sistemas de depuração, perdendo-se por dia somente o contido em células descamadas de pele e condutos gastrointestinal e urinário (em torno de 1 mg/dia). Assim, a grande causa de deficiência de ferro é a perda de sangue. As mulheres podem perder mais 0,006 mg/kg/dia, em média, durante a menstruação. Além disso, gestantes perdem 3,5 vezes mais ferro que um homem normal. Indicações médicas As indicações médicas para a administração de ferro podem ser profiláticas e terapêuticas. As indicações profiláticas incluem condições etárias ou fisiológicas em que há aumento da demanda, como gestação, lactação, fases de crescimento rápido, recém-nascidos com baixo peso e lactentes alimentados com fórmulas. Já as indicações terapêuticas são para pacientes já diagnosticados com ferropenia. O tratamento de anemias ferroprivas deve ser inicialmente dirigido à eliminação da causa básica. Se persistir, cabe escolher entre reposição de sangue ou ferro. Algumas vezes a decisão é evidente, como em hemorragia aguda e intensa, em que se repõe sangue. Nesse caso, além de repor elementos figurados, corrige-se a volemia. Quando não há acentuados comprometimentos hemodinâmico e sintomático, deve- se corrigir a anemia por meio da reposição das reservas de ferro. Isso pode ser feito mais rapidamente com uso farmacológico de compostos de ferro ou com dietas ricas nesse mineral. Não estão definidos os valores de hematócrito ou hemoglobina que suportam uma ou outra conduta. Sais ferrosos são preferíveis aos férricos por serem mais bem absorvidos por via oral. Assim, por extensa experiência de emprego e menor custo, prefere-se sulfato ferroso. Apresentações mais recentes, na forma de ferro aminoácido quelato ou associado à inulina, não mostraram benefícios em relação ao sulfato ferroso. É mais bem absorvido se tomado entre as refeições, mas é em geral prescrito com alimentos para amenizar efeitos adversos gastrointestinais. As condições ácidas do estômago mantêm o ferro na forma ferros (reduzida), que é a forma mais solúvel. Logo, pode-se recomendar que o paciente ingira o medicamento com alguma bebida ácida. O intervalo entre as doses é em geral de 8 h para permitir o pronto aproveitamento do ferro absorvido na síntese da hemoglobina e diminuir a irritação gastrointestinal de dose única. Doses orais profiláticas e terapêuticas, recomendadas em diferentes situações clínicas, são mostradas no quadro ao lado. 32 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 A resposta hematológica a doses adequadas de ferro oral aparece em 2 semanas e aumenta a produção de hemoglobina em torno de 0,1 a 0,2 g/dℓ/dia ou 2 g/dℓ nas primeiras 3 semanas de tratamento. Se não houver persistência da causa da anemia, a hemoglobina normaliza-se em 2 meses. Reticulócitos aumentam a partir do terceiro ou quarto dia, com pico entre o quinto e o décimo dia. A frequência de realização de eritrogramas de controle deve ser individualizada para cada paciente. Aqueles que não apresentam mais perdas e não têm outras complicações podem ser seguidos clinicamente, realizando exame mensal. Caso contrário, recomenda-se a realização de eritrograma semanal. O tratamentonormalmente dura de 3 a 6 meses. O uso de ferro parenteral está indicado em ausência de resposta à terapia oral, falta de adesão ou indisponibilidade da via oral. Utiliza-se classicamente ferrodextrana (complexo oxi-hidroxiférrico com dextrana) ou ferro coloidal, contendo 50 mg/mℓ de ferro. Administra-se por via intravenosa, pois a intramuscular não garante adequada biodisponibilidade. A vantagem da administração endovenosa é não depender de absorção e poder oferecer ao paciente doses mais altas de ferro em menor tempo de tratamento, com aumento inicial da hemoglobina mais rápido. Efeitos adversos Efeitos adversos de ferro oral são, geralmente, dependentes de dose e se devem ao elemento ferro. Incluem distúrbios gastrointestinais, particularmente náuseas, dor epigástrica e diarreia ou constipação intestinal, além de fezes escuras. O escurecimento das fezes confunde-se por vezes com melena. Além disso, soluções de ferro oral tingem os dentes por contato direto, o que pode ser prevenido pela administração com conta-gotas na base da língua. Para aumentar a tolerância a sais ferrosos, pode-se iniciar o tratamento com doses baixas, aumentando-as progressivamente. Com relação a interações medicamentosas, vale saber que a absorção intestinal de ferro oral é diminuída por antiácidos, inibidores da bomba de prótons, cálcio, levotiroxina e alguns antibióticos. A infusão endovenosa de ferro pode desencadear reações alérgicas e até anafilactóides. Entretanto, reações mais severas são extremamente raras. Mais comumente podem ser observadas urticária (rash cutâneo), palpitações, tonturas; geralmente quadros autolimitados e de curta duração; mais frequentemente iniciados durante as infusões. Alterações podem ainda acontecer nas primeiras 24 horas após a infusão e incluem febre, artralgias e mialgias, de leve intensidade e também autolimitadas. Falha no tratamento As causas mais frequentes de falha no tratamento com ferro por via oral, ou de sua refratariedade, estão relacionadas no quadro abaixo. • Continuidade da perda de sangue por falha na identificação ou correção de sangramento e/ou de distúrbio de absorção de ferro • Medicação usada inadequadamente - baixa adesão ao tratamento devido aos efeitos adversos gastrointestinais e/ou dose inadequada e/ou duração insuficiente • Doença coexistente interferindo na resposta ao tratamento com ferro por via oral - doença renal crónica; doença inflamatória ou infecciosa associada • Doenças associadas com distúrbio de absorção do ferro - doença celíaca, gastrite atrófica autoimune e infecção pelo Helicobactet pylori • Diagnóstico incorreto • Interação medicamentosa • Deficiências nutricionais combinadas • Causas genéticas de deficiência de ferro https://www.ufrgs.br/telessauders/perguntas/quando-e-como-fazer-reposicao-de-ferro-endovenosa/ 33 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 » Vitamina B12 e Ácido fólico A vitamina B12 – também chamada de cianocobalamina – é uma vitamina hidrossolúvel, não sintetizada pelo organismo e presente em alimentos de origem animal (fígado, músculos, ovos, leite e queijo). É composta de substâncias com estrutura química complexa e cobalto (cobalamina). A necessidade diária de cianocobalamina varia de 0,3 a 1,2 µg, e a ingestão diária média oferece de 5 a 15 µg. Para absorção no íleo, é necessária sua ligação com proteína secretada no estômago, o fator intrínseco. Uma vez absorvida, é transportada por transcobalamina II, uma betaglobulina plasmática, sendo levada aos tecidos. O maior sítio de armazenamento é o fígado. Já o ácido fólico (folato) é proveniente de alimentos que incluem vegetais de folhas verdes (espinafre, alface, brócolis), feijão, frutas (banana, melão, limão), leveduras, cogumelos e proteína animal (músculo, fígado, rim). O folato presente na dieta existe em diversas formas, a maior parte deste, na forma de poliglutamato folato. A vitamina B12 e o ácido fólico são coenzimas necessárias para a síntese de timidina, uma das quatro bases encontradas no DNA. Uma deficiência dessas vitaminas ou um prejuízo em seu metabolismo resulta em maturação nuclear defeituosa decorrente de síntese desorganizada ou inadequada de DNA, com consequente retardo ou bloqueio da divisão celular, um efeito que é clinicamente verificado principalmente na medula óssea, na qual a divisão celular é rápida. Assim, quando há uma deficiência de vitamina B12, ocorre uma anemia megaloblástica. Sua deficiência é pouco frequente por diminuição do aporte na dieta, todavia é muito frequente em pessoas com problemas de absorção gastrointestinal. A forma mais frequente é a anemia perniciosa, decorrente da não produção do fator intrínseco no estômago, o que, em consequência, determina não absorção da vitamina. Outra possível forma de apresentação é a anemia megaloblástica após gastrectomia ou cirurgia bariátrica. Além disso, alguns medicamentos interferem no metabolismo do ácido fólico. Pacientes em uso de metotrexato, trimetoprima e pirimetamina (inibidores da redutase do ácido di-hidrofólico) que apresentem algum grau de deficiência de ácido fólico podem também exibir quadro de anemia megaloblástica. Consumo de álcool determina queda rápida nos níveis séricos de ácido fólico, podendo desencadear quadro de anemia megaloblástica se a ingestão de ácido fólico não for adequada. Indicações médicas A reposição de cianocobalamina na anemia perniciosa compreende doses diárias intramusculares de 100 µg durante 1 semana; após, aquela dose é repetida semanalmente; por fim, é espaçada mensalmente, pelo resto da vida. Também pode ser administrada por via subcutânea profunda, mas não intravenosamente. Para outras situações de deficiência, em que não há falta de fator intrínseco, pode-se usar vitamina B12 oral, em baixa dose; mesmo na anemia perniciosa, formulação oral (em altas doses) pode ser uma alternativa, pois pequenas quantidades de cianocobalamina (1 a 3%) são absorvidas sem necessidade de fator intrínseco. 34 Gabriela Figueiredo Güntzel – ATM 24/1 Recomenda-se uso associado de ácido fólico, pois, caso ocorra deficiência concomitante deste, o quadro neurológico pode deteriorar-se. Por outro lado, administração isolada de ácido fólico pode levar à correção parcial da anemia, sem normalização dos níveis de cianocobalamina, o que permite progressão da lesão neurológica, que pode ser irreversível. No tratamento de anemia megaloblástica secundária à deficiência de ácido fólico e em diversas indicações de reposição (inclusive nas síndromes de má absorção intestinal), a dose empregada é de 1 a 5 mg/dia via oral. Mantém-se o uso até a correção da alteração hematológica ou, quando a doença de base leva a uma deficiência crônica, utiliza-se o ácido fólico indefinidamente. Nas anemias tratadas com cianocobalamina e ácido fólico, alterações na medula óssea revertem em 24 a 48 h, e reticulócitos aparecem na circulação em 2 a 3 dias, atingindo pico em 6 a 8 dias. O nível da hemoglobina eleva-se lentamente (6 a 8 semanas). Caso não ocorra melhora nesse período, outras causas de anemia devem ser investigadas. Contagens sanguíneas devem repetir-se a intervalos de 3 a 6 meses, por toda a vida, já que a refratariedade à terapia pode desenvolver-se a qualquer momento. Alterações neurológicas, na dependência de sua intensidade e duração, revertem de maneira mais lenta, em geral em prazo de 6 meses a 1 ano. A recuperação pode ser completa ou parcial. Efeitos adversos Uso de cianocobalamina e de ácido fólico não se associa a maiores efeitos adversos. No entanto, algumas interações medicamentosas são importantes. A absorção intestinal da vitamina B12 é diminuída por aminoglicosídeos, ácido aminossalicílico, cloranfenicol, colchicina, anticonvulsivantes, omeprazol, preparados de liberação lenta de potássio e uso prolongado e excessivo de álcool. Já o ácido fólico antagoniza
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