Prévia do material em texto
FARMACO1 Farmacocinética: Distribuição Embora a absorção do fármaco constitua pré-requisito para atingir níveis plasmáticos adequados desse fármaco, ele também precisa alcançar seu órgão ou órgãos-alvo em concentrações terapêuticas para exercer o efeito desejado sobre determinado processo fisiopatológico. A distribuição de um fármaco ocorre primariamente por meio do sistema circulatório, enquanto o sistema linfático contribui com um componente menor. Uma vez absorvido na circulação sistêmica, o fármaco é então capaz de alcançar qualquer órgão-alvo (com a possível exceção dos compartimentos santuários, como o cérebro e os testículos). COMPARTIMENTOS CORPORAIS A água corporal está distribuída em quatro compartimentos principais. A água constitui 50 a 70% do peso corporal e, em mulheres, a porcentagem é menor que em homens. O líquido extracelular compreende plasma (em torno de 4,5% do peso corporal), líquido intersticial (16%) e linfa (1,2%). O líquido intracelular (30 a 40%) é a soma do conteúdo líquido de todas as células do corpo. O líquido transcelular (2,5%) inclui líquidos cefalorraquidiano, intraocular, peritoneal, pleural e sinovial e secreções digestivas. O feto também pode ser considerado um tipo especial de compartimento transcelular. Dentro de cada um desses compartimentos aquosos, as moléculas de fármacos estão presentes tanto livres em solução quanto na forma ligada Assim, após a absorção de um fármaco ou sua administração sistêmica na corrente sanguínea, esse fármaco será distribuído: O padrão do equilíbrio de distribuição entre os diversos compartimentos depende, portanto, de: • permeabilidade através das barreiras teciduais; • ligação dentro dos compartimentos; • partição pelo pH; • partição óleo:água. É importante ressaltar que cada órgão ou tecido apresenta características diferentes: PROTEÍNAS PLASMÁTICAS E DISTRIBUIÇÃO DE FÁRMACOS NOS TECIDOS A ligação de fármacos a proteínas plasmáticas é um fator que tem influência preponderante na distribuição e eliminação de fármacos, assim como a partição na gordura corporal e outros tecidos. Ligação a proteínas plasmáticas Em concentrações terapêuticas no plasma, muitos fármacos encontram-se principalmente na forma ligada. A fração de fármaco que não está ligada, mas se encontra farmacologicamente ativa no plasma, pode ser inferior a 1%, estando o restante associado a proteínas plasmáticas. A proteína plasmática mais importante no que se refere à ligação de fármacos consiste em albumina, que liga muitos fármacos ácidos (p. ex., varfarina, anti-inflamatórios não esteroides, sulfonamidas), e um pequeno número de fármacos básicos (p. ex., antidepressivos tricíclicos e clorpromazina). Outras proteínas plasmáticas, incluindo a β-globulina e uma glicoproteína ácida cujo nível aumenta nas doenças inflamatórias, também foram implicadas na ligação de determinados fármacos básicos, como a quinina. Essas proteínas podem realizar ligações reversíveis (equivalente a RESERVATÓRIO) ou irreversíveis (equivalente à ELIMINAÇÃO). A quantidade de ligação de um fármaco a proteínas depende de três fatores: • a concentração de fármaco livre; • sua afinidade pelos locais de ligação; • a concentração de proteínas. Um fármaco ligado à albumina ou a outras proteínas plasmáticas é incapaz de difundir-se do espaço vascular para os tecidos circundantes. Os fármacos que não se ligam às proteínas plasmáticas sofrem, de maneira visível, rápida difusão (mostrada aqui na forma do Fármaco A nos tecidos). Isso resulta em alto nível de ligação ao local de ação farmacológica (em geral receptores) e em alta taxa de eliminação (representada pelo fluxo através de um órgão de depuração). Dentre esses fármacos destacam-se paracetamol, aciclovir, nicotina e ranitidina. Em contrapartida, para os fármacos que exibem altos níveis de ligação às proteínas plasmáticas (mostrados aqui na forma do Fármaco B), é necessário concentração plasmática total mais elevada para assegurar concentração adequada do fármaco livre (não ligado) na circulação. Caso contrário, apenas pequena fração do fármaco poderá sofrer difusão no espaço extravascular, e poucos receptores estarão ocupados. Dentre esses fármacos, destacam-se amiodarona, fluoxetina, naproxeno e varfarina. É preciso ressaltar que a ligação às proteínas plasmáticas constitui apenas uma das numerosas variáveis que determinam a distribuição dos fármacos. Tamanho molecular, afinidade por lipídios e intensidade do metabolismo de um fármaco são outros parâmetros importantes que precisam ser considerados quando se estuda a farmacocinética. Ligação tecidual Partição na gordura corporal e em outros tecidos. A gordura representa um grande compartimento apolar, um reservatório lipossolúvel. Na prática, isso é importante somente para alguns fármacos, especialmente porque o coeficiente de partição óleo:água efetivo é relativamente baixo para a maioria dos fármacos. A morfina, por exemplo, apesar de ser lipossolúvel o bastante para atravessar a barreira hematencefálica, tem um coeficiente de partição óleo:água de apenas 0,4 e, por isso, seu sequestro pela gordura corporal é de pequena importância. Por outro lado, o tiopental (coeficiente de partição óleo:água de aproximadamente 10) acumula-se substancialmente no tecido adiposo. Isso apresenta consequências importantes que limitam sua utilidade como um anestésico intravenoso para início imediato (“indução”) da anestesia. O segundo fator que limita o acúmulo de fármacos na gordura é o seu baixo suprimento sanguíneo – menos de 2% do débito cardíaco. Consequentemente, os fármacos são levados lentamente para a gordura corporal, e o equilíbrio teórico da distribuição entre gordura e água corporal é retardado. Para fins práticos, portanto, a partição na gordura corporal quando os fármacos são administrados agudamente é importante somente para alguns poucos fármacos altamente lipossolúveis. Além disso, alguns fármacos e contaminantes ambientais (como os inseticidas), se ingeridos regularmente, acumulam-se de maneira lenta, mas progressiva, no tecido adiposo. Músculos também podem se comportar como reservatórios. Como seu volume corporal é grande, a densidade de locais de ligação para os fármacos é alta. Há ainda outros tecidos em que fármacos podem se acumular. A cloroquina por exemplo tem alta afinidade pela melanina, sendo captada por tecidos como a retina, rica em grânulos de melanina, responsável por sua toxicidade ocular. As tetraciclinas acumulam-se lentamente em ossos e dentes, pois apresentam alta afinidade pelo cálcio, não devendo, por isso, ser administradas a crianças. BARREIRAS – DISTRIBUIÇÃO SELETIVA Para passar do compartimento extracelular para os compartimentos transcelulares, o fármaco precisa atravessar uma barreira celular, e a barreira hematencefálica é um exemplo particularmente importante. Barreira hematoencefálica: difusão lipídica; transporte ativo. Barreira palcentária: usualmente não impede a distribuição dos fármacos VOLUME DE DISTRIBUIÇÃO O volume de distribuição aparente Vd é definido como o volume necessário para conter a quantidade total do fármaco (Q) no organismo, na mesma concentração presente no plasma (Cp). 𝑉𝑑 = 𝑄 𝐶𝑝 Assim, dizemos que este conceito relaciona a quantidade de fármaco no corpo com a concentração deste no sangue ou em outro líquido. Não compreende um volume real, mas o volume que seria necessário para conter todo o fármaco no corpo na mesma concentração que no sangue. Podemos dizer, desse modo, que o volume de distribuição (Vd) reflete a extensão da distribuição do fármaco nos meios extravasculares. O Vd pode ser um volume imaginário já que muitos fármacos excedem o volume conhecido dos compartimentos sanguíneos. Isso ocorre com substâncias muitos lipofílicas, que se difundem para tecidos lipofílicos, excedendoo volume intravascular. Já fármacos que se ligam a proteínas plasmáticas de forma extensa, tem volume de distribuição semelhante ao plasmático. Quando meu Vd de um fármaco for alto, indica que a concentração desse fármaco no plasma é baixa. Isso também significa que a quantidade de fármaco no corpo é alta e, assim, ele atinge diferentes tecidos, resultando em uma [plasmática] baixa. Se o Vd for pequeno, sua concentração no plasma é alta. O Vd baixo indica que o fármaco não está alcançando os líquidos dos diferentes tecidos corporais, se encontrando “preso” nos vasos, assim, sua [plasmática] é alta. Fármacos com Vd baixo são aqueles que vão se difundir pouco para os tecidos arredor (ex, heparina): O volume de plasma é de aproximadamente 0,05 l/kg de peso corporal. Alguns fármacos, como a heparina, ficam confinados ao plasma porque a molécula é muito grande para atravessar a parede dos capilares com facilidade. Mais frequentemente, a retenção de um fármaco no plasma após uma dose única reflete uma forte ligação às proteínas plasmáticas. No entanto, é a fração livre do fármaco no líquido intersticial que tem efeitos farmacológicos. Após doses repetidas, ocorre equilíbrio e o Vd medido aumenta. Fármacos com Vd intermediário são aqueles que conseguem, pelo menos, atingir o interstício: Fármacos com Vd alto são aqueles que são muito bem distribuídos e alcançam os líquidos dos demais tecidos corporais: Referências GOLAN, David E.; Princípios de Farmacologia - A Base Fisiopatológica da Farmacologia, 3ed. Capítulo 3 – Farmacocinética. KATZUNG, B., MASTERS, S., TREVOR, A. Farmacologia Básica e Clínica, 13ed. Capítulo 3 – Farmacocinética e farmacodinâmica: dosagem racional e o curso do tempo de ação dos fármacos. RITTER, James M. et al. Rang & Dale Farmacologia. Capítulo 9 – Absorção e Distribuição de Fármacos. O volume extracelular total é de aproximadamente 0,2 l/kg, e esse é o Vd aproximado para muitos compostos polares, tais como o vecurônio, a gentamicina e a carbenicilina. Esses fármacos não conseguem entrar com facilidade nas células por sua baixa lipossolubilidade, não atravessando livremente a barreira hematencefálica nem a placenta. Muitos biofármacos macromoleculares, especialmente anticorpos monoclonais, distribuem-se no espaço extracelular e alcançam os receptores de superfície das células, mas não entram nas células facilmente. A água total do organismo representa em torno de 0,55 l/kg. Esse valor aproxima-se da distribuição de muitos fármacos que atravessam as membranas celulares facilmente, como a fenitoína e o etanol. A ligação dos fármacos fora do compartimento plasmático, ou sua partição na gordura, aumenta o Vd acima do conteúdo total de água corporal. Consequentemente, também existem muitos fármacos com Vd maior que o volume total da água corporal, tais como morfina, antidepressivos tricíclicos e haloperidol. Tais fármacos não são removidos do organismo com eficiência pela hemodiálise, que é, pois, inútil no tratamento de superdosagens com esses agentes.