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LEI DOS CRIMES HEDIONDOS Previa o art. 1 da Lei n. 8.072/90 que eram considerados crimes hediondos o estupro e o atentado violento ao pudor. Com as modificações introduzidas pela Lei n. 12.015/2009, o art. 214 do CP foi revogado e as condutas lá previstas passaram a ser abarcadas pelo delito de estupro Do mesmo modo, foi revogado o art. 223, caput e parágrafo único, do CP, e as formas qualificadas pelo resultado lá contempladas foram inseridas no art. 213, §§ 1 e 2, do CP. Dentre as mudanças da atual lei, o inciso V do art. 1 da Lei n. 8.072/90 dispõe expressamente que é considerado crime hediondo o estupro na forma simples e qualificada. O STF, por reconhecer a natureza hedionda desses crimes, vedava a progressão de regime, em face do disposto no art. 2, § 1, da Lei n. 8.072/90. Havia uma discussão sobre se o estupro e o atentado violento ao pudor com violência presumida constituiriam crimes hediondos. Entendíamos que também possuíam essa natureza, pois a lei não fazia nem autorizava qualquer distinção entre as formas de violência. Com efeito, submeter uma criança de 9 anos à conjunção carnal, seduzindo-a com doces e brinquedos, não nos parecia ser uma conduta menos grave que empregar violência real contra um adulto. Ambas as formas eram, na realidade e na letra da lei, crimes hediondos. Nesse sentido, vinham se manifestando os Tribunais Superiores. Entretanto, com o advento da Lei n. 12.015/2009, o art. 224 do CP foi revogado expressamente e, sob a nomenclatura «estupro de vulnerável», o Codex passou a reprimir em tipo penal autônomo a conduta de «Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos: Pena – reclusão, de 8 a 15 anos. § 1 Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. § 2 § 3 Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão, de 10 a 20 anos. § 4 Se da conduta resulta morte: Pena – reclusão, de 12 a 30 anos». Dessa forma, as hipóteses antes previstas no art. 224 do CP, que caracterizavam o estupro com violência presumida, passaram a configurar delito autônomo, com sanções próprias, inclusive com a previsão de formas qualificadas. A partir disso, a Lei n. 12.015/2009 também introduziu modificações na Lei dos Crimes Hediondos, passando a considerar de natureza hedionda o delito de estupro de vulnerável, em sua forma simples e qualificada , não havendo mais qualquer discussão sobre o tema. Finalmente, vale aqui transcrever antiga discussão que pairava sobre os delitos de estupro e atentado violento ao pudor contra vítima menor de 14 anos. A CF/88, em seu art. 227, § 4, recomendou punição mais severa aos autores de abuso, violência e exploração sexual contra a criança. Atendendo a esse mandamento, a Lei n. 8.069, promulgada em 13 de julho de 1990, em seu art. 263, acrescentou parágrafo único aos arts. 213 e 214 do CP, agravando as penas dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor sempre que forem praticados contra vítima menor de 14 anos. No estupro, a pena passou a ser de 4 a 10 anos de reclusão; no atentado violento ao pudor, a pena passou a ser de 3 a 9 anos de reclusão. Em 26 de julho de 2009, entrou em vigor a Lei dos Crimes Hediondos. Essa lei elevou as penas do estupro e do atentado violento ao pudor para 6 a 10 anos de reclusão. Portanto, o estupro teve sua pena aumentada de 3 a 8 para 6 a 10 anos de reclusão, enquanto no atentado violento ao pudor passou de 2 a 7 para 6 a 10 anos de reclusão O crime de atentado violento ao pudor contra vítima não maior de 14 anos: pena de 9 a 15 anos de reclusão. Pois bem. Chega o dia 12 de outubro e entra em vigor o ECA. E agora? A pena do estupro e do atentado violento ao pudor, quando praticados contra vítima menor de 14 anos, diminuiu de 9 a 15 anos de reclusão para, respectivamente, 4 a 10 e 3 a 9? Convém lembrar que o ECA, visando agravar a situação de quem cometesse violência sexual contra criança, aumentou, na época, as penas do estupro para 4 a 10 anos e as do atentado violento ao pudor para 3 a 9 anos de reclusão. No entanto, com as novas penas trazidas pela Lei dos Crimes Hediondos, a alteração ficou totalmente sem sentido: um estupro contra ofendida adulta é punido com pena de reclusão de 6 a 10 anos. Se entendermos que lei posterior é a que entra em vigor depois, há de prevalecer o ECA. Nesse caso, o legislador teria criado a absurda e injusta situação de o estupro praticado contra adulta ser apenado com 6 a 10, e de o cometido contra vítima menor de 14 anos ser punido somente com 4 a 10 anos de reclusão. Igualmente, no atentado violento ao pudor, se cometido contra adulto seria punido com 6 a 10, enquanto se praticado contra criança seria apenado com 3 a 9 anos de reclusão. Prevalecendo a lei promulgada posteriormente, não haveria impropriedade. É um caso de lei que foi revogada durante o período de vacatio legis, antes mesmo de entrar em vigor. Para efeito de revogação da lei, deve ser observado o princípio de que posterior é a que foi promulgada em último lugar, independentemente das datas da publicação ou da entrada em vigor. Damásio E. de Jesus é partidário dessa corrente. Essa também é a posição do STJ, em reiterados acórdãos, tornando pacífico o entendimento de que o art. 263 do ECA foi revogado antes mesmo de entrar em vigor. Não há mesmo qualquer dúvida. Promulgação é o ato jurídico- constitucional pelo qual se atesta a existência de uma lei votada e aprovada pelo Poder Legislativo. A lei, portanto, já existe a partir de sua promulgação. A entrada em vigor relaciona-se com o plano da eficácia e não da existência. Lei posterior é a que existe depois, e não a que passou a gerar efeitos depois. Por conseguinte, a Lei dos Crimes Hediondos é lei posterior, por ter sido promulgada depois. Acabou a polêmica. Estupro e atentado violento ao pudor contra vítima adulta: pena de 6 a 10 anos de reclusão. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA: Capez, Fernando, Curso de direito penal, volume 3, parte especial : arts. 213 a 359-H / Fernando Capez — 16. ed. atual. — São Paulo : Saraiva Educação, 2018.
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